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TRANSTORNOS GLOBAIS DO DESENVOLVIMENTO CAROLINA POBLETE URRUTIA HARMBACHER 1 Identificar o transtorno global do desenvolvimento Esse grupo de transtornos é caracterizado por anormalidades qualitativas em interações sociais recíprocas e em padrões de comunicação e por um repertório de interesses e atividades restrito, estereotipado e repetitivo. Essas anormalidades qualitativas são um aspecto invasivo do funcionamento do indivíduo em todas as situações, embora possam variar em grau. Na maioria dos casos, o desenvolvimento é anormal desde a infância e, com apenas poucas exceções, as condições se manifestam nos primeiros 5 anos de vida. Em alguns casos, os transtornos estão associados, e são presumivelmente decorrentes, a alguma condição médica das quais espasmos infantis, rubéola congênita, esclerose tuberosa, lipoidose cerebral e anomalia da fragilidade do cromossoma X estão entre as mais comuns. Entretanto, o transtorno deve ser diagnosticado com base nos aspectos comportamentais, independente da presença ou ausência de quaisquer condições médicas associadas; qualquer condição associada deve, todavia, ser codificada separadamente. Ele é caracterizado por déficits em dois domínios centrais: 1) déficits na comunicação social e interação social e 2) padrões repetitivos e restritos de comportamento, interesses e atividades. Este diagnóstico está reservado a indivíduos com menos de 5 anos de idade, quando o nível de gravidade clínica não pode ser avaliado de modo confiável durante a primeira infância. Esta categoria é diagnosticada quando um indivíduo fracassa em alcançar os marcos do desenvolvimento esperados em várias áreas da função intelectual, sendo aplicada a pessoas que não são capazes de passar por avaliações sistemáticas do funcionamento intelectual, incluindo crianças jovens demais para participar de testes padronizados. É uma categoria que requer reavaliações após um período de tempo. CID-10 F84 Transtornos globais do desenvolvimento CID-10 F84.0 Autismo infantil CID-10 F84.1 Autismo atípico CID-10 F84.2 Síndrome de Rett CID-10 F84.3 Outro transtorno desintegrativo da infância CID-10 F84.4 Transtorno com hipercinesia associada a retardo mental e a movimentos estereotipados CID-10 F84.5 Síndrome de Asperger CID-10 F84.8 Outros transtornos globais do desenvolvimento CID-10 F84.9 Transtornos globais não especificados do desenvolvimento Identificar os subtipos de transtorno global do desenvolvimento, epidemiologia e quadro clínico Autismo infantil Um transtorno invasivo do desenvolvimento definido pela presença de desenvolvimento anormal e/ou comprometido que se manifesta antes da idade de 3 anos e pelo tipo característico de funcionamento anormal em todas as três áreas de interação social, comunicação e comportamento restrito e repetitivo. Epidemiologia: O transtorno ocorre em garotos três ou quatro vezes mais frequentemente que em meninas. A prevalência é estimada em 1 (um) em cada 88 nascimentos dando a comprovação de que o autismo tem se tornado um dos transtornos do desenvolvimento mais comum entre outras síndromes. Quadro clínico: Autismo atípico Um transtorno invasivo do desenvolvimento que difere do autismo em termos ou de idade de início ou de falha em preencher todos os três conjuntos de critérios diagnósticos. Assim, o desenvolvimento anormal e/ou comprometido se manifesta pela primeira vez apenas depois da idade de 3 anos e/ ou há anormalidades demonstráveis insuficientes em uma ou duas das três áreas de psicopatologia requeridas para o diagnóstico de autismo (a saber, interações sociais recíprocas, comunicação e comportamento restrito, estereotipado e repetitivo), a despeito de anormalidades características em outra(s) área(s). O autismo atípico surge mais frequentemente em indivíduos profundamente retardados, cujo nível muito baixo de funcionamento oferece pouca oportunidade de exibir comportamentos desviados específicos, requeridos para o diagnóstico de autismo; ele também ocorre em indivíduos com um grave transtorno específico do desenvolvimento da linguagem receptiva. O autismo atípico, então, constitui uma condição significativamente separada do autismo. Epidemiologia: Quadro clínico: TRANSTORNOS GLOBAIS DO DESENVOLVIMENTO CAROLINA POBLETE URRUTIA HARMBACHER 2 Síndrome de Rett Uma condição de causa desconhecida, até então relatada somente em meninas, a qual tem sido diferenciada com base em um início, curso e padrão de sintomatologia característicos. Tipicamente, um desenvolvimento inicial aparentemente normal ou quase normal é seguido por perda total ou parcial das habilidades manuais adquiridas e da fala, junto com uma desaceleração do crescimento do crânio, usualmente com um início entre 7 e 24 meses de idade. Estereotipias de aperto de mão, hiperventilação e perda dos movimentos propositais da mão são características particulares. O desenvolvimento social e lúdico é interrompido nos primeiros 2 ou 3 anos, mas o interesse social tende a ser mantido. Durante a metade da infância, ataxia e apraxia do tronco, associadas a escoliose ou cifoescoliose, tendem a desenvolver-se e algumas vezes há movimentos coreoateoides. Prejuízo mental grave invariavelmente é o resultado. Convulsões frequentemente se desenvolvem durante o início ou meio da infância. É uma condição progressiva que inicia depois de alguns meses daquilo que pode ser considerado um desenvolvimento normal. A circunferência da cabeça é normal no nascimento, e os pontos de referência do desenvolvimento são inexpressivos na fase inicial da vida. Entre os 5 e os 48 meses de idade, em geral entre 6 meses e 1 ano, ocorre uma desaceleração no crescimento da cabeça. Epidemiologia: Os dados disponíveis indicam que há uma prevalência de 6 a 7 casos por 100 mil meninas. Quadro clínico: A degeneração nas habilidades de comunicação, no comportamento motor e no desempenho social inicia por volta da idade de 1 ano. Os sintomas incluem ataxia, caretas, ranger os dentes e perda da fala. Hiperventilação intermitente e padrão respiratório desorganizado são características que se apresentam quando a criança está desperta. Movimentos estereotípicos das mãos, como perda do uso intencional, são comuns. Perturbações progressivas na marcha, escoliose e convulsões são ocorrências frequentes. Em geral, na fase intermediária da infância, as crianças apresentam espasticidade grave. Atrofia cerebral ocorre após uma redução na pigmentação da substância negra, sugerindo a presença de anormalidades no sistema dopaminérgico nigroestriatal. Durante os primeiros 5 meses após o nascimento, as habilidades motoras dos lactentes são compatíveis com a idade, sendo a circunferência e o crescimento da cabeça normais. As interações sociais têm a qualidade recíproca esperada. Entretanto, no período dos 6 meses aos 2 anos de idade, essas crianças desenvolvem encefalopatia progressiva com inúmeras características típicas. Com frequência, os sinais incluem a perda de movimentos manuais intencionais, que são substituídos por movimentos estereotipados, como retorcer as mãos; perda da fala previamente adquirida; retardo psicomotor; e ataxia. Podem ocorrer outros movimentos estereotipados das mãos, como lamber ou morder os dedos e toques ou tapinhas leves. A desaceleração no crescimento da circunferência da cabeça produz microcefalia. Todas as habilidades linguísticas se perdem, e as habilidades comunicativas expressivas e sociais parecem estabilizar nos níveis evolutivos entre 6 meses e 1 ano de idade. A coordenação muscular é precária, com desenvolvimento de marcha apráxica instável e rígida. As características associadas incluem convulsões em até 75% das criançasafetadas, assim como descobertas eletrencefalográficas desorganizadas com algumas descargas epileptiformes em quase todas as crianças mais jovens com síndrome de Rett, mesmo na ausência de convulsões clínicas. Respiração irregular é uma das características adicionais associadas, com episódios de hiperventilação, apneia e falta de ar. A respiração desorganizada ocorre na maior parte dos pacientes enquanto estão acordados; via de regra a respiração normaliza durante o sono. Muitos pacientes com síndrome de Rett também têm esclerose. Aparentemente, à medida que o transtorno progride, o tônus muscular altera de uma condição hipotônica inicial para espasticidade a rigidez. Embora as crianças com síndrome de Rett possam sobreviver em torno de uma década após o início do transtorno, depois dos 10 anos muitos pacientes têm de usar cadeira de rodas, com perda muscular, rigidez e quase nenhuma capacidade linguística. As habilidades de comunicação receptiva e expressiva e de socialização permanecem ao nível evolutivo de menos de 1 ano de idade. Outro transtorno desintegrativo da infância Um transtorno invasivo do desenvolvimento (outro que não a síndrome de Rett) que é definido por um período de desenvolvimento normal antes do início e por uma perda definitiva, no curso de poucos meses, de habilidades previamente adquiridas em pelo menos várias áreas do desenvolvimento, junto com o início de anormalidades características do funcionamento social, comunicativo e do comportamento. Muitas vezes há um período prodrômico de doença vaga; a criança se toma irrequieta, irritável, ansiosa e hiperativa. Isso é seguido por empobrecimento e então perda da fala e linguagem, acompanhado por desintegração do comportamento. Em alguns casos, a perda de habilidades é persistentemente progressiva (em geral quando o transtorno está associado a uma condição neurológica progressiva diagnosticável), mas mais frequentemente o declínio que ocorre em um período de alguns meses é seguido por um platô e então por uma melhora limitada. O prognóstico é usualmente muito pobre e a maioria dos indivíduos evolui para um retardo mental grave. Há incerteza sobre a extensão na qual essa condição difere do autismo. Em alguns casos, o transtorno pode ser demonstrado como decorrente de alguma encefalopatia associada, mas o diagnóstico deve ser feito pelos aspectos comportamentais. Qualquer condição neurológica associada deve ser codificada separadamente. TRANSTORNOS GLOBAIS DO DESENVOLVIMENTO CAROLINA POBLETE URRUTIA HARMBACHER 3 Epidemiologia: Avalia-se que o transtorno desintegrativo da infância seja menos comum que o transtorno do autismo diagnosticado anteriormente, embora os dados epidemiológicos tenham sido complicados pela utilização de uma grande variedade de critérios diagnósticos. As estimativas de prevalência variam em torno de 1 em cada 100 mil meninos. A proporção entre os sexos é calculada entre 4 a 8 meninos para 1 menina. Quadro clínico: O diagnóstico baseia-se em características que se enquadram na idade típica de início, no quadro clínico e no curso da doença. Os relatos de caso indicam que o início ocorre entre as idades de 1 a 9 anos, mas, na maioria, entre os 3 e 4 anos. Ainda que tenha sido previamente diagnosticado como uma entidade separada, o DSM- 5 considera o transtorno desintegrativo da infância um subgrupo do transtorno do espectro autista. O início pode ser insidioso durante vários meses ou repentino, com deterioração das capacidades em alguns dias ou semanas. Em alguns casos, as crianças se tornam inquietas, aumentam o nível de atividade e de ansiedade antes da perda funcional. As características básicas do transtorno incluem perda das habilidades de comunicação, regressão acentuada nas interações recíprocas e início de movimentos estereotipados e de comportamentos compulsivos. A presença de sintomas afetivos é comum, bem como ansiedade, e também a regressão nas habilidades de autoajuda, como o controle do intestino e da bexiga. Para receberem o diagnóstico, as crianças devem apresentar perda de habilidades em duas entre as seguintes áreas: comportamento linguístico, social ou adaptativo; controle do intestino ou da bexiga; atividades recreativas; e habilidades motoras. As anormalidades devem se apresentar nas duas seguintes categorias: habilidades de comunicação social recíproca e comportamentos restritos e repetitivos. Distúrbio convulsivo é a principal característica neurológica associada. Transtorno de hiperatividade associado a retardo mental e movimentos estereotipados Esse é um transtorno maldefinido de validade nosológica incerta. A categoria é incluída aqui por causa da evidência de que crianças com retardo mental grave (QI abaixo de 50) que apresentam problemas maiores de hiperatividade e desatenção, assiduamente mostram comportamentos estereotipados; tais crianças tendem a não se beneficiar com drogas estimulantes (ao contrário daquelas com um QI na faixa normal) e podem exibir uma reação disfórica grave (às vezes com retardo psicomotor) quando tomam estimulantes; na adolescência, a hiperatividade tende a ser substituída por hipoatividade (um padrão que não é usual em crianças hipercinéticas com inteligência normal). E também comum a síndrome está associada a uma variedade de atrasos do desenvolvimento, sejam específicos ou globais. Epidemiologia: Quadro clínico: Síndrome de Asperger Um transtorno de validade nosológica incerta, caracterizado pelo mesmo tipo de anormalidades qualitativas de interação social recíproca que tipifica o autismo, junto com um repertório de interesses e atividades restrito, estereotipado e repetitivo. O transtorno difere do autismo primariamente por não haver nenhum atraso ou retardo global no desenvolvimento cognitivo ou de linguagem. A maioria dos indivíduos é de inteligência global normal, mas é comum que seja marcantemente desajeitada; a condição ocorre predominantemente em meninos (em uma proporção de cerca de oito garotos para uma menina). Parece altamente provável que pelo menos alguns casos representem variedades leves de autismo, mas é incerto se é assim para todos. Há uma forte tendência para que as anormalidades persistam na adolescência e na vida adulta e parece que elas representam características individuais que não são grandemente afetadas por influências ambientais. Episódios psicóticos ocasionalmente ocorrem no início da vida adulta. A Síndrome de Asperger (SA) é muitas vezes difícil de dissociar do autismo e ainda apresentam dúvidas questionáveis ligadas à decisão de causas, não tendo sido confirmado claramente fatores que poderiam responder pelo aparecimento de uma ou de outra. As duas patologias têm seus principais sintomas relacionados a complicações nas áreas de interação social, da linguagem e do repertório comportamental, principalmente das habilidades sociais. A principal modificação, indicado entre ambas as patologias, refere-se ao fato de a SA não incluir desenvolvimento cognitivo e deficiência de linguagem. Epidemiologia: Quadro clínico: caracteriza-se por problemas no relacionamento social e por um padrão repetitivo e estereotipado de comportamento sem retardo ou aberração marcante no uso e no desenvolvimento da linguagem. As capacidades cognitivas e as habilidades adaptativas mais importantes são compatíveis com a idade, embora existam problemas na comunicação social. As crianças com esse transtorno que apresentavam comportamentos repetitivos, como bater palmas, caminhar na ponta dos dedos e brincadeiras estranhas, também foram identificadas com transtornos do espectro autista em uma idade mais jovem em relação àquelas que não tinham esses comportamentos. O diagnóstico anterior do transtorno de Aspergeré caracterizado pela deficiência e esquisitice da interação social, bem como por interesses e comportamentos restritos. Ao contrário do antigo transtorno do autismo, no transtorno de Asperger também não ocorrem retardos significativos no desenvolvimento linguístico e cognitivo. As características clínicas incluem pelo menos duas entre as seguintes indicações de deficiência social qualitativa: gestos comunicativos não verbais bastante TRANSTORNOS GLOBAIS DO DESENVOLVIMENTO CAROLINA POBLETE URRUTIA HARMBACHER 4 anormais e dificuldade para desenvolver relacionamentos com pares no nível esperado. A presença de interesses e de padrões de comportamentos restritos é comum; porém, quando forem sutis, podem não ser identificados de imediato ou talvez sejam considerados algo diferente em relação aos das outras crianças. De acordo com o DSM-IV-TR, indivíduos com o transtorno de Asperger não apresentam retardo linguístico, retardo cognitivo significativo sob o ponto de vista clínico ou deficiências adaptativas. Atualmente, o fenótipo clínico desse transtorno é inserido no contexto diagnóstico do DSM-5 para transtorno do espectro autista. Outros transtornos invasivos do desenvolvimento Transtorno invasivo do desenvolvimento, não especificado Essa é uma categoria diagnostica residual que deve ser usada para transtornos os quais se encaixam na descrição geral para transtornos invasivos do desenvolvimento, mas nos quais uma falta de informações adequadas ou achados contraditórios indicam que os critérios para qualquer dos outros códigos F84 não podem ser satisfeitos. Epidemiologia: Quadro clínico: Identificar os critérios diagnósticos (comparar DSM IV e DSM V), evolução e prognóstico dos tipos de transtorno global do desenvolvimento Autismo infantil Evolução e prognóstico: TRANSTORNOS GLOBAIS DO DESENVOLVIMENTO CAROLINA POBLETE URRUTIA HARMBACHER 5 Autismo atípico Evolução e prognóstico: Síndrome de Rett Evolução e prognóstico: A síndrome de Rett é progressiva, e os indivíduos que chegam até a adolescência ou a vida adulta funcionam em um nível cognitivo e social equivalente ao nível do primeiro ano de vida. Outro transtorno desintegrativo da infância Evolução e prognóstico: O curso do transtorno desintegrativo da infância é variável, sendo atingido um patamar na maior parte dos casos, com uma deterioração progressiva em casos raros e uma melhoria ao ponto de recuperar a capacidade de falar por meio de frases em situações ocasionais. A maioria dos pacientes permanece pelo menos com um retardo mental moderado. Transtorno de hiperatividade associado a retardo mental e movimentos estereotipados TRANSTORNOS GLOBAIS DO DESENVOLVIMENTO CAROLINA POBLETE URRUTIA HARMBACHER 6 Evolução e prognóstico: Síndrome de Asperger Evolução e prognóstico: Os fatores associados a bons prognósticos neste subgrupo do transtorno do espectro autista são QI normal e mais competências nas habilidades sociais. Os relatos de alguns adultos com transtorno de Asperger indicam a persistência de deficiências sociais e comunicativas, que continuam a se relacionar de uma forma tímida e aparentam ser socialmente desconfortáveis. Outros transtornos invasivos do desenvolvimento Transtorno invasivo do desenvolvimento, não especificado Evolução e prognóstico: Descrever a terapêutica medicamentosa para os transtornos do desenvolvimento Autismo infantil Autismo atípico TRANSTORNOS GLOBAIS DO DESENVOLVIMENTO CAROLINA POBLETE URRUTIA HARMBACHER 7 Síndrome de Rett O tratamento é sintomático. A fisioterapia produz alguns benefícios para a disfunção muscular, e o tratamento com anticonvulsivantes geralmente ajuda a controlar as convulsões. A terapia comportamental, em combinação com medicamentos, pode ser útil para manejar comportamentos autolesivos, como nos casos de tratamento do transtorno do espectro autista, bem como facilitar a regulação da desorganização respiratória. Outro transtorno desintegrativo da infância O tratamento possui os mesmos componentes do tratamento do transtorno do espectro autista. Transtorno de hiperatividade associado a retardo mental e movimentos estereotipados Síndrome de Asperger O tratamento de indivíduos que atendem aos critérios diagnósticos anteriores para transtorno de Asperger tem como foco promover a comunicação social e o relacionamento com pares. As intervenções iniciam com a meta de moldar as interações para que se tornem mais compatíveis com as dos pares. É comum crianças com transtorno de Asperger serem altamente verbais e apresentarem excelentes conquistas acadêmicas. A tendência a depender de regras e rotinas rígidas de crianças e adolescentes com esse transtorno pode se transformar em uma fonte de dificuldades e se tornar uma área sujeita a intervenção terapêutica. No entanto, o conforto das rotinas pode ser utilizado para promover hábitos positivos e melhorar a vida social das crianças afetadas. Com frequência, as técnicas de autossuficiência e de solução de problemas são muito benéficas para esses indivíduos em situações sociais e nos ambientes de trabalho. Algumas das técnicas aplicadas no transtorno do autismo provavelmente beneficiem pessoas afetadas pelo transtorno de Asperger com deficiências sociais graves. Outros transtornos invasivos do desenvolvimento Transtorno invasivo do desenvolvimento, não especificado Relacionar outras formas de abordagem terapêutica para os transtornos globais do desenvolvimento Intervenções evolutivas e comportamentais intensivas precoces 1. Modelo com base na UCLA/Lovaas. A base da intervenção manualizada e intensiva são técnicas derivadas da análise comportamental aplicada, as quais são administradas separadamente durante várias horas por semana. O terapeuta e a criança trabalham na prática de habilidades sociais específicas, no uso da linguagem e em outras habilidades-alvo para brincadeiras, com reforço e prêmios para a realização e domínio de habilidades. 2. Modelo com base no Early Start Denver Model (ESDM). As intervenções são administradas em ambientes naturais, como em creches, em casa e durante as brincadeiras com outras crianças. Via de regra, os pais aprendem a atuar como coterapeutas e fazem o treinamento em casa, enquanto as instituições educacionais se responsabilizam pelas intervenções. O foco principal dessas intervenções é o desenvolvimento de brincadeiras básicas e das habilidades de relacionamento, e as técnicas da análise comportamental aplicada são integradas às intervenções. Essa abordagem tem como objetivo o treinamento de crianças muito jovens, sendo aplicadas no contexto de suas rotinas diárias. 3. Abordagens de treinamentos para os pais. Essas abordagens incluem o Treinamento de Respostas Fundamentais, em que os pais aprendem a facilitar o desenvolvimento social e comunicativo no lar e durante atividades focando o domínio, pelas crianças, da via de acesso ou de comportamentos sociais fundamentais, na expectativa de que, após a obtenção desse domínio, ocorra uma generalização natural dos comportamentos sociais. Os pais e os membros da família são integrados nesse tipo de intervenção. Outras abordagens ao treinamento dos pais focalizam a aquisição da linguagem e, especificamente para eles, a frequência pode ser menor, como, por exemplo, uma vez por semana; entretanto, depois que os cuidadores forem treinados, as intervenções com a criança ocorrem durante todo o dia. Outro exemplo de abordagem detreinamento dos pais é o Hanen More Than Words Program. Abordagens às habilidades sociais 1. Treinamento de habilidades sociais. De maneira geral, esse tipo de treinamento é ministrado por líderes terapêuticos para crianças de várias idades no contexto de grupos com pares; elas são orientadas na prática de iniciar TRANSTORNOS GLOBAIS DO DESENVOLVIMENTO CAROLINA POBLETE URRUTIA HARMBACHER 8 conversação social, cumprimentar as pessoas, iniciar jogos e prestar atenção. Com frequência, a identificação e o controle das emoções são incluídos na prática por meio do reconhecimento e da aprendizagem sobre como classificar as emoções em determinadas situações sociais, como aprender a atribuir reações emocionais apropriadas a outras pessoas e como aplicar técnicas de solução de problemas sociais. O objetivo principal é que a prática em grupo permita às crianças aplicarem essas técnicas em ambientes menos estruturados e internalizarem estratégias para que possam interagir de forma positiva com os pares. Intervenções comportamentais e terapia cognitivo-comportamental para comportamentos repetitivos e sintomas associados 1. Terapia comportamental. A análise comportamental aplicada é bastante eficaz para reduzir alguns comportamentos repetitivos em crianças e adolescentes com transtorno do espectro autista. Recomenda-se a intervenção precoce para os casos de comportamentos repetitivos autolesivos; eventualmente, as intervenções comportamentais precisam ser combinadas com tratamentos farmacológicos para possibilitar o gerenciamento dos sintomas de forma adequada. 2. Terapia cognitivo-comportamental (TCC). Há evidências significativas com base em testes randomizados, controlados, que confirmam a eficácia das TCCs no tratamento dos sintomas de ansiedade, depressão e transtornos obsessivo-compulsivos em crianças. Existem menos testes controlados desse tipo de tratamento em crianças com o transtorno do espectro autista, embora haja pelo menos dois estudos publicados em que a TCC foi usada no tratamento de comportamentos repetitivos em indivíduos com esse transtorno. Intervenções para sintomas comórbidos no transtorno do espectro autista 1. Neurofeedback. A administração dessa modalidade de tratamento foi uma tentativa de influenciar os sintomas do transtorno de déficit de atenção/hiperatividade (TDAH), a ansiedade e o aumento na interação social por meio de jogos de computador ou outros em que o comportamento desejado seja reforçado, enquanto o uso de eletrodos permite monitorar a atividade elétrica no cérebro das crianças. O objetivo principal é influenciar a atividade das ondas cerebrais para prolongar ou produzir a atividade elétrica durante os comportamentos desejados. Essa modalidade ainda se encontra em fase de investigação no tratamento de sintomas do transtorno do espectro autista. 2. Gerenciamento da insônia no transtorno do espectro autista. A insônia é uma preocupação predominante entre crianças e adolescentes com esse transtorno, sendo possível melhorar essa condição por intermédio da administração de intervenções comportamentais e farmacológicas. A intervenção comportamental mais comum para insônia no transtorno do espectro autista se baseia na mudança do comportamento dos pais, primeiro em relação à criança no horário de dormir e durante toda a noite, de modo a remover o reforço e a atenção por estar acordada, e, em seguida, extinguindo gradualmente o comportamento de “permanecer acordada”. Vários estudos que utilizaram massagem terapêutica antes de dormir nessas crianças entre as idades de 2 e 13 anos melhoraram o adormecimento e a sensação de relaxamento. Intervenções educacionais em crianças com o transtorno do espectro autista 1. Tratamento e educação de crianças autistas e com deficiências relacionadas a comunicação (TEACCH) (do inglês Treatment and Education of Autistic and Communication- related Handicapped Children). O método TEACCH, desenvolvido originalmente na Universidade da Carolina do Norte, em Chapel Hill, na década de 1970, envolve a aprendizagem estruturada que se fundamenta na noção de que as crianças com transtorno do espectro autista têm dificuldade com a percepção; sendo assim, esse método de ensino incor pora diversos suportes visuais e um programa de apresentação de quadros para facilitar a aprendizagem de assuntos acadêmicos e de respostas apropriadas sob a ótica social. A organização do ambiente físico serve de suporte para a aprendizagem visual, e as atividades diárias são estruturadas para promover autonomia e relacionamento social. 2. Abordagens de bases amplas. Esses planos educacionais incluem uma mistura de estratégias de aprendizagem que utilizam análises comportamentais e focam também a reabilitação da linguagem. O reforço comportamental é aplicado aos comportamentos socialmente aceitáveis, durante o processo de aprendizagem de assuntos acadêmicos. O método TEACCH pode também ser incorporado a programas educacionais especiais mais amplos para o transtorno do espectro autista. 3. Abordagens computadorizadas e realidade virtual. A aprendizagem com base em abordagens computadorizadas e na realidade virtual é centralizada no uso de programas de computador, jogos e programas interativos com a finalidade de ensinar a aquisição da linguagem e as habilidades de leitura. Esse método dá às crianças uma sensação de domínio e fornece um tipo de instrução com base comportamental em uma modalidade que lhes é atrativa. O programa Let’s Face it! é um jogo computadorizado que ajuda a ensinar às crianças com transtorno do espectro autista o reconhecimento de rostos. Esse programa consiste em sete jogos computadorizados interativos com foco em mudanças na expressão facial, atenção na região facial dos olhos, reconhecimento facial holístico e identificação da expressão emocional. Um teste randomizado, controlado, que usou esse programa em crianças com transtorno do espectro autista produziu evidências indicando que, após 20 horas de treinamento, em comparação ao grupo-controle, as crianças treinadas melhoraram a capacidade de focalizar a região dos olhos de um rosto, assim como as habilidades analíticas e holísticas de processamento facial. Diversos estudos que usaram ambientes de realidade virtual para TRANSTORNOS GLOBAIS DO DESENVOLVIMENTO CAROLINA POBLETE URRUTIA HARMBACHER 9 ensinar habilidades sociais e interação social a essas crianças comprovaram seu valor. Um dos estudos criou uma cafeteria virtual para crianças com o transtorno em que elas tinham a oportunidade de fazer pedidos e de pagar pelas bebidas e pela comida navegando com o mouse do computador. Intervenções psicofarmacológicas O foco principal das intervenções psicofarmacológicas no transtorno do espectro autista é melhorar os sintomas comportamentais associados, em vez das características básicas do transtorno. Os sintomas-alvo abrangem irritabilidade, incluindo em um sentido amplo, agressão, ataques de mau humor e comportamentos autolesivos, hiperatividade, impulsividade e desatenção. Irritabilidade. Dois antipsicóticos de segunda geração, risperidona e aripiprazol, foram aprovados pela Food and Drug Administration (FDA) nos Estados Unidos para tratamento de irritabilidade em indivíduos com transtorno do espectro autista. Observou-se que a risperidona, um antipsicótico com alta potência, em combinação com as propriedades da dopamina (D2) e do antagonista do receptor de serotonina (5-HT2), controla os comportamentos agressivos e autolesivos em crianças com e sem esse transtorno. Em 2002, o National Institutes of Health tomou a iniciativa e patrocinou o teste randomizado, controlado, da Research Units on Pediatric Psychopharmacology sobre a risperidona para tratamento de irritabilidadenos casos de transtorno do espectro autista; a partir de então, foram realizados sete testes randomizados e controlados; três estudos de reanálise e dois estudos adicionais, os quais convergiram para confirmar a eficácia da risperidona, em doses variando de 0,5 a 1,5 mg. Alguns dos participantes desse estudo em fase pré-escolar receberam também tratamentos comportamentais intensivos. A risperidona é considerada o tratamento medicamentoso de primeira linha para crianças e adolescentes afetados por esse transtorno com irritabilidade grave. Apesar de sua eficácia, seu uso foi limitado em alguns indivíduos pelos efeitos colaterais principais de ganho de peso e aumento no apetite; efeitos colaterais metabólicos, como hiperglicemia, elevação no nível de prolactina e dislipidemia; em combinação com outros efeitos adversos comuns, como fadiga, sonolência, tontura e sialorreia. A risperidona deve ser usada com muita cautela em indivíduos com anormalidades cardíacas ou hipotensão subjacente, considerando-se que esse medicamento pode contribuir para a incidência de hipotensão ortostática. Estudos adicionais que deram prosseguimento à avaliação da risperidona nesses casos constataram uma eficácia e tolerabilidade persistentes em um período de 6 meses, com retorno rápido dos sintomas em indivíduos que apresentaram boas respostas, a partir do momento da interrupção no uso do medicamento. Outros medicamentos estudados para o tratamento de irritabilidade no transtorno do espectro autista incluem o aripiprazol e a olanzapina. Dois estudos de larga escala que utilizaram o aripiprazol no tratamento de ataques de mau humor, agressividade e autolesão e crianças e adolescentes com o transtorno chegaram à conclusão de que esse medicamento é eficaz e seguro. As doses aplicadas variaram de 5 a 15 mg por dia. Os efeitos colaterais principais incluem sedação, tontura, insônia, acatisia, náusea e vômito. Embora não tenha sido tão significativo quanto no uso da risperidona, o ganho de peso foi considerado um evento adverso moderado, com aumentos de 1,3 a 1,5 kg durante o período de 8 semanas em um dos estudos. O ganho de peso foi semelhante tanto em doses mais baixas quanto em mais elevadas. A olanzapina, que especificamente bloqueia os receptores de 5-HT2A e D2 e também os receptores muscarínicos, foi estudada em crianças e adolescentes com transtorno do espectro autista para tratamento de irritabilidade, com tendência a respostas positivas, ainda que tenha havido um ganho de peso substancial de cerca de 3,5 kg. Sedação foi o efeito colateral principal. Hiperatividade, impulsividade e desatenção. Vários testes randomizados, controlados por placebo, foram realizados com o metilfenidato para tratamento de hiperatividade, impulsividade e desatenção em crianças e adolescentes com transtorno do espectro autista. O órgão Research Units on Pediatric Psychopharmacology descobriu que o metilfenidato é pelo menos moderadamente eficaz em doses de 0,25 a 0,5 mg/kg em jovens autistas e com sintomas de TDAH. Nessa população, a eficácia do metilfenidato foi menor do que em crianças com TDAH e sem o transtorno do espectro autista, sendo que aquelas com o transtorno do espectro autista desenvolveram efeitos colaterais com maior frequência, incluindo aumento na irritabilidade, comparadas às crianças com TDAH. Um estudo sobre o uso do metilfenidato no tratamento de hiperatividade e desatenção em crianças na idade pré-escolar com o transtorno autista concluiu que esse tipo de estimulante é seguro e relativamente eficaz; metade dessas crianças desenvolveu efeitos colaterais, incluindo aumento nos estereótipos, desconforto gastrintestinal, problemas de sono e labilidade emocional. Entre os estimulantes, um estudo duplo-cego, controlado por placebo, sobre hiperatividade, impulsividade e desatenção usando a tomoxetina em crianças com esse transtorno chegou à conclusão de que o medicamento foi significativamente mais eficiente que o placebo. Os efeitos colaterais incluíram sedação, irritabilidade, constipação e náusea. O uso da clonidina, um alfa-agonista, também foi avaliado em crianças autistas para tratamento de hiperatividade e apresentou resultados mistos. A guanfacina também foi utilizada em alguns casos. Comportamento repetitivo e estereotipado. Esses sintomas básicos do transtorno do espectro autista foram estudados com antidepressivos à base de inibidores seletivos da receptação de serotonina (ISRSs), antipsicóticos de segunda geração (ASGs) e agentes estabilizadores do humor, como o valproato. Um estudo com fluoxetina chegou à conclusão de que o grupo do medicamento foi apenas um pouco melhor – e não significativamente melhor – que o grupo-placebo em relação aos sintomas-alvo, e outro estudo com escitalopram não encontrou qualquer diferença entre os grupos. Entretanto, a risperidona foi considerada eficaz nos tratamentos com foco na irritabilidade, além de ter TRANSTORNOS GLOBAIS DO DESENVOLVIMENTO CAROLINA POBLETE URRUTIA HARMBACHER 10 melhorado os comportamentos restritivos e repetitivos. Um estudo recente, com 12 semanas de duração, que utilizou o valproato em 55 crianças autistas com idade média de 9 anos e meio, descobriu que as crianças que reagiram em relação à irritabilidade também foram as que consumiram menos tempo em comportamentos repetitivos. Definir e caracterizar espectro autista Na edição anterior do DSM (DSM-IV), os TEAs incluíam transtorno autista clássico, síndrome de Asperger e transtorno global do desenvolvimento sem outra especificação. Esses três transtornos foram agrupados devido a sua ocorrência comum em famílias, indicando fatores genéticos relacionados e sinais e sintomas compartilhados. Epidemiologia Sinais e sintomas Os primeiros sintomas do transtorno do espectro autista frequentemente envolvem atraso no desenvolvimento da linguagem, em geral acompanhado por ausência de interesse social ou interações sociais incomuns (p. ex., puxar as pessoas pela mão sem nenhuma tentativa de olhar para elas) padrões estranhos de brincadeiras (p. ex., carregar brinquedos, mas nunca brincar com eles), e padrões incomuns de comunicação (p. ex., conhecer o alfabeto, mas não responder ao próprio nome). Um diagnóstico de surdez é geralmente considerado, mas costuma ser descartado. Durante o segundo ano, comportamentos estranhos e repetitivos e ausência de brincadeiras típicas tornam-se mais evidentes. Uma vez que muitas crianças pequenas com desenvolvimento normal têm fortes preferências e gostam de repetição (p. ex., ingerir os mesmos alimentos, assistir muitas vezes ao mesmo filme), em pré-escolares pode ser difícil distinguir padrões restritos e repetitivos de comportamentos diagnósticos do transtorno do espectro autista. A distinção clínica baseia-se no tipo, na frequência e na intensidade do comportamento (p. ex., uma criança que diariamente alinha os objetos durante horas e sofre bastante quando algum deles é movimentado). Os sintomas são frequentemente mais acentuados na primeira infância e nos primeiros anos da vida escolar, com ganhos no desenvolvimento sendo frequentes no fim da infância pelo menos em certas áreas (p. ex., aumento no interesse por interações sociais). Uma pequena proporção de indivíduos apresenta deterioração comportamental na adolescência, enquanto a maioria dos outros melhoram. Apenas uma minoria de indivíduos com transtorno do espectro autista vive e trabalha de forma independente na fase adulta; aqueles que o fazem tendem a ter linguagem e capacidades intelectuais superiores, conseguindo encontrar um nicho que combine com seus interesses e habilidades especiais. Em geral, indivíduos com níveis de prejuízo menores podem ser mais capazes de funcionar com independência. Mesmo esses indivíduos,no entanto, podem continuar socialmente ingênuos e vulneráveis, com dificuldades para organizar as demandas práticas sem ajuda, mais propensos a ansiedade e depressão. Muitos adultos informam usar estratégias compensatórias e mecanismos de enfrentamento para mascarar suas dificuldades em público, mas sofrem com o estresse e os esforços para manter uma fachada socialmente aceitável. Quase nada se sabe sobre a fase da velhice no transtorno do espectro autista. Padrões restritos e repetitivos de comportamentos, interesses e atividades. Desde os primeiros anos de vida, nas crianças com o transtorno do espectro autista, as brincadeiras exploratórias esperadas sob a ótica evolucionária são restritas e mudas. Essas crianças não usam brinquedos ou objetos da maneira habitual; em vez disso eles costumam ser manipulados de uma forma ritualística, com uma quantidade menor de características simbólicas. Em geral, as crianças autistas não apresentam o nível de brincadeiras imitativas ou de pantomima abstrata exibido pelas outras da mesma idade, nas quais essas características são espontâneas. As atividades e brincadeiras das crianças com o transtorno do espectro autista parecem ser mais rígidas, repetitivas e monótonas em comparação com os pares. Os comportamentos ritualísticos e compulsivos são comuns na fase inicial e intermediária da infância. Caraterísticas físicas associadas. De maneira geral, elas realmente apresentam taxas mais elevadas de anomalias físicas de menor importância, como, por exemplo, malformações nas orelhas, e outras que podem ser reflexo de anomalias que ocorreram durante o desenvolvimento fetal dos órgãos, junto com partes do cérebro. Um número maior do que a expectativa de crianças com transtorno autista não apresenta destreza manual e lateralidade e permanecem ambidestras na idade em que o domínio cerebral costuma ser estabelecido. Perturbações no desenvolvimento e uso da linguagem. As deficiências no desenvolvimento da linguagem e as dificuldades no uso da linguagem para comunicar ideias não fazem parte dos critérios básicos para diagnosticar o transtorno do espectro autista; entretanto, esses problemas ocorrem em um subgrupo de indivíduos com esse tipo de condição. Algumas crianças com esse transtorno não se recusam apenas a falar, e suas anormalidades na fala não resultam da ausência de motivação. O desvio linguístico, assim como o retardo no desenvolvimento da linguagem, é uma característica de subtipos mais graves desse transtorno. As crianças sofrem com a versão grave do transtorno sentem uma grande dificuldade para organizar as frases de uma forma inteligível, mesmo que tenham um vocabulário amplo. Nas situações em que as crianças com o transtorno e com retardo no desenvolvimento linguístico aprendem a conversar fluentemente, a conversação pode transmitir informações sem prosódia ou inflexão típicas. TRANSTORNOS GLOBAIS DO DESENVOLVIMENTO CAROLINA POBLETE URRUTIA HARMBACHER 11 Deficiência intelectual. Em torno de 30% das crianças com transtorno do espectro autista apresentam um nível intelectualmente incapaz no desempenho intelectual. Entre esse grupo, cerca de 30% apresentam desempenho na faixa variando de leve a moderado, sendo que quase 40 a 50% são grave ou profundamente deficientes sob o ponto de vista intelectual. As pontuações do quociente de inteligência (QI) desse transtorno em crianças com deficiências intelectuais tendem a refletir os problemas mais graves nas habilidades de sequenciamento e abstração, com forças relativas nas habilidades visuais e espaciais ou na aprendizagem de memória. Esse tipo de descoberta mostra a importância dos defeitos nas funções linguísticas. Irritabilidade. Esses sintomas costumam ser produzidos por situações do dia a dia em que esses jovens mudam de uma atividade para outra, permanecem sentados na sala de aula ou ficam quietos quando sentem vontade de sair correndo. Nos casos de crianças afetadas pelo transtorno com desempenho mais baixo e com deficiências intelectuais, o instintivo agressivo pode surgir de forma inesperada, sem um desencadeador ou propósito óbvio, sendo observados também comportamentos autolesivos, como bater a cabeça, beliscar a pele e se morder. Instabilidade no humor e no afeto. Algumas crianças com transtorno do espectro autista apresentam mudanças repentinas de humor, com explosões de riso ou de choro, sem nenhuma razão óbvia. A melhor compreensão desses episódios se torna ainda mais difícil nas situações em que elas não conseguem expressar pensamentos associados ao afeto. Resposta a estímulos sensoriais. Observa-se que crianças com transtorno do espectro autista respondem de forma intensa a alguns estímulos e fraca a outros estímulos sensoriais (p. ex., ao som e à dor). É uma ocorrência comum que elas aparentem ser surdas; em geral, respondem muito pouco ao som da voz de uma conversa normal; no entanto, a mesma criança poderá demonstrar um interesse intenso pelo som de um relógio de pulso. Algumas crianças apresentam um limiar alto para dor ou respostas alteradas para ela. Na realidade, algumas não respondem a uma lesão com choro ou busca de conforto. Alguns jovens autistas persistem em alguma experiência sensorial; por exemplo, com frequência cantarolam uma música ou cantam a canção de algum anúncio comercial, antes de expressar palavras ou de usar a fala. Outros gostam particularmente da estimulação vestibular – rotação, oscilação e movimentos para cima e para baixo. Hiperatividade e desatenção. Níveis de atividade abaixo da média são menos frequentes; nesse caso, há alternância com excesso de atividade. Comportamentos como déficit de atenção e incapacidade para se concentrar em uma tarefa específica também interferem no desempenho diário. Habilidades precoces. Alguns indivíduos com o transtorno do espectro autista têm habilidades precoces ou dissidentes de grande proficiência, tais como habilidade prodigiosa para cálculos e aprendizagem de memória, geralmente além das capacidades dos pares normais. Outras habilidades precoces potenciais em algumas crianças autistas incluem hiperlexia, uma capacidade precoce para leitura (mesmo que não entendam aquilo que estão lendo), memorização e declamação e habilidades musicais (cantar ou tocar; ou reconhecer peças musicais). Insônia. Insônia é um problema frequente do sono entre crianças e adolescentes com o transtorno do espectro autista, e as estimativas indicam que ocorre em 44 a 83% das crianças em idade escolar. Infecções menores e sintomas gastrintestinais. Os sintomas gastrintestinais observados em crianças com o transtorno do espectro autista em geral incluem arrotos excessivos, constipação e movimentos intestinais soltos. Observa-se também um aumento na incidência de convulsões febris. Algumas crianças não apresentam elevações na temperatura na presença de enfermidades infecciosas de menor importância e podem não sentir a indisposição típica de quem está doente. Em outras, os problemas comportamentais e as condições relacionadas aparentam melhorar significativamente nos casos de enfermidades menos graves, e essas mudanças podem ser indicações da presença de alguma enfermidade física. Critérios diagnósticos TRANSTORNOS GLOBAIS DO DESENVOLVIMENTO CAROLINA POBLETE URRUTIA HARMBACHER 12 TRANSTORNOS GLOBAIS DO DESENVOLVIMENTO CAROLINA POBLETE URRUTIA HARMBACHER 13 O transtorno do espectro autista engloba transtornos antes chamados de autismo infantil precoce, autismo infantil, autismo de Kanner, autismo de alto funcionamento, autismo atípico, transtorno global do desenvolvimento sem outra especificação, transtorno desintegrativo da infância e transtorno de Asperger. Diagnósticodiferencial Síndrome de Rett. Uma ruptura da interação social pode ser observada durante a fase regressiva da síndrome de Rett (em geral, entre 1 e 4 anos de idade); assim, uma proporção substancial das meninas afetadas pode ter uma apresentação que preenche critérios diagnósticos para transtorno do espectro autista. Depois desse período, no entanto, a maioria dos indivíduos com síndrome de Rett melhora as habilidades de comunicação social, e as características autistas não são mais grande foco de preocupação. Consequentemente, o transtorno do espectro autista somente deve ser considerado quando preenchidos todos os critérios diagnósticos. Mutismo seletivo. No mutismo seletivo, o desenvolvimento precoce não costuma ser acometido. A criança afetada normalmente exibe habilidades comunicacionais apropriadas em alguns contextos e locais. Mesmo nos contextos em que a criança é muda, a reciprocidade social não se mostra prejudicada, nem estão presentes padrões de comportamento restritivos ou repetitivos. Transtornos da linguagem e transtorno da comunicação social (pragmática). Em algumas formas de transtorno da linguagem, pode haver problemas de comunicação e algumas dificuldades sociais secundárias. O transtorno específico da linguagem, porém, não costuma estar associado a comunicação não verbal anormal nem à presença de padrões restritos e repetitivos de comportamento, interesses ou atividades. Quando um indivíduo apresenta prejuízo na comunicação social e nas interações sociais, mas não exibe comportamentos ou interesses restritos ou repetitivos, podem ser preenchidos critérios para transtorno da comunicação social (pragmática) em vez de transtorno do espectro autista. O diagnóstico de transtorno do espectro autista se sobrepõe ao de transtorno da comunicação social (pragmática) sempre que preenchidos os critérios para transtorno do espectro autista, devendo-se indagar cuidadosamente sobre comportamento restrito/repetitivo anterior ou atual. Deficiência intelectual (transtorno do desenvolvimento intelectual) sem transtorno do espectro autista. Pode ser difícil diferenciar deficiência intelectual sem transtorno do espectro autista de transtorno do espectro autista em crianças muito jovens. Indivíduos com deficiência intelectual que não desenvolveram habilidades linguísticas ou simbólicas também representam um desafio para o diagnóstico diferencial, uma vez que comportamentos repetitivos frequentemente também ocorrem em tais indivíduos. Um diagnóstico de transtorno do espectro autista em uma pessoa com deficiência intelectual é adequado quando a comunicação e a interação sociais estão significativamente prejudicadas em relação ao nível de desenvolvimento de suas habilidades não verbais (p. ex., habilidades motoras finas, solução de problemas não verbais). Diferentemente, a deficiência intelectual é o diagnóstico apropriado quando não há discrepância aparente entre o nível das habilidades de comunicação social e outras habilidades intelectuais. Transtorno do movimento estereotipado. Estereotipias motoras estão entre as características diagnósticas do transtorno do espectro autista, de modo que um diagnóstico adicional de transtorno do movimento estereotipado não TRANSTORNOS GLOBAIS DO DESENVOLVIMENTO CAROLINA POBLETE URRUTIA HARMBACHER 14 é feito quando tais comportamentos repetitivos são mais bem explicados pela presença do transtorno do espectro autista. Quando as estereotipias causam autolesão e se tornam um foco do tratamento, os dois diagnósticos podem ser apropriados. Transtorno de déficit de atenção/hiperatividade. Anormalidades de atenção (foco exagerado ou distração fácil) são comuns em pessoas com transtorno do espectro autista, assim como o é a hiperatividade. Um diagnóstico de transtorno de déficit de atenção/hiperatividade deve ser considerado quando dificuldades atencionais ou hiperatividade excedem o tipicamente encontrado em indivíduos de idade mental comparável. Esquizofrenia. Esquizofrenia com início na infância costuma desenvolver-se após um período de desenvolvimento normal ou quase normal. Há descrição de um estado prodrômico no qual ocorrem prejuízo social, interesses e crenças atípicos que podem ser confundidos com os déficits sociais encontrados no transtorno do espectro autista. Alucinações e delírios, características definidoras da esquizofrenia, não são elementos do transtorno do espectro autista. Os clínicos, entretanto, devem levar em conta que indivíduos com transtorno do espectro autista podem ser concretos na interpretação de perguntas sobre aspectos-chave da esquizofrenia (p. ex., “Você ouve vozes quando não há ninguém por perto?” “Sim [no rádio]”). Prognóstico: Os melhores fatores prognósticos estabelecidos para as evoluções individuais no transtorno do espectro autista são presença ou ausência de deficiência intelectual e comprometimento da linguagem associados (p. ex., linguagem funcional por volta dos 5 anos de idade é um sinal de bom prognóstico), bem como outros problemas de TRANSTORNOS GLOBAIS DO DESENVOLVIMENTO CAROLINA POBLETE URRUTIA HARMBACHER 15 saúde mental. Epilepsia, como um diagnóstico de comorbidade, está associada a maior deficiência intelectual e menor capacidade verbal. Tratamento: As metas principais dos tratamentos de crianças com transtorno do espectro autista são focar comportamentos básicos para melhorar as interações sociais e a comunicação; ampliar as estratégias de integração escolar; desenvolver relacionamentos significativos com os pares; e aumentar as habilidades para viver uma vida independente no longo prazo. As intervenções nos tratamentos psicossociais têm como foco principal ajudá-las a desenvolver habilidades nas convenções sociais, estimular comportamentos socialmente aceitáveis e prossociais com os pares e diminuir os sintomas de comportamentos estranhos. Muitos casos exigem soluções linguísticas e acadêmicas. Além disso, as metas dos tratamentos costumam incluir a redução de comportamentos irritáveis e disruptivos que possam surgir na escola ou em casa e ser exacerbados nos períodos de transição. Crianças com incapacidade intelectual precisam de intervenções comportamentais apropriadas sob a ótica evolutiva para reforçar comportamentos socialmente aceitáveis e incentivar habilidades de autocuidado. É frequente também que os pais de crianças com o transtorno se beneficiem da educação psicológica, do suporte e da orientação para otimizar o relacionamento e a eficiência com suas crianças. O tratamento amplo e detalhado do transtorno do espectro autista, incluindo programas comportamentais intensivos, treinamento e participação dos pais e intervenções acadêmicas ou educacionais, produziu resultados bastante promissores. Identificar as organizações civis de apoio ao autismo e a importância do acolhimento dos familiares e acometidos AMA – Associação de amigos do autista: Proporcionar à pessoa com autismo uma vida digna: trabalho, saúde, lazer e integração à sociedade. Oferecer à família da pessoa com autismo instrumentos para a convivência no lar e em sociedade. Promover e incentivar pesquisas sobre o autismo, difundindo o conhecimento acumulado. ABRA – Associação Brasileira de autismo: é uma entidade civil sem fins lucrativos, com sede e foro em Brasília-DF, mas com funcionamento itinerante. Originalmente destinada a congregar Associações de Pais e Amigos de Autistas, hoje tem por finalidade a integração, coordenação e representação, em nível nacional e internacional, das entidades voltadas para a atenção das pessoas com Transtorno do Espectro do Autismo (TEA). GAIA – Grupo de Apoio ao individuo com autismo: O Grupo de Apoio ao Indivíduo com Autismo | GAIA é umaassociação civil, pessoa jurídica de direito privado de fins não lucrativos, fundada por pais, como resposta à exclusão social sofrida pelas pessoas que são acometidas de uma alteração no processo de desenvolvimento humano, classificadas como apresentando TEA (no qual se inclui o autismo e outros processos patológicos relacionados).
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