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Prof. Douglas Pizarro 7 Elementos-chave do Treinamento de Força Uma abordagem científica Prof. Douglas Pizarro 05/03/2017 Os “7 elementos-chave do treinamento de força” é uma análise crítica dos principais conceitos do treinamento com um viés científico atualizado, sem perder o foco na sua aplicação prática. Prefácio Uma rápida caminhada pelas academias e facilmente identificamos erros crassos no processo de treinamento, desde o planejamento até sua execução. Exemplos são numerosos: incoerência nas divisões do treino, sobrecarga articular ignorada, periodização inexistente, técnica e execução fracas, isso sem citar a fundo o controle de diversas variáveis que implicam diretamente na qualidade e eficácia do treino. E não é à toa. Em uma área do conhecimento tão ampla e complexa como a ciência do treinamento, novas informações surgem a todo momento, assim como modelos de treino ou exercícios buscando atingir o maior número de adeptos possível sem muitas vezes possuir um embasamento científico por trás, expondo as pessoas a rotinas inefetivas ou até mesmo lesivas a médio-longo prazo. Fontes de informação sobre esta temática raramente conseguem acompanhar a velocidade de renovação do conhecimento biológico acerca do treinamento esportivo, sendo necessária uma busca constante por conteúdo atual que basicamente se concentra em artigos científicos em língua estrangeira, o que dificulta o acesso da maioria dos estudantes da área. Pensando nisso, criei um material rico que vai abordar os 7 principais conceitos e variáveis do treinamento de força com uma visão embasada no que há de mais relevante no conhecimento científico atual. Com a preocupação de transmitir a informação com linguagem simples e didática, o conteúdo deste e-book mesclará textos e vídeos, o que certamente vai propiciar um maior aprendizado e otimizar o tempo do leitor. Você, estudante de educação física, certamente encontrará informações valiosíssimas que muitas vezes não são abordadas com a devida profundidade em sala de aula e o profissional já graduado encontrará respostas para otimizar a abordagem dos treinamentos no cotidiano do aluno e consequentemente aumentar a satisfação pelo seu serviço. Espero que goste, e se buscar mais conteúdos e discussões sobre treinamento, se inscreva nos meus canais e página do facebook. Bons estudos! Introdução A teoria predominante da ciência do exercício postula que as adaptações musculares são maximizadas pela manipulação precisa das variáveis do programa de treinamento de força. Porém, historicamente a relação quantificável entre volume, intensidade, frequência e demais variáveis do treino visando otimizar os ganhos de força tem sido obscura e controversa. Por muitos anos, opinião pessoal e inúmeras fontes de informação sem viés científico foram as fontes primárias de evidência para suportar as filosofias de treino. Mas com o passar dos anos, métodos de investigação mais detalhados e objetivos possibilitaram a compilação de informações que juntas trazem maior clareza sobre as variáveis determinantes no desempenho e ganhos de massa muscular. Mesmo assim, vemos uma série de limitações e insconsistências na literatura que permitiriam tirarmos conclusões equivocadas quando se analisa experimentos de forma isolada. Com o aumento ao acesso à informação, tal procedimento tem sido cada vez mais comum nos meios de comunicação, onde informações isoladas são usadas para induzir aquilo que quer ser dito pelo locutor, sendo em um programa de tv, internet ou afins. Cabe a nós termos uma visão muito mais ampla do processo de treinamento para disseminarmos informações com mais qualidade para aqueles que precisam dela. Meu objetivo como autor deste e-book é justamente sintetizar esta gama de informações em um conteúdo consistente e coeso. Espero que gostem! 1. Intensidade da Carga intensidade é premissa básica do treinamento de força. Esta variável está diretamente ligada com um princípio básico do treinamento: a sobrecarga. Tal princípio ressalta a necessidade de aumentar progressivamente o estímulo a fim de alcançarmos adaptações positivas e evitar a estagnação do sistema. Porém, engana-se quem simplesmente associa tal princípio a necessidade de aumento da carga (o famoso soca peso aí!). “- Perae, como assim?” - você pode perguntar. Bom, vamos lá. Quando o objetivo do treino visa o aumento da área de secção transversa do músculo, a famosa e almejada hipertrofia, o estímulo dado serve como um desencadeador de eventos moleculares que aumentarão de forma aguda a síntese protéica na musculatura treinada. Tanto o estresse mecânico gerado quanto o metabólico têm papel chave nesse processo, e para isso, inúmeras combinações entre as variáveis do treino (volume, intervalo entre série, sistemas de treino, etc) geram resultados crônicos significativos, então um maior entendimento destas variáveis já alterariam o estresse no tecido muscular e a intensidade do treino sem a dependência única e exclusiva de aumento de carga. Ou seja, dependendo da estratégia adotada, podemos utilizar cargas mais intermediárias e gerar aumento da força e massa muscular tanto quanto ou até mais comparado à cargas correspondentes a zonas de treino convencionais. Pra quem isso pode ser benéfico? Diria que para todo mundo, mas imagina aquele cara que está com o joelho “bichado”, onde o aumento da compressão patelo-femoral seja um problema? Ou o aluno que tem desconforto no ombro durante o supino e não quer deixar de utilizar esse ótimo exercício de membros superiores? Enfim, exemplos não faltam. Certamente você está pensando: “Mas e o peso??” - Não confunda, Carga e intensidade são coisas distintas, mas a intensidade da carga, expressa em porcentagem da repetição máxima (%RM) ou em número de repetições máximas (ex: 10 RM), também terá papel relevante no controle de intensidade do treino. Quando buscamos o aumento dos níveis de força e massa muscular, a primeira coisa que nos vem em mente é a necessidade de realizar continua- A Estresse mecânico remete à tensão nas fibras musculares gerada principalmente em situações de alta demanda de quilagem. Já o estresse metabólico remete à resposta química aguda ao exercício, como acúmulo de lactato, íons H+, que aumentarão a acidose local no músculo. mente o aumento das cargas usadas. Tal relação não existe à toa. As unidades motoras (ou somente U.M., composta por um único neurônio motor alfa e todas as fibras musculares que ele inerva) possuem limiares de ativação diferentes, e basicamente o aumento da carga demandaria uma maior frequência de disparo dos neurônios motores para assim alcançar todo o espectro de fibras musculares, principalmente as de contração rápida, que geram maior grau de tensão e possuem maior potencial para hipertrofia. Esse recrutamento respeita o princípio do tamanho, onde as UM menores, responsáveis pelas fibras lentas, seriam ativadas primeiro. Ou seja, ao levantar um peso intermediário, nosso sistema nervoso central envia impulsos necessários para solicitar a musculatura alvo dentro da necessidade da tarefa, começando o recrutamento pelas UM que geram menor tensão. Porém com o surgimento da fadiga, uma alternância no recrutamento das unidades motoras ocorreria, a fim de distribuir a carga de trabalho epossibilitar a manutenção do trabalho mecânico. Seria uma estratégia do nosso corpo para combater a fadiga: começar a solicitar mais fibras musculares para não sobrecarregar aquelas que foram encarregadas da tarefa e interromper o trabalho. E qual a aplicação disso tudo? Este conceito tornaria viável atingir um grande recrutamento do músculo sem a necessidade das altas cargas comumente vistas no treinamento de força sem perder os benefícios nos ganhos de área de secção transversa do músculo, a famosa e desejada hipertrofia. Fiz uma mini-aula para explicar o que os estudos mais atuais dizem sobre o uso de diferentes cargas no treino, recomendo fortemente que vejam! Vídeo - Há um limiar de intensidade da carga para induzir hipertrofia? Dadas as informações levantadas, surge uma questão relevante: seria necessariamente importante atingirmos a falha concêntrica? Bom, a intensidade é sim fator relevante no processo de treinamento, porém alcançar a falha concêntrica não é premissa básica para promover adaptações morfológicas como é veiculado em tantos lugares. Há evidências de que a ativação muscular atinge um patamar 3 a 5 repetições antes do ponto de falha durante uma série de 15 RM, sugerindo que repetições adicionais não resultam em maiores adaptações musculares. Pesquisas recentes mostram ganhos hipertróficos semelhantes quando a série para 2 repetições antes da falha em comparação com um esforço total. Isto se torna particularmente importante na prática profissional onde nem sempre é possível chegar a tal nível de esforço. É interessante conscientizarmos o aluno da importância desse conceito mas no treinamento de força, nenhuma variável trabalhará sozinha, e entendê-las melhor com certeza permitirá maior extração do potencial delas no planejamento da rotina de treinamento. A falha concêntrica remete à incapacidade muscular de continuar o movimento na fase de ascensão dado o alto grau de fadiga. Garante um grau elevado de intensidade na série e tem sido utilizada entre estudos para garantir o nível de esforço máximo dos participantes, porém não é premissa básica para gerar adaptações positivas. 2. Volume de Treino ma das variáveis do treino de força mais críticas é o volume. Represen- tando a quantidade de treino da sessão ou em um período de tempo, o volume é comumente definido na literatura atual como o produto do número de séries x repetições x carga. “-Mas carga, professor? Como assim?” - A utilização da carga no cálculo de volume nos dá noção do trabalho mecânico realizado, possibilitando uma comparação mais fiel entre modelos de treino diferentes. Caso não a usássemos, dificilmente saberíamos se a diferença entre modelos teria como causa a quantidade de exercício de fato ou a influência de outras variáveis. A vídeo aula a seguir explica o conceito de forma mais clara e mostra sua aplicação prática. Vídeo – Novos Conceitos do Volume de Treino Independente se alterarmos o volume da sessão, a frequência de sessões semanais ou ambos, existe um elemento chave que definirá o sucesso e otimização da abordagem: a relação dose-resposta do exercício. É um conceito simples que relaciona a quantidade de estímulo (no nosso caso, o exercício) e o efeito da intervenção (ganho de força, potência, flexibilidade, etc). Um estudo que ilustra bem isso foi conduzido por um grupo de pesquisadores espanhóis onde diferentes volumes de treinos de potência foram aplicados em 42 jovens a fim de identificar o volume ideal de treino. Foi observado que o grupo experimental que treinou com volume intermediário obteve ganhos similares ao grupo de alto volume, que treinava duas vezes mais. Então a premissa de quanto mais melhor, definitivamente não se aplica ao treino de força. Infelizmente, valores absolutos de volume total não podem ser aplicados de forma genérica entre diferentes populações e níveis de treinamento, servindo de base de comparação apenas entre amostras homogêneas, ou seja, é uma ferramenta válida para comparar protocolos quando os sujeitos possuem características semelhantes dentre as supracitadas. Uma forma de contornar este problema na busca da dose-reposta do volume no treino é analisar o número de séries realizadas por grupo muscular. As recomendações atuais do American College of Sports Medicine para treinamento de hipertrofia U O volume total tem sido considerado uma das principais variáveis do programa de treino por mensurar o trabalho mecânico realizado na sessão e não simplesmente contabilizar sua quantidade de forma isolada. recomendam a execução de 1-3 séries por exercício para indivíduos novatos com volumes mais elevados de 3-6 séries por exercício para sujeitos mais avançados, mas similar ao que ocorre nos estudos sobre frequência de treino, a influência do número de séries e seu impacto no ganho muscular é um pouco obscura. Apesar da inconsistência nos resultados, uma meta-análise conduzida em 2010 já mostrava maior impacto positivo de séries múltiplas vs séries únicas. Sim, parece uma discussão besta, mas foi difícil para ciência provar de fato que 1 série apenas não produz os mesmos resultados que múltiplas séries! (o tópico sobre frequência de treino aborda melhor o porquê de parte das inconsistências na literatura). Porém, a quantidade de séries semanais que seria um marcador mais relevante do volume de treino ainda não tinha sido explorada. Analisando 17 estudos que buscavam comparar diferentes volumes de intervenção, uma recente meta-análise mostrou um efeito de dose-resposta gradual com o aumento do número de séries semanais, onde baixos volumes (≤4 séries semanais por grupo muscular), médios (5-9 séries semanais) e altos (≥10 séries semanais) produziam aumentos graduais na porcentagem de crescimento muscular, atingindo 5.4%, 6.5% e 9.6%, respectivamente. Vale ressaltar que há uma escassez de estudos que avaliem volumes muito altos (≥12 séries por semana), então permanece obscuro se há um limiar limite quanto à relação dose-resposta entre volume e crescimento muscular. O curioso é que estes volumes investigados são abaixo do que comumente praticantes experientes usam na prática cotidiana, mas vale ressaltar que os estudos em grande parte trabalham com protocolos que levam até a falha concêntrica muscular, garantindo um alto grau de intensidade. Em suma, pelo 10 séries semanais por grupo muscular, que podem ser divididas em diferentes exercícios e dias, seriam suficientes para otimizar ganhos de tecido muscular em condições de intensidade de treino elevadas (séries realizadas próximas a falha concêntrica). Porém, é necessário cuidado ao adaptar tais informações à prática profissional visto que: comumente não serão encontradas as mesmas situações de treino vistas nos protocolos dos experimentos; tais dados apresentados se baseiam em estudos com sujeitos pouco experientes em treinamento de força, então não devem ser extrapolados a qualquer nível de condiciona- mento! a dose ótima de estímulo pode variar entre indivíduos, tendo possivelmente influência de fatores genéticos; Quanto à questão sobre volumes mais altos, fica a minha ressalva de que uma boa manipulaçãodas variáveis provavelmente torne desnecessário volumes muito maiores do que estes (apesar de ser necessário mais pesquisas sobre) e que o cuidado com a sobrecarga articular se torna indispensável, como abordarei mais adiante neste e-book. Em suma, uma boa manipulação das variáveis relacionadas ao volume serão fator chave no desenvolvimento muscular. Porém, a alta gama de opções nos possibilita adequar tais condições ao nível do praticante e principalmente à sua disponibilidade para treinar. 3. Frequência de Treino xiste um conceito que se relaciona diretamente com a quantidade de treino e sua organização e distribuição ao longo da semana: a frequência. Basicamente, a frequência define quantas vezes cada sessão ou principalmente cada grupo muscular será trabalhado dentro de um período de tempo, que normalmente representa uma semana. Ela pode ou não interferir no volume semanal, já que um treino pode ser replicado mais vezes ou simplesmente ter seu conteúdo total dividido no número de sessões desejados (ex: 9 séries de exercício para peitoral realizados em uma única sessão semanal ou 3 séries realizadas em 3 sessões semanais possuem o mesmo volume de treino semanal mas frequências distintas). No desenho dos estudos que investigam os efeitos da manipulação da frequência de treino, teremos normalmente o uso do mesmo volume semanal a fim de garantir que as diferenças encontradas não sofram influência de outras variáveis. Veremos tais estudos em breve nesse e-book. O posicionamento oficial do American College of Sports Medicine (ACSM) sobre modelos de progressão no treinamento de força indica uma freqüência de 2-3 dias por semana para os novatos usando um programa corporal total, aumentando à medida que o indivíduo progride para um nível mais alto de treinamento com o uso de divisões do treino. Porém, tais recomendações baseiam-se relativa- mente em poucos estudos e baixos níveis de evidência. De fato, a literatura científica diverge bastante sobre a influência da frequência no desenvolvimento muscular. Amostras pequenas, isto é, poucos sujeitos por estudo como também abordagens experimentais muito heterogêneas (estudos muito diferentes dificultam a comparação entre si) e outras limitações no desenho das investigações produzem resultados com baixo poder estatístico. Nesse sentido, meta-análises, que são análises estatísticas que agrupam os principais estudos sobre determinado tema, são ótimas ferramentas para esclarecer tais pontos por justamente eliminar ou minimizar estas limitações, comuns em estudos isolados. A vídeo aula abaixo analisa alguns estudos e uma meta- análise sobre a influência da frequência de treino nos ganhos de tecido muscular. Vídeo – Frequência de treino ideal Dado o conteúdo da vídeo aula, fica a questão: valeria a pena treinar um grupo muscular 3 vezes por semana, mesmo sem suporte da literatura atual? O acréscimo de um terceiro dia contri- E buiria com o volume total semanal, e seria uma opção válida para sujeitos que não alcançassem valores ideais dentro de uma frequência mais baixa. Porém, ensinar os corretos elementos da execução do treino já garantiria um estímulo próximo ao ideal otimizando o tempo do praticante, o que para mim é o melhor caminho a ser percorrido. Há evidências de um efeito benéfico para o treinamento de grupos musculares com frequên- cias de 2 vezes por semana em comparação a apenas 1 vez, mesmo em situação de volume equalizado. 4. Escolha dos exercícios o elaborarmos uma uma rotina de treinamento de força, inevitavelmente pensamos em uma série de fatores a fim de garantir os resultados desejados. Selecionamos o sistema de treino (se vai ser um piramidal, drop-set, etc), controlamos as variáveis (volume, intensidade da carga, recuperação entre séries, etc). Até aí, tudo perfeito. Mas e os exercícios? Como identificar o quanto cada músculo está sendo solicitado? Como saberei se aquele exercício gera alguma sobrecarga articular lesiva? Como selecionar, dentre centenas de opções, os exercícios ideais para a rotina do meu aluno? Não adianta você planejar bem cada um dos fatores supracitados e não ter um entendimento sobre como cada exercício pode interferir na qualidade do treino. Aí que entra a biomecânica. Sem ela, você vai basear seu treino em achismos, pois „sente‟ que o exercício em questão trabalha ou não determinado músculo; Vai replicar mitos pois ouviu em algum lugar que tal exercício só pode ser feito até determinado ângulo, cair naquela de “exercícios proibidos”; ou vai copiar invenções de exercícios que brotam todos os dias na internet, e justificar para o seu aluno como uma “variação”. Variou o que, além do bom senso? Apesar da Cinesiologia nos dar um norte relacionando o movimento articular e seus prováveis executores, a única forma de sabermos a real participação de um grupo muscular e seu grau de ativação em uma tarefa é através de um método de estudo muito usado na biomecânica, a eletromio- grafia. Quer exemplo? É fácil enxergar que o quadríceps é ativado durante uma cadeira extensora, certo? Mas é uma ativação satisfatória? A ativação do vasto medial é similar a ativação do vasto lateral ou do reto femoral? Algum ângulo em específico favorece o trabalho dessa musculatura, ou geraria desequilíbrios musculares? É fácil perceber que sem essas informações, a escolha dos exercícios vira um tiro no escuro. E se não bastasse, há outra pergunta extremamente relevante: Esse exercício é seguro? Quanta sobrecarga ele gera? em quais estruturas? há ampla pesquisa na área de biomecânica a respeito da sobrecarga articular, e ter um bom entendimento sobre garante que selecionemos de forma mais consciente, pois não existe o melhor exercício, e sim as melhores opções para o aluno de acordo com seu nível de treinamento, histórico de lesão e o momento da periodização em que ele se encontra. Eletromiografia “Hummm, esse exercício pega, hein?” Quem nunca ouviu/disse isso na academia, que atire a primeira pedra. A A percepção de esforço é uma ferramenta muito imprecisa para avaliar quais músculos estão sendo realmente solicitados. Não é incomum relacionarmos nossa percepção de esforço com o grau de ativação da musculatura exercitada durante o treinamento de força. Traduzindo: quanto mais você “sente”, mais acha que “pega”. O problema com essa relação é tão óbvia, mas sejamos diretos. Durante a série, o volume muscular cria uma oclusão temporária do fluxo de sangue que dificulta a eliminação de metabólitos gerados pelas vias energéticas, e o produto final disso é uma alteração no pH local, pois a acidose aumentará na presença dos íons H+ gerados no metabolismo energético como também na contração muscular (mais especificamente na hidrolise do ATP). Em conjunto com outros fatores como por exemplo o comprimento do músculo devido a variações técnicas, amplitude, etc, causará a sensação de queimação que sentimos na série. Infelizmente, não podemos sentir com precisão a quantidade real de ativação muscular. “-Tudo bem, mas tenho meu guia de musculação debaixo do braço! Sei exatamente o que trabalhaem cada exercício!” - você sabia que um dos livros mais vendidos na nossa área ilustra os grupos musculares em cada exercício sem referência científica alguma? Inclusive, o autor é um artista, que simplesmente tem afinidade pelas formas humanas. Então antes de acreditar em manual de musculação, confira as referências sobre o que é afirmado, você pode se surpreender. Se você vem lendo este tópico do e- book, já sabe que a forma mais precisa que se tem hoje para mensurar a ativação muscular é a eletromiografia (EMG), que seria o registro do recrutamento muscular através da análise dos estímulos elétricos gerados pelos potenciais de ação na membrana celular. A idéia é bem simples: o músculo é solicitado por impulsos elétricos enviados pelos moto- neurônios, então registrar tais impulsos nos ajuda a entender quais músculos são utilizados em determinado movimento, o nível de ativação muscular durante a execução pois esse sinal elétrico sofre alterações de frequência tornando-se capaz de avaliar a intensidade e duração da solicitação muscular. Agora, qual a aplicação prática disso? Identificar o melhor exercício? Eu diria que é muito mais do que isso. Seria ter um leque de opções onde as suas escolhas se encaixassem perfeitamente às necessidades do seu aluno. Por que tantas pessoas odeiam exercício abdominal? Será que não tem a ver com o grau de desafio proposto para aquele atual nível de condicionamento dele? A musculatura abdominal é solicitada diariamente porém em grau de intensidade baixa, então propor um desafio muito além pode ser um desafio desestimulante ao praticante. Algumas opções ou variações de técnica poderiam solicitar mais a musculatura abdominal, como o caso do uso da instabilidade. Aliás, diversas variações de exercícios como a profundidade do agachamento, posição dos pés no leg press podem ou não mudar drasticamente a solicitação muscular, e como dito anteriormente, nem sempre há relação com a percepção do praticante. Se o aluno está voltando de lesão, pré temporada, não seria interessante fazer uma progressão quanto a ativação muscular dos exercícios propostos? O alcance desse tipo de conhecimento é absurdo, e casando com outros conhecimentos como sobrecarga articular, próximo tópico do e-book, conseguimos traçar o melhor custo benefício para cada situação, pois conhecer o estresse gerado nos tecidos biológicos nos ajuda a ter maior segurança e efetividade no processo de treinamento. Infelizmente, não há bons livros que trazem este tema em profundidade. Pretendo em breve compilar os melhores artigos sobre EMG aplicados ao treinamento para servir de guia para os estudantes e profissionais de Educação Física no planejamento coerente das rotinas de treino, mas até lá, recomendo fortemente que busquem artigos científicos sobre o tema, sem eles você fica a mercê de conteúdos que nem sempre possuem embasamento por trás. 5. Sobrecarga articular corpo humano pode ser definido fisicamente como um complexo sistema de segmentos articulados em equilíbrio estático ou dinâmico, onde o movimento é resultado de forças internas geradas pela ação contrátil dos grupos musculares atuando nos eixos das articulações, a fim de superar forças externas ao corpo e gerar deslocamentos angulares. Parece complexo mas não é, só mantemos uma postura ou realizamos uma ação devido a interação entre forças internas e externas. Tais forças são transmitidas pelas estruturas biológicas do corpo como músculos, ossos, tendões e cartilagem articular, e estão intimamente ligadas com as cargas mecânicas aplicadas ao aparelho locomotor. Isso implica que desde atividades corriqueiras como manter a postura na cadeira, caminhar, até esportes de alto nível, tudo gera sobrecarga. A foto abaixo apresenta a socrecarga na coluna em diversas posições cotidianas: O que vai definir o potencial lesivo dessas cargas é a magnitude e a incidência desse estresse no tecido, e o quanto ele é capaz de suportar. Aqui os adeptos de forma incondicional do lema “no pain no gain” começam a fazer cara feia, mas fato é que errar a dosagem do exercício significa aumentar o estresse muitas vezes de forma desnecessária. Este erro não limita-se apenas à quantidade, uma má programação pode submeter estruturas que não tiveram o descanso apropriado a novos estímulos de treino, e principalmente a escolha de protocolo ou exercício pode expor o praticante à cargas que ele não estaria preparado para receber naquele momento. Saber como e quanto o aparelho locomotor é solicitado em alguma abordagem ou exercício é fundamental para garantirmos a segurança no treino! Parte relevante dos estudos em biomecânica dedicam-se a determinar as forças internas no movimento humano. Apesar da grande dificuldade na medição direta por implicar basicamente na colocação de um transdutor na estrutura biológica em questão para obtenção dos dados, a determinação das forças internas pode ser executada indiretamente, por meio de modelos mecânicos do corpo e medidas simultâneas e sincronizadas das variáveis biomecânicas externas. Através dessas medições é possível saber por exemplo que apesar de comumente recomendado, o encosto da cadeira em 90º não é o mais interessante para diminuir compressão na coluna (foto ao lado), e que 90º de O flexão de joelho no agachamento não é proibido como alguns pregam. Além disso, é possível identificar quais estruturas recebem de fato a sobrecarga, o que é especialmente interessante no processo de recuperação de lesões pois você saberá especificamente o quanto poderá ir com cada aluno. É importante ressaltar que é impossível evitar estresse no aparelho locomotor, porém um pleno conhecimento deste tema te ajuda a fazer escolhas mais sensatas pois para um sujeito leigo o que importa sempre é o que „pega mais‟, e não a custo de que. A eficiência do exercício dependerá do que ele propicia e do quanto ele cobra do corpo, e caberá a você saber entender e preparar o praticante para suportar a demanda progressiva de um treino intenso e efetivo! Pensando nisso, prentendo reunir tais dados e relacioná-los com conceitos importantes do tópico anterior a fim de criar a melhor referência possível sobre análise biomecânica dos exercícios de musculação, então fiquem atentos porque muita informação e conheci- mento estão por vir! 6. Intervalo de descanso série de musculação, dependente da correta manipulação das suas variáveis, depleta os estoques energéticos de ATP mais rápido do que sua regeneração, que ocorre principalmente pelas vias alácticas. O intervalo de descanso entre séries surge como estratégia para tornar viável a continuação do esforço, e sua manipulação tem sido fonte de questões relevantes no treinamento de força. Vários artigos de revisão estabeleceram que séries múltiplas de exercícios de força resultam em maior desenvolvi- mento de força e hipertrofia muscular do que séries únicas e que essas adaptações seriam consideravelmente afetadas pelo intervalo de descanso entre séries, com diferentes intervalos de repouso produzindo resultados para diferentes objetivos de treinamento. Porém, antes de se aprofundar no tema, vale ressaltar que na prática vemos muitos indivíduos que ao não entenderem conceitosbásicos da rotina de treino, reproduzem intervalos de forma aleatória, ou simplesmente não o realizam! Isto acontece muitas vezes porque a série não os fadigam suficientemente, então 15 seg de recuperação acabam sendo suficientes para o esforço que ele se propôs a fazer, que é baixíssimo. É dever do professor esclarecer o nível de esforço esperado, e por si só o aluno entenderá na prática a necessidade do descanso! As prescrições de intervalo de repouso geralmente variam de acordo com a meta de treinamento. Para maximizar a hipertrofia muscular, muitos autores propuseram que os intervalos de repouso de 30-60 s seriam ideais porque resultam nas maiores elevações induzidas pelo exercício em hormônios ostensivamente anabólicos, notadamente o hormônio do crescimento. O American College of Sports Medicine atualmente recomenda 1-2 min intervalos de descanso para programas de treinamento projetados para estimular a hipertrofia muscular em novatos e praticantes intermediários com períodos de repouso mais longos de 2-3 min apenas sendo empregados para os exercícios mais intensos para indivíduos treinados, porém na realidade há poucos estudos que compararam diferentes intervalos nas respostas morfológicas crônicas. Desde que os experimentos em grande parte passaram a equalizar o volume de treino das intervenções, protocolos com intervalo curto demais passaram a contar com uma série a mais por exercício pois havia uma queda maior no rendimento em comparação a protocolos com maior tempo de recuperação. Isso levanta a hipótese de que intervalos maiores (≥2 min) poderiam ser mais vantajosos se permitirem de fato o alcance de um trabalho total maior, ou seja, uma manutenção maior do número de repetições ao longo das séries. O efeito no volume de exercício não é o único fator a ser considerado quando prescreve-se intervalos de descansos no programa de treinamento. Parece que o A intervalo estaria ligado diretamente com as respostas hormonais de uma sessão de treino. A vídeo aula a seguir discute os efeitos agudos da manipulação de intervalo na resposta endócrina e dá seu parecer quanto ao seu uso nas estratégias de treino. Video - Intervalo de descanso e resposta hormonal Dada as inconsistências encontradas na resposta hormonal e a falta de estudos que comparem de forma efetiva a resposta crônica de intervalos diferentes, torna-se difícil indicar uma estratégia como superior à outra. Tantos intervalos curtos como mais prolongados possuem potencial para promover hipertrofia muscular, porém cuidados com a queda de volume acentuada por uso de recuperações muito curtas devem ser tomados. Descansos fixos de ≥2 min parecem ótimas opções por permitir uma maior manutenção do número de repetições ao longo das séries quando o esforço é máximo, e estratégias de auto regulação do intervalo baseado na percepção de cansaço do próprio praticante são estratégias particular- mente interessantes para sujeitos mais experientes no treino de força. Já o intervalo curto pode ser um ótimo aliado em protocolos que dispõem de pouca carga disponível, gerando altos graus de fadiga nas séries subsequentes, além de aumentar o estresse metabólico em situações onde o aluno possua algum tipo de aversão ao aumento da carga externa (quilagem). Por hora, maximizar os resultados do treino com intervalos curtos a fim de promover maiores respostas de hormônios anabólicos é cientificamente insustentável. 7. Periodização aplicada ao treino de força periodização é o planejamento e estruturação sistemática das variáveis de treinamento (intensidade, volume, freqüência e repouso) ao longo de períodos de treinamento designados, visando maximizar os ganhos de desempenho e minimizar o potencial de overtraining ou diminuição no desempenho. Estes períodos normalmente são denominados na literatura como: microciclos - Os Microciclos são as menores unidades do processo de periodização, representando comumente as variáveis adotadas dentro de uma semana de treino da periodização. indica os dias ou unidades de treinamento em que os componentes serão trabalhados; mesociclos - Os mesociclos são unidades mais extensas, representando pequenos blocos de microciclos com os mesmos objetivos e métodos principais. Normalmente tem duração de 4 semanas. Indica o tipo de exercício que deve ser usado no período; macrociclos - Os macrociclos são unidades que representam o objetivo geral de uma intervenção mais extensa, comumente uma temporada completa, sendo resultado do trabalho de um conjunto de mesociclos e microciclos. determina a tendência geral da carga de treinamento e o período de obtenção da forma esportiva. No treinamento de força, dois dos modelos de periodização mais citados na literatura são a periodização linear e periodização ondulatória (ou não- linear). A periodização linear, que é o modelo clássico de treinamento, foi descrita com a utilização de volumes iniciais mais altos com baixas intensidades de treinamento com aumentos graduais de intensidade e diminuição de volume dentro e ao longo de períodos de treinamento. Já a periodização ondulatória tem sido descrita como mais freqüente, diária, semanal ou quinzenal variação de intensidade e volume e geralmente usa zonas de repetições máximas para prescrever a intensidade de exercício. Recentemente tem sido proposto que estas manipulações não lineares de volume e intensidade, proporcionando mudanças mais frequentes nos estímulos e nos períodos de recuperação, são mais propícias aos ganhos de força, visto que não permitiria ao sistema acomodar-se com estímulos pouco variados ao longo do tempo. Há uma gama de trabalhos que tentaram provar este ponto, e este é o tema da video-aula abaixo. A Vídeo - Periodização Linear vs Ondulatória: qual a melhor? Dadas as informações levantadas, é difícil apontarmos um modelo de periodização superior. Porém, parece coerente assumir que modelos dinâmicos tendem a se ajustar mais às necessidades dos alunos e aumentar sua adesão, visto que o fator motivacional é extremamente importante na continuidade de um processo que é maçante para muitos indivíduos. Nesse ponto, possuir um leque de opções é extremamente importante para produzir a variação necessária sem abrir mão da efetividade do processo de treinamento. Por hora, maximizar os resultados do treino com intervalos curtos a fim de promover maiores respostas de hormônios anabólicos é cientificamente insustentável. Principais Referências AMADIO. Metodologia biomecânica para o estudo das forças internas ao aparelho locomotor: importância e aplicações no movimento humano. A biodinâmica do movimento humano e suas relações interdisciplinares. São Paulo: Estação Liberdade, 2000. DE LUCA. The use of surface electromyography in biomechanics. Journal of applied biomechanics, 1997. FISHER; STEELE; SMITH. High-and Low-Load Resistance Training: Interpretation and Practical Application of Current Research Findings. Sports Medicine, 2016. HARRIES; LUBANS; CALLISTER. Systematic review and meta-analysis of linear and undulatingperiodized resistance training programs on muscular strength. The Journal of Strength & Conditioning Research, 2015. HENSELMANS; SCHOENFELD. The effect of inter-set rest intervals on resistance exercise-induced muscle hypertrophy. Sports Medicine, 2014. ISSURIN. New horizons for the methodology and physiology of training periodization. Sports medicine, 2010. KLEMP et al. Volume-equated high-and low-repetition daily undulating programming strategies produce similar hypertrophy and strength adaptations. 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