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GQI 114 ENSINO DE QUÍMICA I 2018/01 PROF. RITA SUART ENSINO DE QUÍMICA PARA A FORMAÇÃO CIDADÃ Texto elaborado por Rita Suart para a disciplina GQI 114 O construtivismo Processos de ensino de Ciências, ou mais especificamente de Química, aproximadamente até a década de setenta, não se atentavam a algumas dificuldades encontradas pelos alunos no processo de aprendizagem. A imagem tradicional do ensino como transmissão de conhecimentos privilegiava a amplitude e a profundidade do conhecimento relacionando-as diretamente com a qualidade da aprendizagem dos estudantes. Assim, para ensinar, bastava o professor saber o conteúdo a ser ensinado e algumas "técnicas pedagógicas". Na década de oitenta, começam a ser desenvolvidas pesquisas sobre as ideias dos alunos. Estas pesquisas defendiam que o conhecimento seria construído pelo indivíduo pela interação entre elementos internos e externos na mente do aprendiz. Propostas de ensino pautadas nestas concepções são conhecidas sob o rótulo de “construtivismo”. As teorias que se baseiam no construtivismo concordam que o conhecimento se constitui progressivamente das interações entre o sujeito e o objeto. Assim, a perspectiva construtivista propõe que o indivíduo já não é mais considerado uma folha em branco, pelo contrário, suas ideias prévias são o ponto de partida para o desenvolvimento do conhecimento. O aluno é o agente ativo do processo de construção do conhecimento e o professor assume o papel de mediador entre os novos conceitos e os conceitos já existentes na mente do aprendiz. Assim, os alunos precisam estar inseridos em um ambiente onde possam utilizar suas ideias em outras situações, percebendo que o novo conhecimento é importante e útil, e que suas ideias anteriores precisarão algumas vezes ser (re) interpretadas com o auxílio dos novos conhecimentos. A partir das características apresentadas, percebe-se na abordagem construtivista, que apesar de o aluno ser o agente responsável pela construção do conhecimento, o papel do professor é de extrema importância para intermediar essa construção, uma vez que muitos alunos precisam desta intervenção para alcançar respostas adequadas para as situações problemas. Assim, o professor propõe situações para o processo de ensino e aprendizagem de forma a procurar alcançar a aprendizagem do aluno. As ideias Prévias A formação da estrutura cognitiva depende do modo como o indivíduo percebe os aspectos do mundo pessoal, físico e social. Por meio da aprendizagem, produzem-se alterações da estrutura cognitiva, ou compreensão interna da situação e de seu significado. Isto pressupõe a origem de novos conceitos interiorizados, novas estruturas mentais, novas atitudes com as quais os alunos poderão analisar e solucionar problemas. Existe, portanto, um processo de reflexão, já que se trata da incorporação consciente e responsável de fatos, conceitos, situações e experiências. No entanto, se o indivíduo não tiver intenção de associar o novo conhecimento, ou se ocorrer pouca interação com a estrutura de conceitos já existentes, poderá ocorrer a memorização mecânica ou repetitiva de dados, fatos ou conceitos, pois a nova informação permanecerá isolada do restante do corpo de seus conhecimentos. Neste caso, a nova informação é armazenada de forma arbitrária, não ocorrendo interação com aquelas já presentes. A potencialização da estrutura cognitiva do aluno facilita a aquisição e a retenção de novos conhecimentos. Se o novo material entra em forte conflito com a estrutura preexistente ou, se não se relacionar com ela, a informação não pode ser incorporada ou retida. Portanto, o reconhecimento das ideias que os estudantes trazem para a sala de aula,ou seja, as ideias, ou concepções prévias, se torna de fundamental importância para que se estabeleçam ligações entre o que se pretende ensinar e o que o aluno já conhece. Essas ideias podem ser distintas daquelas que o professor pretende ensinar e, como geralmente fazem sentido aos estudantes, apresentam-se fortemente resistentes a mudanças, comprometendo, muitas vezes, a aprendizagem das novas ideias. A literatura apresenta inúmeras denominações atribuídas às ideias dos alunos, tais como: pré-conceitos, conceitos de senso comum, ideias intuitivas, conceitos espontâneos, concepções alternativas, pré-concepções, entre outras. Para algumas destas designações, tais como, “ideias erradas” ou “misconceptions” são atribuídas conotações negativas, uma vez que são vistas como imperfeições do sistema cognitivo, tidas como respostas equivocadas ou sem sentido. Outras apresentam conotações positivas, tais como: “concepções alternativas”, pois são apreciadas não como imperfeições cognitivas, mas como explicações pessoais, com valor positivo no processo de construção ativa do pensamento. Essas ideias podem surgir pela influência da mídia, influência da linguagem cotidiana, erros conceituais em livros didáticos, ideias alternativas dos professores e utilização de estratégias de ensino pouco adequadas para favorecer a aprendizagem significativa. As misconceptions podem dificultar ou impedir a aprendizagem dos conceitos, uma vez que apresentam-se estáveis, tenazes e resistentes na estrutura cognitiva do aprendiz, podendo atuar como um obstáculo epistemológico no processo de aprendizagem. No entanto, para os alunos, são úteis e coerentes, satisfazendo seus pontos de vista. Mas, a ausência de tais ideias também pode consistir um fator limitador na construção de novas ideias. Dado que os conhecimentos prévios são muito estáveis, estes são ativados com bastante facilidade, uma vez que são utilizados repetitivamente no cotidiano dos indivíduos, sendo difíceis de serem substituídos. Assim, conhecimentos prévios podem coexistir com os novos conhecimentos adquiridos, ocorrendo uma divisão desses dois tipos de conhecimentos, não se estabelecendo relações entre eles, no campo teórico ou no campo de aplicação. Se há integração entre ambos, o sistema cognitivo se enriquece e se reestrutura, ocorrendo interação entre o campo teórico e de aplicação. Ainda, ao tentar predizer e controlar os acontecimentos, o aluno passa a atribuir um efeito a uma determinada causa. Abandonar uma ideia em que acredita é supor perder o controle da situação, o que pode ser uma das razões para a resistência dos alunos em apreender o novo conceito, principalmente, se a nova teoria não dá conta de explicar, já que as suas ideais pré-existentes, dão conta de explicá-las. Para superar as ideias alternativas dos alunos, algumas considerações são necessárias: · Insatisfação com as concepções existentes - O sujeito deve perceber que seus conceitos não são suficientes para resolver o problema. · A nova concepção deverá ser inteligível - O novo conceito deve ser minimamente entendido. · Uma nova conceitualização deve ser inicialmente plausível - O novo conceito deve ser capaz de resolver os problemas, anteriormente gerados e também se adaptar a outros conhecimentos, caso contrário não será aceito. · Um novo conceito deve sugerir a possibilidade de um programa de pesquisa profícuo · O conceito deve ser potencialmente ampliado para explorar novas áreas de pesquisa e tecnologia (Posner et al. 1982). Os estudantes ainda podem apresentar erros conceituais. Mas, qual a diferença entre erro conceitual e ideias/concepções alternativas? Erros conceituais: respostas contraditórias ao conhecimento científico Concepções alternativas: ideias que levam ao erro conceitual Neste sentido, quando as ideias prévias e os novos conhecimentos são incompatíveis, o novo conceito pode se tornar cada vez mais estruturado, podendo chegar a extinguir o conhecimento prévio por falta e ativação. No entanto, na coexistência de ambos os conceitos pode ocorrer o domínio do conhecimento prévio sobre o novo conhecimento, e esse último, uma vez não reforçado, poderá ser extinto, o que justifica o fracasso do ensino de alguns conceitos científicos. Assim, considerando que o ensino deva estar baseado no reconhecimento das ideias alternativas dosalunos, se essas concepções não forem reconhecidas, podem tornar-se cada mais elaboradas e estáveis, e dificultarem a apropriação de conceitos científicos. Referências Posner, G.J., Strike, K.A.; Hewson, P.W.; Gertzog, W.A. (1982); Accomodation of a Scientific Conception: Toward a Theory of Conceptual Change. Science Education, 66(2), 211-227.