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Fundação Centro de Ciências e Educação a Distância do Estado do Rio de Janeiro Centro de Educação Superior a Distância do Estado do Rio de Janeiro UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE Curso de Licenciatura em Letras - UFF / CEDERJ Disciplina: EAD12038 - INTRODUÇÃO À SEMÂNTICA AP 1 - 2024/ 1 - Gabarito Instruções: Caro aluno, cara aluna, • Concentre-se durante a realização desta avaliação. Trabalhe com calma, reflita bem antes de responder às questões. Controle o tempo a ser usado para responder a cada pergunta. Faça um rascunho com suas ideias, leia e revise o que escreveu e, quando achar que sua resposta está suficientemente fundamentada, passe-a a limpo no caderno de resposta. Veja bem: esta prova NÃO tem como objetivo verificar se você decorou conceitos e/ou definições presentes nas aulas. Na verdade, o objetivo desta AP é criar uma oportunidade para você demonstrar sua forma de reflexão e seu domínio conceitual em relação às questões abordadas ao longo das aulas e das leituras da disciplina. • Escreva somente à caneta (azul ou preta) e com a maior legibilidade possível. Não escreva em tópicos (com frases soltas ou lista de palavras ou expressões). Escreva um texto com coesão e coerência e use em registro linguístico compatível com o trabalho acadêmico formal (norma culta). Desenvolva suas respostas exclusivamente na folha de respostas – e não no caderno de perguntas. • Tenha o cuidado de redigir as respostas com as suas próprias palavras, sem copiar literalmente o material didático ou qualquer outra fonte de estudos ou pesquisas. Lembre-se de que a cópia de materiais durante as avaliações caracteriza plágio acadêmico e será punida com nota zero. Boa prova! Texto I O Caso do Espelho (Ricardo Azevedo) Era um homem que não sabia quase nada. Morava longe, numa casinha de sapé esquecida nos cafundós da mata. Um dia, precisando ir à cidade, passou em frente a uma loja e viu um espelho pendurado do lado de fora. O homem abriu a boca. Apertou os olhos. Depois gritou, com o espelho nas mãos: – Mas o que é que o retrato de meu pai está fazendo aqui? – Isso é um espelho – explicou o dono da loja. – Não sei se é espelho ou se não é, só sei que é o retrato do meu pai. Os olhos do homem ficaram molhados. – O senhor... conheceu meu pai? – perguntou ele ao comerciante. O dono da loja sorriu. Explicou de novo. Aquilo era só um espelho comum, desses de vidro e moldura de madeira. – É não! – respondeu o outro. – Isso é o retrato do meu pai. É ele sim! Olha o rosto dele. Olha a testa. E o cabelo? E o nariz? E aquele sorriso meio sem jeito? O homem quis saber o preço. O comerciante sacudiu os ombros e vendeu o espelho, baratinho. Naquele dia, o homem que não sabia quase nada entrou em casa todo contente. Guardou cuidadoso o espelho embrulhado na gaveta da penteadeira. A mulher ficou só olhando. No outro dia, esperou o marido sair para trabalhar e correu para o quarto. Abrindo a gaveta da penteadeira, desembrulhou o espelho, olhou e deu um passo atrás. Fez o sinal-da-cruz tapando a boca com as mãos. Em seguida, guardou o objeto na gaveta e saiu chorando. – Ah, meu Deus! – gritava ela desnorteada. – É o retrato de outra mulher! Meu marido não gosta mais de mim! A outra é linda demais! Que olhos bonitos! Que cabeleira solta! Que pele macia! A diaba é mil vezes mais bonita e mais moça do que eu! Quando o homem voltou, no fim do dia, achou a casa toda desarrumada. A mulher, chorando sentada no chão, não tinha feito nem comida. – Que foi isso, mulher? – Ah, seu traidor de uma figa! Quem é aquela jararaca lá no retrato? – Que retrato? – perguntou o marido, surpreso. – Aquele mesmo que você escondeu na gaveta da penteadeira! O homem não estava entendendo nada. – Mas aquilo é o retrato do meu pai! Indignada, a mulher colocou as mãos no peito: – Cachorro sem-vergonha, miserável! Pensa que eu não sei a diferença entre um velho lazarento e uma jabiraca safada e horrorosa? A discussão fervia feito água na chaleira. – Velho lazarento coisa nenhuma! – gritou o homem, ofendido. A mãe da moça morava perto, escutou a gritaria e veio ver o que estava acontecendo. Encontrou a filha chorando feito criança que se perdeu e não consegue mais voltar para casa. – Que isso, menina? – Aquele cafajeste arranjou outra! – Ela ficou maluca – berrou o homem, de cara amarrada. – Ontem eu vi ele escondendo um pacote na gaveta lá do quarto, mãe! Hoje, depois que ele saiu, fui ver o que era. Tá lá! É o retrato de outra mulher! A boa senhora resolveu, ela mesma, verificar o tal retrato. Entrando no quarto, abriu a gaveta, desembrulhou o pacote e espiou. Arregalou os olhos. Olhou de novo. Soltou uma sonora gargalhada. – Só se for o retrato da bisavó dele! A tal fulana é a coisa mais enrugada, feia, velha, cacarenta, murcha, arruinada, desengonçada, capenga, careca, caduca, torta e desdentada que eu já vi até hoje! E completou, feliz, abraçando a filha: – Fica tranquila: a bruaca do retrato já está com os dois pés na cova! AZEVEDO, Ricardo. O Caso do Espelho. In: Nova Escola, Maio 1999., p. 28-9. Leia o seguinte trecho para responder à primeira questão: – Mas o que é que o retrato de meu pai está fazendo aqui? – Isso é um espelho – explicou o dono da loja. – Não sei se é espelho ou se não é, só sei que é o retrato do meu pai. Questão 1 – 2,0 pts Segundo o dicionário de Oxford, retrato é “a imagem de uma pessoa (real ou imaginária), reproduzida por pintura, desenho, fotografia etc”. Fotografia, por sua vez, “a arte ou processo de reproduzir imagens sobre uma superfície fotossensível (como um filme), pela ação de energia radiante, especialmente a luz”. No texto “O Caso do Espelho”, a palavra retrato pode ser substituída por fotografia, pois estão em um contexto de sinonímia. No entanto, a substituição de um termo pelo outro não é possível em todos os contextos. Explique o motivo, recorrendo ao conceito aprendido sobre sinonímia em sua resposta e fazendo uso de exemplo. Nas abordagens linguísticas contemporâneas, como em Lyons (1979), a sinonímia deixa de ser uma propriedade vocabular para ser textual. Sob esse ponto de vista, a sinonímia sempre deve ser analisada contextualmente. Como podemos notar, o retrato a que se refere o homem é uma imagem de pessoa capturada por câmera. Por isso, também pode ser chamada de fotografia nesse caso. No entanto, a substituição não é possível nos casos abaixo: a) Havia um retrato de Van Gogh em aquarela; b) Havia a fotografia de minha geladeira em meu celular. Em (a), como se trata de uma pintura, não cabe o termo fotografia, que é específico para o registro captado pela luz de uma câmera. Em (b), como se trata de um objeto, não se pode utilizar retrato, pois o termo é específico para designar uma entidade humana. Questão 2 – 2,0 pts Na aula 5, vimos o papel da sinonímia, bem como o da hiperonímia e da hiponímia, para a progressão textual. a) Extraia do texto uma passagem em que a progressão textual (no que diz respeito à retomada de um referente por anáfora) se dê por sinonímia, indique esses elementos e justifique sua resposta. (0,8) – O senhor... conheceu meu pai? – perguntou ele ao comerciante. O dono da loja sorriu. Explicou de novo. Aquilo era só um espelho comum, desses de vidro e moldura de madeira. Comerciante, segundo a definição, é o proprietário da loja (os funcionários são comerciários). Os termos são sinônimos porque são intercambiáveis entre si, sem alteração de sentido referencial. b) Extraia do texto uma passagem em que a progressão textual (no que diz respeito à retomada do referente por anáfora) se dê por hiperonímia ou hiponímia, indique esses elementos, justifique sua resposta e explique em que consiste o fenômeno (1,2) Abrindo a gaveta da penteadeira, desembrulhou oespelho, olhou e deu um passo atrás. Fez o sinal- da-cruz tapando a boca com as mãos. Em seguida, guardou o objeto na gaveta e saiu chorando. Espelho e objeto estão em relação de hiperonímia, já que “objeto” é uma categoria superordenada para “espelho” e um termo retoma o outro. Questão 3 – 3,0 pts A palavra “espelho”, empregada no texto, refere- se, segundo ao Dicionário Oxford, a um objeto de “superfície lisa e muito polida, capaz de refletir a luz e as imagens de objetos e pessoas”. Além desse significado, espelho também pode ser empregado em sentido figurado, para se referir a algo ou alguém muito semelhante (na aparência ou no comportamento) a alguém ou a algo, como na ocorrência abaixo: “O filho é o espelho da mãe. A mãe, que observa o seu filho, nele há de encontrar sempre um reflexo dela própria. “Tal mãe, tal filho!’”. Tomando-se os dois sentidos de espelho apresentados acima, podemos dizer que estamos diante de um caso de homonímia ou de polissemia? Em sua resposta, recorra aos conceitos e critérios estudados sobre o assunto, vistos na aula 06. Trata-se de um caso de polissemia, dado que conseguimos mapear uma mesma base de significado. Assim como a imagem do espelho reflete o objeto; o filho reflete o comportamento da mãe. Na aula 06, vimos que, para a homonímia, deve haver divergência semântica - “quando dois ou mais significados da mesma palavra se separam de tal modo que não haja nenhuma conexãoevidente entre eles, a polissemia dará lugar à homonímia e a unidade da palavra será destruída” (ULLMANN, 1987, p. 368). Por ex.: sole (inglês) – sola de sapato e linguado (peixe). No caso em tela, temos uma mudança de aplicação, quando alguma nuança de sentido de uma palavra distancia-se das demais de modo permanente, consideramos aquela nuança como um sentido diferente dessa mesma palavra. Por exemplo: bonito (para pessoas, animais, objetos, ações etc.). Questão 4 – 3,0 pt Na aula 07, vimos que, para Ulmann (1964), há três tipos de ambiguidade: a fonética, a gramatical e a lexical. Além desses tipos, há ainda a ambiguidade situacional, quando temos de recorrer a conhecimentos extralinguísticos para interpretar corretamente a frase. Reconheça o tipo de ambiguidade presente nos textos IV e V e justifique sua escolha. Texto IV Algumas marcas de pinga ainda trazem uma etiqueta em que se dá a idade da pessoa a partir de um jogo de palavras criado a partir de um nome e um sobrenome: Primeiro dia – Inácio Pinto Cinco anos – Jacinto Pinto Cinquenta anos – Décio Pinto Sessenta anos – Caio Pinto Etc. Você conhece mais alguma dessas “idades”? Fonte: ILARI, R. Introdução à Semântica. Brincando com as palavras. São Paulo: Contexto, 2011, p. 15. Texto V No texto IV, ambiguidade fonética, já que o humor reside na semelhança sonora entre Inácio Pinto e “e nasce o pinto”; “Jacinto Pinto” e “Já sinto o pinto”, etc. No texto V, ambiguidade situacional, porque a criança não entendeu o contexto de troca. Boa avaliação!