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OF18 Paulo Roberto Fitz

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Anais XVI Encontro Nacional dos Geógrafos 
Crise, práxis e autonomia: espaços de resistência e de esperanças 
Oficinas 
 
 
 
 
Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN: 978-85-99907-02-3 
 
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Paulo Roberto Fitz (coord.) 
Seção Porto Alegre 
e-mail: fitz@unilasalle.edu.br 
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GEOGRAFIA TECNOLÓGICA: UMA NOVA MANEIRA DE PENSAR GEOGRAFIA 
 
RESUMO 
As questões epistemológicas sempre ocuparam lugar de destaque no âmbito da ciência geo-
gráfica. Na busca por uma sociedade mais justa, através de uma crítica social, a Geografia 
percorreu caminhos que, por vezes, a afastaram do centro das decisões. Tal situação traz con-
sigo preocupações que talvez demonstrem um certo esgotamento do modelo atual, especial-
mente no que diz respeito à aplicabilidade da ciência frente a questões relacionadas à crise en-
frentada pelo capitalismo nos dias de hoje. Alternativas para revigorá-la podem ser o primeiro 
passo para um redirecionamento que forneça à Geografia a capacidade necessária para propor 
soluções plausíveis, com vistas à discussão e à resolução de problemas na estrutura de nossa 
sociedade. Para isto, sugere-se uma abordagem baseada no que denominou-se de Geografia 
Tecnológica, a qual procura integrar, dentro de uma concepção humanística, os avanços tec-
nológicos com o objeto de estudo e com determinados preceitos metodológicos da ciência ge-
ográfica. Esta oficina pretende apresentar algumas considerações a respeito dos temas envol-
vidos a fim de se gerar discussões e proposições em torno dos mesmos. Serão apresentados 
exemplos de aplicação de metodologias de ação a fim de fornecer um caráter mais pragmático 
à ciência, buscando aproximá-la de seu objeto de estudo, em termos de aplicabilidade prática 
e eficiente, mas nunca afastando-se de seu viés social e ambiental. 
 
1 INTRODUÇÃO 
Concebida na área das humanidades, a Geografia possivelmente sofra as agruras in-
trínsecas ao seu próprio caráter científico-metodológico. As dificuldades em superar obstácu-
los internos podem, muitas vezes, impedir adequações ou avanços epistemológicos tão neces-
sários para a evolução científica, uma vez que a sociedade tende a cobrar ações mais efetivas 
da academia. 
É certo que o esvaziamento de determinados cursos tradicionais nas universidades po-
de ser entendido como reflexo de uma recomposição da sociedade, situação que pode ser vis-
lumbrada com o caso da Geografia. Em 2001, o curso de graduação em Geografia da Univer-
sidade Federal do Rio Grande do Sul, no horário noturno, possuía densidade de 11,27 candi-
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Crise, práxis e autonomia: espaços de resistência e de esperanças 
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datos por vaga; em 2010, este valor cai para 4,68 candidatos por vaga (UFRGS, 2010). Se por 
um lado esta fase pode ser explicada através de uma recomposição mercadológica, por outro, 
a própria crise de identidade epistemológica da ciência pode a assumir papel como indicador 
do fracasso de sua impostação frente à sociedade. Faz-se necessária, portanto, a busca de so-
luções para revigorar a ciência e reordenar a lógica atual de nossa estrutura social, um dos pa-
péis da Geografia enquanto ciência. Neste sentido, propõe-se discutir a situação atual da Geo-
grafia a partir de uma possível reestruturação epistemológica. 
2 METODOLOGIA – NOVOS CAMINHOS PARA A GEOGRAFIA 
Antes de se trazer o assunto específico, serão trazidos conceitos gerais, tais como co-
nhecimento, epistemologia, paradigma etc. A partir daí, apresentar-se-á que, especialmente a 
partir dos anos 80 do século passado, a ciência passou a experimentar um certo consenso com 
relação ao seu caráter social. Isto poderá ser exemplificado quando Buzai (1999) a situa no rol 
das ciências humanas. Será visto, de igual sorte, que a relação homem-meio, ou ambiente vi-
vido-sociedade continua a traduzir, sob certo aspecto, a essência do pensamento geográfico 
com relação ao seu objeto de estudo (MORAES, 2005; MOREIRA, 2002). Igualmente, serão 
apresentadas as considerações de Pierre George, quando, por exemplo, chegou a apresentá-la 
como “uma ciência de síntese” que faria uso dos métodos de outras ciências (GEORGE, 
1986). Os presentes serão instigados a discutir sobre o assunto, já que talvez neste aspecto re-
sida o principal obstáculo epistemológico a ser trabalhado, uma vez que, em geral, a formação 
experimentada ao longo da universidade fornece uma gama de conteúdos multidisciplinares 
frequentemente desprovidos de aparentes conexões e aplicabilidades. 
Será levantada, então, a questão da concorrência no mercado de trabalho, uma vez que 
o profissional geógrafo se depara com um mundo que, em muitos casos, foge totalmente aos 
ensinamentos acadêmicos, no qual a utilização de geotecnologias ocupa lugar de destaque. 
Para ilustrar, serão apresentados dados relativos à procura por cursos superiores e à expansão 
do uso da computação, especialmente em termos do uso de ferramentas de análise espacial. 
Neste ponto, devem ser insufladas algumas das divergências internas da Geografia en-
quanto ciência, como, por exemplo, o dilema Geografia Humana versus Geografia Física, que 
parece resistir aos tempos. Tentando explicar o período do final do século passado, serão a-
presentadas algumas considerações, como a de Milton Santos (1998), quando concebeu o que 
chamou de “meio técnico-científico”, isto é, “o momento histórico no qual a construção ou 
reconstrução do espaço de dará com um crescente conteúdo de ciência e técnicas” e sua deri-
vação para o denominado “meio técnico-científico-informacional”, onde uma informatização 
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é agregada à ideia (SANTOS, 1998, p. 139). Paralelamente, serão apresentados trabalhos de 
outros pesquisadores que procuravam explicar possíveis novos rumos experimentados pela 
Geografia. Neste sentido, será destacado o estudo de Buzai (1999), com sua “Geografia Glo-
bal” a qual, situada dentro da Geografia, se constituiria em um novo campo teórico-
metodológico de aplicação generalizada, sob ambiente computacional. No trabalho a ser bre-
vemente comentado, o autor procurou sintetizar o direcionamento da Ciência Geográfica no 
final do século XX. Baseado em outros pesquisadores, relacionou três perspectivas para tal: 
i. Ecologia da Paisagem, derivada dos paradigmas regional, racional e humanista; 
ii. Geografia Pós-moderna, com conceitos do paradigma crítico; e 
iii. Geografia Automatizada, vinculada ao paradigma quantitativo. 
Nesta etapa, serão questionadas tais perspectivas, as quais podem sugerir uma certa 
divergência, ou um distanciamento entre as mesmas. Paradoxalmente, entretanto, depreende-
se que elas possam conduzir para uma aproximação. Nesse contexto, defender-se-á que a in-
formatização e a automação de métodos e procedimentos científicos tenderia a facilitar análi-
ses vinculadas a quaisquer dos paradigmas relativos. Haveria, assim, uma possibilidade de en-
trelaçá-los na busca de uma unidade de ação. Será demonstrado que tais considerações vêm 
sendo debatidas desde, pelo menos, as duas últimas décadas do século passado. Se por uma 
lado percebe-se a possibilidade de um cisalhamento da Geografia, como sugeria Bosque Sen-
dra (1999), por outro, pesquisadores como Dobson (2004) apresentam as tecnologias dos 
SIGs como um novo campo de trabalho para os geógrafos. Em diversos textos, o referido au-
tor, que já trabalhara, assim como Goodchild (2004), a idéiade uma CIG (Ciência da Infor-
mação Geográfica), discute sobre uma possível revolução no conhecimento geográfico a par-
tir do uso de SIGs (Dobson, 1993; 2004). 
As perspectivas brevemente descritas, e que deverão ser motivo de debates, sugerem a 
proposta de uma nova noção que, apesar de ainda não contar com um tratamento mais acadê-
mico, parece traduzir bem o atual estágio. Trata-se do que denominaremos de “Geografia 
Tecnológica”, noção brevemente desenvolvida no capítulo 2 do livro “Geoprocessamento sem 
complicação” (FITZ, 2008). Aqui pretende-se discutir questões vinculadas a esta proposição. 
A Geografia Tecnológica deverá ser encarada como uma nova proposta paradigmática, dentro 
de uma concepção humana da ciência, onde seriam integrados os avanços tecnológicos com o 
objeto de estudo e com certos preceitos metodológicos da mesma. Buscaria-se, assim, uma 
aproximação maior com um dos quadros que se desenha no momento: o de uma unificação de 
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ações. O vínculo Geografia-tecnologia deverá ser constatado a partir de trabalhos apresenta-
dos em congressos, de dissertações de mestrado e de teses de doutorado. 
Entendendo a Geografia Tecnológica como uma vertente do movimento de renovação 
da Geografia, descrito por Moraes (2005), serão discutidos certos princípios básicos que em-
basam o desenvolvimento de suas ações metodológicas em termos de análise do problema. 
Estes, adaptados e reformulados a partir de antigas propostas concebidas ao longo do desen-
volvimento da ciência, serão apresentados e discutidos junto aos presentes. São eles: 
i. Princípio da espacialidade, derivado do princípio da localização, o qual sustenta 
que todo fenômeno ocupa um determinado lugar no espaço, definido através de 
um conjunto de coordenadas identificáveis e únicas, interferindo neste e em outros 
espaços adjacentes ou não, modificando-os de maneira mais ou menos impactante; 
ii. Princípio da causalidade, o qual seguindo sua tradicional diretriz, especifica que 
podem ser estabelecidas relações de causa e efeito de um fenômeno que ocorre em 
dado espaço, com determinado grau de incerteza; 
iii. Princípio da comparação e análise, o qual apresenta que todo o fenômeno obser-
vado na superfície terrestre pode ser comparado e analisado a partir de outro fe-
nômeno semelhante que ocorre em espaço diferente do primeiro; 
iv. Princípio da correlação, o qual estabelece que a ocorrência de um determinado 
fenômeno pode ser relacionada a outra em um espaço que apresente condições as-
semelhadas; e 
v. Princípio da decorrência, cuja proposição sustenta que todo o fenômeno de cará-
ter geográfico deriva da intervenção humana no espaço por ele constituído. 
É sabido que os princípios da ciência geográfica tradicional nortearam muitos dos tra-
balhos realizados dentro de tal percepção, o que, de certa forma, desagrada a uma significativa 
parcela de geógrafos. Entretanto, como será mostrado, tais princípios continuaram norteando, 
direta ou indiretamente, muitos trabalhos dos usuários de geotecnologias, a maioria constituí-
da por profissionais não-geógrafos. 
Os princípios propostos subsidiam metodologias de ação para a Geografia Tecnológi-
ca, onde as etapas a serem vencidas tornam-se sobremaneira mais dinâmicas e práticas. Tais 
princípios serão demonstrados a partir de exemplos de aplicação. Nas condições descritas, 
procurar-seá estabelecer que esta maneira de “pensar geografia” tão somente faria uso de téc-
nicas mais objetivas e específicas, constituindo-se como uma nova maneira de abordar meto-
dologicamente o objeto de estudo da ciência. Não seriam desprezadas, entretanto, as propostas 
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de análise vinculadas à escola crítica, por exemplo, visto que tal maneira de se pensar Geogra-
fia, na opinião expressa neste texto, reflete melhor os anseios da sociedade. 
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS 
As reflexões apresentadas, procuraram descortinar certas apreensões quanto aos cami-
nhos futuros da Geografia enquanto ciência, especialmente no que diz respeito à aplicabilida-
de prática da mesma. Há necessidade urgente de sair do marasmo em que a ciência se encon-
tra, a fim de que se possa servir de instrumento ativo para reordenar a estrutura mercadológica 
vivida pela sociedade atual. Conforme procurar-se-á estabelecer nas discussões, a Geografia 
Tecnológica buscaria resguardar certos princípios epistemológicos intrínsecos à Geografia, 
enquanto ciência, com a finalidade de reforçar a sua importância e adequação junto à socieda-
de. Desta maneira, ser-lhe-ia conferido um caráter mais pragmático para aproximá-la de seu 
objeto de estudo, possibilitando sua aplicabilidade prática em termos de uma reestruturação da 
lógica da produção capitalista. Almeja-se que esta oficina possa provocar discussões sobre o 
futuro da Geografia enquanto ciência, com o intuito de sugerir caminhos viáveis para a evolu-
ção do pensamento geográfico. A Geografia Tecnológica constituiria-se, nesta concepção, em 
uma proposta prática e factível. 
 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 
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Encuentro de Geógrafos de América Latina, 7 1999, San Juan de Puerto Rico. Publicaciones 
CD. San Juan, CD-ROM,1999, 15p. 
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minar. São Paulo: FCC, 2009. 
FITZ, Paulo R. Geoprocessamento sem complicação. São Paulo: Oficina de Textos, 2008. 
GEORGE, Pierre. Os métodos da Geografia. 2 ed. São Paulo: Difel, 1986. 
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MORAES, Antonio Carlos Robert. Geografia: pequena história crítica. 20. ed. São Paulo: 
Annablume, 2005. 
MOREIRA, Ruy. O que é Geografia. 14 ed. São Paulo: Brasiliense, 2002. 
SANTOS, Milton. Técnica, Espaço, Tempo: Globalização e meio técnico-científico in-
formacional. 4 ed. São Paulo: Hucitec, 1998. 
UFRGS. Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Coperse – Comissão Permanente de Se-
leção. Disponível em http://www.ufrgs.br/coperse/ Acesso em 19/04/2010.

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