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DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR NA INFÂNCIA PROFESSORAS Dra. Mara Cecília Rafael Lopes Esp. Maria Gorethe de Vasconcelos Miranda DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR NA INFÂNCIA 2 DIREÇÃO UNICESUMAR Reitor Wilson de Matos Silva, Vice-Reitor Wilson de Matos Silva Filho, Pró-Reitor de Administração Wilson de Matos Silva Filho, Pró-Reitor de EAD William Victor Kendrick de Matos Silva, Presidente da Mantenedora Cláudio Ferdinandi. NEAD - NÚCLEO DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Direção Executiva de Ensino Janes Fidélis Tomelin, Diretoria Operacional de Ensino Kátia Coelho, Diretoria de Planejamento de Ensino Fabrício Lazilha, Direção de Operações Chrystiano Mincoff, Direção de Polos Próprios James Prestes, Direção de Desenvolvimento Dayane Almeida, Direção de Relacionamento Alessandra Baron, Gerência de projetos especiais Daniel F. Hey, Supervisão do Núcleo de Produção de Materiais Nádila de Almeida Toledo, Coordenador(a) de Contéudo Mara Cecilia Rafael Lopes, Projeto Gráfico José Jhonny Coelho, Editoração Humberto Garcia da Silva, Designer Educacional Ana Claudia Salvadego, Qualidade Textual Hellyery Agda, Revisão Textual Felipe Veiga da Fonseca, Ilustração Bruno Pardinho, Fotos Shutterstock. C397 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE MARINGÁ. Núcleo de Educação a Distância; RAFAEL LOPES, Mara Cecília; VASCONCELOS MIRANDA, Maria Gorethe de. Desenvolvimento Psicomotor na Infância. Mara Cecília Rafael Lopes; Maria Gorethe de Vasconcelos Miranda. Reimpressão Maringá - PR.:UniCesumar, 2018. 152 p. “Graduação em Educação Física - EaD”. 1. Psicomotricidade. 2. Desenvolvimento. 3. Criança. 4. EaD. I. Título. ISBN-978-85-459-0834-0 CDD - 22ª Ed. 701.1 CIP - NBR 12899 - AACR/2 NEAD Núcleo de Educação a Distância Av. Guedner, 1610, Bloco 4 Jd. Aclimação - Cep 87050-900 Maringá - Paraná www.unicesumar.edu.br | 0800 600 6360 Viver e trabalhar em uma sociedade global é um grande desafio para todos os cidadãos. A busca por tecnologia, informação, conhecimento de qualidade, novas habilidades para liderança e solução de problemas com eficiência tornou-se uma questão de sobrevivência no mundo do trabalho. Cada um de nós tem uma grande responsabilidade: as escolhas que fizermos por nós e pelos nossos fará grande diferença no futuro. Com essa visão, o Centro Universitário Cesumar assume o compromisso de democratizar o conhecimento por meio de alta tecnologia e contribuir para o futuro dos brasileiros. No cumprimento de sua missão – “promover a educação de qualidade nas diferentes áreas do conhecimento, formando profissionais cidadãos que contribuam para o desenvolvimento de uma sociedade justa e solidária” –, o Centro Universitário Cesumar busca a integração do ensino-pesquisa-extensão com as demandas institucionais e sociais; a realização de uma prática acadêmica que contribua para o desenvolvimento da consciência social e política e, por fim, a democratização do conhecimento acadêmico com a articulação e a integração com a sociedade. Diante disso, o Centro Universitário Cesumar almeja ser reconhecida como uma instituição universitária de referência regional e nacional pela qualidade e compromisso do corpo docente; aquisição de competências institucionais para o desenvolvimento de linhas de pesquisa; consolidação da extensão universitária; qualidade da oferta dos ensinos presencial e a distância; bem-estar e satisfação da comunidade interna; qualidade da gestão acadêmica e administrativa; compromisso social de inclusão; processos de cooperação e parceria com o mundo do trabalho, como também pelo compromisso e relacionamento permanente com os egressos, incentivando a educação continuada. Wilson Matos da Silva Reitor da Unicesumar boas-vindas Prezado(a) Acadêmico(a), bem-vindo(a) à Comunidade do Conhecimento. Essa é a característica principal pela qual a Unicesumar tem sido conhecida pelos nossos alunos, professores e pela nossa sociedade. Porém, é importante destacar aqui que não estamos falando mais daquele conhecimento estático, repetitivo, local e elitizado, mas de um conhecimento dinâmico, renovável em minutos, atemporal, global, democratizado, transformado pelas tecnologias digitais e virtuais. De fato, as tecnologias de informação e comunicação têm nos aproximado cada vez mais de pessoas, lugares, informações, da educação por meio da conectividade via internet, do acesso wireless em diferentes lugares e da mobilidade dos celulares. As redes sociais, os sites, blogs e os tablets aceleraram a informação e a produção do conhecimento, que não reconhece mais fuso horário e atravessa oceanos em segundos. A apropriação dessa nova forma de conhecer transformou-se hoje em um dos principais fatores de agregação de valor, de superação das desigualdades, propagação de trabalho qualificado e de bem-estar. Logo, como agente social, convido você a saber cada vez mais, a conhecer, entender, selecionar e usar a tecnologia que temos e que está disponível. Da mesma forma que a imprensa de Gutenberg modificou toda uma cultura e forma de conhecer, as tecnologias atuais e suas novas ferramentas, equipamentos e aplicações estão mudando a nossa cultura e transformando a todos nós. Então, priorizar o conhecimento hoje, por meio da Educação a Distância (EAD), significa possibilitar o contato com ambientes cativantes, ricos em informações e interatividade. É um processo desafiador, que ao mesmo tempo abrirá as portas para melhores oportunidades. Como já disse Sócrates, “a vida sem desafios não vale a pena ser vivida”. É isso que a EAD da Unicesumar se propõe a fazer. Willian V. K. de Matos Silva Pró-Reitor da Unicesumar EaD Seja bem-vindo(a), caro(a) acadêmico(a)! Você está iniciando um processo de transformação, pois quando investimos em nossa formação, seja ela pessoal ou profissional, nos transformamos e, consequentemente, transformamos também a sociedade na qual estamos inseridos. De que forma o fazemos? Criando oportunidades e/ou estabelecendo mudanças capazes de alcançar um nível de desenvolvimento compatível com os desafios que surgem no mundo contemporâneo. O Centro Universitário Cesumar mediante o Núcleo de Educação a Distância, o(a) acompanhará durante todo este processo, pois conforme Freire (1996): “Os homens se educam juntos, na transformação do mundo”. Os materiais produzidos oferecem linguagem dialógica e encontram-se integrados à proposta pedagógica, contribuindo no processo educacional, complementando sua formação profissional, desenvolvendo competências e habilidades, e aplicando conceitos teóricos em situação de realidade, Kátia Solange Coelho Diretoria Operacional de Ensino Fabrício Lazilha Diretoria de Planejamento de Ensino de maneira a inseri-lo no mercado de trabalho. Ou seja, estes materiais têm como principal objetivo “provocar uma aproximação entre você e o conteúdo”, desta forma possibilita o desenvolvimento da autonomia em busca dos conhecimentos necessários para a sua formação pessoal e profissional. Portanto, nossa distância nesse processo de crescimento e construção do conhecimento deve ser apenas geográfica. Utilize os diversos recursos pedagógicos que o Centro Universitário Cesumar lhe possibilita. Ou seja, acesse regularmente o AVA – Ambiente Virtual de Aprendizagem, interaja nos fóruns e enquetes, assista às aulas ao vivo e participe das discussões. Além disso, lembre-se que existe uma equipe de professores e tutores que se encontra disponível para sanar suas dúvidas e auxiliá-lo(a) em seu processo de aprendizagem, possibilitando-lhe trilhar com tranquilidade e segurança sua trajetória acadêmica. boas-vindas 6 autoras 6 Professora Doutora Mara Cecília Rafael Lopes Doutorado em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação pela Universidade Estadualde Maringá (UEM/2016). Mestrado em Educação pela Uni- versidade Estadual de Maringá (UEM/2009). Possui graduação em Educação Física pela Universidade Estadual de Maringá (UEM/1995) e graduação em Pedagogia pelo Centro Universitário de Maringá (Unicesumar/2016). Atualmente é professora e coordenadora do curso de Licenciatura em Educação Física na EAD do Unicesumar. Para informações mais detalhadas sobre sua atuação profi ssional, pesquisas e publicações, acesse seu currículo, disponível no endereço a seguir: <http://lattes. cnpq.br/5472896495130234>. Professora Especialista Maria Gorethe de Vasconcelos Miranda Especialista em Educação Psicomotora pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS/1986), com formação pelo Centro Lydia Coriat de Porto Alegre- RS em Clínica e Terapêutica em Transtornos da Infância e Adolescência. Professora, graduada em Educação Física pela Universidade Federal de Pelotas (UFPEL/1986). Para informações mais detalhadas sobre sua atuação profi ssional, pesquisas e publicações, acesse seu currículo, disponível no endereço a seguir: <http://lattes. cnpq.br/8161227323374434>. apresentação Desenvolvimento Psicomotor na Infância Professora Dra. Mara Cecília Rafael Lopes Professora Esp. Maria Gorethe de Vasconcelos Miranda Caro(a) aluno(a), este livro tem por objetivo conduzir e auxiliar seu aprendizado sobre o desenvolvimento psicomotor da criança. Quando falamos da criança e do seu desenvolvimento, devemos entender que há um grande leque de conhecimentos a desbravar. O sujeito humano é um ser complexo, que recebe influências de seus responsáveis e do meio no qual está inserido. Quanto mais entendermos sobre o sujeito humano nos vários enfoques, mais poderemos ter uma prática docente adequada e valiosa junto aos alunos. O desenvolvimento infantil envolve muitos as- pectos subjetivos, por isso veremos o quanto a His- tória, a Filosofia, a Sociologia, a Psicanálise de Freud, a Psicologia Genética de Jean Piaget e os autores da Psicomotricidade, propriamente ditos, enfatizam a im- portância em considerar o sujeito como uma unidade e não apenas como um sujeito biológico e psíquico. Não se trata de unir o corpo e mente, e sim de entender o quanto o psiquismo influência o biológico, ao mesmo tempo que o biológico afeta o psiquismo. Nada em nosso desenvolvimento acontece de forma reducionista. O desenvolvimento psicomotor que você estudará neste livro apresenta o percurso da criança lhe possibilitando ganhar noção de si, do seu corpo, de seu movimento e de sua aprendi- zagem. Assim, chegaremos a entender que o mo- vimento da criança vai depender da sua história e da representação que ela tem de si mesma, ou seja, como foi construída a sua imagem. Veremos que a imagem de si não é a mesma coisa que noção do corpo ou esquema corporal. Existem diferenças sutis que permitirão ao professor entender a criança mais profundamente. E assim poderá fornecer estratégias facilitadoras aos alunos. Você aprenderá sobre os aspectos do desenvol- vimento psicomotor: esquema corporal, equilíbrio, coordenação, lateralidade, noção de espaço e de tempo e como estes aspectos influenciam a atividade corporal. Esses aspectos serão o objetivo do seu trabalho. Con- tudo, não esqueça a subjetividade da criança, pois é essa subjetividade que servirá de base para que o aluno possa incrementar ações com precisão, qualidade e boa estruturação. Portanto, caro(a) aluno(a), perceba a grandio- sidade do humano e a imensa responsabilidade em estudar o desenvolvimento e trabalhar com os alunos em estruturação. O sujeito humano precisa do organismo bioló- gico como sustentação da sua subjetividade. Juntos, permitem que ele se constitua, se movimente, atue em relação com os outros semelhantes, crie, produza e se estruture definitivamente. Há uma maravilhosa engrenagem! Um ser é mais que corpo e mente! É o que faz de nós diferentes e iguais ao mesmo tempo. É com isso que você, futuro professor, trabalhará. Ajudando na construção de sujeitos plenos de potencialidades. sumário UNIDADE I O UNIVERSO DA CRIANÇA 14 A Criança - Que Ser é Este? 16 O Desenvolvimento Infantil 18 A Escola e a Criança 22 Uma Questão de Postura do Professor 24 Psicomotricidade e Difi culdade de Apren- dizagem – Um Olhar Além do Corpo 28 Considerações fi nais 34 Referências 35 Gabarito UNIDADE II O BRINCAR E O DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR 40 Biologia e Subjetividade Humana 44 O Brincar: Principal Ferramenta da Infância 56 Considerações fi nais 63 Referências 65 Gabarito UNIDADE III A PSICOMOTRICIDADE 70 História da Psicomotricidade 72 Aspectos Motores da Psicomotricidade 78 Elementos da Psicomotricidade 90 Considerações fi nais 93 Referências 94 Gabarito UNIDADE IV ATIVIDADES PSICOMOTORAS: UMA INCRÍVEL SOLUÇÃO NA INFÂNCIA 100 A Importância das Atividades Psicomotoras para Crianças de Até 10 Anos 104 Estágios do Desenvolvimento infantil 110 Cortes Epistemológicos 112 Considerações fi nais 118 Referências 119 Gabarito UNIDADE V AVALIAÇÃO PSICOMOTORA- SINTOMAS E ABORDAGENS TERAPÊUTICAS 124 Aspectos Constitucionais do Desenvolvimento Psicomotor: Os Refl exos Arcaicos 130 A Psicomotricidade e os Sintomas Psicomotores 134 O Gesto Motor 136 A Construção da Imagem 138 Abordagens Terapêuticas em Psicomotricidade 143 Avaliação Psicomotora 144 Considerações fi nais 149 Referências 150 Gabarito 151 Conclusão Professora Dra. Mara Cecília Rafael Lopes Professora Esp. Maria Gorethe de Vasconcelos Miranda Plano de Estudo A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade: • Criança: que ser é este? • O Desenvolvimento Infantil • A escola e a criança • Uma questão de Postura do Professor • Psicomotricidade e Difi culdade de Aprendizagem – Um Olhar Além do Corpo Objetivos de Aprendizagem • Entender o processo de estruturação do ser humano dentro da nossa cultura. • Perceber a importância do Outro na estruturação da criança. • Conhecer o desenvolvimento global da criança e como o aspecto orgânico e psíquico se inter-relacionam. • Compreender a relevante função da escola na estruturação da criança. O UNIVERSO DA CRIANÇA I unidade INTRODUÇÃO Pensar o desenvolvimento psicomotor é fazer prevenção de dificuldades do desenvolvimento. Desde que feito precocemente, isto é, desde bebê, o trabalho psicomotor pode nos dar pistas de uma estruturação saudável ou não da criança, dessa forma, agindo como prevenção. O desenvolvimento não inicia se não houver condições sutis para isso. É necessário mais do que um organismo saudável para que o ho- mem inicie seu longo processo de estruturação, de tornar-se sujeito. Su- jeito subjetivado e rico em potencialidades. Ao nascer, o bebê não está pronto, mesmo nascido a termo (entre 37 e 42 semanas), ainda precisará completar seu desenvolvimento. O que te- mos a princípio é apenas um grupo de órgãos funcionando. Para animar, para dar vida mesmo ao ser humano, é necessário mais do que biologia. Lançando o olhar sobre as várias teorias que explicam o ser humano, encontraremos a Sociologia, a Antropologia, a Filosofia, a Psicanálise, a Me- dicina, a Pedagogia, e muitas outras. No trabalho com educação, devemos compreender o que cada uma dessas disciplinas dizem sobre o sujeito huma- no. Isso trará como consequência um entendimento mais competente do de- senvolvimento infantil e assim um trabalho mais responsável com pessoas. Muitos professores sentem dificuldade ao se deparar com crianças com desenvolvimentos diferentes daqueles esperados. Percebem atrasos ou diferenças que resultam em problemas escolares. Poucos estudam o porquê das dificuldades no desenvolvimento de uma criança. Um dos motivos para problemas no desenvolvimento pode ser o fato dela nãoser bem recebida pela família, isto é, quando pelo menos um dos responsá- veis pela criança, não se faz cargo realmente sobre aquele ser que nasceu. Vamos tentar iniciar, então, esse interessante estudo que nos dará condições de trabalhar a corporeidade humana, certos de que estejamos minimamente instrumentalizados para dar conta daqueles que estão sob nossa responsabilidade nas aulas de psicomotricidade: nossos alunos! DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR NA INFÂNCIA 14 Que enorme responsabilidade fazer parte de um projeto grandioso como o de estruturar um ser hu- mano. Pela necessidade do trabalho das mães, as crianças chegam hoje ainda bebês na escola. Dessa forma, os professores podem fazer a diferença na vida dos pequenos. Tudo que dirigimos aos bebês será estruturante, ou, do contrário, desestruturante. Poderíamos de imediato pensar que a criança é um ser em construção, em estruturação. Essa estru- turação não vai acontecer pela simples biologia. O biológico é importantíssimo, mas não garante toda a estruturação humana. (WALLON, 1979). Então, a partir disso, estamos falando de algo não garantido “a priori”, ou seja, cada criança que nasce é um ser “prematuro” e dependente, ficando “à mercê” dos que a rodeiam. Dessa maneira, inclui-se aqui pri- meiro os pais, e depois todos os adultos envolvidos com a criança. Entre eles estão os professores. “Educar” faz parte de “ESTRUTURAR”. Educar, etimologicamente, significa: sustentar, acompanhar, conduzir (Dicionário Etimológico, on-line)1. Uma questão importante: será que os adultos da vida das crianças sempre as sustentam, acompa- nham e conduzem? A educação está marcada pela dificuldade de aceitar as diferenças. Proust (2003, p. 544) vai dizer: “Talvez a imobilidade das coisas ao nosso redor lhes seja impossível pela nossa certeza de que tais coisas são elas mesmas, e não outras pela imobilidade do nosso pensamento em relação a ela”. Então, nossas crianças começam, desde muito cedo, a serem “enquadradas” num modelo fixado A Criança Que Ser é Este? 15 EDUCAÇÃO FÍSICA por nós ou por alguns autores é que toda forma di- ferente de existir passa a ser “patologia”. Ou seja, as crianças, muitas vezes, não obedecem um “padrão” no desenvolvimento. Por vezes, uns demoram um pouco mais a amadurecer, ou têm respostas mais ousadas, ou ainda necessitam um pouco mais de atenção do que outros. Cabe ao professor perceber que sua relação com cada aluno será singular, única e descobrirá formas particulares de resolver os im- passes do desenvolvimento infantil. As “formas” diferentes das crianças reagirem precisam ser entendidas como “discursos”, isto é, formas de dizer algo de si mesmo, e as explicações para essas questões deveriam ser pesquisadas e ob- servadas nos pais dessas crianças. É importante es- tarmos atentos ao estilo de cada família, que lugar a criança tem no contexto familiar, e se investem na criança como sujeito, ou como objeto a ser carrega- do de cá pra lá, o qual, muitas vezes, os pais não per- cebem a expressão da sua criança. Os professores deverão se ocupar das crianças, en- tendendo que toda a atividade infantil deve respeitar o estilo das crianças e o nível de compreensão delas, além das suas condições gerais. Caso as crianças rea- jam a certas rotinas ou atividades, devemos nos preo- cupar em decifrar em que estamos errando. As crian- ças são sábias: sabem sobre amor, verdade, justiça etc. É dessa maneira que a Educação deve chegar até nossas crianças. Um modo humanizado de “susten- tar” a possibilidade de “estruturar” um ser humano, conduzindo-o às descobertas e às originais formas de se tornar sujeito. DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR NA INFÂNCIA 16 O desenvolvimento infantil está relacionado com a forma como os semelhantes se colocam e colocam a criança na vida. O modo como os pais falam do seu filho, as formas como o tocam, o olham, vão po- sicionando-o na família. Também vão mapeando o corpo, marcando as zonas erógenas, organizando as percepções e constituindo o modo de pertencer ao mundo. Então, toda a corporeidade do sujeito está relacionada ao Outro. O termo “outro” é utilizado pelo psicanalista francês Lacan (1964-1965), cita- do por Julieta Jerusalinsky (2002, p. 58) no Livro: Enquanto o futuro não vem - a psicanálise na clínica O Desenvolvimento Infantil interdisciplinar com bebês, se referindo à cultura e à civilização, na qual estamos incluídos e que tam- bém está incluído a mãe, como o Outro Primordial, como chama Lacan. Esse Outro Primordial nos dará acolhimento e iniciará nossa história vivida e construída pela famí- lia. (LACAN, 1964 - 1965). “O conceito de Outro é introduzido por Lacan para definir aquilo que é anterior ao sujeito e o de- termina em sua Constituição. Escreve-se com mai- úscula para diferenciá-lo do semelhante (outro)” (JERUSALINSKY, 2002, p. 58). 17 EDUCAÇÃO FÍSICA As diferentes formas de lidar com as crianças farão diferença no sujeito que está se estruturando. Por exemplo: caso uma criança seja marcada pela super- proteção, retira-se dela a capacidade de autonomia e segurança, que certamente afetará seu corpo, seu pensar, seu existir propriamente dito. Contudo, se, ao contrário, houver negligência por parte da família com os cuidados e proteção, teremos, também, um sujeito estruturado fora dos limites e regras, fora da organização que orienta e dirige o desenvolvimento. É verdade que toda a relação humana afeta po- sitiva ou negativamente o semelhante. Então, a sub- jetividade do professor e do aluno estarão em jogo na escola. As angústias que atravessam o processo de educação (aluno x professor) deverão estar con- troladas no professor, para evitar a desorganização psíquica do aluno. Ou seja, o professor deverá ser um adulto suficientemente estruturado e assim pro- mover o respeito mútuo. Este é outro fator decisivo para o bom desenvolvimento infantil na escola. O professor sempre deverá ser uma referência simbólica para a criança, por isso, devemos saber: quem é a criança que ali está? Qual sua história, seus desejos, sua imagem inconsciente? Nossas técnicas atendem aos alunos ou a nós mesmos? Somos sensí- veis às questões da infância? Temos postura de aco- lhimento, respeito e humildade para com os alunos? O professor tem uma tarefa muito nobre jun- to aos alunos. Deverá respeitar as diferenças, pois estas não são divergências. Também deverá ter au- toridade que sempre protege e acalma a criança, pois as leis de convivência ficarão garantidas, isto é, estamos protegidos pelos hábitos e costumes da cultura, e todos nós cerceados de certos impulsos primitivos, pois estamos submetidos à cultura. O professor é um representante da cultura. Assim, deverá estar o mais livre possível de preconceitos e generalizações. Escutar profundamente todos, mas principalmente seus alunos. Na infância, temos todas as possibilidades, por- tanto, ainda há tempo de afetarmos e até mudarmos o destino de alguém. As crianças só precisam de apoio, de sustentação subjetiva, ou seja, sustenta- ção psíquica, ser reconhecido como sujeito, como pessoa, valorizado, ser conduzido no caminho da fraternidade e do bem coletivo, de uma civilização melhor, mais justa e humanitária. Sempre precisamos saber sobre a história da criança em sua família, para poder entender seu desenvolvi- mento. Assim, nossas estratégias de trabalho serão balizadas. Todos os aspectos da vida dependerão dessas primeiras vivências, e se mostrarão na estru- turação da criança: sua psicomotricidade, sua lin- guagem, sua cognição, seus hábitos, seu brincar, sua sexualidade, “aliás, sobre a sexualidade, Freud nos alertava que toda curiosidade intelectual é derivada da curiosidade sexual” (MILLOT, 1987, p. 43). Figura 1 -Jacques-Marie Émile Lacan (1901-1981) Fonte: Wikipédia ([2017], on-line)2. DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR NA INFÂNCIA 18 Aceitar o estilo de crescer e se estruturar de cada criança colabora para a construção de laços. E são es- ses laços que nos colocarão na cultura, garantindo a pertença familiar, depois escolar e por último social. Toda a criança, hoje, é escolar, diferente de épo- cas passadas, a escola faz parte do início fundamental do ser em sociedade (JERUSALINSKY, 2002). Nesse sentido, a escola, também, deverá ter formas de co- laborar com os pais, auxiliando-os a fazer emergir o sujeito de cada criança e respeitando a singularidade subjetiva de cada um. A Escola e a Criança As aprendizagens são derivadas de vivências precoces das crianças em suas famílias. Aprendemos desde que nascemos. Toda e qualquer palavra, toque, olhar dirigido ao bebê, escreve nele algo da cultura familiar e social. Vivenciamos corporalmente as pri- meiras marcas e isso é “matéria-prima” para nossas futuras descobertas, aprendizagens, transformadas depois em abstrações inteligentes. Somos afetados pelo meio desde sempre, e todos os adultos que con- vivem com a criança farão parte de sua estruturação global (biológica, psíquica e social). 19 EDUCAÇÃO FÍSICA Nas crianças com diagnóstico de dificuldade psicomotora ou de aprendizagem, muitas vezes não encontramos nenhum componente neurológico e/ ou orgânico. Então do que se trata? Algo do psíqui- co, fazendo obstáculos ao psicomotor e ao cognitivo. E por que é tão comum tal sintoma? Para atingir o “alvo”: o Outro. O sintoma está dirigido ao Outro. Esse Outro é principalmente os que exercem fun- ções importantes para uma criança, quais sejam: pais e mães. Dizer “pais” e “mães” propõe diferen- ças entre um e outro, função materna diferente de função paterna. Cada um responsável por aspectos específicos na constituição psíquica do sujeito e os dois permitindo a sustentação simbólica que possi- bilita o aprender. Antes de pensarmos como se organiza o psico- motor e o pedagógico nas crianças, é preciso saber que a construção psíquica (a forma com que foi ge- rado, recebido, cuidado, o lugar dela na família, o clima afetivo) o determina. Caso não haja sustenta- ção simbólica mínima, o aprendizado não terá como pertencer a um SUJEITO. As vivências e os conflitos vividos pela criança desempenham um papel im- portante em seu desenvolvimento, assim como na sua vida adulta (FREUD, 1938). Essas vivências são sinônimos de marcas simbólicas que “fabricam” mo- dos de ser sujeito. Que posição ocupa a criança na história fami- liar? Qual o papel da criança nessa família? Como pensam e projetam a vida do filho? Questões que fa- zem parte da estruturação do sujeito psíquico. Isso “fabrica” um sujeito. As dificuldades de existir já estão na criança quando ela chega à escola. Na relação com os pro- fessores algumas dificuldades poderão se agravar, visto que somos o que foi possível na relação com o Outro. Se não tem um lugar de importância para o Outro (país/cultura), provavelmente também não terá junto aos professores, que agora são os repre- sentantes dos pais. Aqui proponho um giro de 180º para que os pro- fessores possam, alertados por questões teóricas a respeito da constituição psíquica da criança, retirar do lugar vazio ou depreciado que as crianças tenham junto à família, para possibilitar “algum” lugar na es- cola. Escola que é lugar de resgate dos sujeitos, lugar de convívio, lugar de sublimações. Palavra-chave para se reposicionar um sujeito e transformar uma ausência do desejo, em desejo. Na escola, sempre de- veria ser possível elevar o sujeito humano, mesmo aqueles esquecidos, desvalorizados. Principalmente O “alvo” do sintoma se refere a encontrar eco naque- les que são os responsáveis pelas crianças e que ofe- recem a sustentação simbólica a ela, compreender como ocorre esta relação. Então, é preciso atentar para o quanto os impasses das relações constroem problemas ou dificuldades no aprendizado. DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR NA INFÂNCIA 20 com as crianças bem pequenas, que frequentam a Educação Infantil. Quanto mais cedo uma interven- ção adequada, mais chances de organizar uma vida. A escola que desejamos é a Escola que não se- grega, que não exclui, que não deixa escapar aquelas crianças que não fazem parte da camada exitosa e sem problemas. É preciso abandonar o “furor docente”, quer di- zer, furor de ensinar tudo, o tempo todo, que tam- bém fez fracassar Jean Itard, discípulo de Pinel, o médico que tentou ensinar hábitos humanos a Victor de Aveyron – o menino lobo, encontrado em 1800, num bosque da França (JERUSALINSKY, 2010). Os únicos sinais interessantes, mais humaniza- dos, que Victor demonstrou vieram da sua relação com a babá que não se preocupou em ensinar, mas em viver com ele. Adestramento não resgata o sujei- to, o submete, o enquadra, o configura como mero objeto e não como sujeito. Maud Mannoni em sua obra Educação Impossí- vel (1977) fala sobre fracasso da Pedagogia para a maioria das crianças do mundo contemporâneo, o que explica, para ela, o enorme número de crianças com problemas de aprendizagem entre outros pro- blemas que temos na escola hoje. “[...] A pedagogia oscila, nesse caso, entre as ideias de liberdade herda- das do século XIX e os princípios de disciplina de- correntes da tradição religiosa” (MANNONI, 1988, p. 33-34). Tanto a escola como a família utilizam de métodos pedagógicos que seduzem e ao mesmo tempo punem as crianças, assumem uma forma sutil de violência psíquica. Se tomarmos os fundamentos da Psicanálise, sa- beremos que não se trata de fazermos uma Educa- ção Psicanalítica, mas devemos possibilitar um lugar especial para cada criança, que significa vê-la como sujeito apesar de não ser quietinha, apesar de não aprender com facilidade, apesar de ser agressiva, apesar de se angustiar e “perder a cabeça”, gritar. A criança que demonstra sinais de problemas es- colares está às margens da loucura. Um sofrimento enorme as habita e elas “gritam” por socorro. Quem poderá ouvi-las? Aqueles que são sensíveis à causa humana, que não se perdem enquadrando o “certo” e “errado”, mas lutam para salvar crianças do desati- no dos adultos. A psicanálise analisa o sujeito psíquico, o su- jeito que atribui significado a seu corpo e seus órgãos, e possui uma relação de dependência a respeito de si, pois todas as funções dependem do sujeito. Nesse sentido, Freud coloca sobre o nascimento orgânico do nascimento psíquico, ao qual tem seu início desde a fase intra-uteri- na. É na capacidade de antecipação (altamente abstrata) do papel daquele que nascerá, que a família (especificamente a mãe) dá início ao processo de constituição do sujeito. Um bebê humano se torna humano ao rela- cionar-se com seus pares e com a linguagem. Nomear, é manter um controle psíquico, so- bre aquilo que se nomeia. Fonte: Lima ([2017], on-line)3. SAIBA MAIS 21 EDUCAÇÃO FÍSICA Não se trata apenas de criticar a educação que mais “aliena”, no sentido marxista do termo1, que ensi- na. O que podemos pensar é que o ato educativo poderá ser, inclusive, terapêutico, se der um lugar ao sujeito, e não tentar adestrá-lo, ou desrespeitá-lo “pelo bem” da educação. Talvez muitos não percebam seu talento como adestrador. Corrigem, inibem, punem, sem obser- var que ali, naquele aluno, existe um sujeito que é efeito de seus tutelares. Devemos cuidar dos tutelares também? Sim. Propo- mos que respeito, solidariedade, sensibilidade, sejam palavras aceitas para colaborar com estes que também se beneficiariam da escola, e, com isso, aliviariam seus filhos de tensões e angústias avassaladoras. 1 A alienação fez parte dos conceitos desenvolvidos por Marx,ao analisar as trans- formações sociais ocorridas ao longo da história, sobretudo a partir da formu- lação do método do materialismo histórico. A atividade dos alunos na escola, portanto, é uma relação que expressa a atividade na sociedade. Os alunos são categorizados ao se ter uma referência idealizada de aluno: interesse, disciplina, capacidade, inteligência. Fonte: as autoras. Quando Freud, em 1925, no texto “A negação” afirma que: – “Nossas melhores virtudes nasceram sobre o húmus de nossas piores disposições (pul- sões)”, quer dizer que todos nós temos um conteúdo primitivo que foi civilizado. Se a escola possibilita o laço social das crianças e também de seus pais, colabora na inscrição sim- bólica do sujeito, que lhe dá condições de convívio social. Entram aí conceitos ligados à estruturação do sujeito que inclui sexualidade e conhecimento. Freud sempre se ocupou em explicar como o homem, desejando “saber” sobre seu próprio desejo, sua existência, se referia às questões se- xuais, levando-o ao saber científico. Germe do saber, que, reprimindo sua verdadeira origem, dá lugar às investigações científicas. Por isso, Octa- ve Mannoni (antropólogo, filósofo e psicanalista francês) afirma que a inteligência se faz com res- tos da sexualidade. As crianças, apesar de tudo, seguem lutando por um lugar no Outro, um lugar em seus pais. Po- demos contribuir para que elas encontrem esse lu- gar. Podemos “cavar com picareta”, “garimpar” esse lugar e assim possibilitar aprendizagem e mesmo para aqueles que não venham a aprender, dar al- gum lugar de valorização. Ter um lugar importan- te, apesar de tudo. Na Educação Psicomotora, não é diferente. Muitas crianças com problemas psico- motores são excluídas, negligenciadas, quando, na verdade, podem ter muitas condições cognitivas, camufladas sob seu aspecto físico. Aqui cabe refletir: por que atacamos tanto aqueles que já “desvalorizados” não sabem “pedir com educação”? Como ajudá-los a vol- tar ao caminho dos “educados e felizes”? REFLITA DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR NA INFÂNCIA 22 A postura subjetiva do professor afeta a relação com aluno. Tudo é percebido pela criança, colaborando ou atrapalhando o seu desenvolvimento: como o professor se refere aos alunos, como ele fala, como ele olha, como ele resolve as situações, como ele pensa infância e a educação, como os protege, como os expõe etc. Os alunos não são especialistas da área, mas sabem sobre isso pela intuição que têm e pelas sensações provocadas pelas relações com professor e colegas. Antes de sermos adultos, seres burocráticos, somos crianças e temos nossa forma original de sentir as pessoas. Mesmo os bebês sen- tem as pessoas e os ambientes. Desenvolver qualidades fraternas e solidárias à causa Infantil é fundamental para o professor. Essa postura subjetiva do professor se diferencia de uma que há tempos atrás existia entre o professor e seus alunos. A autoridade e a sabedoria andam juntas. O bom humor e a gentileza facilitam as relações. Assim as crianças terão motivo para ouvir o professor. Suas qualidades humani- zadas colaboram para a formação do aluno que poderá se identificar com o professor. Portanto, valorizar o não palpável, o subjetivo, o invisível, trarão melhores con- dições para o trabalho do professor. Ampliando sua visão do sujeito humano, ampliará também sua visão do sujeito cognitivo (SILVA; SILVA; LEAL, 2014). Uma Questão de Postura do Professor 23 EDUCAÇÃO FÍSICA Uma postura que impulsiona os alunos a supe- rarem limites, a explorarem os espaços, descobri- rem formas de agir em grupo, a se relacionarem com cooperação, transformará nossa sociedade. A cada ação gentil e incentivadora, como por irradia- ção, produzirá ambientes mais calmos e humaniza- dos, retirando, assim, do convívio formas violentas e descompromissadas com o próximo, egoístas e in- dividualistas. O bem-estar de todos nos dá chances de crescer em comunhão com valores fraternos e assim perceber o outro semelhante na sua essência, garantindo que todos envolvidos no processo es- colar e social sejam valorizados. Utopia necessária, quando estamos engajados na construção de um mundo moderno, mas não frio ou mecânico. As primeiras relações com os pais são determinantes, e as primeiras relações com os professores são funda- mentais para nossas identificações sociais. Temos, portanto, imensa responsabilidade social quando estamos diante dos alunos. Nossa pequena parcela, somada a outras, fará a diferença no clima e na at- mosfera psíquica da escola e do mundo, sendo oti- mistas e acreditando que somos parte dessa imensa engrenagem chamada humanidade. Até mesmo o marketing, área envolvida em como vender um produto ou serviço, sabe disso. Não será a educação que ficará fora dessa maneira inteligente de fazer sua práxis. DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR NA INFÂNCIA 24 Por que algumas crianças enlouquecem seus pro- fessores? Onde isso tudo teve início? Certamente é anterior à escolaridade. Vejamos onde se localizam os primeiros “nós” que podem entravar o desenvol- vimento da criança que, uma vez afetada em seu psi- que, trarão consequências corporais e vice-versa. Quando estamos ao lado de uma criança com transtornos psicomotores (dificuldade no movi- mento, agitação, falta de concentração, apatia etc.), Psicomotricidade e Dificuldade de Aprendizagem Um Olhar Além do Corpo o que mais nos chama a atenção é como o corpo da criança se mostra, ou como ele se deixa ver. Geral- mente são “corpos” extremamente visíveis. Salta aos olhos de qualquer um esse corpo descoordenado, desequilibrado, agitado. É aqui que precisamos ver além do corpo. Corpo que se faz presente demais, que disfarça ou camufla sofrimentos que geraram tal desarmonia no sujeito. E isso tem causas diversas. 25 EDUCAÇÃO FÍSICA Normalmente, crianças com tais sintomas acabam por serem maltratadas por causar muita confu- são nos ambientes que frequentam e são chamadas comumente de “bagunceiras”, “desordeiras”, “ma- landras”, “desobedientes” etc. Raramente o adul- to envolvido com essa criança faz outra leitura da condição da criança. Esses adjetivos poderiam ser substituídos por: “abandonada”, “vítima”, “não com- preendida”, “sofredora”, “superexigida”, “superprote- gida”, “não acolhida” etc. Adjetivos que falariam da responsabilidade e da falha do adulto para com essas crianças (MENEZES, 1998, on-line)4. É necessário levar em conta o estilo de cada criança; não exagerar nas exigências; dar chance à criança de errar, acertar, falar; organizar sua rotina com regras e respeito. Esses são aspectos que auxiliam no desen- volvimento infantil. Às vezes, as pessoas não incluem suas crianças nas escolhas da família como: passeios, férias de verão, responsabilidades, decisões, opiniões e isso as torna excluídas de sua própria família e alheia à sua realidade. Outras vezes são dadas às crianças to- tal liberdade de decisão e escolha, o que também não é adequado para essa idade, porque as crianças não têm condições de se autogerenciarem, fazendo deles “pequenos reis”, aterrorizando seus súditos (os pais). Os laços estabelecidos entre a criança e seus pais desde o nascimento farão sentir agora que ela já fala, caminha, escolhe, opina. No entanto, se esses laços não se estabeleceram adequadamente, a relação co- meçará a demonstrar seus problemas. É quando se nota que tudo se transforma em conflito com o fi- lho e seus pais, e posteriormente com os professo- res. Vejamos como sutilezas subjetivas determinarão problemas nos relacionamentos futuros da criança (babás, coleguinhas, familiares, professores, e mais tarde chefe, cônjuge, filhos). O adulto geralmente não se coloca em outro ân- gulo para ver a criança, justamente por ter res- ponsabilidadesobre esses sintomas, e inconscien- temente sabe disso, embora se esforce para não saber. É provável que os adultos amem suas crian- ças, mas só o amor não basta para estruturar uma pessoa. É preciso envolvimento, investimento psíquico, acolhimento, aceitação, sensibilidade, olhar e escuta especial. DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR NA INFÂNCIA 26 A primeira relação significante que uma criança tem é com aquele que lhe cuida, geralmente a mãe. É nessa relação, relação primordial, que se construi- rão todas as outras relações e percepções que propi- ciarão o desenvolvimento harmônico. Muitas vezes, esse laço no início da vida das crianças acontece de forma desastrosa, não adequada ou na pior das hi- póteses não acontece. Dessa forma, teremos a ori- gem de transtornos psicomotores. O corpo não se organiza quando o fio condutor de toda a relação estiver frágil ou partido. A men- sagem dos pais chega até a criança, mas de forma tênue ou defeituosa. Assim, o laço do outro com a criança se mostrará insuficiente. Somos todos ape- nas semelhantes entre nós, com pequenas diferenças que nos marcarão como sujeitos, cada um com seu estilo e peculiaridade. É no corpo que as dificulda- des psíquicas mostrarão seus efeitos. Muitas crian- ças mostram atraso no desenvolvimento sem esta- rem afetadas por nenhuma patologia orgânica, e sim por dificuldades no laço com seus pais, que neste momento não dão conta de sustentar psiquicamente seu rebento. Sustentar a criança enquanto pequena é muito importante para a sua estruturação global. Sustentar no sentido simbólico, dar conta de estruturar o que futuramente terá condições de se estruturar sozinho, mas que por enquanto é frágil e indefeso demais. É emprestar-se à criança como continente e que lhe dê proteção e segurança. E sus- tentar, no real, é cuidar da sobrevivência do bebê, da alimentação, da higiene, de proteger das intempéries etc.; porque no início da vida, a pele, assim como os outros sentidos, são de fundamental importân- cia. Por essas vias que os bebês decodificam todos os estímulos que chegam do ambiente, e todas as sensações são resumidas em duas; dor ou prazer, de- pendendo disso o seu bem-estar. A frase de Jacques Lacan, “o bebê é no Outro”, trata dessas questões. A dose de como organizar a vida de uma criança se tor- na, então, uma dúvida constante, entremeada por cer- tezas momentâneas. É essa dúvida que abre na criança a possibilidade de “ser”. Quando o outro primordial (a mãe) vacila, diminui a sua certeza, consequentemen- te, o pequeno ser poderá se mostrar e se apossar do seu jeito. Características como ser mais chorão, menos guloso, mais calmo, mais alerta, mais tranquilo etc., é que tornarão única essa criança, que há poucos dias era apenas uma hipótese no imaginário dos pais. 27 EDUCAÇÃO FÍSICA É a própria criança que mostrará aos adultos que lhe rodeiam como deverão cuidar dela. Quando insis- timos em não notar o que as crianças nos mostram, te- remos o início dos transtornos e das psicopatologias. Na escola, muitas vezes, essas crianças não serão ouvidas, não serão percebidas, não serão valoriza- das. Chegarão carregando suas formas peculiares e às vezes desastrosas de relação. Muitas vezes é o con- trário, o que chega na escola são crianças hiperexi- gidas, hiperesperadas, hiperautoritárias, hiperter- roristas. Logo, também, se percebe a maneira como foram construídas, no qual, talvez, o objetivo núme- ro um seria que a criança fosse melhor que todas, para que os pais fossem, assim, melhores também na opinião das demais pessoas do círculo de convi- vência. Onde não pode ser feito um projeto adequa- do, um pedido possível, um investimento razoável, aparecerão crianças fora do comum; que não param, que não ouvem, que não respeitam, que não têm afe- to, que não se sentem valorizadas, e que exigem que alguém lhes ajude a organizar um projeto possível para elas. Aqui o professor e o terapeuta poderão co- laborar, adequando com os pais uma nova posição para a criança que sofre muito e apresenta sintomas. Nova posição significa adequar sentimentos e atitu- des para com a criança. Por exemplo: uma criança que é tratada como bebê, está mal posicionada em sua família. Ou uma criança que tem a função de salvar um casamento ou coisa parecida, tem uma função impossível para ela. É preciso retirá-la desse lugar em intervenção terapêutica junto aos seus pais. As crianças que causam dificuldades na escola, que enlouquecem professores e funcionários, estão gritando por ajuda. Seu mal-estar não permite que ela se mostre tranquila, aprendendo, brincando, criando, como as outras crianças. A posição que lhe cabe, e que lhe coube até então, mostra uma ina- dequação que causa uma tremenda dor psíquica, fazendo com que ela se agite ou se deprima, se an- gustie e assim não aprenda, não acredite que possa arcar com suas responsabilidades, e, assim, não reaja frente aos deveres escolares; acreditam que os outros não gostam dela, e, por isso, respondem geralmente de forma agressiva. O professor tem a tarefa de ver a criança além do sintoma e abrir um canal de escuta, ter um olhar que “fisgue” a criança e que faça com que ela se sin- ta importante e que esteja incluída na preocupação da professora, dessa forma poderá fazer algo inte- ressante para ela (representante dos pais). Quando conseguimos “fisgar” essa criança, é porque fomos suficientemente sensíveis e acolhedores. As crianças com sintomas começam a se de- sarmar, a ouvir o outro e a tentar responder a essa demanda de amor. Isso pode ressignificar tantas marcas intoleráveis até então. Por isso, o profes- sor tem o que fazer! Não angustiar-se vendo como impossível essa tarefa, e contar com a assessoria de profissionais de outras áreas, poderá colaborar enormemente para a melhor condução dessa pro- blemática escolar. 28 considerações finais N esta primeira unidade do livro, vimos alguns aspectos muito rele- vantes para a prática docente de uma forma geral. Saber compre- ender os alunos, motivá-los, e colaborar com seu desenvolvimento são tarefas importantes. As leituras e aprendizados feitos até aqui deverão ser ampliados. Sempre é necessário, para conhecermos bem um determinado tema, que busquemos ou- tros autores que falem de outras formas, e, assim, formularmos nossas próprias convicções, mas sempre baseados em autores respeitados, que já desenvolveram bem o assunto, e permitam sua compreensão. Caso não façamos com cuidado e rigor nossa formação, corremos o risco de identificar apenas alguns pontos su- perficiais das questões e não conheceremos com a profundidade necessária para termos condições de avaliar e concluir melhor. A intenção dessa unidade foi mostrar o quanto as subjetividades compare- cem no trabalho do professor. A do próprio aluno, do professor, das famílias e social de uma forma ampliada. Isso será a base para compreender os demais aspectos do desenvolvimento psicomotor. É necessário ter conhecimento sobre a criança, seu desenvolvimento, a escola, a postura do professor, para então podermos seguir adiante estudando sobre a história da psicomotricidade, autores relevantes, o desenvolvimento psicomotor, as atividades práticas, o brincar, os problemas psicomotores e finalmente a ava- liação psicomotora. 29 atividades de estudo 1. Para Jerusalinsky (1999, p. 28) “o desenvolvimento de um bebê humano não opera por simples automatismos biológicos”. Nesse trecho, a autora está afirmando que: a. O desenvolvimento do bebê segue de forma cronológica com base na biologia. b. O desenvolvimento do bebê está relacionado com o tônus muscular, sua estrutura física. c. O desenvolvimento do bebê envolve a linguagem, sua constituição psíquica para além da questão apenas biológica. d. O desenvolvimentodo bebê possui uma cronologia evolutiva determinada na biologia. e. O automatismo é um aspecto importante no desenvolvimento do bebê. 2. A constituição da criança, no seu desenvolvimento, envolve uma série de laços reais, imaginários e simbólicos que fazem parte da organização do seu psiquismo. Nesse sentido, a organização psíquica envolve: I. A realidade familiar e especialmente a vivência subjetiva. II. A simbolização, que é uma atividade de representação, na organização dos conte- údos psíquicos. III. A social, pois é pelo social que se aprende a cultura e se insere no sistema simbólico da linguagem. IV. Os laços simbólicos, fruto da relação com os tutelares. Assinale a alternativa correta: a. Apenas I e II estão corretas. b. Apenas II e III estão corretas. c. Apenas I está correta. d. Apenas II, III e IV estão corretas. e. Todas estão corretas. 30 atividades de estudo 3. Lacan pretendia dar conta da relação do homem com tudo que o determi- na, assim estabeleceu diversos conceitos como o conceito de Outro, que significa: a. Apenas a figura do pai e da mãe. b. Pessoas do nosso convívio e a própria cultura. c. Apenas os professores e amigos. d. A mãe, que é a pessoa mais próxima da criança. e. As pessoas do convívio escolar. 4. Para você, querido(a) aluno(a), que está iniciando os estudos sobre o de- senvolvimento psicomotor, cabe um questionamento para seu autoconhe- cimento: o que determinou e determina quem você é? 5. Na turma de um professor do ensino fundamental, tem uma criança que é constantemente rotulada por seus pares como: bagunceiras, hiperativa, agitada e com dificuldade de atenção. Acerca do papel do professor, diante de estratégias que visam a inclusão do aluno, avalie as afirmações a seguir. I. O professor deve encaminhar esse aluno a uma turma especial com alu- nos que apresentem as mesmas dificuldades. II. O professor deve elaborar atividades para que o aluno participe e se en- volva com a turma. III. O professor necessita olhar para o aluno além dos sintomas que ele apre- senta, para acolher o aluno. IV. O professor necessita humanizar a relação com o aluno e do aluno com a turma. Assinale a alternativa correta: a. Apenas I e II estão corretas. b. Apenas II e III estão corretas. c. Apenas IV está correta. d. Apenas II, III e IV estão corretas. e. Todas estão corretas. 31 LEITURA COMPLEMENTAR O EIXO DO CORPO Esteban Levin A temática do eixo corporal nas crianças pequenas remete-nos diretamente a interro- gar-nos sobre o papel da postura e da representação no desenvolvimento psicomotor de um sujeito. Acreditamos que a primeira postura, o primeiro eixo corporal, organiza-se e delimita-se a partir do toque e da postura do Outro materno. É nessa cena de diálogo tônico-ges- tual e corporal que o recém-nascido sustentará não apenas seu corpo, mas também sua imagem. Nesse cenário simbólico, os movimentos arcaicos do bebê serão tomados como gestos, o amamentar será tomado como um ato de amor, o grito será transfor- mado em chamado e a gestualidade refl exa se confi gurará como um dizer. Nessa ver- dadeira metamorfose corporal e gestual, o eixo corporal começará a funcionar como representação e como lugar em que se instala o desejo do Outro. A ideia de eixo corporal remete-nos ao que se perguntava Diderot no século XVIII: “se lhe perguntamos o que é um corpo, você responderá que é uma substância, um vo- lume impenetrável, fi gurado, colorido e móvel. Mas separe desta defi nição todos os adjetivos. O que restará para este ser imaginado que você chama de substância?” O eixo do corpo é um polo integrador das funções cinestésicas e labirínticas, que orde- na o corpo ao promover o equilíbrio em relação à posição postural, espacial e temporal. A sensibilidade cinestésica refl ete a posição do corpo em relação à força da gravidade. O que marca a importância dessa sensibilidade na orientação e no equilíbrio do corpo no espaço. O sentido cinestésico do equilíbrio postural (sensações correspondentes aos músculos, às articulações e aos tendões) junto com o órgão do equilíbrio localizado no ouvido in- terno determinam o modelo neuromotor da orientação e do equilíbrio corporal, dando lugar à função do eixo. O eixo do corpo em sua função de receptáculo (parafraseando Jean Bergès) transfor- ma-se em um operador fundamental para o desenvolvimento psicomotor e para sua constituição subjetiva. Nas crianças pequenas, o efeito de apaziguamento gerado pelos movimentos de embalar e movimentar que o Outro realiza acompanhado pela sua voz (canção de ninar) abre o caminho para o que inteligentemente Dupré chamou de “o lado negativo da motricidade” (o relaxamento). O ritmo do impulso motor é delimitado por um estado de contração muscular (o lado positivo da motricidade) e um estado de distensão (o lado negativo da motricidade); 32 LEITURA COMPLEMENTAR entre essas variações tônicas motoras e suas referências posturais (em especial, em relação com o eixo corporal) oscila a motricidade de um sujeito. Desse ponto de vista, o lado “negativo” da motricidade não é a passividade, mas o que nomeia a síncopa, o silêncio necessário para que o movimento se organize em um ato gestual. Tanto os estados de tensão permanente (as paratonias) como os estados de hipotonia generalizada situam a impossibilidade do desdobramento psicomotor, especifi camen- te no concernente ao ritmo do impulso motor necessário para o “exercício” de seu funcionamento e do fazer signifi cante. As crianças com sintomatologia psicomotora nos “fazem ver” a queda, o desmoronamen- to do eixo corporal, dramatizado em sua desorientação espacial sem limites representa- tivos nos quais sustentar-se para situar-se e diferenciar-se. Em parte, esta é a demanda que a criança enuncia nesse singular “fazer-se ver” na relação com o olhar do Outro. O impulso motor desprende-se da postura. A partir disso, o eixo do corpo se confi gura- rá como a “coluna vertebral” do postural. Esse primeiro eixo corpóreo é ritmado pelas presenças e ausências que o Outro ma- terno demarca em seus cuidados periódicos, nas trocas e giros posturais que realiza com o recém-nascido, nos jogos e imitações corporais, no manejo do corpo. Tudo isso produz como efeito sensações cinestésicas e labirínticas que se incorporam e ressoam no bebê como uma primeira musicalidade estética, um ritmo que marcará o encontro- -desencontro com o Outro. O impulso motor de um sujeito, em seu correspondente tônico, responderá a esse rit- mo “estético” delimitado pelas presenças e ausências, abrindo o caminho à representa- ção, que, desse modo, fi cará ligada ao eixo do corpo em sua função de receptáculo do toque, do dizer e do movimento que o Outro imprime no corpo. Nesse sentido, o ritmo periódico e melódico (limitado pelo lado negativo, silencioso da motricidade) do movimento corporal tem uma “sonoridade” musical que institui um tempo: o tempo orientador no encontro com o Outro que marcará o impulso motor do infans e, por que não?, sua temporalidade. O domínio da motricidade estrutura-se, em grande medida, a partir desse laço com o Outro que transforma o movimento em gesto e em imagens lúdicas. O sistema motor fi ca assim limitado pela dimensão psíquica que constitui a direcionalidade e a orienta- ção do sistema. Daí o psicomotor. Fonte: Levin (2000, on-line)5. 33 EDUCAÇÃO FÍSICA No site Criança e Natureza, você terá sugestões de como envolver a criança no ambiente na- tural e potencializar suas experiências por meio do brincar livre e exploratório. Acesse o link: <http://criancaenatureza.org.br/>. A Infância em Cena Esteban Levin Editora: Vozes Sinopse: que infl uência tem a estrutura e o desenvolvimento psicomotor para o desenvolvimentoda criança? A formação - construção, desenvolvimento, amadurecimento e crescimento - do corpo e do corpo subjetivado são determinadas por uma infi nidade de atividades como desejar, agarrar, engatinhar, balbuciar etc. O livro detém sua análise a essa fase como um todo, a qual começa a estruturar-se o universo simbólico e o sujeito. O autor apresenta caminhos inexplorados no campo da infância, na interrogação acerca do sujeito e do seu corpo. Como Estrelas na Terra Aamir Khan, Darsheel Safary, Tisca Chopra Direção: Aamir Khan País: Índia Sinopse: o jovem Ishaan tem muita difi culdade para se concen- trar nos estudos, e mal consegue escrever o alfabeto. Depois de diversas reclamações da escola, o pai, que acredita que Ishaan não faz as tarefas por falta de compromisso, decide levá-lo a um internato, o que leva o menino a entrar em depressão. Contudo, um professor substituto de artes, Nikumbh, logo percebe o problema de Ishaan e entra em ação com seu plano para devolver nele a vontade de aprender e, sobretudo, viver. 34 referências Freud, S. Obras psicológicas completas de Sigmund Freud: edição standard brasi- leira, com comentários e notas de James Strachey. Rio de Janeiro: Imago, 1996. Edi- ção de 2006. Volume XIX, “O ego e o id e outros trabalhos (1923-1925), p. 261-269. ______. Esboço de psicanálise, 1940. In: Edição standard brasileira das obras psi- cológicas completas de Sigmund Freud, vol. XXIII. Rio de Janeiro: Imago, 1996. JERUSALINSKY, J. Enquanto o futuro não vem: A psicanálise na clínica inter- disciplinar com bebês. Salvador: Ágalma, 2002. JERUSALINSKY, A. N. Psicopatologia dos bebês: entre as neurociências e a psi- canálise. In D.C. Barbosa & E. Parlato-Oliveira (Orgs.). Psicanálise e clínica com bebês: sintoma, tratamento e interdisciplina na primeira infância (p. 23-32). São Paulo: Ed. Instituto Langage, 2010. LACAN, J. (1964- 1965). O seminário. Livro 11. Os quatro conceitos fundamen- tais da psicanálise. Texto estabelecido por Jacques Alain Miller. Versão brasileira de M. D. Magno. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1979. MANNONI, M. Educação impossível. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1988. MIRANDA, M. G. Psicanálise e Educação: o que revela um sintoma na apren- dizagem? MARINGÁ. Revista Maringá Ensina. SEDUC, ago./set./out. 2011, n.20, p. 44-47. MILLOT, C. Freud antipedagogo. Rio de Janeiro: Zahar, 1987. PROUST, M. Em busca do tempo perdido - Do lado de Swan. Relógio D’água, Lisboa, 2003. Tradução: Pedro Tamen. SILVA M. A. A.; SILVA, L. B. da; LEAL, A. L. G. A importância da Relação Hu- manizada professor-aluno para a superação das dificuldades de Aprendizagem. II Encontro Internacional de Educação e Espiritualidade. Recife, 2014. WALLON, H. Psicologia e educação da criança. Lisboa: Veiga, 1979. Referências On-line 1 Em: <www.dicionarioetimologico.com.br>. Acesso em: 11 mai. 2017. 2 Em: <https://pt.wikipedia.org/wiki/Jacques_Lacan>. Acesso em: 11 mai. 2017. 3 Em: < http://www.profala.com/artpsico41.htm>. Acesso em: 11 mai. 2017. 4 Em: <https://www.researchgate.net/publication/48928933_Dimensoes_psiqui- cas_e_sociais_da_crianca_e_do_adolescente_em_situacao_de_rua>. Acesso em: 11 mai. 2017. 5 Em: <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1415- 71282000000100012&lng=pt&nrm=iso>. Acesso em: 11 mai. 2017. 35 gabarito 1. C. 2. E. 3. B. 4. R: Você poder ter respondido: um conjunto de experiências vividas, seu relacionamento com sua mãe, pai e familiares e também a cultura de forma geral, mas cada um tem uma história única e especial na qual determinou quem você é hoje. 5. D. Professora Dra. Mara Cecília Rafael Lopes Professora Esp. Maria Gorethe de Vasconcelos Miranda Plano de Estudo A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade: • Biologia e subjetividade humana • O Brincar: principal ferramenta da infância Objetivos de Aprendizagem • Compreender a importância do brincar na estruturação da criança. • Valorizar o brincar infantil como instrumento pedagógico. • Perceber a fundamental ligação entre orgânico e subjetivo, que une a biologia e o psiquismo. O BRINCAR E O DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR II unidade INTRODUÇÃO N esta unidade estudaremos sobre a importante aliança entre o biológico e a subjetividade humana. Veremos como o brin- car é fundamental na infância e como a criança se coloca no mundo por meio desta atividade, organizando sua relação interpessoal e sua aprendizagem. A mãe, o outro primordial, inaugura a criança no campo do brincar, colaborando para a independência psíqui- ca do bebê. As variadas formas do brincar servem como ferramenta para a estruturação psíquica, favorecendo o psicomotor e o cognitivo. O brincar colabora na estruturação corporal impulsionando o De- senvolvimento Psicomotor. Nenhuma dificuldade existirá para a criança diante do entusiasmo de descobrir, de construir e realizar seus intentos quando está motivada pelo brincar. É verdade que houve uma grande modificação na infância e no brin- car ao longo da história, mas este continua sendo primordial na infância. Na escola devemos reservar cuidadosamente os espaços para o brincar, valorizar e respeitar essa importante atividade infantil. Também poderemos compreender o quanto o brincar é organizador do sujeito, trazendo formas civilizadas e ordenadas de convivência, sen- do uma forma de diminuir a indisciplina na escola e na vida. O excesso de intelectualismo, isto é, a insistência em tornar as crian- ças precocemente intelectualizadas, muitas vezes, impede o brincar nas escolas, em tempos que o brincar ainda serviria muito na formação de nossas crianças. É preciso que os professores as incentivem, e saibam que essa fase não termina com a alfabetização dos alunos. Pelo contrário, vai até o final da infância e início da adolescência, quando, então, o brin- car será substituído pela atividade mais intelectualizada. Em cada um de nós, porém, reside ainda a criança que amou brincar. Com ela, permane- ceremos para favorecer o brincar de todas as crianças que convivemos, sejam alunos, filhos, ou amigos. DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR NA INFÂNCIA 40 Biologia e Subjetividade Humana 41 EDUCAÇÃO FÍSICA Os aspectos orgânicos se referem ao aparato biológi- co humano. Sistema nervoso central, músculos, ossos, tendões, órgãos, membros, articulações, fisiologia, anatomia, juntamente com o subjetivo, ou seja, com os aspectos psíquico e cognitivo, serão a base da estru- turação humana. Podemos dizer que o orgânico sus- tentará o simbólico. Sabemos que o sujeito se constitui nessa necessária união do orgânico e da subjetividade, dessa forma os pais oferecem a hereditariedade orgâni- ca e também sua hereditariedade subjetiva. Durante sua existência, a criança participará do seu processo de estruturação primeiramente de for- ma passiva, pois será afetada pelo desejo de seus pais, seus projetos, e tudo mais que dirigirem ao filho, mas logo depois, de forma ativa, pois dará retorno aos pais, afetando-os também, como uma usina, ali- mentando e retroalimentando ambas as partes, pais e filho. Toda essa rede simbólica e imaginária criada pela família em direção da criança a tornará um se- melhante. Tudo foi herdado dos pais, mas, ao mesmo tempo, modificado pela criança, que também será protagonista de sua história. Nos primeiros meses de vida, a criança vive seu corpo com sensação de despedaçamento, pois ainda não há recursos que lhe dê a sensação de unidade. O orgânico e o subjetivo imaturos tornam difíceis seus primeiros meses, provocando choros e dificuldades constantes de toda ordem: alimentação, digestão, defecação, aconchego, mal-estar, dor e aflição. Por isso, a forma como seu corpo é tomado pelo adul- to responsável fará toda a diferença nos progressos subsequentespara as próximas fases. Como é tocado, olhado, acalmado, pensado? Dependerá, portanto, da saúde psíquica familiar, do modo como seus pais se sentem quando confrontados com essas questões. Quanto menor a angústia dos adultos, mais harmo- niosa e prazerosa serão as primeiras vivências da criança e melhor será o desenvolvimento infantil (Zveiter; Pongianti, 2006). Quando, então, já for possível à criança ter al- gumas representações de si mesma, sua imagem unificada e suas atividades serão organizadas, seu esquema corporal lhe dará possibilidades de ação, e as aprendizagens se farão notar sem maiores dificul- dades. Estará aprendendo e apreendendo o mundo, chegando a organizar e efetivar suas primeiras ações pensadas. Enquanto isso, precisarão de colo, de acei- tação, de olhar motivador, de sustentação. O outro semelhante os impulsiona aos novos progressos em todas as áreas do desenvolvimento. Assim, as próxi- mas etapas da vida dependem das primeiras vivên- cias infantis. As demais relações dependem da pri- meira relação com os pais ou com quem os marcou significativamente. Quanto ao desenvolvimento psicomotor, tam- bém precisamos entender que a criança necessita de vivências motoras que resultem em ações prazero- sas e que o movimento colabore para a descoberta do mundo. Para Aucouturier (2007), o prazer é um conceito fundador no desenvolvimento infantil, abre a criança ao mundo, por outro lado o desprazer o afasta, o fecha sobre si mesmo. DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR NA INFÂNCIA 42 Assim, por exemplo, a organização do tônus muscular não depende somente de sinergias e automatismos neurofisiológicos, mas sim do tipo de tratamento que o Outro na posição ma- terna outorgue aos estímulos internos que as- sediam a criança. Destacados psicomotricistas, como André Lapierre, Bernardo Aucouturier, P. Voyer e outros assinalaram como decisiva a in- tervenção do outro possibilidade de uma efetiva maturação harmônica do tônus muscular. Em outra direção, mas convergindo neste conceito, J. Ajuriaguerra assinalou a importância do “di- álogo tônico”, ou seja, a necessidade para que se opere um desenvolvimento neste campo, de que a mãe signifique que no campo da linguagem (dimensão especificamente psíquica) o que o bebê manifesta em suas variações tonico mus- culares. (JERUSALINSKY, 2010, p. 24). Portanto, exercícios repetidos e enfadonhos não correspondem à necessidade infantil. A Psicomo- tricidade não trata com exercícios motores que nos pareçam bonitos ao olhar externo, e sim, com ativi- dades significantes e ricas de simbolismo, ajudando a criança a descobrir-se e descobrir o mundo à sua volta. Do mais simples ao mais complexo e do mais natural ao mais elaborado e coordenado. Podemos pensar que o brincar espontâneo é o mais importante na infância, e é esse exercício o mais inte- ressante. Seria então o “exercício do desejo”, ou seja, aqueles movimentos que favorecem a organização psí- quica, auxiliando na solução de questões pertinentes à etapa de estruturação da criança, e por consequência levando à organização da corporeidade e do psiquismo. O movimento será proporcional à motivação, à curiosidade e à necessidade de descobrir todas as coisas do mundo, para, assim, compreendê-lo. A criança busca aquelas atividades que no momento concorrem para as suas necessidades. Basta observar com atenção e cuidado a atividade infantil para com- preensão de seu momento global. Qual o papel do brincar, especialmente nessa fase da vida? Por meio do brincar, a criança constrói normas, aprende a regular suas ações, a se relacionar, interage, questiona, argu- menta, aprende a se organizar, comparti- lha ideias, cria e recria o mundo. O brincar espontâneo, autoiniciado pela criança, é fundamental na escola. É preciso permitir e prover essa forma de brincar. O brincar dirigido, conduzido pelo adulto, e o espon- tâneo, proporcionam o desenvolvimento e a aprendizagem. Ao brincar, a criança tem a possibilidade de conhecer seu próprio corpo, o espaço físico e social, as pessoas com as quais ela convive, conquistando a autonomia e construindo sua identidade. Terá oportunidade de aprender conteúdos conceituais, atitudinais e procedimentais nas mais diversas áreas do conhecimento e poderá desenvolver as linguagens oral, escrita, musical, plástica e a matemática. Fonte: Melo ([2017], on-line)1. SAIBA MAIS Se uma criança está agitada e agressiva, é natural que precise de atividades que lhe permitam exteriorizar esses sentimentos, e portanto, devemos colaborar para que as atividades lhe permitam organizar seus conflitos. Nesses momentos, não poderemos ofere- cer ações de concentração e calma e sim movimen- tos rápidos, fortes, que lhe exijam usar seu corpo de forma parecida com a sua situação. Após essas ati- vidades adequadas ao humor, a criança se mostrará extenuada e poderá, agora sim, se acalmar e relaxar com a ajuda do professor. 43 EDUCAÇÃO FÍSICA Ao contrário, se a criança se mostra desmotivada e apática, deveremos ir pouco a pouco aumentando a intensidade da atividade, de modo que a criança vá entrando numa proposta de ação e movimento. O importante é sabermos que nossos grupos não se- rão homogêneos, e que nenhum grupo será. E assim mesmo, ter, ao mesmo tempo, alternativas diferentes para um mesmo grupo. O professor deverá colaborar para que a criança perceba o modo como se sente, que “escute” seu cor- po, articulado ao seu desejo inconsciente, facilitando também nosso trabalho e nossas intervenções. Dessa forma poderemos colaborar com a corporeidade e suas significações, sua linguagem corporal. É com isso que trabalhamos em Psicomotricida- de, com a criança, seu movimento e sua história. Desde muito cedo, nos bebês, podemos obser- var sua estruturação, se estão se desenvolvendo bem, ou se mostram sinais de dificuldade ou dis- túrbios. Também é possível observar como está seu tônus, sua força muscular, seu equilíbrio, sua ini- cial coordenação, sua ação sobre os objetos, se seu olhar é expressivo, convocante, conectado, curioso ou apagado e sem graça, não se interessando pelas pessoas e os objetos à sua volta. Tudo isso nos serve de base para entendermos como está a criança em seu desenvolvimento. A prevenção da saúde infantil está em promo- ver vivências, relações, situações, para que a crian- ça escreva sua própria história e sua maneira única de existir, assim, socializando, respeitando regras de convivência e evoluindo como pessoa. DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR NA INFÂNCIA 44 Sabemos que o brincar é a atividade por excelên- cia na infância, e é verdade que a infância sofreu muitas modificações ao longo da história, mesmo assim, o brincar continua sendo a principal ferra- menta dessa fase. Os brinquedos foram registrados com o surgi- mento das civilizações, no período entre 3 mil e 2 mil a.C. no Antigo Egito, já tendo sido encontra- das bonecas em túmulos de crianças (MUSEU DO BRINQUEDO, [2017], on-line)2. O Brincar: Principal Ferramenta da Infância Essa informação demonstra a antiga e necessá- ria atividade infantil. Os brinquedos, objetos nor- malmente oferecidos pelas mães, têm a importante função de substituí-la, de facilitar a separação sim- bólica, e assim impulsionar seus filhos ao desenvol- vimento e independência. A criança de antes não gozava do status que tem hoje. Também o brincar não era valorizado como hoje. No livro História social da família e da criança, Ariès (1981) diz que a criança era vista como um 45 EDUCAÇÃO FÍSICA adulto em miniatura. Que tão logo pudesse exer- cer atividade produtiva, era tomada como adulto, passando assim da infância à vida adulta de forma abrupta, não havia adolescência. Hoje temos uma grande modificação na forma de brincar.Os brinquedos eletrônicos estão demasia- damente presentes, esmagando precocemente a pos- sibilidade de interação com os semelhantes. Um dos principais objetivos do brincar é oportunizar à crian- ça conhecer o mundo em que se vive, isso envolve imaginação, fantasia e convívio social. O problema é que a maioria dos jogos eletrônicos não apresentam tais características (SETZER, 2008, on-line)3. Isso traz uma devastação na estruturação subjeti- va do sujeito, que ainda sem as marcas significantes, principais inscrições simbólicas do psiquismo, se vê às voltas com um excesso de objeto que impede o laço com seu semelhante. Como é o caso de muitos bebês “intoxicados eletronicamente”, que ao chegarem à ida- de de falar, nem sequer adquirem a linguagem, fican- do em risco de desconexão definitiva com o Outro. Este é um claro sinal de distúrbio de desenvolvi- mento, pela ausência do outro semelhante, em subs- tituição ao objeto. Não há estruturação do sujeito, não há o brinquedo simbólico, não há outras signifi- cações, não há substituições nem metáforas, que são a riqueza do psiquismo humano. Caro(a) aluno(a), quais foram suas experiên- cias brincantes na infância? Quais os brinque- dos ou objetos que você se lembra? O que você sente quando recupera essas memórias? REFLITA QUANDO COMEÇAMOS A BRINCAR? Podemos pensar que as crianças brincam desde que são bebês, a partir de 2 meses em diante. E que a cada momento brincam de forma diferente. Não há “mesmice” no brincar. Suas mães ofere- ceram brinquedos a eles e para Winnicott (1975) essa é uma forma da relação mãe/bebê. É a “pri- meira possessão”, segundo o autor. As mães ofe- recem os brinquedos, esperando que seus filhos se relacionem com tais objetos. Assim, inicia-se a paixão pelo brincar. A mãe substitui sua inicial doação, significante e corporal, oferecendo ao seu bebê um objeto que é metáfora da cultura, que assim irá unindo mãe/ bebê de forma simbólica. Ela oferece objetos, que tem efeito organizador do bebê e que favorecerá seu crescimento e posterior separação em direção à autonomia física e psíquica. Aqui está o germe da criatividade, da imaginação e da criação. Trans- formando em objeto metafórico, o brinquedo tor- na-se recurso imaginário que permite a criança ir construindo seu ser. Agora, seu corpo e todos os recursos imaginários por ela produzidos, organi- zarão seu lugar para viver. Adquirirá a linguagem e seguirá fazendo metáforas, permitindo seu de- senvolvimento. O brincar de forma prazerosa apresenta signi- ficado para a criança, e tais significados dependem do uso de símbolos, por isso o brincar não deve ter o foco apenas no brinquedo, no objeto, ou na atividade realizada pela criança, mas na represen- tatividade do objeto e da brincadeira (WINNI- COTT, 1975). DESENVOLVIMENTO PSICOMOTOR NA INFÂNCIA 46 OS BRINQUEDOS ELETRÔNICOS E AS CONSEQUÊNCIAS NO DESENVOLVIMEN- TO INFANTIL Por essa forma de entender a estruturação humana, percebemos como o uso excessivo de eletrônicos é danoso ao desenvolvimento, e, na verdade, nem se enquadra no conceito de brinquedo, visto que este teria a função de unir e simbolizar as relações, e não de desconectar a criança dos seus semelhantes. Então, essa riqueza entre pais e filhos impulsiona o desenvolvimento, e não o contrário, como no uso solitário e sem as importantes marcas do Outro. O desenvolvimento das funções orgânicas por si não leva a criança a brincar e aprender. O que possibilita a evolução do sujeito são os aspectos psíquicos, as- sociados ao aparato orgânico. [...] problema do crescimento das crianças na sociedade contemporânea, sobrevém do fato de que o desenvolvimento social, as in- terações sociais da criança com o adulto e entre as próprias crianças, estão seriamente ameaçados pelo avanço tecnológico (FRIED- MANN, 1992, p. 25). Alguns fatores juntamente com o avanço tecno- lógico modificaram as formas de brincar como: a redução dos espaços físicos, pelo avanço das ci- dades, diminuição do tempo destinado ao brincar em que a televisão passou a fazer parte da roti- na das crianças, a indústria dos brinquedos, no qual o sonho é comprar e não produzir ou criar os brinquedos, a negação da necessidade do brincar pela escola e a sociedade como um todo (FRIED- MANN, 1992). O BRINCAR COMO INTERMEDIÁRIO NA RELAÇÃO MÃE/BEBÊ Antes mesmo de pensar racionalmente, os bebês brincam, se ligam aos objetos oferecidos pela mãe, e com eles fabricam sua existência. Para Winnicott (1975), “objetos transicionais” são os objetos eleitos pelo bebê, que facilitarão o “descolamento” do corpo materno e a futura autonomia. Assim, diz-nos Win- nicott, a percepção, a memória, a psicomotricidade, a linguagem, a socialização e a aprendizagem se or- ganizaram desde esse tempo precoce, de bebê, numa contínua evolução gradativa e complexa. [...] Winnicott interpretou o significado desses objetos e comportamentos da seguinte forma: se o bebê se apega de forma tão vigorosa ao objeto e precisa dele para dormir, isso mostra que o objeto está exercendo uma função funda- mental no psiquismo do bebê. Que função seria essa? Ora, quando se leva em conta que o gran- de “problema” com o qual o bebê está tendo que lidar após os seis meses de vida diz respeito ao afastamento gradual da mãe e, por consequ- ência, o reconhecimento dela como uma pes- soa, logo a função do objeto ao qual o infante se apega se torna mais clara. Se até então a mãe era tudo para o bebê (dependência absoluta), agora que ela começa a “falhar” (dependência relativa), eis que um dado objeto adquire para a criança um significado curiosamente absoluto – tanto é que o bebê precisa dele para sentir- -se seguro e dormir. O objeto, portanto, parece exercer, para o infante, a função de substituto da mãe (NÁPOLI, 2016, p. 1, on-line)4. Por isso, o brincar é tão estruturante do sujeito. Quanto melhor for a substituição simbólica da mãe por novos objetos significantes do mundo, melhor a 47 EDUCAÇÃO FÍSICA criança reagirá e menos dependente estará, favore- cendo, assim, a busca por novas vivências e apren- dendo sobre o mundo. A aprendizagem será tam- bém uma substituição do corpo da mãe por outros prazeres. O prazer inicialmente sentido na relação corporal com a mãe, agora se dirige a outras desco- bertas, com imensa curiosidade pelo novo. O corpo a corpo já não será tão necessário, e a criança partirá em busca das outras formas de prazer. JOGOS ESTRUTURANTES DO SUJEITO A partir da inicial estruturação da imagem corporal, e consequente progresso na movimentação e corpo- reidade do bebê, as brincadeiras de exploração do mundo se fortalecem. Dois jogos aparecem como fundamentais na estruturação do sujeito humano. São eles: o Jogo do Fort-Da e o Jogo de Faz-de-Conta. rolava para baixo de um móvel, ao que exclama- va “fort”. Seu neto demonstrava maior prazer no momento em que puxava e revia o brinquedo que havia desaparecido sob o móvel, e exclamava “da”. Freud deduz dessa observação que o menino vi- via agora ativamente o aparecer/desaparecer que até então fora vivido passivamente, quando no dia a dia os objetos somem, tal como a mãe, que ora está, e ora desaparece de seu campo visual. Nes- se momento é a criança quem faz o objeto desa- parecer. É ela quem produz a ação de aparecer e desaparecer, que brincava de fazer desaparecer e reaparecer os objetos. Esse jogo é notado em várias brincadeiras da criança. Trata-se de jogos de presença e ausência: abrir e fechar/ encher e esvaziar/ por e tirar. O co- nhecido jogo de cobrir o rosto do bebê com um pano e descobrir, dizendo: “Achou!”, é um exemplo clássico do Fort-da. E todos sabem que essas brin- cadeiras são vividas com imenso prazer por parte das crianças e dos adultos. Todas as brincadeiras
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