Buscar

Prévia do material em texto

03
Aspectos Socioeconômicos e Culturais: Alimentação
Influências biológicas
Características
Sabemos que alimentação vai muito além dos nutrientes. Ela é determinada por inúmeros aspectos sociais, culturais, psicológicos e econômicos, sendo o sabor o principal determinante de escolhas (ESTIMA et al., 2009). Entretanto, outras características que despertam os nossos sentidos, como o odor, a aparência, a textura, a crocância, também são importantes nesse sentido. É pouco provável que alimentos que desagradem esses sentidos sejam consumidos — e isso ocorre independentemente da renda do indivíduo e da disponibilidade do produto.
Cada vez mais a ciência descobre a relação entre o sabor e a genética. O caso do coentro é exemplar. D’Ávila (2018) cita um experimento feito com mais de mil indivíduos, em que se pode perceber diferenças genéticas relacionadas ao sabor do coentro em diferentes grupos étnicos e entre os gêneros feminino e masculino.
Alguns indivíduos relatam sentir gosto de sabão, de detergente, gosto parecido com o de insetos, gosto de coisa pútrida e gasolina. Os apreciadores dessa erva consideram que ela tem um sabor fresco e cítrico. Tais diferenças de percepção não só chamaram atenção dos cientistas, como levaram à criação de um site para pessoas que odeiam o coentro.
O cheiro também é importante nessa percepção. Alguns polimorfismos em determinados genes estão relacionados à percepção de um cheiro desagradável do coentro.
O coentro é um exemplo das diferentes percepções de sabor.
É a composição genética, segundo a etnia, que influenciará a percepção desses cheiros e sabores enfadonhos. Em um estudo feito com quase 1.400 pessoas de diversas origens, observou-se que entre os hispânicos, os sul-asiáticos e os indivíduos do Oriente Médio, de 3% a 7% da amostra sentem esses sabores e cheiros desagradáveis do coentro. Já entre as pessoas do Leste Europeu, os caucasianos europeus e os africanos, esse percentual aumentou e ficou entre 14% e 21%. Porém, é preciso mencionar o dado cultural: em locais onde a erva é mais usada, ela tende também a provocar mais reações negativas.
Outro dado: as mulheres são mais propensas a sentir o sabor de sabão do que os homens. Entretanto, esse tema é pouco estudado e são necessárias pesquisas suplementares para que se possa esclarecer toda a sua complexidade.
Existe também uma substância encontrada em vegetais como o brócolis, a couve, o agrião, a couve-de-bruxelas, a couve-flor e o repolho, que tem seu sabor associado a fatores genéticos: é a feniltiocarbamida.
O teste de sensibilidade à feniltiocarbamida é inclusive utilizado no ensino de genética, com o intuito de aproximar mais a disciplina do cotidiano dos indivíduos (FREIRE; LIMA, 2009).
Atenção!
O nutricionista deve não apenas conhecer essas substâncias, mas também evitar indicar para os seus pacientes alimentos cujo sabor eles não apreciam, pois, sendo o sabor o principal determinante das escolhas alimentares, a probabilidade de fracasso do tratamento aumenta.
Em situações como as relatadas por Estima et al. (2009), em que experimentos demonstraram que os jovens frequentadores de lanchonetes fast-food consideravam ruim o gosto dos alimentos saudáveis, cabe ao nutricionista encontrar uma solução capaz de mudar o comportamento alimentar desses indivíduos.
Por outro lado, as crianças e os jovens necessitam de um aporte energético para o seu crescimento, e isso influencia suas escolhas alimentares (JOMORI et al., 2008a), assim como a fome e o apetite.
Influências psicossociais e a mídia
Diferentes tipos de fome
É importante compreendermos que os processos de escolha dos alimentos são complexos e multideterminados, e que eles estão relacionados a reflexões conscientes, mas também àquelas que, por força do hábito, se tornam automáticas.
Quantas vezes comemos na frente da TV ou do computador porque está na hora da refeição, mas nem percebemos se estamos efetivamente com fome, ou sequer prestamos atenção ao sabor do que estamos comendo?
Ou então comemos rápido demais e nem nos damos conta de quando estamos satisfeitos. Sem falar de quando vamos a uma festa e comemos muito mais salgadinhos e doces do que necessitamos.
Com efeito, existem diferentes tipos de fome:
Fome fisiológica
Ocorre quando nosso corpo nos avisa que já não comemos há algum tempo ou quando gastamos energia demais e sentimos aquele “buraco” no estômago.
Fome psicológica
Ocorre quando não comemos por fome, e sim porque ficamos com vontade de saborear um doce, por exemplo, mesmo que já estejamos satisfeitos. Ou então comemos porque estamos em um evento social, como o exemplo da festa. Mas também comemos porque estamos tristes ou cansados e buscamos uma compensação. Esse tipo de fome não está ligado às necessidades fisiológicas do corpo, e sim a aspectos emocionais e sociais.
Por outro lado, o comer consciente, ou comer com atenção plena, é um conceito derivado da prática de atenção plena ou mindfullness.
A atenção plena tem origem milenar no budismo, mas, a partir dos anos 2000, ela começou a ser usada de forma terapêutica.
Comer com atenção plena é aplicar esses princípios à alimentação.
Prestar atenção de forma intencional, no momento presente, sem julgamento no momento em que se está comendo.
(RODRIGUES, 2019, p. 46)
Dessa forma, respeitamos a nossa fome, ficamos atentos a ela, ao nosso corpo e suas sensações, ao que estamos comendo e ao efeito que os alimentos fazem à nossa saúde.
Silva, Ribeiro e Cardoso (2008) comentam que tanto o humor negativo como o positivo influenciam na ingestão de alimentos, mas também a dieta pode influenciar no humor. As dietas restritivas com frequência alteram o humor. Situações de fadiga e depressão podem igualmente causar compulsão por alimentos gordurosos e ricos em carboidratos.
Muitas vezes, pessoas que estão em situação de cansaço e de noites mal dormidas buscam conforto em comidas gordurosas e saborosas. É muito comum comer para aliviar o estresse e, nesse caso, a preferência é por doces e alimentos gordurosos. Mas essa relação entre alimentação e estresse pode apresentar formas distintas. Enquanto alguns indivíduos vão comer mais quando estão sob pressão, outros comerão menos.
Exemplo
Em determinadas situações, como no período de provas, os estudantes muitas vezes fazem menos refeições e mais lanches rápidos, mas também podem comer como uma forma de distração, o que pode provocar aumento de peso.
O gênero também importa nesse caso, pois as respostas serão diferentes. Alguns estudos demonstraram que os homens em situação de estresse comerão menos, enquanto as mulheres tendem a comer mais. A questão de gênero vai muito além disso, pois existem diferenças significativas entre homens e mulheres com relação às escolhas alimentares.
Saiba mais
Em uma pesquisa sobre alimentação fora de casa em restaurantes a quilo, Jomori et al. (2008b) observaram que as mulheres escolhiam seus alimentos com base na saúde, no valor nutricional e na questão estética, enquanto os homens compunham seus pratos baseados nos alimentos que lhes trariam mais prazer. A conclusão desse estudo é de que a mulher se preocuparia mais com a saúde pelo fato de, historicamente, em muitas culturas, ela ter ocupado o papel de fornecedora de alimentação saudável para a família.
Efetivamente, Barbosa (2007), em uma grande enquete sobre alimentação em um contexto urbano, constatou que a responsabilidade da escolha do menu diário da família ainda recai sobre a mulher em 70% dos casos. Essa função representa para ela uma fonte de tensão e irritação, pois, além de ser uma obrigação, ela deve conjugar preço, praticidade, variedade, qualidade dos alimentos e as preferências pessoais dos membros da família.
Existe outro fator significativo nas escolhas alimentares femininas: a preocupação com a própria estética. A mulher conseguiu liberdade e autonomia financeira a partir de sua inserção no mercado de trabalho, mas, diante do ideal de beleza corporal estabelecido na segunda metade do século XX, ela busca incessantemente obter o corpo magro ideal e acaboupor se tornar uma prisioneira dentro do seu próprio corpo “sob a égide do mito da beleza” (ANDRADE; BOSI, 2003).
A busca pelo corpo perfeito influencia os hábitos nutricionais.
A busca pelo corpo perfeito, que é um corpo magro, se traduz em um ideal de beleza, mas também de poder, um corpo que seria capaz de proporcionar à mulher felicidade e realização tanto profissional como amorosa. Temos aí também a crença de que toda mulher pode ter o corpo perfeito se fizer o esforço necessário, e as que não conseguem atingir esse ideal, é porque são fracas.
A indústria da beleza exerce a ditadura da magreza e a indústria alimentar fornece alimentos ricos em açúcar e gordura, enviando assim mensagens contraditórias nas suas publicidades. Mesmo se a mulher é aquela que cuida da saúde da família e de si própria, como vimos acima, diante de tanta pressão pela busca por um corpo perfeito, ela pode até vir a adoecer, desenvolvendo algum transtorno do comportamento alimentar (TCA).
Mulher com anorexia.
Obviamente, o prazer, que também está associado ao gosto, vai influenciar as escolhas alimentares, mesmo se o desejo por determinados alimentos é também culturalmente construído. O humor, entretanto, tem um papel bastante importante nisso, estando entre os fatores da fome psicológica.
A dieta pode influenciar no humor.
Outros autores acreditam que o descontentamento com a imagem corporal pode levar o indivíduo a reduzir o consumo de doces e gorduras, estimulando-o, assim, a adotar comportamentos alimentares mais saudáveis (SILVA; RIBEIRO; CARDOSO, 2008). O fato de estar acima do peso ativaria um mecanismo de autorregulação, que o faria controlar seus impulsos e ter uma alimentação mais equilibrada para obter mais saúde e um peso desejável. Entretanto, é importante lembrar que, em muitas situações, não basta a força de vontade para lidar com o sobrepeso e a obesidade.
Exemplo de alimento processado.
As mídias influenciam bastante as nossas escolhas alimentares: impõem padrões de beleza, nos atraem para um produto ultraprocessado com um manto de tradição e saúde, nos oferecem produtos deliciosos e baratos em embalagens vibrantes, mas que não trazem nenhum aporte nutricional e podem ser danosos para a saúde.
Também há os digital influencers, que nos oferecem dicas de saúde e beleza nas redes sociais. Somos afetados de forma inconsciente pelas mais diferentes mídias.
[...] a publicidade utiliza uma série de recursos que permitem transferir para os alimentos informações subliminares, reconhecidas no subconsciente e que são associados ao desejo de querer ser dos consumidores. Podem expressar virilidade, força, leveza, modernidade, associando a comida a uma nova esfera de situações psicoafetivas.
(FONSECA et al., 2011, p. 3854-3855, grifos dos autores)
Quantas vezes vemos publicidades de comidas ou molhos prontos sendo legitimados por uma vovozinha que parece ser a nossa? E aquela propaganda de refrigerante que dá água na boca? E a dieta indicada pela blogueira da moda?
Influências socioculturais
Identidade cultural
Sem dúvida a história individual é importante nesse contexto, mas a cultura também é um dos fatores que influenciam as escolhas alimentares.
Gostamos de comer aquilo que faz parte dos nossos hábitos alimentares, comidas com as quais temos familiaridade, ou seja, aqueles alimentos e preparações que são comumente consumidos dentro do grupo cultural ao qual pertencemos. A alimentação é uma importante fonte de construção da identidade cultural dos indivíduos.
O pertencimento a um dado grupo é feito também por aquilo que se come; entretanto, as escolhas oscilam entre a neofobia e neofilia, ambas influenciando as escolhas alimentares.
De acordo com Fischler (1990), nós somos onívoros e temos liberdade de escolha, mas ela é limitada pelo que aquela cultura define como fazendo parte do que é culturalmente comestível.
Esse movimento contraditório dos diferentes aspectos culturais não acontece somente na alimentação. Há sempre um conflito entre a tradição e a inovação. Sobre isso, podemos sinalizar que, quando falamos em tradição, é porque aquele hábito já está em transformação. Falamos em casamento tradicional porque as formas de casamento se modificaram. Ainda não falamos da tradição do almoço, porque isso ainda é comum e frequente, mesmo se a comensalidade está em transformação.
Até o tamanho das porções e o ritmo do consumo de alimentos é influenciado pela cultura. Silva, Ribeiro e Cardoso (2008) mencionam estudos nos quais se observou que, enquanto estudantes franceses comem pouco, sobretudo nas refeições principais, os estudantes alemães e americanos comem uma quantidade maior de comida e fazem várias pequenas refeições durante o dia.
Comentário
A conveniência em torno dos alimentos também importa. A praticidade na hora do preparo, diante de uma vida corrida, e o fato de que o indivíduo tenha conhecimento das técnicas de preparo do alimento vão influenciar suas escolhas.
Na contemporaneidade, a tendência à alimentação fora de casa ou à aquisição de produtos prontos congelados traduz um afastamento da cozinha e dos modos de preparo tradicionais (LIMA, 2015). Com efeito, a praticidade é o principal motivo para a compra de produtos industrializados. Dessa forma, o comedor vai ficando cada vez mais distante da relação entre alimentos e natureza, separando-se igualmente de suas conexões identitárias relativas à alimentação.
Andrade e Bosi (2003) apontam que, em um contexto de globalização:
A massificação e a importação de modelos culturais hegemônicos destituem o homem do sentimento de pertença a grupos humanos e invadem seu universo simbólico, expropriando o centro de referência cultural balizador do psiquismo humano.
(ANDRADE; BOSI, 2003, p. 117)
Distanciamo-nos de nossas tradições, mas também do próprio alimento. Quando a comida se torna um bem de consumo, já não interessa sua origem, sua composição, nem como foi feita. Interessa apenas seu custo-benefício como mercadoria (LIMA, 2015).
O aumento do consumo de produtos industrializados ricos em açúcar, em gordura e em sódio pode trazer riscos para a saúde, estando também na origem do aumento da prevalência de doenças crônicas não transmissíveis (DCNT): obesidade, diabetes, hipertensão, doenças do coração e certos tipos de câncer.
Alimentos industrializados.
O consumo de alimentos ultraprocessados, que são pobres em fibras e têm uma composição nutricional inadequada, favorece esses tipos de doenças, além de provocar deficiências nutricionais (BRASIL, 2014).
Mesmo a comensalidade é afetada pelo ritmo frenético da vida nos centros urbanos, pois não temos mais tempo para nos sentarmos à mesa com nossos familiares. Isso está gerando maior individualização alimentar, ao mesmo tempo que enfraquece o poder de sociabilidade e de agregação das refeições tomadas em conjunto (LIMA, 2015).
A necessidade de comer fora de casa também estimula essa individualização. Isso atribui ao indivíduo a liberdade de comer longe das regras impostas pelas famílias e pelos papéis tradicionais atribuídos aos gêneros masculino e feminino, sendo, assim, importante nas escolhas alimentares (JOMORI et al., 2008b).
Alimentos saudáveis.
Na contramão dessa tendência, porém, está o movimento slow-food, que prega o consumo de alimentos mais saudáveis e sustentáveis, com consumidores mais conscientes e que tenham mais tempo para saboreá-los (MADER, 2006).
Há também aumento no número de pessoas que apresentam preocupações éticas em relação aos alimentos que estão consumindo. Elas levam em consideração as questões ambientais e de sustentabilidade, assim como o respeito aos direitos humanos no processo de produção (SILVA; RIBEIRO; CARDOSO, 2008).
O consumo de produtos veganos e vegetarianos também tem aumentado no Brasil e no mundo. Isso se deve ao fato de que vegetarianos, veganos e mesmo pessoas que não se enquadram nessas categorias estão cada vez mais preocupados com questões relacionadas à sua saúde, ao meio ambiente e ao bem-estar animal, que influenciam suas escolhas alimentares (RÉVILLION et al., 2020).Cresce o consumo de produtos vegetarianos.
Os flexitarianos querem diminuir a ingestão de produtos de origem animal, mas não parar totalmente de consumi-los.
Nessa busca por uma alimentação mais saudável, que também é uma tendência da alimentação contemporânea, as preocupações com o controle do peso, mas também com a quantidade de aditivos químicos e agrotóxicos nos alimentos, vão estimular a busca por uma comida mais natural (JOMORI et al., 2008a), orgânica e de produção local.
Em função do crescente comprometimento dos consumidores com a questão ambiental, o marketing ecológico demonstrou ser necessário em termos de competitividade (RANDONS.; Battistella; Grohmann, 2016). Os consumidores mais conscientes darão preferência às empresas que se mostrem mais comprometidas com a questão socioambiental.
As escolhas alimentares também diferem de acordo com o dia da semana, sendo que no fim de semana existe maior liberdade na escolha, maior valorização do sabor e maior flexibilidade nos horários (BARBOSA, 2007). Muitas vezes, é o momento em que a família sai junta para comer fora de casa, ou quando os pratos tradicionais da família se repetem no almoço de domingo. As comidas de festa, de momentos especiais de comemoração também variam nesse sentido. Os mais diferentes grupos aos quais o indivíduo pertence, incluindo seus amigos, também irão influenciar suas escolhas alimentares.
Influências socieconômicas
Determinantes
Os determinantes socioeconômicos são também fundamentais nas escolhas alimentares. Obviamente a renda é muito importante; entretanto, percebeu-se que a maioria dos consumidores considera altos os preços dos itens alimentares, independentemente da sua renda (JOMORI et al., 2008a).
Estima et al. (2009) comentam que, em situação de baixa renda, existe pouca variedade de itens alimentares e a dieta se torna enfadonha e repetitiva. Por outro lado, os lugares onde vivem esses indivíduos muitas vezes não contam com lojas onde se possa comprar produtos frescos. A falta de opções nesse sentido também termina por influenciar as escolhas alimentares (JOMORI et al., 2008a).
Na Pesquisa de Orçamento Familiar (POF) de 2017-2018, verificou-se que entre os indivíduos de menor renda, os gastos com alimentação representam o maior percentual do orçamento familiar, chegando a 22%, enquanto entre os de rendimentos mais alto, esse percentual cai a 7,6% (IBGE, 2019).
A diferença no orçamento destinado à alimentação em diferentes faixas de renda.
A escolaridade também influencia a oferta de opções alimentares. Nas casas das famílias com menor escolaridade, que receberam menos informações nutricionais e normalmente têm menor renda, existe uma oferta menor de alimentos saudáveis, sendo que as mães dessa categoria consomem mais doces e produtos gordurosos. Quanto maior a renda e a escolaridade do chefe de família, mais variada e de melhor qualidade é a alimentação.
Silva, Ribeiro e Cardoso (2008) citam um estudo feito com porteiros e agentes de limpeza, e dentistas, no qual se obteve a seguinte constatação:
Porteiros e agentes de limpeza
Tinham como motivação para suas compras de alimentos o preço, a praticidade, o alívio do estresse e o fato de o alimento lhes ser familiar, ou seja, de eles estarem acostumados a comer esses itens desde criança.
Dentistas
Tinham como determinantes nas suas escolhas o fato de os alimentos não conterem muitos aditivos e terem sido produzidos em condições de respeito ao meio ambiente e aos direitos humanos, como, por exemplo, as condições de trabalho dos produtores.
Medina et al. (2019) constataram que os menos favorecidos, com menor renda e escolaridade, contam com uma dieta com muitas calorias e pouco valor nutricional. Segundo os autores, “esses segmentos tendem a optar por alimentos menos saudáveis em virtude do preço, da saciedade que propiciam, da facilidade de acesso e do nível de conhecimento que possuem sobre o impacto à saúde atribuído à inclusão desses itens na alimentação” (MEDINA et al., 2019, p. 2).
Entretanto, em grandes centros urbanos no Brasil, Barbosa (2007) verificou que as informações nutricionais independem da renda, contradizendo o estudo citado anteriormente.
Em sua enquete, a autora relata que “independentemente da variável social considerada, as pessoas são capazes de citar com clareza que alimentos são considerados saudáveis, da mesma forma que os vilões dos cardápios” (BARBOSA, 2007, p. 110).
As pessoas detêm esse conhecimento e relatam fazer um certo malabarismo entre aquilo que gostam, o que é acessível, o que é mais prático e o que seria mais saudável, sendo esses fatores importantes na determinação de suas escolhas alimentares.
A relação renda X hábitos alimentares.
Saiba mais
Desde a abertura da economia para produtos importados, sobretudo após o fim do governo militar nos anos 1980, as opções de alimentos com poucas fibras e muitos carboidratos simples aumentaram bastante nas últimas décadas, afetando as escolhas alimentares. Cresceu o consumo de pães, biscoitos e refrigerantes, mesmo se naquele momento também aumentou o consumo de carnes e laticínios. Recentemente, conforme resultados da POF, constatou-se que o consumo de laticínios vem diminuindo (IBGE, 2019).
Essas transformações nas estruturas tradicionais de alimentação representam uma ocidentalização da dieta, característica dos países em desenvolvimento. A instalação de redes de fast-food, assim como a de multinacionais do setor alimentar, a importação de produtos em um contexto de globalização e o marketing desses produtos têm alterado as opções de escolha e os regimes alimentares locais.
Não podemos deixar de comentar o fato de a alimentação manifestar também uma forma de prestígio e distinção social. Isso também vai afetar as escolhas alimentares dos mais ricos, que fazem questão de ostentar sua riqueza em função do que comem.
Indicativo de luxo e sofisticação, o papel da comida também é manifestar status. O que muda são os porquês e as formas de distinção ao longo do tempo.
(NAZULAY, 2005, p. 67)
A produção de alimentos é outro fator que interfere nas escolhas alimentares, pois eles podem não estar disponíveis no mercado ou se tornarem muito caros. A sazonalidade também é importante, pois frutas, legumes e verduras, quando estão na sua época, são mais baratos, saborosos e nutritivos.
A escassez de alimentos interfere no preço e reduz o consumo de alguns deles.
Você sabia que a distribuição de renda também influência no consumo alimentar?
Em um artigo sobre desigualdade social e alimentação, Medina et al. (2019) constatam que existe uma disparidade de consumo entre os diferentes extratos sociais devido à desigualdade na distribuição de renda, infelizmente uma característica perversa da sociedade brasileira em pleno século XXI. Essa pesquisa trabalhou dados de uma amostra de mais 60 mil pessoas, provenientes da Pesquisa Nacional de Saúde de 2013.
O estudo foi feito considerando também o critério raça/cor e concluiu que, entre os grupos estudados e considerando as variáveis contempladas, o grupo que conta com a alimentação mais saudável são as mulheres brancas, que possuem maior renda e escolaridade. Esses grupos mais abastados consomem mais frutas, legumes e verduras, e alimentos com pouca gordura. Todavia, paradoxalmente, esses são também os grupos nos quais se encontra um alto consumo de doces, sanduíches, salgados e pizzas, alimentos que não são saudáveis.
Podemos ver assim a complexidade das escolhas alimentares, multideterminada e que não é fruto, obrigatoriamente, de uma reflexão racional. As motivações para as escolhas alimentares diferem bastante entre os indivíduos, segundo seu pertencimento a um determinado grupo socioeconômico e com diferentes níveis de escolaridade.

Mais conteúdos dessa disciplina