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1 Hormônios e Ambiente Jurandy Mauro Penitente Filho 48756 ZOO 670 – Bioclimatologia Animal 06/04/2011 Introdução O termo estresse foi utilizado pela primeira vez pelo austríaco Hans Selye, em 1936, que o definiu como sendo o estado do organismo, o qual, após a atuação de agentes de quaisquer naturezas, responde com uma série de adaptações, entre as quais estão em primeiro plano uma hipertrofia do córtex da glândula adrenal com consequente aumento da secreção de seus hormônios. A todo fator exógeno que provoca um estresse dava-se o nome de estressor, entretanto, tal denominação foi modificada ao longo dos anos, denominando-se os fatores exógenos que provocam o estresse com o próprio nome de estresse (calor, frio, umidade, fome, sede, esforço físico, infecções, dor, poluição sonora, elevada densidade populacional, isolamento, medo, ansiedade, entre outros). A interação entre estímulo e a resposta ao estímulo manifesta-se na forma de uma síndrome, a síndrome da adaptação geral, com a qual o organismo busca evitar ou reduzir os efeitos de um estresse. Durante o estresse, embora ocorram mudanças em quase todo o sistema endócrino, a ativação do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal talvez seja a mais importante resposta do organismo animal a condições de estresse. A adrenal é uma pequena glândula localizada acima de cada rim, compreende duas partes histologicamente distintas: a medula, onde são produzidas as catecolaminas (adrenalina e noradrenalina) relacionadas com a resposta rápida a determinados estímulos (reflexo de luta ou fuga); e o córtex, responsável pela produção de corticóides e de alguns hormônios sexuais. Mudanças hormonais durante o estresse por calor As secreções hormonais estão entre os principais fatores de termorregulação do organismo. Durante o estresse por calor, os hormônios liberadores hipotalâmicos têm suas secreções reduzidas, consequentemente, os hormônios hipofisários também têm suas liberações diminuídas, o que afeta praticamente todos os hormônios do organismo. 2 Insulina: A insulina é produzida pelas células beta do pâncreas e o estímulo para sua liberação é o aumento das concentrações sanguíneas de glicose. A insulina possui efeitos profundos no metabolismo animal. Aumenta a síntese de triglicérides, proteínas, VLDL, colesterol, glicogênio, além de inibir a gliconeogênese e a glicogenólise. Estudos mostram que em altas temperaturas, ocorre redução dos níveis plasmáticos de insulina em novilhas (-54%) e bezerros (-30%) da raça Friesian, contudo, em touros da raça Friesian não houve diferença dos níveis séricos de insulina entre animais submetidos ao estresse por calor e não submetidos. Vacas da raça Holstein mostraram queda (-22%) dos níveis plasmáticos de insulina durante o verão em relação ao inverno. Esta redução da concentração sérica de insulina pode ser devido à diminuição da produção de calor pelo organismo em altas temperaturas. Hormônios da Tireóide: O controle da secreção dos hormônios da tireóide, triiodotironina (T3) e tiroxina (T4), se dá pelo hormônio hipofisário TSH (tireotropina), o TSH por sua vez tem sua secreção controlada pelo hormônio hipotalâmico TRH (hormônio liberador da tireotropina). A glândula tireóide produz os hormônios T3 e T4, mas é o T3 o hormônio mais ativo, contudo a produção de T4 é maior, o T4 é convertido a T3 nos tecidos por deiodinases e é considerado um pró- hormônio. Estudos demonstram que durante o estresse por calor, ocorre redução da atividade da glândula tireóide com redução dos níveis séricos de T3 e T4. Tal redução leva a uma diminuição das taxas de metabolismo basal para reduzir a produção de calor. A redução da secreção dos hormônios da tireóide não ocorre abruptamente, mas sim em exposições prolongadas a altas temperaturas. Em vacas Friesian, quarenta e oito horas de exposição ao estresse por calor podem promover uma queda de 15% nos níveis dos hormônios da tireóide e esta queda pode chegar a 37% em 72 horas. O principal regulador exógeno de atividade da glândula tireóide é a temperatura ambiente, portanto, uma relação inversa entre a temperatura ambiente e as concentrações dos hormônios da tireóide no sangue já foi encontrado em ovinos e caprinos. Durante o estresse por calor, as concentrações sanguíneas de T3 e T4, bem como a taxa metabólica, o consumo de ração, o crescimento e a produção de leite são reduzidos. 3 Corticóides: Os corticóides podem ser diferenciados em dois tipos quanto às suas ações fisiológicas: os mineralocorticóides (aldosterona) responsáveis pela manutenção do balanço de Na + e K + ; e os glicocorticóides, que influenciam o metabolismo dos carboidratos, lipídios e proteínas. Os glicocorticóides induzem a formação de glicose (gliconeogênese), através da mobilização de proteínas e gorduras, tendo como resultados o aumento das concentrações séricas de glicose. Simultaneamente ao estímulo à gliconeogênese, ocorre inibição da síntese de ácidos graxos no fígado e se observa uma reduzida utilização de glicose nos tecidos adiposo e muscular. A gliconeogênese promovida pelos glicocorticóides desempenha importante papel na adaptação do organismo ao estresse, onde mais glicose (energia) é disponibilizada ao metabolismo celular Os glicocorticóides ainda possuem um efeito catabólico sobre os tecidos conjuntivo, ósseo e linfático. O efeito linfocítico é responsável pela atrofia do sistema timolinfático, principalmente do timo. Os glicocorticóides promovem aumento do número de trombócitos e leucócitos totais, enquanto o número de linfócitos e eosinófilos é reduzido. Os glicocorticóides possuem efeito antiinflamatório e antialérgico, amplamente utilizado pela medicina humana e veterinária. Os mais importantes glicocorticóides são o cortisol, corticosterona, cortisona, 11- desoxicortisol, 18-hidroxicorticosterona (naturais) e predsinona, predsinolona e dexametasona (sintéticos). Dentre esses glicocorticóides destacam-se o cortisol e a costicosterona. O controle da secreção dos glicocorticóides se dá pelo hormônio hipofisário ACTH (hormônio adrenocorticotrófico ou corticotropina). O ACTH por sua vez tem sua secreção controlada pelo hormônio hipotalâmico CRH (hormônio liberador da corticotropina). A concentração plasmática de glicocorticóides é regulada por feedback negativo. Em condições normais a concentração sanguínea de glicocorticóides atua principalmente no hipotálamo, inibindo a secreção de CRH, resultando daí uma redução da produção de ACTH pela hipófise e, consequentemente, uma menor produção e secreção dos próprios hormônios corticóides. Tão logo cai a concentração dos glicocorticóides (degradação hepática), cessa o efeito inibidor sobre o hipotálamo e o CRH é novamente secretado. Cortisol: Os efeitos de altas temperaturas nas concentrações plasmáticas de cortisol apresentam resultados conflitantes na literatura. Alguns autores apontam aumento dos níveis de cortisol em estresse por calor, outros autores mostram haver redução dos níveis e ainda outros 4 mostram não haver diferenças significativas. Contudo, Alvarez e Johnson (1973) mostraram que os níveis de cortisol aumentaram 62% após 2 horas de exposição dos animais a condições de clima quente, atingindo um pico de 120% em 4 horas de exposição, então, os níveis de cortisol declinaram gradualmente a valores não diferentes do normal com 48 horas de exposição e permaneceram normais ou abaixo pelo restante do tempo de exposição ao calor. Aldosterona: Devido à menor retenção de potássio durante o estresse por calor, ocorre redução das concentrações séricas de Aldosterona. Uma reduçãosignificativa nos níveis plasmáticos de aldosterona em bovinos foi observada após 24 horas de exposição ao calor. Isso foi associado com um ligeiro aumento na excreção urinária de sódio e uma significativa redução do sódio sérico. Tanto as concentrações séricas quanto as urinárias de potássio foram significativamente menores no calor. Corticosterona: A concentração de corticosterona no plasma é utilizada como parâmetro para medir o estresse em aves. Aumentos nas concentrações plasmáticas de corticosterona já foram observados em frangos de corte submetidos ao estresse por calor, houve aumento na taxa de quebra de proteína muscular com consequente elevação da produção de calor e piora no desempenho. Sabe-se que a corticosterona secretada pela adrenal participa da regulação de padrões comportamentais em aves, como também da utilização dos diferentes tipos de reservas energéticas não só durante o voo migratório, como também em resposta às alterações ambientais onde seus níveis encontram-se elevados. Quando uma ave encontra um estressor, a sua primeira linha de defesa envolve a ativação do sistema neurogênico. Adrenalina e noradrenalina são liberadas na corrente sanguínea, causando um aumento significativo da pressão arterial, do tônus muscular, dos níveis séricos de glicose e da frequência respiratória. Após esta reação, e com a retirada do estresse, as respostas são normalizadas com consequências mínimas para o animal. No entanto, se o estresse é crônico, a ave deve se adaptar ao estressor para manter a homeostase, assim, o crescimento e a eficiência de utilização dos nutrientes podem ser diminuídos. O estresse crônico resulta na ativação do sistema hipotálamo-hipófise-adrenal (HHA). A ativação do sistema HHA faz com que o hipotálamo produza o fator liberador de corticotrofina (CRH), que por sua vez estimula a hipófise a liberar o hormônio adrenocorticotrófico (ACTH). O ACTH na corrente sanguínea estimula as adrenais a 5 secretarem corticosterona. Se os níveis de corticosterona permanecem elevados, podem ocorrer doenças cardiovasculares, hipercolesterolemia, lesões gastrintestinais, alterações no funcionamento do sistema imunológico e alterações no metabolismo da glicose e minerais. Um dos efeitos mais importantes da corticosterona é a sua capacidade de alterar processos metabólicos. Os efeitos mais nocivos do estresse de longo prazo em frangos de corte é o catabolismo de proteínas estruturais através da gliconeogênese induzida pela corticosterona, visto que produção de glicose ocorre à custa da degradação de proteínas. As alterações metabólicas nas aves tratadas com corticosterona ou ACTH normalmente acompanham reduções significativas no peso vivo, como resultado do estresse fisiológico. Esta perda de peso é muitas vezes independente da alta ingestão alimentar. Mudanças hormonais durante o estresse por frio As principais glândulas envolvidas na resposta fisiológica ao estresse por frio são a adrenal, a tireóide e o pâncreas. Enquanto os hormônios da tireóide e as catecolaminas desempenham importantes papéis no estímulo à termogênese em suínos, bovinos e ovinos, o glucagon mostrou ser um potente calorigênico em aves. Hormônios da Tireóide: O aumento da atividade da tireóide bem como aumento da secreção de T3 e T4 durante o estresse por frio já foi relatado em suínos, bovinos e aves. Os hormônios da tireóide aumentam as taxas de metabolismo basal, controlando a expressão gênica e, especialmente, controlando o funcionamento de enzimas-chaves envolvidas na função mitocondrial, além de estimularem a atividade da bomba Na + /K + ATPase. Como foi dito anteriormente, o principal regulador exógeno de atividade da glândula tireóide é a temperatura ambiente, assim, o estresse por frio em ovelhas e cordeiros induz aumentos nos níveis circulantes dos hormônios da tireóide. O padrão sazonal dos níveis de T3 e T4 no sangue, muitas vezes mostra valores máximos durante o inverno (meses frios) e mínimos durante o verão (meses quentes). Catecolaminas: As catecolaminas (adrenalina e noradrenalina) são produzidas pela medula da adrenal e estão relacionadas com a resposta rápida a determinados estímulos (reflexo de luta ou fuga). 6 Dentre as catecolaminas, a adrenalina tem sido associada com as respostas de curta duração induzidas pelo estresse por frio. Entretanto, em exposições prolongadas ao frio, em mamíferos, o maior envolvimento do sistema nervoso simpático levará a maiores níveis circulantes de noradrenalina. Essa maior liberação de catecolaminas durante o frio é evidenciada pela maior excreção urinária destes hormônios por animais expostos a baixas temperaturas. Em mamíferos, a liberação de catecolaminas durante o frio está relacionada, em parte, com ajustes cardiovasculares levando a máxima produção de calor (aumento do fluxo sanguíneo para os órgãos produtores de calor) e mínima perda de calor (vasoconstrição periférica), e em parte por ações diretas na termogênese. As catecolaminas promovem a mobilização de ácidos graxos e glicose, disponibilizando substratos energéticos para o organismo. Em aves, as catecolaminas mostraram ter pouco ou nenhum efeito calorigênico, provavelmente porque as catecolaminas não são os principais hormônios envolvidos na mobilização de substratos energéticos nesta classe. Glucagon: O principal hormônio envolvido na resposta ao frio em aves é o glucagon. Produzido pelas células alfa pancreáticas, o glucagon promove hiperglicemia através do estímulo à degradação do glicogênio e do estímulo à gliconeogênese. Em aves, o glucagon possui forte efeito lipolítico, glicogenolítico e calorigênico, efeitos observados em patos, gansos e galinhas, e aumenta a produção de calor em até 75% em codornas. Durante a exposição ao frio, a administração de glucagon em patos inibiu os tremores, mas a termogênese não foi suprimida, mostrando uma ação de termogênese independente de tremor nestas aves. 7 Referências ALVAREZ, M. B.; JOHNSON, H. D. Environmental Heat Exposure on Cattle Plasma Catecholamine and Glucocorticoids. J. Dairy Sci. v.56, p.189-194, 1973. BARRE, H.; COHEN-ADAD, F.; ROUANET, J. L. Two daily glucagon injections induce nonshivering thermogenesis in Muscovy ducklings. Am. J. Phys. v.252, p.616-620, 1987. COSTA, M.J.R.P. Bioclimatologia Animal. 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