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PROF. DRESCH 2016/2 HELENA FABRICIO RESPONSABILIDADE CIVIL História do Direito Civil Antes de iniciar a análise da Responsabilidade Civil propriamente dita, cabe uma breve retomada histórica do direito civil. A história do Direito Civil se inicia no Direito Romano, com seus diversos institutos. O primeiro período que cabe ser analisado dentro do Direito Romano é a transformação do “Fas” (direito baseado em normas morais e religiosas) em “ius civile” (direito quiritário dos patriarcas romanos). O “Fas” foi a base do Direito Romano, pois este teve seu início muito vinculado à solenidade do procedimento. Eram, inclusive, sacerdotes que tratavam do direito e, quando especialistas, tornavam-se jurisconsultos. Inicialmente, havia um só magistrado: o Rei. É somente com a República que passa a haver maior distribuição de tarefas e uma maior acessibilidade, mesmo que ainda mínima, da plebe ao direito. Os jurisconsultos eram os grandes especialistas principalmente do período clássico. Eles foram importantes, pois auxiliaram a moldar o direito civil, produzindo obras como Digesto e Justiniano. Já os magistrados funcionavam como administradores da lei, em diversos cargos. A magistratura era anual e o início de um mandato era marcado pelos Éditos. Esses Éditos eram atualizados com base nos casos enfrentados, vinculados aos novos problemas que surgiam em uma sociedade cada vez mais complexa. Essa atualização devia ser feita após consulta aos jurisconsultos, tendo também como fontes os plebiscitos e a própria jurisprudência do período. Foi a extrema solenidade do Direito Romano que permitiu o estabelecimento de um formalismo contratual. Isso gerou a distinção entre pactos e contratos. Os pactos eram vínculos estritamente morais, informais e não-jurídicos. Já os contratos são formais, com vínculo jurídico. O pacto só foi tornar-se vinculativo com a evolução do direito, quando foi, inclusive, equiparado ao contrato. Vale dizer, então, que o nosso direito vem do direito romano e que o conceito de direito em Roma vinha, em grande parte, da ideia aristotélica de justiça. Essa ideia aristotélica faz uma análise dos diversos tipos de justiça, sendo que a aplicada no Direito Romano era a chamada “corretiva e sinalagmática”. Ela buscava corrigir e permitir o equilíbrio, a fim de garantir a justiça. É por essa razão, inclusive, que pactos e contratos foram equiparados (para garantir o equilíbrio nas relações), dando origem à termos como boa-fé e sinalagma. Cabe, porém, analisar a ideia de justiça aristotélica mais a fundo. Era a “dike” a justiça tratada em Ética a Nicômaco, sendo este o primeiro sentido de justiça grego. Divide-se em justiça geral, particular, sinalagmática e comutativa: a) Justiça Geral (Dikaiosini) – Era a que Aristóteles via como base de estruturação da sociedade. Essa justiça corresponderia a soma de todas as virtudes, sendo vinculada ao dever do indivíduo e da legalidade de seus atos. É uma justiça que busca garantir a ordem. b) Justiça Particular (Dikaione) – Aristóteles acreditava ser possível a injustiça perante outro membro específico da sociedade, sem interferir na ordem geral. Esse tipo de injustiça ocorre quando um toma mais do que lhe cabe em uma relação com outro, ferindo o critério de isonomia. A justiça seria o meio termo entre duas pessoas, que poderia se dar de duas formas: corretiva e distributiva. A corretiva é aquela em que se retira o que o injusto “lucrou”, compensando o injustiçado. Essa é a base da responsabilidade civil, a exemplo de um acidente: aquele que se excedeu em sua ação deve compensar o outro. Já a distributiva é aquela que ocorre quando é necessário distribuir algo de forma igualitária entre os membros da sociedade, tratando “desigualmente os desiguais” – não sendo, portanto, uma justiça absoluta. Tem, então, um viés mais subjetivo, pois precisa estabelecer critérios para esta distribuição (mérito X necessidade,...). É exemplo a medida de cotas nas universidades. c) Justiça Sinalagmática – É a base de muitos institutos atuais, baseando-se na ideia de equilíbrio de prestações. Discute-se se realmente é um tipo diferenciado de justiça ou um tipo de justiça particular. d) Justiça Comutativa – Mistura a sinalagmática e a corretiva, sendo, de certa forma, confundida com a distributiva. Isso porque busca equilibrar as relações através de uma correção. Responsabilidade Civil no Direito Romano A responsabilidade civil no direito romano pode ser analisada por fases: vingança privada, Lei das XII Tábuas, Lex Aquilia e estruturação do critério de culpa. A fase da vingança privada é aquela em que não se distinguia responsabilidade penal e civil. A vítima ou a própria comunidade poderia se vingar daquele que causou o dano conforme achasse melhor. Já a segunda fase, da Lei das XII Tábuas, é onde há a tipificação dos delitos públicos (crimen) e privados (maleficium). O primeiro gerava pena corpórea e pecuniária, enquanto o segundo, apenas pecuniária. Essa pecúnia é o que atualmente conhecemos como indenização. Essa foi a fase em que foi tipificado o furto, a rapina e o dano iniura. Houve, ainda, a “Lei Poetelia Papiria”, que determinou o fim da responsabilidade corpórea por dívidas. A terceira fase é a da “Lex Aquilia”, em 286 a.C. Nela, é reforçada a ideia de indenização em pecúnia e passa a exigir-se, como elemento fundamental para responsabilização, a valoração do elmento subjetivo da conduta do ofensor (a culpa), sendo um grande marco para a responsabilidade civil. A quarta e última fase do Direito Romano é aquela em que ocorre a estruturação do critério de culpa. A culpa torna-se elemento essencial de definição que separa as responsabilidades civil, penal, contratual e extracontratual. Isso porque cada uma utiliza a culpa de um modo diferente, a exemplo da responsabilidade contratual, que independe totalmente deste critério, utilizando a responsabilidade objetiva. Responsabilidade Civil na Idade Média É importante que se faça, também, uma análise da Responsabilidade Civil na Idade Média. Nesse período, a justiça era totalmente vinculada ao cristianismo. A religião cristã torna-se a única oficial e, por isso, influenciou no modo de pensar o mundo e a própria justiça. Essa justiça cristã auxiliou a estruturar o conceito de culpa, pois a cultura religiosa é extremamente vincula à ideia de vontade. Era essa vontade que guiava a conduta do homem e que podia salvá-lo, e esse foi o conceito que ajudou na responsabilização. Em relação a justiça cristã, vale lembrar de Santo Agostinho. Ele falava da diferença entre a “lei de Deus”, eterna, e a “lei dos homens”, temporal. Os bispos deviam interpretar essa lei de Deus para que, a partir dela, fossem criadas as leis humanas. Em seus textos falava que o mal era o “afastamento da vontade de Deus”, que era pecaminoso e gerava ilícito. A ideia de pecado era, então, totalmente vinculada a de culpa, o que tornava o homem responsável pelas vontades – nessa época, contrárias às de Deus – que exercer. Em resumo, a Idade Média com sua visão de Justiça cristã enxergava o homem como dotado de vontade e, portanto, passível de responsabilização. Além disso, esse período permitiu que se desenvolvesse a noção subjetiva de culpa, vinculada à vontade do cristianismo. Responsabilidade Civil na Modernidade Na modernidade a visão deixa de ser religiosa para tornar-se mais antropocentrista: o ser humano passa a ser o centro do conhecimento. Isso permite um maior desenvolvimento da corrente humanista, baseada na dignidade da pessoa humana como concepção central. Surgem,aqui, os direitos humanos (subjetivos, que decorrem da natureza do homem) com mais fora. O relativismo ganha, também, mais força: os valores passam a ser relativizados. Percebe-se que é possível levantar questionamentos sobre aquilo que o cristianismo defendendo. Surge, então, a liberdade religiosa, permitindo concepções diferentes das cristãs, que com o passar do tempo se transforma em política e econômica. Há, aqui, o movimento de securalização: a igreja se separa do Estado, que se torna laico. Há, então, um fortalecimento da corrente racionalista. A razão se torna o ponto central, vinculando-se à sistematização e ao cientificismo que surgiram com força na modernidade. Cabe, na verdade, uma análise do próprio direito na modernidade. O direito, de um modo geral, passa a ser fundamentado no homem e não mais na ordem divina, baseando-se no antropocentrismo. É aqui que Hobbes cria sua teoria do estado de natureza (homem lobo do homem) e o pacto social (ideia contratualista, que troca liberdade pela segurança estatal). Busca-se, então, segurança e paz. O surgimento dos Estados Nacionais também influencia no direito. Ele passa a ser concentrado no poder soberano do Estado (existindo, porém, divergência sobre quem é esse soberano – o parlamento ou o Rei). A garantia da paz e da segurança cabe ao Estado, que passa a fazê-la a partir da lei escrita e do direito. O direito passa a ser único para todos os súditos, sendo abandonada a pessoalidade (critério que diferia o direito aplicado por diferentes origens e qualidades). Há, ainda, na modernidade, a separação gradativa entre direito, ética e política. É Maquiavel que difere esses três conceitos, mostrando o direito como técnica de manutenção do poder, e não necessariamente como manifestação da ética. Surge, ainda, o jusracionalismo. Kant, com sua teoria do homem como animal racional, diz que é essa racionalidade que dá base à liberdade. A moral e o direito é que servem como limite para os impulsos da ação humana, sendo o direito externo ao homem. O agir irracional e instintivo torna-se contrário ao dever, sendo consequência a responsabilização. É com essa corrente jusracionalista que se inicia a busca por um direito ideal: aquele puramente racional e relacionado à ética e a moral. O direito positivo não tem fundamento na razão, mas ela seria o critério para a positivação do Estado. O direito torna-se mais sistemático e a culpa fornece critério para pensar as ações humanas e a própria responsabilidade civil, que passa a pressupor liberdade e igualdade formal (perante à lei). A responsabilidade civil se baseia no grande princípio do direito obrigacional: a autonomia da vontade. Nas relações privadas, os agentes têm liberdade para estabelecer suas vontades. A culpa é, aqui, a violação ou dano causado dentro dessa autonomia, possuindo um sentido lato sensu (que engloba tanto o dolo quanto a culpa stricto sensu). Essa culpa é o que gera a responsabilização, por se tratar de abuso ou negligência dentro da liberdade. A responsabilidade é um conceito amplo: é o indivíduo que, em sua liberdade, age culposamente. Essa responsabilidade pode ser penal, administrativa, contratual, extracontratual e civil. Debate ético-político contemporâneo A análise deontológica sobre o debate ético-político foi desenvolvida por Kant. Ela é vinculada ao dever-ser, relacionada à razão e mais formalista. Foi a que preponderou na modernidade. Já as análises consequencialistas tiveram Bentham como o grande pensador. O critério do direito, para ele, é a consequência da ação na sociedade, devendo ser buscada a felicidade para o maior número de pessoas. Jhering defende, também, essa análise, mas com uma corrente funcionalista do direito privado, buscando um bem coletivo. Cada uma das citadas se baseia em fundamentos diferentes: a deontólogica em fundamentos formalistas e a consequencialista em fundamentos funcionalistas. Os fundamentos formalistas são aqueles que veem o direito como liberal, baseado na justiça comutativa, na propriedade como direito absoluto e na autonomia da vontade, tendo a responsabilidade como centrada na culpa. Já os fundamentos funcionalistas já veem o direito como social, baseado na justiça distributiva, no funcionalismo econômico, tendo a responsabilidade civil funcionalizada para distribuição (protegendo o mais frágil). Responsabilidade Civil Atualmente, porém, o conceito de sociedade civil é diferente. Ela é o instituto que define as situações em que uma pessoa (devedor) deve responder, através de indenização, pelos danos sofridos por outra pessoa (credor). A responsabilidade civil aloca as consequências de um dano para outra pessoa que não a vítima. O grande critério para isso é a culpa, sendo essa a responsabilização subjetiva. Há, porém, atualmente, a chamada responsabilização objetiva, que independe da culpa, como aquela em que o dano decorre de atividade com riscos inerentes (banco). Pressupostos da Responsabilidade Civil A responsabilidade civil possui alguns pressupostos essenciais. Isso significa que a pessoa só poderá ser responsabilizada se todos esses pressupostos estiverem presentes em sua conduta. a) Dano: é o prejuízo que certa pessoa terá, podendo ser patrimonial ou extrapatrimonial. Ele é a base para estabelecer uma relação de credor e devedor. Existem hoje, porém, aqueles que defendem a responsabilidade civil sem dano, sendo a mera possibilidade (perigo de dano) o suficiente. Seria exemplo a responsabilização por danos ambientais que virão a longo prazo. O dano também pode ser presumido, mas normalmente é provado. Já quando não há dano, percebe-se que a função é mais de desencorajar atitudes do que gerar indenização – como no caso do exemplo ambiental. Em geral, o dano deve ser provado e, portanto, ainda é considerado essencial. b) Nexo causal: é o pressuposto que diz que o dano deve estar ligado ao ato ilícito do ofensor. Esse ato deve ser a causa do prejuízo da vítima. Há, portanto, uma relação de causa e efeito. O fato de não haver responsabilidade civil, porém, não afasta outras responsabilizações, como a penal (ex: bebeu e dirigiu, batendo o carro – mesmo que a culpa seja do outro, ele ainda cometerá crime de trânsito). c) Culpa (responsabilidade subjetiva): A responsabilidade civil é centrada no ato ilícito culposo. O ilícito pode ser geral (age culposamente causando o delito) ou específico (a culpa é presumida). A culpa é o agir doloso (intencionado) ou culposo stricto sensu (negligência ou imperícia). d) Risco (responsabilidade objetiva): O risco está presente nos casos em que não é exigida a avaliação de culpa. O risco, então, é o pressuposto da responsabilização objetiva. Quando há risco anormal inerente a uma atividade, aquele que explora pode ser responsabilizado por quaisquer danos causados. São exemplos os bancos. Isso está no Art 927, parágrafo único. e) Necessidade de um fator de imputação: É um elemento determinado pelo direito que estabelece a imputação da responsabilidade. Toda essa análise é somente um breve resumo, sendo necessária análise mais profunda de cada um desses pressupostos. Esse aprofundamento será feita a seguir. Dano O dano é a lesão ao bem jurídico protegido, que causa responsabilização. Como já dito, hoje fala-se em responsabilização sem dano. 1) Espécies de dano Existem espécies de dano, que se dividem em patrimonial e extrapatrimonial (morais). Os patrimoniais tratam de lesões vinculadas ao patrimônio, enquanto os morais não se vinculam a bens (como imagem e a honra). Conforme o art 402 do Código Civil, o dano patrimonial é uma lesão ao interesse econômico, sendo englobado o dano emergente (o queefetivamente perdeu) e o lucro cessante (o que deixou de ganhar). Há, atualmente, a indenização pela perda de uma chance, sendo uma subclasse do dano emergente: perde-se oportunidade de obter futura vantagem. É como meio caminho entre dano emergente e lucro cessante, na prática, pois o benefício era futuro e aleatório. O valor da indenização deve ser menor do que o lucro cessante. Já o dano extrapatrimonial é uma lesão da personalidade da pessoa, ligados à imagem e honra, por exemplo. Só existe dano moral quando a dignidade é atingida (conforme art 5 da CF). Esse tipo de dano não é suscetível à reparação, mas sim compensação, uma vez que não é possível reintegrá-lo através de pecúnia. O abalo à dignidade não é restaurado, só há uma compensação de outra forma. O dano moral pode ser vinculado ao estético. Nesse caso, pode ser cumulado com dano patrimonial. O dano estético causa desequilíbrio físico na vítima, sendo possível dano moral reflexo (quando a pessoa que sofreu o dano é diferente da que está pleitando). 2) Liquidação do dano A liquidação do dano é a forma de mensurá-lo. Existem alguns critérios para isso no Código Civil. O critério geral está no artigo 944: a indenização mede-se pela extensão do dano, mas o juiz pode reduzi-la se o sujeito teve culpa levíssima (desproporcional ao dano causado). O art 953 fala, ainda, da indenização por injuria, difamação ou calúnia, que consiste em reparação. O art 954 trata da indenização por ofensa à liberdade pessoal (prisão ilegal), que consiste no pagamento por perdas e danos e, se este não puder ser comprovado, na reparação do art 953. Os critérios jurisprudenciais mais utilizados para estabelecer a liquidação do dano são o grau de culpa do ofensor; a situação econômica do ofensor (ex: Mc e seu café – a indenização deve ser alta o suficiente para fazê-lo mudar conduta); natureza, gravidade e repercussão da ofensa (amplitude do dano, relacionado à dignidade da pessoa humana); condições pessoais da vítima (posição social e econômica) e a intensidade do sofrimento da vítima. Tudo isso tem relação com a razoabilidade, a fim de evitar enriquecimento ilícito ou meio coercitivo fraco demais. Há, também, a ideia de equidade vinculada à indenização, tratando igualmente os iguais e de modo desigual os desiguais. 3) Indenização por morte A indenização por morte está prevista no artigo 948 do Código Civil, determinando a pensão em caso de homicídio. Existem alguns critérios para determinar essa pensão: se a vítima possuía até 70 anos, devem ser pagos 2/3 dos preventos; se a vítima for maior de 70 anos, realiza-se uma estimativa vinculada ao possível tempo de vida; se era uma criança que auxiliava na renda familiar, devem ser pagos 2/3 até data em que completaria 25 anos, e metade disso até os 70; se for menor de família com más condições, há presunção de ajuda no valor de um salário mínimo dos 16 aos 25 anos, mesmo que não trabalhasse; se foi um acidente de trabalho os lucros cessantes podem ser pagos em uma só parcela. 4) Pessoa Jurídica A pessoa jurídica pode pedir indenização por danos morais. Isso porque ela possui honra objetiva: reputação, vinculada ao seu bom nome no mercado. O art 52 do CC determina que ela não possui direitos da personalidade, mas sim abalos de crédito decorrentes dos danos morais. A PJ sem fins lucrativos pode pedir indenização por dano institucional. 5) Dano Moral Coletivo (Lei 7347/85) (art. 6, CDC) O dano moral coletivo ocorre quando há agressão a direitos fundamentais difusos, transindividuais. O dinheiro de indenização vai para um fundo de prevenção vinculado ao assunto. O STJ, porém, não considera possível essa indenização. 6) Punitive Damages Os “punitive damages” tentam dissuadir a nova prática do agente, sendo também chamados de teoria do valor do desestímulo. Essa teoria implica que, quanto maior a culpa, maior a indenização. O dano aqui pode ser inclusive social, com atos de conduta reprovável, que prejudicam a sociedade (como danos ao consumidor). Essa é a ideia de função social da indenização, que pode ser fixada além do dano a fim de evitar abusos no mercado. Existem algumas críticas a essa teoria. A primeira delas é que não há previsão legal para esse tipo de punição. Ela também pode gerar enriquecimento ilícito para a parte que sofreu o dano. Por fim, ela afeta o “bis in idem”, gerando duas punições (já que o valor da indenização se altera pelo grau de culpa). Essa teoria, majoritariamente, não é utilizada no Brasil, mesmo que se admita o caráter punitivo da indenização. Ela tem origem americana e, portanto, é muito aplicada nos EUA. Ilícito Cabe, aqui, estudar o ilícito como elemento da responsabilidade. O ilícito é a atuação humana, comissiva ou omissiva, contrária ao direito. Ele é típico da responsabilidade subjetiva. Esse elemento nem sempre está presente nos casos de responsabilidade civil, mesmo que na teoria clássica ele seja central. O ilícito geral está determinado no art. 186. Conforme esse dispositivo comete ato ilícito aquele que, por culpa, causa dano a outro. Essa culpa aqui é lato sensu, englobando dolo e culpa stricto sensu. Há, ainda, o dolo eventual (podia prever o dano, mas não se importa) ou culpa consciente (pode prever o dano e tenta evitá-lo). Aqui entra, também, o abuso de direito (usar ilicitamente um direito, um meio lícito, desviando sua finalidade). Importante analisar aqui o critério da boa-fé objetiva, vinculada à responsabilidade pré e extra-contratual. É exemplo o caso das sementes Cicca, vinculado ao surrectio e venire contra factum proprium. Isso também se vincula ao abuso de direito. Isso porque a boa fé limita o exercício de direitos, como uma ordem de colaboração entre as partes. É ilícito também o exercício de direito contrário a sua função social. Isso significa que um direito deve atender às suas finalidades em sociedade. A propriedade, por exemplo, tem grande função social, a exemplo da patente do coquetel de AIDS. Já o ilícito específico é a contrariedade ao conteúdo expresso na lei. O sujeito age, então, de modo vedado pelo direito. Nexo Causal O nexo de causalidade é aquele que determina que deve haver uma conexão entre o ilícito e o dano. Ele é um dos elementos da responsabilidade civil. Ele baseia-se na ideia de causa e efeito, mas no plano do dever-ser. O principio torna-se a imputação: avalia-se se no plano do ser se o ilícito causou o dano sofrido, mas o direito, no seu dever-ser, imputa limites a essa avaliação a partir das normas. Cabe, aqui, estudar o ilícito como elemento da responsabilidade. O ilícito é a atuação humana, comissiva ou omissiva, contrária ao direito. Ele é típico da responsabilidade subjetiva. Esse elemento nem sempre está presente nos casos de responsabilidade civil, mesmo que na teoria clássica ele seja central. A ideia do nexo de causalidade foi sempre muito vinculada à liberdade. Kant dizia que a causa tem, na verdade, relação com a moralidade (aspecto psicológico). Kelsen também separa o ser do dever-ser, dizendo que o primeiro aborda a causalidade e o segundo está vinculado ao direito e a imputabilidade. Existem algumas teorias de análise do nexo causal. Cabe analisar cada uma delas: a) Teoria da Equivalência dos Antecedentes: foi formulada em 1860 por Von Buri e considera como causa qualquer evento que contribua para o dano e que seja capaz de gerá-lo. Todas as causas são, então, equivalentes e que sem uma delas o dano já seria evitado. Foi a primeira teoria da causalidade, mas não é utilizada no Brasil. b) Teoria da Causa Adequada: foi formulada por Von Kries e procura identifica, na presença de uma possível causa, a que tem potencialidade apta (maisadequada) a produzir o dano. Faz-se, então, um juízo valorativo abstrato para avaliar se aquela causa poderia produzir o dano (formulação hipotética). É baseada na previsibilidade. Ela tem duas correntes: positiva (é causa sempre que se possa prever o dano como consequência natural) e negativa (só se afasta a causa se, dano sua natureza, não se poderia prever que geraria o dano). Alguns juristas acreditam que essa seja a teoria utilizada no Brasil. c) Teoria do Dano Direto e Imediato: procura verificar se a causa, no caso concreto, foi a necessária ao resultado, operando por si só. A grande diferença da anterior é que faz uma análise mais vinculada ao ser. É exemplo o dispositivo que determina que “o devedor só responde por danos que são consequência necessária do ato ilícito”. É, então, a mais utilizada no Brasil, conforme o art. 403 do CC, mesmo que seja especificamente para responsabilidade contratual. Existem, ainda, teorias que falam de concausas. É importante estudá-las, pois podem levar ao rompimento do nexo. a) Causalidade alternativa: é aquela em que mais de uma causa pode ter gerado aquele dano. As causas são suficientes para gerar nexo de causalidade. É exemplo um caso com responsabilidade de vários autores. b) Causas Preexistentes e concomitantes: as pré-existentes não eliminam a relação causal, e são exemplos as condições peculiares da vítima. Já as concomitantes ocorrem simultaneamente ao fator gerador do dano e também não eliminam o nexo. c) Causas Supervenientes: Não eliminam o nexo causal, de modo geral. Existem casos, porém, em que esse se rompe, devido à teoria da causa adequada. d) Concorrência de culpa: ocorre quando o agente e o lesado concorrem para o resultado danoso. É exemplo o acidente de trânsito em que um está em alta velocidade e o outro passa o sinal vermelho. O art 945 determina que, se a vítima tiver concorrido culposamente, sua indenização será fixada tendo em conta a gravidade, estabelecendo uma porcentagem. Ela não exclui, porém, o nexo causal, sendo diferente da culpa exclusiva. e) Excludentes do nexo causal: São capazes de excluir o nexo causal a culpa exclusiva da vítima; a culpa de terceiro; o caso fortuito (evento imprevisível e evitável) ou força maior (evento previsível e inevitável). Existem, ainda, casos diferenciados para o consumidor, pois não há excludente de caso fortuito, havendo divergência na doutrina. Imputabilidade A imputabilidade diz respeito às condições pessoais que dão ao agente a capacidade de poder responder pelos resultados de sua conduta. Não responde pelo ato aquele que, no momento da prática, estava incapacitado de entender ou querer praticar o ato. É exemplo de inimputável o incapaz. Os incapazes são responsáveis de modo subsidiário, conforme o Art. 928, só respondendo se os responsáveis não puderem fazê-lo. Além disso, a indenização não pode ser cobrada se privar o incapaz ou seus responsáveis de suas necessidades. Ela deve, então, ser estabelecida de forma equitativa. Importante falar ainda da questão do deficiente: com o novo estatuto ele, em geral, não é incapaz, mas há divergências sobre o entendimento de sua responsabilização, prevalecendo a ideia relativa ao tipo e grau de deficiência (dependendo da condição do deficiente).
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