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O FÓRUM MÚLTIPLAS PORTAS COMO POLÍTICA PÚBLICA DE ACESSO À JUSTIÇA E À PACIFICAÇÃO SOCIAL

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1 
 
 
 
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO 
MESTRADO EM DIREITO 
ÁREA DE CONCENTRAÇÃO EM DEMANDAS SOCIAIS E POLÍTICAS 
PÚBLICAS 
LINHA DE PESQUISA EM POLÍTICAS PÚBLICAS DE INCLUSÃO SOCIAL 
 
 
 
 
 
Luthyana Demarchi de Oliveira 
 
 
 
 
 
O FÓRUM MÚLTIPLAS PORTAS COMO POLÍTICA PÚBLICA DE ACESSO À 
JUSTIÇA E À PACIFICAÇÃO SOCIAL 
 
 
 
 
 
 
Santa Cruz do Sul 
2012 
2 
 
 
 
Luthyana Demarchi de Oliveira 
 
 
 
 
O FÓRUM MÚLTIPLAS PORTAS COMO POLÍTICA PÚBLICA DE ACESSO À 
JUSTIÇA E À PACIFICAÇÃO SOCIAL 
 
 
 
 
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Direito – Mestrado e Doutorado – 
Área de Concentração em Demandas Sociais e 
Políticas Públicas da Universidade de Santa Cruz 
do Sul – UNISC, como requisito parcial para 
obtenção do título de Mestre em Direito. 
 
Orientadora: Profª Pós-Doutora Fabiana Marion 
Spengler 
 
 
 
 
 
 
Santa Cruz do Sul 
2012 
3 
 
 
 
Luthyana Demarchi de Oliveira 
 
 
 
O FÓRUM MÚLTIPLAS PORTAS COMO POLÍTICA PÚBLICA DE ACESSO À 
JUSTIÇA E À PACIFICAÇÃO SOCIAL 
 
 
Esta dissertação foi submetida ao Programa de 
Pós-Graduação em Direito – Mestrado e Doutorado 
– Área de Concentração em Demandas Sociais e 
Políticas Públicas da Universidade de Santa Cruz 
do Sul – UNISC, como requisito parcial para 
obtenção do título de Mestre em Direito. 
 
 
 
_________________________________________________ 
Profª. Pós-Doutora Fabiana Marion Spengler 
Professora Orientadora 
 
___________________________________________________ 
 
 
____________________________________________________ 
 
 
4 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Aos meus pais e meus irmãos!! 
 
 
 
 
5 
 
 
 
AGRADECIMENTOS 
 
Agradecer normalmente não é um gesto fácil, mas com certeza algumas 
pessoas merecem o carinho e a atenção pela construção desse trabalho. 
O maior agradecimento é para aqueles que são os grandes responsáveis 
por tudo isso: meus pais João e Jurema!!! São para eles as palavras de carinho e 
atenção que nos momentos mais difíceis foram meus verdadeiros incentivadores. 
Não mediram esforços para que mais este objetivo fosse alcançado. Com amor e 
dedicação, deram todo o suporte necessário. Foram mestres nos ensinamentos, 
nos desafios e nos exemplos da vida. Souberam me propiciar aquilo que existe de 
mais valioso: o estudo. 
Ao meu irmão Thyago e minha cunhada Daiana, que jamais hesitaram em 
me ajudar e compreenderam meus momentos de ausência. 
À minha irmã Tathy pela compreensão e auxílio nos momentos cansativos 
e delicados. 
A minha princesa Isa, pelas alegrias e brincadeiras. 
Agradeço, também de forma particular, ao restante da minha família, que, 
durante a realização deste trabalho, sempre me incentivou e entendeu meu 
distanciamento. 
 Ainda, um carinho especial por aquela pessoa a qual aprendi a admirar e 
que me acolheu de forma tão generosa. Meu sincero agradecimento a minha 
professora ―eterna‖ orientadora: Profª Pós-Doutora Fabiana Marion Spengler, não 
apenas pelo incondicional apoio quanto aos ensinamentos e orientações dados, 
mas também pela dedicação e pelo diálogo proporcionado nesse tempo. Pela 
oportunidade de conhecer o professor Eligio Resta, pela viagem a nossa querida 
e amada Roma, pela experiência e aprendizado no projeto de extensão. Além 
disso, é importante mencionar uma gratidão imensa pelo acolhimento, exemplo de 
amor e carinho que somente a família Spengler é capaz de dar. 
Agradeço aos demais professores do Programa de Pós-Graduação, 
Mestrado em Direito da UNISC, pelos ensinamentos e incentivos à minha 
formação acadêmica. 
6 
 
 
 
Agradeço à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível 
Superior – CAPES e Conselho Nacional de Justiça- CNJ, pela bolsa concedida 
durante os anos do mestrado. 
Aos colegas, pelos momentos e pelas viagens partilhadas e aos amigos 
que souberam entender minha ausência e pelo apoio e incentivo! 
Por fim, agradeço à pessoa que me foi presenteada pelo mestrado, 
Fernando Augusto, meu amor, por toda a ajuda recebida, todo estímulo e toda 
compreensão durante essa nossa conquista. 
Muito obrigada a todos que contribuíram para essa vitória e principalmente 
a Deus! 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
7 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
―O ser humano deve desenvolver, para todos os seus conflitos, um método que 
rejeite a vingança, a agressão e a retaliação. A base para esse tipo de método é o 
amor.‖ 
Martin Luther King 
 
8 
 
 
 
RESUMO 
A presente dissertação tem como objetivo demonstrar o exaurimento do sistema 
jurisdicional na sociedade atual e, a partir disso, apresentar uma política pública 
que possa promover um tratamento mais adequado dos conflitos. Nessa esteira, 
analisar-se-á, através do método de abordagem dedutivo, tópicos considerados 
fundamentais para o desenvolvimento do tema, tais como o exaurimento do 
sistema jurisdicional e o acesso à justiça, para então tratar do modelo americano 
―múltiplas portas‖ e de sua possibilidade de adoção no Brasil, como uma política 
pública célere e eficaz no tratamento dos conflitos. Também serão investigadas as 
semelhanças e as diferenças entre a jurisdição e a política pública do modelo 
americano ―múltiplas portas‖, bem como a evolução deste último (o modelo) no 
decorrer do tempo, demarcando as deficiências que identificam a primeira (a 
jurisdição), em meio à complexidade conflitiva atual. O desenvolvimento do 
estudo dar-se-á pelo procedimento comparativo e pela técnica da pesquisa 
bibliográfica, baseada em documentação indireta. O modelo americano ―múltiplas 
portas‖ caracteriza-se por direcionar o conflito a uma ―porta‖ (dentre outras 
existentes) que se mostre como aquela que se apresente como a mais adequada 
para o tratamento do conflito. Por fim, estudar-se-á a política pública nacional de 
tratamento de conflito instituída pela Resolução n.º 125 do Conselho Nacional de 
Justiça, comparando-a com o modelo americano ―múltiplas portas‖, com o intuito 
de mostrar a construção de um novo paradigma voltado para a pacificação social. 
 
Palavras-chave: Exaurimento Jurisdicional. Acesso à Justiça. Política Pública. 
Tratamento do Conflito. Múltiplas Portas. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
9 
 
 
 
Abstract 
 
The objective of this dissertation is to show the exhaustion of the present legal 
system in today‘s society and, on this basis, propose a public policy that would 
serve as a more suitable approach to dealing with conflict. In light of this, the most 
important topics relevant to this theme, including the exhaustion of the legal 
system and access to justice, are addressed using a deductive analytical method, 
leading to the American ‗Multidoor Courthouse‘ model as an example of a rapid 
and effective means of addressing conflicts. The similarities and differences 
between the jurisdiction and public policies of the American ‗Multidoor Courthouse‘ 
model will also be investigated, as will the evolution of this model over time, 
clarifying the deficiencies found in the jurisdiction, given the complex nature of 
present day conflict. The paper is developed as a comparative study that makes 
use of secondary sources though bibliographic research. The American ‗Multidoor 
Courthouse‘ model is noted for its channeling of a conflict towards a particular 
‗door‘ (amongvarious existing options) which is considered to be the most 
appropriate means to address the conflict. To close, the national public policy for 
the treatment of conflict as addressed by Resolution No. 125 of the National 
Council of Justice, is studied and compared with the American ‗Multidoor 
Courthouse‘ model, with the objective of showing the construction of a new 
paradigm aimed at social pacification. 
 
Key-Words: Judicial Exhaustion. Access to Justice. Public Policy. Conflict 
Resolution. Multidoor Courthouse. 
. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
10 
 
 
 
SUMÁRIO 
 
INTRODUÇÃO...................................................................................................... 12 
1 O EXAURIMENTO DA PRESTAÇÃO JURISDICIONAL E O ACESSO À 
JUSTIÇA............................................................................................................... 17 
1.1 A sociedade, seus conflitos e o sistema estatal 
......................................................................................................................... .. 17 
1.2 O acesso à justiça, o exaurimento da prestação jurisdicional e seus desafios 
.............................................................................................................................. 25 
1.2.1 O acesso à justiça........................................................................................ 25 
1.2.2 O exaurimento do sistema jurisdicional........................................................ 28 
1.2.3 Os atuais desafios de acesso à justiça........................................................ 36 
1.3 A mudança de paradigma do litigio para a justiça consensual...................... 43 
2 O FÓRUM MULTIPLAS PORTAS .............................................. .................... 51 
2.1 Criação ................................................................ .......................................... 51 
2.2 Caracteríticas ................................................................................................ 56 
2.3 As portas de tratamento do conflito ............................................................... 59 
2.3.1 Negociação ................................................................................................. 61 
2.3.2 Conciliação................................................................................................... 65 
2.3.3 Mediação .................................................................................................... 69 
2.3.4 Arbitragem .................................................................................................. 76 
2.3.5 Outras portas ............................................................................................. 80 
2.3.5.1 Avaliação Preliminar Neutra ............................................................. ..... 80 
2.3.5.2 Summary Jury Trial................................................................................... 82 
2.3.5.3 Mini Trial.................................................................................................... 82 
2.3.5.4 Court- annexed arbitration ...................................................................... 83 
2.3.5.5 Med/Arb ou Arb/Med ............................................................................... 84 
2.3.5.6 Ombudsman............................................................................................. 85 
2.3.6 Adjudicação ............................................................................................ . 86 
2.3.7 O Funcionamento do Fórum Múltiplas Portas ................................... ........ 89 
3 A POLÍTICA PÚBLICA DO FÓRUM MÚLTIPLAS PORTAS .......................... 97 
3.1 O contexto democrático e as políticas públicas ............................................. 97 
11 
 
 
 
3.2 A política pública nacional de tratamento dos conflitos: um modelo múltiplas 
portas? .............................................................................................. ................. 103 
3.2.1 Os objetivos e as ações da Política Nacional de Tratamento Adequado dos 
conflito................................................................................................................. 106 
3.2.2 Dos mecanismos e da rede de tratamento do conflito 
............................................................................................. ............................... 109 
3.2.3 Dos núcleos e dos centros de tratamento de conflito e cidadania previstos 
na politica nacional............................................................. ................................ 114 
3.3 As experiências e programas as brasileiros de implementação da politica de 
tratamento do conflito nos moldes do Fórum Múltiplas Portas........................... 119 
3.4 A política pública do Fórum Multiplas Portas como mecanismo de acesso à 
justiça e a pacificação social........................................................................... ... 129 
CONCLUSÃO......................................................................................................135 
REFERÊNCIAS............................................................................................... ... 141 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
12 
 
 
 
INTRODUÇÃO 
 
Atualmente, pode-se dizer que não existe sociedade sem conflitos. A 
sociedade é movida por conflitos, em função de fatores que envolvem questões 
tecnológicas, políticas, econômicas e sociais. Para tanto, é de fundamental 
importância a análise do conflito e seus aspectos, como elemento de 
amadurecimento das relações sociais. 
 Nesse contexto, explodem os conflitos sociais, principalmente pela busca 
da garantia dos direitos. Essa explosão perpassa também pelo sistema 
jurisdicional, que não consegue dar resposta aos litígios, resultado da morosidade 
da prestação jurisdicional, do acúmulo de ações, bem como da falta de servidores 
e magistrados. Por isso, analisa-se o exaurimento do sistema jurisdicional e a 
adoção de uma política pública no modelo americano múltiplas portas1. 
 Diante do exaurimento do sistema jurisdicional que envolve diversos 
fatores, como a morosidade da prestação, burocratização, ineficiência, custas e 
aumento dos litígios, iniciam-se movimentos e programas de modo a transformar 
o paradigma vigente de litigiosidade para o da consensualidade, com o objetivo 
de tratar o conflito. Nesse contexto, surge o questionamento sobre se o sistema 
múltiplas portas pode ser aplicado à realidade brasileira como uma política pública 
de tratamento de conflitos. 
 Desse modo, o estudo objetiva analisar a aplicação do fórum múltiplas 
portas como uma política pública de tratamento dos conflitos e averiguar como 
essa política se aplica à realidade brasileira diante do quadro de exaurimento do 
sistema jurisdicional, apontando as consequências positivas de transformação do 
paradigma de consenso. 
Portanto, além de identificar e apontar os pontos de exaurimento do 
sistema jurisdicional brasileiro após Constituição de 1988, que estabeleceu como 
princípio o acesso à justiça, estudar-se-á o surgimento da legitimidade estatal e o 
modelo adotado no tratamento de conflitos, bem como apresentar-se-á os 
movimentos de reformas que objetivam o tratamento do conflito, transformando o 
paradigma da litigiosidade para o da consensualidade. 
 
1
 Cabe mencionar que o modelo pode ser denominado tanto de “multiportas” quanto “múltiplas portas”, 
sendo este último adotado na presente dissertação. 
13 
 
 
 
 Por isso, a adoção de uma políticapública de tratamento do conflito 
transforma o paradigma de litígio vigente, restaurando o diálogo e o entendimento 
dos envolvidos. Essa política, além de restabelecer o consenso e a comunicação, 
adota mecanismos de modo a tratar adequadamente o conflito. Nesse sentido, a 
aplicação de mecanismos como mediação, conciliação e arbitragem, dentre 
outros que seguem o modelo americano denominado múltiplas portas, torna-se 
uma política pública célere e eficaz de modo a enfrentar o exaurimento 
jurisdicional. 
E mais, pelas experiências e programas já implementados no Brasil, 
percebe-se que esses mecanismos são aplicados de modo eficiente no modelo 
de jurisdição brasileira, sendo que poderá realmente trazer uma nova concepção 
para a sociedade enfrentar os seus problemas e ter acesso à justiça. 
Para tanto, ante o quadro de exaurimento do sistema jurisdicional 
brasileiro, é que se justifica o presente estudo. Tornou-se frequente, na prestação 
jurisdicional, a burocracia, o formalismo, a morosidade, a ineficiência e a 
escassez de recursos, tanto de ordem financeira, quanto material ou humana. A 
explosão de litigiosidade demonstrou a necessidade de adoção de mecanismos 
de tratamento do conflito, de modo a transformar o paradigma do litígio em 
consenso, diálogo e participação. Nesse sentido, a construção de um sistema de 
tratamento de conflitos capaz de lidar com a complexidade pressupõe a adoção 
de políticas públicas que objetivam a cidadania, fraternidade e a pacificação 
social. 
 Desse modo, a pesquisa consiste em averiguar e propor a possibilidade de 
implementar vários mecanismos de tratamento de conflitos, com suas 
especificidades, junto ao Poder Judiciário brasileiro, seguindo o modelo do Fórum 
Múltiplas Portas americano, com o intuito de otimizar a prestação jurisdicional, 
para torná-la mais adequada à realidade das partes e, assim, contribuindo para a 
construção de soluções e tratamento mais céleres e eficazes. 
Ainda, salienta-se que a pesquisa faz parte das atividades realizadas junto 
ao projeto intitulado ―Multidoor Courthouse System - avaliação e implementação 
do sistema de múltiplas portas (multiportas) como instrumento para uma 
prestação jurisdicional de qualidade, célere e eficaz‖. Tal projeto é uma parceria 
entre a Universidade de Fortaleza (UNIFOR) e a Universidade de Santa Cruz do 
14 
 
 
 
Sul (UNISC); é financiado pela CAPES e pelo Conselho Nacional de Justiça e se 
conecta à linha de pesquisa - Políticas Públicas de Inclusão Social, do programa 
de mestrado da Universidade de Santa Cruz do Sul. 
Nesse contexto, é de fundamental relevância jurídica e social a avaliação e 
implementação de uma política pública de tratamento do conflito. Assim, ante os 
programas e projetos já existentes, justifica-se a adoção do modelo de múltiplas 
portas como uma política pública célere e eficaz de tratamento do conflito. Por 
isso, trata-se de um estudo desafiador e inédito não apenas para a comunidade 
acadêmica, mas também para os próprios operadores do direito, já que escassas 
são as bibliografias e as pesquisas no país sobre o assunto. 
No primeiro capítulo do trabalho, abordar-se-á o exaurimento da prestação 
jurisdicional e o acesso à justiça. Inicialmente, contextualizar-se-á a sociedade, 
seus conflitos e o sistema estatal, adentrando-se na questão do acesso à justiça, 
o exaurimento do sistema e os desafios atuais de acesso. Nesse sentido, ainda 
estudar-se-á a mudança do paradigma do litígio para uma justiça consensual. 
 Desse modo, a explosão de litigiosidade decorrente dos avanços do mundo 
moderno, bem como das complexidades das relações sociais, exige novos 
mecanismo de tratamento de conflitos. Além do tratamento do conflito, procura-se 
a transformação do paradigma do ganhar versus perder para o da 
consensualidade. O consenso surge pela teoria habermasiana do agir 
comunicativo. O consenso significa o entendimento de um acordo de 
comunicação válido. Portanto, o agir comunicativo se dá através das práticas do 
consenso e, ainda, pelo tratamento dos conflitos de forma consensual, que nesse 
contexto promove a paz e a inclusão social. 
 Após uma breve contextualização dos conflitos da sociedade, abordar-se-á 
a teoria do agir comunicativo apresentando, em seguida, os conceitos, as 
principais características da teoria de Habermas e pressupostos da prática de 
consenso do agir comunicativo. 
 Dentro desse contexto, adotam-se políticas públicas de reforma, as quais 
promovem ações que possibilitem o tratamento dos conflitos. Assim, as políticas 
públicas são ações ou programas instituídas pelo Estado, de modo a enfrentar 
determinada situação problemática ou conflituosas que objetivam a garantia de 
direitos e a participação dos cidadãos. 
15 
 
 
 
 Consequentemente, o Conselho Nacional de Justiça, órgão instituído com 
a finalidade específica de zelar e planejar, através de metas e programas, pelo 
serviço de prestação jurisdicional, cumulou a função de formular políticas públicas 
de acesso e prestação da justiça, de modo eficiente e efetivo, em benefício da 
sociedade. 
 Nesse aspecto, a política do Fórum Múltiplas Portas, denominado em 
inglês de MultiDoor Courthouse System, é um sistema no qual se disponibiliza um 
mecanismo de tratamento e uma solução do conflito para processos trazidos até o 
Poder Judiciário. Preliminarmente, faz-se uma avaliação, por meio de pessoal 
especializado, a fim de se identificar às partes ou interessados qual o instrumento 
de tratamento ou resolução de demandas (ou ―porta‖) é mais adequado à causa 
proposta. Nasce, assim, como uma alternativa para enfrentar o problema de 
exaurimento do sistema e de modo a incentivar e adotar, ainda, mecanismos 
consensuais de tratamento do conflito. 
 Desse modo, no segundo capítulo, de forma mais pontual, estudar-se-á o 
Fórum Múltiplas Portas, desde sua criação nos Estados Unidos, suas 
características e, por fim, seu funcionamento. Especificamente, são abordadas as 
portas de tratamento do conflito que são a negociação, a conciliação, a mediação 
e a arbitragem. De forma particular, apresenta-se nesse capítulo outras portas 
existentes no sistema americanos que são a avaliação neutra, o summary jury 
trial, a mini trial, a court-annexed arbitration, a med/arb e arb/med e a 
ombudsman. Por último, menciona-se a porta tradicional, conhecida por todos, a 
adjudicação. Assim, o presente estudo faz uma análise da importância dessa 
política para o sistema, traçando, através de revisões bibliográficas e de coleta de 
dados, o alcance desses mecanismos para a sociedade. 
 No terceiro capítulo, abordar-se-á a adoção de uma política múltiplas 
portas no Brasil, com a análise da Política Pública Nacional de Tratamento 
Adequado de Conflitos, nos moldes do modelo americano, apresentando os 
objetivos e ações, os mecanismos e a rede de tratamento proposto pela 
Resolução n.º 125. Ainda, especificamente, estudar-se-á os Núcleos e Centros de 
Tratamento de Conflito e Cidadania, as experiências e programas brasileiros 
implementados nos moldes da política múltiplas portas. 
16 
 
 
 
 Portanto, a metodologia de que aqui se vale é a dedutiva2, através da qual, 
a partir da abordagem de tópicos considerados fundamentais para o 
desenvolvimento do tema, tais como o exaurimento do sistema jurisdicional e o 
acesso à justiça, passa-se a tratar do modelo americano ―múltiplas portas‖ e de 
sua possibilidade de adoção no Brasil, como uma política pública célere e eficaz 
no tratamento de conflitos. Também serão investigadas as semelhanças e as 
diferenças entre a jurisdição e a política pública do modelo americano ―múltiplas 
portas‖, bem como a evoluçãodeste último (o modelo) no decorrer do tempo, 
demarcando as deficiências que identificam a primeira (a jurisdição), em meio à 
complexidade conflitiva atual. O desenvolvimento do estudo dar-se-á pelo 
procedimento comparativo e pela técnica da pesquisa bibliográfica, baseada em 
documentação indireta. 
Por fim, a implementação da política pública de múltiplas portas de 
tratamento adequado dos conflitos, além de tornar efetivo o princípio 
constitucional de acesso à justiça (art. 5º, XXXV da Constituição Federal) contribui 
para a construção de um novo paradigma para o sistema, no caso àquele voltado 
ao consenso e à pacificação social. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
2
 Na lógica dedutiva parte-se de premissas para que se chegue ao resultado. Assim, se as 
premissas forem verdadeiras, o resultado deverá ser verdadeiro, e, neste caso, estará apenas 
enunciando o que já havia sido expressado nas premissas, mas ainda não explicitado. Dessa 
maneira, pela lógica dedutiva trazem-se explicitações às informações trazidas pelas premissas. 
(LAKATOS, E. M; MARCONI, M.A. Fundamentos de metodologia científica. 4. ed. São Paulo: 
Atlas, 2001, p. 92). 
17 
 
 
 
1 O EXAURIMENTO DA PRESTAÇÃO JURISDICIONAL E O ACESSO À 
JUSTIÇA 
 
 A complexidade das relações sociais modernas e a consequente explosão 
de conflitos, juntamente com a globalização e a crise estatal tem desencadeado o 
exaurimento do sistema jurisdicional, de forma que o modelo tradicional de 
resolução de conflitos já não acompanha os anseios da população. Nesse 
sentido, após uma breve contextualização da sociedade, seus conflitos e o 
sistema estatal vigente, adentrar-se-á na discussão acerca da crise da efetivação 
da prestação jurisdicional e de seus desafios no alcance do acesso à justiça. 
Após o delineamento do problema, explorar-se-á a mudança de paradigma, 
visando à passagem do litígio para o da consensualidade. 
 
1.1 A sociedade, seus conflitos e o sistema estatal 
 
 Normalmente, o conflito nasce da disputa de interesses individuais ou 
coletivos dentro das complexas relações sociais, sendo que o modo habitual de 
resolvê-lo, após seu ajuizamento no Poder Judiciário, dá-se pela aplicação do 
Direito. No entanto, estudar, analisar e, por fim, conceituar o fenômeno do conflito 
e suas nuances é um desafio imprevisível e enigmático3. 
 A sociedade é movida por conflitos, em função de fatores que envolvem 
questões tecnológicas, políticas, econômicas e sociais. O conflito nasce de uma 
disputa de interesses, ideias ou valores. Assim, para que haja um conflito, ―é 
preciso em primeiro lugar, que as forças confrontantes sejam dinâmicas, contendo 
em si próprias o sentido da ação, reagindo umas sobre as outras‖4. 
 Para Dinamarco, o conflito significa um choque e pode ser entendido como 
―a situação existente entre duas ou mais pessoas ou grupos, caracterizado pela 
 
3
―Il mondo dei conflito è sempre por molta parte imprevedibile ed enigmático. Non c´é scienza 
sociale, per quanto ricca di litteratura specialistica sull´argomento, che alla fine ci possa raccontare 
questo mondo hobbesiano, inestricabile, ricco di passione, interessi, comportamenti, motivazioni; 
lo si descrive in una scala di possibilità che coinvolgono la ritualitá, la concorrenza, l´invidia, 
l´inimicizia, sempre a metà tra la rottura irrevocabile e la solida conferma della socievolezza‖ 
Resta, Eligio. Giudicare, conciliare, mediare. In: Scarparro, Fulvio. Il coraggio di mediare. Contesti, 
teorie e pratiche di risoluzione alternative delle conttoversie. Milano: Ângelo Guerini, 2005ª, p. 21. 
4
MORAIS, José Luiz Bolzan de; SPENGLER, Fabiana Marion. Mediação e arbitragem: alternativa 
à jurisdição. 2. ed. rev. e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2008, p.45. 
18 
 
 
 
pretensão a um bem ou situação da vida e impossibilidade de obtê-lo‖5. Nesse 
sentido, o conflito pode ser concebido de forma mais ampla, pois as relações 
interpessoais são marcadas por insatisfações decorrentes de estados psíquicos 
da carência de um bem desejado. O conflito seria ―a situação objetiva 
caracterizada por uma aspiração e seu estado de não-satisfação, independente 
de haver ou não interesses contrapostos‖6. 
 Salienta-se, pelos conceitos expostos, que o tema envolve aspectos não 
apenas jurídicos, mas também sociológicos, psicológicos e filosóficos. Desse 
modo, várias ciências vêm abordando o assunto, já que a interdisciplinariedade 
revela-se como um importante instrumento para a compreensão desse fenômeno. 
A tal respeito, Cruz coloca que ―a normatização jurídica da vida em sociedade 
constitui uma questão interdisciplinar, compreendendo dimensões filosóficas, 
históricas, sociológicas econômicas e políticas‖7. Sob a ótica dela uma análise 
interdisciplinar ―transcende em muito a ‗assepsia‘ do discurso jurídico tradicional 
fundado na simples análise legislativa e no estudo de conceitos abstratos‖8. Ainda 
sobre o mesmo tópico, Tartuce aduz que, ―numa perspectiva interdisciplinar, tem-
se que o conflito é salutar para o crescimento e o desenvolvimento da 
personalidade, por gerar vivências e experiências valiosas para o indivíduo em 
seu ciclo de vida‖9. 
Nas lições de Resta10, a raiz de identidade do conflito torna-se um 
paradoxo no momento em que uma relação conflitiva une um grupo em torno de 
 
5
DINAMARCO, Candido Rangel. Instituições de direito processual civil. 4.ed. São Paulo: 
Malheiros, 2004, v.1, p.117. 
6
DINAMARCO, Candido Rangel. A instrumentalidade do processo. 8. ed. São Paulo: Malheiros, 
2000, p. 140. 
7
―A abordagem holista em Direito supõe a permissividade da cooperação de várias áreas do 
conhecimento para com ele, bem como de que o mesmo, positivado, constitui um todo, um 
sistema integrado, interconectado, tendo todas as suas partes ou leis relações entre si, e, restando 
como que um plus, um algo mais, correspondente ao lema gestaltista de que o todo é o maior do 
que a soma das partes, isto é, o Direito é mais do que lei, do que norma, é a busca da Justiça ou 
de harmonia social, refletindo em suas regras não só os fatos sociais, mas toda uma série de 
constelações de fundo político, cultural, etc., objetivando, ao seu modo, uma melhor convivência 
entre os homens‖. CRUZ, Valéria Alvares da. O direito e a nova visão da ciência. São Paulo: Fiuza 
Editores, 2000, p. 129. 
8
CRUZ, Valéria Alvares da. O direito e a nova visão da ciência. São Paulo: Fiuza Editores, 2000, 
p. 129. 
9
TARTUCE, Fernanda. Mediação nos conflitos civis. Rio de Janeiro: Forense: São Paulo: Método, 
2008, p.33. 
10
―Quello che il conflito mette in luce è il contrasto tra diverse contigenze dell´identità, più meno 
generalizzabili; il suo codice non è quelli vero-falso, ma riconoscibile- non riconoscibile‖ E 
estabelece ―La semantica del conflito e la sua condenzazione nelle decisione del giudice ci 
formano molto più di tante psicologie e sociologie: il suo linguagio duplica e amplifica il dilemma‖. 
19 
 
 
 
um mesmo objetivo, criando uma identidade social. Assim, o conflito é uma forma 
possibilitadora de elaborações evolutivas e retroativas no que se refere a 
instituições, estruturas e interações das relações. ―O conflito pode ser classificado 
como um processo dinâmico de interação humana e confronto de poder no qual 
um parte influencia e qualifica o movimento da outra‖11. Freund salienta a 
importância sociológica do conflito, uma vez que nenhuma sociedade é 
perfeitamente homogênea. Aliás, seria utópico falar em homogeneidade. È 
justamente a heterogeneidade das sociedadesque geram os desacordos, as 
discórdias, as controvérsias, as turbulências, além dos choques e enfretamentos. 
Para ele, 
 
toda a ordem social é uma desordem, ao menos latente, uma 
circunstância que pode ameaçar a coesão social. O jogo de dissensões 
se traduz segundo o desejo de uns de impor seus pontos de vista sobre 
os outros mediante a persuasão, o domínio, ou por outros meios
12
. 
 
Dessa maneira, o choque de aspirações e interesses divergentes 
desenvolve uma relação de forças. Simmel explica que a dinâmica conflitiva 
torna-se o meio de manter a vida social, de demarcar seu futuro, de facilitar a 
mobilidade e de valorizar determinadas configurações ou formas sociais em 
detrimento de outras. ―Essa dinâmica conflitiva permite verificar que o conflito 
pode ser tanto positivo quanto negativo e que a valoração de suas consequências 
se dará, justamente, pela legitimidade das causas que pretende defender‖13. 
Assim, a sociedade, para alcançar determinada configuração, necessita de 
quantidades proporcionais de harmonia e desarmonia, de associação e de 
competição, de tendências favoráveis e desfavoráveis. A sociedade, como 
conhecemos, é o resultado de categorias positivas e negativas de interação; 
nesse jaez, o conflito para Simmel promove a integração social. 
 
RESTA, Eligio. Le stelle e le masserizie. Paradigmi dell´osservatore. Roma/Bari: Laterza, 1997, p. 
84. 
11
SPENGLER, Fabiana Marion. Da jurisdição à mediação: por uma outra cultura no tratamento de 
conflitos. Ijuí: Editora Unijuí, 2010, p. 248. 
12
FREUND, Julien. Il terzo, il nemico, il conflito. Materiali per una teoria del politico. A cura di 
Alessandro Campi. Milano: Giuffré, 1995a, p.101. 
13
SIMMEL,Georg. Sociologia. Trad. de Carlos Alberto Pavanelli et. al. São Paulo: Ática, 1983, 
p.124. 
20 
 
 
 
 Para Weber14, a teoria sobre o conflito está interligada com a relação 
intrínseca de poder. O poder pode ser legítimo ou ilegítimo e refere-se a uma 
autoridade. Nesse sentido, o detentor de poder/força, fundado em regras 
formais/racionais, monopoliza não só a força, mas principalmente a força legítima. 
A teoria weberiana define o Estado como uma instituição que reivindica o 
monopólio sobre o uso da força dentro de um território e por meio dessa força, 
pretende manter a coesão social. 
 Por isso, o conflito apresenta vários aspectos, sendo que o principal é a 
mudança construtiva. Para Sales, o conflito deve ser visto como uma 
possibilidade de transformação e de aprimoramento das relações. ―É uma 
oportunidade de viver, questionar experiências profundas e assim crescer junto 
com essa avaliação e mudança‖15. Ressalta ela, ainda, que o conflito deve ser 
visto como um momento natural nas relações, buscando a compreensão não 
apenas expressa e individual, mas a profundidade da situação, avaliando, a 
relação entre esses conflitos individuais e os padrões de comportamento social. 
Assim, o conflito ―é o motor de transformação das relações e das estruturas 
sociais sensíveis às dinâmicas das relações humanas‖16. 
 Consequentemente, no caso dos conflitos nascidos da sociedade, o 
Estado, enquanto detentor do monopólio da força legítima, utiliza-se do poder 
para decidir as situações conflituosas. Em outras palavras, pode-se dizer que o 
conflito é o enfrentamento, o litígio entre dois indivíduos ou grupos, por um 
determinado direito, podendo este ser, algumas vezes, garantido através da 
violência. O Estado toma para si a legitimidade de regular as suas relações, 
sendo que compete ao Poder Jurisdicional a resolução do conflito. ―A legitimidade 
 
14
 WEBER, Max. Economia e sociedade. Fundamentos da Sociologia compreensiva. Tradução 
Regis Barbosa e Karen Elsabe Barbosa. Brasília: UNB, 1999a. 
15
SALES, Lilia Maia de Moraes. Transformação de Conflitos, Construção de Consenso e a 
Mediação – a complexidade dos conflitos. In: SPENGLER, Fabiana Marion; SPENGLER, 
Theobaldo Spengler Neto (Org.). Mediação enquanto política pública [recurso eletrônico]: a teoria, 
a prática e o projeto de lei. 1.ed. - Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 2010. Disponível em: < 
http://www.unisc.br/edunisc >. Acesso em 11 mar 2012. 
16
SALES, Lilia Maia de Moraes. Transformação de Conflitos, Construção de Consenso e a 
Mediação – a complexidade dos conflitos. In: SPENGLER, Fabiana Marion; SPENGLER, 
Theobaldo Spengler Neto (Org.). Mediação enquanto política pública [recurso eletrônico]: a teoria, 
a prática e o projeto de lei. 1.ed. - Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 2010. Disponível em: < 
http://www.unisc.br/edunisc >. Acesso em 11 mar 2012. 
21 
 
 
 
estatal de decidir os conflitos nasce, assim, do contrato social no qual os homens 
outorgaram a um terceiro o direito de fazer a guerra em busca da paz‖17. 
 Por conseguinte, o Poder Jurisdicional é exercido pelo Judiciário, que, 
representado por uma pessoa investida de poder, colhe as informações 
necessárias para análise e julgamento do conflito. Essa forma de resolução do 
conflito tornou-se o método tradicional, fazendo com que as pessoas buscassem 
essa prestação. 
 Assim, os conflitos que permeiam a sociedade moderna são resultado de 
uma série de fatores que englobam o sistema. Este pode ser conceituado como 
―toda a organização complexa que recolhe e transmite informação, gera 
atividades e controla resultados, dotado de certa autonomia, mas 
permanentemente articulado ao contexto‖ 18. A sociedade está organizada por 
elementos como Estado, governo, poder, economia e cidadãos. Dessa forma, o 
Estado é o resultado de um processo histórico de concentração de poder que 
ocorreu na Europa, entre o final da Idade Média e o início da Idade Moderna. Nas 
palavras de Rodrigues, ―o Estado moderno se constitui de um conjunto de 
instituições públicas que envolvem múltiplas relações com o complexo social num 
território delimitado‖19. 
 Nesse contexto, o governo é uma instituição composta por indivíduos e 
órgãos que têm como função orientar os rumos da sociedade. O elemento poder 
é definido pela capacidade de influenciar e exigir da sociedade determinada ação 
ou conduta. É encontrado em várias esferas, mas é a principal característica de 
coerção do Estado. Assim, para que o Estado exija o cumprimento de 
determinadas regras, ele pode lançar mão do seu poder coercitivo. Nas palavras 
de Höfling, 
 
 
 
 
 
 
17
MORAIS, José Luiz Bolzan de; SPENGLER, Fabiana Marion. Mediação e arbitragem: alternativa 
à jurisdição. 2. ed. rev. e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2008, p., 65; WEBER, 
Max. Economia e Sociedade. Fundamentos da sociologia compreensiva. Tradução de Regis 
Barbosa e Karen Elsabe Barbosa. Brasília: UNB, 1999ª, p.275. 
18
SCHIMIDT, João Pedro. Para entender as políticas públicas: aspectos conceituais e 
metodológicos. In: REIS, Jorge Renato; LEAL, Rogério Gesta. (Org.). Direitos sociais e políticas 
públicas: desafios contemporâneos. Tomo 8. Santa Cruz do Sul: Edunisc, 2008, p. 2326. 
19
RODRIGUES, Marta Maria Assumpção. Políticas Públicas. São Paulo: Publifolha, 2010.p.17. 
22 
 
 
 
torna-se importante aqui ressaltar a diferenciação entre Estado e 
governo.[...], é possível se considerar Estado como o conjunto de 
instituições permanentes – como órgãos legislativos, tribunais, exército e 
outras que não formam um bloco monolítico necessariamente – que 
possibilitam a ação do governo; e Governo, como o conjunto de 
programas e projetos que parte da sociedade (políticos,técnicos, 
organismos da sociedade civil e outros) propõe para a sociedade como 
um todo, configurando-se a orientação política de um determinado 
governo que assume e desempenha as funções de Estado por um 
determinado período
20
. 
 
Por isso, o governo tem o poder político de tomar decisão de acordo com a 
preferência e com os interesses de diversos atores. Quando os indivíduos são 
eleitos para tomarem as decisões, tem-se um governo democrático. 
Normalmente, as tarefas e ações do Estado são executadas pela Administração 
Pública. 
Dessa maneira, o Estado não é somente uma organização burocrática, 
mas é também o próprio reordenamento jurídico da sociedade com o 
reconhecimento dos direitos do cidadão. Para Rodrigues21, em primeiro lugar, a 
organização burocrática estatal nasce da administração pública, que é composta 
do conjunto das atividades ou ações, definidas por lei ou pelos atos do governo, 
visando à execução de interesse público. O reordenamento da sociedade se dá 
pelo Estado de Direito, que é ―um sistema jurídico que garante as liberdades 
fundamentais, com a aplicação da lei por intermédio de juízes independentes‖ e, 
por fim, um sistema de proteção social que ―garante renda mínima, saúde, 
educação, habitação, saneamento e segurança como direito de todo cidadão‖, 
nascendo, assim o Estado do Bem-Estar Social (Welfare State)22. 
Portanto, o Estado do Bem–Estar Social é um sistema de proteção social 
que emergiu nos países de capitalismo desenvolvido, no período do pós-Segunda 
Guerra Mundial. Contudo, contrariando essa ideia de Estado de Bem-Estar Social 
e implementando a bandeira neoliberal que percorria as sociedades modernas, o 
postulado de Estado Mínimo nasceu com o objetivo claro de que o mercado 
coordenasse a economia. O intuito era afastar a intervenção estatal do mercado, 
buscando a auto-regulação e oportunizando a livre atividade econômica de 
 
20
HÖFLING, Eloisa Matos. Estado e Política (Públicas) Sociais. 2001: Disponível em:< 
http://www.scielo.br/scielo.php?pid=s0101-32622001000300003&script=sci_arttext>. Acesso em: 
15 jun 2011. 
21
RODRIGUES, Marta Maria Assumpção. Políticas Públicas. São Paulo: Publifolha, 2010.p.18. 
22
RODRIGUES, Marta Maria Assumpção. Políticas Públicas. São Paulo: Publifolha, 2010.p.18. 
23 
 
 
 
acordo com os interesses privados e da economia globalizada. Sobre o Estado 
Mínimo, Kliksberg explica que, 
 
[...] suas funções deveriam ser totalmente mínimas e que se deveria 
deixar o desenvolvimento entregue ao mercado e à ―mão invisível‖. O 
Estado foi sentido como um estorvo para a dinâmica a ser impulsionada. 
Enfatizou-se a existência de uma autonomia entre Estado e mercado. 
Finalizou-se um ativo processo ―demolição‖ do Estado nos países em 
desenvolvimento.[...] tratou-se, em muitas ocasiões, de privatizar e 
eliminar funções, no mais curto prazo
23
. 
 
Sob esse enfoque, pode-se dizer que, partirculamente, Estado brasileiro é 
centralizador, preocupando-se, por tradição, muito mais com seus objetivos 
econômicos do que propriamente com a proteção social ou com o bem–estar do 
povo. Dessa forma, o Estado adquiriu uma postura de Estado-fazedor e não-
regulador, ou seja, protegia determinados direitos ao invés de dialogar sobre um 
espaço político com a sociedade civil. Para Bacelar, o Estado centralizador ―junta-
se ao autoritário: tivemos uma longa ditadura no período Vargas e, depois, uma 
longa ditadura nos governos militares pós-64. Então, o viés autoritário é muito 
forte nas políticas públicas do país‖24. 
 Observa-se que o Estado brasileiro era desenvolvimentista. Seu objetivo 
principal visava à industrialização e ao crescimento econômico, de modo que o 
Estado do Bem-Estar Social acabava ficando de lado. Nas palavras de Bacelar, 
 
desde o começo do século, optou-se pela industrialização. A grande 
tarefa era consolidar esse processo e fazer do Brasil uma grande 
potência. Assim, o grande objetivo era de ordem econômica: construir 
uma potência intermediária no cenário mundial. O Estado 
desempenhava a função de promover a acumulação privada na esfera 
produtiva. O essencial das políticas públicas estava voltado para 
promover o crescimento econômico, acelerando o processo de 
industrialização, o que era pretendido pelo Estado brasileiro, sem a 
transformação das relações de propriedade na sociedade brasileira 
25
. 
 
 Verifica-se, assim, pelo histórico brasileiro, que há um distanciamento entre 
Estado e a sociedade, já que os ideais do neoliberalismo preconizam o Estado 
 
23
KLIKSBERG, Bernardo. Repensando o estado para o desenvolvimento social. São Paulo: 
Cortez, 1998, p. 38. 
24
BACELAR, Tânia. As Políticas Públicas no Brasil: heranças, tendências e desafios. Disponível 
em:<http://www4.fct.unesp.br/grupos/gedra/textos/Texto1_politicas_publicas_no_br_TaniaBacelar.
pdf.> Acesso em: 16 jun 2011. 
25
BACELAR, Tânia. As Políticas Públicas no Brasil: heranças, tendências e desafios. Disponível 
em:<http://www4.fct.unesp.br/grupos/gedra/textos/Texto1_politicas_publicas_no_br_TaniaBacelar.
pdf.> Acesso em: 16 jun 2011. 
24 
 
 
 
Mínimo e defendem o individualismo, evitando-se a interação social. Portanto, 
ainda persiste uma imagem negativa e minimalista do Estado. Na visão de Farah, 
 
o descrédito com relação ao Estado e à Administração Pública diz 
respeito à ação estatal como um todo, às diversas políticas públicas, e 
aos políticos, de um modo geral. A ocorrência de práticas de cunho 
clientelista e marcadas pela corrupção, após a democratização dos anos 
80, e a maior visibilidade desses fenômenos, decorrente da própria 
democratização, articularam-se à onda minimalista de corte neoliberal, 
que propõe a redução radical do Estado, contaminando a visão que os 
cidadãos têm da ação governamental e da Administração Pública em 
todas as esferas de governo
26
. 
 
 Dessa forma, contribuindo para tal situação, a economia, como uma 
instância autônoma e dependente, está intimamente ligada ao mercado, o qual, 
normalmente, tem ditado as suas regras. A expansão do mercado e a quebra de 
barreiras existentes entre as nações fez com que o processo de globalização 
estabelecesse uma nova ordem mundial, fazendo, assim, com que o Estado 
perdesse parte de suas atribuições. 
Consequentemente, em função do processo acima observado, o Estado 
entrou em crise. A crise está afetando a maioria das sociedades do mundo, desde 
que se instaurou a globalização e que se preconizou a ideia de diminuição da 
intervenção do Estado em oferecer os direitos sociais à população. Também 
denominada de crise estatal, ―o processo nasceu de um deliberado 
enfraquecimento do Estado se transferindo para todas as suas instituições‖27. 
Nesse viés, observa-se que ―a gradativa perda de soberania do Estado, tem 
alargado sua incapacidade de dar respostas céleres aos litígios atuais. É evidente 
a fragilidade nas esferas Legislativa, Executiva e Judiciária, perdendo ainda a 
total exclusividade de dizer e aplicar o direito‖28. 
 Por conseguinte, a fim de evitar um colapso mundial, organizações da 
sociedade civil começaram a tomar iniciativas com o objetivo de burlar o quadro 
de crise e garantir, assim, os direitos civis e coletivos de todos os cidadãos. Na 
busca desse espaço de diálogo, a sociedade civil ressurge como a esfera de 
 
26
FARAH, Marta F. S. Parcerias, novos arranjos institucionais e políticas públicas no Brasil. 
Revista da Administração Pública, V. 35, nº 1, p. 119-145, jan-fev 2001. 
27
SPENGLER, Fabiana Marion. Da jurisdição à mediação:por uma outra cultura no tratamento de 
conflitos. Ijuí: Editora Unijuí, 2010, p. 102. 
28
SPENGLER, Fabiana Marion. Da jurisdição à mediação: por uma outra cultura no tratamento de 
conflitos. Ijuí: Editora Unijuí, 2010, p. 103. 
25 
 
 
 
interação, de maneira a garantir a autonomia da economia e do Estado. A 
construção dessa esfera torna-se, então, essencial enquanto participação política 
e social dos cidadãos. Nesse sentido, o combate da democracia liberal dá-se pela 
instituição de uma democracia participativa com espaços estruturais de integração 
social. Por isso, 
 
no processo, o próprio espaço político liberal, o espaço da cidadania 
sofre uma transformação profunda. A diferenciação das lutas 
democráticas pressupõem a imaginação social de novos exercícios de 
democracia e de novos critérios democráticos para avaliar as diferentes 
formas de participação política. E as transformações prolongam-se no 
conceito de cidadania, no sentido de eliminar os novos mecanismos de 
exclusão da cidadania, de combinar formas individuais com formas 
coletivas de cidadania e, finalmente, no sentido de ampliar esse conceito 
para além do princípio da reciprocidade e simetria entre direitos e 
deveres
29
. 
 
 Portanto, os gigantescos problemas da civilização demandam mobilização 
no sentido de humanizar a burocracia e a técnica, defendendo e desenvolvendo 
as convivialidades e solidariedades30. Assim, a sociedade contemporânea, 
colhendo os resultados negativos do modelo de progresso capitalista, necessita 
reaprender a viver e conjugar as formas individuais e coletivas de cidadania, de 
modo a melhor cuidar de seus conflitos. 
 E, o papel do Estado é promover políticas que priorizem a convivência dos 
cidadãos, de modo a multiplicar os espaços públicos de cooperação e 
participação com o objetivo de enfrentar os problemas que envolvem as relações 
sociais, como será abordado a seguir. 
 
1.2 O Acesso à justiça, o exaurimento da prestação jurisdicional e seus 
desafios 
 
1.2.1 O acesso à justiça 
 
Na forma tradicional de resolução do conflito, as pessoas acessam o 
sistema jurisdicional, de modo a buscar ―justiça‖ para seus problemas. Nas 
 
29
SANTOS, Boaventura de Sousa. Pela mão de Alice: o social e o politico na pós-modernidade. 3. 
ed. São Paulo: Cortez, 1997, p. 276. 
30
MORIN, Edgar. Terra Pátria. Traduzido por Paulo Azevedo Neves da Silva. Porto Alegre: Sulina, 
1995, p.32. 
26 
 
 
 
palavras de Cappelletti e Garth, ―o acesso à justiça pode, portanto, ser encarado 
como o requisito fundamental – o mais básico dos direitos humanos – de um 
sistema jurídico moderno e igualitário que pretenda garantir, e não apenas 
proclamar os direitos de todos‖31. 
 Consequentemente, o aumento dos conflitos é resultado do crescimento da 
população mundial. O acesso ao Judiciário torna-se, assim, um direito para o 
cidadão, o que acaba acarretando um crescente número de demandas. A 
explosão de litigiosidade, em virtude das inovações, fez com que as pessoas 
encontrassem nessa a estrutura a única forma válida de solução do conflito. 
 Nessa esteira, o mecanismo predominante utilizado pelo nosso sistema 
jurisdicional é o da solução adjudicada dos conflitos, que se dá por meio de 
sentença do juiz. Assim, a adoção desse critério vem gerando o que é 
denominado de ―cultura da sentença‖, que traz como consequência ―o aumento 
cada vez maior da quantidade de recursos, o que explica o congestionamento não 
somente das instâncias ordinárias, como também dos Tribunais superiores, e até 
mesmo da Suprema Corte‖32. 
 Dessa maneira, o princípio do acesso à justiça, proclamado no inciso 
XXXV, do art. 5º da Constituição Federal, não assegura somente o acesso formal 
aos órgãos do Judiciário, mas garante também ao cidadão o acesso qualificado à 
ordem jurídica justa. Nas palavras de Azevedo, ―o acesso à Justiça está 
intrinsecamente ligado à contínua redução das insatisfações com o sistema 
público de resolução de conflitos‖33. Para Watanabe, o inciso XXXV, do art. 5º da 
Constituição Federal, ―dever ser interpretado não apenas como garantia de mero 
acesso aos órgãos do Poder Judiciário, mas como garantia de acesso à ordem 
jurídica justa, de forma efetiva, tempestiva e adequada‖34. 
 
31
CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à justiça. Porto Alegre: SAFE, 1988, p. 12. 
32
WATANABE, KAZUO. Política Pública do Poder Judiciário Nacional para Tratamento Adequado 
dos Conflitos de Interesses. In: RICHA, Morgana de Almeida; PELUSO, Antonio Cezar. (Coord.). 
Conciliação e mediação: estruturação da política judiciária nacional. Rio de Janeiro: Forense, 
2011, p. 04. 
33
AZEVEDO, André Gomma. Desafios de Acesso à Justiça ante o Fortalecimento da 
Autocomposição como Política Pública Nacional. In: RICHA, Morgana de Almeida; PELUSO, 
Antonio Cezar. (Coord.). Conciliação e mediação: estruturação da política judiciária nacional. Rio 
de Janeiro: Forense, 2011, p. 11. 
34
WATANABE, Kazuo. Política Pública do Poder Judiciário Nacional para Tratamento Adequado 
dos Conflitos de Interesses. In: RICHA, Morgana de Almeida; PELUSO, Antonio Cezar. (Coord.). 
Conciliação e mediação: estruturação da política judiciária nacional. Rio de Janeiro: Forense, 
2011, p. 05. 
27 
 
 
 
 Desse modo, todos os cidadãos que tenham qualquer problema jurídico 
merecem atenção por parte do Poder Público, em especial do Poder Judiciário e a 
este não cabe somente organizar os serviços que são prestados por meio de 
processos judiciais, mas também de socorrer os cidadãos ―de solução por vezes 
de simples problemas jurídicos, como a obtenção de documentos essenciais para 
o exercício da cidadania, e até mesmo de simples palavras de orientação 
jurídica‖35. Por isso, ―no processo democrático, o acesso à justiça desempenha 
um relevante papel ao habilitar o cidadão a tutelar seus interesses e possibilitar a 
composição pacífica dos conflitos‖36. 
 Para tanto, atenta-se para a distinção entre justiça e jurisdição; a primeira 
―é um ideal de equidade e de razão, é um sentimento, uma virtude, um valor‖. E, a 
segunda, ―é uma das funções da soberania do Estado, consistente no poder de 
atuar o direito objetivo, compondo os conflitos de interesses, resguardando a 
ordem social‖37. 
 Nesse contexto, entender o acesso à justiça como sinônimo de acesso à 
jurisdição é uma questão que deve ser salientada. Como pondera Dinamarco, o 
acesso à justiça é o acesso à ordem jurídica justa, ou seja, ―abarca uma série de 
possibilidades de verificação e realização da justiça, o que se coaduna com a 
nossa realidade multifacetada na configuração de um sistema jurídico 
pluriprocessual‖38. 
 Portanto, embora o acesso efetivo à justiça seja reconhecido como um 
direito fundamental, o que deve ser igualmente destacado, como preconiza 
Cappelletti e Garth39, é o conceito de efetividade, isto é, o de proporcionar o 
acesso igualitário a todos e produzir resultados individuais e socialmente justos. O 
que se objetiva não é somente ―conceber a realização da justiça como valor 
superior em relação à forma para sua obtenção‖, mas sua grande importância 
 
35
WATANABE, Kazuo. Politica Publica do Poder Judiciário Nacional para Tratamento Adequado 
dos Conflitos de Interesses. In: RICHA, Morgana de Almeida; PELUSO, Antonio Cezar. (Coord.). 
Conciliação e mediação: estruturação da politica judiciária nacional. Rio de Janeiro: Forense, 
2011, p. 04. 
36
TARTUCE, Fernanda. Mediação nos conflitos civis. Rio de Janeiro: Forense: São Paulo: Método, 
2008, p.97. 
37
BARBOSA,Aguida Arruda. Mediação Familiar: uma nova mentalidade em direito de família. 
Revista de Doutrina e Jurisprudência. Brasília: JTDF, n.28, set./dez.1998, p.52. 
38
DINAMARCO, Candido Rangel. Instituições de direito processual civil. 4.ed. São Paulo: 
Malheiros, 2004, v.1, p.114. 
39
CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à justiça. Porto Alegre: SAFE, 1988, p. 15. 
28 
 
 
 
está ―na composição dos conflitos dando a cada um o que é seu, realizando os 
direitos violados ou ameaçados com o mínimo de convulsão social‖40. 
 Por isso, é relevante ―os juristas passarem a reconhecer que as técnicas 
processuais servem a funções sociais, bem como que as cortes não constituem a 
única forma de solução de conflitos a serem consideradas‖41. Cabe salientar que 
o Estado deve administrar e zelar pelos conflitos nascidos da sociedade, 
enquanto detentor do monopólio da força legítima. A atuação desse monopólio se 
dá pela jurisdição, definida por Dinamarco como 
 
o amparo que, por obra dos juízes, o Estado ministra a quem tem razão 
em um litigio deduzido em processo. Ela consiste na melhoria da 
situação de uma pessoa, pessoas, ou grupo de pessoas, em relação ao 
bem pretendido ou à situação imaterial desejada ou indesejada. 
Receber tutela jurisdicional significa obter situações felizes e favoráveis, 
propiciadas pelo Estado mediante o exercício da jurisdição
42
. 
 
Para tanto, reitera Assis que a jurisdição surge através do processo ―como 
única modalidade institucional eficiente, competindo ao Estado, na condição de 
representante da sociedade política, instituir órgãos para a resolução das lides‖43. 
Assim, o exercício do poder estatal consiste precisamente na ―capacidade de 
decidir imperativamente e impor decisões‖44. Dessa forma, após essa breve 
contextualização do acesso à justiça, adentrar-se-á no exaurimento do sistema 
jurisdicional. 
 
1.2.2 O exaurimento do sistema jurisdicional 
 
 A partir do momento que houve a organização política dos povos, o Estado, 
buscando eliminar a vingança privada, ―reservou-se o poder (não compartilhado 
 
40
CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à justiça. Porto Alegre: SAFE, 1988, p. 12. 
41
CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à justiça. Porto Alegre: SAFE, 1988, p. 12. 
42
DINAMARCO, Candido Rangel. Instituições de direito processual civil. 4.ed. São Paulo: 
Malheiros, 2004, v.1, p.106. 
43
ASSIS, Araken de. O direito comparado e a eficiência do sistema judiciário. Revista do 
Advogado. São Paulo, n.43, p. 9-25, jun.1994, p. 10. 
44
DINAMARCO, Candido Rangel. Instituições de direito processual civil. 4.ed. São Paulo: 
Malheiros, 2004, v.1, p.36. 
29 
 
 
 
com outrem) e o dever (não sujeito à escusa) de tutelar os direitos com o intuito, 
por tal controle exclusivo, de obter a harmonia e a paz social‖45. 
Nessa esteira, explica Citra46 que a conceituação de jurisdição tem 
destaque em três aspectos: poder, função e atividade. A jurisdição é poder 
enquanto capacidade estatal de decidir imperativamente impondo decisões. Nas 
suas funções, ela expressa o dever de promover a pacificação dos conflitos, 
realizando no processo o direito justo e, como atividade, constitui o complexo de 
atos do juiz no processo, exercendo o poder e cumprindo a função atribuída pela 
lei. 
No entanto, frente a esse contexto, duas questões vem à tona quanto ao 
monopólio estatal sobre a jurisdição: o Poder Judiciário vem cumprindo, 
adequadamente, o seu papel de pacificador social? O modelo clássico de 
prestação da tutela jurisdicional atende aos anseios da população? 
 Obviamente que a resposta às duas questões acima é negativa. Conclui-se 
que a insatisfação com o Poder Judiciário é tão antiga quanto o Direito. A 
ausência efetiva de pacificação conduz ao inconformismo, gerando, assim, uma 
explosão de litigiosidade, o que, por consequência, resulta no que é denominado 
por muitos de crise do sistema jurisdicional (exaurimento do sistema jurisdicional). 
Defende-se, no presente trabalho, o termo exaurimento no sentido de ―esgotar 
completamente; fazer secar; ensecar; ressecar; gastar ou dissipar inteiramente; 
empobrecer; cansar-se; exaurir as forças e/ ou os recursos‖47. 
 Convém salientar que o exaurimento do sistema jurisdicional deve ser 
estudado no sentido amplo, sendo que, atualmente, esse conceito também é 
denominado por muitos de crise do Estado. O problema não é exclusivo do 
Judiciário, mas também do Legislativo e do Executivo. Nesse sentido, explica 
Spengler que ―todas as considerações sobre a jurisdição e suas crises (criadas e 
 
45
SIDOU, J.M. Othon. A controvertida jurisdição voluntária. In; CALMON, Eliana; BULOS, Uadi 
Lammêgo (Coord.). Direito Processual: inovações e perspectivas; estudos em homenagem ao 
Ministro Sálvio de Figueredo Teixeira. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 305. 
46
CITRA, Antônio Carlos Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Candido R. Teoria 
geral do Processo. 20.ed. São Paulo: Malheiros, 2004, p. 131. 
47
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. 2.ed. Rio de 
Janeiro: Nova Froteira Editora. 1986. 
30 
 
 
 
fomentadas a partir da globalização cultural, política e econômica) são 
consequências da crise estatal‖48. 
Por conseguinte, o exaurimento é próprio do processo de enfraquecimento 
do Estado que, inevitavelmente, afeta também suas instituições. O Direito que se 
aplica é escrito pelo Legislativo, o qual sofre grande pressão do Executivo. Os 
interesses são muito mais políticos do que sociais, sendo que o descrédito e a 
fragilidade das esferas Legislativa, Executiva e Judiciária completam a perda de 
força do Estado. 
 Nessa esteira, um dos pontos de exaurimento refere-se ao 
desconhecimento por parte da população do Direito. Por isso, 
 
antes de dizer o Direito, incumbe ao juiz fazer conhecer o Direito. Pois na 
medida em que o conhecimento daquilo que está disponível constitui 
pré-requisito da solução do problema, da necessidade jurídica não 
atendida, é preciso fazer muito mais para aumentar o grau de 
conhecimento do público a respeito dos meios disponíveis e de como 
utilizá-los
49
. 
 
Nesse sentido, Santos50 ressalta que estudos sociológicos revelam que 
quanto mais baixo o Estado Social em que se situam os cidadãos, maior a sua 
distância em relação à administração da justiça em razão de fatores econômicos, 
sociais e culturais. Para ele, a falta de informação dos cidadãos sobre seus 
direitos e como exercê-los resulta em inseguranças e desconfianças em buscá-los 
para a maior parte da população. Ele aponta também que ―as classes de nível 
mais elevado tendem a resolver seus conflitos de forma extrajudicial para que 
seus interesses econômicos sejam solucionados com certa privacidade‖51. 
Constata-se, aí, a negação de acesso à justiça para camadas mais baixas 
da população. Para tanto, 
 
 
 
 
48
SPENGLER, Fabiana Marion. Da jurisdição à mediação: por uma outra cultura no tratamento de 
conflitos. Ijuí: Editora Unijuí, 2010, p. 102. 
49
NALINI, José Renato. Novas perspectivas no acesso à justiça. Disponível em: 
<http://www.cjf.gov.br/revista/numero3/artigo08.htm>. Acesso em: 20 set 2011. 
50
SANTOS, Boaventura de Sousa. Introdução à sociologia da administração da justiça. Revista de 
Processo. São Paulo, ano X, n. 37, p. 121-139, jan.-mar.1985, p. 127. 
51
SANTOS, Boaventura de Souza. Introdução à sociologia da administração da justiça. Revista do 
Processo. São Paulo: Ano X, n 37, p. 121-139, jan. mar. 1985, p.127. 
31a barreira da pobreza impede a submissão de todos os conflitos à 
apreciação de um juiz imparcial. Mas é verdadeiramente trágica se 
considerada a dimensão do acesso do pobre aos direitos. Os 
despossuídos são privados até dos direitos fundamentais de primeira 
geração, para eles meras declarações retóricas, sem repercussão em 
sua vida prática
52
. 
 
Assim, muito mais que enfrentar a pobreza, deve-se, igualmente, erradicar 
a miséria, já que o objetivo de uma Constituição dita Cidadã é construir uma 
sociedade livre, justa e solidária. 
No entanto, os altos índices de litígios no Judiciário brasileiro apontam que 
poucas são as pessoas ou instituições que utilizam intensamente o sistema, já 
que a maior parte da população não tem sequer conhecimento de que podem 
acessar a justiça (acesso ao meio formal). 
A título de exemplo, segundo o relatório da ―Justiça em Números‖ do 
Conselho Nacional de Justiça, os dez maiores litigantes do país são: 1º- Instituto 
Nacional de Seguro Social (INSS) com 22,33% de demandas, 2º - Caixa 
Econômica Federal com 8,50%, Fazenda Nacional com 7,45%, União com 6,97%, 
Banco do Brasil S/A com 4,24%, Estado do Rio Grande do Sul com 4,24%, Banco 
Bradesco S/A com 3,84%, Banco Itaú S/A com 3,43%, Brasil Telecom Celular S/A 
com 3,28% e Banco Finasa S/A com 2.19 % de demandas53. 
Por isso, existe um foco central de discussão, 
 
há um excesso de demandas judiciais que não decorre da 
democratização do acesso à Justiça, mas de sua utilização exagerada 
por poucos atores, dentre os quais o Poder Público, as empresas 
concessionárias prestadoras de serviços e as instituições financeiras [...] 
A presença recorrente desses como réus ou autores na Justiça acarreta 
a multiplicação de feitos de igual teor, de conteúdo idêntico e repetido
54
. 
 
 
52
NALINI, José Renato. Novas perspectivas no acesso à justiça. Disponível em:< 
http://www.cjf.gov.br/revista/numero3/artigo08.htm>. Acesso em: 20 set 2011. 
53
O Relatório Justiça em Números 2010, integrante do Sistema de Estatísticas do Poder Judiciário 
(SIESPJ), é apresentado pelo Departamento de Pesquisas Judiciárias do Conselho Nacional de 
Justiça. Esse importante sistema engloba a coleta e o tratamento de dados que possibilitam abrir, 
em bases consistentes, a discussão para o entendimento de indicadores orçamentários, 
administrativos e de litigiosidade da Justiça brasileira. Disponível 
em:<http://www.cnj.jus.br/images/pesquisas-judiciarias/Publicacoes/sum_exec_por_jn2010.pdf>. 
Acesso em 15 mar 2012. 
54
BOTINI apud CAMPOS, André Gambier. Sistema de justiça no Brasil: problemas de equidade e 
efetividade. Disponível em: <http://www.ipea.gov.br/sites/000/2/publicacoes/tds/td_1328.pdf>. 
Acesso em: 20 fev 2012, p. 12. 
32 
 
 
 
Nas palavras de Sadek, conclui-se ―que a excessiva facilidade de acesso a 
certo tipo de litigante e o estímulo à litigiosidade podem tornar a justiça não só 
seletiva, mas principalmente ―inchada‖, estando repleta de demandas que pouco 
tem a ver com a garantia de direito‖55. 
Consequentemente, ultrapassado o obstáculo inicial relativo ao acesso à 
justiça, outros três pontos (males endêmicos) podem ser destacados: a incerteza 
do direito, a lentidão/morosidade do processo e os altos custos. A incerteza do 
direito configura-se tanto nos aspectos qualitativos, pois não se sabe qual será a 
interpretação aplicada ao caso concreto, quanto nos aspectos temporais, já que 
não se pode prever exatamente quando a satisfação do direito ocorrerá56. 
Essa incerteza do direito resulta, ainda, na questão referente à exposição 
fática e na falta de contato entre o juiz e as partes. Isso significa que a exposição 
fática nem sempre deduz expressamente a extensão do conflito, sendo que o 
terceiro que lida com interesses diferentes de cada parte nem sempre consegue 
averiguar a verdade. Ou seja, ―a situação do magistrado, assim, fica limitada a um 
panorama deliberadamente recortado pelas partes, o que pode gerar intensas 
dificuldades para a reconstituição histórica dos elementos relevantes e a dedução 
do que é realmente justo‖57. Percebe-se, então, que o ―processo escrito e o 
excesso de trabalho conduziram a um progressivo distanciamento entre o juiz e 
as partes e à criação de resistência e dificuldade ao contato pessoal das partes e 
do julgador‖58. Nesse sentido, 
 
 
 
 
 
 
 
 
55
SADEK, Maria Teresa. Acesso à Justiça. São Paulo: Fundação Konrad Adenauer, 2001, p. 41. 
56
TARTUCE, Fernanda. Mediação nos conflitos civis. Rio de Janeiro: Forense: São Paulo: Método, 
2008, p.172. 
57
TARTUCE, Fernanda. Mediação nos conflitos civis. Rio de Janeiro: Forense: São Paulo: Método, 
2008, p.109. 
58
GRECO, Leonardo. O acesso ao direito e à justiça. Disponível em: 
<http://www.mundojuridico.adv.br>. Acesso em 20 fev 2012. 
33 
 
 
 
a ideologia corporativa responsável pela formação e orientação da 
magistratura, bem como o próprio modelo doutrinário adotado na 
concepção do sistema processual brasileiro reforçam a compreensão do 
papel do juiz como um agente neutro, passivo e eqüidistante das partes. 
Se de um lado a postura inercial pode oferecer garantia relativa de 
equilíbrio processual, de outro gera distorções no curso dos processos 
capazes de desvirtuar completamente o objetivo pretendido para um 
sistema como o Judiciário. Em raras situações existem processos 
judiciais em que há real igualdade de recursos entre os litigantes. A 
rotina forense revela, de fato, um universo de desequilíbrios que 
espelham um verdadeiro microcosmos das mazelas e desigualdades 
contidas na sociedade brasileira
59
. 
 
Esse distanciamento entre partes e magistrado e a utilização instrumental 
técnico de representação através de um advogado geram, ainda, insatisfações 
reprimidas que redundam em novas lides. Como explica Sales, a decisão judicial 
fundamenta-se, exclusivamente, no processo, resultando, muitas vezes, na falsa 
máxima de que ―o que não está nos autos, não está no mundo‖60. Dessa forma, 
―em muitos casos os reais problemas, os aspectos relevantes da questão não são 
estudados. A decisão judicial, portanto, resta insatisfatória, dificultando o seu 
cumprimento e ainda produzindo mais impasses‖61. 
 Outro aspecto de exaurimento a ser levantado é a questão da lentidão/ 
morosidade da prestação jurisdicional, privilégio que não é somente do Brasil. A 
despeito da demora, ―o processo brasileiro não precisa humilhar-se no mundo. De 
qualquer forma, ninguém deixa de reconhecer que a demora da Justiça é também 
uma forma de injustiça‖62. Para Feitosa, a demora na prestação jurisdicional 
acarreta custos que se aproximam ou, até mesmo, superam o valor objeto do 
litígio. Por isso, o tempo excessivo entre o início e o término do processo leva a 
maioria das partes a desistirem da causa ou a realizarem acordos, em grande 
parte, desvantajosos. ―O conhecimento sobre a morosidade judicial repercute nas 
escolhas das partes, interfere na sua disponibilidade em ingressar em juízo e 
 
59
FEITOSA, Gustavo Raposo Pereira. Virtualização do Processo, Acesso à Justiça e Miséria: 
limites do modelo de justiça informal. Disponível em: 
<http://www.conpedi.org.br/anais/36/07_1361.pdf>. Acesso em 20 mai 2012, p. 1799. 
60
SALES, Lilia Maia de Morais. Justiça e Mediação de conflitos. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p. 
65. 
61
SALES, Lilia Maia de Morais. Justiça e Mediação de conflitos. Belo Horizonte: Del Rey, 2003, p. 
65. 
62
NALINI, José Renato. Novas perspectivas no acesso à justiça. Disponível em:< 
http://www.cjf.gov.br/revista/numero3/artigo08.htm>.Acesso em: 20 set 2011. 
34 
 
 
 
acaba por oferecer uma vantagem adicional àquele que pode suportar os custos 
da demora por mais tempo‖63. 
 Evidentemente, o aumento crescente do ajuizamento das ações gera um 
acúmulo enorme nos cartórios, ocasionando igualmente um crescimento na 
quantidade de trabalho, sem aumentar o número de pessoas para dar suporte ao 
aparato judiciário. Nessa situação, verifica-se, ainda, a sobrecarga do trabalho 
dos magistrados e, assim, não conseguem agilizar e fundamentar suas decisões. 
Para Santos, ―na maior parte do século XX, nos países latinos americanos, o 
Judiciário não figurou como tema importante em matéria de reforma, cabendo ao 
juiz a figura inanimada de aplicador da letra da lei emprestada do modelo 
europeu‖64. O quadro piora quando as ações coletivas não conseguem mais dar 
respostas à população em geral e há a reiterada prática de interposição de 
recursos de decisões já pacificadas no sentido protelatório de ganhar tempo. Nas 
palavras de Theodoro Junior, 
 
deve-se reconhecer, infelizmente, que o Poder Judiciário é visto por 
muitos como o mais burocratizado e mais ineficiente dos poderes 
estatais além de ser considerado o mais ritualista e mais refratário à 
modernização. Tais circunstâncias por certo o atrapalham a superar a 
morosidade de sua atuação, especialmente em face do esclerosamento 
de suas rotinas operacionais
65
. 
 
 Ainda, contribuindo para a situação, há o acúmulo de instâncias, a falta de 
preparo dos operadores, bem como dos servidores e magistrados frente aos 
mecanismos de agilidade dos procedimentos judiciais. A título de ilustração, 
conforme relatório do Projeto ―Justiça em Números‖66 do Conselho Nacional de 
Justiça, relativamente ao ano de 2010 ingressaram 24,2 milhões de processos 
nas três esferas da Justiça (17,7 milhões na Justiça Estadual, 3,2 milhões na 
Justiça Federal e 3,3 milhões na Justiça trabalhista), sendo que havia no mesmo 
período 59,2 milhões de processos pendentes. Tramitaram, nos três ramos da 
 
63
FEITOSA, Gustavo Raposo Pereira. Virtualização do Processo, Acesso à Justiça e Miséria: 
limites do modelo de justiça informal. Disponível em: 
<http://www.conpedi.org.br/anais/36/07_1361.pdf> Acesso em 20 mai 2012, p. 1799. 
64
SANTOS, Boaventura de Souza. Para uma revolução democrática da justiça. 2.ed. São Paulo: 
Cortez, 2008, p.11. 
65
THEODORO JUNIOR, Humberto. Celeridade e efetividade da prestação jurisdicional. 
Insuficiência da reforma das leis processuais. Revista Síntese de Direito Civil e Processo Civil, 
Porto Alegre, n.36, p. 19-37, 2005, p.30. 
66
O Relatório Justiça em Números 2010, integrante do Sistema de Estatísticas do Poder Judiciário 
(SIESPJ). Disponível em:<http://www.cnj.jus.br/images/pesquisas-
judiciarias/Publicacoes/sum_exec_por_jn2010.pdf>. Acesso em 15 mar 2012. 
35 
 
 
 
Justiça pesquisados, cerca de 83,4 milhões de processos em 2010, quantitativo 
que equivale à soma dos casos novos e dos processos pendentes, além da taxa 
de congestionamento no elevado percentual de 70% para um quadro de 16.804 
magistrados e 321.963 servidores. 
Outro aspecto de exaurimento refere aos custos associado à 
movimentação da máquina judiciário. Nesse sentido, explica Feitosa, 
 
a oferta de assistência judiciária gratuita, na forma de advogados pagos 
pelo Estado ou por Defensorias, a flexibilização das regras de 
sucumbência ou mesmo a criação de organismos judiciais 
especializados e gratuitos contempla algumas das dimensões das 
barreiras impostas aos mais pobres
67
. 
 
Resumidamente, o escasso orçamento dedicado ao Judiciário acarreta a 
sua má-reputação e a sua falta de descredibilidade perante a sociedade, 
aumentando os problemas de exaurimento instaurado no sistema de justiça 
brasileiro. 
 Para Spengler e Morais, desenham-se os seguintes tipos de crise 
jurisdicional: a objetiva ou pragmática, que é aquela referente a questões de 
linguagem técnico-formal utilizada nos trabalhos forenses e que acumulam 
burocracia e lentidão ao procedimento; a crise subjetiva ou tecnológica, que 
refere-se à (re)formulação das mentalidades, em especial por buscar apenas 
soluções para conflitos transindividuais; e a última, considerada paradigmática, 
que é aquela que se refere aos métodos e conteúdos utilizados para a busca de 
um tratamento pacífico para os conflitos, ou seja, ―a adequação do modelo 
jurisdicional para atender às necessidades sociais do final do século e do 
milênio‖68. 
 Para Dinamarco, as fontes dos problemas se originam 
 
 
 
 
 
67
FEITOSA, Gustavo Raposo Pereira. Virtualização do Processo, Acesso à Justiça e Miséria: 
limites do modelo de justiça informal. Disponível em: < 
http://www.conpedi.org.br/anais/36/07_1361.pdf>. Acesso em 20 mai 2012, p. 1799. 
68
MORAIS, José Luiz Bolzan de; SPENGLER, Fabiana Marion. Mediação e arbitragem: alternativa 
à jurisdição. 2.ed. rev. e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2008, p.79. 
36 
 
 
 
da Lei vêm defeitos como a extrema burocracia dos serviços judiciários e 
pequena abrangência dos julgamentos, com causas que se repetem às 
centenas e congestionam os juízos e tribunais [...] Da realidade 
econômica vem insuficiência de recurso das pessoas carentes para 
custear o litígio sem prejuízo da subsistência, associada à precariedade 
dos serviços de assistência Judiciária. Da realidade cultural da nação 
vem a desinformação e, o que é pior, a descrença nos serviços 
judiciários. Da estrutura política do Estado vem dificuldades como a que 
se apóia no mito da discricionariedade administrativa e exagerada 
impermeabilidade dos atos administrativos à censura judiciária
69
. 
 
Assim, o exaurimento é resultado, também, da própria concepção de 
jurisdição. Normalmente, entende-se que a jurisdição é exercida por aquela 
autoridade estatal (Juiz) encarregada de resolver o conflito dos cidadãos, sendo 
que, nesse sistema, para se alcançar a ―justiça‖, necessariamente haverá um 
perdedor (além do ganhador, é obvio), ou seja, há uma cultura que ―privilegiou o 
paradigma ganhar-perder, que funciona com uma lógica determinista binária, na 
qual a disjunção e a simplificação limitam as opções possíveis‖.70 Ressalta-se, 
ainda, que o conflito deve ser analisado como uma forma de mudança, isto é, ―os 
conflitos entre pessoas, sistemas ou subsistemas de sistemas complexos podem 
ser percebidos como um aspecto indesejável ou como uma oportunidade de 
mudança‖71. 
Desse modo, visto alguns dos principais aspectos que tem levado o modelo 
tradicional de prestação jurisdicional ao exaurimento, impõem-se verificar as 
possibilidades de mudanças, propostas a seguir. 
 
1.2.3 Os atuais desafios de acesso à Justiça 
 
A noção de acesso à justiça sofre com os problemas em nível estrutural, 
conceitual e cultural. Capelletti72 salienta essa temática quando trata das três 
ondas de desafios para enfrentar o exaurimento da prestação jurisdicional. 
 
69
DINAMARCO, Candido Rangel. Instituições de direito processual civil. São Paulo: Malheiros, 
2002. v.1, p.113. 
70
SCHNITMAN, Dora Fried; LITTLEJOHN, Stephen. Novos paradigmas em mediação. Trad. 
Marcos A.G. Domingues e Jussara Haubert Rodrigues. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1999, 
p.17. 
71
SCHNITMAN, Dora Fried; LITTLEJOHN, Stephen. Novos paradigmas em mediação. Trad. 
Marcos A.G. Domingues e Jussara Haubert Rodrigues. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 1999, p. 
17 
72
CAPPELLETTI, Mauro; GARTH, Bryant. Acesso à justiça. Porto Alegre: SAFE, 1988, p. 12.

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