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Aplicacao da lei penal no tempo e no espaco Data do resumo: 09/09/2016 Extraído de: Manual de Direito Penal – Guilherme Nucci; 12ª Ed. Lei penal no tempo A regra geral no direito é a aplicação da lei vigente a época dos fatos – tempus regit actum. Na esfera penal ocorre o mesmo, ou seja, ao crime cometido em determinada data aplica-se a lei penal vigente no mesmo dia, ainda que a sentença venha a ser proferida posteriormente. A exceção a essa regra configura-se pela extratividade da lei, que se materializa de duas formas: Retroatividade: aplicação da lei penal benéfica a fato criminoso ocorrido antes do período de sua vigência (art.5º, XL da CF/88); a lei retroage em benefício do réu. Ultratividade: aplicação da lei penal benéfica já revogada a fato jurídico ocorrido após o período da sua vigência, inclusive a sentença. Contudo, a data do cometimento do delito é a base e o limite inicial para a aplicação da extratividade. Existe ainda a possibilidade de aplicação de lei penal intermediária, isto é, aquela lei que surgiu após a ocorrência do fato criminoso e foi revogada antes da sentença. Neste caso, caso beneficie o réu, haverá a retroatividade no tocante ao fato criminoso, e haverá a ultratividade no momento da sentença. Para a escolha da lei penal mais favorável ao réu, temos como marco inicial a data da prática do ato criminoso e a data da extinção da punibilidade. ABOLITIO CRIMINIS – ABOLIÇÃO DO DELITO Fenômeno pelo qual uma lei posterior deixa de considerar crime determinado fato, como por exemplo, a descriminalização do adultério, sedução e rapto consensual. De acordo com o art. 107, III do CP, quando ocorre a abolitio criminis extingue-se a punibilidade do agente. Portanto, em qualquer fase na qual se encontre o processo, ainda que na execução da pena, deve ser imediatamente aplicada a retroatividade da norma que retirou a tipicidade do fato. Destaca-se que, uma vez aplicada a abolitio criminis, não deverá subsistir contra o réu qualquer dos efeitos gerados pela prática do fato criminoso, inclusive o registro constante da folha de antecedentes deverá ser apagado. Outro fator de relevância é que o fato do Estado abolir um tipo penal não faz surgir o direito à reparação e a respectiva indenização, pois o que ocorre é a extinção de punibilidade e não erro por parte do Estado no processo penal. Havia um fato típico praticado que passou a não ser mais considerado como tal. Abolitio Criminis x Novatio Legis in Mellius A novatio legis in mellius não se confunde com a abolitio criminis, uma vez que não representa a abolição de um fato típico, mas apenas sua alteração, variando a descrição da conduta, excluindo certas maneiras de execução, ou ainda alterando a sanção penal. Mantém-se a figura delitiva, mas sob uma nova roupagem que beneficia o réu. Portanto, trata-se de mera reforma e não abolição. Um exemplo de novatio legis in mellius foi a edição da Lei 9.714/98 que permitiu a aplicação das penas restritivas de direitos a todos os delitos cuja pena privativa de liberdade não superasse a marca dos 4 anos de reclusão ou detenção, quando dolosos e não violentos. O que ocorreu nesse caso foi o abrandamento da punição e não a extinção da punibilidade. Abolitio Criminis x Novatio Legis in Pejus A novatio legis in pejus é o fenômeno pelo qual o legislador transfere a outro tipo penal incriminador a mesma conduta, aumentado a pena em muitos dos casos. Um exemplo disso é a Lei 11.106/05 que excluiu o art. 219 do CP – rapto, mas colocou parte de seu texto no art. 148, §1º, V do CP com aumento de pena. Portanto, privar alguém de sua liberdade, mediante sequestro ou cárcere privado, para fins libidinosos continua sendo crime, porém, não está mais tipificado como rapto e transformou-se em causa de agravante. ATENÇÃO! Uma lei penal benéfica pode ser aplicada ao caso concreto mesmo em seu período de vacatio legis? Paulo José da Costa Júnior e Cernicchiaro: a lei na vacatio não deixa de ser lei posterior, portanto, deve ser aplicada desde logo, se beneficia o réu. Frederico Marques, Delmanto e Damásio: defendem que a lei nova em período de vacatio ainda não está em vigor, motivo pelo qual as relações sociais permanecem sob a vigência da lei antiga, já que uma lei somente quando uma lei deixa de vigorar outra lhe pode ocupar o espaço e produzir efeitos. Guilherme Nucci: o princípio constitucional da retroatividade benéfica, que apenas se refere à lei penal, não especifica ou impõe qualquer restrição ou condição. Outrossim, a vacatio legis é instituída por lei infraconstitucional e o art. 59, § único da CF/88 preceitua que lei complementar disporá sobre a elaboração, redação, alteração e consolidação das leis, mas não menciona expressamente a sua vigência. Dessa forma, deduz-se que, em favor do réu, a possibilidade de se aplicar, em plenitude, a retroatividade benéfica durante o período de vacância, fundamentando tal dedução no princípio da dignidade da pessoa humana, que se sobrepõe a formalismo legal. ATENÇÃO! É possível combinar leis para beneficiar o réu? Frederico Marques, Basileu Garcia, Magalhães Noronha, Mirabete, Damásio, Celso Delmanto, Nereu José Giacomolli: defendem a possibilidade de combinação de leis, pois seria apenas um processo de integração da lei penal, visando à fiel aplicação do contido no art. 2º, § único do CP. Nélson Hungria, Aníbal Bruno, Heleno Fragoso, Jair Leonardo Lopes, Paulo José da Costa Junior, José Henrique Pierangeli: defendem a impossibilidade de combinação de leis, pois entendem que seria permitir ao juiz criar uma instrução normativa não prevista pelo legislador. Entende pela impossibilidade de combinação de leis, conforme previsto na Súmula 510, que admite a retroatividade da lei na íntegra de suas disposições, sendo vedada a combinação de partes de leis. Em novembro de 2013 apreciou o tema e por maioria de votos vedou a combinação de leis penais. COMPETÊNCIA PARA APLICAÇÃO DA LEI PENAL BENÉFICA Divide-se em: Processo em andamento até a sentença: cabe ao juiz de 1º grau. Em grau de recurso: cabe ao Tribunal, dependendo da situação concreta. a) Tratando-se de redução de tempo de pena, o Tribunal pode aplicar a lei benéfica, pois o mínimo é o montante que foi fixado pelo magistrado. Logo, o stj stf Tribunal apenas aplicará a redução, não havendo nesse caso a supressão de instância. b) Havendo alteração nos critérios para o cálculo da pena-base, não poderá o Tribunal aplicar a redução, uma vez que o processo de individualização da pena terá que ser refeito. Nessa hipótese, o Tribunal deve remeter o processo ao juiz de 1ª instância para que o mesmo possa fixar a pena com base na lei nova. Havendo trânsito em julgado da decisão: a) Cabe ao juiz da execução criminal, com base na Súmula 611 do STF, art. 13, ‘caput’ da LICPP e art. 66, I da LEP. Posição majoritária da doutrina. b) Cabe ao Tribunal por meio de revisão criminal. CRIME PERMANENTE E LEI PENAL BENÉFICA Crime permanente: aquele cuja consumação se estende no tempo. Nessa hipótese, advindo lei nova que, por exemplo, aumente o tempo de pena, esta lei nova será imediatamente aplicada, desde que prossiga na vigência dela a conduta necessária à permanência do resultado, uma vez que nesse tipo de crime a conduta deação ou omissão do agente se perpetua no decorrer da prática do crime. Este é o entendimento consagrado na Súmula 711 do STF. ATENÇÃO! Crime permanente NÃO se confunde com crime instantâneo de efeito permanente, pois esse último trata-se do crime instantâneo que tem a aparência de permanente por causa do seu método de execução, como por exemplo, a bigamia. Ao contrair o segundo casamento, o agente torna-se bígamo, um estado que perdura com o passar do tempo. CRIME CONTINUADO E LEI PENAL BENÉFICA Está previsto no art. 71 do CP e ocorre quando o agente pratica várias condutas, implicando na concretização de vários resultados, cometendo infrações penais da mesma espécie, em circunstâncias parecidas de tempo, lugar e modo de execução. Portanto, aplica-se apenas a pena de um dos delitos, se iguais, ou a pena do mais grave, se diversas, aumentada de 1/6 a 2/3. Assim como ocorre com os crimes permanentes, no crime continuado aplica-se a Súmula 711 do STF, uma vez que uma série de crimes constitui um único delito para a finalidade de aplicação da pena. Logo, se uma lei nova é benéfica ou prejudicial deverá ser aplicada ao caso. RETROATIVIDADE DA LEI PROCESSUAL PENAL BENÉFICA Existem dois tipos de norma processual penal: Normas processuais penais materiais: trata de temas ligados ao status libertatis do acusado, tais como queixa, perempção, decadência, prisão cautela, prisão em flagrante etc. Normas processuais penais propriamente ditas: trata de temas ligados ao procedimento, tais como formas de citação e intimação, modos de colheita de prova, prazos, mandados etc. A doutrina e a jurisprudência entendem que no que se refere às normas penais processuais materiais, deve-se aplicar a retroatividade de lei mais benéfica. Já no que se refere as normas processuais penais propriamente ditas, entendem que não há aplicação da retroatividade, devendo ser aplicadas imediatamente, ainda que possam prejudicar o réu. LEIS INTERMITENTES Leis formuladas para durar um período determinado e breve. Há duas espécies de leis intermitentes: Excepcionais: feitas para durar enquanto um estado anormal ocorrer. Cessam sua vigência assim que a situação excepcional termina como, por exemplo, uma lei editada para aumentar penas de determinados crimes enquanto permanecer o estado de calamidade pública declarado em determinada localidade. Temporárias: editadas com período certo de duração e, portanto, dotadas de autorrevogação como, por exemplo, uma lei editada para durar por 6 meses. Essas espécies de lei não seguem a regra prevista no art. 2º do CP, ou seja, a elas não se aplica a retroatividade, pois se assim fosse permitido, essas espécies de lei seriam inócuas e perderia o seu objetivo. Embora não possam retroagir, podem gerar efeitos mesmo após sua revogação, desde que o fato tenha sido praticado quando ainda estavam em vigor. Logo, o que ocorre é ultra-atividade. NORMAS PENAIS EM BRANCO ATENÇÃO! Há uma exceção quanto à aplicação da retroatividade, que ocorre quando uma lei temporária mais benéfica, editada posteriormente, altera para melhor lei temporária anterior, sendo certo que o período temporal deve ser observado. Isso é possível porque a retroatividade ocorrerá entre normas de igual status e com idêntica finalidade. NORMAS PENAIS EM BRANCO São aquelas que necessitam de complemento. Quando o complemento advier de norma com mesmo status legal, ou seja, provenientes do mesmo órgão legiferante, da mesma fonte normativa (normas homogêneas), são denominadas de normas impropriamente em branco como, por exemplo, os impedimentos matrimoniais descritos no tipo do crime do art. 237 do CP, que são encontrados no Código Civil, norma de mesmo status que o Código Penal. Quando o complemento advier de órgão legiferante diverso e de hierarquia inferior, de fonte normativa diversa (normas heterogêneas), são denominadas de normas propriamente em branco. Como, por exemplo, o crime contra a economia popular referente à transgressão da tabela de preços, que encontra o complemento (elaboração da tabela de preços) em norma estabelecida por órgão do Poder Executivo, que possui fonte normativa diversa. ATENÇÃO! Normas penais em branco NÃO se confundem com tipos penais remetidos, pois os últimos tem um objetivo explicativo e não dependem de uma legislação fora do âmbito penal para que sejam compreendidas integralmente, bastando mera consulta ao dispositivo indicado no artigo. Logo, uma norma explicativa qualquer, de conteúdo penal, não é suficiente para caracterizar a norma em branco. Legalidade das Normas Penais em Branco As normas penais em branco não ofendem a legalidade porque seu complemento pode ser encontrado na lei penal ou em outra fonte legislativa, embora diversa do Direito Penal, previamente determinada e conhecida. Contudo, é importante observar que o complemento da norma é considerado intermitente, pois pode sofrer alteração ao longo do tempo a exemplo do que ocorre com a tabela de preços. Nesse sentido, tratando-se de complemento com caráter secundário à própria norma penal, ele é sempre ultrativo como, por exemplo, o crime de transgressão à tabela de preços, no qual o acusado terá desobedecido a tabela X e no curso do seu processo estar em vigor a tabela Y. O sujeito será acusado com base na transgressão à tabela X, mesmo que essa não esteja mais em vigor, pois o importante foi o descumprimento da tabela em vigor na época do fato e não os preços em si. Porém, quando o complemento da norma for a parte essencial da mesma, será aplicada a retroatividade benéfica como, por exemplo, o porte de substância entorpecente. Caso a substância objeto do fato criminoso seja retirada da lista do Ministério da Saúde, será aplicada a retroatividade, pois o que importa é saber qual a substância que estava na posse do indivíduo de modo que se possa verificar a tabela do Ministério da Saúde e aplicá-la ao caso. Quando o complemento da norma advier da mesma fonte legislativa de onde surgiu a própria lei penal em branco, a retroatividade benéfica é imperiosa! ATENÇÃO! Excepcionalmente podemos encontrar uma norma penal em branco na qual poderemos aplicar o art. 2º do CP – retroatividade ou o art. 3º do CP – ultratividade. Isso ocorrerá quando a complemento for vago demais, necessitando-se de uma análise maior. Um exemplo é o art. 268 do CP – “Infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa”. Complemento: “determinação do poder público” O poder público revoga tal determinação Retroatividade Ultratividade a) Se foi revogada porque constatou-se que a doença não era contagiosa, retroagirá. b) Se foi revogada porque a doença contagiosa que se propagava, cessou de fazê-lo, o complemento será ultrativo, ou seja, aqueles que respondem pelo fato tipificado permanecerão nessa condição. dica
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