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1 CURSO DE DIREITO DIREITO DOS CONTRATOS PROFESSOR: LAURICIO ALVES CARVALHO PEDROSA Plano de aula 12 – Extinção dos contratos (CC, art. 472 a 480) 1. Noções Gerais a) Em regra, a extinção do contrato ocorre após o seu cumprimento, seja a execução instantânea, diferida ou continuada. 2. Extinção do contrato sem cumprimento 2.1. Causas anteriores ou contemporâneas à formação do contrato 2.1.1. Nulidade absoluta ou relativa a) A nulidade absoluta decorre da ausência de elemento essencial ao contrato, com ofensa a preceito de ordem pública. Pode ser alegada pelo interessado, pelo MP ou reconhecida de ofício pelo Juiz (CC, art. 168). b) A anulabilidade ou nulidade relativa decorre de imperfeição da vontade. Ex: Vícios do consentimento. Só pode ser argüida pelo contraente prejudicado (CC, art. 177). 2 2.1.2. Cláusula resolutiva a) Cláusula resolutiva expressa ou pacto comissório expresso 1 – a sentença possui efeito declaratório e ex tunc. EX: STJ, REsp n.237.539, 4ª T. rel. Min. Rosado de Aguiar. b) Todo contrato bilateral ou sinalagmático pressupõe uma cláusula resolutiva tácita (CC, art. 475 c/c CPC art. 497), que depende de interpelação judicial. 2.1.3. Direito de arrependimento a) Precisa estar previsto expressamente. b) Sujeita a parte à perda do sinal ou à sua devolução do sinal acrescido do equivalente, caso tenha sido também previsto (CC, art. 420). 2.2. Causas supervenientes à formação do contrato 2.2.1. Resolução a) Decorre da inexecução ou descumprimento por um dos contratantes de forma voluntária ou involuntária. 2.2.1.1. Resolução por inexecução voluntária a) Decorre do comportamento culposo de um dos contratantes. b) Produz efeitos ex nunc. c) A depender do contrato, poderá ser exigida a restituição da quantia paga, acrescida de perdas e danos. 1 “Apesar de todo contrato sinalagmático conter implicitamente cláusula resolutiva, nada obsta que os contratantes ajustem expressamente, para reforçar o efeito da condição, de tal forma que a inexecução da prestação por qualquer um deles importe na rescisão do contrato, de pleno direito, sujeitando o faltoso às perdas e danos, sem necessidade de interpelação judicial (CC, art 474, 1 parte, 127 e 128)”. DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro. Vol. 3. 25 ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 159. 3 2.2.1.1.1. Exceção de contrato não cumprido (CC, art. 476) a) Exceptio non adimpleti contractus. b) O contratante que não cumpriu sua obrigação não pode exigir o implemento da do outro. c) É necessário que as prestações sejam recíprocas e simultâneas. d) Trata-se de defesa indireta contra a pretensão ajuizada. e) Cabe também a exceção do contrato parcialmente cumprido ou exceptio non rite adimpleti contractus. f) Admite-se a restrição dos direitos das partes de se valerem do disposto no art. 476 do CC (cláusula solve et repete). 2.2.1.1.2. Garantia de execução da obrigação a prazo (CC, art. 477) a) Busca proteger o contratante contra alterações patrimoniais do outro (risco de insolvência). 2.2.1.2. Resolução por inexecução involuntária a) Decorrente de fato não imputável às partes. Ex: Fato de terceiro, caso fortuito e força maior. b) Impossibilidade superveniente, total e definitiva de cumprimento do contrato. c) O inadimplente não responde por perdas e danos, salvo se tiver se obrigado expressamente ou estiver em mora (CC, art. 393 e 399). 4 2.2.1.3. Resolução por onerosidade excessiva (Teoria da imprevisão) 2.2.1.3.1. Evolução histórica a) Ligada ao princípio pacta sunt servanda, constava em norma latente na Lei 48 do Código de Hamurabi. b) Traduz o ressurgimento da cláusula rebus sic stantibus do Direito Canônico. c) Caiu no esquecimento nos séculos XVII e XIX por conta da prevalência da ideologia liberal. d) Após a Primeira Guerra Mundial e a intensificação dos movimentos sociais, ganhou força novamente a teoria. e) A França foi o primeiro Estado a editar uma Lei (Falliot). 2.2.1.3.2. Noção geral a) Segundo tal teoria, em razão da ocorrência de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, que tornem o contrato comutativo, de trato sucessivo ou de execução diferida, excessivamente oneroso para uma das partes, permite-se sua resolução ou sua revisão judicial. b) Pode ser utilizada por quaisquer dos contratantes. 5 2.2.1.3.3. Elementos para aplicação da teoria da Imprevisão a. Vigência de um contrato comutativo, de execução diferida ou de trato sucessivo. b. Acontecimentos novos, imprevisíveis pelas partes e a elas não imputáveis. c. Alteração da base econômica objetiva do contrato. d. Onerosidade excessiva para uma ou ambas as partes. e. Nexo causal entre o fato superveniente e a excessiva onerosidade. 2.2.1.3.4. A Teoria da Imprevisão no Código Civil de 2002 a. Foi dado tratamento legal à matéria nos arts. 478 a 480. b. O art. 478 exige imprevisibilidade e extraordinariedade do evento. c. O art. 479 permite evitar-se a resolução através da revisão do contrato. f. Crítica ao art. 479: atribuiu-se tal faculdade apenas ao demandado. Entende-se ser aplicável também ao demandante. g. Consagrou-se também regra específica para os contratos unilaterais (CC, art. 480), podendo o devedor solicitar redução da prestação ou alteração do modo de executá-la. 6 2.2.1.3.5. Trata-se de norma de ordem pública, inderrogável pela vontade das partes (CC, art. 2.035) 2.2.2. Resilição a) Decorre da manifestação da vontade. 2.2.2.1. Distrato e quitação a) O distrato é uma espécie de resilição bilateral (acordo de vontades). b) Deve ser realizado pela mesma forma exigida para o contrato. c) “Retratação bilateral do contrato mediante novo contrato” (Messineo) 2.2.2.2. Resilição unilateral: denúncia, revogação, renúncia e resgate a) A resilição unilateral pode ocorrer nas obrigações duradouras, contra a sua renovação ou continuação. Ex: Locação. Nestes casos, denomina-se denúncia. b) No mandato, a resilição denomina-se revogação (feita pelo mandante) ou renúncia (feita pelo mandatário). Na enfiteuse, ocorre o resgate (CC/1916, art. 693). c) Independe de pronunciamento judicial e produz efeitos ex nunc. d) A depender da natureza do contrato, a resilição pode dar ensejo a perdas e danos ou à execução compulsória (CC, art. 473). 7 2.2.3. Morte de um dos contratantes a) Só acarreta a dissolução dos contratos personalíssimos 2 . 2.2.4. Rescisão a) Ocorre quando se verificar o instituto da lesão ou do estado de perigo. b) O Código Civil de 2002 não exige a malícia da outra parte na lesão (CC, art. 157). c) No estado de perigo, a situação de extrema necessidade é conhecida da outra parte (CC, art. 156). 2.3. Violação positiva do contrato a) A noção de violação positiva do contrato possui íntima relação com o princípio da boa-fé e o descumprimento dos deveres anexos. b) De acordo com Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald: “Com base na abstração e na generalidade do princípio da boa- fé, alarga-se o conceito de adimplemento. Adimplir significará atender a todos os interesses envolvidos na obrigação, abarcando tanto os deveres ligados à prestação propriamente dita, como aqueles relacionados à proteção dos contratantes em todo o desenvolvimento do processo obrigacional. O descumprimento dos deveres anexos provocará inadimplemento, com o nascimento da pretensão reparatória ou o direito potestativo à resolução do vínculo”3.2 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro: contratos e atos unilaterais. 9. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 207. 3 FARIAS, Cristiano Chaves de; ROSENVALD, Nelson. Direito dos contratos. Rio de Janeiro: Lúmen Juris, 2011, p. 606. 8 c) O desrespeito aos deveres de proteção, informação e cooperação provocaria a violação positiva do contrato. d) Menezes Cordeiro utiliza a expressão “perturbação das obrigações” para se referir às hipóteses de descumprimento definitivo, mora e cumprimento defeituoso 4 . e) O Enunciado 24 da I Jornada de Direito Civil reconhece a violação dos deveres anexos como espécie de inadimplemento: “em virtude do princípio da boa-fé, positivado no art. 422 do novo Código Civil, a violação dos deveres anexos constitui espécie de inadimplemento, independentemente de culpa”. 2.4. O adimplemento substancial a) A teoria do adimplemento substancial foi construída para “impedir o exercício do direito potestativo de resolução por parte do credor em face de um mínimo descumprimento da obrigação”5. b) Em determinadas situações, a extinção do contrato acarretaria um sacrifício desproporcional para o devedor, que já cumpriu substancialmente o contrato. c) Esse comportamento do credor é interpretado como um abuso do direito, em razão do desequilíbrio existente entre a 4 “A expressão ‘Direito da perturbação das prestações’ é uma tradução literal de Recht der leistungsstörungen. Ficariam abrangidas as hipóteses de incumprimento definitivo, de mora e de cumprimento defeituoso”. CORDEIRO, Antônio Menezes. Da modernização dodireito civil: aspectos gerais. Coimbra: Almedina, 2004, p. 100. 5 FARIAS; ROSENVALD, op.cit., p. 607. 9 vantagem auferida pelo titular do direito e o sacrifício imposto ao outro contratante (CC, art. 187). d) Caso o descumprimento seja minimamente gravoso e cause pouco prejuízo ao equilíbrio econômico-financeiro do contrato, veda-se o direito à resolução e admite-se apenas o pedido de indenização. e) Clóvis Couto e Silva se refere à substancial performance, que consiste no adimplemento tão próximo do resultado final que impede a possibilidade de se requerer a resolução 6 . f) A extinção dos contratos nessas situações exigiria de uma das partes um desequilíbrio excessivo e violaria o princípio da proporcionalidade. g) O tema foi objeto do Enunciado n. 361 das Jornadas de Direito Civil: “O adimplemento substancial decorre dos princípios gerais contratuais, de modo a fazer preponderar a função social do contrato e o princípio da boa-fé objetiva, balizando a aplicação do art. 475”. h) Em decisão recente, da Quarta Turma do STJ, foram ratificados os requisitos para a aplicação da teoria da substancial performance no Brasil: 6 COUTO E SILVA, Clóvis do. O princípio da boa-fé no direito brasileiro e português, p. 45. In: FRADERA, Vera Maria Jacob de (org.). O direito privado brasileiro na versão de Clóvis Couto e Silva. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 1997 apud FARIAS; ROSENVALD, op. cit., p. 608. 10 DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. RESCISÃO CONTRATUAL. REINTEGRAÇÃO NA POSSE. INDENIZAÇÃO. CUMPRIMENTO PARCIAL DO CONTRATO. INADIMPLEMENTO. RELEVÂNCIA. TEORIA DO ADIMPLEMENTO SUBSTANCIAL. INAPLICABILIDADE NA ESPÉCIE. RECURSO NÃO PROVIDO. 1. O uso do instituto da substancial performance não pode ser estimulado a ponto de inverter a ordem lógico- jurídica que assenta o integral e regular cumprimento do contrato como meio esperado de extinção das obrigações. 2. Ressalvada a hipótese de evidente relevância do descumprimento contratual, o julgamento sobre a aplicação da chamada "Teoria do Adimplemento Substancial" não se prende ao exclusivo exame do critério quantitativo, devendo ser considerados outros elementos que envolvem a contratação, em exame qualitativo que, ademais, não pode descurar dos interesses do credor, sob pena de afetar o equilíbrio contratual e inviabilizar a manutenção do negócio. 3. A aplicação da Teoria do Adimplemento Substancial exigiria, para a hipótese, o preenchimento dos seguintes requisitos: a) a existência de expectativas legítimas geradas pelo comportamento das partes; b) o pagamento faltante há de ser ínfimo em se considerando o total do negócio; c) deve ser possível a conservação da eficácia do negócio sem prejuízo ao direito do credor de pleitear a quantia devida pelos meios ordinários (critérios adotados no REsp 76.362/MT, QUARTA TURMA, j. Em 11/12/1995, DJ 01/04/1996, p. 9917). 4. No caso concreto, é incontroverso que a devedora inadimpliu com parcela relevante da contratação, o que inviabiliza a aplicação da referida doutrina, independentemente da análise dos demais elementos contratuais. 5. Recurso especial não provido. (STJ, Quarta Turma, REsp. n. 1581505 / SC. Rel. Min. Antônio Carlos Ferreira, DJ 18.08.2016, DJe 28.09.2016). (grifos nossos) ANEXO: CONTRATO. MÚTUO HIPOTECÁRIO. REVISÃO. Discute-se no REsp o interesse recursal em apelação que versa sobre cláusulas de contrato de mútuo hipotecário após a quitação de todas as prestações pelos recorrentes (mutuários). O tribunal a quo considerou prejudicado o recurso por falta de interesse recursal ao fundamento de que os mutuários haviam pago a totalidade das prestações do contrato. Observa o Min. Relator que a jurisprudência deste Superior Tribunal entende que o cumprimento da obrigação assumida em contrato de adesão não retira do mutuário o direito de discutir em ação revisional a legalidade das cláusulas contratuais, visto que o adimplemento pode ter ocorrido apenas para evitar sanções de natureza contratual e teria como finalidade não incentivar a inadimplência. Isso porque, segundo os precedentes deste Tribunal, se o entendimento fosse ao contrário, a inadimplência passaria a ser exigida como condição para a ação no direito contratual, além de que serviria de incentivo ao descumprimento dos contratos. Para o Min. Relator, não há justificativa para não considerar o direito à revisão após a quitação, uma vez que é mais vantajoso para o credor receber todo o contrato para só depois se submeter a uma demanda em que, se nela fosse vencido, teria de devolver o que foi pago a mais. Com esse entendimento, a Turma deu provimento ao recurso. Precedentes citados: REsp 293.778-RS, DJ 20/8/2001, e REsp 565.235-RS, DJ 9/2/2005. REsp 904.769-SP, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, julgado em 2/12/2010.
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