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1 O Equilíbrio dos Indicadores do Balanced Scorecard: Um Estudo em Empresas Cearenses Autoria: Eduardo Santos Galas, Vera Maria Rodrigues Ponte Resumo A busca de maior eficácia na implementação das estratégias de ampliação das vantagens competitivas tem levado as empresas a adotar instrumentos de gestão que propiciem melhoria de desempenho. O Balanced Scorecard (BSC) tem demonstrado ser um desses instrumentos. Baseado em indicadores financeiros e não-financeiros, o BSC necessita que seus indicadores reflitam o equilíbrio entre os objetivos de curto e os de longo prazo, entre medidas financeiras e não-financeiras, entre indicadores de tendência e de ocorrência e entre as perspectivas interna e externa. Necessita, também, de eficientes mecanismos de alimentação dos indicadores, de modo a refletir a situação da empresa. Com o objetivo de verificar se esses requisitos estão sendo atendidos, realizou-se uma pesquisa exploratória, por meio de um estudo de caso múltiplo em cinco empresas cearenses que implantaram o BSC. Os resultados mostram que os critérios de equilíbrio – número de indicadores; distribuição dos indicadores nas perspectivas externa e interna; financeiros e não-financeiros; de curto e longo prazo; e indicadores de tendência e ocorrência – não são observados nas empresas estudadas. Mostram também que os indicadores são alimentados manualmente e de forma eficiente. Introdução As organizações contemporâneas estão inseridas em um mundo cada vez mais competitivo, no qual produtos e serviços são rapidamente transformados em commodities, reduzindo, assim, os seus diferenciais competitivos. Isso tem levado as empresas a buscar instrumentos de gestão estratégica que garantam a manutenção de suas vantagens competitivas. Além disso, o aumento da importância dos ativos intangíveis é outro fator que tem reforçado a necessidade desses novos instrumentos de gestão. Na era industrial predominavam sistemas de controle financeiro cujo objetivo era facilitar e monitorar a eficiente alocação de capital físico e financeiro, ou seja, dos ativos tangíveis, para a obtenção de vantagens competitivas. Com o advento da era da informação, no entanto, a eficiente alocação desses ativos mostra-se insuficiente para obter e manter essa vantagem. A gestão dos ativos intangíveis tornou-se, dessa forma, mais decisiva para a competitividade das empresas do que a gestão dos ativos tangíveis. Diante desse quadro e, ainda, por não demonstrar a capacidade das empresas de criação de valor econômico para o futuro, os instrumentos de gestão baseados, exclusivamente, em indicadores contábeis e financeiros tornaram-se obsoletos. Surgiram, então, outros instrumentos de gestão que levam em conta esses fatores e visam dar maior competitividade às empresas. Um desses instrumentos é o Balanced Scorecard (BSC). Criado por Kaplan e Norton (1997, p.2), o BSC complementa o planejamento, na medida em que “traduz a missão e as estratégias das empresas num conjunto abrangente de medidas de desempenho que serve de base para um sistema de medição e gestão estratégica”, possibilitando, dessa forma, o acompanhamento e a avaliação das estratégias, o que contribui para o aumento das vantagens competitivas das empresas. O BSC despertou as empresas para a necessidade de avaliar a implementação das estratégias, rapidamente passando a ser utilizado em todo o mundo. Estudo realizado por Bain & Company, em 1999, revelou que 55% das empresas americanas e 45% das empresas européias utilizam o BSC (KAPLAN e NORTON, 1999 apud GUILHERME e GOLDSZMIDT, 2003). As empresas brasileiras também estão, cada vez mais, implantando o 2 BSC. Uma única empresa de consultoria já orientou a implantação do instrumento em 45 companhias brasileiras (SYMNETICS, 2003). O BSC baseia-se em um conjunto de indicadores que, segundo Kaplan e Norton (1997, p. VIII), deve refletir o “equilíbrio entre os objetivos de curto e longo prazo, entre medidas financeiras e não-financeiras, entre indicadores de tendência e de ocorrência e entre as perspectivas interna e externa de desempenho”. Esse equilíbrio permite às empresas o acompanhamento de seu desempenho financeiro, ao tempo em que fazem o monitoramento da construção de capacidades e da aquisição dos ativos intangíveis necessários para a manutenção e aumento dos níveis de competitividade no futuro. Outra característica dos indicadores do BSC é que eles devem estar alinhados com a estratégia da empresa. Ou seja, não é apenas a criação de um conjunto de medidas financeiras e não-financeiras que indica a implantação do BSC na organização, sendo necessário que eles estejam de acordo com alguns preceitos definidos pelos dois autores. Além de servirem para articular a estratégia da empresa, os indicadores do BSC são utilizados, também, para “comunicar essa estratégia e para ajudar a alinhar iniciativas individuais, organizacionais e interdepartamentais, com a finalidade de alcançar uma meta comum” (KAPLAN e NORTON, 1997, p. 25). Nesse contexto, as empresas deparam-se com um problema: a necessidade de definir indicadores adequados com os requisitos do BSC: que traduzam a visão, a missão e a estratégia da empresa; que estejam equilibrados entre medidas de ocorrência e vetores de tendência, entre objetivos de curto e de longo prazo e que indiquem os resultados financeiros e não-financeiros da empresa; que representem a cadeia de causa e efeito para o desempenho organizacional; e que estejam distribuídos nas quatro perspectivas do BSC. Além da definição dos indicadores, há questões relacionadas à operacionalização e utilização: A coleta será manual ou informatizada? Os processos estão preparados para oferecer as informações necessárias? Que nível hierárquico utilizará, que área da empresa, com que finalidade? Essas são algumas indagações que surgem na implantação do BSC. Diante do exposto, percebe-se que a correta seleção e operação dos indicadores contribui significativamente para o sucesso na implementação do BSC na empresa. Com base nessa afirmação, foi feita uma pesquisa exploratória com o objetivo de verificar se os critérios e orientações propostos por Kaplan e Norton sobre os indicadores do BSC são observados pelas empresas que o implantaram. São objetivos específicos deste estudo verificar: 1) se há um equilíbrio entre os indicadores de curto e os de longo prazo, entre as medidas financeiras e as não-financeiras, entre os indicadores de tendência e os de ocorrência e entre as perspectivas interna e externa; e 2) se a alimentação dos indicadores se dá de maneira eficiente. A população utilizada para essa pesquisa abrange as empresas cearenses que implantaram o BSC. Dois pressupostos nortearam essa pesquisa: 1) as empresas que implantaram o BSC possuem um conjunto de indicadores que reflete as orientações dos autores do modelo; e 2) a alimentação do conjunto de indicadores não vem sendo feita eficientemente, prejudicando a sua utilização e seus resultados. Este texto encontra-se organizado da seguinte maneira: no item 1 é apresentado o referencial teórico sobre BSC, enfatizando os aspectos relacionados aos indicadores de desempenho; o item 2 traz a metodologia da pesquisa; o item 3 reúne os resultados da pesquisa; e, por fim, vêm as conclusões. 1. O Balanced Scorecard e seus Indicadores de Desempenho O BSC é uma ferramenta empresarial que traduz a missão e a estratégia da organização por meio de um conjunto coerente de medidas de desempenho, que propicia a formação de uma estrutura de medição estratégica e de um eficiente sistema de gestão. Trata- 3 se de uma metodologia que liga as atividades de curto e as de longo prazo com a visão, a missão e a estratégia da empresa, mediante estabelecimento de metas mensuráveis. Além disso, ele cria uma estrutura, uma linguagem para comunicar a missão ea estratégia, e utiliza indicadores para informar os funcionários sobre os vetores do sucesso atual e futuro (KAPLAN e NORTON, 1997). Enfatizando a importância do BSC para as empresas, Kimura e Suen (2003) colocam que por meio dele é possível identificar o desempenho empresarial considerando os resultados de rentabilidade e custos, assim como os indicadores de atendimento das necessidades dos clientes, de eficiência de processos internos e de potencial de aprendizado e crescimento da organização. As medidas de desempenho utilizadas pelo BSC distribuem-se em quatro perspectivas diferentes e representam a estrutura do modelo, conforme mostra a Figura 1. São elas: financeira, do cliente, dos processos internos e do aprendizado e crescimento. VISÃO E ESTRATÉGIA VISÃO E ESTRATÉGIA FINANCEIRAFINANCEIRA •Objetivos •Indicadores •Metas •Iniciativas •Objetivos •Indicadores •Metas •Iniciativas APRENDIZADO E CRESCIMENTOAPRENDIZADO E CRESCIMENTO •Objetivos •Indicadores •Metas •Iniciativas •Objetivos •Indicadores •Metas •Iniciativas CLIENTECLIENTE •Objetivos •Indicadores •Metas •Iniciativas •Objetivos •Indicadores •Metas •Iniciativas PROCESSOS INTERNOSPROCESSOS INTERNOS •Objetivos •Indicadores •Metas •Iniciativas •Objetivos •Indicadores •Metas •Iniciativas Perspectivas Externas Perspectivas Internas Figura 1. Estrutura do Balanced Scorecard. Fonte: KAPLAN e NORTON (1997, p. 10), adaptado pelos autores Segundo os dois autores, a perspectiva financeira sintetiza as conseqüências econômicas imediatas das ações realizadas. Isto é, os indicadores dessa perspectiva indicam se a estratégia de uma empresa, sua implementação e execução estão contribuindo para a melhoria dos resultados financeiros. Dessa forma, as outras três perspectivas têm como foco os objetivos financeiros definidos na perspectiva financeira. Qualquer medida selecionada deve fazer parte de uma cadeia de relações de causa e efeito que culmina com a melhoria do desempenho financeiro. Os indicadores da perspectiva financeira dependem da fase do ciclo de vida em que se encontra a empresa ou unidade de negócios. Kaplan e Norton (1997) consideram três fases: crescimento, onde os níveis de investimento são elevados; sustentação, momento em que se espera o retorno do capital investido; e colheita, caracterizada pela maximização do fluxo de capital. O Quadro 1 detalha as características e objetivos financeiros das empresas em cada uma das três fases. 4 Fase Características Objetivos Financeiros Crescimento • Investimentos elevados em infra-estrutura • Criação/consolidação dos processos internos • Desenvolvimento de base de clientes • Velocidade de crescimento da receita (aumento das vendas) em mercados previamente determinados Sustentação • Retorno sobre o capital investido • Investimento visando basicamente à melhoria contínua dos processos internos • Ampliação gradual da capacidade de produção • Lucratividade • Aumento da receita operacional e da margem bruta • Aumento da razão entre a receita contábil e o capital investido • Aumento do valor econômico agregado Colheita • Colheita dos investimentos realizados nas etapas anteriores • Realização de investimentos somente para manter os equipamentos e capacidades existentes ou com retorno rápido e certo • Redução de despesas com pesquisa e desenvolvimento • Maximização dos fluxos de caixa • Diminuição da necessidade de capital de giro Quadro 1. Características e objetivos financeiros nas três fases do ciclo de vida. Fonte: Hernandes et al (2000). Nas organizações governamentais e naquelas sem fins lucrativos, no entanto, a perspectiva financeira representa uma limitação, não um objetivo. Ela não é o foco das outras perspectivas, uma vez que os indicadores financeiros não demonstram se a organização está cumprindo sua missão. O que indica isso é a satisfação dos clientes (NIVEN, 2004), ou seja, da sociedade. A perspectiva do cliente passa, nesse caso, a ser o foco das outras perspectivas, e o sucesso delas passa a ser medido pelo grau de eficácia e eficiência com que atendem às necessidades de seus participantes, e não pelo desempenho financeiro (KAPLAN e NORTON, 1997, p. 188-189). A perspectiva do cliente possibilita a identificação dos segmentos de clientes e mercados nos quais atuará a organização, bem como das medidas de desempenho da organização nos ditos segmentos. Nessa perspectiva geralmente constam medidas essenciais que indicam se uma estratégia foi bem formulada e bem implementada, tais como nível de satisfação do cliente, índice de retenção do cliente, aquisição de novos clientes, lucratividade dos clientes e participação nos segmentos-alvo (Quadro 2). Mas deve, também, conter “medidas específicas das propostas de valor que a empresa oferecerá aos clientes desses segmentos” (KAPLAN e NORTON, 1997, p. 26), tais como rapidez da produção e pontualidade das entregas e fluxo constante de produtos e serviços inovadores. Essas medidas específicas representam os fatores críticos para que os clientes mudem ou permaneçam fiéis à empresa e que, segundo os autores, geralmente relacionam-se com tempo de resposta, qualidade e preço do produto ou serviço. Participação de mercado Reflete a proporção de negócios num determinado mercado (em termos de clientes, valores gastos ou volume unitário vendido) Captação de clientes Mede, em termos absolutos ou relativos, a intensidade com que uma unidade de negócios atrai ou conquista novos clientes ou negócios Retenção dos clientes Controla, em termos absolutos ou relativos, a intensidade com que uma unidade de negócios retém ou mantém relacionamentos contínuos com seus clientes Satisfação dos clientes Mede o nível de satisfação dos clientes segundo critérios específicos de desempenho dentro da proposta de valor Lucratividade dos clientes Mede o lucro líquido de clientes ou segmentos, após deduzidas as despesas específicas necessárias para sustentar esses clientes Quadro 2. Medidas essenciais da perspectiva do cliente. Fonte: Kaplan e Norton (1997, p. 72). Fazendo uma ligação com a perspectiva financeira, numa relação de causa e efeito, “a perspectiva do cliente permite que os gerentes das unidades de negócios articulem as 5 estratégias de clientes e mercados que proporcionarão maiores lucros financeiros futuros” (KAPLAN e NORTON, 1997, p. 27). A perspectiva dos processos internos possibilita a identificação dos processos internos críticos para a organização, a qual, por isso, deve-se ter excelência. As medidas dessa perspectiva, portanto, estão voltadas para aqueles processos que possibilitam atrair e reter clientes em segmentos-alvo de mercado e satisfazer as expectativas dos acionistas em relação a retornos financeiros. As abordagens tradicionais de medição de desempenho buscam o monitoramento e a melhoria dos processos existentes. O BSC possibilita, ainda, a identificação de novos processos críticos para o alcance dos objetivos financeiros e do cliente, ou seja, para o sucesso da estratégia da empresa. Kaplan e Norton (1997, p. 98) assinalam que “a derivação [da estratégia] de objetivos e medidas para a perspectiva dos processos internos é uma das principais diferenças entre o balanced scoercard e os sistemas tradicionais de medição de desempenho”. A quarta e última perspectiva do BSC, a do aprendizado e crescimento, trata da infra- estrutura da empresa, visando ao crescimento e melhoria a longo prazo. Enfatizando a importância da infra-estrutura da empresa em um quadro de intensa competição nos dias de hoje e para o futuro, Kaplan e Norton (1997, p. 29) consideram “improvável que as empresas sejam capazes de atingir suas metas de longoprazo para clientes e processos internos utilizando as tecnologias e capacidades atuais". Os objetivos financeiros, os do cliente e os dos processos internos somente serão atingidos se a empresa possuir uma infra-estrutura que apóie esses objetivos e que provenha das pessoas, sistemas e procedimentos organizacionais. Entretanto, nem sempre as capacidades da infra-estrutura estão adequadas aos objetivos estabelecidos. No BSC essa adequação é feita com os objetivos da perspectiva do aprendizado e crescimento, isto é, com o investimento em capacitação dos empregados, com a melhoria da tecnologia da informação e com o alinhamento dos procedimentos e rotinas organizacionais (KAPLAN e NORTON, 1997). Kaplan e Norton (1997, 2000) afirmam, no entanto, que apenas a utilização de indicadores financeiros e não-financeiros não basta para medir o desempenho da empresa, sendo necessário que eles estejam articulados numa relação de causa e efeito e que se reforcem mutuamente. Considerando a estratégia um conjunto de hipóteses sobre causas e efeitos, os autores orientam, ainda, que o conjunto de indicadores do BSC deve explicitar as relações (hipóteses) entre os objetivos e as medidas nas diversas perspectivas, para possibilitar o gerenciamento e a validação dessas relações. Essas hipóteses são, então, explicitadas em um diagrama que auxilia as organizações a visualizar suas estratégias de maneira coesiva, integrada e sistemática. Nesse diagrama, que os autores denominaram mapa estratégico, cada indicador do Balanced Scorecard se converte em parte integrante de uma cadeia lógica de causa e efeito que conecta os resultados almejados da estratégia com os vetores que induzirão a essas conseqüências. O mapa estratégico descreve o processo de transformação de ativos intangíveis em resultados tangíveis para os clientes e, por conseguinte, em resultados financeiros (KAPLAN e NORTON, 2000, p. 81). Em relação à implantação do BSC, Epstein e Manzoni (1998) afirmam tratar-se de um processo difícil, porque significa introduzir uma mudança na organização, e mudanças afetam a disponibilidade de informações relacionadas ao desempenho organizacional, o que pode representar uma ameaça ao processo, principalmente se houver mudança no equilíbrio do poder na organização. Os autores afirmam que sistemas de medição mal projetados e a dificuldade de implantá-los são as duas principais razões de falhas na implementação do BSC. 6 Vários executivos concordam com a afirmativa desses autores de que a implantação do BSC “não é tão simples quanto parece” (KAPLAN e NORTON, 1997, p. 297). Schneiderman (1999) reforça a tese de que o BSC implica mudança organizacional, e acrescenta que as organizações somente mudam quando empregados compartilham a propriedade das metas e dos meios. Para ele, no entanto, são seis as razões para a maioria das falhas na implementação do BSC. Duas delas relacionam-se aos indicadores de desempenho: (1) as variáveis independentes (não-financeiras) são identificadas incorretamente como direcionadores primários da satisfação futura dos stakeholders; e (2) as medidas são mal definidas. A primeira razão ocorre porque os requerimentos de stakeholders não-proprietários, como empregados, clientes, fornecedores, comunidades e até futuras gerações, dificultam a identificação das medidas com maior peso para a organização, ou seja, as medidas financeiras. A segunda ocorre em decorrência da falta de experiência em definir medidas não- financeiras. Schneiderman (1999) entende que as medidas de resultados são mais úteis aos gerentes, enquanto as de processos são mais utilizadas pela equipe de melhoria, por permitir a identificação dos pontos onde as melhorias terão maior impacto. Ainda segundo esse autor, as boas medidas são aquelas que: (a) são uma procuração confiável para a satisfação dos stakeholders; (b) são orientadas para fraquezas ou defeitos (ideal que tenha valor zero) e avaliação contínua; (c) são simples e fáceis de entender; (d) têm definição operacional bem documentada, precisa, consistente, apropriadamente regulada e metrologicamente sólida; (e) são oportunas e acessíveis para aqueles que podem usá-las melhor; (f) são ligadas ao sistema de dados, o que facilita a identificação das causas centrais das lacunas nos resultados do scorecard; e (g) têm um processo formal para revisão e refinamento contínuos. Ainda sobre o processo de implantação do BSC, Roest (1997) apresenta alguns pontos fundamentais, denominados “regras de ouro”, a serem observados na implementação do BSC: (1) não há uma solução-padrão: todas as empresas são diferentes; (2) é essencial o apoio da alta administração; (3) a estratégia é o ponto de partida; (4) os objetivos e medidas devem ser limitados e equilibrados, porém, relevantes; (5) o intervalo de tempo entre análise e implementação não deve ser muito longo nem muito curto; (6) deve-se adotar abordagens top- down e bottom-up; (7) o BSC sugere forte ligação entre sistemas de informação e medição do desempenho; (8) deve-se considerar os sistemas de comunicação como ponto de partida; (9) deve-se considerar o efeito dos indicadores de desempenho no comportamento; e (10) nem todas as medidas podem ser quantificadas. De acordo com Olve, Roy e Wetter (2001, p. 53), o processo de construção do BSC pode ser estruturado em onze etapas. A sexta etapa corresponde a “desenvolver medidas, identificar as causas e os efeitos e estabelecer um equilíbrio”, ou seja, corresponde ao estabelecimento dos indicadores do BSC. Os autores ensinam que “o grande desafio é encontrar relações claras de causa e efeito e criar um equilíbrio entre as diferentes medidas nas perspectivas selecionadas [...] de modo que as melhorias de curto prazo não entrem em conflito com os objetivos de longo prazo” (OLVE, ROY e WETTER, 2001, p. 75-76). Guilherme e Goldszmidt (2003) fizeram uma revisão de literatura com o objetivo de identificar os fatores críticos na implementação e uso do BSC, mostrando que alguns desses fatores estão relacionados aos indicadores: A comunicação e a disseminação dos indicadores mostram-se dependentes de forma significativa da eficácia dos sistemas de informação que, em geral, apresentam limitações quanto aos indicadores de desempenho não-financeiro do BSC. Dessa forma, os sistemas de informação tornam-se um fator crítico importante a ser considerado. Stivers e Joyce (2000:28), baseados em sua experiência e em uma revisão de literatura citam como uma das importantes lições para a implementação de um sistema de gestão do desempenho balanceado a obtenção dos indicadores corretos. 7 [...] Rousseau e Rousseau (2000) incluem, dentre os riscos potenciais para a aplicação do Balanced Scorecard, a “síndrome do equilíbrio ou melhor prática”, em que após identificar a ineficiência de seu sistema de medição de desempenho, a organização simplesmente acrescenta indicadores não financeiros, sem o necessário foco estratégico [...] [...] Kaplan (1999) cita como forma de um projeto inadequado do BSC o uso de poucos indicadores, o que leva a não alcançar um equilíbrio entre os resultados desejados e os condutores de desempenho desses resultados. Em outros casos, são utilizados indicadores em demasia, dando-se pouca atenção aos efetivamente relevantes; ou a empresa não consegue identificar os condutores adequados aos resultados desejados. Indagados acerca da quantidade ideal de indicadores e de sua melhor distribuição entre as diferentes perspectivas, Kaplan e Norton (2000) responderam que um BSC possui de 20 a 25 indicadores, distribuídos da seguinte forma: perspectiva financeira – 5 indicadores (22%); perspectiva do cliente – 5 indicadores (22%); perspectiva dos processos internos – 8 indicadores (34%); e perspectiva de aprendizado e crescimento – 5 indicadores (22%). Referiram ainda queuma pesquisa realizada por Best Practices, em 1998, com 22 organizações que haviam implementado o BSC com sucesso encontrou mais ou menos a mesma distribuição. Ainda segundo esses autores, aproximadamente 80% dos indicadores devem ser não-financeiros. Segundo Olve, Roy e Wetter (2001), o número de indicadores depende do nível em que as medidas vão ser utilizadas, podendo variar de acordo com o nível em que o BSC é implantado (corporativo/divisão). Os autores constataram, no entanto, que habitualmente as empresas utilizam de 15 a 25 indicadores no nível corporativo e de 10 a 15 no nível divisional. Quanto mais baixo na hierarquia, menor a quantidade de indicadores utilizados. Alertam, no entanto, que “o fato de apenas se colocar algumas medidas no papel não nos dará um balanced scorecard” (OLVE, ROY e WETTER, 2001, p. 129). Os números propostos por Niven (2002) se aproximam desses propostos por Olve, Roy e Wetter (2001). Segundo ele, a chave para determinar o número de indicadores de desempenho consiste em assegurar a adequada descrição da estratégia ao longo das quatro perspectivas do BSC. Esse autor coloca, contudo, que espera a seguinte distribuição de medidas em BSC de alto nível: perspectiva financeira – 3 ou 4 indicadores; perspectiva do cliente – 5 a 8; perspectiva dos processos internos – 5 a 10; e perspectiva do aprendizado e crescimento – 3 a 6; o que perfaz um total entre 16 e 28 indicadores. Acerca de indicadores, Niven (2002) acrescenta, ainda, que a perspectiva do cliente tende a ter um grande número de indicadores de tendência e que a tecnologia tem proporcionado um aumento na quantidade de indicadores, a qual pode chegar a centenas e, até mesmo, a milhares. Sobre a proporção de indicadores de tendência em relação aos de ocorrência, esse autor assinala que freqüentemente tem-se uma relação de um para um, podendo chegar a uma relação de dois para um. 2. Metodologia da Pesquisa O presente estudo caracteriza-se como uma pesquisa qualitativa exploratória e descritiva. Exploratória, porque visa levantar questões e hipóteses para futuros estudos, e descritiva, porque se propõe descrever os fatos e fenômenos de determinada realidade. Segundo Gil (1994), a pesquisa exploratória tem como objetivo proporcionar maior familiaridade com o problema, com vistas a torná-lo mais explícito ou a construir hipóteses para estudos futuros. Pode-se dizer que essas pesquisas têm como principal objetivo o aprimoramento de idéias ou a descoberta de intuições. Ainda segundo o autor, a pesquisa 8 descritiva busca, primordialmente, descrever as características de determinado fenômeno e estabelecer possíveis relações entre variáveis. Os procedimentos metodológicos adotados seguiram o ciclo da pesquisa social apresentado por Minayo (1994). A autora divide esse ciclo em três fases: exploratória, trabalho de campo e análise ou tratamento do material. A escolha do tema da pesquisa ocorreu em virtude de um dos pesquisadores ter participado de um processo de implantação de um modelo de gestão estratégica baseado no BSC, despertando, assim, o interesse de estudar mais aprofundadamente o tema. Com vistas ao delineamento do objeto de estudo e construção do marco teórico, foram realizadas pesquisas bibliográfica e documental. A pesquisa bibliográfica constitui etapa importante da pesquisa, por ser “um apanhado geral sobre os principais trabalhos já realizados, revestidos de importância por serem capazes de fornecer dados atuais e relevantes sobre o tema” (LAKATOS e MARCONI, 1999, p. 27). A pesquisa de campo foi feita por meio de um estudo de caso múltiplo. De acordo com Yin (1994), o estudo de caso possibilita a investigação profunda de uma ou mais organizações, com o objetivo de testar a validade das hipóteses ou questões de pesquisa construídas a partir de um referencial teórico. Como instrumento de coleta dos dados, utilizou-se um questionário estruturado, aplicado aos “arquitetos” do BSC das empresas, ou seja, às pessoas responsáveis pela implantação e manutenção do sistema. Para a validação do questionário, foi procedido um pré-teste em uma das empresas da população. O questionário continha onze perguntas de múltipla escolha e um conjunto de seis perguntas para cada uma das quatro perspectivas do BSC, sendo quatro numéricas – para identificação das quantidades de indicadores nas características estudadas – e duas de escala de Likert – para avaliação da eficiência dos mecanismos de coleta de dados para os indicadores e do alinhamento dos indicadores com a estratégia da empresa. A última etapa da fase exploratória da pesquisa corresponde à exploração do campo. Essa etapa contempla as seguintes atividades: escolha do espaço da pesquisa, escolha do grupo de pesquisa, estabelecimento dos critérios de amostragem e estabelecimento de estratégia de entrada em campo. A população da pesquisa foi delimitada a partir de levantamento junto a uma empresa de consultoria que orienta a implantação do BSC no Ceará e junto à Federação das Indústrias do Estado do Ceará (FIEC). Ao todo, sete empresas cearenses o implantaram. Como estratégia de entrada em campo, adotaram-se visitas e envio dos questionários via e-mail. A segunda etapa do ciclo da pesquisa corresponde ao trabalho de campo. Essa etapa representa uma fase essencial da pesquisa qualitativa, pois é o momento do encontro entre o teórico e o empírico. Foi realizada em dezembro de 2003 e janeiro de 2004. Como resultado dessa fase, obteve-se uma amostra formada por cinco empresas, sendo que três responderam o questionário por e-mail e duas por meio de visitas. A sexta empresa foi descartada em virtude de o BSC encontrar-se em implantação. A última também foi excluída devido à impraticabilidade de contato com os responsáveis pelo BSC durante a pesquisa. Na fase da análise ou tratamento do material, realizou-se a tabulação por meio da planilha eletrônica Excel. Para a análise dos dados, os resultados foram distribuídos em duas categorias empíricas: (1) o perfil das empresas e informações gerais sobre o BSC; e (2) as características dos indicadores de desempenho dentro das quatro perspectivas do BSC. Foram ainda utilizados alguns recursos estatísticos, como média aritmética e correlação de Pearson, mas tão-somente para reforçar as evidências dos dados, uma vez que o pequeno tamanho da amostra inviabilizou a adoção dos procedimentos metodológicos próprios de uma pesquisa quantitativa. 9 A análise do nível de equilíbrio dos indicadores foi procedida com base nos critérios apresentados no Quadro 3. Ressalte-se que o terceiro critério foi definido com base no segundo, e que o quinto foi definido com base na coerência desse critério em relação ao sexto. Nº Característica do BSC Critério de equilíbrio Fonte 1 Número de indicadores 20 a 25 Kaplan e Norton (2000) 2 Proporção de indicadores nas perspectivas Financeira – 22% Clientes – 22% Processos Internos – 34% Aprendizado e Crescimento – 22% Kaplan e Norton (2000) 3 Perspectivas externas / internas Perspectivas externas – 44% Perspectivas internas – 56% Os autores 4 Financeiro / Não-financeiro Financeiros – 20% Não-financeiros – 80% Kaplan e Norton (2000) 5 Curto prazo / Longo prazo Um de curto prazo para dois de longo prazo Os autores 6 Ocorrência / Tendência Um de ocorrência para dois de tendência Niven (2002) Quadro 3. Critérios de avaliação de equilíbrio. Fonte: Elaborado pelos autores. 3. Resultados da Pesquisa A apresentação dos resultados da pesquisa foi dividida em duas partes: (1) perfil das empresas estudadas e informações gerais sobre o BSC; e (2) indicadores de desempenho segundo cada uma das perspectivas do BSC. 3.1 As Empresas Estudadas e o BSC A população estudada compõe-se de empresas privadas de médio e de grande porte, sendo quatroindustriais e uma de serviços. As industriais pertencem aos setores têxtil, de construção (duas) e de bebidas, enquanto a de serviços atua nos ramos de hotelaria, alimentação e eventos. Todas implantaram o BSC há pouco tempo, mais precisamente nos anos 1999, 2000 (duas), 2002 e 2003. O BSC encontra-se em funcionamento, e os indicadores já foram analisados, revistos e divulgados pelo menos uma vez. Essa divulgação se deu apenas internamente; os stakeholders externos não têm conhecimento dos resultados obtidos. Quatro das cinco empresas estudadas informaram que todos os empregados têm acesso às informações acerca dos indicadores. Em apenas uma o acesso é restrito à alta gerência e às gerências intermediárias. Uma delas informou que os empregados têm acesso às informações dos indicadores, mas a empresa não adota como procedimento rotineiro comunicar os resultados desses indicadores aos empregados. Buscou-se verificar os graus de confiança que os responsáveis pelo BSC têm nos dados que alimentam os indicadores. Para tanto, utilizou-se uma escala de Likert variando de um (pouco confiável) a quatro (totalmente confiável). O resultado foi um elevado nível de confiança; obteve-se 3,6 em média, sendo que três empresas informaram confiar totalmente. Ainda utilizando-se da escala de Likert, buscou-se identificar o grau de relacionamento de causa e efeito que os indicadores possuem, obtendo-se uma média de 3,6, considerada elevada. 3.2 Indicadores da Perspectiva Financeira Na perspectiva financeira, as empresas trabalham principalmente com indicadores de curto prazo. Uma empresa informou que possui exclusivamente indicadores de longo prazo, enquanto duas delas informaram a existência de indicadores de longo e curto prazo. Nestas últimas, registra-se uma relação de dois indicadores de curto prazo para um de longo prazo. Com relação aos indicadores de curto prazo, registra-se média de 5,8, contra 2 de longo prazo, demonstrando que as empresas possuem apenas visão de curto prazo ou seus indicadores não 10 estão alinhados com a visão. Vale ressaltar que a visão “estabelece um destino a ser alcançado, [...] é onde e como a organização espera estar no futuro” (FORTE, PEREIRA e AQUINO, 2003, p. 5). Nessa perspectiva, geralmente os indicadores são financeiros, o que ocorreu em quatro das cinco empresas pesquisadas, as quais não apresentaram indicador não-financeiro. Apenas uma empresa apresentou quantidades aproximadas desses dois tipos de indicador: cinco financeiros e seis não-financeiros. A grande maioria dos indicadores apresentados nessa perspectiva foi de ocorrência, com uma média de 5,6, contra apenas 2,2 de tendência; duas empresas apresentaram quantidades aproximadas desses tipos de indicador. Observou-se uma forte correlação positiva (+0,7632) entre a diferença nas quantidades de indicadores de curto e de longo prazo e a diferença nas quantidades de indicadores de ocorrência e de tendência, demonstrando que se a empresa está medindo mais o passado (ocorrência), o máximo que ela chega a medir é o curto prazo. A alimentação dos indicadores dessa perspectiva se dá basicamente pelo processo manual. Apenas duas empresas informaram utilizar um processo automático de alimentação. Entretanto, os mecanismos de coleta de dados para alimentar esses indicadores foram considerados eficientes por todas as empresas estudadas, obtendo-se uma eficiência média de 3,4 numa escala de Likert variando de um (ineficiente) a quatro (muito eficiente). Em média, as empresas estão trabalhando com 8 indicadores para a perspectiva financeira, sendo que duas delas utilizam apenas três indicadores (mais próxima das recomendações dos idealizadores do BSC). O grau de alinhamento desses indicadores com a estratégia da empresa foi considerado elevado; obteve-se um grau médio de 3,4 numa escala de Likert variando de um (desalinhado) a quatro (totalmente alinhado). Em suma, nos indicadores da perspectiva financeira nas empresas estudadas predominam as seguintes características (Gráfico 1): são de curto prazo, financeiros e de ocorrência, isto é, voltados para o registro de informações passadas; seus mecanismos de coleta dos dados apresentam alto grau de eficiência, apesar de alimentados manualmente no sistema, não havendo integração com outros sistemas informatizados; e são altamente alinhados com a estratégia da empresa. PERSPECTIVA FINANCEIRA 0 1 2 3 4 5 6 7 CURTO / LONGO PRAZO FINANCEIRO / NÃO FINANCEIRO OCORRÊNCIA / TENDÊNCIA AUTOMÁTICO / MANUAL M É D IA Gráfico 1. Características da perspectiva financeira. Fonte: Elaborado pelos autores. 3.3 Indicadores da Perspectiva do Cliente Nessa perspectiva, observou-se que em relação à classificação em curto e longo prazo, três empresas apresentaram mais indicadores de longo prazo, enquanto as outras duas não apresentaram nenhum indicador desse tipo. Observa-se, portanto, que no tocante a essa classificação não houve um padrão de comportamento entre as empresas estudadas. Revela-se uma predominância de indicadores não-financeiros; dos 40 indicadores obtidos, apenas 5 são financeiros, todos eles de uma única empresa, o que mostra uma tendência de inclusão de indicadores financeiros apenas na perspectiva financeira. 11 Três empresas apresentaram quantidades aproximadas de indicadores de ocorrência e de tendência. Entretanto, a quarta empresa não possui nenhum indicador de tendência, registrando uma quantidade de indicadores de ocorrência maior que a soma desse tipo de indicador nas outras três empresas. A quinta empresa registra apenas indicadores de tendência. Praticamente todos os indicadores dessa perspectiva são alimentados manualmente. Apenas quatro indicadores são alimentados automaticamente – todos eles não-financeiros –, sendo três de longo prazo e um de curto prazo. Apesar de a alimentação manual ser menos eficiente que a automática, os mecanismos manuais de coleta de dados foram considerados eficientes por todas as empresas estudadas. Mediu-se essa eficiência utilizando-se uma escala de Likert variando de 1 a 4, tendo sido obtida média 3. Registrou-se uma média de 8 indicadores de desempenho para essa perspectiva, igual à média obtida na perspectiva financeira. Assim como naquela perspectiva, os indicadores desta foram considerados altamente alinhados com a estratégia da empresa, obtendo-se um alinhamento médio de 3,8 (escala de 1 a 4). Observou-se, também, que há uma forte correlação positiva (+0,8551) entre a diferença na quantidade de indicadores de ocorrência e de tendência e a diferença na quantidade de indicadores de curto e de longo prazo, reforçando a idéia de que indicadores de ocorrência correspondem a indicadores de curto prazo. Sintetizando as características dos indicadores de desempenho apresentados na perspectiva do cliente (Gráfico 2), observou-se uma predominância de indicadores de curto prazo, não-financeiros e de ocorrência, alimentados de forma manual, porém eficiente; e muito alinhados às estratégias das empresas. PERSPECTIVA DO CLIENTE 0 2 4 6 8 CURTO / LONGO PRAZO FINANCEIRO / NÃO FINANCEIRO OCORRÊNCIA / TENDÊNCIA AUTOMÁTICO / MANUAL M É D IA Gráfico 2. Características da perspectiva do cliente. Fonte: Elaborado pelos autores. 3.4 Indicadores da Perspectiva dos Processos Internos A quantidade de indicadores de desempenho apresentada nessa perspectiva revela que se deu ênfase aos processos internos da empresa na implantação do BSC. Registrou-se uma média de 23 indicadores, contra 7,7 indicadores nas outras perspectivas. Ressalte-se, outrossim, que uma empresa apresentou 53 indicadores nessa perspectiva. Observou-se nas empresas estudadas uma relação muito forte entre o BSC e o programa de qualidade, sendo que em três delas o respondente e responsávelpelo BSC é também gerente da qualidade. Essa relação explica a quantidade de indicadores da perspectiva dos processos internos, uma vez que geralmente os programas da qualidade enfatizam os processos internos. Conforme comentado no item 1, Schneiderman (1999) afirma que os indicadores de processo são mais utilizados pelas equipes de melhoria (qualidade) por possibilitar a identificação dos pontos onde as melhorias terão maior impacto. Esses números caracterizam as abordagens tradicionais de medição de desempenho que, como anteriormente assinalado, buscam o monitoramento e a melhoria dos processos. Outra justificativa possível para a quantidade de indicadores dessa perspectiva pode ser retirada dos resultados de uma pesquisa sobre o BSC realizada por Soares Júnior e 12 Prochnik (2003) em 2002, junto a onze empresas no Brasil. Verificou-se que a perspectiva dos processos internos é a mais trabalhosa para o estabelecimento de métricas, em virtude de se confundir o que é operacional com o que é estratégico, dificultando a abstração daquilo que é operacional no momento da construção do mapa estratégico. Ainda segundo os autores, a ênfase que se dá a aspectos pontuais e operacionais em detrimento das questões estratégicas corresponde a um fator cultural. Reforçando essas informações, uma das onze empresas pesquisadas apresentou 30 indicadores estratégicos e 400 operacionais. Assim como nas outras perspectivas, predominam nessa perspectiva indicadores de curto prazo; dos 116 indicadores apresentados nessa perspectiva, apenas 28 (24%) são de longo prazo. Destes, 19 pertencem a uma única empresa, demonstrando um não- balanceamento nessa característica, uma vez que a diferença entre curto e longo prazo é muito elevada. Em média, registram-se 3,1 indicadores de curto prazo para cada indicador de longo prazo. Nessa perspectiva, as empresas adotaram basicamente indicadores não-financeiros (19, em média); entretanto, três empresas possuem indicadores financeiros, embora em quantidades bem inferiores. A proporção entre as médias registra quatro indicadores não- financeiros para cada financeiro. Essa ênfase em indicadores não-financeiros nessa perspectiva já era esperada, uma vez que os processos internos são geralmente avaliados em termos de eficiência na execução. Quanto aos indicadores de ocorrência e de tendência, três empresas apresentaram mais indicadores do primeiro tipo; entretanto, uma empresa apresentou bem mais indicadores de tendência do que de ocorrência, com uma proporção de 4,3 para 1. Acerca dessa característica, e pelo mesmo motivo da característica anterior, quatro das cinco empresas estudadas enfatizaram muito mais uma característica do que a outra. A forma de alimentação dos indicadores, mais uma vez, é predominantemente manual. Dos 116 indicadores apresentados pelas empresas, apenas oito são alimentados automaticamente. Mais uma vez, os mecanismos de coleta de dados para os indicadores foram considerados eficientes, embora apresentando uma pequena redução nesse nível de eficiência – média de 3 pontos em uma escala de um a quatro. Assim como ocorreu com o nível de eficiência na coleta dos dados, houve uma pequena redução no grau de alinhamento entre os indicadores dessa perspectiva e a estratégia da empresa; entretanto, considerou-se que o nível de alinhamento é elevado, uma vez que se obteve uma média de 3,4 pontos numa escala de um a quatro. Apesar de uma empresa apresentar quantidade de indicadores muito maior que as demais, pode-se concluir que os indicadores da perspectiva dos processos internos das empresas estudadas possuem as seguintes características (Gráfico 3): predominantemente de curto prazo, não-financeiros e de ocorrência; alimentados basicamente na forma manual, porém com razoável eficiência; e elevado nível de alinhamento com as estratégias da empresa. PERSPECTIVA DOS PROCESSOS INTERNOS 0 5 10 15 20 25 CURTO / LONGO PRAZO FINANCEIRO / NÃO FINANCEIRO OCORRÊNCIA / TENDÊNCIA AUTOMÁTICO / MANUAL M É D IA Gráfico 3. Características da perspectiva dos processos internos. Fonte: Elaborado pelos autores. 13 3.5 Indicadores da Perspectiva do Aprendizado e Crescimento Os indicadores apresentados pelas empresas estudadas para essa perspectiva são basicamente de curto prazo. Apenas duas empresas informaram possuir indicadores de aprendizado e crescimento visando ao longo prazo. Identificaram-se 28 indicadores de curto prazo e 9 de longo prazo, totalizando 37 indicadores. Nessa perspectiva, todos os indicadores apresentados são não-financeiros, o que pode demonstrar que as empresas não conseguiram uma forma de mensurar financeiramente os impactos do investimento em infra-estrutura, pessoas, sistemas e procedimentos organizacionais, ou, mais uma vez, a ênfase na qualidade levou a indicadores não relacionados com o crescimento da empresa no longo prazo. A perspectiva do aprendizado e crescimento foi a primeira em que as empresas apresentaram quantidades aproximadas de indicadores de ocorrência e de tendência. Isso denota a preocupação das empresas em mensurar suas capacidades atuais e futuras para atingir suas metas de longo prazo para clientes e processos internos; entretanto, a coerência dessa característica com a de curto/longo prazo não ocorreu. Os respondentes demonstraram não haver um grau de alinhamento muito elevado desses indicadores com as estratégias das empresas, pois o grau obtido foi bem menor que os das outras perspectivas (média de 2,8). Acerca dos mecanismos de coleta de dados, observou-se que em apenas uma empresa os indicadores dessa perspectiva são alimentados automaticamente. Assim como nas outras perspectivas, os dados obtidos com os questionários demonstraram que o grau de eficiência desses mecanismos não foi afetado pela forma de alimentação, uma vez que esse grau foi considerado bom (média = 3). Resumindo as informações sobre os indicadores da perspectiva do aprendizado e crescimento (Gráfico 4), conclui-se que: são predominantemente de curto prazo; são todos não-financeiros; as quantidades de indicadores de ocorrência e de tendência foram aproximadas; estão alinhados com as estratégias das empresas, mas em grau inferior em relação aos indicadores das outras perspectivas; e a maioria é alimentada manualmente, mas de modo eficiente. PERSPECTIVA DO APRENDIZADO E CRESCIMENTO 0 2 4 6 8 CURTO / LONGO PRAZO FINANCEIRO / NÃO FINANCEIRO OCORRÊNCIA / TENDÊNCIA AUTOMÁTICO / MANUAL M É D IA Gráfico 4. Características da perspectiva do aprendizado e crescimento. Fonte: Elaborado pelos autores. Conclusão Com base no estudo, pôde-se observar que as empresas não definiram seus indicadores de acordo com as orientações de Kaplan e Norton (2000). Em média, elas definiram 46 indicadores, enquanto que os autores do BSC sugerem de 20 a 25 (critério 1). Esses autores assinalam, ainda, que o excesso de indicadores é uma forma inadequada de implantação do BSC, uma vez que pode desviar a atenção dos indicadores que são, de fato, relevantes para a estratégia da empresa. A Tabela 1 mostra a quantidade de indicadores adotados pelas empresas, bem como a porcentagem que eles representam em relação ao total. 14 A Tabela 1 mostra, ainda, que, em relação à distribuição nas quatro perspectivas (critério 2), as empresas adotaram, em média, 18% dos indicadores para a perspectiva financeira, 19% para a perspectiva do cliente, 44% para a perspectiva dos processos internos e 19% para a perspectiva do aprendizado e crescimento. Analisando-se essa distribuição, observa-se que as empresas não estão de acordo com o segundo critério, devido à ênfase dada na perspectiva dos processos internos. A tabela mostra também que 37% dos indicadores (18+19) correspondem às perspectivas externas(financeira e do cliente) e que 63% (44+19) estão nas duas perspectivas internas (processos internos e aprendizado e crescimento). Não são, portanto, condizentes com o terceiro critério. Financeira Cliente Processos Internos Aprendizado e Crescimento Empresa Quant. % Quant. % Quant. % Quant. % Total A 11 14 9 11 53 66 7 9 80 B 9 20 8 17 20 43 9 20 46 C 3 9 6 17 16 46 10 29 35 D 13 22 14 24 24 41 8 14 59 E 3 25 3 25 3 25 3 25 12 Média 8 18 8 19 23 44 7 19 46 Tabela 1. Distribuição dos indicadores em cada perspectiva do BSC. Fonte: Elaborado pelos autores. A Tabela 2 apresenta a soma dos indicadores das quatro perspectivas do BSC das cinco empresas estudadas, distribuídos de acordo com as características analisadas – curto e longo prazo, financeiro e não-financeiro, ocorrência e tendência, e alimentação automática e manual. Observa-se que, apesar de as empresas adotarem uma quantidade de indicadores muito superior à recomendada por Kaplan e Norton (2000), a proporção média de indicadores financeiros em relação aos não-financeiros ficou muito próxima daquela recomendada (critério 4). Os dados obtidos mostram que as empresas definiram, em média, 26% de indicadores financeiros e 74% de não-financeiros. Entretanto, considerou-se que esse critério não foi atendido, pois apenas uma empresa (C) apresentou equilíbrio nessa característica. A B C D E Característica Quant % Quant % Quant % Quant % Quant % Total Média (%) Curto Prazo 63 79 13 28 35 100 59 100 0 0 170 61 Longo Prazo 17 21 33 72 0 0 0 0 12 100 62 39 Financeiro 20 25 13 28 7 20 18 31 3 25 61 26 Não-Financeiro 60 75 33 72 28 80 41 69 9 75 171 74 Ocorrência 22 28 39 85 20 57 52 88 0 0 133 52 Tendência 58 72 7 15 15 43 7 12 12 100 99 48 Alimentação Automática 0 0 0 0 9 26 0 0 12 100 21 25 Alimentação Manual 80 100 46 100 26 74 59 100 0 0 211 75 Total de Indicadores 80 100 46 100 35 100 59 100 12 100 Tabela 2. Resumo da quantidade de indicadores em cada característica analisada. Fonte: Elaborado pelos autores. No tocante à característica relacionada ao prazo (critério 5), o estudo mostrou que três empresas implantaram o BSC utilizando, predominantemente, indicadores de curto prazo (A, C, D). Isso mostra que implantaram um instrumento que possibilita a articulação da estratégia com a missão e a visão para a obtenção de lucros futuros, enfatizando apenas o presente, ou 15 seja, o desempenho atual. Essa ênfase no desempenho atual constitui uma característica das abordagens tradicionais de medição (KAPLAN e NORTON, 1997). Com base no quinto critério e no fato de que apenas uma empresa (B) se aproximou do critério, apresentando uma proporção de um indicador de curto prazo para cada 2,5 indicadores de longo prazo, considerou-se que as empresas não apresentaram o equilíbrio esperado. Acerca das características ocorrência e tendência (critério 6), observou-se que três das cinco empresas estudadas apresentaram mais indicadores da primeira do que da segunda. Analisando-se as características curto/longo prazo e ocorrência/tendência, observa-se que há uma coerência entre essas quantidades, porquanto indicadores de ocorrência tendem a levar a objetivos de curto prazo. Apesar disso, e ainda com base no sexto critério, nenhuma empresa apresentou um conjunto de indicadores equilibrado. Tomando-se por base o conjunto das empresas estudadas e os seis critérios propostos, os resultados negaram o pressuposto 1 deste estudo. Os indicadores das empresas estudadas são quase todos alimentados manualmente. Observou-se que essas empresas possuem sistemas informatizados para o acompanhamento e controle do BSC. Entretanto, a forma de alimentação dos indicadores indica que esses sistemas não são integrados aos demais sistemas da empresa, o que aumenta o risco de erro na alimentação dos indicadores e na demora no processo de comunicação e disseminação dos indicadores. Apesar disso, os mecanismos de coleta de dados para alimentar os indicadores mostraram-se eficientes, proporcionando um elevado grau de confiabilidade nos indicadores, contrariando o pressuposto 2 desta pesquisa. Este estudo suscitou alguns questionamentos: Qual a proporção indicada entre essas características estudadas para se afirmar que um BSC é equilibrado? É possível definir um padrão para essa proporção, ou depende de cada empresa? Colocam-se essas questões como sugestão para estudos futuros, envolvendo maior número de empresas. Considera-se que um BSC equilibrado – sem ocorrência da “síndrome do equilíbrio ou melhor prática” – deve apresentar uma distribuição aproximada daquelas definidas nos seis critérios. Entretanto, sabe-se que os indicadores devem contar a história da estratégia da empresa e que, portanto, a não-observância dos critérios apresentados não indica que o BSC esteja mal elaborado. Considera-se, também, que a coerência entre o tipo de indicador (ocorrência ou tendência) e o prazo (curto ou longo) contribui para o equilíbrio do BSC, e que, portanto, deve ser observada. Referências Bibliográficas EPSTEIN, M.; MANZONI, J. F. Implementing corporate strategy: from tableaux de board to balanced scorecards. In: European Management Journal, v. 16, n. 2, abr. 1998. FORTE, S. H. A. C.; PEREIRA, M. S.; AQUINO, P. M. de. A construção e a disseminação da missão nas instituições de ensino superior no Ceará. Revista Gestão & Tecnologia, Faculdades Pedro Leopoldo, n. 2, p. 99-122, nov. 2003. GIL, A. C. Métodos e técnicas de pesquisa social. São Paulo: Atlas, 1994. GUILHERME, R.; GOLDSZMIDT, B. Uma revisão de literatura dos fatores críticos para a implementação e uso do balanced scorecard. In: ENCONTRO ANUAL DA ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ADMINISTRAÇÃO, 27., 2003, São Paulo. Anais... São Paulo: Anpad, 2003. Estudos Organizacionais. HERNANDES, C. A. 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