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TCC 100% Leonardo Carvalho da Silveira (2) CAP 2 em diante 10

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FUNDAÇÃO EDUCACIONAL SERRA DOS ÓRGÃOS - UNIFESO
 CENTRO UNIVERSITÁRIO SERRA DOS ÓRGÃOS
 CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO
Leonardo Carvalho da Silveira
A BUSCA DA VERDADE REAL, UM RESQUÍCIO INQUISITORIAL NO PROCESSO PENAL BRASILEIRO.
Teresópolis
2017
LEONARDO CARVALHO DA SILVEIRA
A BUSCA DA VERDADE REAL, UM RESQUÍCIO INQUISITORIAL NO PROCESSO PENAL BRASILEIRO.
Monografia apresentada ao Curso de
Graduação em Direito como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito, sob a orientação do Professor Thiago Jordace. 
Teresópolis
2017
A BUSCA DA VERDADE REAL, UM RESQUÍCIO INQUISITORIAL NO PROCESSO PENAL BRASILEIRO.
LEONARDO CARVALHO DA SILVEIRA 
Monografia apresentada ao Curso de graduação em Direito do Centro Universitário Serra dos Órgãos como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Direito e submetida à avaliação da banca composta pelos seguintes membros:
___________________________
Prof. Thiago Jordace 
Orientador
___________________________
Membro-examinador
____________________________
Membro-examinador
Teresópolis 
 2017
RESUMO
	A presente pesquisa tem como base o foco total na atuação do sistema penal, que por diversas oportunidades e regido por determinadas correntes doutrinárias, age como violador das garantias individuais estabelecidas em nosso ordenamento jurídico, buscando em questões históricas e jurídicas, informações e entendimentos que se justifiquem.
	PALAVRAS CHAVE
	Verdade real; Sistemas processuais penais; Bases históricas; Princípios Constitucionais.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 
1.	PODER PUNITIVO DO ESTADO
1.1	BASES HISTÓRICAS DO PROCESSO PENAL 
1.2	INQUISIÇÃO 
1.3	ASPECTOS HISTÓRICOS DO PROCESSO CRIMINAL BRASILEIRO 
		1.3.1	A PERSECUÇÃO PENAL NO REGIME MILITAR BRASILEIRO
2.	SISTEMAS PORCESSUIAIS PENAIS
 	2.1.	SISTEMA ACUSATÓRIO 
	2.1.2	CONFORMIDADE CONSTITUCIONAL DO SISTEMA ACUSATÓRIO
	2.3	PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO PROCESSO PENAL 
	2.3.1	PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA E IN DUBIO PRO REO
	2.3.2	IMPARCIALIDADE DO JUIZ
2.3.3	IGUALDADE DAS PARTES E PARIDADE DE ARMAS
 	2.4	SISTEMA INQUISITÓRIO
	2.5	SISTEMA MISTO 
	2.6	GESTÃO DA PROVA NO PROCESSO PENAL
	
3. 	PRINCÍPIO DA VERDADE REAL
	3.1	VERDADE FORMAL
	3.2	O QUE É VERDADE?
	3.3	O PRINCÍPIO DA VERDADE REAL EM DETRIMENTO DOS PRINCÍOIOS CONSTUCIONAIS DO PROCESSO PENAL	
	3.2.1 	O PRINCÍPIO DA VERDADE REAL EM DETRIMENTO DO PRINCÍPIO DO IN DUBIO PRO REO
	3.2.2	O PRINCÍPIO DA VERDADE REAL EM DETRIMENTO DA IMPARCIALIDADE DO JUIZ
	3.2.3	O PRINCÍPIO DA VERDADE REAL EM DETRIMENTO DO PRINCÍPIO DA IGUALDADE E PARIDADE DE ARMAS 
4.	A INSUFICIÊNCIA DA LEI Nº 11.690, DE 2008.
	
CONCLUSÃO
INTRODUÇÃO
	Ao longo da história as sociedades se organizaram cada vez mais, e por consequência, a figura do Estado ganhou muita notoriedade com o passar do tempo, resultando hoje na formação de aproximadamente duzentos países, e ainda que existam muitas peculiaridades conferidas a cada um destes no que tange a sua respectiva organização interna, é inegável que a grande maioria, se não todos, dispõem de Legislações, sendo de suma importância que todos os aspectos sociais e humanitários destes países sigam em conformidade com as tais.
	A legislação brasileira, com a Constituição Cidadã de 1988, documento este que fora promulgado após um período em que o Brasil havia, por conta do regime militar iniciado em 1964, se tornado um estado de exceção, visando, sobretudo, a redemocratização da República. Portanto, se faz completamente necessário que toda e qualquer Legislação do País esteja em total conformidade Constitucional. [2: DO VALE, Maria Ribeiro. 1964 – 2014: Golpe Militar, História, Memória e Direitos Humanos. Araraquara, Cultura Acadêmica, 2014. p.16.]
	No que tange o Direito Processual Penal Brasileiro, a constituição adota o sistema acusatório, que preceitua preponderantemente com a separação entre as funções de acusar, defender e julgar, fazendo com que as mesmas sejam conferidas a personagens distintos, além de assegurar a imparcialidade do Juiz, mantendo-lhe alheio a questões inerentes às partes, dentre outros aspectos característicos a tal modelo, que serão elucidados ao decorrer da presente pesquisa. [3: LOPES JR, Aury. Direito Processual Penal, 11. ed. São Paulo: Saraiva 2014. Pág 65]
	Contudo, há diversos resquícios que permeiam a seara do Direito Processual Penal Brasileiro, tais resquícios são provenientes em sua maioria, do sistema inquisitorial, que antagonicamente ao sistema acusatório, não faz a distinção das funções de julgar, condenar e defender. Tal modelo defende, dentre outras questões, o princípio da verdade real, que preceitua que a mesma deva ser implacavelmente perseguida pelo Juiz dentro do Processo Penal. [4: LOPES JR, Aury. Direito Processual Penal, 11. ed. São Paulo: Saraiva 2014. Pág. 67.]
	Vale ressaltar a importância da prova judiciária no Processo Penal Brasileiro, haja vista que a mesma possui o objetivo de construção do convencimento do julgador, que formará sua convicção e legitimará o poder contido na sentença. Logo, a eventual atribuição de poderes instrutórios ao Juiz deve ser problematizada.
	O conteúdo em questão tem por objetivo trazer meios de reflexão e dialética sobre os fatores preponderantes ao tema, considerando os seus aspectos históricos e efeitos na atualidade, fazendo valer o que se entende a partir da segunda parte do título temático, onde nota-se a afirmação de que a verdade real seria um resquício, ou seja, algo proveniente de eventos passados, no caso, o período inquisitorial. Logo será necessário fazer um “caminho de volta” de modo que seja possível desvendar, dentro de um contexto histórico, a forma na qual o princípio ora enfrentado se estabeleceu no nosso ordenamento jurídico e consequentemente, em correntes doutrinárias, bem como no senso-comum.
	Todas as questões supramencionadas serão elaboradas de modo que possam ser visualizadas na estruturação atual do Processo Penal Brasileiro, problematizando procedimentos jurídicos atuais e exortando acerca da sistematização ideal de sua estrutura. Fazendo valer uma pesquisa na linha das estratégias com o foco total na atuação do sistema penal, que por diversas oportunidades e regido por inúmeras correntes doutrinárias, age como violador das garantias individuais estabelecidas em nosso ordenamento jurídico.
PODER PUNITIVO DO ESTADO
	A humanidade busca, desde os seus primórdios e de diversas maneiras, manifestar e reafirmar o seu poder, e por isso, sempre procurou estabelecer e manter uma ordem social desejável utilizando-se deste, em um primeiro momento o fez de forma mais coletiva e disseminada, entretanto ao longo do tempo o poder social foi se concentrando e consequentemente se individualizando, sendo necessária a nomeação de alguém ou algo que pudesse suportar a titularidade do referido poder, sendo passível então, a recorrência à figura do Estado, que já sendo composto de território e nação, passou a contar também com um terceiro elemento, no caso, o poder, procedendo ao crescimento de sua composição elementar e consequentemente de suas prerrogativas. [5: MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. 4. Ed. São Paulo: Atlas, 1994, pag. 116.][6: ROBINSON CALEGARI, Luciano. A formação do Estado. Disponível em: http://www.conteudojuridico.com.br/artigo,a-formacao-do-estado,29225.html. Acesso em 10/11/2016]
	Sendo certo que a formação do Estado está intimamente ligada à consciência coletiva presente na sociedade, o mesmo passou a ostentar um estigma de soberano, e a concessão do poder a este, acabou por lhe oferecer, quase automaticamente, total legitimidade de agir, isto é, fez com que o poder fosse aceito portodos seus regidos, ainda que por meios coercitivos. 
	Superada esta sucinta e breve conceituação acerca do surgimento e aceitação do poder Estatal, conclui-se que seu maior fito é o de administrar e organizar determinada coletividade, sendo necessário então que o mesmo se faça presente em diversas áreas da mesma, o que por consequência, acaba por subdividi-lo, perpetrando surgir então, o poder de punir concedido ao Estado, visando evitar eventuais desvios de conduta de seus membros, como afirma Mirabete:[7: MIRABETE, Julio Fabbrini. Processo Penal. 4. Ed. São Paulo: Atlas, 1994, página 23.]
(...) uma das tarefas essenciais do Estado é regular a conduta dos cidadãos por meio de normas objetivas sem as quais a vida em sociedade seria praticamente impossível.
	Com base neste entendimento, fica manifesto que o Estado se utiliza da Lei de forma instrumental no campo Penal, de modo a obstar o desacordo e o desequilíbrio social, impondo limites aos seus regidos de forma coercitiva através das sanções penais, surgindo então o vulto do Direito Penal. 
	O Direito Penal nasce com o fito de resguardar os valores de uma determinada coletividade, também chamados de bens jurídicos penais, com destaque para a vida, a liberdade, a propriedade, a integridade física, a honra etc. Conforme preceitua Luiz Regis Prado: “(...) o pensamento jurídico moderno reconhece que o escopo imediato e primordial do Direito Penal radica na proteção de bens jurídicos – essenciais ao indivíduo e à comunidade”. 	[8: PRADO, Luiz Regis. Bem jurídico-penal e Constituição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999, pag. 47.]
	Tal entendimento ganhou bastante notoriedade ao longo da história, sendo assim superada a antiga Lei do Talião, bem como a vingança pública, privada e divina, que perduram aproximadamente até o século XVIII, de modo que as sanções penais pudessem se tornar um monopólio do Estado, haja vista a função precipuamente pública do Direto Penal. 
	1.1 BASES HISTÓRICAS DO PROCESSO PENAL
	Em razão da concessão do poder punitivo ao Estado, surgiu então uma necessidade eminente da criação de uma estrutura que possibilitasse o julgamento e, por consequência, a aplicação das sanções necessárias, dando ensejo ao nascimento do Processo Criminal. 
	A Grécia Antiga (1.100 a.C. até 146 a.C), por sua vez, contava com um Processo Penal essencialmente democrático, onde havia, dentre outros fatores característicos, as garantias de defesa ao acusado (exclui-se os acusados de crimes políticos), distinção dos crimes de caráter público e privado, participação direta dos cidadãos no exercício da acusação, bem como da jurisdição, e por fim, a oralidade e publicidade dos debates. Em meio a tal estruturação, nos casos de crimes públicos – considerados pelos gregos crimes contra a coletividade – surge a acusação formal (denúncia), que era direcionada à assembleia do povo, que por sua vez, elegia um acusador. No julgamento, o Acusador iniciava o procedimento apresentando suas provas, majoritariamente testemunhais, haja vista que não existiam maiores recursos probatórios na época. Em seguida, ouvia-se a Defesa, que de igual modo utilizava-se de sua carga probatória com fito de replicar as acusações proferidas pela outra parte. A figura do juiz era de certa forma arbitrária, tendo em vista que os tais apenas votavam e não decidiam. A decisão, por sua vez, se dava por maioria dos votos proferidos pelos membros do tribunal popular, culminando na absolvição do acusado em casos de empate.[9: TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal, volume I, 32. ed ver. E atual, São Paulo: Saraiva 2010. pág. 107]
	A Grécia antiga contava com diversos tribunais, cada um era competente para julgar determinado delito, nos casos de crimes políticos, a Assembleia do Povo era o juízo competente, cumprindo informar que, em crimes desta natureza não havia quaisquer garantias ao acusado. Os crimes de homicídios planejados, incêndios, traições, etc. eram remetidos ao Tribunal de Atenas, alcunhado de Areópago. Os homicídios culposos e não premeditados, eram julgados pelo Tribunal de Éfetas, que era composto por 51 membros, dentre estes, membros do senado. Outro tribunal da época era o Tribunal dos Eliastas (Heliea), era responsável pela jurisdição comum, sendo composto de até 6.000 juízes para um único julgamento, número que abisma, porém tratava-se de um fruto da crença Ateniense, onde se acreditava que seria mais viável o exercício de uma justiça plena, se fosse possível contar com muitos julgadores.[10: MIRABETE, Julio Fabbrini. Curso de Processo Penal, 18. ed. Ver. E atual. Até 31 de dezembro de 2005 6. reimpr. São Paulo: Atlas, 2008, pág. 14. ]
	A estruturação do Processo Penal na Roma Antiga assemelhava-se com a da Grécia em diversos aspectos, dentre eles a distinção entre delito público e privado, subdividindo a referida estrutura em Processo Penal Público e Privado (que posteriormente entrou em desuso). No Processo Público o Estado figurava como sujeito de repressão enquanto que no Privado ele assumia tão somente um papel arbitrário com o fito de solucionar o litígio entre as partes. 
	A Roma Antiga se subdividiu em três períodos, são eles: monárquico, republicano e imperial. Cada período contou com peculiaridades no âmbito de sua respectiva jurisdição penal, no período monárquico a princípio não se limitava o poder de julgar, o próprio julgador iniciava as investigações, após receber a denúncia, e sancionava a pena sem conceder quaisquer garantias ao acusado. Posteriormente, com a finalidade de brecar o arbítrio do juiz, surge uma espécie de apelação denominada provocatio ad populum, concedendo ao acusado a oportunidade de recorrer da decisão frente à população reunida em comício. Tais práticas – juntamente com que se via na Grécia Antiga – embasaram a criação do sistema interpretativo acusatório. [11: TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal, volume I 32. ed ver. Editora Atual, São Paulo: Saraiva 2010. pág. 109.]
	No período republicano, foi concedida a qualquer cidadão a prerrogativa de acusar, surgindo então a accusatio. Neste período, o primeiro ato do processo denominava-se postulatio, onde era feita a verificação acerca da tipicidade, ou não, do fato, e se havia algum fator obstante para o prosseguimento do processo. Diante de eventual admissão, o processo seguia para a inscriptio, onde a postulatio seria registrada junto ao Tribunal competente, que era primeiramente formado por membros do Senado e posteriormente por cidadãos de determinadas categorias, mensuradas por suas respectivas condições morais, sociais e econômicas. [12: THUMS, Gilberto. Sistemas Processuais Penais, Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2006. p. 232][13: TOURINHO FILHO, Fernando da Costa, Op. Cit., pág. 113.]
	Com o advento do Império Romano, surge uma nova estruturação processual, a saber, a cognitio extra ordinem, onde o poder dos magistrados se acentuou tanto, que chegou ao ponto de misturar as funções do Ministério Público e do Juiz em um mesmo órgão Estatal, e consequentemente a accusatio tornou-se um problema, pois uma ferramenta de justiça e a garantia de acusar tornaram-se meios de opressão, como por exemplo, a aceitação da tortura como meio de obtenção de confissões, embasando a criação do sistema interpretativo inquisitório. [14: TOURINHO FILHO, Fernando da Costa, Op. Cit., pág. 113.]
	1.2 INQUISIÇÃO
Ao decorrer dos anos, a figura da Igreja Católica ganhou muita notoriedade, e consequentemente mais poder, tornando-se cada vez mais imponente sobre questões inerentes à sociedade. Tal imponência adentrou a seara do Direito Penal, dando ensejo ao Direito Canônico, e fazendo com que o mesmo fosse utilizado como instrumento para assegurar os respectivos interesses da Igreja. Em um primeiro momento – leia-se até o século XII – a estruturação processual criminal utilizada pela igreja se enquadrava nos moldes do sistema acusatório, isto é, não havia julgamento sem que fosse oferecida a devida acusação, de modo que o acusado pudessese defender da tal, logo o acusador devia necessariamente apresentar aos representantes da igreja (Bispos, Arcebispos e Oficiais) a acusação por escrito, junto com possíveis provas colhidas. [15: ARCE,Pablo e SADA,Ricardo. Curso de Teologia Dogmática, Rei dos Livros, Lisboa, 1992, p. 222.][16: GONZAGA, João Bernardino. A Inquisição em seu Mundo. 4ª edição. São Paulo, 1993, p. 85.][17: Ob. Cit., pág. 92-99. ]
A partir do século XIII, a igreja passou a abdicar de suas práticas processuais garantistas, e por consequência, acabou abonando o sistema acusatório pouco a pouco, passando a se utilizar do sistema inquisitório. Mesmo com a criação de diversos princípios garantistas por parte de Inocêncio III (1198-1216), as únicas coisas que perpetravam na sociedade eram ligadas a práticas inquisitoriais. Consequentemente, haja vista a utilização do sistema inquisitorial, a estruturação do processo penal sofreu drásticas alterações, a saber: abolição da acusação nos crimes considerados públicos, bem como da publicidade do processo, além da recorrente utilização da tortura como meio de obtenção de provas.
Todas as práticas supracitadas perpetuaram por séculos, e não sendo erradicadas, ganharam mais força por intermédio dos líderes religiosos subsequentes ao Papa Inocêncio III, tal afirmativa se evidencia na prática de Inocêncio IV (1243 - 1254), que autorizou, mediante publicação de um documento, a utilização da tortura no curso dos processos criminais, e com o decorrer do tempo, todos os seus sucessores apenas reforçavam tal documento, de modo a reafirmar, ano após ano, o poder de perseguição da Igreja Católica a todos os que fossem contrários aos seus dogmas. 
Vale ressaltar, que entre os pontificados dos Papas Inocêncio III e Inocêncio IV, ocorreu à criação do Tribunal do Santo Ofício, pelo Papa Gregório IX (1227 – 1241). O referido tribunal buscava essencialmente punir os chamados “crimes contra a fé”, principalmente, a heresia. Sendo certo que, com o devido respaldo concedido pelo Papa em exercício, os chamados inquisidores buscavam implacavelmente localizar supostos hereges, e quando os localizavam, os submetiam a determinados procedimentos do Tribunal do Santo Ofício, como por exemplo, ser interrogado por três inquisidores – sendo um deles responsável pela sentença final– que praticamente compeliam o acusado a proferir uma confissão, ainda que a mesma não representasse a veracidade da situação fática. [18: Ob. Cit., págs. 119-129. ]
As penas impostas variavam de trabalhos escravos e excomunhão, além de prisão perpétua, bem como morte por decapitação, enforcamento ou fogueira. As execuções provenientes das penas mais ríspidas eram realizadas publicamente, com o fito de intimidar a população. As referidas sentenças determinavam a apreensão dos bens do acusado, tornando tal prática, além de tudo, um negócio lucrativo para seus adeptos. Diante de todo exposto formou-se o chamado primeiro ciclo da inquisição, que perdurou do século XIII até meados do século XIV.[19: Ob. Cit., págs. 132-135. ]
 A partir do século XV adveio o segundo ciclo do período inquisitorial, considerado pela maioria dos historiadores, como o mais sádico da inquisição, a chamada Inquisição Espanhola. A Inquisição Medieval – leia-se o primeiro ciclo da inquisição – que não havia sido totalmente disseminada em terras Espanholas, basicamente encontrava-se em desuso na segunda metade do séc. XV. Ocorre que, durante a Semana Santa de 1478, em determinada cidade espanhola, foi descoberto um suposto motim de descendentes de judeus convertidos à força. Logo os reis vigentes, solicitaram ao Papa Sisto IV, que reavivasse na Espanha a antiga Inquisição sobre alicerces mais conexos aos interesses do reino. Sisto IV, por sua vez, concedeu aos monarcas Espanhóis a autorização necessária para que, as já conhecidas práticas inquisitoriais, passassem a vigorar em solo Espanhol. Com a devida autorização de Sisto IV, foram nomeados três inquisidores, além de arcebispos, bispos etc. recomendáveis por sua prudência e suas virtudes, sacerdotes seculares ou regulares, de determinadas idades, e de costumes considerados corretos, mestres ou bacharéis em Teologia, doutores ou licenciados em Direito Canônico, os quais necessitariam advir de maneira aceitável por uma análise específica. Tais inquisidores tinham a tarefa de agir contra judeus batizados e reincidentes do judaísmo, bem como qualquer outro indivíduo que fosse contrário a dogmática imposta pela monarquia. Foi concedida também pelo pontífice aos monarcas Espanhóis, toda e qualquer prerrogativa para eventuais e oportunas destituições ou nomeações de seus inquisidores. [20: Ob. Cit., págs. 183-185.][21: História das Religiões. Crenças e práticas religiosas do século XII aos nossos dias. Grandes Livros da Religião. Editora Folio. 2008. Pág.: 37.]
Os monarcas espanhóis nomearam seus inquisidores no ano de 1480, fornecendo-lhes dois sacerdotes como auxiliadores, bem como um compilado de instruções. Superado tal período, os inquisidores começaram a agir de forma bem enérgica a favor do reino, evidenciando a primeira peculiaridade do segundo ciclo da inquisição em relação ao primeiro, que defendia, sobretudo, os interesses da Igreja. Os procedimentos inquisitoriais passaram a abranger indivíduos que cometiam crimes de categoria política, isto é, aqueles contrários ao Reino, e não somente os que infringiam os dogmas da Igreja Católica. O Papa Sisto IV se mostrou totalmente insatisfeito com o cenário apresentado, e forneceu novas instruções aos juízes Espanhóis, tanto aos civis, quanto aos eclesiásticos, de modo a brecar o ímpeto excessivamente enérgico dos mesmos. [22: CÁRCEL, Ricardo Garcia. L’inquisizione. Traduzido por Stefano Baldi. Milão: Fenice, 2000. pág. 13. (Tradução livre).]
Os monarcas espanhóis, por sua vez, buscavam confirmar a Inquisição em seu Reino, e remeteram a Sisto IV um pedido para que fosse nomeado um Inquisidor de sua preferência para atuar em solo Espanhol. O pontífice acatou tal pedido e nomeou Tomás de Torquemada, como inquisidor-mor da Espanha. [23: Op. Cit. pág. 10. ]
A concessão feita por Sisto IV de forma benigna aos monarcas Espanhóis seria motivo para púberes e novos avanços destes. Os sucessores de Torquemada ao cargo de Inquisidor-Mor já não foram nomeados pelo pontífice, mas sim por soberanos Espanhóis, que adotavam critérios totalmente subjetivos para tal. Torquemada, bem como seus sucessores, obtiveram junto à Santa Sé o direito de nomearem Inquisidores regionais, sendo os tais completamente subordinados ao Inquisidor-Mor. Diante do exposto, o Santo Ofício espanhol alcançou uma condição mais autônoma, tendo em vista que havia se desvencilhado totalmente da Igreja Católica Romana, chegando ao ponto de ser opor a mesma em diversas ocasiões. A Inquisição Espanhola começou a ser erradicada gradualmente com o advento da Revolução Francesa, mais precisamente no século XVIII, revolução esta que trouxe novas ideologias e postulados de valorização do homem, fazendo com que o mesmo abandonasse, pouco a pouco, os traços mais cruéis do sistema inquisitório.[24: Aquino, FELIPE, A história da igreja: A inquisição Espanhola. Disponível em: http://cleofas.com.br/historia-da-igreja-a-inquisicao-espanhola/ Publicado em 10 de junho de 2016. Acesso em 14 de novembro de 2016.]
Nota-se que todas as práticas consideradas inquisitoriais eram dotadas de extrema violência e inflexibilidade para com o acusado, afastando-lhe de suas garantias essenciais, evidenciando, quase sempre, o animus de condenar do inquisidor.[25: JARDIM, Afrânio Silva. Ação penal pública – princípio da obrigatoriedade. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p. 24.]
O processo criminal durante a inquisição seguia de forma secreta, escrita e sem conceder o direito à ampla defesa e contraditório ao acusado. Assim, os inquisidores utilizavam-se do sistema de valoração de provas, onde a confissão era considerada como o principal meio probatório, merecendo destaque que a prisão durante a instruçãocriminal era a regra, onde o acusado era submetido à praticas de tortura e tinha seu direito à coisa julgada cerceado.[26: FOUCAULT, Michel. Vigiar e Punir: história da violência nas prisões. Trad. Raquel Ramalhete. 34. Ed. Petrópolis: Vozes, 2007, p. 35.]
 Tendo em vista o caráter opressor imposto pelo Santo Ofício, em qualquer um de seus períodos a partir do século XII, fica claro que o mesmo foi utilizado tão somente para defender interesses superiores, bem como o exercício do poder. Tal afirmativa se exemplifica na forma como a Inquisição Espanhola se sucedeu, haja vista que a mesma se aproveitou de práticas inicialmente utilizadas para a proteção de interesses ligados à Igreja Católica, para o zelo de um Reino dotado de preocupações meramente políticas. Conclui-se então, dentro do breve contexto histórico apresentado, que a inquisição não teve, em nenhum momento, a finalidade de proteger os interesses da coletividade, mas sim de determinadas entidades, a saber, o Estado e a Igreja Católica. Conforme já elucidado, o Processo Criminal surgiu para assegurar a aplicação justa de sanções, de modo a evitar danos aos bens jurídicos da sociedade, possibilitando a preservação dos interesses da mesma. Quando conduzido sob a égide da inquisição, o Processo Criminal não atuava como ferramenta garantidora do bem estar da sociedade, e sim como algo que suprimia os interesses da mesma, baseando-se no terror como ferramenta, e fazendo com que seus regidos não tivessem escolha, ou seja, limitando de forma coercitiva a liberdade individual de cada um, balizando-os com normas e dogmas impostos por determinadas entidades. [27: EYMERICO, Nicolau. Trad. A. C. Godoy. Manual da Inquisição. Curitiba: Juruá, 2001, p. 49.]
1.3 ASPECTOS HISTÓRICOS DO PROCESSO CRIMINAL BRASILEIRO
	Como é sabido, o Brasil foi colonizado por Portugal e permaneceu na condição de colônia por séculos, de modo que herdou dos Portugueses o idioma, a religião e determinados costumes. Tornou-se independente somente em 07 de setembro de 1822, contudo nossos colonizadores deixaram mais heranças, dentre elas, suas legislações, como por exemplo, as normas processuais contidas nas Ordenações Filipinas de 1603, bem como as normas Manuelinas de 1521 e Afonsinas de 1456, além de algumas outras leis extravagantes posteriores. Ainda sem contar com uma legislação própria, o Brasil promulgou o Decreto de 20 de outubro de 1823, e determinou que o país permanecesse sob a égide da legislação de Portugal até que surgisse o nosso ordenamento jurídico. [28: PIERANGELLI, José Henrique. Processo Penal: Evolução Histórica e Fontes Legislativas, Ed. 1, São Paulo: Edipro, 1983, p. 99.]
	No ano seguinte, surge a Constituição Imperial de 1824, que em um de seus dispositivos, logo determinou a elaboração, com urgência, de um código criminal.
	Oito anos mais tarde, foi consagrado o Código de Processo Criminal, concedendo total autonomia judiciária aos municípios. O referido diploma legal sofreu duas alterações, uma por intermédio da Lei nº 261, de 03 de dezembro de 1841, com o fito principal de aumentar os poderes de polícia, a outra alteração ocorreu através da Lei nº 2.033, de 1871, concedendo mais prerrogativas aos Chefes de Polícia e aos Delegados de Polícia.[29: LEITE, Gisele, Breves considerações sobre a história do processo penal brasileiro e habeas corpus. Disponível em: http://www.boletimjuridico.com.br/doutrina/texto.asp?id=1560. Acesso em 14/11/2016.]
A proclamação da República, em 1889, trouxe o impacto das mudanças políticas, muito embora, desde 1871, houvesse ganhado um movimento com fito de reformar a lei processual anterior. A introdução de um modelo federalista, com inspiração norte-americana, repercutiu de modo a deferir aos estados membros a competência legislativa em termos de processo penal, independentemente de alguma reserva decorrente das disposições sobre direitos fundamentais em Constituições anteriores, bem como uma limitada previsão, em termos de processo penal, contida em várias leis federais.
Assim, as verdades acerca dos sistemas do processo penal no Brasil, a partir de então, podem ser resumidas nas anotações de Frederico Marques: “Quando a pluralidade processual foi instaurada, era nosso processo penal informado pelos seguintes princípios: oralidade de julgamento e processo escrito para a instauração ou formação da culpa; contraditório pleno no julgamento e contraditório restrito no sumário de culpa; processo ordinário para os crimes inafiançáveis e afiançáveis comuns ou de responsabilidade, com plenário posterior à formação da culpa; inquérito policial servindo de instrumento de denúncia ou queixa, apenas nos crimes comuns; o processo especial estabelecendo desde logo a plenitude da defesa nos crimes comuns; a propositura e titularidade da ação penal, de acordo com o que dispunha o artigo 407, do Código Penal... Essa fragmentação contribuiu para que se estabelecesse acentuada diversidade de sistemas, o que, sem dúvida alguma, prejudicou a aplicação da lei penal.”. [30: MARQUES, José Frederico apud PIERANGELLI, José Henrique, Processo Penal: Evolução Histórica e Fontes Legislativas, Ed. 1, São Paulo: Edipro, 1983, pp. 158 e 160.]
Em 1930, ocorre uma nova mudança política, que por consequência, traz consigo novos aspectos, valendo mencionar que, nomeou-se uma comissão de juristas para proceder à elaboração do projeto do novo código unificado, havendo sido cogitada, na ocasião, a adoção do modelo do juizado de instrução.[31: PRADO, Geraldo, Sistema Acusatório, A Conformidade Constitucional das Leis Processuais Penais, 3ª Edição, EDITORA LUMEN JURIS, Rio de Janeiro 2005, p 259.]
	Em 1941, foi promulgado o código de processo penal brasileiro, vigente até os dias atuais. Cumpre dizer que, apesar de sua vigência, o referido diploma legal não pode ser considerado um documento moderno, tendo em vista seu caráter essencialmente autoritário e ultrapassado. O Código de processo Penal de 1941 foi submetido a inúmeras reformas desde sua promulgação, porém pouquíssimas que realmente pesem diante das diversas mudanças ocorridas no cenário político-social do Brasil ao longo desses anos, principalmente no que diz respeito à ordem constitucional vigente, conforme preceitua Frederico Marques:[32: MARQUES, José Frederico, Elementos de Direito Processual Penal, Vol. I, Campinas: Bookseller, 1998, p. 108. ]
Continuamos presos, na esfera do processo penal, aos arcaicos princípios procedimentalistas do sistema escrito (...). O resultado de trabalho legislativo tão defeituoso e arcaico está na crise tremenda por que atravessa hoje a Justiça Criminal, em todos os Estados Brasileiros. (...) A exemplo do que se fizera na Itália fascista, esqueceram os nossos legisladores do papel relevante das formas procedimentais no processo penal e, sob o pretexto de por cobro a formalismos prejudiciais, estruturou as nulidades sob princípios não condizentes com as garantias necessárias ao acusado, além de o ter feito com um lamentável confusionismo e absoluta falta de técnica.
1.3.1 A PERSECUÇÃO PENAL NO REGIME MILITAR BRASILEIRO
		
	Em 1964, os militares, após a deposição do então presidente João Goulart, sob a justificativa de uma ameaça comunista, ascenderam ao poder governamental no Brasil, tornando o País um estado de exceção, até 1985, quando ocorreu a eleição de Tancredo Neves. A governabilidade dos militares se dava através de atos institucionais, que impetravam a supressão de direitos constitucionais, perseguição política e censura, afastando por completo a democracia institucional. [33: DO VALE, Maria Ribeiro. 1964 – 2014: Golpe Militar, História, Memória e Direitos Humanos. Araraquara, Cultura Acadêmica, 2014. p.16.][34: DE REZENDE, Maria José. A Ditadura Militar no Brasil REPRESSÃO E PRETENSÃO DE LEGITIMIDADE 1964-1984. Londrina, Editora UEL, 2013. p.64.]
	Fica evidente que uma das principais características do governo Militar era o autoritarismo, autoritarismo este que ensejou o fortalecimento do poder central, principalmentedo poder Executivo, caracterizando um regime de exceção, pois foi concedida ao Executivo a prerrogativa de legislar, em detrimento dos outros poderes estabelecidos pela Constituição Federal vigente na época.[35: BEZERRA, Juliana, Ditadura Militar no Brasil, disponível em: https://www.todamateria.com.br/ditadura-militar-no-brasil/. Acesso em 04 de setembro de 2017.]
	Diante da sobredita centralização de poder, bem como das medidas utilizadas pelos governos vigentes no regime militar, os impactos legislativos foram inevitáveis. Assim, a forma de condução da instrução criminal acabou sendo drasticamente alterada durante o regime militar, sobretudo no que tange aos chamados “presos políticos”, tendo em vista que os governos militares, em sua maioria, combatiam os seus opositores, pois os consideravam subversivos. Com isso, os governos da época buscaram meios legais para garantir seu funcionamento repressivo, criando leis que permitissem isso, de modo a não cercear o princípio da legalidade. [36: DE REZENDE, Maria José. A Ditadura Militar no Brasil REPRESSÃO E PRETENSÃO DE LEGITIMIDADE 1964-1984. Londrina, Editora UEL, 2013. p.14.]
	Em 1967 foi editado o Decreto-Lei nº 314, tal dispositivo possuía um caráter absolutamente reformador, não obstante, o mesmo não atendeu integralmente às pretensões do governo militar, logo em 1969, o Decreto-Lei nº 898 revogou o dispositivo de 1967 e em seu artigo 3º assim definiu: “a Segurança Nacional compreende, essencialmente, medidas destinadas à preservação da segurança externa e interna, inclusive a prevenção e repressão da guerra psicológica adversa a da guerra revolucionária ou subversiva”. Este decreto, inclusive, inseriu no ordenamento jurídico as penas de morte e prisão perpétua, sanções estas previstas em quinze infrações ditadas pela chamada Lei de Segurança Nacional. Não resta dúvida que este foi mais um dos instrumentos legislativos utilizados na ditadura com o intuito de fortalecer seu poder e fazer da repressão um mecanismo de governamental. Merece destaque que tal decreto abrangia também crimes “não políticos”, como por exemplo: em seu artigo 27, incluiu no rol de crimes contra a Segurança Nacional, os delitos de assalto, roubo e depredação de estabelecimento de crédito ou financiamento, deixando evidente que o intuito dos governos militares era o de alcançar uma vasta alçada no que tange à pretensão de punir. [37: BRASIL. Decreto-Lei nº 898, de 29 de setembro de 1969.][38: BRASIL. Artigo 27º do Decreto-Lei nº 898, de 29 de setembro de 1969.]
	Diante do exposto, por consequência do ímpeto dos governos militares, a persecução penal passou a oferecer cada vez menos garantias ao acusado e, a cada Ato Institucional isso se intensificava, a exemplo do que emanou com o advento do Ato Institucional cinco, que suprimiu, dentre outras garantias, o direito a habeas corpus, bem como a comunicação de prisão, além de não estabelecer prazo para conclusão de inquérito. Desta forma, os presos políticos ficavam completamente entregues aos órgãos de segurança, e ali permaneciam, sem defesa e, em muitos casos, sob tortura, até proferirem uma confissão, prática muito comum no período inquisitorial.[39: CADEMARTORI, Daniela M.L.. O Julgamento dos Crimes Políticos no Brasil: o direito numa estrutura política autoritária (1964-1979). Disponível em: <http://www.buscalegis.ufsc.br/revistas/index.php/buscalegis/article/viewFile/12172/11737>. Acesso em: 04 de setembro de 2017.]
SISTEMAS PROCESSUAIS CRIMINAIS 
Análise acerca dos aspectos conceituais dos sistemas processuais penais cumpre, inicialmente, definir o que seja o vocábulo sistema. Conforme o dicionário HOUAISS, a definição de sistema que parece melhor se coadunar com essa explanação, consiste em, “conjunto de unidades organizadas de determinada forma para alcançar um fim.” .[40: HOUAISS, Antônio. Minidicionário Houaiss da Língua Portuguesa. 2. ed. Rio de Janeiro: Objetiva, 2004. p.684.]
Assim, tendo em vista o advento do Processo Criminal nas sociedades, e considerando as diversas formas em que se apresentou ao longo dos anos, constata-se que todas as peculiaridades conferidas aos modelos processuais adotados contemporaneamente estão intimamente ligadas às suas respectivas origens, embasando os chamados sistemas processuais, que se subdividem em: Sistema Acusatório, Inquisitório e Misto, onde se pode observar dois sistemas antagônicos e uma mescla de ambos.
2.1. SISTEMA ACUSATÓRIO
O sistema acusatório tem sua origem proveniente do direito Grego, onde havia a participação direta do povo no exercício da acusação, isto é, a população atuava como o órgão julgador, assemelhando-se ao nosso atual Ministério Público. À época vigorava o sistema de ação popular para os delitos considerados graves, onde qualquer pessoa detinha a faculdade de acusar, e a acusação privada era utilizada diante dos delitos menos graves. [41: LOPES JÚNIOR, Aury. Introdução Crítica ao Processo Penal. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2004. pág. 152.]
Com passar do tempo, mais precisamente durante a idade médica, o sistema acusatório deixou de ser o mais usual, dando espaço para a utilização do sistema inquisitório. [42: LOPES JÚNIOR, Aury. Introdução Crítica ao Processo Penal. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2004. págs. 152-153.]
O sistema acusatório se caracteriza, sobretudo, pela atribuição das atividades de acusar, defender e julgar a três órgãos diferentes, isto é, a iniciativa probatória deve ser das partes (decorrência lógica da distinção entre as atividades); mantém-se o juiz como um terceiro imparcial, alheio a labor de investigação e passivo no que se refere à coleta da prova, tanto de imputação como de descargo; tratamento igualitário das partes (igualdade de oportunidades no processo); procedimento é em regra oral (ou predominantemente); plena publicidade de todo o procedimento (ou de sua maior parte); contraditório e possibilidade de resistência (defesa); ausência de uma tarifa probatória, sustentando-se a sentença pelo livre convencimento motivado do órgão jurisdicional; instituição, atendendo a critérios de segurança jurídica (e social) da coisa julgada; possibilidade de impugnar as decisões e o duplo grau de jurisdição, nesse sentindo entende Paulo Rangel que, “O sistema acusatório, antítese do inquisitivo, tem nítida separação de funções, ou seja, o juiz é órgão imparcial da aplicação da lei, que somente se manifesta quando devidamente provocado; o autor é quem faz a acusação (imputação penal + pedido), assumindo, segundo nossa posição, todo o ônus da acusação, e o réu exerce todos os direitos inerentes à sua personalidade, devendo defender-se utilizando todos os meios e recursos inerentes à sua defesa. Assim no sistema acusatório, cria-se o actum trium personarum, ou seja, o ato de três personagens: juiz, autor e réu”.[43: LOPES JR, Aury. Direito Processual Penal, 11. ed. São Paulo: Saraiva 2014. Pág 65][44: RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 14ª Ed. Rio de Janeiro. Lúmen Juris, 2008, p. 48.]
Outras características conferidas ao sistema acusatório, além da clara distinção das funções processuais de julgar, acusar e defender, são: iniciativa probatória deve ser das partes; manutenção do juiz como um terceiro imparcial, isto é, alheio a labor de investigação e passivo no que se refere à coleta da prova, tanto de imputação como de descargo; tratamento igualitário das partes; procedimento é em regra oral (predominantemente); plena publicidade de todo procedimento (ou de sua maior parte); contraditório e possibilidade de resistência (defesa); ausência de uma tarifa probatória, sustentando-se a sentença pelo livre convencimento motivado do órgão jurisdicional; instituição, atendendo a critérios de segurança jurídica (e social) da coisa julgada e possibilidade de impugnar as decisões e o duplo grau de jurisdição. [45: LOPES, Aury Jr. Direito Processual Penal e sua Conformidade Constitucional. 3ª Ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 58.]
Vale ressaltar que a principal crítica feitaao sistema interpretativo acusatório que está intimamente ligada à imparcialidade do juiz, onde se alega que, ao manter-se imparcial, o magistrado automaticamente fica inerte dentro do processo, conforme preceitua o professor Aury Lopes Junior:[46: LOPES JR, Aury. Direito Processual Penal, 11. ed. São Paulo: Saraiva 2014. Pág 65.]
É importante destacar que a principal crítica que se fez (e se faz até hoje) ao modelo acusatório é exatamente com relação à inércia do juiz (imposição da imparcialidade), pois este deve resignar-se com as consequências de uma atividade incompleta das partes, tendo que decidir com base em um material defeituoso que lhe foi proporcionado. Esse sempre foi o fundamento histórico que conduziu à atribuição de poderes instrutórios ao juiz e revelou-se (através da inquisição) um gravíssimo erro. 
	O sistema acusatório é um cogente do atualizado processo penal, tendo em vista estrutura contemporânea social e política do Estado. Tendo em vistas seus fatores característicos o sistema interpretativo acusatório assegura a imparcialidade e a bonança psicológica necessárias ao juiz que irá julgar o mérito, de modo a garantir a dignidade e o respeito necessário ao acusado, que passa a figurar como parte genuína, ainda que no passivo, do processo penal.[47: LOPES JR, Aury. Direito Processual Penal, 11. ed. São Paulo: Saraiva 2014. Pág 65]
	Conforme já elucidado, as práticas inquisitoriais, por consequência, desviam totalmente a real finalidade do processo criminal, que é de assegurar a tranquilidade social. O sistema acusatório, por sua vez, cumpre de forma muito mais efetiva tal finalidade, pois sua estruturação e seus preceitos característicos obstam eventuais abusos da prepotência do Estado, que pode se manifestar na figura do julgador impetuoso, que ao julgar, se esquece dos princípios básicos de justiça, pois ao se valer de possíveis poderes instrutórios, manifestaria evidentemente a vontade de condenar. Em virtude dos princípios que norteiam o sistema ora analisado, a inatividade do juiz – constantemente criticada pelos adeptos de sistemas antagônicos – implica diretamente no aumento da responsabilidade das partes, já que as mesmas têm o dever de toda a carga probatória necessária para evidenciar a situação fática e convencer o julgador, exigindo uma maior responsabilidade e grau técnico dos profissionais do Direito que atuam na área criminal. 
2.1.2 A CONFORMIDADE CONSTITUCIONAL DO SISTEMA ACUSATÓRIO
	O sistema acusatório é respaldado pela Constituição Federal de 1988, ganhando força normativa frente aos sistemas antagônicos. Vale ressaltar, antes de tudo, a real importância da Constituição Federal de 1988, conforme afirma Geraldo Prado: “O desenvolvimento do paradigma da modernidade radicou-se no ideal democrático, de modo que nada é mais natural que o relevo dado à Constituição entre as demais leis, decorrente do convencimento de que aquela assegura a divisão dos poderes do Estado, mediante sistema de freios e contrapesos, bem como tutela os direitos fundamentais, conformando toda ordem jurídica.”.[48: PRADO, Geraldo, Sistema Acusatório, A Conformidade Constitucional das Leis Processuais Penais, 3ª Edição, EDITORA LUMEN JURIS, Rio de Janeiro 2005, p 36.]
	Tendo em vista a importância da Constituição Federal, sendo conhecidas todas as características do sistema acusatório, entende Geraldo Prado que: [49: Ob. Citada, Pág. 300.]
Se aceitarmos que a norma constitucional que assegura ao Ministério Público a privatividade do exercício da ação penal pública, na forma da lei, a que garante a todos os acusados o devido processo legal, com ampla defesa e contraditório, além de lhes deferir, até o trânsito em julgado da sentença condenatória, a presunção de inocência, e a que, aderindo a tudo, assegura o julgamento por juiz competente e imparcial, pois que se excluem as jurisdições de exceção, com a plenitude do que isso significa, são elementares do princípio do acusatório, chegaremos à conclusão de que, embora não o diga expressamente, a Constituição da República adotou-o. Verificando que a Carta Constitucional prevê, também, a oralidade do processo, pelo menos como regra para as infrações de menor potencial ofensivo, e a publicidade, concluiremos que filiou-se, sem dizer, ao sistema acusatório. Porém, se notarmos o concreto estatuto jurídico dos sujeitos processuais e a dinâmica que, pelas relações jurídicas ordenadas e sucessivas, entrelaçam a todos, de acordo com as posições predominantes nos tribunais (principalmente, mas não exclusivamente no Supremo Tribunal Federal), não nos restará alternativa salvo admitir, lamentavelmente, que prevalece, o Brasil, a teoria da aparência acusatória, porque muitos dos princípios opostos ao acusatório são implementados todo dia. Tem razão o mestre Frederico Marques ao assinalar que a Constituição preconiza a adoção e efetivação do sistema acusatório. Também tem razão Hélio Tornaghi, ao acentuar que há formas inquisitórias vivendo de contrabando no processo penal brasileiro, o que melhor implica em considerá-lo, na prática, misto. O princípio e o sistema acusatório são, por isso, pelo menos por enquanto, meras promessas, que um novo Código de Processo Penal e um novo fundo cultural, consentâneo com os princípios democráticos, devem tornar realidade. 
	Cumpre dizer que no Brasil não há um entendimento unificado acerca do sistema processual a ser adotado, tendo em vista que há dois enfoques legislativos, a saber: o constitucional e o processual, sem do certo que se fôssemos seguir exclusivamente o viés Constitucional poderíamos afirmar que nosso sistema é acusatório (no texto constitucional encontramos os princípios que regem o sistema acusatório). Ocorre que nosso processo penal é regido por Código Específico, que data de 1941, elaborado com um caráter nitidamente inquisitivo.[50: NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal e Execução Penal. 3ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007. p. 104-105.]
	Com base em tal entendimento, conclui-se que as ideias confrontantes da Constituição Federal de 1988 em relação ao Código de Processo Penal de 1941 ensejaram a mescla dos sistemas interpretativos adotados pelas legislações supracitadas. Não há como negar a complexidade do cenário elucidado, muito em função do caráter inquisitório do Código de Processo Penal de 1941 frente à Constituição Federal de 1988, que por sua vez é imantada pelos princípios democráticos do sistema acusatório. Diante da dificuldade iminente de fugir a tal realidade legislativa, de modo a prover somente a aplicação dos princípios democráticos elencados pela Constituição à prática forense, existem juízes, promotores, delegados e advogados que se valem Código de Processo Penal, submetendo-se as regras de funcionamento pelo referido diploma legal, que não pode ser ignorado como se inexistisse. Tornado o sistema misto evidente em nosso ordenamento.
	Diante do cenário exposto fica expressa a ambiguidade sistemática que caí sobre a estruturação ideal do Processo Criminal Brasileiro, e mesmo que haja a consciência acerca de que seria correto assegurar a conformidade constitucional do processo penal, é sabido que, mesmo com diversos dispositivos anticonstitucionais, o nosso Código Processual Penal não será ignorado frente à Constituição Vigente, é o que entende Guilherme de Souza Nucci: [51: NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Processo Penal e Execução Penal. 3ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007. p. 104-105.]
É certo que muitos processualistas sustentam que o nosso sistema é o acusatório. Mas baseiam-se exclusivamente nos princípios constitucionais vigentes (contraditório, separação entre acusação e órgão julgador, publicidade, ampla defesa, presunção de inocência etc.). Entretanto, olvida-se, nessa análise, o disposto no Código de Processo Penal, que prevê a colheita inicial da prova através do inquérito policial, presidido por um bacharel em Direito, que é o delegado, com todos os requisitos do sistema inquisitivo (sigilo,ausência de contraditório e ampla defesa, procedimento eminentemente escrito, impossibilidade de recusa do condutor da investigação etc.) Somente após, ingressa-se com a ação penal e, em juízo, passam a vigorar as garantias constitucionais mencionadas, aproximando-se o procedimento do sistema acusatório. (...) Defender o contrário, classificando-o como acusatório é omitir que o juiz brasileiro produz prova de ofício, decreta a prisão do acusado de ofício, sem que nenhuma das partes tenha solicitado, bem como se vale, sem a menor preocupação, de elementos produzidos longe do contraditório, para formar sua convicção. Fosse o inquérito, como teoricamente se afirma, destinado unicamente para o órgão acusatório, visando a formação da sua opinio delict e não haveria de ser parte integrante dos autos do processo, permitindo-se ao magistrado que possa valer-se dele para a condenação de alguém.
	Diante de todo o exposto conclui-se que, dada à importância da Constituição Federal em nível de Legislação – já elucidada na presente pesquisa – é certo que a mesma deveria reger por completo o Código de Processo Penal, contudo, este último, por conta de sua “alma inquisitória”, juntamente com o fato de não ter sido submetido às reformas pertinentes desde sua promulgação, obsta em muitos os efeitos a tão aclamada conformidade constitucional, evidenciando a maior problemática do processo penal brasileiro. 
PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO PROCESSO PENAL
	
	 Sendo notória a conformidade constitucional do Processo Penal, necessária se faz a analise dos princípios processuais que emanam da Constituição Federal, uma vez que tais princípios devem ser o alicerce de qualquer estruturação processual, entendendo-se, então, que com a relativização destes, a solidez da sistematização processual se vê comprometida. Conforme já elucidado, mediante interpretação sistemática da Constituição Federal, é notório que o sistema processual penal adotado pelo referido diploma legal é o acusatório, onde deste emanam diversos princípios, que por conta de suas respectivas origens podem ser considerados Constitucionais. 
2.3.1 A PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA E IN DUBIO PRO REO 
	A presunção de inocência preza pela preservação do acusado, sendo este um princípio fundamental de civilidade, decorrente de uma visão garantista a favor da preservação dos inocentes, mesmo que por ventura isto ocasione a impunidade de algum culpado, pois, para um convívio social saudável, basta que os culpados sejam geralmente punidos, sob a ótica de que todos os inocentes estejam a salvo de uma condenação injusta. [52: FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: Teoria do Garantismo Penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, p. 441.]
	Por esta ótica, entende o Professor Aury Lopes Jr., que a presunção da inocência trata-se de “princípio reitor do processo penal e, em última análise, podemos verificar a qualidade de um sistema processual através do seu nível de observância (eficácia)”.[53: JÚNIOR, Aury Lopes. Direito Processual Penal e sua Conformidade Constitucional. 8 ed. V. 1. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011, p. 177.]
	O princípio da presunção de inocência ganhou notoriedade ao longo dos anos, de modo a figurar em diversos diplomas legais pelo mundo, podendo ser visualizado, inclusive, na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão promulgada em 1789, durante a Revolução Francesa, que em seu artigo nono estabelecia: “Todo acusado é considerado inocente até ser declarado culpado”, bem como na Declaração Universal dos Direitos Humanos promulgada pela Organização das Nações Unidas, em 1948, que em seu artigo XI preceitua que: “Toda pessoa acusada de um ato delituoso tem o direito de ser presumida inocente, até que a culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público, no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua defesa.”. [54: Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão - Assembleia Nacional Constituinte Francesa, 1789][55: Declaração dos Direitos Humanos - ONU, 1948.]
	A Constituição Federal Brasileira, promulgada em 1988, inseriu no ordenamento jurídico nacional o princípio da presunção de inocência, conforme redação de seu artigo 5º, LVII, que prevê: ““Art. 5 º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:(...) LVII – ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória.”, desta forma fica evidente que o princípio ora elucidado preceitua que a carga probatória dentro de um processo criminal caberá integralmente à acusação, dando ensejo ao princípio do In dubio pro reo, onde entende-se que sendo o acusado é presumivelmente inocente, cabendo o ônus probatório ao acusador, sendo, portanto, essencial para a cominação de uma sentença condenatória, que se prove, além de qualquer dúvida razoável, a responsabilidade do acusado. Subsistindo dúvida, tem-se que a acusação não se desincumbiu do ônus que lhe cabe, restando para tanto a absolvição do réu, já que, sem demonstração cabal de sua culpa, prevalece a inocência presumida. Seguindo está ótica, é possível afirmar que a presunção de inocência confunde-se com o in dubio pro reo. [56: BADARÓ, Gustavo Henrique. Direito Processual Penal. Tomo I. Rio de Janeiro: Elsevier, 2008, p. 17.]
	O princípio in dubio pro reo, essencialmente, busca garantir que, sem provas elementares suficientes, sejam estas objetivas ou subjetivas, do fato típico e ilícito, não será possível a aplicação de pena. A insuficiência da prova equivale à dúvida positiva e irredutível sobre a existência ou inexistência de determinado fato ou de sua autoria. Dá-se, então, como não provado o fato desfavorável ao arguido, e, vedado o non liquet em nosso ordenamento, é preconizado ao juiz que valore a mercê do defendente a prova ambígua.[57: MONTEIRO, Cristina Líbano. Perigosidade de inimputáveis e in dubio pro reo. Coimbra: Coimbra editora, 1997, p. 11.]
Para melhor compreensão acerca da aplicação do princípio in dubio pro reo, mister se faz que haja uma breve recapitulação a respeito do conceito da prova no Processo Penal. Desta forma entende-se que a prova, em sua mais pura essência, é o conjunto de instrumentos utilizados com fito de formar o convencimento do julgador, sendo os tais inerentes ao direito de defesa e de ação, conforme preceitua Guilherme Nucci: "O termo prova origina-se do latim – probatio –, que significa ensaio, verificação, inspeção, exame, argumento, razão, aprovação ou confirmação. Dele deriva o verbo provar – probare –, significando ensaiar, verificar, examinar, reconhecer por experiência, aprovar, estar satisfeito com algo, persuadir alguém a alguma coisa ou demonstrar.".[58: NUCCI; Guilherme de Souza, Manual de Direito Penal, Rio de Janeiro, Editora Forense, 2014, p.338]
	
2.3.2 Imparcialidade do Juiz
Para que o Estado consiga, efetivamente, dirimir os conflitos penais presentes na sociedade, é imprescindível que o mesmo conte com a figura de um Juiz Imparcial, conforme entendimento de Tourinho: "Não se pode admitir Juiz parcial. Se o Estado chamou a si a tarefa de dar a cada um o que é seu, essa missão não seria cumprida se, no processo, não houvesse imparcialidade do Juiz." [59: TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal, volume 4, São Paulo: Saraiva 2006, pág 18.]
Seguindo tal entendimento, compreende-se que para que um Juiz seja verdadeiramente imparcial, é necessário que o mesmo se isente de qualquer influência externa que poderá interferir no processo.
Conforme já elucidado na presente dissertação, a Constituição Federal adota o sistema interpretativo acusatório para o Processo Penal e, no referido sistema, é sabido que há a clara separação das funções de julgar, acusar e defender, devendo o julgador de apenas analisar os elementos processuais (subjetivos, probatórios e objetivos), sem para tanto,atuar como parte no decorrer da instrução.
O ordenamento jurídico Brasileiro, para além do campo interpretativo, oferece dispositivos que proporcionam garantias e deveres ao Juiz, a exemplo da Constituição Federal/1988, em seu artigo 95, citado abaixo, lhe assegura algumas prerrogativas basais, objetivando evitar que o mesmo seja acometido por qualquer tipo de influências ou coações, sendo elas: vitaliciedade, inamovibilidade e irredutibilidade de subsídio. [60: BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 05 de outubro de 1988. 6 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005]
 Ainda no que tange o ordenamento jurídico em relação à imparcialidade do juiz, existem dispositivos que podem ser clamados diante de eventual parcialidade do julgador, como por exemplo, os Artigos 252, 253 e 254 do Código de Processo Penal/1941:[61: BRASIL. Decreto-Lei n. 3.689, de 3 de outubro de 1941. Código de Processo Penal Brasileiro. ]
As hipóteses elencadas nos dispositivos legais supracitados estão além das questões interpretativas emanadas do sistema acusatório, pois são causas mais específicas que caracterizam a parcialidade do juiz, onde é possível visualizar uma nítida e direta ligação do julgador com o processo em apreciação, como por exemplo, nas situações em que seu cônjuge tiver atuado no processo, ou, quando ele mesmo tiver atuado como juiz da causa em outra instância, ou, quando ele ou outro familiar for parte, ou, tiver interesse direto na demanda processual, nestes casos o juiz estará impedido de atuar, dando ensejo ao instituto do impedimento (Art. 252), que é considerado um dos mais enérgicos quando se trata de inibir a parcialidade do julgador. Em havendo alguma das causas de impedimento, o magistrado deverá por livre e espontânea convicção se afastar do processo, e, se não for tomada tal atitude, qualquer das partes processuais poderá arguir o impedimento, e, se restar devidamente comprovado, o mesmo será concedido imediatamente. No que tange a suspeição (Art. 254), mesmo não sendo tão grave quanto o impedimento, também acaba por afetar a imparcialidade do juiz, e, por conta disto, poderá ser arguida pelo próprio juiz, e, se este não o fizer, poderá ocorrer a recusado deste, por qualquer das partes. E, a suspeição se apresenta nas hipóteses elencadas pelo Art. 254, em seus respectivos incisos.[62: COELHO DIAS, Fabio, Princípios constitucionais à luz do Direito Processual Penal brasileiro. Disponível em: http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=8453. Acesso em 23 de maio de 2017.]
Além do que está disposto legalmente, é sabido que o julgador pode abdicar de sua imparcialidade de diversas maneiras, como por exemplo, quando o mesmo busca verdade real dentro do processo criminal, pois ao fazê-lo atua nitidamente como parte, evidenciando o animus de condenar, tendo em vista que para absolver, basta mera dúvida em relação à situação fática, a teor do que preceitua o princípio do in dubio pro reo, já analisado na presente dissertação. 
2.3.3 Igualdade das partes e paridade de armas
Superada a análise dos princípios da presunção de inocência, do in dubio pro reo e da imparcialidade do juiz, conclui-se que o réu deve ter preservado, em toda a instrução penal, o seu estado de Inocência, salvo quando findo o devido processo legal, portanto, se nenhum elemento probatório for encontrado e nenhuma ação dirigida na formação da culpa for efetuada, este mesmo réu permanece inocente, de modo que a persecução penal não tem como oferecer ao réu um estado mais favorável do que o mesmo possuía originalmente, ainda que a sentença determine eventual absolvição. Dito isto, é cabível afirmar que, na persecução penal, considerando a busca pela verdade (meramente processual), tudo o que existe quanto ao réu é em relação à alteração ou à manutenção de seu estado de inocência.[63: FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 48-56.]
Seguindo o prisma do sistema acusatório, é possível afirmar que os acusadores devem buscar a alteração do estado de inocência do acusado, que por sua vez, irá se defender para manter-se inocente até o findar da instrução criminal. Contemporaneamente, os chamados acusadores se fazem presentes nas seguintes figuras: Ministério Público (MP), Polícia Civil; a Polícia Militar; Agência Brasileira de Inteligência; Polícia Federal, entre outros, além de todo o poder estatal e a influência popular. Os defensores, aqueles que buscam manter o estado de inocência do réu, se fazem presentes na figura do advogado de defesa.[64: ZAFFARONI, Eugenio Raúl. A palavra dos mortos: conferências de criminologia cautelar. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 303-346, disponível em http://www.conteudojuridico.com.br.]
Conforme já elucidado, é sabido que a instrução criminal é a única forma de alterar o estado de inocência do Réu, e para tanto, se faz necessário que o mesmo esteja em condições processuais igualitárias em relação 
a seus acusadores, isto é, não deve haver disparidade de condições entre a defesa a acusação. Tal entendimento de faz presente no ordenamento jurídico, sendo o mesmo consolidado pela Constituição Federal de 1998, em seu artigo 3º , que pressupõem uma sociedade construída de forma livre, justa e solidária. De forma mais específica, o artigo 5º da Constituição Federal de 1988, em seu inciso XLI, pressupõem que: “a lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais;”, o inciso LV artigo 5ª do mesmo diploma legal, preceitua, ainda, que: “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.”.[65: BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 05 de outubro de 1988. 6 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005][66: BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 05 de outubro de 1988. 6 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005]
Além de estar presente no texto constitucional brasileiro, o princípio da igualdade e paridade armas encontra amparo, também, no Pacto de São José da Costa Rica, incorporado ao ordenamento jurídico brasileiro através do Decreto nº 678, de 1992, que pressupõem em seu artigo 8º, 2º item, que todo o indivíduo, que fora acusado de algum delito, possui direito à plena igualdade durante o processo, sendo-lhe concedidas para tanto diversas garantias mínimas, tais como, direito do acusado de ser assistido gratuitamente por tradutor ou intérprete, se não compreender ou não falar o idioma do juízo ou tribunal; comunicação prévia e pormenorizada ao acusado da acusação formulada; concessão ao acusado do tempo e dos meios adequados para a preparação de sua defesa; direito do acusado de defende se pessoalmente ou de ser assistido por um defensor de sua escolha e de comunicar - se, livremente e em particular, com seu defensor; direito irrenunciável de ser assistido por um defensor proporcionado pelo Estado, remunerado ou não, segundo a legislação interna, se o acusado não se defender ele próprio nem nomear defensor dentro do prazo estabelecido pela lei; direito da defesa de inquirir as testemunhas presente no tribunal e de obter o comparecimento, como testemunhas ou peritos, de outras pessoas que possam lançar luz sobre os fato, bem como o direito de não ser obrigado a depor contra si mesmo, nem a declarar-se culpado, bem como o direito de recorrer da sentença para juiz ou tribunal superior.[67: BRASIL. DECRETO N° 678, DE 06 DE NOVEMBRO DE 1992. Promulga a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), de 22 de novembro de 1969. ]
Com base na presença do princípio da igualdade e paridade de armas no ordenamento jurídico brasileiro, fica expresso que durante a instrução do processo criminal, as partes devem estar em “condiçõesprocessuais” igualitárias, e para tanto, a defesa deverá estar munida das mesmas capacidades e dos mesmos poderes da acusação, além de ter assegurado o seu papel contraditor, sendo o mesmo admitido em todo estado e grau do procedimento e em relação a cada ato probatório singular, das averiguações judiciárias e das perícias ao interrogatório do imputado, dos reconhecimentos aos testemunhos e às acareações. Há o entendimento, também, que preceitua que igualdade condições não deva ser meramente processual, uma vez que a adequada abordagem da 'paridade de armas' leva a um conceito que difere de uma “igualdade estática”, senão dinâmica, em que o Estado deve dirimir questões relacionadas às desigualdades para poder fortificar uma igualdade real. Se o devido processo é o algoritmo jurisdicional democrático de um determinado modelo de Estado, essa igualdade somente pode ser a substancial, efetiva e real. As chamadas “oportunidades processuais”, tais como: de falar, de contraditar, de reperguntar, de opinar, de requerer e de participar das provas etc., devem ser exatamente proporcionais, seja para quem ocupa posição idêntica dentro do processo, seja para os que ostentam posição contrária, sendo conferidos aos mesmos, idênticos direitos, ônus e deveres.[68: FERRAJOLI, Luigi. Direito e razão: teoria do garantismo penal. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 565.][69: GOMES, Luiz Flávio; MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Comentários à convenção americana sobre direitos humanos: Pacto de San José da Costa Rica. 3. Ed. São Paulo: RT, 2010, p. 113.]
	
2.4 SISTEMA INQUISITÓRIO
	Conforme já elucidado, o sistema inquisitório surgiu ao longo do tempo, mais precisamente entre o século XII e século XIV, sendo o mesmo altamente difundido durante o Império Romano. O advento do sistema inquisitório se deu muito em função da pretensão de se “punir mais”, ou seja, passou a se entender que as características do sistema acusatório eram maléficas à ordem pública, conforme preceitua Aury Lopes Junior:[70: LOPES JÚNIOR, Aury. Introdução Crítica ao Processo Penal. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2004. pág. 152.][71: LOPES JR, Aury. Direito Processual Penal, 11. ed. São Paulo: Saraiva 2014. Pág. 67.]
O sistema inquisitório, na sua pureza, é um modelo histórico. Até o século XII, predominava o sistema acusatório, não existindo processos sem acusador legítimo e idôneo.
A acusação era apresentada por escrito, indicando as provas que se utilizariam para demonstrar a veracidade dos fatos. Estava apenado o delito de calúnia, como forma de punir as acusações falsas. Não se podia atuar contra um acusado ausente.
As transformações ocorrem ao longo do século XII até o XIV, quando o sistema acusatório vai sendo, paulatinamente, substituído pelo inquisitório. 
Essa substituição foi fruto, basicamente, dos defeitos da inatividade das partes, levando à conclusão de que a persecução criminal não poderia ser deixada nas mãos dos particulares, pois isso comprometia seriamente a eficácia do combate à delinquência. Era uma função que deveria assumir o Estado e que deveria ser exercida conforme os limites da legalidade. Também representou uma ruptura definitiva entre o processo civil e penal.
	As principais características do sistema inquisitorial consistem em: reunir as funções de julgar, acusar e defender; inexistência de partes, tendo em vista que o réu é mero objeto do processo penal e não sujeito de direitos; ausência de publicidade dos atos praticados; ausência de garantias constitucionais, como contraditório, ampla defesa e devido processo legal etc.; maior valoração da confissão, tornando-a rainha das provas; e a existência de presunção de culpa, isto é, o réu é culpado até que se prove o contrário.[72: RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 14ª Ed. Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2008, p. 46.]
	Cumpre informar que, em relação à prova judiciária no processo criminal, o sistema inquisitório preceitua o sistema legal de valoração (a chamada tarifa probatória) conforme salienta José Laurindo de Souza Netto: “Especificamente com relação às provas, é importante ressaltar que elas eram tarifadas por lei (sistemas de prova legal), ou seja, cada prova possuía um valor probatório diverso, e a confissão era denominada a ‘rainha das provas’, suplantando qualquer outra, mesmo que obtida mediante tortura. Quanto às provas documentais e testemunhais, havia uma tarifação, que observava, principalmente, a condição da testemunha (sexo, parentesco com a vítima etc.). Havia até mesmo uma graduação para a comprovação de determinados fatos – por exemplo, um roubo se provava com número específico de testemunhas masculinas, ou, então, femininas, sendo que um homicídio tinha sua autoria comprovada por um número diverso.”[73: NETTO, José Laurindo de Souza. Processo Penal: Sistemas e Princípios. Curitiba: Juruá, 2003, p. 30.]
	É sabido que o sistema inquisitorial antagoniza totalmente com o sistema acusatório, principalmente no que tange a condição das partes do processo, enquanto um preza pela igualdade das mesmas, o outro por sua vez, as coloca em total desnível, conforme entendimento de Aury Lopes Junior:[74: LOPES JR, Aury. Direito Processual Penal, 11. ed. São Paulo: Saraiva 2014. Pág. 67.]
O sistema inquisitório muda a fisionomia do processo de forma radical. O que era um duelo leal e franco entre acusador e acusado, com igualdade de poderes e oportunidades, se transforma em uma disputa desigual entre o juiz-inquisidor e o acusado. O primeiro abandona sua posição de árbitro imparcial e assume a atividade de inquisidor, atuando desde o início também como acusador. Confundem-se as atividades do juiz e acusador, e o acusado perde a condição de sujeito processual e se converte em mero objeto da investigação.
	A desigualdade de condições entre o acusado e o julgador é umas das principais características do sistema inquisitório, e a mesma se manifesta, por exemplo, na ocasião onde o julgador atua de ofício, sem obrigação de ser provocado, isto é, inicia o processo sem a necessidade da acusação, e se vale de poderes instrutórios, ou seja, reúne o material que vai constituir seu próprio convencimento, caracterizando a busca da verdade real.
	Fica evidente, levando em consideração a característica supracitada do sistema inquisitorial, que o julgador atua como parte no processo, julgando, acusando, investigando e dirigindo o procedimento. [75: MARQUES, José Frederico. Apud THUMS, Gilberto. Sistemas Processuais Penais. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2006. p. 201. ]
	Com base nas análises acerca das características do sistema inquisitivo, considerando, inclusive, sua origem histórica, resta concluído que o mesmo não guarda compatibilidade com os direitos constitucionais que devem prevalecer em um Estado Democrático de Direito e, em vista disso, deve ser afastado das legislações contemporâneas que tem o escopo de assegurar ao cidadão as mínimas garantias em apreço à honra da pessoa humana, uma vez que o processo penal de uma nação funciona como uma espécie de termómetro, mensurando seus elementos legislativos e determinando se estes são democráticos ou autoritários. [76: RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 14ª Ed. Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2008, p, 47.][77: GOLDSCHMIDT, James. Apud THUMS, Gilberto. Sistemas Processuais Penais. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2006. p. 171.]
2.5 SISTEMA MISTO
Entre o sistema acusatório e o inquisitório existe uma “mescla”, isto é, um meio termo entre ambos, que a doutrina tradicional denomina como sistema misto, inquisitório reformado ou napoleônico.
Parte da doutrina refere-se ao modelo brasileiro de sistema processual, principalmente, no que tange à definição da atuação do juiz criminal, como um sistema de natureza mista, isto é, com feições acusatórias e inquisitórias, sobretudo, em função da predominância do sistema inquisitório na fase denominada como pré-processual e o acusatório, na fase processual. [78: NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de ProcessoPenal e Execução Penal. São Paulo: RT, 2007, p. 130.]
Merece destaque, também, que há o entendimento doutrinário que preceitua que o sistema processual criminal brasileiro é de natureza mista por conta dos enfoques legislativos diversos, o que se exemplifica quando constatamos determinados poderes atribuídos aos juízes através do Código de Processo Penal, o que caracterizaria a adoção desse pelo sistema inquisitório, apesar da conformidade constitucional do sistema acusatório.[79: Idem, Ibidem, p. 130.]
Sendo certo que os princípios norteadores do sistema, provenientes da Constituição Federal (direito à ampla defesa, contraditório, publicidade, separação entre acusação, defensa e julgamento, imparcialidade do juiz, presunção de inocência, etc.) possuem inspiração acusatória, não se há de ignorar, também, que o corpo legislativo processual penal, estruturado pelo Código de Processo Penal e leis especiais, utilizados demasiadamente no dia-a-dia forense, instruindo feitos e produzindo soluções às causas, possui institutos advindos tanto do sistema acusatório quanto do sistema inquisitivo, não havendo então, qualquer pureza na mescla dessas regras, surgindo daí o entendimento da existência de um sistema misto.[80: NUCCI, Guilherme de Souza. Provas no Processo Penal. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009, p. 25.]
Em relação às fases processuais, há na doutrina o entendimento que, se uma seguir sob a égide inquisitorial, contaminará a outra, que, por sua vez, segue sob o prisma do sistema acusatório, conforme entendimento de Aury Lopes Junior: “(...) a prova é colhida na inquisição do inquérito, sendo trazida integralmente para dentro do processo e, ao final, basta o belo discurso do julgador para imunizar a decisão. Esse discurso vem mascarado com as mais variadas fórmulas, do estilo: a prova do inquérito é corroborada pela prova judicializada; cotejando a prova policial com a judicializada; e assim todo um exercício imunizatório (ou melhor, uma fraude de etiquetas) para justificar uma condenação, que na verdade está calcada nos elementos colhidos no segredo da inquisição. O processo acaba por converter-se em uma mera repetição ou encenação da primeira fase.” Com base em tal entendimento, fica expresso que se o procedimento preliminar secreto, escrito, sem contraditório e ampla defesa; a fase judicial, mesmo sendo oral, pública e com todos os atos praticados em audiência, garantidos ao acusado os direitos de contraditório e ampla defesa, será contaminada, o que tornaria o procedimento absolutamente inquisitorial, afastando a possibilidade da existência de um sistema misto. Tal entendimento preceitua, também, pela insuficiência da denominação de um sistema processual como misto, uma vez que não existem mais sistemas puros (são tipos históricos), todos são mistos, havendo então a necessidade de se localizar “o princípio informador de cada sistema”, bem como seu núcleo, que, enfim, determinará se um sistema é inquisitivo ou acusatório.[81: LOPES JR, Aury. Direito processual penal e sua conformidade constitucional. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 133.][82: LOPES JR, Aury. Direito processual penal e sua conformidade constitucional. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 130.]
Há no entendimento doutrinário, também, a visão do sistema misto como um sistema autônomo, isto é, dotado de características e princípios próprios, dividindo, efetivamente a instrução criminal em duas fases e, consequentemente, conferindo a cada uma destas um sistema processual próprio. É o que salienta Paulo Rangel: “Instrução preliminar: nesta fase, inspirada no sistema inquisitivo, o procedimento é levado a cabo pelo juiz, que procede às investigações, colhendo as informações necessárias a fim de que se possa, posteriormente, realizar a acusação perante o tribunal competente; judicial: nesta fase, nasce a acusação propriamente dita, onde as partes iniciam um debate oral e público, com a acusação sendo feita por um órgão distinto do que irá julgar, em regra, o Ministério Público.”.[83: RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 8. ed. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2004. p. 51.]
Assim, conclui-se que, apesar de ser consideravelmente avançado em relação ao sistema inquisitório, o sistema misto ainda não é considerado um sistema pleno, uma vez que mantém o juiz na condição de ator do processo, já na fase de colheita das provas, isto é, na fase pré-processual, o que culmina por influenciar e contaminar toda a instrução criminal, nesse sentido, concluí Paulo Rangel: [84: RANGEL, Paulo. Direito Processual Penal. 8. ed. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2004. p. 52]
	A função jurisdicional deve ser ao máximo preservada, retirando-se, nos Estados Democráticos de Direito, o juiz da fase persecutória e entregando-se a mesma ao Ministério Público, que é quem deve controlar as diligências investigatórias realizadas pela polícia judiciária, ou, se necessário for, realizá-las pessoalmente, formando sua opinio delicti e iniciando a ação penal.
	2.6	GESTÃO DA PROVA NO PROCESSO PENAL
A terminologia prova tem origem no latim (probatio), apresentando diversos significados, a saber: experimentação, verificação, exame, confirmação, reconhecimento, confronto, etc. Apesar dos diversos significados da palavra prova, o sentido comum da mesma consiste em tudo aquilo que pode levar ao conhecimento de um fato, de uma qualidade, da existência ou exatidão de uma coisa.
Processualmente, 
No sistema acusatório, a função da prova está vinculada à formação do convencimento julgador, devendo ser gerida pelas partes,
O PRINCÍPIO DA VERDADE REAL 
	Superada a análise acerca das características dos sistemas do processo penal, considerando, sobretudo, seus aspectos históricos, é possível evidenciar que, historicamente, o sistema inquisitório age com ímpeto e “paixão”, pois pressupõem maior “pretensão punitiva”, deixando de observar para tanto os diversos aspectos técnicos observados no sistema acusatório, como por exemplo, a separação das funções processuais de julgar, acusar e defender. Em função de seu caráter “apaixonado”, o sistema acusatório admite, inclusive, a concessão de poderes instrutórios ao julgador, concedendo-lhe, inclusive, a prerrogativa para busca da “verdade real” no curso da instrução criminal, isto é, a insuficiência da verdade processual.
	Considerando a análise feita acerca dos princípios constitucionais do processo penal, fica expresso que o principio da verdade real não se faz presente no texto constitucional, além de ir contra o mesmo, uma vez que, o ato de “buscar a verdade real” no processo criminal fere diversos princípios do processo criminal consagrados constitucionalmente. 
 	O princípio da verdade real no processo criminal é claramente um resquício do período inquisitorial, e tal afirmativa se sustenta diante da visualização do contexto histórico emanado dos séculos de inquisição (conforme elucidado na presente pesquisa), principalmente no que concernem os processos criminais da época. Conforme já elucidado na presente pesquisa, é sabido que os inquisidores eram demasiadamente enérgicos e buscavam sempre uma forma de conseguir a “verdade”, de modo que praticamente compeliam os acusados a confessarem o delito, utilizando-se para tanto de todos os métodos possíveis para tal. É o que afirma Aury Lopes Junior: [85: LOPES JR, Aury. Direito Processual Penal, 11. ed. São Paulo: Saraiva 2014. Pág. 69.]
	A estrutura do processo inquisitório foi habilmente construída a partir de um conjunto de instrumentos e conceitos (falaciosos, é claro), especialmente o de “verdade real ou absoluta”. Na busca dessa tal “verdade real”, transforma-se a prisão cautelar em regra geral, pois o inquisidor precisa dispor do corpo do herege. De posse dele, para buscar a verdade real, pode lançar mão da tortura, que se for “bem” utilizada conduzirá à confissão. Uma vez obtida a confissão, o inquisidor não necessita de mais nada, pois a confissão é a rainha das provas (sistema de hierarquia de provas).

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