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C A P Í T U L O 1 8 IMUNODEFICIÊNCIAS PRIMÁRIAS O sistema imune dos animais, no seu processo de adaptação a variações ambientais, desenvolveu mecanismos adaptativos de resposta a parasitas extra- e intracelulares que são expressos pela maioria dos indivíduos de uma determinada população; no entanto, um pequeno percentual de indivíduos nasce com defeitos genéticos que levam à deficiência em algum dos aspectos da resposta imune; estas são as chamadas imunodeficiências primárias ou inatas. Muitas vezes, as imunodeficiências podem surgir ao longo da vida, através do contato com microorganismos (tais como o HIV, os tripanossomas), pelo desenvolvimento de alguns tipos de câncer (linfomas, leucemias) e por deficiências nutricionais, no caso de países subdesenvolvidos; nestes casos as imunodeficiências são denominadas secundárias ou adquiridas. Além disso, mesmo indivíduos com o sistema imune normal podem apresentar infecções persistentes causadas por alguns tipos de parasitas que evoluíram mecanismos que impedem uma resposta eficiente. O tipo de imunodeficiência primária mais comum na população humana é a relacionada com a imunidade humoral (LB), correspondendo a cerca de 60% dos casos (Figura 1). A forma mais grave de imunodeficiência – a imunodeficiência combinada de LT e LB – é a mais rara sendo encontrada em cerca de 17% dos casos de imunodeficiência primária. A incidência de casos de imunodeficiência de fagócitos é similar (12%) à de imunodeficiência combinada de LT e LB. O restante dos casos de imunodeficiências estão relacionados à redução na função de LT (7%), à produção de moléculas do sistema complemento (1%) e outras causas conhecidas ou não (2%). CAP. 18 - IMUNODEFICIÊNCIAS PRIMÁRIAS 227 7% 17%1% 12% 2% 60% LB LT LB/LT Complemento Fagócitos Outros Figura 1 – Incidência das Imunodeficiências Primárias O surgimento das técnicas para detecção de anticorpos no início da década de 50, propiciou o diagnóstico dos primeiros casos de hipogamaglobulinemia (diminuição na produção de anticorpos) e agamaglobulinemia (ausência de produção de anticorpos). Estes estudos clínicos associados aos estudos experimentais da década de 60, com animais timectomizados e bursectomizados, propiciaram uma melhor compreensão dos mecanismos da resposta imune, que foram descritos neste livro. Atualmente, existem vários modelos em camundongos que reproduzem as imunodeficiências humanas e além disso, com as técnicas de nocaute gênico (Capítulo 20) pode-se estudar os efeitos causados pela deleção de um determinado gene. DEFICIÊNCIAS DE LINFÓCITOS B Agamaglobulinemia associada ao cromossomo X (Síndrome de Bruton) Esta imunodeficiência foi a primeira a ser descrita, em 1952, pelo médico Ogden C. Bruton. Bruton tinha como paciente um menino que, no período de 4 anos, tinha apresentado 19 infecções por diferentes tipos de pneumococos, dentre outras infecções; este quadro clínico estava associado a agamaglobulinemia (ausência de produção de anticorpos). Nos anos seguintes, ficou evidenciado que este tipo de agamaglobulinemia era mais comum entre crianças do sexo masculino e foi associada a defeitos no cromossomo X A associação ao cromossomo X se deve ao fato de que quando ocorre um defeito genético neste cromossomo, as meninas herdam um segundo X que pode suprir o defeito FILOMENA M. P. BALESTIERI - IMUNOLOGIA BÁSICA E APLICADA 228 existente no primeiro; o mesmo não ocorre nos meninos, que apresentam apenas um cromossomo X e por isso expressam a falha gênica. Esta imunodeficiência manifesta-se entre os 5 e 9 meses após o nascimento, quando as Igs de origem materna começam a serem substituídas pelas produzidas pela criança. Nesta fase, esta síndrome pode ser confundida com a hipogamaglobulinemia transitória da infância (ver abaixo), na qual pode ocorrer um retardo de até 18 meses na produção das Igs. A agamaglobulinemia leva ao surgimento de várias infecções recorrentes tais como: otite média, bronquite, pneumonia e meningite ocasionadas geralmente por Streptococcus pneumoniae, Haemophilus influenzae, outros tipos de streptococos e bactérias gram negativas. Ocorre também uma maior incidência de infecções do sistema nervoso central por enterovírus, ecovírus, poliomielite adquirida através de vacina e vírus da hepatite B. Os pacientes com esta síndrome apresentam dez vezes mais células pró-B que os indivíduos normais, sugerindo que o bloqueio na diferenciação dos LB está associado ao ambiente medular ou a defeitos intrínsecos dos LB. O gene responsável por esta imunodeficiência é um gene mutadoo que origina uma tirosina quinase importante no processo de diferenciação e ativação celular; esta foi denominada tirosina quinase do LB ou de Bruton (Btk). A Btk é expressa em todas as células da série B e sua função parece ser crítica na expansão e maturação de células pré-B embora possa ser importante em todo o processo de desenvolvimento dos LB. A variabilidade quanto ao número de LB circulantes nos diversos pacientes de XLA sugere que possam ocorrer mutações em diferentes regiões do gene da tirosina quinase afetando conseqüentemente diferentes seqüências de aminoácidos da Btk e alterando de forma diversificada a sua atividade enzimática. Avaliação da função imunológica: a quantificação da IgG, IgM e IgA no sangue periférico e a contagem de LB circulantes são os procedimentos iniciais para a identificação da síndrome. A quantificação das Igs pode ser feita por imunodifusão radial ou por nefelometria enquanto que a contagem dos LB pode ser realizada pelo método de citometria de fluxo, utilizando anticorpos monoclonais anti-CD19, CD20 e Igs de membrana (Capítulo 20). A imunoeletroforese realizada com o soro do paciente pode demonstrar a ausência das Igs mas não quantifica estas moléculas, por isso não é normalmente utilizada quando se dispõe das técnicas acima indicadas. CAP. 18 - IMUNODEFICIÊNCIAS PRIMÁRIAS 229 Os pacientes com XLA apresentam níveis de IgG inferiores a 200mg/dl (normal = ≥ 500- 600mg/dl) e a concentração sérica das Igs totais estão abaixo de 250 mg/dl. Entre 5-9 meses, os lactentes geralmente apresentam níveis de IgG inferiores a 350 mg/dl e uma certa produção de IgM e IgA (> 20 mg/dl). Em caso de dúvida quanto ao diagnóstico, os níveis de Igs podem ser quantificados em intervalos de três meses após a primeira avaliação; caso ocorra algum aumento na concentração das Igs, é pouco provável que se trate de agamaglobulinemia. Quanto aos LB, na medula óssea destes pacientes estão presentes apenas células pró-B que expressam Ig intracitoplasmática e no sangue periférico, na maioria dos casos, não são detectados LB. Terapia: estes pacientes necessitam receber doses mensais de gamaglobulina intramuscular ou endovenosa (Capítulo 21) e antibióticos. A administração endovenosa é preferível à intramuscular, que além de dolorosa, leva a uma maior degradação das Igs e não permite a administração de altas doses. A diferença principal entre os preparados para administração endovenosa e intramuscular, é que a última não é submetida a tratamento químico que reduz a agregação e a ativação do sistema complemento in vivo. Desta forma, a gamaglobulina preparada para uso intramuscular não deve ser administrada por via endovenosa porque pode causar choque anafilactóide (Capítulo 11). Este tipo de terapia pode prolongar a vida do paciente em até 30-40 anos; no entanto, pode ocorrer alta mortalidade em crianças antes dos 10 anos pelo desenvolvimento de infecções severas antes do diagnóstico ou por falha no tratamento. Hipogamaglobulinemia transitória da infância Ao nascer, a criança conta com a proteção mediada pela IgG maternatransferida através da placenta a partir do quarto mês de gestação e com a produção de IgM, que nesta fase corresponde a 20% da concentração desta Ig num indivíduo adulto normal (Figura 2). A partir do nascimento, estas IgGs são catabolizadas num período de 30 dias e entre o quarto e o quinto mês de vida, quase já não estão mais presentes no sangue periférico da criança. Neste período, a IgM produzida pela criança corresponde a cerca de 50% da concentração encontrada durante a vida adulta; no entanto, a concentração de IgG encontra-se muito reduzida (cerca de 350 mg/dl) possibilitando o aumento da incidência de infecções das vias aéreas. Assim, entre os 3 e 12 meses, a criança fica mais susceptível a infecções até que a IgG atinja níveis protetores. No entanto, este período de refratariedade pode ser prolongado até os 2 anos em algumas crianças, principalmente aquelas nascidas prematuramente. FILOMENA M. P. BALESTIERI - IMUNOLOGIA BÁSICA E APLICADA 230 Figura 2 – Produção de Igs na infância 0 20 40 60 80 100 120 140 160 Fr aç ão d os n ív ei s a du lto IgG materna IgM IgG IgA 0 3 6 9 N Avaliação da função imunológica: o mais interessante é fazer a avaliação do número de LB no sangue periférico, porque as crianças com agamaglobulinemia congênita não apresentam estas células em números normais. A investigação da produção de anticorpos específicos, mesmo contra as moléculas do sistema ABO não é interessante porque nesta fase a concentração destas moléculas ainda é muito baixa. Caso a criança não apresente infecção recorrente grave, deve-se esperar de 3 a 5 meses para dosar as Igs; a ocorrência do aumento das Igs em relação à primeira dosagem sugere que a agamaglobulinemia não é congênita e sim fisiológica. Terapia: quando a criança apresenta infecções graves deve ser administrada a gamaglobulina, da mesma forma que no caso da Síndrome de Bruton. Esta administração não interfere com a produção própria das Igs e como estes preparados apresentam principalmente IgG, não interfere na dosagem de IgM e IgA. Neste período de agamaglobulinemia não devem ser administradas vacinas, o que deve ser realizado logo que a resposta imune esteja normalizada. Deficiência seletiva de subclasses de IgG Neste tipo de imunodeficiência, a pessoa apresenta infecções recorrentes por Streptococcus pneumoniae e Haemophilus influenzae nas vias aéreas superiores e inferiores. Nestes pacientes, os níveis de IgG total não se encontram alterados, no entanto, a concentração de uma ou mais subclasses CAP. 18 - IMUNODEFICIÊNCIAS PRIMÁRIAS 231 pode estar reduzida. A deficiência mais comum, em crianças, é a da suclasse IgG2 (importante na resposta a antígenos polissacarídicos) associada à deficiência de IgA. Em adultos é mais comum a deficiência na produção de IgG3. Estas deficiências se devem a anomalias na diferenciação dos LB ou por deleção homozigota de genes das regiões constantes das cadeias pesadas. Quando a deleção ocorre apenas num gene, não ocorre manifestação da imunodeficiência. Terapia:As infecções são tratadas com antibióticos enquanto que a imunodeficiência pode ser tratada com gamaglobulina. Como os preparados são diferentes quanto a composição das subclasses, deve-se escolher aqueles que apresentem a maior concentração da subclasse de Ig deficitária. Deficiência seletiva de IgA Os parâmetros que definem este tipo de síndrome são: a redução na síntese de IgA1e IgA2 nas formas sérica e secretória e a manutenção da produção de IgG e IgM. Em cerca de 20% dos casos, a deficiência de IgA está associada à de IgG2 e IgG4. A concentração de IgA sérica nos indivíduos acometidos por esta síndrome é de 5µg/ml enquanto que uma pessoa normal produz entre 2 e 4 mg/ml. O mecanismo subjacente a esta deficiência ainda não é completamente compreendido. Os pacientes com deficiência seletiva de IgA podem apresentar números normais de linfócitos B com IgA de membrana com redução no número de plasmócitos secretores de IgA. Nos seres humanos, o TGF-β é o responsável pela troca de isótipo de IgM para IgA e quando células do sangue periférico de pacientes com esta síndrome são incubadas com esta citocina, os plasmócitos secretam IgA. A análise do material genético destes pacientes, demonstrou que na maioria dos casos pode ocorrer falha na fase de transcrição do gene da cadeia constante alfa (Cα) sem que ocorra deficiência na produção de TGF-β, importante nesta etapa de diferenciação celular. Em um menor número de casos, a falha ocorre na etapa de secreção da IgA. Como a IgA é a principal Ig de mucosa a sua deficiência pode levar a um aumento na incidência de infecções bacterianas e virais das vias aéreas superiores, sistema gastrointestinal e urogenital. No entanto, em certos casos, principalmente na primeira década de vida, talvez pelas concentrações normais de IgM e IgG, os pacientes são assintomáticos. Além do aumento nas infecções, estes pacientes apresentam uma maior incidência de doenças auto-imunes, alergias e tumores, provavelmente pelo aumento de contato com partículas antigênicas. Pesquisas recentes têm demonstrado que os pacientes deficientes de IgA com a expressão de HLA-A1, -B8 e Dw3 são os mais FILOMENA M. P. BALESTIERI - IMUNOLOGIA BÁSICA E APLICADA 232 susceptíveis a doenças auto-imune. As doenças auto-imunes mais comuns são a artrite reumatóide, o lupus, a anemia hemolítica, a miastenia gravis, a doença celíaca dentre outras. Cerca de 44% dos pacientes com deficiência de IgA apresentam IgG anti-IgA que pela ativação do sistema complemento retiram a IgA da circulação numa taxa 4 a 20 vezes mais rápida que a taxa catabólica normal desta Ig. Avaliação da função imunológica: O diagnóstico da Deficiência Seletiva de IgA é dado pela detecção de baixas concentrações (50 µg/ml) de IgA sérica e níveis normais das outras Igs. A quantificação da IgA pode ser feita pela técnica de imunodifusão radial simples (Imunodifusão de Mancini) ou pelo método do ELISA (Capítulo 20). Para a investigação da presença ou ausência da IgA, sem quantificação, pode-se realizar uma imunoeletroforese (Capítulo 20). Alguns pacientes podem apresentar anticorpos anti-IgA, outros um aumento na síntese de IgM. Em relação aos linfócitos do sangue periférico, tanto os LT quanto os LB, estão em número normal, na maioria dos pacientes. No entanto, alguns destes podem apresentar uma redução no número de LT, na produção de IFN-γ e na resposta a mitógenos (Capítulo 20). Terapia: a administração de gamaglobulina é inefetiva porque quase não existe IgA nestes preparados. Além de ser inefetiva, a gamaglobulina pode conter quantidades mínimas de IgA, que sensibilizam o indivíduo podendo causar choque anafilático a partir de um segundo contato com preparados contendo esta Ig. Quanto às infecções pulmonares, estas devem ser tratadas rapidamente para evitar uma doença pulmonar crônica. As doenças auto-imunes quando presentes são tratadas de forma convencional. Deficiência de IgG e IgA com Hiper-IgM Esta síndrome caracteriza-se pela redução na produção de IgG e IgA com produção aumentada de IgM. Indivíduos normais produzem cerca de 1,5 mg/ml de IgM enquanto que estes pacientes podem produzir até 20 mg/ml desta Ig. Na maioria dos casos, este defeito está associado ao cromossomo X e manifesta-se nos meninos após o primeiro ano de vida, quando as Igs maternas declinam. A falha no cromossomo X está relacionada à ausência de produção da molécula CD40-Ligante (CD154) presente em LT ativados. A CD154 é importante na ativação dos linfócitos T e das Células Apresentadoras de Antígenos (Capítulo 9). Os LB quando apresentam peptídeos associadoscom moléculas do MHC-II, expressam CD40 que se associa com o CD154 nos LT. Os LB ativados por estes LT, na presença de CAP. 18 - IMUNODEFICIÊNCIAS PRIMÁRIAS 233 citocinas, trocam o isótipo de IgM para IgG ou IgA. A deficiência na expressão de CD154 leva à ausência da troca de isótipo e uma hiper-produção de IgM. A deficiência de IgG e IgA resulta numa maior incidência de otite, pneumonia e septicemia, infecções causadas por bactérias piogênicas. As manifestações iniciais podem ser a pneumonia por Pneumocystis carinii e a infecção intestinal por Cryptosporidium. A deficiência na expressão de CD40L também altera o processo de seleção negativa dos timócitos, levando a uma maior freqüência de doenças auto-imunes. Estes pacientes apresentam IgM que reage com antígenos próprios presentes nas hemácias, neutrófilos e plaquetas, levando a anemia, neutropenia e trombocitopenia. O aumento da incidência de tumores também está associado à deficiência da expressão de CD40L e a redução na ativação de LT e macrófagos. Esta síndrome também é observada em mulheres e, nestes casos, pode ocorrer em decorrência de herança autossômica dominante ou recessiva não relacionada com o defeito na expressão de CD40L. A falha parece residir no LB mas ainda não se sabe quais moléculas estão envolvidas. Avaliação da função imunológica: O diagnóstico desta síndrome é realizado através de técnicas de quantificação das Igs séricas: imunodifusão radial simples ou ELISA (Capítulo 20). Terapia: Como no caso da agamaglobulinemia associada ao X, o tratamento desta síndrome é realizado com a administração de gamaglobulina endovenosa. Mais recentemente, tem se tentado o transplante de medula óssea quando há possibilidade de doador MHC compatível. DEFICIÊNCIA DE LT. Síndrome de DiGeorge ou aplasia tímica congênita A história do nome desta síndrome é interessante por ressaltar a importância da interação entre os estudos experimentais e os casos clínicos. Em 1965, o médico Angelo DiGeorge participando de um congresso científico, entrou em contato com os resultados dos experimentos em que se utilizava animais timectomizados ou bursectomizados e que elucidaram a função do timo e da bursa de Fabricius na maturação dos linfócitos (Capítulo 6). Nesta época, DiGeorge estava avaliando crianças que apresentavam hipoparatireoidismo e agenesia tímica e relacionou estes casos médicos aos experimentais com animais timectomizados. A Síndrome de DiGeorge caracteriza-se imunologicamente pela aplasia ou hipoplasia congênita do timo. Associada à deficiência na maturação de linfócitos T, os portadores desta síndrome FILOMENA M. P. BALESTIERI - IMUNOLOGIA BÁSICA E APLICADA 234 apresentam hipocalcemia, hipoparatireoidismo, cardiopatia e anomalias na estrutura do esôfago, boca e pavilhão auditivo. Estas anomalias se devem a alterações que ocorrem durante a vida intra-uterina. Entre a 6a e a 8a semana de gestação, o timo e as paratireóides desenvolvem-se a partir de evaginações do epitélio da terceira e quarta bolsas faringeanas. Na 12a semana, o timo começa a migrar na direção caudal, concomitante às alterações nos lábios e orelhas. Nesta fase, interferências no desenvolvimento embriológico resultam nestas anomalias. Um dos fatores que têm sido associado a esta síndrome é o alcoolismo materno. Em cerca de 90% dos pacientes, são observadas deleções no cromossomo 22. Os pacientes apresentam uma deficiência de LT variável de acordo com o grau de hipoplasia, que é mais comum que a aplasia. Desta forma, alguns pacientes não apresentam infecções graves e crescem normalmente; neste caso os pacientes apresentam uma síndrome de DiGeorge parcial. A expressão desta imunodeficiência pode ocorrer logo após alguns meses de vida pela ausência de timo ou pela presença de um timo extremamente pequeno ou localizado em local diferente do normal. Como ocorre deficiência de LT, esta síndrome caracteriza-se pela ocorrência de infecções recorrentes ou crônicas por bactérias, vírus, fungos e protozoários. Como muitas das respostas humorais são T-dependentes, ocorre também uma redução na produção de anticorpos. Alguns pacientes apresentam, a partir dos cinco anos de idade, uma resolução espontânea da imunodeficiência; isto se deve provavelmente a presença de algum tecido tímico ou locais extratímicos que assumem a função de maturar os LT. Avaliação da função imunológica: a suspeita de aplasia tímica, é confirmada pela radiografia lateral do mediastino anterior que pode revelar ausência da sombra tímica. A contagem de linfócitos por citometria de fluxo (Capítulo 20) pode revelar níveis normais ou reduzidos destas células (<1500/µl). A contagem normal pode ser o resultado do aumento do número de linfócitos B. Outro aspecto que pode estar reduzido e depende do grau de hipoplasia é a resposta das células do sangue periférico à estimulação com células alogeneicas ou mitógenos de LT, tal como a fitohemaglutinina (PHA) (Capítulo 20). Os níveis de imunoglobulinas também podem variar de níveis normais a reduzidos. A atividade das células NK é normal. Terapia: A hipocalcemia e as alterações cardíacas requerem tratamento urgente. Quanto aos aspectos imunológicos, deve-se fazer o tratamento profilático contra infecções por Pneumocystis carinii. O transplante tímico ou o transplante de medula óssea são os tratamentos indicados. O CAP. 18 - IMUNODEFICIÊNCIAS PRIMÁRIAS 235 transplante tímico deve ser realizado com células com menos de 14 semanas de gestação de parente ou doador HLA compatível para evitar reações de enxerto versus hospedeiro (Capítulo 16). Candidíase muco-cutânea crônica É uma síndrome que surge geralmente nas duas primeiras décadas de vida e está associada a uma maior susceptibilidade a infecções cutâneas e de mucosa por Candida, geralmente Candida albicans. É uma deficiência seletiva de LT específicos para antígenos de Candida, sendo que a resposta humoral para estes antígenos é normal. Esta imunodeficiência está associada, em graus diferentes, a redução da atividade da supra renal e paratireóides. Não se conhecem as causas desta anomalia. Muitos pacientes desenvolvem doença de Addison, doença auto-imune que leva à insuficiência do córtex da supra renal. Outras doenças auto-imunes também podem estar associadas: hipotireoidismo, diabetes melitus e anemia perniciosa. Avaliação da função imunológica: os pacientes geralmente apresentam resposta normal para outros fungos. O número de linfócitos é normal e quando as células do sangue periférico são ativadas por PHA proliferam normalmente. Existe uma redução na resposta dos LT a antígenos de Candida albicans em sistemas in vitro (Capítulo 20). A resposta de hipersensibilidade tardia a candidina, antígeno de Candida albicans, também está reduzida nestes pacientes (Capítulo 13). Terapia: O único tratamento disponível é a eliminação da infecção por Candida com anti- fúngicos (anfotericina B, miconazol, cetoconazol). DEFICIÊNCIAS COMBINADAS DE LT E LB Imunodeficiência severa combinada (SCID – Severe Combined Immunodeficiency Disease) A Imunodeficiência Severa Combinada (SCID) corresponde a uma série de síndromes em que ocorre a deficiência das respostas celular e humoral, nas quais diferentes mecanismos estão envolvidos. A freqüência deste tipo de imunodeficiência é de 1 em 75.000 nascimentos e leva à mortalidade dentro do primeiro ano de vida. Pelo menos 7 tipos de SCID já foram identificados e agrupados de acordo com a herança genética e o fenótipo. A forma mais comum é a SCID associada ao X que acomete cerca de 50-40% dos pacientes nos EUA. As crianças afetadas durante os primeiros seis meses de vida não apresentam infecções por estarem protegidas pelas Igs deorigem materna. Após este período estas crianças apresentam infecções oportunísticas de origem bacteriana, fúngica e viral. FILOMENA M. P. BALESTIERI - IMUNOLOGIA BÁSICA E APLICADA 236 Imunodeficiência Severa Combinada Associada ao X (XSCID) Esta síndrome corresponde a 50-60% dos casos de SCID e o mais famoso caso foi o do “Garoto da Bolha” que viveu isolado durante 12 anos até morrer de complicações de um transplante recebido da irmã HLA-compatível. Este tipo de imunodeficiência caracteriza-se pela ausência ou redução de LT por um bloqueio no desenvolvimento tímico. O timo é hipoplásico, mas após o transplante de medula óssea, as células T se implantam e se desenvolvem normalmente, indicando que o defeito não se encontra no epitélio tímico mas nos precursores de LT presentes na medula óssea. Além dos LT, as células NK também estão reduzidas em número enquanto que os LB encontram-se em níveis normais. Os linfonodos, as tonsilas, as placas de Peyer encontram-se ausentes ou extremamente reduzidos. No baço, as regiões T-dependentes são depletadas de células. O defeito nos pacientes com esta síndrome reside em mutações no cromossomo X, especificamente, no gene da cadeia γ comum (γc) de vários receptores de citocinas: IL-2, IL-4, IL-7, IL-13, IL-15. Cerca de 2/3 dos pacientes apresenta mutação no γc enquanto que o restante não apresenta γc. A cadeia γc é expressa constitutivamente por LT, LB, células NK, células mielóides e eritroblastos. A expressão do γc associado às subunidades α e β destes receptores gera um receptor de alta afinidade. Em decorrência da ausência de LT e células NK, a criança com XSCID pode apresentar, nos primeiros meses de vida, infecções persistentes com microorganismos oportunistas: Candida albicans, Pneumocystis carinii, vírus da varicela, do sarampo, citomegalovírus, vírus Epstein-Barr, dentre outros. Estas crianças também perdem a capacidade de rejeitar tecidos estranhos e são mais susceptíveis a reações de GVH (Capítulo 16). Estas reações podem ocorrer em decorrência da passagem de LT maternos durante a fase intrauterina ou por transplante de medula óssea alogêneica. Avaliação da função imunológica: estes pacientes apresentam linfopenia que pode ser detectada por citometria de fluxo ou esfregaços de sangue. Crianças normais apresentam, em média, aos 6 meses de idade, cerca de 7.300 linfócitos/ml (com variações entre 4.000 e 13.500/ml) enquanto que as portadoras de XSCID apresentam um número de linfócitos abaixo de 2.000/ml. As células do sangue periférico, mesmo quando coletadas in utero ou do cordão umbilical apresentam, in vitro, uma resposta linfoproliferativa ausente frente a mitógenos e células alogenêicas. A produção de anticorpos pela CAP. 18 - IMUNODEFICIÊNCIAS PRIMÁRIAS 237 dependência das células T também está afetada e pode estar reduzida ou ausente. Apesar disto, o número de LB circulante encontra-se normal ou elevado. Terapia: o único tratamento adequado é o transplante de medula óssea HLA-compatível ou haploidêntico. No caso do transplante haploidêntico, devem ser retirados os LT para evitar uma reação GVH. O transplante quando realizado nos primeiros três meses de vida aumenta a sobrevida em 95% dos casos. Para isso o diagnóstico deve ser precoce, pela detecção da linfopenia ainda no sangue do cordão umbilical. Estes procedimentos podem alertar o médico para que se avalie a função dos LT e a presença da cadeia γc. Deficiência de adenosina desaminase (ADA) Esta imunodeficiência, que afeta a produção de linfócitos T e B, está relacionada a deleções ou mutações no gene da enzima Adenosina desaminase (ADA), importante na via selvagem do metabolismo das purinas, que leva à síntese de DNA. A ADA cataliza a reação de desaminação da adenosina para inosina e da 2’-deoxiadenosina para 2’-deoxinosina. As pessoas heterozigotas têm a metade da concentração de ADA e podem apresentar um padrão variável de resposta; algumas permanecem clinicamente normais enquanto que outras apresentam um quadro de infecções repetitivas e doenças auto-imunes. A síndrome atinge de forma mais dramática apenas os homozigotos. A deficiência de ADA, no entanto, nem sempre leva à imunodeficiência: no deserto de Kalahari, cerca de 1% dos indivíduos da tribo Kung apresentam este gene defeituoso sem que apresentem problemas na resposta imune. A imunodeficiência relacionada à ausência da produção de ADA se deve ao acúmulo de deoxiadenosina, de S-adenosil homocisteína e de deoxiadenosina tri-fosfato (deoxi-ATP) que apresentam efeitos tóxicos sobre as células. A deoxi-ATP é um inibidor da síntese de deoxinucleotídeos e portanto da síntese de DNA e da divisão celular. Apesar da presença desta enzima em todas as células os efeitos deletérios da sua ausência são maiores nos linfócitos, porque estes não produzem a enzima 5’- nucleotidase importante no mecanismo de degradação dos produtos tóxicos. Os pacientes com deficiência de ADA apresentam um quadro clínico similar aos outros tipos de SCID: doenças virais, bacterianas, fúngicas e propensão à reação GVH quando transplantados com infusão celular rica em LT. FILOMENA M. P. BALESTIERI - IMUNOLOGIA BÁSICA E APLICADA 238 Avaliação da função imunológica: deve-se realizar rotineiramente a avaliação da produção de ADA pelos recém-nascidos. Esta avaliação pode levar à observação de casos de deficiência parcial da expressão de ADA e um quadro imunológico normal. Estes pacientes devem ser submetidos à avaliação periódica dos parâmetros imunológicos porque existe uma grande variabilidade na imunodeficiência, o que leva a padrões diversos de sintomas. As crianças com deficiência na produção de ADA geralmente apresentam uma linfopenia maior que a observada em outros tipos de SCID: geralmente possuem 500 linfócitos/ml (Normal: ≈7.300/ml, Outras SCIDs: ≈2.000/ml). Terapia: a terapia mais adequada atualmente é o transplante alogêneico de medula óssea, que restaura a imunidade do paciente. Uma terapia paliativa é a administração de ADA bovina acoplada a polietilenoglicol (PEG). Este tipo de terapia foi testado em mais de 40 pacientes e restaurou a imunidade celular por períodos de 2 a 8 anos. O tratamento com ADA-PEG reduz a concentração de metabólitos tóxicos e melhora a atividade imunológica principalmente nos indivíduos que apresentam imunidade residual. Uma terapia que não é eficaz em todos os pacientes é a administração mensal de hemácias irradiadas, células ricas em ADA. Esta síndrome é a que tem sido mais promissora quanto ao uso de terapia gênica . Neste tipo de terapia, administra-se ao paciente vírus atenuados que expressam cópias normais do gene defeituoso, neste caso, vírus que expressam o gene normal da ADA. A infecção por estes vírus faz com que sejam introduzidas nas células cópias deste gene, que passam a ser expressos pela célula infectada. Várias crianças já receberam este tipo de terapia e estão sendo acompanhadas quanto à resposta imune e parece que apresentam uma melhora clínica. Deficiência de purina nucleosídeo fosforilase (PNP) A Purina Nucleosídeo Fosforilase (PNP) assim como a ADA participa no metabolismo das purinas, no entanto a sua deficiência não causa imunodeficiência severa como no caso da ADA. A PNP catalisa a conversão da inosina, da desoxinosina, da guanosina e da desoxiguanosina em hipoxantina e guanina. Na ausência de PNP, pelo acúmulo de desoxiguanosina há formação de trifosfato de desoxiguanosina (GTP) que, assim como a desoxi-ATP, leva à inibição da síntese de deoxinucleotídeos. Os pacientes com deficiência em PNP apresentam varicela, vaccinia generalizada e linfosarcoma. Um terço dos pacientes apresenta doenças auto-imunes, sendo as mais comuns, a anemiahemolítica auto-imune, a púrpura trombocitopênica idiopática e o lupus eritematoso sistêmico. CAP. 18 - IMUNODEFICIÊNCIAS PRIMÁRIAS 239 Avaliação da função imunológica: A maioria dos pacientes apresenta concentrações normais ou elevadas de Igs. A linfopenia apresentada por estes pacientes é similar aos da deficiência de ADA, com um número de linfócitos menor que 500/ml. Ocorre uma redução dos LT e suas subpopulações, sendo variável a atividade destas células que geralmente é baixa. Nestes pacientes, ocorre deficiência no ácido úrico urinário e sérico porque a PNP é necessária para a formação dos precursores dos uratos: a xantina e a hipoxantina. Terapia: assim como para a deficiência da ADA, a terapia mais adequada é o transplante alogêneico de medula óssea. O tratamento enzimático não tem apresentado resultados satisfatórios e a terapia gênica deve ser tentada no futuro. DEFICIÊNCIA NA EXPRESSÃO DE MOLÉCULAS DO MHC-CLASSE I E II Deficiência na expressão de moléculas do MHC classe I A deficiência isolada das moléculas do MHC classe I é uma síndrome rara. Ocorre uma ausência de expressão das moléculas do MHC classe I em todas as células do corpo embora estas estejam presentes no sangue. Gêmeos de uma família marroquina que foram identificados com esta síndrome apresentavam uma mutação no gene do TAP (Capítulo 7). O TAP transporta peptídeos, oriundos do processamento pelo proteassoma, do citoplasma para o retículo endoplasmático onde estes se associam a moléculas do MHC classe I e beta2-microglobulina. A deficiência na expressão do TAP, leva à ausência de peptídeos o que induz a destruição das moléculas do MHC classe I no citoplasma. A ausência das moléculas do MHC classe I nas APCs reduz a seleção tímica de linfócitos T CD8+ e conseqüentemente a resposta a parasitas intracelulares e a tumores, nos órgãos linfóides secundários. Deficiência na expressão de moléculas do MHC classe II - ou síndrome do linfócito nu (bare). Esta síndrome autossômica recessiva caracteriza-se pela redução ou ausência da expressão de moléculas do MHC-II, na membrana das APCs profissionais: macrófagos, linfócitos B e células dendríticas. Com a ausência na expressão destas moléculas, a seleção tímica de linfócitos T CD4+ é anormal, reduzindo a sua maturação e a sua migração para os órgãos linfóides secundários. A redução no número de linfócitos T CD4+ impossibilita a maioria das respostas T-dependentes, ou seja, a produção de anticorpos contra estruturas proteícas, respostas a tumores e infecções intracelulares. Os FILOMENA M. P. BALESTIERI - IMUNOLOGIA BÁSICA E APLICADA 240 sintomas surgem no primeiro ano de vida e consistem em infecções repetitivas do sistema gastrointestinal e respiratório. A morte geralmente ocorre por infecções virais múltiplas e persistentes. Avaliação da função imunológica: esta síndrome é diagnosticada pela ausência da expressão de moléculas do MHC classe II em células do sangue periférico. Há uma certa heterogeneidade na expressão da doença, sendo que os pacientes podem apresentar concentrações residuais variáveis de Igs e de linfócitos T CD4+. Alguns pacientes também apresentam redução moderada na expressão das moléculas do MHC classe I. A redução na expressão das moléculas do MHC-I pode também ocorrer porque além da similaridade nos fatores de transcrição alguns são comuns para as duas classes de moléculas. Terapia: a terapia utilizada é o transplante de medula óssea. DEFEITOS NA RESPOSTA DE FAGÓCITOS E OUTRAS CÉLULAS DA RESISTÊNCIA NATURAL Doença granulomatosa crônica A Doença Granulomatosa Crônica (DGC) afeta 1 criança em 1 milhão nos EUA e prevalece naquelas do sexo masculino (4:1). Este defeito pode estar associado ao cromossomo X (80-60% dos casos) ou pode ser autossômico (40-20% dos casos). As manifestações clínicas aparecem nos primeiros dois anos de vida e deve-se à falha das células dos sistemas Granulocítico Polimorfonuclear (neutrófilos e eosinófilos) e Fagocítico Mononuclear (monócitos-macrófagos) em produzir moléculas tóxicas oriundas do metabolismo do Oxigênio (ROI), principalmente, o ânion superóxido e o peróxido de hidrogênio. Desta forma, as pessoas que herdam este defeito são acometidas de infecções recorrentes de origem bacteriana e fúngica e formação excessiva de granulomas.Alguns microorganismos produzem peróxido de hidrogênio, tais como o Streptococcus pneumoniae e o S. pyogenes (catalase negativo) e não causam infecção porque suprem a deficiência das células fagocíticas. Os microorganismos que afetam estes pacientes geralmente são de baixa virulência e são catalase positivos (Staphylococcus, Klebsiella, Escherichia coli, Serratia, Pseudomonas). Estas infecções afetam a pele, tecido conjuntivo, sistema respiratório, linfonodos, fígado, baço e ossos. Os granulomas se formam na maioria destes tecidos porque como os microrganismos não são eliminados, ocorre indução de uma resposta imune celular crônica, com ativação de linfócitos T e macrófagos. CAP. 18 - IMUNODEFICIÊNCIAS PRIMÁRIAS 241 A produção de produtos tóxicos derivados do oxigênio (ROI), quando as células fagocíticas engolfam um patógeno, depende da ativação do complexo multi-enzimático NADPH (Nicotinamida\adenina-dinucleotídeo) oxidase ou phox (phagocyte oxidase). A NADPH oxidase em uma célula em repouso consiste de um flavocitocromo (citocromo b558) associado à membrana e constituído por duas proteínas a gp91phox e a p22phox (Figura 3a ). Quando a célula é ativada, a NADPH oxidase forma um complexo com as proteínas citosólicas p47phox, p67phox e uma proteína ligante de GTP, Rac-2 e cataliza a redução de um único elétron do oxigênio molecular (O2) para superóxido (O2 -) (Figura 3b). Como a NADPH oxidase é um complexo multi-enzimático pode ocorrer uma heterogeneidade no defeito molecular envolvido na DGC, apesar de todos os pacientes apresentarem um quadro clínico similar. A forma da doença granulomatosa associada ao cromossomo X caracteriza-se por um defeito na gp91. A forma autossômica mais comum resulta de defeito na p47. Falhas nos dois outros componentes são herdadas como desordens autossômicas e correspondem ao restante dos casos. Avaliação da função imunológica: o diagnóstico da doença granulomatosa crônica é feito pelo teste do NBT (Nitrobluetetrazolium). Este teste consiste em induzir a fagocitose pelas células na presença do corante NBT, que apresenta coloração amarela. Quando o burst respiratório ocorre é liberado um H do NADPH e este reage com o NBT, que reduzido apresenta uma coloração púrpura. No caso dos indivíduos com esta síndrome, não ocorre o burst respiratório e não há formação do precipitado púrpura do NBT. Outras alterações que podem ocorrer são o aumento no número de células do sangue (leucocitose), em decorrência do aumento no número de neutrófilos jovens e segmentados; anemia (geralmente, hipocrômica, microcítica ou ocasionalmente, normocítica), hipergamaglobulinemia. FILOMENA M. P. BALESTIERI - IMUNOLOGIA BÁSICA E APLICADA 242 Figura 3 – NADPH oxidase na célula fagocítica em repouso (A.) e na célula ativada (B.) Terapia: O aumento da sobrevivência dos pacientes depende do diagnóstico precoce e do tratamento das infecções com altas doses de antibióticos. Nos pacientes em que o gene estrutural da gp91 está presente e a sua transcrição reduzida, o tratamento com IFN-γ estimula a produção de superóxido, aumentando a transcrição não só da gp91 como também de outros componentes do complexo. O IFN-γ reduz em mais de 70% o risco relativo de Membrana celular p22 gp91 Citosol GTP Rac2 p47 p67 p40 A. 2 O2 - 2 O2 Bactéria p22 p47 gp91 p67 p40 Rac2GTP B. CAP. 18 - IMUNODEFICIÊNCIAS PRIMÁRIAS 243 infecções graves. O tratamento deve ser feito três vezes por semana, por via subcutânea e apresenta efeitos colaterais (febre, dores musculares e fatiga) entre 4 e 8 horas após a injeção. O transplante de medula óssea tem sido uma opção para eliminar a necessidade de tratamento constante das infecções. A terapia gênica tem sido estudada experimentalmente porque a sua utilização pode levar a uma cura permanente sem os riscos de transplante alogeneico. Deficiência de Glicose-6-Fosfato Desidrogenase A Glicose-6-Fosfato desidrogenase cataliza a primeira etapa da reação no desvio da hexose monofosfato, levando à produção de NADPH. A deficiência na produção desta enzima leva, como na Doença Granulomatosa Crônica, à falha na produção do ânion superóxido e peróxido de hidrogênio. Os pacientes são susceptíveis à infecção por Staphylococcus aureus e Escherichia coli. Avaliação da função imunológica: A deficiência de Glicose-6-Fosfato desidrogenase leva a sintomas clínicos semelhantes ao da Doença Granulomatosa Crônica, com teste do NBT com resultado anormal. Deficiência de mieloperoxidase A incidência da deficiência da mieloperoxidase é de 1 em 2.000 pessoas e está associada a herança autossômica recessiva. O defeito genético ocorre na fase de pré-tradução com conseqüente redução na quantidade de mRNA para a mieloperoxidase. A mieloperoxidase é uma enzima lisossômica presente nos grânulos azurofílicos dos neutrófilos e monócitos e bioquimicamente distinta da peroxidase dos eosinófilos. A sua função é catalizar a reação entre o H2O2 e os íons Cl - e I- para produzir hipoclorito (OCl-) e hipoiodeto (OI-) (Capítulo 4). Estes produtos gerados pela ação da mieloperoxidase são tóxicos para uma série de microorganismos incluindo bactérias, vírus, fungos, Mycoplasma, Chlamydia, Leishmania donovani e Schistosoma mansoni . FILOMENA M. P. BALESTIERI - IMUNOLOGIA BÁSICA E APLICADA 244 A maioria dos pacientes não apresenta sintomas; os pacientes sintomáticos geralmente apresentam infecções recorrentes por Candida albicans em associação com diabetes mellitus ou doenças imunossupressivas. Avaliação da função imunológica: a quimiotaxia das células destes pacientes é normal enquanto que a produção do ânion superóxido está aumentada. A morte bacteriana in vitro pode estar um pouco reduzida para S. aureus e com redução maior na morte de Candida albicans. A avaliação das células para a presença de peroxidase revela perda da atividade enzimática nos neutrófilos embora esta esteja presente nos eosinófilos. Terapia: a terapia principal é o tratamento das infecções de origem fúngica. Os portadores da deficiência devem receber um aconselhamento genético caso queiram ter filhos. Síndrome de Chediaki-Higashi A síndrome de Chediaki-Higashi é uma imunodeficiência herdada de forma autossômica recessiva e caracteriza-se por infecções bacterianas piogênicas, albinismo oculocutâneo parcial e alta incidência de tumores linforeticulares. O nome desta síndrome se deve aos médicos Moisés Chédiak e Ototaka Higashi que descobriram nestes pacientes a mutação em um dos genes que controla o transporte intracelular de proteínas. Esta deficiência no transporte de proteínas interfere nas funções das células do sistema imune e de outras células. No caso dos neutrófilos, durante o processo de maturação, apresentam lisossomos gigantes, morrendo precocemente o que causa uma neutropenia leve. Os neutrófilos sobreviventes apresentam anomalias na produção de enzimas lisossômicas reduzindo a morte parasitária. Os grânulos gigantes dos neutrófilos são grânulos azurofílicos, que contém mieloperoxidase, a qual não é exocitada de forma normal quando estas células são ativadas. A deficiência na exocitose dos grânulos também interfere na atividade de células NK e LT citotóxicos, o que pode estar associado a alta incidência de tumores linforeticulares. A deficiência no transporte intracelular de proteínas afeta também os macrófagos e as células dendríticas em relação a apresentação antigênica. Outras células afetadas são os melanócitos, levando ao albinismo e as células de Schwann, com conseqüências neurológicas. Avaliação da função imunológica: estes pacientes podem apresentar anemia e leucopenia, quimiotaxia reduzida e em esfregaços do sangue periférico são observadas granulações citoplasmáticas gigantes nos leucócitos e plaquetas. CAP. 18 - IMUNODEFICIÊNCIAS PRIMÁRIAS 245 Terapia: a cura definitiva ocorre apenas com o transplante de medula óssea. Deficiência na adesão dos leucócitos Deficiência de adesão dos leucócitos - tipo 1 - (LAD-1) A LAD-1 é uma imunodeficiência de herança autossômica recessiva em que ocorre uma redução na expressão de moléculas importantes na adesão das células ao endotélio vascular e na interação com outras células do sistema imune. Esta deficiência resulta em infecções recorrentes principalmente por Staphylococcus, bactérias gram negativas entéricas e fungos. Periodontite é muito comum também nestes casos. Os pacientes portadores desta imunodeficiência apresentam uma mutação no gene da integrina β2 ou ausência do mRNA para a β2 integrina nos leucócitos. O gene da integrina β2 é responsável pela expressão da cadeia β (CD18) das moléculas: ! LFA-1 (CD11a.CD18) ! Mac-1 ou CR3 (CD11b.CD18) ! p150,95 ou CR4 (CD11c, CD18) O LFA-1 é expresso em mais de 90% dos timócitos, em linfócitos T e B, granulócitos e monócitos. O seu ligante (ICAM-1 ou CD540) pode ser expresso por células endoteliais, fibroblastos, queratinócitos, linfócitos T e B. Outros ligantes do LFA-1 são o ICAM-2, expresso em células endoteliais e o ICAM-3, em linfócitos. A função principal do LFA-1 é a adesão das células ao endotélio vascular no processo de migração e na interação dos linfócitos com as células apresentadoras de antígeno (Capítulos 3 e 10), aumentando a expressão de genes das citocinas. As moléculas Mac-1 e p150,95 também são importantes no mecanismo de migração celular associando-se a moléculas no endotélio vascular (ICAM-1) e da matriz extracelular (fibrinogênio). A deficiência nestas moléculas resulta num acúmulo de células no sangue periférico pela ausência de migração para os tecidos. Avaliação da função imunológica: estes pacientes podem apresentar expressão anormal de CD18 na membrana dos leucócitos, o que pode ser detectado através de citometria de fluxo, imunofluorescência ou imunoperoxidase (Capítulo 20). Logo ao nascer, estas crianças podem apresentar retardo na perda do cordão umbilical e um processo de cicatrização anormal. Ocorre leucocitose FILOMENA M. P. BALESTIERI - IMUNOLOGIA BÁSICA E APLICADA 246 acentuada com contagens de células brancas do sangue periférico acima de 25.000/mm3. A quimiotaxia das células, a atividade citotóxica de células NK e LTc são anormais. Terapia: a terapia de uso é o transplante de medula óssea. Deficiência de adesão dos leucócitos - tipo 2 (LAD-2) Esta imunodeficiência foi identificada em pequeno número de pacientes, oriundos de casamentos consangüíneos, e está associada a um defeito autossômico recessivo. O gene alterado é provavelmente o que codifica a enzima fucosiltransferase, importante na síntese do sialyl-Lewis X, componente dos ligantes de E e P-selectinas (Capítulo 3). Estes ligantes são glicoproteínas que apresentam o tetrasacarídeo sialyl-Lewis X (CD15s) e estão presentes no endotélio vascular. Nestes pacientes, ocorre uma redução na fase inicial de adesão das células ao endotélio vascular (fase de rolamento) com conseqüentes infecções recorrentes bacterianas similares às que ocorrem em pacientes com LAD-1. Além da reduzida respostainflamatória os portadores desta síndrome apresentam retardo mental, estatura pequena e a expressão de antígenos Bombay na membrana das hemácias. Avaliação da função imunológica: estes pacientes, durante um processo inflamatório, podem apresentar leucocitose com contagens de células brancas que variam entre 30.000 a 150.000 células/mm3. Em estudos in vitro os neutrófilos apresentam motilidade anormal. Defeitos no sistema complemento A importância do sistema complemento reside na sua atividade lítica tanto na ausência quanto na presença de anticorpos IgM e IgG, pela ativação das vias alternativa e clássica, respectivamente. Além da lise bacteriana, a ativação do sistema complemento leva a opsonização, ao aumento da resposta inflamatória e à retirada de complexos imunes da circulação (Capítulo 10). A maioria das deficiências de ativação do sistema complemento está associada a herança autossômica recessiva e para que um indivíduo apresente deficiência total de um dos componentes do sistema complemento é necessário que os genes, oriundos de ambos os parentais, sejam defeituosos. Este fato reflete-se no pequeno número de casos de pacientes com defeitos na ativação deste sistema. Um indivíduo que apresente apenas um dos genes defeituoso pode produzir a metade dos níveis normais de um dos componentes do complemento, o que na maioria das vezes, é assintomático. CAP. 18 - IMUNODEFICIÊNCIAS PRIMÁRIAS 247 Deficiência nos componentes exclusivos da via alternativa A ativação do sistema Complemento pela via Alternativa é um dos mecanismos de resistência natural interno porque, na maioria dos casos, os seus componentes podem ser ativados sem que o indivíduo tenha tido um contato prévio com o patógeno. A primeira molécula ativada por esta via é o C3 e como esta é comum à via clássica será discutida a parte. A deficiência dos fatores da Via Alternativa é pouco freqüente e quando ocorre é mais prejudicial do que a deficiência de fatores da via Clássica provavelmente por permitir a proliferação inicial de bactérias piogênicas, na fase em que anticorpos não estão presentes e a via Clássica não é ativada. Deficiência dos fatores B e D e Properdina Não existem casos relatados de deficiência isolada do fator B, molécula que leva à formação da C3 convertase (C3Bb), podendo esta deficiência estar associada à de C2 da via clássica (ver abaixo). A deficiência no Fator D [que cliva o Fator B em Ba e Bb, com a formação da C3 convertase (C3bBb)] leva a um aumento de infecções piogênicas. A deficiência de Properdina, molécula que estabiliza as C3 e C5 convertases, é a única das imunodeficiências do complemento, identificadas até o momento, cuja herança está associada ao cromossomo X. A ausência desta molécula também aumenta o número de infecções piogênicas, principalmente por Neisseria, podendo levar à meningite fulminante. Os pacientes são susceptíveis a estas infecções, pela deposição insuficiente de C3 na superfície dos parasitas, resultando em opsonização deficiente. Deficiência nos componentes exclusivos da via clássica (C1, C4 e C2). A característica comum a todos os pacientes deficientes nas moléculas de C1 (principalmente C1q), C4 e C2 é a ocorrência de síndrome similar ao Lupus Eritematoso Sistêmico (LES). A ocorrência de LES parece estar associada à redução na fagocitose de células apoptóticas, com a expressão aumentada de autoantígenos na superfície das vesículas destas células e nas modificações da estrutura dos antígenos durante certas formas de morte apoptótica. A molécula C1q parece ser essencial na FILOMENA M. P. BALESTIERI - IMUNOLOGIA BÁSICA E APLICADA 248 eliminação das células apoptóticas por macrófagos, porque em sistemas in vitro foi observada a associação de C1q a queratinócitos apoptóticos. A deficiência de C2 e de C4 causa síndrome similar ao da deficiência de C1q porque impede a continuação da ativação da via clássica, e a expressão de C3b e C4b, reconhecidos por receptores na membrana de macrófagos. A deficiência destas moléculas também reduz a solubilidade dos complexos imunes aumentando a sua deposição nos glomérulos renais e vasos sanguíneos, com o desencadeamento de resposta inflamatória típica de hipersensibilidade do tipo III (Capítulo 12). Outras doenças auto- imunes, tais como a artrite reumatóide, espondilite anquilosante, glomerulonefrite e vasculites cutâneas, também estão associadas à deficiência destas moléculas. Os pacientes que apresentam deficiência nos primeiros componentes da via clássica podem também apresentar uma maior susceptibilidade a infecções bacterianas apesar de apresentarem a ativação da via alternativa normal. A infecção pelo pneumococo, por exemplo, pode ocorrer apesar da cápsula bacteriana ser capaz de ativar a via alternativa do complemento. No entanto, na ausência de anticorpos anti-cápsula estas bactérias não são aderidas de forma eficiente aos receptores CR1 e CR3 dos macrófagos, podendo escapar à opsonização. Embora estas síndromes e infecções sejam comuns em pacientes deficientes das moléculas referidas, cerca de 50% dos pacientes podem ser saudáveis. Estudos têm demonstrado que nestes indivíduos, pode ocorrer um aumento nas moléculas da via alternativa, como por exemplo o fator B, em pacientes deficientes de C2, o que propicia mecanismos mediados pela via alternativa. A deficiência de C2 é uma das mais freqüentes na Europa, com uma incidência de 1 a 3 indivíduos deficientes dentre 10.000 pessoas. A deficiência de C1r ocorre geralmente concomitante à de C1s porque os genes para as duas moléculas encontram-se muito próximos no cromossomo 12. Deficiência no componente C3 O C3 é a principal molécula do eixo comum de ativação das vias Alternativa e Clássica do Complemento (Capítulo 10). Desta molécula depende: ! a formação do complexo de ataque à membrana, responsável pela lise. ! a opsonização de partículas revestidas de C3b ou de seus fragmentos. CAP. 18 - IMUNODEFICIÊNCIAS PRIMÁRIAS 249 Esta síndrome é caracterizada por graves infecções piogênicas recorrentes causadas por bactérias encapsuladas, logo na fase inicial da infância. Podem ocorrer síndromes tipo LES, pela deposição dos complexos imunes nos glomérulos renais. Deficiência nos componentes terminais Os componentes C5, C6, C7, C8 e C9 fazem parte do complexo de ataque à membrana, que propicia a formação de poros na superfície dos microorganismos, após a ativação do sistema complemento pelas vias alternativa e clássica (Capítulo 10). Os pacientes com deficiência em uma destas moléculas apresentam falha, em diferentes proporções, na lise bacteriana pelas duas vias de ativação do sistema Complemento. Embora o mecanismo de lise esteja deficiente, a opsonização pode ocorrer normalmente, porque as moléculas C3b e C4b, importantes para este mecanismo estão presentes. No entanto, estes pacientes apresentam maior susceptibilidade à infecções por Neisseria meningitidis e N. gonorrhoeae, provavelmente por serem bactérias encapsuladas cujo principal mecanismo de morte é a lise. Os pacientes com deficiência de C5 também apresentam uma tendência a desenvolver síndromes tipo LES. Um caso particular é a deficiência de C9, comum no Japão, com a ocorrência de 1 pessoa afetada a cada 1000. No entanto, a ativação do sistema complemento até C8 é suficiente para a formação dos poros (o C9 propicia o aumento no seu tamanho), o que leva estes pacientes a apresentarem uma menor incidência de infecções por Neisseria que os indivíduos deficientes das outras moléculas terminais do Complemento. Deficiência dos inibidores séricos das vias alternativa e clássica O Fator H é uma proteína sérica que se associa ao ácido siálico, presenteem altas concentrações nas células dos mamíferos, e ao C3b. A associação do Fator H ao ácido siálico impede que células saudáveis ativem o sistema complemento pela via alternativa enquanto que a ligação ao C3b, impede que a molécula B se associe e forme a C3 convertase desta mesma via (Capítulo 10). A deficiência deste fator ocasiona uma ativação excessiva da via alternativa o que ocasiona uma deficiência de C3, com o surgimento de infecções por bactérias piogênicas e glomerulonefrite. FILOMENA M. P. BALESTIERI - IMUNOLOGIA BÁSICA E APLICADA 250 O Fator I cliva C3b e C4b regulando assim as duas vias de ativação do sistema complemento. Este fator é importante na clivagem basal, contínua e normal do C3b pela via alternativa. A sua deficiência também propicia uma ativação excessiva do sistema complemento, ocasionando um quadro similar ao da deficiência do Fator H. O Inibidor de C1 associa-se ao C1r e C1s, impedindo a ligação do C1q e conseqüentemente, a ativação da via clássica. Além da associação ao C1r-C1s, esta molécula também regula a ativação do Fator de Hageman e da calicreína, que ativadas aumentam a formação de bradicinina, importante no aumento da permeabilidade vascular (Capítulo 3). A deficiência desta molécula portanto, causa um desequilíbrio na ativação da via clássica, com aumento na clivagem de C4 e C2 e na formação de bradicinina. A clivagem de C2 gera o C2b, que também é uma cinina, e que juntamente com a bradicinina, leva ao edema característico desta síndrome conhecida como Edema Angioneurótico Hereditário (HANE). Esta síndrome caracteriza-se por crises recorrentes de edema que geralmente inicia-se na boca, espalha-se pelo pescoço e faces, podendo também afetar os intestinos. Embora o edema não possa ser previsto, existe uma relação entre o stress mental (por isso angioneurótico), a fadiga excessiva ou trauma físico e o surgimento dos sintomas. O edema geralmente persiste até o C1 sérico ser todo consumido;o que pode ocorrer entre 48-72 horas ou mesmo uma semana. Após a redução do C1, o edema desaparece mas a elevação na concentração de C1pode levar a uma nova crise de edema. O diagnóstico é sugerido pela história familiar, pela ocorrência de edema, sem prurido e urticária, cólicas gastrointestinais e edema de laringe. No período de crise, normalmente a concentração de C4 está reduzida. O tratamento consiste na administração de esteróides anabólicos ou androgênios atenuados, dentre eles o danazol, que atuam sobre os hepatócitos aumentando a síntese do Inibidor de C1. Deficiência dos inibidores de membrana das vias alternativa e clássica O DAF é uma proteína de membrana associada ao glicofosfatidilinositol expressa em células endoteliais e hemácias. A deficiência de uma das enzimas, importante na formação de ligações proteína- lipídeos, leva a falha de expressão de moléculas tais como o DAF e a CD59. A deficiência destas moléculas leva a uma doença chamada Hemoglobinúria paroxismal noturna. Esta doença é caracterizada por crises recorrentes de hemólise intravascular pela ativação descontrolada do sistema complemento na superfície das hemácias. CAP. 18 - IMUNODEFICIÊNCIAS PRIMÁRIAS 251 O CD59, assim como o DAF, é uma proteína de membrana associada a glicofosfatidilinositol expressa em várias células normais. Ela é incorporada ao complexo de ataque a membrana, inibindo a lise celular. As deficiências nos receptores de Complemento (CR3 e CR4) foram abordadas anteriormente, como a síndrome de Deficiência de Adesão do Leucócito tipo 1 (LAD-1). Outras imunodeficiências Nas últimas décadas, várias deficiências, em que os linfócitos T apresentam função alterada, embora estejam presentes em número normal ou reduzido, têm sido identificadas. Estas imunodeficiências podem não causar infecções letais, mas levam ao surgimento de doenças auto- imunes, tumores, alergias e infecções. Dentro deste grupo, existe uma grande heterogeneidade de anomalias: deficiência na expressão de subunidades de CD3, na expressão da tirosina quinase ZAP70, na síntese de citocinas, no influxo de Cálcio intracelular, na expressão de Fas e outras. IMUNODEFICIÊNCIAS PRIMÁRIAS Figura 1 – Incidência das Imunodeficiências Primárias DEFICIÊNCIAS DE LINFÓCITOS B Agamaglobulinemia associada ao cromossomo X (Síndrome de Bruton) Hipogamaglobulinemia transitória da infância Figura 2 – Produção de Igs na infância Deficiência seletiva de subclasses de IgG Deficiência seletiva de IgA Deficiência de IgG e IgA com Hiper-IgM DEFICIÊNCIA DE LT. Síndrome de DiGeorge ou aplasia tímica congênita Candidíase muco-cutânea crônica DEFICIÊNCIAS COMBINADAS DE LT E LB Imunodeficiência severa combinada (SCID – Severe Combined Immunodeficiency Disease) Imunodeficiência Severa Combinada Associada ao X (XSCID) Deficiência de adenosina desaminase (ADA) Deficiência de purina nucleosídeo fosforilase (PNP) DEFICIÊNCIA NA EXPRESSÃO DE MOLÉCULAS DO MHC-CLASSE I E II Deficiência na expressão de moléculas do MHC classe I Deficiência na expressão de moléculas do MHC classe II - ou síndrome do linfócito nu (bare). DEFEITOS NA RESPOSTA DE FAGÓCITOS E OUTRAS CÉLULAS DA RESISTÊNCIA NATURAL Doença granulomatosa crônica Figura 3 – NADPH oxidase na célula fagocítica em repouso (A.) e na célula ativada (B.) Deficiência de Glicose-6-Fosfato Desidrogenase Deficiência de mieloperoxidase Síndrome de Chediaki-Higashi Deficiência na adesão dos leucócitos Deficiência de adesão dos leucócitos - tipo 1 - (LAD-1) Deficiência de adesão dos leucócitos - tipo 2 (LAD-2) Defeitos no sistema complemento Deficiência nos componentes exclusivos da via alternativa Deficiência dos fatores B e D e Properdina Deficiência nos componentes exclusivos da via clássica (C1, C4 e C2). Deficiência no componente C3 Deficiência nos componentes terminais Deficiência dos inibidores séricos das vias alternativa e clássica Deficiência dos inibidores de membrana das vias alternativa e clássica Outras imunodeficiências
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