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1- DEFINIR E CLASSIFICAR ABDOME AGUDO (DAR EXEMPLOS) Abdome agudo: é um quadro clínico caracterizado por dor abdominal não traumática, de início súbito ou de evolução progressiva, que necessita de definição diagnóstica e de conduta terapêutica imediata, onde a maioria dos casos requer encaminhamento cirúrgico. De 1- 72 hs não ultrapassa 7 dias. Classificação sindrômica 1. Inflamatório (infeccioso): causado por processo inflamatório ou infeccioso localizado na cavidade abdominal ou em órgão e estruturas adjacentes. EX.: apendicite aguda, colecistite aguda, pancreatite aguda, diverticulite dos colos, DIP, abscessos intracavitários e febre do Mediterrâneo. Características: dor de início insidioso, com agravamento e localização com o tempo. O paciente apresenta sinais sistêmicos, como febre e taquicardia. 2. Perfurativo: perfuração de víscera oca. EX.: úlcera péptica, CA gastrointestinal, processos inflamatórios intestinais (febre tifóide, amebíase, doença de Crohn), perfuração de divertículos de colo, perfuração de apendicite, perfuração de vesícula. Características: dor súbita e intensa, com defesa abdominal e irritação peritoneal. Há derrame do conteúdo da víscera oca no peritônio. 3. Obstrutivo: decorre de obstrução intestinal. EX.: obstrução pilórica, hérnias, bridas, áscaris, corpos estranhos, cálculo biliar, vólvulo e intussuscepção intestinal. Características: dor em cólica, geralmente periumbilical. Associadamente surgem náuseas, vômitos, distensão abdominal, parada da eliminação de flatos e fezes. 4. Vascular (isquêmico): isquemia intestinal. EX.: trombose de a. mesentérica, torção do grande omento, torção do pedículo de cisto ovariano, infarto esplênico. Características: dor difusa e mal definida, há desproporção entre a dor e o exame físico. 5. Hemorrágico: hemorragia intra- abdominal espontânea. EX.: prenhez ectópica, rotura de aneurisma de aorta abdominal, cisto hemorrágico de ovário, rotura de baço, endometriose, necrose tumoral Características: dor intensa, com rigidez e dor à descompressão; há sinais de hipovolemia (hipotensão, taquicardia, palidez e sudorese) → Existem causas não cirúrgicas de dor abdominal 2- DISCUTIR A FISIOPATOLOGIA, ETIOLOGIA, QUADRO CLÍNICO E CONDUÇÃO DO ABDOME AGUDO INFLAMATÓRIO. ETIOLOGIA As principais são: apendicite aguda; colecistite aguda; pancreatite aguda e diverticulite aguda. FISIOPATOLOGIA Está relacionada com reações do peritônio e as modificações do funcionamento no trânsito intestinal. A cavidade peritoneal é revestida pelo peritônio (memb. serosa derivada do mesênquima, que possui uma rede capilar sanguínea e linfática, com função protetora por meio da exsudação, absorção e formação de aderências). O peritônio é dividido em visceral (inervado pelo SNA) e parietal (SN cerebroespinal, o msm da musculatura da parede abdominal). P. visceral: Todo agente inflamatório ou infeccioso, ao atingir o peritônio, acarreta irritação→ segue a instalação progressiva de íleo paralítico localizado e generalizado. (toda vez que uma serosa q envolve uma musculatura lisa sofre irritação, esta entra em paresia ou paralisia) → a dor é mal localizada (originada pela distensão e contração das vísceras) P. parietal: sua resposta se exterioriza clinicamente por dor mais bem localizada e contratura da musculatura abdominal localizada ou generalizada → dor mais localizada, contínua, progressiva, piora com a movimentação. QUADRO CLÍNICO - Dor abdominal: progressiva de difícil caracterização pelo paciente e má interpretação pelo médico. É comum exacerbação da dor com a movimentação e esforço. - Outros sintomas: náuseas e vômitos, alteração no hábito intestinal, especialmente constipação (na fase avançada da doença devido a peritonite), disúria e polaciúria, podem acompanhar quadros de apendicite de localização retrocecal e, mais frequentemente, quadros de diverticulite do sigmóide. Febre depende, geralmente baixa. DIAGNÓSTICO ● Diagnóstico clínico O diagnóstico da síndrome de AAI é fundamentalmente clínico. 1. Apendicite aguda - Fisiopatologia: obstrução do lúmen apendicular por corpo estranho (fecalito) ou processo inflamatório. - Dor inicialmente localizada no epigástrio e na região periumbilical e depois se localiza na fossa ilíaca direita. De caráter contínuo, piora com a movimentação, podendo ser acompanhada de náuseas e vômitos, além de febre e calafrios. Pode revelar alguns sinais de comprometimento peritoneal como defesa à palpação (voluntária), rigidez abdominal (involuntária) e até presença de descompressão brusca (sinal de Blumberg) - Sinais sugestivos de apendicite aguda: Blumberg em FID, Rovsing. Sinal do psoas (dor à extensão da coxa - apendicite retroperitoneal e retrocecal), sinal do obturador (dor à rotação interna da coxa - apendicite pélvica), sinal de Rovsing (dor no quadrante inferior direito quando se palpa o quadrante inferior esquerdo). - Dor na percussão é expressão da irritação peritoneal localizada - Diminuição de ruídos hidroaéreos (principalmente na fase mais avançada). ** Diagnosticada precocemente, a apendicite mostra sinais de peritonismo localizado, tornando- se difusa à medida que o processo inflamatório atinge toda a serosa peritoneal. 2. Colecistite aguda - Fisiopatologia: inflamação química e/ou bacteriana da VB, na maioria das vezes desencadeada a partir da obstrução do ducto cístico. - Dor inicialmente em cólica e depois torna- se contínua devido aos fenômenos vasculares e inflamatórios. Frequentemente associada a ingestão de alimentos. - Dor inicialmente localizada em HD, segue-se irradiação para epigástrio, dorso e difusa p o abdome na vigência de complicações. - Outros sintomas: febre e icterícia - Posição antálgica, discreta distensão, hipersensibilidade em HD, sinal de Murphy, dor ao nível do HD na percussão devido a irritação do peritônio visceral, Ruídos hidroaéreos normais ou diminuídos. 3. Pancreatite aguda - Fisiopatologia: processo inflamatório→ ação enzimática → edema, hemorragia e necrose - Dor abdominal intensa, inicialmente epigástrica e irradiada para o dorso, em faixa ou para todo o abdome - Outros sintomas: náuseas e vômitos, parada de eliminação de flatos e fezes. - Repercussão sistêmica que vai da hipovolemia ao comprometimento de múltiplos órgãos. 4. Diverticular dos colos - Fisiopatologia: processo inflamatório de um ou mais divertículos, podendo estender- se às estruturas vizinhas. - Diverticulite do sigmóide: manifestações vão desde irritação peritoneal até quadros de peritonite generalizada. Dor abdominal em FIE ou na região suprapúbica, pode ser contínua ou em cólica, pode irradiar para o dorso - Outros sintomas: anorexia e náuseas, alterações do trânsito intestinal (obstipação e algumas vezes náuseas), se atingir a bexiga ou om ureter→ disúria e polaciúria - Exame físico: paciente febril, pouco taquicárdico, abdome discretamente distendido, ruídos hidroaéreos diminuídos, descompressão brusca positiva, percussão dolorosa em FIE, região suprapúbica ou generalizada. Pode ser palpada massa em FIE. ● EXAMES COMPLEMENTARES 1. Laboratoriais: Hemograma: (leucocitose) → inflamação; glóbulos vermelhos (eritrócitos, hematócrito e hemoglobina) → avaliação do estado de hidratação do doente. VHS: valores baixos podem indicar caráter agudo do processo; níveis elevados indicam processo inflamatório ou infeccioso crônico, eventualmente agudizado. Demora mais p elevar do que a PCR. Pancreatite: Amilase (eleva-se nas primeiras 24-48hs) e lipase (eleva- se mais tardiamente); glicemia, transaminase, cálcio, sódio , potássio, gasometria arterial. HCG- para mulheres em idade fértil. Exame de urina→ diagnóstico diferencial com processos inflamatórios ou infecciosos do trato urinário. 2. Imagem RX de abdome (calcificações, distensão e volvos) dorsal e ortostático, RX detórax em posição ortostática (pneumoperitônio), USG (cálculos biliares, avaliação da parede da VB e a presença de líquido em sua imediação, calibre de ductos biliares intra e extra- hepáticos, detecta líquido intraperitoneal), TC (muitas causas de abdome agudo e suas complicações podem ser identificadas, ótima p; apendicite) 3. Laparoscopia diagnóstica (POR VIDEO, SE PRECISAR ABRE) As vantagens incluem alta sensibilidade e a especificidade, a capacidade de tratar laparoscopicamente várias condições que causam um abdome agudo, e ter menor morbimortalidade, menor tempo de permanência hospitalar e menores custos hospitalares. Acurácia diagnóstica é elevada; variando de 90% a 100%, reconhecendo no entanto que há limitações para a identificação dos processos retroperitoneais. → Apendicite aguda Hemograma → leucocitose USG, TC ● Score de triagem Alvorado → Colecistite aguda USG, TC, RX → Pancreatite aguda Amilase , lipase TC, RNM → Diverticulite aguda RX (pode mostrar pneumoperitônio e/ ou obstruções), enema opaco, TC, colonoscopia. TRATAMENTO O tratamento do AAI baseia-se em tratamento de suporte e específico: 1. Analgesia; 2. Reposição volêmica; 3. Correção de distúrbios eletrolíticos; (vômito, diarreia, choque) 4. Tratamento do íleo adinâmico → jejum, sonda nasogástrica nos casos de distensão gástrica e intestino delgado considerável ou vômitos incoercíveis; 5. Antibioticoterapia ou antibioticoprofilaxia; 6. Tratamento de falência orgânica se houver → internamento em UTI (mais comumente observado na pancreatite aguda grave). *Intervenção cirúrgica Tratamento específico: Apendicite aguda - A apendicectomia é o tratamento padrão da apendicite complicada e não complicada; - Para a apendicite não complicada → apendicectomia dentro de 12 horas após o diagnóstico; Antibioticoprofilaxia 1 hora antes da cirurgia para aqueles que serão abordados imediatamente e antibioticoterapia venosa para os que esperarão por tempo maior a cirurgia; Pacientes instáveis com apendicite perfurada devem ser submetidos à cirurgia imediatamente; para os estáveis, antibioticoterapia inicial e drenagem percutânea de coleções localizadas com apendicectomia 6 a 8 semanas após pode ser uma alternativa; Pode ser por videolaparoscopia ou laparotomia; Estudos recentes analisaram o manejo com antibioticoterapia isolada em indivíduos com apendicite aguda não complicada, sugerindo que essa pode ser uma estratégia viável na possibilidade de seguimento dos pacientes, entretanto não existem evidências suficientes que indiquem seu uso rotineiro, uma vez que muitos desses pacientes necessitarão de abordagem cirúrgica na evolução do quadro. Colecistite aguda - Antibioticoterapia empírica: cefazolina, cefuroxima ou ceftriaxona nos casos leves a moderado → nos casos mais graves podem ser usados carbapenêmicos, betalactâmicos com inibidores de betalactamase, fluoroquinolonas com metronidazol. Colecistectomia de emergência em pacientes com instabilidade hemodinâmica ou dor intratável e para aqueles com complicações; - Para os indivíduos estáveis, a colecistectomia deve ser realizada no mesmo internamento, dentro de três dias após o início dos sintomas – pacientes ASA I ou II. - Pacientes ASA III, IV ou V, sem indicação de colecistectomia de emergência, pode ser feito tratamento não cirúrgico inicialmente → antibioticoterapia e drenagem da vesícula biliar. Caso não respondam, tratamento cirúrgico deve ser instituído. Prefere-se cirurgia laparoscópica à laparotomia. Pancreatite aguda - Ressuscitação volêmica agressiva nas primeiras 24 horas; - Nutrição enteral após o quinto dia caso não tolere dieta oral; - Antibioticoterapia em caso de infecção documentada a partir da segunda semana de suporte clínico; - Estão indicadas terapias minimamente invasivas nos casos de complicações a partir da quarta semana, como a ultrassonografia endoscópica em vigência de pseudocisto pancreático; - CPRE nos casos de pancreatite secundária a colelitíase com evidência de colangite sobreposta. Diverticulite aguda Tratamento hospitalar da diverticulite não complicada: o Antibioticoterapia venosa contra gram-negativos e anaeróbios; o Analgesia; o Reposição volêmica; o Dieta zero para repouso intestinal, com retorno em 2 a 3 dias; Nos casos leves → continuação ou início do tratamento em caráter ambulatorial com antibioticoterapia oral por 7 a 10 dias, evolução gradual da dieta, com reavaliações a cada 2 a 3 dias inicialmente em semanalmente até resolução completa do quadro; Pacientes estáveis hemodinamicamente devem ser submetidos à ressecção definitiva do segmento colônico acometido → Em pacientes classificados como Hinchey I ou II pode-se proceder à anastomose primária com ou sem ostomia protetora; Pacientes instáveis necessitam de abordagem menos invasiva, como ressecção limitada ou drenagem percutânea de coleções → procedimento à Hartmann é preferido à anastomose primária em pacientes com apresentações mais graves (Hinchey III ou IV); → Orientar dieta rica em fibra; Nos casos de primeiro episódio de diverticulite aguda, com apresentação leve, não é mandatória a indicação de colectomia. DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL 3- REVISAR A FISIOPATOLOGIA DA DOR NO ABDOME AGUDO. A dor abdominal poder ser de origem somática ou visceral, referida, ou irradiada ou originada a partir de mediadores inflamatórios que estimula as terminações nervosas resultando em dor localizada. Da transmissão da dor abdominal participam as duas seguintes vias sensitivas aferentes: (1) do sistema nervoso cerebrospinal que transmite a dor somática (também chamada de parietal) proveniente da parede do abdômen, (2) do sistema nervoso autônomo, no qual o sistema simpático aferente (divisão toracolombar) é o responsável pela condução dos impulsos sensitivos das vísceras e outras estruturas anatômicas da cavidade celômica. O parassimpático aferente não participa da dor abdominal, sendo que o mesmo ocorre, obviamente, com as vias eferentes autônomas, com seu neurônio pré-ganglionar, tendo como mediadores a acetilcolina e a noradrenalina. Sistema Nervoso Cerebrospinal Inervação da Parede Abdominal. Todos os planos anatômicos que limitam a cavidade abdominopélvica são inervados pelo sexto ao décimo segundo nervos torácicos (T6 a T12), pelo primeiro nervo lombar (L1) e nervo frênico. A inervação somática, (também chamada de parietal) é muito densa, especialmente na pele, no peritônio parietal e nas raízes dos mesos. Na parede do abdômen, cada dermatômero, juntamente com a musculatura estriada subjacente, o peritônio, parietal e as raízes dos mesos recebem fibras somáticas aferentes de um mesmo nervo espinhal. É importante assinalar que nos limites cutâneos entre um dermatômero e outro existe uma superposição da inervação que conduz à sensibilidade dolorosa. Receptores da Sensibilidade Somática da Parede Abdominal. Os receptores podem ser: 1. Da sensibilidade superficial ou cutânea: (a) dor - seus receptores formam uma vasta rede de terminações nervosas livres na pele, as quais são sensíveis à picada, ao corte, aumento de tensão nos tecidos, traumatismos diversos etc. A reação inflamatória é muito dolorosa quando acompanhada de exsudato ou edema, uma vez que eles reduzem drasticamente o limiar da sensibilidade à dor, transformando em dolorosos os estímulos comumente inócuos; 2. Das sensações profundas da parede do abdômen, como os corpúsculos de Vater-Paccini, através dos quais a sensação de pressão pode manifestar-se por dor, pelos fusos nervosos musculares e também pelas terminações livres das fibras responsáveis pela inervação do peritônio, parietal e raízes dos mesos. Sistema Nervoso Autônomo Plexos Nervosos. Existem na cavidade abdominopélvica quatro importantes plexos: (1) celíaco ou solar, localizado ventral e lateralmente ao tronco arterial celíaco. Seus ramos seguemos vasos sangüíneos, especialmente as artérias, e vão constituir os plexos hepático, gástrico, frênico, esplênico, supra-renal e renal; (2) plexo mesentérico superior; (3) plexo, mesentérico inferior, (4) plexo pélvico ou hipogástrico. Simpático Aferente do Abdômen Receptores Simpáticos Viscerais. O estômago e o intestino são insensíveis ao corte e à queimadura (p. ex.: cauterização), ao estímulo pela corrente farádica, à picada etc. Os órgãos abdominais são sensíveis, por exemplo, aos seguintes estímulos: (a) aumento da tensão da musculatura lisa da parede de órgãos ocos, como o estômago, as vias biliares, o intestino, tanto por espasmo como por distensão, (b) aumento de tensão produzido pelo edema e congestão vascular secundária à reação inflamatória da parede da víscera, o que diminui acentuadamente o limiar da dor visceral; (c) rápida distensão da cápsula de órgãos sólidos ou parenquimatosos, como o fígado, o baço e os rins; (d) isquemia do intestino. As terminações nervosas entéricas; são muito suscetíveis ao estímulo provocado pelas substâncias químicas liberadas pela hipoxia. Exemplos: a angina intestinal, o estrangulamento entérico, a trombose mesentérica etc.: (e) distensão da túnica adventícia das artérias do abdômen, pois ela é muito inervada, como ocorre nó aneurisma dissecante da aorta. Inervação Simpática das Vísceras Abdominais 1. A via simpática sensitiva aferente do fígado, vesícula e vias biliares, estômago, duodeno, pâncreas, baço e rins atinge a medula espinhal ao nível do sexto, sétimo e oitavo nervos torácicos (T6, T7 e T8). 2. Às fibras do intestino delgado, o apêndice vermiforme e a porção superior dos ureteres correspondem ao nono e décimo nervos torácicos (T9, T10), onde penetram na medula espinhal. 3. A via simpática dos órgãos citados abaixo penetram na medula espinhal em vários níveis: (a) ceco, cólon ascendente: T10, T11 e T12; (b) cólon transverso: T12 e L1; (C) cólon descendente: T12 e L1 23 ; (d) reto e bexiga: plexo pélvico; (e) porção média e inferior do ureter: T11, T12 e L1. Comentário. Do exposto, seis fatos se destacam em relação as bases anatomofisiológicas da dor abdominal: (1) a inervação sensitiva visceral é muito esparsa se a comparamos com a inervação somática da pele e peritônio parietal; (2) o gânglio, dorsal da raiz dorsal dos nervos torácicos (T6 a T12) e do primeiro nervo lombar (L1) contém não só os corpos celulares dos neurônios unipolares da via aferente sensitiva simpática visceral como também os da via aferente sensitiva somática dos nervos acima citados; (3) os impulsos das terminações nervosas viscerais chegam ao mesmo ponto de recepção das células do corno posterior da medula espinhal que os impulsos de origem somática. Assim podemos compreender a distribuição da dor nas doenças viscerais, a qual será sentida na área somática ou peritoneal que partilha de uma via final comum; (4) os feixes espinotalâmicos laterais conduzem tanto os impulsos viscerais autônomos como os de origem somática; (5) a inervação das vísceras abdominais pelo sexto ao décimo segundo nervos torácicos (T6 a T12) explica a ocorrência de dor abdominal originada em afecção do tórax; (6) o cérebro tem a imagem corporal da parede abdominal e por isso pode localizar a dor com o auxílio de um ou dois dedos, o que não acontece com os impulsos oriundos das vísceras abdominais, pobremente localizados por ele. Tipos de Dor Abdominal. Distinguimos três tipos de dor:(1) somática (também chamada parietal); (2) visceral; e (3) irradiada (também denominada referida). É importantíssimo distinguir uma dor oriunda de afecção clínica daquela do abdômen agudo cirúrgico. Dor Somática Características: bem localizada, bem definida e próxima ao ponto onde ocorrem o estímulo ou a irritação dos planos anatômicos da parede do abdômen. Como existem receptores em grande número e muito próximos uns dos outros, um pequeno estimulo, como uma alfinetada, pode excitar vários receptores, fazendo com que haja um rápida resposta dolorosa, que habitualmente leva o organismo a se defender desse estímulo nocivo. A lesão tissular produz a liberação de substâncias químicas diversas, já citadas anteriormente e que vão estimular as terminações nervosas. O peritônio parietal é estimulado por agentes químicos, bacterianos ou mistos, como ocorre nas fístulas digestivas, com o escape de bile, sucos gástrico, pancreático e entérico, bem como a exposição rápida de grande quantidade de sangue e urina. A irritação pelos agentes bacterianos, como o pus, é observada nas diversas infecções agudas das vísceras da cavidade celômica, como a apendicite aguda, a colecistite aguda, a pancreatite aguda, diverticulite etc. Na peritonite, a dor é constante, sendo sua localização relacionada com o órgão doente. O enfermo mostra, com os dedos, o ponto que dói. Ela aumenta com os movimentos do paciente no leito, a tosse e a deambulação. Por isto freqüentemente ele permanece imóvel na cama, ao contrário dos portadores de dor tipo cólica, de origem visceral, que se apresentam inquietos. A dor somática oriunda de irritação do peritônio parietal se acompanha de contratura reflexa de forma localizada ou generalizada da musculatura estriada da parede do abdômen. A úlcera cloridropéptica gastroduodenal, com perfuração livre, determina o abdômen em tábua, pela grande extensão do estímulo peritoneal. A contratura muscular é o substrato anatômico da irritação do peritônio parietal, caracterizando o abdômen agudo cirúrgico. Deve ser diferenciada da contração voluntária ou daquela que ocorre, por exemplo, em doença extra-abdominal, sobretudo as do tórax. Neste último caso, a contratura pode ser desfeita se aumentamos a força de palpação exercida pela mão do examinador, sem haver aumento da dor. A hiperalgesia cutânea é freqüente. É preciso chamar a atenção, contudo, para o fato de que a irritação do peritônio parietal pélvico não causa rigidez da musculatura da parede do abdômen. As afecções que mais freqüentemente podem provocar a irritação do peritônio parietal podem ser agrupadas em cinco itens: (a) síndromes inflamatórias: formas agudas dá apendicite, colecistite, pancreatite, diverticulite etc.; (b) síndrome de perfuração: úlcera cloridropéptica gastroduodenal com perfuração livre, ruptura traumática de víscera oca, perfuração de carcinoma gastroduodenal, perfuração por corpo estranho, perfuração na trombose mesentérica etc.; (c) síndromes hemorrágicas: gravidez ectópica rota, ruptura do baço, do fígado ou de aneurismas da aorta abdominal e de seus ramos; (d) síndrome de oclusão: obstrução intestinal mecânica estrangulada, com gangrena da alça entérica; (e) síndrome traumática: resulta de traumatismo fechado ou aberto do abdômen. Dor visceral Os estímulos que causam a dor abdominal visceral variam conforme o tipo de tecido orgânico afetado, como as vísceras parenquimatosas do abdômen, as ocas, as artérias esplâncnicas etc. Caracteriza-se por ser profunda, difusa, mal definida, podendo localizar-se na linha média do abdômen (regiões epigástrica, periumbilical e hipogástrica), ou nos quadrantes da parede abdominal, dependendo da inervação da víscera de onde partem os estímulos. A dor visceral não se acompanha de contração da musculatura estriada da parede abdominal. Como exemplo de dor visceral citamos a obstrução intestinal mecânica simples, na qual o peristaltismo, de luta do segmento entérico a montante do ponto de oclusão determina dor tipo cólica, rítmica, repetindo-se, periodicamente até que ocorra a fase de fadiga muscular, caso o tratamento cirúrgico não tenha sido feito mal s precocemente. Podemos mencionar também a dor tipo cólica em conseqüência do espasmo ou distensão súbita dos dutos biliares ou ureteres, ocasião em que o enfermo se mostra agitado, inquieto, sem conseguir uma posição adequada.7 Dor Irradiada A dor irradiada é considerada como a dor de uma estrutura orgânica quepode ser percebida pelo sistema nervoso como se fosse proveniente de outro órgão, em virtude de mútuas interconexões nervosas. Participam da dor irradiada o sistema simpático aferente e os nervos torácicos, não havendo um consenso entre os pesquisadores sobre o seu mecanismo. Uma hipótese é a seguinte: Os impulsos aferentes viscerais chegam ao mesmo neurônio localizado no corno posterior da medula espinhal, que os impulsos aferentes somáticos, isto é, múltiplas estruturas de várias localizações, podem se projetar no mesmo segmento modular e daí seguir até o córtex cerebral, onde são percebidos e localizados erroneamente. Os impulsos aferentes da colecistite aguda, juntamente com os provenientes da parede abdominal, sobretudo da pele e do peritônio parietal, podem se convergir, através de várias vias, e alcançar o sétimo e o oitavo nervos torácicos, de onde são conduzidos ao córtex cerebral, que interpreta a dor nos dermatômeros correspondentes a estes dois nervos, uma vez que as fibras somáticas aferentes, especialmente as cutâneas, são mais numerosas e melhor condicionadas do que as fibras sensitivas viscerais. Daí ser freqüente a dor irradiada subescapular direita, oriunda da colecistite aguda. Referências - Abdome agudo. USP. Omar Feres, 2008. - Abdome agudo: clínica e imagem /editores Antonio Carlos Lopes, Samuel Reibscheid, Jacob Szejnfeld. —São Paulo: Editora Atheneu, 2006. - Sabiston tratado de cirurgia. 19 ed - Clínica cirúrgica da USP. vol 1 - Capítulo 02.02. Fisiopatologia da Dor Abdominal .Geraldo Boaventura Leite Sobrinho