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GABRIEL TRENTIM GOMES FARIA - TXXII 1 INTRODUÇÃO Miomas ou leiomiomas são neoplasias benignas do músculo liso uterino, sendo mais comuns no miométrio, mas também podendo estar localizados na camada submucosa, serosa do útero e até mesmo no colo uterino. Existem descrições de miomas nos ligamentos, principalmente no ligamento largo do útero e paraovariano. São compostos por colágeno, fibronectina e proteoglicanos. Cerca de 40% das mulheres em idade fértil apresentam miomas, podendo chegar a 80% de diagnósticos positivos na ultrassonografia. Apesar de serem a PRINCIPAL CAUSA DE HISTERECTOMIA NO MUNDO, muitas vezes a cirurgia não é a melhor opção de tratamento, principalmente quando as pacientes são assintomáticas. Nesses casos, a conduta conservadora, seja por meio de acompanhamento clínico ou tratamento medicamentoso, costuma ser adotada. CARACTERÍSTICAS REDONDOS Os miomas tendem a ser tumores arredondados, o que significa que eles têm uma forma circular ou oval quando observados em exames de imagem como ultrassonografia. BRANCOS NACARADOS Os miomas são geralmente de cor branca nacarada, o que significa que possuem uma coloração semelhante à pérola. FIRMES Os miomas são geralmente descritos como tumores firmes, o que significa que têm uma consistência sólida ao toque. MIOMATOSE UTERINA GINECOLOGIA MIOMATOSE UTERINA GINECOLOGIA GABRIEL TRENTIM GOMES FARIA - TXXII 2 ELÁSTICOS Apesar de serem firmes, os miomas também podem ser elásticos, o que significa que podem se deformar ou distender sob pressão e depois voltar à sua forma original. o Padrão espiralado: essa característica é descrita como uma aparência de linhas curvas ou espirais no tecido do mioma. ▪ Os miomas com padrão espiralado geralmente estão autonomamente isolados do miométrio circundante por uma fina camada de tecido conjuntivo externo. Diante disso é produzido um plano de clivagem com o miométrio, facilitando sua exérese Na imagem acima mostra-se um corte longitudinal do útero após uma histerectomia mostrando esse mioma intramural então presente na cavidade miometrial e a diferenciação do tecido miometrial normal (a esquerda) com um bom suprimento sanguíneo para esse tecido arredondado, espiralado, branco nacarado. É possível visualizar a firmeza do tecido, bem sólido. HISTOLOGIA A histologia do leiomioma uterino mostra células alongadas do músculo liso organizadas em feixes, com origem monoclonal a partir de células-tronco do miométrio. Essas células apresentam RARA ATIVIDADE MITÓTICA, o que as distingue do LEIOMIOSSARCOMA, que possui grande atividade mitótica. MIOMATOSE UTERINA GINECOLOGIA GABRIEL TRENTIM GOMES FARIA - TXXII 3 CITOGENÉTICA Na citogenética, cada leiomioma tem origem a partir de um único miócito progenitor, mostrando que cada tumor tem uma origem específica, como por exemplo, o útero polimiomatoso gerado por um único miócito progenitor. CLASSIFICAÇÃO A classificação dos miomas uterinos é essencial para compreender sua relação com a anatomia do útero e orientar o tratamento adequado. A Federação Internacional de Ginecologia e Obstetrícia (FIGO) desenvolveu um sistema de classificação que considera a localização dos miomas. CERVICAL Miomas localizados no colo do útero SUBMUCOSO Estão na camada endometrial, próxima à cavidade uterina. Esses miomas podem ser MAIS SINTOMÁTICOS. INTRAMURAL Miomas que ocupam o espaço miometrial (a camada muscular do útero). SUBSEROSO Localizados na camada mais externa do útero, próxima à serosa. PEDICULADO Esses miomas têm uma haste de comunicação, principalmente para o vaso sanguíneo que fornece sangue à nodulação (ou “cavidade mãe”). ➢ Intracavitário: Miomas que estão completamente dentro da cavidade uterina. ➢ Extracavitário: Miomas que se estendem para fora da cavidade uterina, afetando outras estruturas. MIOMATOSE UTERINA GINECOLOGIA GABRIEL TRENTIM GOMES FARIA - TXXII 4 Se for um mioma que estiver comprometendo duas localizações, quando faz a medida desse mioma pelo exame de imagem, principalmente pela ultrassonografia a gente passa uma linha média e aonde esse mioma estiver com seu maior tamanho presente é a localização que vamos determinar EPIDEMIOLOGIA E FATORES DE RISCO A miomatose uterina é uma condição prevalente em MULHERES NA PERIMENOPAUSA, afetando 50% delas. As mulheres negras têm uma incidência maior, chegando a 80% em comparação com 70% das mulheres brancas. Os sintomas geralmente surgem a partir da 3ª e 4ª décadas de vida, porém, apenas 20% das portadoras apresentam sintomas evidentes. GRUPOS DE RISCO NULÍPARAS ➢ O tempo prolongado em amenorreia após o parto resulta em menor exposição aos hormônios estrógeno e progesterona ao longo da vida. OBESAS ➢ Na obesidade, a diminuição da transformação dos androgênios em estrogênios resulta em uma menor conversão do estradiol em estrona, que é um estrogênio menos ativo. Isso leva a um aumento da quantidade de estradiol circulante, o que promove um maior desenvolvimento celular dos miomas devido à interação com os receptores de progesterona e estrogênio presentes nessas nodulações. Assim, a presença de altos níveis de estradiol ativo pode estimular um crescimento maior dos miomas em mulheres obesas. RAÇA NEGRA ➢ Mulheres de raça negra têm maior tendencia à produção de miomas, possivelmente relacionada a aspectos citogenéticos. HISTÓRIA FAMILIAR DE MIOMATOSE ➢ Hereditariedade é considerado um fator de risco ACO MIOMATOSE UTERINA GINECOLOGIA GABRIEL TRENTIM GOMES FARIA - TXXII 5 ➢ O uso de anticoncepcionais orais combinados ainda é incerto, pois estudos observacionais apresentaram resultados conflitantes, podendo tanto favorecer o desenvolvimento de miomas quanto oferecer proteção. “FATORES PROTETORES” TABAGISMO ➢ O tabagismo pode diminuir a proliferação celular devido à ação da nicotina que reduz o estrogênio ativo no organismo. USO DE ANTICONCEPCIONAIS ORAIS COMBINADOS ➢ Os estudos observacionais indicam que eles podem influenciar na regulação hormonal, especialmente dos estrógenos e progesteronas, que são essenciais para a formação e crescimento dos miomas DEPENDENTES DE HORMÔNIOS OVARIANOS – ESTRÓGENOS E PROGESTERONAS ➢ Algumas mulheres apresentam maior densidade de receptores estrogênicos e baixa atividade da enzima 17-hidroxidesidrogenase, o que pode contribuir para uma menor conversão de estradiol em estrona. Níveis mais altos da aromatase citocromo P450, enzima que converte estradiol em estrona, também podem atuar como fatores protetores ao regular a proliferação celular dos miomas e mediar fatores de crescimento. QUADRO CLÍNICO A maioria das pessoas com miomas uterinos são assintomáticas, sendo que muitas vezes eles são descobertos durante exames médicos. No entanto, alguns sintomas podem estar presentes, como sangramentos anormais, também conhecidos como menorragia, causados tanto pela cavidade endometrial como pela cavidade miometrial. Miomas subserosos, por outro lado, RARAMENTE CAUSAM SANGRAMENTOS INTENSOS, mas podem provocar dor localizada, devido ao contato com outros órgãos da pelve. Além disso, miomas localizados na parede anterior do útero podem comprimir a bexiga, levando a um aumento na frequência urinária. Em casos mais graves, miomas gigantes podem causar sensação de abaulamento e peso na região pélvica, devido ao seu tamanho e localização. O desconforto em baixo ventre e dismenorreia, sendo esta última mais intensa em casos de alteração da cavidade miometrial, que gera uma alteração na contratilidade uterina. A DOR AGUDA pode estar presente em casos de LEIOMIOMA DEGENERATIVO OU MIOMA PARIDO. O mioma parido refere-se a pediculados intracavitários que, se não possuírem suprimento sanguíneo adequado, podem gerar necrose, calcificação local e liberação de fatores MIOMATOSEUTERINA GINECOLOGIA GABRIEL TRENTIM GOMES FARIA - TXXII 6 inflamatórios, resultando em crises de dores intensas e agudas. É importante diferenciar esses quadros de dor de uma endometrite, já que a passagem de um mioma parido pelo colo do útero durante a dilatação cervical pode causar uma dor significativa devido à liberação de fatores inflamatórios no local. SUBSEROSOS Miomas subserosos podem causar sintomas compressivos e distorção anatômica de órgãos adjacentes. Eles podem gerar sintomas compressivos retais, como sensação de evacuação iminente e, em casos mais graves, fezes em fita devido à compressão do reto por um mioma muito grande. INTRAMURAIS Os miomas intramurais podem causar sangramentos irregulares e dismenorreia devido às distorções anatômicas que ocorrem na musculatura lisa do útero. Essas distorções levam a uma maior quantidade de endométrio na cavidade endometrial, resultando em um aumento da superfície e do sangramento. A dismenorreia, por sua vez, está relacionada ao aumento do fator inflamatório local devido à maior quantidade de tecido endometrial, o que leva a uma maior liberação de prostaglandina e consequente aumento do engurgitamento de vasos, resultando em mais sangramento e dor. SUBMUCOSOS Os miomas submucosos são mais sintomáticos, causando sangramentos irregulares devido à alteração da cavidade endometrial. Além disso, sua localização pode levar à infertilidade ou dificuldade reprodutiva. Isso ocorre porque a presença do mioma e sua localização dentro da mucosa podem gerar irregularidades na liberação de fatores inflamatórios, citocinas e mediadores de crescimento. Isso resulta em alterações na motilidade e contratilidade da mucosa, dificultando a chegada do espermatozoide até a tuba uterina para a fecundação. No caso de um mioma localizado no fundo uterino, pode haver dificuldade na implantação do blastocisto, contribuindo para a infertilidade. Acima há uma imagem histeroscópica onde é possível ver os dois osteos tubários e na parede anterior a presença do mioma submucoso. Essa região é uma localização muito frequente na implantação de blastocisto. Portanto esse seria um mioma altamente MIOMATOSE UTERINA GINECOLOGIA GABRIEL TRENTIM GOMES FARIA - TXXII 7 suspeito para paciente que tenha dificuldade reprodutiva e tenha presença da miomatose. Sangramento é o principal sintoma, por quê? ➢ Aumento da superfície intracavitária ➢ Modificação contratilidade uterina e vascular ➢ Ingurgitamento dos vasos ▪ Muito mais frequente das vênulas INVESTIGAÇÃO DIAGNÓSTICA A investigação diagnóstica de miomas uterinos inclui a anamnese, o exame físico e exames de imagem. Na anamnese, é importante considerar a história clínica e epidemiologia do paciente. No exame físico, a palpação abdominal pode revelar a presença de uma massa na região pélvica, enquanto o exame ginecológico com palpação uterina bimanual pode avaliar o tamanho, consistência e superfície do útero. Para a realização de exames de imagem, os mais comuns são a ultrassonografia pélvica e a ULTRASSONOGRAFIA TRANSVAGINAL, que apresenta alta sensibilidade (95-100%) e baixo custo. Em pacientes sem vida sexual ativa, a ultrassonografia transvaginal é INELEGÍVEL. Em casos de dúvidas na visualização do mioma durante a ultrassonografia transvaginal, ou se ele estiver muito próximo da cavidade endometrial, pode ser necessário realizar uma histerossonografia. Outras opções de exames de imagem incluem a histeroscopia, a tomografia computadorizada (TAC) e a ressonância magnética (RNM), sendo a RNM preferida para avaliação de órgãos pélvicos em relação à TAC. DISFUNÇÕES REPRODUTIVAS Disfunções reprodutivas podem afetar a fertilidade de 5 a 10% dos casais inférteis, sendo responsáveis por 2 a 3% dos casos. Os miomas submucosos são uma das causas, que podem ser tratados com ressecção do tumor. Após o tratamento, é necessário avaliar se é mais indicado continuar com reprodução assistida ou buscar a natalidade espontânea. Durante a gestação, os miomas geralmente crescem no primeiro trimestre devido à quantidade de progesterona circulante, podendo causar sintomas. Além disso, aumentam as chances de complicações como descolamento prematuro de placenta (DPP), sangramento no primeiro trimestre, trabalho de parto distócico e apresentações fetais anômalas (maior chance de estar côrmico ou pélvico), aumentando a probabilidade de cesariana. MIOMATOSE UTERINA GINECOLOGIA GABRIEL TRENTIM GOMES FARIA - TXXII 8 TRATAMENTO ASSINTOMÁTICAS Apenas acompanhamento!!! (nível A de evidência) ➢ Ultrassonografia para as pacientes elegíveis a cada 90 dias. Se NÃO ocorrer um crescimento de 30% do volume inicial durante esse período de tempo, não precisa teoricamente se preocupar. Se houver o crescimento o tratamento deve partir para a ressecção (suspeita de malignidade) ➢ É muito complicado fazer biópsia de mioma, pois se for um mioma intrauterino ou intracavitário corre-se o risco de espalhar a célula cancerígena por toda a pelve. SINTOMÁTICAS Avaliar a idade da paciente, desejo de gestação, quais sintomas provocados e suas intensidades, tamanho, localização. PROGESTÁGENOS ➢ Primeira escolha – baixo custo, fácil acesso. ➢ Corrigem sangramento uterino disfuncional (SUD) ➢ Acetato de medroxiprogesterona 150mg – IM – trimestral ▪ Mais utilizado no SUS ➢ Desogestrel 75mg – contínuo ANTI-INFLAMATÓRIOS NÃO ESTEROIDAIS ➢ Sem evidência cientifica DANAZOL E GESTRINONA ➢ Gestrinona reduz sangramentos e volume uterino, mas possui muitos efeitos androgênicos MIFEPRISTONE ➢ Não disponível no Brasil ➢ Antiprogesterona sintética ➢ Reduz aproximadamente 50% do volume uterino SERM´S E SPRM´S ➢ Sem evidências científicas ANÁLOGOS GNRH ➢ Hipoestrogenismo ➢ Redução do volume dos miomas ➢ Utilização pré-cirúrgica ➢ Uso máximo por 6 meses ➢ Redução de sangramentos pré e transoperatório DIU DE LEVONOGESTREL ➢ Diminuição apenas do sangramento ➢ Mioma com distorção da cavidade é contraindicado para seu uso MIOMATOSE UTERINA GINECOLOGIA GABRIEL TRENTIM GOMES FARIA - TXXII 9 TRATAMENTO CIRÚRGICO O tratamento cirúrgico definitivo para a miomatose é a HISTERECTOMIA, sendo a principal indicação quando os sintomas persistem e não respondem ao tratamento clínico. A histerectomia profilática não é recomendada. HISTERECTOMIA ➢ A histerectomia pode ser total ou subtotal, realizada por vias abdominais, vaginais ou laparoscópicas. MIOMECTOMIA ➢ Para mulheres que desejam manter a fertilidade, a miomectomia pode ser indicada, porém com alta recorrência de miomas, que pode chegar a 30%. As vias para a miomectomia incluem laparotomia, laparoscópica e histeroscópica. EMBOLIZAÇÃO ➢ Outra opção de tratamento é a embolização, que consiste na oclusão das artérias uterinas e seus ramos. A embolização tem melhores taxas de sucesso quando comparada com a oclusão laparoscópica das artérias uterinas, porém pode levar a insuficiência ovariana temporária.