Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
K LS N U TRIÇ Ã O , C IÊN C IA E PRO FI SSÃ O Nutrição, ciência e profissão Carla Vanessa de Sousa Caratin Martins Nutrição, ciência e profissão Sumário Unidade 1 | História da alimentação e sua evolução Seção 1.1 - História da alimentação e sua evolução Seção 1.2 - Alimentação nos dias de hoje Seção 1.3 - Comportamento alimentar 7 9 20 33 Unidade 2 | O homem, a sociedade, a cultura e a alimentação Seção 2.1 - A sociedade e a alimentação Seção 2.2 - Conceitos sobre alimentação Seção 2.3 - Influência da cultura na alimentação 49 51 66 79 Unidade 3 | Aspectos culturais da alimentação Seção 3.1 - Mídia e comportamento alimentar Seção 3.2 - Condicionamento alimentar Seção 3.3 - Tipos de alimentos 95 97 115 129 Unidade 4 | Áreas de atuação do nutricionista Seção 4.1 - Histórico do nutricionista no Brasil Seção 4.2 - Atuação do profissional nutricionista Seção 4.3 - Órgãos públicos relacionados à categoria 145 147 160 174 Palavras do autor Caro aluno, a nutrição é uma ciência muito ampla e extremamente interessante. Para compreendê-la em sua totalidade é muito importante conhecer sua história, seus avanços e a realidade nos dias de hoje. Não podemos, no entanto, pensar em história da nutrição sem contextualizar a alimentação do homem e a transformação sofrida ao longo da sua evolução na Terra. Tampouco é possível pensar em uma boa atuação profissional sem antes conhecer as áreas de conhecimento. Nesta disciplina, iremos conhecer um pouco da história da alimentação, sua evolução e o impacto nutricional. Com esse conhecimento adquirido, o nutricionista, o modo como este profissional interage com esse conteúdo e sua posição no mercado de trabalho serão nossos próximos objetos de estudo. Esse conjunto faz com que esta disciplina traga uma base sólida sobre essa ciência tão encantadora. Nas próximas unidades de ensino iremos caminhar na construção desse conhecimento, iniciando com a maneira como nossos ancestrais se alimentavam, sua evolução até a alimentação nos dias de hoje – passando pelo surgimento das refeições prontas e semiprontas, tanto em restaurantes como pelo processamento da indústria – e as mudanças de comportamento alimentar (Unidade 1). Seguindo nesse sentido, a Unidade 2 tem o papel de olhar para a alimentação mundial e seus problemas, conceitos e diferentes hábitos, além de dar ênfase à alimentação no nosso país, nas suas diferenças e em alguns fatores que influenciam na formação de padrões alimentares. A Unidade 3 será o momento de olhar mais profundamente para aspectos culturais da alimentação, como o efeito da mídia e do marketing na formação de hábitos alimentares e a alta rotatividade de dietas consideradas “da moda”. Para fortalecer alguns desses conceitos, os alimentos serão analisados mais de perto para que certos termos tão utilizados nos dias atuais – como ultraprocessados, transgênicos, orgânicos, biodinâmicos, irradiados, diet e light – façam parte do novo dia a dia, sem mistérios. Para finalizar esta disciplina e preparar os próximos passos, iremos abordar o papel do nutricionista como profissional de nível superior, seu panorama de atuação, a ética que rege a profissão, o mercado de trabalho e os órgãos que representam a categoria. Nutrição, ciência e profissão é um grande mergulho em um mundo cheio de possibilidades e descobertas prazerosas. Vamos juntos? Unidade 1 História da alimentação e sua evolução Convite ao estudo Caro aluno, este é o início do nosso estudo sobre a ciência da nutrição. Para nos familiarizarmos com esse novo e apaixonante mundo, vamos entender a relação do homem com o alimento, as transformações dos hábitos alimentares ao longo da história, discutir como está hoje a alimentação no mundo, especialmente no nosso país, compreender quais os principais fatores que influenciam nas nossas escolhas, conhecer a grande variedade de produtos diferenciados disponíveis e, para finalizar, olhar como o nutricionista se relaciona com essas questões no mercado de trabalho. Esses assuntos compõem nossa disciplina. Nesta primeira unidade estudaremos a história da alimentação e sua evolução, com conhecimentos e conceitos importantes para a compreensão de como nos alimentamos nos dias atuais e a nossa relação com a comida e sua produção. Iniciaremos estudando um pouco sobre o homem da Pré-História e uma descoberta que transforma, radicalmente, sua vida – inclusive seus hábitos alimentares: a descoberta do fogo. A evolução dos equipamentos culinários e o surgimento da indústria do alimento também serão abordados nesse primeiro momento. Com isso, passaremos às transformações da sociedade na idade contemporânea no que diz respeito aos hábitos estabelecidos. Para finalizar esta unidade, a discussão será a respeito do comportamento alimentar, não apenas da sociedade, mas também ao longo da vida de cada indivíduo. Esses conhecimentos permitem um olhar mais crítico para a maneira como hoje nos alimentamos e nos relacionamos com a comida, e é essencial para a formação de um bom nutricionista. Para ilustrar os conteúdos serão apresentadas situações U1 - História da alimentação e sua evolução 8 hipotéticas da vida de Aline, uma pessoa que, assim como você, acabou de iniciar o curso de graduação em Nutrição e está vivenciando esse novo mundo. Considerando que esse é um grande passo na vida de Aline, nós iremos, a cada seção, acompanhar as novas descobertas e inquietações que surgirão, avançando com ela em sua busca pelo conhecimento. Preparado para acompanhar Aline nesse grande desafio? U1 - História da alimentação e sua evolução 9 Seção 1.1 História da alimentação e sua evolução Entusiasmada com o início do curso e com a ideia de conhecer a alimentação de seus antepassados, Aline se debruçou sobre as bibliografias sugeridas e se aprofundou bastante sobre o tema. Encantada com tudo o que estudou, ela não consegue se imaginar vivendo apenas da coleta e da caça, sem poder usar o fogo para o preparo dos alimentos e nem geladeira para o seu armazenamento. Como Aline é muito dedicada e curiosa, resolve convidar os amigos para passar alguns dias no sítio de sua família com o propósito de tentarem, ao menos por um curto período, vivenciar a ausência do fogo, da energia elétrica (para o preparo e armazenamento dos alimentos) e de alimentos industrializados. Como você acredita que Aline e seus amigos passariam esses dias? Seria fácil? A quais alimentos e preparações teriam acesso? Caso pudessem levar alguns alimentos processados para emergências, o que você acredita que poderiam levar? Quais benefícios dos alimentos industrializados eles conseguiriam aproveitar? Na sua opinião, eles conseguiriam manter uma boa alimentação sem os recursos aos quais recorremos diariamente? Com essas questões iniciamos os seus estudos sobre nutrição, ciência e profissão. O material a seguir irá fomentar essa discussão e prepará-lo para os próximos passos! Diálogo aberto Não pode faltar Antecedendo o início do estudo desta seção, reflita sobre a sua alimentação hoje. Pense nos alimentos que mais consome e os motivos para essas escolhas. Pense na alimentação dos seus pais, avós e familiares mais distantes. Essa alimentação é a mesma? Pelos mesmos motivos? O que mudou ao longo dos anos e impactou seus hábitos alimentares? Agora, vamos olhar para os nossos antepassados bem distantes: como era o dia a dia deles? E o acesso aos alimentos? U1 - História da alimentação e sua evolução 10 Reflita O ser humano, para existir, possui algumas necessidades essenciais. A alimentação faz parte delas. No entanto, é necessário compreender que a alimentação diz muito sobre quem a consome, principalmentequando olhamos para um grande grupo: como esse alimento é produzido? Como se dá a sua distribuição e o seu acesso? Qual a qualidade dessa alimentação? O que ela representa? Como são feitas as escolhas? Como é o estado nutricional desse grupo? Todas essas perguntas fazem parte do papel da alimentação em um determinado grupo. Podemos separá-las em alguns enfoques para facilitar sua compreensão: • Enfoque biológico: diz respeito às necessidades do organismo e às teorias de nutrição vigentes em uma época. Vale dizer que alguns problemas de ordem biológica, como a fome, a desnutrição, a escolha de alguns alimentos e parte das patologias estão ligadas a outras questões que não apenas a evolução do homem. E, assim, apenas essa questão não é capaz de explicar a alimentação e suas variações. • Enfoque econômico: refere-se ao acesso e à disponibilidade dos alimentos por um viés de produção, distribuição e mercado. • Enfoque social e político: considera a sociedade e o contexto ao seu redor. • Enfoque cultural: avalia o papel de determinados alimentos e hábitos para o grupo que os consome, entendendo uma relação de crenças, gostos e preferências. • Enfoque filosófico: tem um olhar mais amplo sobre as situações, como os motivos que podem levar os indivíduos a não consumir carne e aspectos éticos na produção e distribuição dos alimentos. Compreendendo que comer é muito mais do que apenas se alimentar, vamos voltar um pouquinho no tempo... Alimentação na Pré-História Há cerca de 2,5 milhões de anos, os primeiros homens – homo habilis – andavam sobre a Terra. Com a sua evolução, chegamos ao homo neanderthalensis, considerado o primeiro ser humano como U1 - História da alimentação e sua evolução 11 o que nós conhecemos e precursor do homem que temos hoje, o homo sapiens. Na etapa mais antiga da Pré-História, a era Paleolítica, ocorreu uma grande transformação do homem, levando ao aperfeiçoamento dos seus utensílios domésticos, de trabalho e de suas armas (feitas de madeira, osso ou pedra – Figura 1.1). Com isso, obteve-se um grande desenvolvimento dos seus meios de subsistência. Fonte: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Armi_primitive_-_Brendola.JPG>. Acesso em: 24 mar. 2017. Figura 1.1 | Exemplo de utensílios utilizados Esses novos utensílios possibilitaram o desenvolvimento de meios de comunicação (como as pinturas rupestres, pelas quais obtemos grande parte do que sabemos hoje sobre aquele período) e uma descoberta essencial para novos passos: a descoberta do fogo. Nesse período, os homens não plantavam e nem criavam animais. A sobrevivência era garantida por meio dos alimentos encontrados na natureza: coletavam frutos, grãos e raízes silvestres e também pescavam e caçavam animais. Os homens eram nômades – se deslocavam de tempos em tempos para outras regiões em busca desses alimentos. Nesses curtos períodos, viviam em cavernas e fendas nas rochas, árvores e tendas cobertas com peles. Com a melhoria dos seus instrumentos, passaram a construir abrigos, fortalecendo regras coletivas e vida familiar, social e religiosa. A divisão do trabalho era baseada na idade e no sexo. As mulheres e crianças eram responsáveis pelas coletas de frutos e raízes, enquanto U1 - História da alimentação e sua evolução 12 os homens caçavam, pescavam e defendiam o território. Todos os alimentos obtidos eram divididos entre o grupo. A descoberta do fogo Com a observação do fogo gerado espontaneamente, o homem foi – lentamente – perdendo o medo desse desconhecido, aprendendo a manipulá-lo e mantê-lo aceso. Seus benefícios iniciais eram a iluminação e o aquecimento. A compreensão de que o fogo poderia ser iniciado por temperatura elevada levou à descoberta de que o atrito entre dois pedaços de madeira seca produzia a chama, que poderia ser reforçada e reativada através do vento ou do sopro. As tentativas levaram à compreensão de que o atrito entre duas pedras também gerava faíscas que, quando próximas a folhas e galhos secos, geravam fogo. Com o conhecimento da técnica, os homens foram se apropriando e aprimorando seu domínio. O fogo, além de ser um elemento ao redor do qual eles se reuniam, com claridade e proteção contra o frio e os animais, passou a ser importante para as relações sociais, principalmente para assar e cozinhar os alimentos, facilitando seu consumo e digestão. Ao notar que os alimentos cozidos demoravam um pouco mais para se deteriorarem, o homem começou a utilizá-lo para preservar esses alimentos. Fonte: <https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Diorama,_cavemen_-_National_Museum_of_Mongolian_History. jpg>. Acesso em: 24 mar. 2017. Figura 1.2 | Representação do homem reunido ao redor do fogo U1 - História da alimentação e sua evolução 13 Exemplificando Aproveitamento da carne e das carcaças Estudos apontam que o aproveitamento da carne obtida através da caça e de carcaças abandonadas por outros carnívoros também melhorou com o avanço dos instrumentos e técnicas. Inicialmente, a carne era obtida apenas retalhando as carcaças encontradas. Com a melhoria desses utensílios, os animais passaram a ser cortados em pedaços menores, podendo ser transportados do local de abate. O consumo do tutano, obtido através da quebra dos ossos, também foi uma mudança desse processo. Vale ressaltar que, mesmo com a melhoria dos utensílios e instrumentos de trabalho e a descoberta do fogo, os homens continuaram sendo nômades e vivendo da caça e coleta. Ao perceber que as sementes dos alimentos davam origens a novas plantas e que podiam produzir alimentos dessa maneira, os homens inciaram o desenvolvimento e aprimoramento das técnicas agrícolas (período Neolítico). Dessa forma, passaram a viver em pequenos grupos e a domesticar os animais, mudando intensamente a sua relação de dependência com a natureza, passando a ter um controle maior sobre as fases de escassez e abundância. Essa permanência em um local permitiu transformações constantes até chegarmos à maneira como nossa sociedade está estruturada nos dias de hoje e isso se reflete em todo o nosso comportamento, inclusive alimentar. Evolução dos equipamentos culinários Ao longo da história da civilização, vivenciamos diversas alterações na relação entre o homem e a sua alimentação. O desenvolvimento da tecnologia – iniciado com a melhoria dos utensílios de trabalho – é um dos fatores que mais influencia essas alterações. O uso do fogo para abrandar a textura dos alimentos e aumentar a sua conservação foi um grande passo nesse sentido. No entanto, esse uso do fogo demandou o desenvolvimento de novos utensílios – de pedra ou madeira – para a cocção dos alimentos. Com o surgimento da cerâmica, o barro passou a ser moldado U1 - História da alimentação e sua evolução 14 e queimado em forma de panelas, recipientes e utensílios para aumentar as possibilidades de cocção, combinação de aromas, texturas, sabores e armazenamento. Um marco muito importante nessa evolução foi o manuseio (a altas temperaturas) dos metais. Com isso, a qualidade das ferramentas de uso cotidiano aumentou muito e surgiram novas, como a faca – usada para caça, proteção, preparo e consumo das refeições. O ato de se alimentar passa a ser mais valorizado e, consequentemente, registrado na era das grandes civilizações, como Egito, Mesopotâmia, Grécia e Roma. Dessa fase tem-se tábuas com receitas, técnicas de preparo e questões sociais e hierárquicas da alimentação. Na Grécia, a gastronomia passa a ser objeto de estudo – hábitos, cargos, utensílios utilizados e estrutura física da cozinha. Nessa época já podíamos encontrar fornos, utensílios, panelas, cerâmica e ferro fundido no uso cotidiano. No século XIX a culinária francesa atinge o seu ápice, estimulando a teoria gastronômica, a estrutura eo uso das cozinhas de maneira sistematizada. Além disso, com a Revolução Industrial surge uma vasta gama de maquinários modernos, deixando a manufatura em segundo plano. Outra questão muito importante é a entrada da mulher no mercado de trabalho – de forma assalariada – o que cria uma nova série de oportunidades e necessidades de consumo, como a abertura de restaurantes e as indústrias de processamento de alimentos. Além disso, a demanda por utensílios e equipamentos que facilitem os afazeres em casa, principalmente na cozinha, aumenta vertiginosamente. Após a Segunda Guerra Mundial e o processo de reconstrução dos países, temos um grande boom no desenvolvimento da tecnologia voltada para o campo, para a indústria, mas também para as famílias e suas casas. Nessa época surgem as geladeiras, os congeladores, os fornos elétricos, os micro-ondas, os utensílios menores, como liquidificadores e processadores. Com esses novos equipamentos, ocorre uma grande transformação no conceito da alimentação familiar. A busca por inovações e novidades nesse setor é constante, não apenas pensando em grandes maquinários – como os fornos combinados utilizados em restaurantes – mas também em pequenos objetos usados na rotina doméstica. Um fator muito importante e do qual não podemos nos esquecer U1 - História da alimentação e sua evolução 15 nessa busca por inovações são os equipamentos que permitem a produção de alimentos mais saudáveis, importantes aliados para a melhoria da qualidade de vida da população. Podemos citar panelas que diminuem a necessidade de óleo, que cozinham no vapor, processadores que extraem os sucos de alimentos e tantos outros aparelhos presentes em muitas cozinhas, inclusive domésticas. Exemplifi cando A arte de cozinhar está muito ligada à cultura de um povo, podendo variar os ingredientes, as combinações, a ordem de apresentação dos pratos, as técnicas utilizadas e até os utensílios necessários para a sua produção. Algumas culturas, por exemplo, utilizam talheres para a alimentação, enquanto outras fazem uso de hashi (varetas/palitos usados pelos orientais). Outro aspecto que pode ser refletido na culinária é a religião, que envolve desde não consumir determinados alimentos, não misturar alguns ingredientes e até o processamento desses, como o abate dos animais. A indústria de alimentos Nos séculos XVIII e XIX temos uma realidade bastante diferente daquela à qual nos referimos anteriormente. Com o desenvolvimento da industrialização e o deslocamento da população do campo para a cidade, temos uma grande dificuldade para garantir o abastecimento alimentar da população. A classe trabalhadora enfrenta dificuldades com alimentos escassos e caros. Com esse cenário, os países europeus aumentam a produção de cereais e gados, mas, principalmente, assistem ao surgimento das indústrias de alimentos que têm como objetivo diminuir o custo da alimentação, oferecer uma comercialização mais eficaz e uma melhor distribuição. Para aumentar a produtividade, a indústria passa a buscar novos sistemas de conservação para esses alimentos, iniciando com a produção de pães e vinhos (base da alimentação) e tendo um grande desenvolvimento no século XIX com as indústrias de conserva e do frio (produtos de origem animal). Assimile A necessidade de preservação dos alimentos ao longo da história foi essencial para que atingíssemos o nível de tecnologia das indústrias da atualidade. O que era, inicialmente, apenas uma necessidade de acesso, U1 - História da alimentação e sua evolução 16 apresenta, nos dias de hoje, outras características importantes, como praticidade, variedade, preços baixos, fim da escassez sazonal e tantas outras vantagens. Conservação dos alimentos Pensando nas indústrias de conserva, estas aumentaram a disponibilidade dos legumes e frutas pela sua manipulação, principalmente pelo calor, pelo uso de salmouras, vinagre e açúcar. A ausência de ar (latas) também era um recurso muito utilizado, e a secagem dos alimentos foi uma maneira encontrada para aumentar a disponibilidade de gêneros alimentares. Além dessa metodologia, hoje também temos opções mais inovadoras como os alimentos liofilizados, extremamente presentes nos nossos mercados. O frio é um grande agente natural de conservação e seu uso se perde no tempo. Esse recurso era utilizado desde a Pré-História (os alimentos eram armazenados nas áreas mais frias e escuras da caverna), passando para antigas construções, no subsolo, onde eram armazenados alimentos e gelo. Com o aumento da necessidade de armazenamento, foram aperfeiçoadas as técnicas e, em 1851, nos Estados Unidos, foi patenteado o primeiro refrigerador. O refrigerador doméstico tornou-se, ao longo do tempo, um item indispensável nos lares, sendo o responsável por manter os alimentos frescos e com menor risco de contaminação. Na segunda metade do século XIX, o congelamento passou a ser utilizado para aumentar ainda mais a durabilidade de alimentos in natura e, posteriormente, pratos prontos. A indústria aperfeiçoou seus métodos e disponibilizou no mercado uma grande quantidade de alimentos com longo prazo de duração – modificando seu processamento e aprimorando a embalagem e o armazenamento. Além da questão da disponibilidade, temos uma variedade enorme de produtos cujo principal objetivo é aumentar a sensação de prazer na alimentação – muitas vezes associado ao uso de temperos e condimentos e a mudanças de texturas para aumentar a palatabilidade. Na direção oposta, na década de 1980, surgiram os primeiros produtos enriquecidos com vitaminas e sais minerais, visando melhorar o estado de saúde da população, inicialmente infantojuvenil. Sempre em busca de novos mercados e visando atender às necessidades da população, nos anos 1990 surgiram os produtos dietéticos, seguidos pelos lights. U1 - História da alimentação e sua evolução 17 Hoje, encontramos no mercado inúmeros alimentos enriquecidos (alguns com obrigatoriedade por lei) e produtos destinados a diferentes públicos – faixas etárias, sexo, cultura, religião e filosofia de vida. O desenvolvimento não para e temos, diariamente, novas tecnologias sendo utilizadas para a melhoria e ampliação dos produtos disponíveis no mercado. Nesta seção, falamos um pouco sobre a alimentação na Pré-História e o surgimento da indústria de alimentos. Uma boa forma de observar essas transformações é por meio de filmes. Algumas dicas: A festa de Babette Vatel – um banquete para o rei O tempero da vida Aline e seus amigos, ao chegarem ao sítio, ficariam surpresos com a quantidade de comida disponível. Por ser uma situação diferente daquela vivida pelos nossos antepassados, eles encontrariam uma grande quantidade de alimentos já cultivados, animais domesticados e também melhores equipamentos de trabalho. A grande variedade de frutas, legumes e verduras encontrada seria bastante satisfatória. No entanto, estamos acostumados a utilizar boa parte desses alimentos apenas após a cocção, o que seria um primeiro impacto. O consumo de leite poderia acontecer normalmente, no entanto, o consumo de ovos também seria do alimento cru. Dificilmente Aline e seus amigos teriam habilidade para caçar animais silvestres, nem mesmo para abater os animais domesticados. Peixes poderiam ser pescados/coletados com mais facilidade. No entanto, voltaríamos para a ausência do fogo – o que obrigaria o consumo desses alimentos sem passar pela cocção – e também da energia elétrica – o que deixaria esses alimentos muito vulneráveis à deterioração. No entanto, eles poderiam contar com uma grande variedade de produtos industrializados de fácil armazenamento sem refrigeração, como pães, biscoitos, salgadinhos, enlatados (no caso de terem um Sem medo de errar Pesquise mais U1 - Históriada alimentação e sua evolução 18 abridor de latas), alimentos em conserva (vidros), alimentos embalados em caixas Tetra Pak®. Vale ressaltar que alguns produtos que fazem parte do nosso dia a dia não seriam consumidos pela dificuldade de consumi-los crus (como arroz, feijão e batatas), pela falta de utensílios adequados para manipulá-los (como facas para cortar as carnes) ou por não poderem ser armazenados de maneira adequada (queijos, derivados do leite e carnes). O uso de alimentos semiprontos e prontos comprados congelados também não seria permitido. Alguns alimentos embutidos (conservados) no sal poderiam ser boas opções. Apesar da dificuldade de manter os nossos hábitos atuais, eles seriam capazes de sobreviver alguns dias apenas se alimentando dessa forma. Avançando na prática Analisando a nossa alimentação Descrição da situação-problema Agora que aprendemos um pouco sobre a importância da indústria de alimentos, vamos entender a presença dela nos dias de hoje. Vá para a cozinha de sua casa e analise os alimentos disponíveis. O que você encontra? Resolução da situação-problema Frutas, verduras e legumes – normalmente guardados sob refrigeração. Carnes, peixes e aves – refrigeração ou congelamento. Ovos – refrigeração. Grãos, cereais e farinhas – armazenados em local fresco. Conservas, molhos e enlatados – local fresco. Alimentos semiprontos – refrigerados ou congelados. Alimentos prontos – refrigerados ou congelados. Alimentos secos e/ou liofilizados – local fresco. Leite e derivados – refrigerados. U1 - História da alimentação e sua evolução 19 Alimentos embutidos – refrigerados. Pães e biscoitos – local fresco. Vamos refletir sobre a nossa alimentação? Quanto dela é baseada em alimentos frescos? Quantos são os alimentos processados? Quantos precisam ser preparados em casa antes do consumo? Faça valer a pena 1. A descoberta do fogo foi essencial para a transformação da vida dos nossos antepassados. Marque a opção que não está associada a essa descoberta: a) Proteção contra os animais. b) Criação de laços sociais. c) Cocção dos alimentos. 2. Os equipamentos culinários acompanharam, desde o início, a transformação da sociedade. Pensando nessa evolução, marque a alternativa correta: a) Talheres sempre fizeram parte do momento da refeição. b) A alimentação sempre foi considerada uma fonte de prazer, e não apenas de sobrevivência. c) O acesso a equipamentos como refrigeradores mudou o hábito alimentar da população. d) A cerâmica foi desenvolvida apenas após o fogo, pois antes não havia sobra de alimentos para armazenar. e) O tipo de preparação escolhido não interfere na escolha dos utensílios que serão utilizados. 3. A indústria alimentícia surgiu de uma necessidade de aumentar o acesso da população aos alimentos. Com o avanço da tecnologia, esse objetivo foi ampliado. Escolha, entre as alternativas a seguir, qual não é a função da indústria de alimentos nos dias de hoje: a) Desenvolver alimentos para grupos específicos, como alergias e restrições alimentares. b) Garantir o acesso a alimentos de qualidade e baixo custo. c) Informar todos os ingredientes dos seus produtos no rótulo. d) Garantir maior tempo de conservação dos alimentos. e) Produzir alimentos em grande quantidade indiferentemente das especificidades da população. d) Criação de animais para o consumo. e) Conservação dos alimentos. U1 - História da alimentação e sua evolução 20 Seção 1.2 Alimentação nos dias de hoje Com tantas informações novas e após passar alguns dias no sítio com uma série de restrições em relação aos alimentos que costuma consumir, Aline volta à cidade e resolve visitar um grande mercado para observar a variedade de alimentos disponíveis. Impressionada com o número de itens e marcas, ela se recorda da monotonia da alimentação dos seus dias de experimentação no sítio. No entanto, percebe que no seu dia a dia consome, com muita frequência, os mesmos alimentos. O que você acredita que influencia na compra dos alimentos pela família da Aline? Quais fatores podem estar envolvidos na formação desses hábitos alimentares? O que podemos apontar de pontos positivos em termos de acesso a essa variedade tão grande de produtos? E de negativos? Vamos aprofundar um pouco mais essa discussão? Diálogo aberto Não pode faltar Antes de iniciarmos esta seção, vamos relembrar as aulas de história. Como era a vida na época da Revolução Industrial? Como as pessoas moravam? No que elas trabalhavam? Como se divertiam? Como era a alimentação? Quais seriam as suas principais dificuldades no dia a dia? Alimentação na época contemporânea Assimile Quando olhamos para a época contemporânea, pensamos no período que vai desde a Revolução Francesa (1789) – com suas máquinas a vapor – até os dias de hoje. Esse é um período de muitas e intensas mudanças na organização da sociedade: temos o aparecimento de novos produtos e o desenvolvimento de técnicas e equipamentos agrícolas e industriais. Olhando para a alimentação nessa época, podemos distinguir duas U1 - História da alimentação e sua evolução 21 fases: uma delas com o aumento da disponibilidade dos alimentos e a outra marcada por um desequilíbrio entre essa oferta e procura. O padrão de consumo alimentar apresenta a utilização dos vários tipos de cereais, raízes e tubérculos (batata, batata-doce, inhame e mandioca), frutas (bananas, figos e tâmaras), leguminosas, nozes e sementes, carnes, leite e derivados, ovos, peixes, gorduras e óleos, açúcar e bebidas. No entanto, percebe-se grande variação desse consumo em diferentes países e regiões, dependendo do desenvolvimento e da tecnologia. Nas áreas mais desenvolvidas nota-se um consumo maior de alimentos de origem animal, vegetais, frutas, açúcares e bebidas. Os alimentos frescos eram mais consumidos em regiões de climas mais quentes, com invernos menos rigorosos. Nos locais com menor desenvolvimento, a base da alimentação eram os cereais, raízes e tubérculos. A batata, por exemplo, continuava sendo considerada um alimento para pessoas de poucos recursos que não tinham acesso a alimentos considerados mais nobres, como o pão. Os alimentos de origem animal quase não eram consumidos. Pensando nas bebidas alcoólicas, as cervejas e os vinhos são os mais consumidos, principalmente na Europa. Percebe-se também o aumento recente do uso de bebidas não alcoólicas. O açúcar é altamente consumido no mundo todo. Reflita Mudanças nos hábitos alimentares têm sido observadas em diversos países e estão associadas ao sistema de desenvolvimento da distribuição, produção e urbanização, refletindo diretamente no estilo de vida e na saúde da população. No entanto, os problemas alimentares mais graves estão relacionados a outros componentes também, como os ambientes em que as pessoas estão inseridas. Quais outros aspectos podem influenciar nossos hábitos? Transformações na sociedade e no consumo alimentar Em várias partes do mundo temos o êxodo rural, o início da urbanização e as transformações decorrentes desse fluxo. No século XVIII pode ser observado um grande crescimento demográfico e ondas de emigração, espalhando e mesclando hábitos e culturas. U1 - História da alimentação e sua evolução 22 O desenvolvimento de novas tecnologias se reflete em todos os aspectos da vida dos homens, incluindo o aumento da sua expectativa de vida devido ao avanço da medicina. No entanto, como vimos na seção anterior, depois de desenvolver técnicas de agricultura para aumentar a produção de alimentos, o homem deparou-se com outra questão, a sua conservação, pois as técnicas iniciais (como secagem, defumação, salmoura, vinagre e açúcar) alteravam o sabor dos alimentos e diminuíam seu valor nutritivo. Essa situação melhora com osenlatados e pasteurizados, e é muito importante para a quantidade e qualidade da alimentação da época, resultando em uma melhora nas condições nutricionais dos europeus. Os alimentos que antes eram produzidos em casa ou por artesãos passaram a ser processados em grandes fábricas e refinarias. As mulheres deixaram os serviços domésticos ou a agricultura familiar e foram inseridas nas fábricas e escritórios. A melhoria no sistema de transportes e os avanços do comércio mundial foram responsáveis pelo aumento de produtos vindos de países distantes, como as especiarias e o açúcar. No século XIX, temos um aumento da oferta e do acesso aos alimentos decorrentes de alterações da agricultura, seu processamento e na economia. Esse processo foi chamado de “revolução dietética”. No entanto, para obter esse resultado positivo para os países europeus, houve grandes crises de fome e mortes nas suas colônias. Grande parte dos alimentos eram trazidos de longe, como o trigo (América), os legumes e frutas (África e América) e as oleaginosas tropicais (como o amendoim para a produção de óleo). No século XX, temos o aumento da fome, subalimentação e carências nutricionais, mesmo com a maior produção de alimentos vista até então com o uso de fertilizantes, agrotóxicos e da engenharia genética. A fome nesse período não está relacionada às colheitas destruídas por fatores naturais, mas sim, por conta da economia moderna e sua divisão desigual de renda. Temos, nesse século, uma diminuição do crescimento demográfico na Europa Ocidental, o que atrai os imigrantes, principalmente das outras regiões europeias. U1 - História da alimentação e sua evolução 23 Assimile As guerras trouxeram mudanças na alimentação, tanto pela situação de carência e fome quanto pela mudança de hábitos decorrentes da disponibilidade dos alimentos para os soldados. Um grande exemplo é o consumo de refrigerantes. Após a Segunda Guerra Mundial observamos um grande crescimento do consumismo e a busca pela praticidade, com grande expansão do mercado de bens de consumo. Novos utensílios e equipamentos culinários, bem como novos alimentos surgiram com grande força. Inovações como geladeiras, fogões a gás, forno micro-ondas e eletrodomésticos variados tornaram-se acessíveis para parte da população. A preocupação com o controle sanitário dos alimentos é marcante e tem seu início nos Estados Unidos e Inglaterra. Vale ressaltar que, se por um lado temos o aumento da população subnutrida em alguns países, por outro a obesidade começa a aumentar, tornando-se um problema de saúde pública nos países ocidentais. Um exemplo disso é o imenso consumo de refrigerantes que se torna, em 1986, maior do que o consumo de água (encanada ou engarrafada) nos Estados Unidos. Outra grande transformação está ligada à popularização de alimentos como hambúrguer, cachorro-quente e pizza, além de algumas cozinhas internacionais tradicionais como indiana, chinesa, japonesa, mexicana e italiana. Temos, atualmente, fácil acesso e, consequentemente, alto consumo de alimentos ultraprocessados. Esse consumo está associado à obesidade e doenças crônicas não transmissíveis, pois são alimentos nutricionalmente desbalanceados e que apresentam uma quantidade excessiva de sal, açúcar e gorduras. Em contrapartida, o atual estado de saúde da população gera uma grande preocupação e se reflete nos hábitos alimentares de uma parcela da sociedade, por meio da diminuição do consumo de farinha, redução do uso de açúcar e aumento do consumo de legumes e frutas, principalmente crus, para melhor aproveitamento das fibras e vitaminas. Como consequência da obesidade, aparecem também os transtornos alimentares, como anorexia, bulimia e a preocupação com o corpo e forma física. Temos também uma retomada da U1 - História da alimentação e sua evolução 24 valorização dos preceitos religiosos ligados à alimentação, como o caráter de eliminar alimentos perigosos do corpo dos fiéis; a fim de prepará-los para a oração e penitência. Não podemos, no entanto, nos esquecer do impacto negativo de todos esses avanços. Temos hoje um ambiente poluído e degradado e alimentos processados em imensos volumes que não apresentam mais suas características sensoriais e qualidade originais. O mesmo acontece com frutas e legumes que, apesar de terem uma aparência impecável, podem não apresentar o sabor e textura desejados. A falta de qualidade dos alimentos produzidos em larga escala tem, nos dias de hoje, feito parte da população recorrer a alimentos produzidos artesanalmente, valorizando as pequenas produções rurais familiares, muitas vezes orgânicas, criando um novo mercado. Nascimento e expansão dos restaurantes e alimentos prontos/semiprontos Restaurantes são os estabelecimentos comerciais nos quais, mediante pagamento, pode-se fazer uma refeição. Esse tipo de comércio surgiu com os mercados e feiras antigas que afastavam os camponeses e artesãos de suas casas. Ao mesmo tempo em que se alimentavam, realizavam parte de suas transações comerciais. Também eram muito encontrados próximos às estradas principais, sendo importantes pontos de paradas, muitas vezes para passar a noite. Na Europa do século XVIII as refeições podiam ser feitas em estabelecimentos que ofereciam bebidas e pratos simples e baratos – como as charcutarias, chucrutes, queijos e tapas espanholas. Para ter uma refeição mais saborosa e reforçada, as estalagens eram mais procuradas. Esses pratos também podiam ser servidos nos quartos de descanso ou em salas alugadas para as refeições. Londres era uma exceção a esse cenário, com casas luxuosas nas quais eram servidas boas comidas e bebidas. No entanto, com o passar do tempo, diferente dessas estalagens que os precederam, alguns restaurantes passaram a ser referência de alta gastronomia, com grandes cozinheiros, normalmente provenientes da elite. Mesmo em restaurantes mais simples, tinha-se a valorização do paladar do cliente, mas nesses casos o objetivo maior era alimentar, no dia a dia, a grande quantidade de pessoas que deixaram de fazer as refeições em casa – normalmente por falta de tempo para os afazeres U1 - História da alimentação e sua evolução 25 domésticos ou pela distância do trabalho até suas residências. Ao longo do século XIX houve uma grande melhora na qualidade dos serviços oferecidos. Ao final desse século, houve um fortalecimento do turismo pela Europa e o surgimento dos hotéis com bons restaurantes. No século XX podemos encontrar o uso da expressão restaurante e cozinheiros franceses espalhados por quase todo o mundo. A cozinha francesa continua a se desenvolver se fortalecer (cozinha tradicional), mas começa a absorver costumes locais. Foi essa mistura que fez nascer a cozinha internacional, que oferece pratos de sabor conhecido, mesmo que a pessoa esteja muito longe, ampliando a comunicação entre os povos. Apreciadores de boa comida começam a viajar apenas para degustar pratos de chefes famosos, mas somente nos anos 1920, com o turismo automotivo, passamos a ter uma grande exploração das cozinhas regionais em restaurantes locais de luxo. No entanto, os restaurantes populares crescem oferecendo refeições baratas e “sem sabor” para o dia a dia, principalmente, aos trabalhadores. Fast-food O conceito se amplia nos Estados Unidos nos anos 1950 através de grandes redes que se espalharam nos eixos rodoviários, periferias, centros comerciais e shoppings. Oferecem comida rápida, como pizzas, hambúrgueres, tacos, comida chinesa e sanduíches. A origem do fast-food está associada a Ray Kroc, pois foi ele que deu o impulso necessário para que tivesse essa dimensão. No entanto, o conceito foi inventado pelos irmãos McDonald que, acreditando na dependência do carro, abrem, em 1937, o primeiro restaurante drive-inna Califórnia, no qual vendiam cachorro-quente. Nesse restaurante o cliente era servido no carro, facilitando ainda mais o consumo e aumentando a velocidade da compra. Com o sucesso alcançado, abrem um restaurante maior ainda na Califórnia. O resultado é rápido, atinge principalmente as crianças, os adolescentes e suas famílias, e gera imitações e a demanda pelo franchising. U1 - História da alimentação e sua evolução 26 Exemplificando Exemplificando Em 1948 os irmãos McDonald resolvem mudar o conceito do restaurante focando o custo baixo, a rapidez e o autosserviço. Centralizam o cardápio no hambúrguer, que é consumido sem pratos e talheres – substituídos por embalagens de papelão e sacos de papel. Eles trabalham com uma equipe reduzida e com pouca qualificação (baixos salários), com o suporte de equipamentos adaptados e procedimentos padronizados. A questão da higiene no processo é desde o seu início muito importante e pode ser percebida, por exemplo, pela grande utilização de inox, produto fácil de ser higienizado. O custo torna-se muito mais baixo do que nos moldes anteriores. McDonald’s Não tem quem não conheça a sua logomarca! Essa cadeia é um grande símbolo do capitalismo com suas filiais espalhadas por todo o mundo. O seu nome e marca são mais importantes comercialmente que o próprio produto oferecido. É nesse momento que Ray Kroc compra o direito de vender e administrar as franquias e espalha o conceito. Nos anos 1950 e 1960 surgem outras grandes redes, como o KFC, o Taco Bell e a Pizza Hut. O conceito de fast-food chega na Europa no início dos anos 1970/1980, vencendo uma série de barreiras e dificuldades, e é ligado apenas à combinação hambúrguer e fritas. Grandes redes precisaram mudar seus produtos para conseguir uma melhor aceitação. Com o fast-food, o ato de comer ganha praticidade, rapidez e mobilidade, mas os hábitos alimentares tradicionais são abandonados. Mesmo com a invasão de grandes redes mundiais, ainda há espaço e mercado para pequenos cafés e restaurantes tradicionais, sendo extremamente valorizados em muitos países. Além disso, apesar de pensarmos no hambúrguer e na pizza ao falarmos de fast-food e suas grandes redes, temos também a oferta de alimentos regionais nos mesmos moldes. U1 - História da alimentação e sua evolução 27 Exemplificando O hambúrguer O hambúrguer, tão difundido hoje, teve origem no bife tartar (prato de carne crua, bem temperada, picada com a faca) e passou a ser cozido ainda na Alemanha. Em 1904 chega aos Estados Unidos, onde foi incorporado como sinônimo de alimentação rápida e se expandiu em grandes cadeias de lanchonetes. No Brasil, hoje, ao entrarmos em uma praça de alimentação num shopping podemos escolher facilmente entre pizza, hambúrguer, pastel, esfirra e os restaurantes chineses, italianos, japoneses e de comidas típicas brasileiras. Nossa tapioca e o açaí também têm papel de destaque nesses espaços nos últimos tempos. Alimentos prontos e semiprontos A partir dos anos 1970, uma grande quantidade de alimentos processados pela indústria passa a fazer parte do dia a dia dos restaurantes para facilitar o preparo das refeições, como conservas, alimentos congelados, purês em pó, caldos e molhos prontos. Nos anos 1990 houve um grande aumento do uso do micro-ondas e dos congeladores domésticos, resultando em um grande consumo de alimentos congelados, principalmente aqueles comprados prontos. O uso desses alimentos facilita a individualização das refeições, simplificando o seu preparo. Esses alimentos passaram a ser vistos de maneira muito positiva. Alguns alimentos, como certas frutas e legumes industrializados, por serem, normalmente, escolhidos, processados e congelados dentro de um curto espaço de tempo, são considerados até mais frescos do que os preparados na hora, devido ao seu processo de ultracongelamento e embalagens a vácuo. As saladas pré-lavadas e os legumes pré-processados também ganharam força pela sua praticidade e necessidade de completar uma boa refeição. Nos dias de hoje os alimentos prontos e semiprontos fazem parte da rotina de muitas famílias – que a cada dia têm menos tempo para cozinhar a sua refeição. A grande variedade e a palatabilidade são benefícios adicionais. Ao comparar uma refeição congelada com uma realizada em restaurantes, o custo tende a ser menor, sendo um atrativo para algumas famílias. No entanto, esses alimentos são U1 - História da alimentação e sua evolução 28 formulados para serem extremamente saborosos (com a presença de uma grande quantidade de açúcares, sal, gorduras e outros aditivos), são calóricos e, normalmente, vendidos em porções grandes, estimulando o consumo excessivo. Reflita Vários estudos têm mostrado que a refeição em família contribui para o bom estado nutricional e para uma melhor qualidade de vida. Em contrapartida, a falta de companhia para comer ou a solidão podem motivar o consumo de dietas de pior qualidade. Como você faz as suas refeições diariamente? Para ampliar esse olhar, a leitura da tese Alimentação de rua na cidade de São Paulo (1828-1900), de João Luiz Maximo da Silva, é muito interessante. Tese (Doutorado em História Social) – FFLCH, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2008. Disponível em: <http://www.teses.usp.br/teses/ disponiveis/8/8138/tde-23112009-142821/pt-br.php>. Acesso em: 31 maio 2017. Leia também este artigo: RODRIGUES, J. Por uma história da alimentação na cidade de São Paulo (décadas de 1920 a 1950). Revista de Estudios Sociales, 1 ago. 2009. p. 118-128. Disponível em: <https://res.uniandes.edu.co/view.php/601/index. php?id=601>. Acesso em: 31 maio 2017. Para aprender de maneira mais leve, assista: Ratatouille. Disponível em: <https://www.youtube.com/ watch?v=y3MQugGOvcw>. Acesso em: 1 jun. 2017. Tampopo. Disponível em: <https://www.youtube.com/ watch?v=in2DLfsNNZ8>. Acesso em: 31 maio 2017. Supersize me. Disponível em: <https://www.youtube.com/ watch/?v=rC1fKQNMjSk>. Acesso em: 1 jun. 2017. Pesquise mais U1 - História da alimentação e sua evolução 29 Sem medo de errar Quais fatores podem interferir na escolha dos alimentos? - Disponibilidade: ter acesso a determinado alimento é essencial para que esse possa fazer parte dos nossos hábitos. - Safra: os alimentos da safra estão mais disponíveis (fáceis de encontrar/consumir) e com preços mais acessíveis (maior oferta). - Praticidade: no dia a dia a tendência é a busca por alimentos práticos, que não demandem muito tempo para o seu preparo. - Sabor: a preferência de consumo está relacionada a alimentos que agradam o paladar. - Hábito: cada região, país, família e indivíduo possui o seu hábito alimentar e consome os alimentos que estão associados a ele. - Religião: algumas religiões possuem crenças que influenciam no hábito alimentar, como restrição a determinados alimentos. - Preço: o fator econômico é determinante para o acesso aos alimentos. - Promoções: estratégia muito utilizada para aumentar a venda de produtos, inclusive de alimentos. - Curiosidade: marcas e produtos novos tendem a levar o consumidor a experimentar esses produtos. - Propaganda: as propagandas influenciam na escolha dos alimentos consumidos/comprados. - Temperatura: o clima interfere na escolha dos alimentos, como o consumo de alimentos mais leves (e gelados) no calor e mais densos (e quentes) no frio. - Qualidade: alimentos de boa qualidade são preferidos pelos consumidores. - Valor nutricional: algumas doenças podem restringir o consumo de determinados alimentos, bem como a preocupação com os alimentos e a quantidade de calorias consumidas. - Localização no mercado: a visualização estimula a compra. Pensando na grande disponibilidade de opções que encontramos no mercado hoje, podemos apontar:U1 - História da alimentação e sua evolução 30 Pontos positivos: - Possibilidade de escolha. - Variação de preço. - Marcas de confiança. - Possibilidade de experimentar novos produtos e novas marcas. Pontos negativos: - Dificuldade de escolha. - Confusão de informação. - Possibilidade de comprar sempre os mesmos produtos e não experimentar novos. Avançando na prática Hábitos alimentares Descrição da situação-problema Uma boa parte da família de Aline mora na fazenda, afastada da cidade. Por causa dessa distância e da possibilidade de consumirem alimentos frescos, utilizam poucos alimentos processados pela indústria e fazem poucas refeições em restaurantes. A tia-avó de Aline virá visitá-la por alguns dias. Como sua tia-avó se sente pouco à vontade fora de casa, Aline quer que ela tenha uma alimentação próxima aos seus hábitos cotidianos. É possível manter uma alimentação com o uso de poucos alimentos processados? Quais alterações na rotina Aline terá que fazer? Vamos ajudar Aline a pensar em um cardápio para agradar a sua tia-avó? Resolução da situação-problema É possível diminuir o uso de alimentos processados na nossa rotina e aumentar o uso de alimentos in natura. Para que Aline ofereça à sua tia-avó uma alimentação como a que esta tem no dia a dia, terá que comprar os alimentos frescos (no mercado, na feira ou em hortifrútis) e processá-los em casa, aumentando o tempo destinado à preparação das refeições. Em vez de comprar alimentos prontos, como os pães, será necessária a compra dos ingredientes para produzi-los em casa. U1 - História da alimentação e sua evolução 31 Pensando no cardápio, ela poderá servir para a sua tia-avó: Café da manhã: Café coado (em vez das cápsulas atuais) Leite fresco Pães e biscoitos caseiros Queijos frescos Geleia caseira Frutas Almoço: Saladas e legumes frescos. Macarrão com molho (ambos preparados em casa). Frango assado (comprado resfriado e utilizando temperos naturais). Frutas ou doces de frutas para a sobremesa. Lanche da tarde: Chá preparado com ervas frescas. Bolo caseiro Jantar: Sopa feita com legumes frescos. Pão caseiro para acompanhar. Faça valer a pena 1. O período contemporâneo é representado por muitas e intensas mudanças na organização da sociedade. Em relação a esse período, podemos afirmar: a) A tecnologia teve um grande avanço, mas nada foi desenvolvido em relação à agricultura. b) Houve um grande aumento na disponibilidade e acesso aos alimentos. c) Foi um período marcado apenas por fome e carências nutricionais. d) Todos os indivíduos tinham acesso ao consumo de carnes, leite e ovos em abundância. e) A batata era considerada um alimento nobre. U1 - História da alimentação e sua evolução 32 2. Durante o período contemporâneo houve muitas mudanças no hábito alimentar da população. Leia as afirmações com atenção: ( ) No século XIX os alimentos produzidos de maneira artesanal eram muito valorizados. ( ) Os períodos de fome eram causados, exclusivamente, por fenômenos da natureza. ( ) Após a Segunda Guerra Mundial observamos um grande crescimento do consumismo e a expansão do mercado de bens de consumo. ( ) A obesidade passa a ser um problema de saúde pública, mesmo com o aumento da população subnutrida. ( ) A bulimia e a anorexia são um reflexo do baixo acesso aos alimentos. Classifique as afirmativas como verdadeiras (V) ou falsas (F) e, em seguida, assinale a alternativa correta: a) V; F; V; V; F. b) F; F; F; V; F. c) F; F; V; V; F. d) F; F; V; V; V. e) F; V; F; V; F. 3. Restaurantes são os estabelecimentos comerciais nos quais, mediante pagamento, pode-se fazer uma refeição. Em relação aos restaurantes, qual afirmativa está correta? a) Surgiram com os mercados e feiras antigas que afastavam os camponeses e artesãos de suas casas. b) Na sua origem, eram todos locais luxuosos. c) Surgiram no final do século XIX, com o fortalecimento do turismo pela Europa e a criação de hotéis com bons restaurantes. d) O conceito de fast-food foi criado na França. e) A intenção do fast-food era garantir uma refeição completa, saborosa e de luxo. U1 - História da alimentação e sua evolução 33 Seção 1.3 Comportamento alimentar Aline está cada vez mais envolvida com os conhecimentos adquiridos no seu curso de Nutrição e com as trocas com os colegas. Um dia, ao chegar em casa após passar a tarde na biblioteca, sua mãe lhe diz que neste ano a grande festa da família irá acontecer na casa deles, pois sua avó não está bem de saúde. Essa festa é um evento muito importante para eles, pois todos os membros da família, mesmo aqueles que moram em outras regiões, e até em outros países, serão recebidos para um jantar. Além da diferença dos hábitos alimentares, uma dificuldade para a elaboração do cardápio é a presença de pessoas com as mais variadas faixas etárias: de bebês recém-nascidos até o vovô, beirando os cem anos! Preocupada em agradar a todos, a mãe da Aline pede à estudante que a auxilie nessa tarefa. O que você acha que a Aline deve considerar para escolher os alimentos que serão servidos? Você acredita que um único prato conseguirá agradar a todos? Quais são os pontos mais importantes para garantir o sucesso desse jantar? Diálogo aberto Não pode faltar O comportamento alimentar O ato de comer está intimamente ligado a necessidades básicas e sensações prazerosas. Quando falamos de comportamento, pensamos no modo como os indivíduos e grupos se comportam e em quais são suas condutas e costumes. O comportamento reflete a história do grupo no qual o indivíduo está inserido, sua história pessoal e sua cultura. As mudanças de comportamento, por outro lado, estão relacionadas a novas observações, vivências, sentimentos, estímulos e aprendizagens. O comportamento alimentar reflete, dessa maneira, não apenas aspectos fisiológicos, mas também questões psicológicas e o ambiente externo. Nos dias de hoje, o termo é utilizado para expressar todo o conceito de alimentação: compra, consumo, modo de comer, local U1 - História da alimentação e sua evolução 34 e todas as questões envolvidas no ato de se alimentar. Para entender a escolha dos alimentos podemos considerar o termo “atitude alimentar”, que envolve os componentes afetivos (sentimentos e emoções), cognitivos (crenças e conhecimentos) e volitivos (vontades e comportamentos). Esses fatores influenciam diretamente na aceitação e rejeição de alguns alimentos. Outro ponto importante é o conceito de hábito – comportamento aprendido pelo indivíduo e repetido constantemente, geralmente de modo inconsciente (rotinas neurológicas). Nesse sentido, segundo Alvarenga e Koritar (2016), o conceito de hábito alimentar pode ser definido como os costumes e o modo de comer de uma pessoa ou comunidade, geralmente sem pensar, mas considerando que a genética e o ambiente contribuem para sua determinação. Os hábitos de um indivíduo dependem daquilo que ele sabe, acredita e vivenciou. Reflita Você já observou o seu comportamento e seus hábitos alimentares? Está satisfeito com eles? O que faria diferente no seu dia a dia? Por quê? O comportamento alimentar do homem ao longo dos tempos O comportamento alimentar está relacionado com o controle da ingestão dos alimentos, pois é ele que auxilia nas escolhas, combinando a fisiologia com o mundo externo – características dos alimentos, ambiente, crenças, questões financeiras e sociais. Como já vimos na seção anterior, com a Revolução Francesa há uma grande mudança na sociedade e, dessa forma, na alimentação, através da introdução de alimentos pré-cozidos, pré-processados, congelados, enlatados e alimentos com empacotamento a vácuo, com o objetivo de reduzir o período gasto com as tarefas do dia a dia. Após a Segunda Guerra Mundial foram incorporadosalguns hábitos dos soldados, vivenciando-se um grande consumismo. O acesso a utensílios e equipamentos culinários trouxe mudanças nos hábitos alimentares das famílias. Em 1948, a mudança no processo de preparo de alimentos em restaurantes – com a padronização de utensílios, processos e sabores – reduziu significativamente os preços, aumentou o volume de vendas e a velocidade do serviço, e, consequentemente, das refeições, alterando tradições culturais e alimentares e substituindo as refeições feitas em casa por alimentos comprados prontos e de U1 - História da alimentação e sua evolução 35 rápido consumo. Nesse processo de padronização e rapidez, os alimentos passaram e ter uma uniformização de aparência e sabor, mesmo nas cozinhas internacionais. Os alimentos passam a ser entendidos realmente como mais uma mercadoria e a preferência por produtos industrializados torna-se quase uma imposição do mercado – grande oferta – e do mercado de trabalho – cada vez mais exigente, mantendo as pessoas por mais tempo fora de casa. Outro fator extremamente importante nesse processo de escolha é a influência da mídia, principalmente da televisão, por ser a principal fonte de informações utilizada pela população. A necessidade de refeições rápidas e a boa aceitação dos produtos industrializados (mesmo que com grande quantidade de calorias e aditivos, como sal, açúcar e gorduras) geram novas tecnologias de processamento e armazenamento. Os alimentos in natura perdem cada vez mais espaço para junk foodies no mercado e não aparecem nas propagandas de televisão. Assimile Alimentos in natura: são aqueles alimentos obtidos diretamente de plantas ou animais e que não sofrem qualquer alteração após deixarem a natureza. Junk food: expressão muito utilizada para se referenciar a alimentos com alto valor energético e baixo valor nutricional. Uma terminologia que vem sendo muito utilizada é: minimamente processados, processados e ultraprocessados. Minimamente processados: correspondem a alimentos in natura que foram submetidos a processos como limpeza, remoção de partes não comestíveis ou indesejáveis, fracionamento, moagem, secagem, fermentação, pasteurização, refrigeração e congelamento, sem acrescentar sal, açúcar, óleos, gorduras ou outras substâncias ao alimento original. Processados: são alimentos processados pela indústria com a adição de sal, de açúcar ou de outra substância de uso culinário a alimentos in natura, aumentando a palatabilidade e a durabilidade. Ultraprocessados: são formulações prontas para o consumo, necessitando de aquecimento ou não, feitas inteiramente ou majoritariamente de substâncias extraídas de alimentos (óleos, gorduras, U1 - História da alimentação e sua evolução 36 açúcar, amido, proteínas), derivados de constituintes de alimentos (gorduras hidrogenadas, amido modificado) ou sintetizadas em laboratório com base em matérias orgânicas, como petróleo e carvão (corantes, aromatizantes, realçadores de sabor e vários tipos de aditivos usados para dotar os produtos de propriedades sensoriais atraentes). Esses novos hábitos e a pressa do mundo externo diminuem o ritual familiar de sentar ao redor da mesa, transformando as refeições em momentos solitários e nos quais pouco se atenta aos alimentos que estão sendo consumidos. A sociedade, a cultura e a alimentação Comer é, desde os nossos ancestrais, um ato em grupo e uma maneira de criar e expressar a relação entre os indivíduos. Segundo Diez-Garcia (2003), o comer atual é caracterizado pela escassez de tempo para o preparo e consumo de alimentos; pela presença de produtos gerados com novas técnicas de conservação e de preparo, que agregam tempo e trabalho; pelo vasto leque de itens alimentares; pelos deslocamentos das refeições de casa para estabelecimentos que comercializam alimentos; pela crescente oferta de preparações e utensílios transportáveis; pela oferta de produtos provenientes de várias partes do mundo; pelo arsenal publicitário associado aos alimentos; pela flexibilização de horários para comer agregada à diversidade de alimentos; e pela crescente individualização dos rituais alimentares. Como dito anteriormente, as escolhas alimentares – opção por determinados alimentos em detrimento de outros – refletem fatores biológicos, socioculturais e psicológicos. Essas escolhas podem ser feitas considerando as características dos indivíduos citadas acima e também dos alimentos. Entre os fatores que estão relacionados aos alimentos podem ser citados as características sensoriais (sabor, aparência e odor), diretamente ligadas ao prazer, o acesso a eles (disponibilidade, praticidade e custo) e, atualmente, os aspectos nutricionais (quantidade de calorias, nutrientes, aditivos e a presença de alimentos restritos para parte da população). U1 - História da alimentação e sua evolução 37 Reflita As características sensoriais e o prazer são fatores determinantes para a escolha de um alimento, mas, infelizmente, para muitas pessoas essa sensação está associada a uma alimentação não saudável e, portanto, proibida, enquanto a alimentação saudável é considerada não prazerosa, estimulando sentimentos ambíguos de prazer e culpa em boa parte da população. Essa associação está correta? É possível ter uma alimentação saudável com prazer? A escolha pela alimentação saudável, que vem crescendo ao redor do mundo, está associada não apenas à saúde e à prevenção de doenças, mas, principalmente, à boa forma física e à busca pelo padrão de beleza atual. Um ponto muito utilizado pelo marketing em restaurantes e fast- foods é o tamanho da porção. Normalmente esses estabelecimentos oferecem porções grandes que estimulam o consumo excessivo dos alimentos, tornando ainda mais complexa a relação entre comida, saúde e corpo. As questões de higiene – ambiente e alimentos – são entendidas como risco à saúde e interferem nas escolhas. Essa questão vem sendo bastante pensada pelos restaurantes desde o surgimento dos fast-foods. O ambiente ser tranquilo, confortável e limpo é um requisito essencial para uma refeição agradável e calma. Lugares sujos, barulhentos e sem conforto estimulam o consumo rápido e sem atenção aos alimentos ingeridos. Além disso, o conceito de comida boa ou ruim está ligado à história de vida de cada um, pois há um componente afetivo (e não racional) muito simbólico e suas escolhas refletem isso de maneira muito intensa. Pensando no futuro, percebemos o grande desenvolvimento de tecnologias para aumentar e aprimorar os produtos industrializados, como alimentos sintéticos, pós, proteínas concentradas ou isoladas e alimentos transgênicos. Tem-se observado, no entanto, um grande resgate das tradições alimentares, do consumo de alimentos frescos e do ato de cozinhar. Chama a atenção o uso de novas técnicas e alimentos em receitas tradicionais – trazendo modernidade e, muitas vezes, preocupação com a saúde – sem, no entanto, deixar de lado a origem da receita e sua simbologia. Essa mudança de comportamento U1 - História da alimentação e sua evolução 38 visa modificar não apenas o consumo dos alimentos, mas todos os aspectos relacionados ao ato de comer, como produção, compra, preparo e momento das refeições, relembrando o prazer de se alimentar, e não apenas a busca pelos nutrientes, saúde e boa forma. O comportamento alimentar nas fases da vida Assimile Existe na alimentação um componente fundamental ligado à sobrevivência que é inato ao ser humano e está presente desde o nascimento até a morte, apesar de variar ao longo da vida – influenciado pela idade, sexo e fases –, como o estirão da adolescência. O comportamento e as escolhas alimentares variam muito ao longo da vida. Ainda bebês, o que mais interfere nessas escolhas são os sinais biológicos (fomee instinto), passando pelo gostar e não gostar da infância e pelas escolhas racionais feitas pelos adultos. Fatores genéticos podem interferir não só nas escolhas como também na quantidade de alimentos consumidos, pois há evidências de que os genes podem determinar preferências, ingestão, nível metabólico basal, atividade física e gastos energéticos. O primeiro contato do ser humano com a comida é por meio do leite, no entanto, o paladar, e consequentemente os hábitos, começam a serem desenvolvidos ainda na gestação, através do líquido amniótico, refletindo a alimentação da mãe. As crianças em aleitamento materno recebem, com grande impacto, as influências do estado nutricional e da qualidade da alimentação da mãe. O ato de amamentar é importante para a formação de vínculo entre mãe e filho e reforça, desde o início do contato com os alimentos, que o prazer está relacionado à alimentação, à saciedade e a suprir a necessidade fisiológica de alimentos (fome). Ao iniciar a introdução da alimentação complementar, os bebês têm contato com novos sabores, cheiros e texturas e passam a ser ainda mais influenciados pela alimentação da família – o bebê humano apresenta grande dependência em relação aos seus pais e responsáveis. Se a alimentação da família for equilibrada, as chances de a criança crescer com bons hábitos são maiores. O estigma de que bebê saudável é aquele gordinho ainda é muito presente na nossa U1 - História da alimentação e sua evolução 39 sociedade e é responsável, muitas vezes, pelo excesso na alimentação das crianças. As crianças, rapidamente (a partir dos 2 anos), tornam-se alvos prioritários da publicidade de alimentos desenvolvidos para essa fase, normalmente associados a brinquedos e personagens. Exemplificando As propagandas de alimentos na televisão e a associação destes a brinquedos e personagens influenciam os padrões de compra da família, que atende aos pedidos das crianças. Esse consumo de alimentos calóricos destinados ao público infantil associado ao grande tempo que as crianças e adolescentes passam assistindo à televisão (ou usando videogames, tablets e celulares) são os grandes responsáveis pelo aumento da obesidade nesses grupos e pelo surgimento de doenças como hipertensão, diabetes e dislipidemias. Nos supermercados os alimentos são expostos ao nível dos olhos das crianças para que elas possam reconhecer as marcas e produtos veiculados nos programas e canais infantis. Esses alimentos, em geral, são aqueles ricos em gorduras, sal e açúcares, sendo de alta densidade calórica, baixo valor nutricional e grande palatabilidade. Assim, o comportamento alimentar da criança, que era inicialmente influenciado pela mãe (aleitamento materno) e pela família (introdução alimentar), começa a receber estímulos externos da propaganda e do grupo social ao qual pertence, como a escola. Nessa fase, a criança já desenvolve algumas preferências alimentares, surgindo a dificuldade para variar o cardápio oferecido, a seletividade e a recusa dos alimentos de que alegam “não gostar”. Esse gostar e não gostar é determinante na aceitação das crianças. Um fenômeno muito comum nessa fase é a neofobia alimentar, ou seja, o receio de novos alimentos e sabores, restringindo a variedade de alimentos consumidos nessa fase. É comum as crianças elegerem alguns alimentos e os tornarem a base da sua alimentação. Assimile A neofobia (medo do novo) e a neofilia (atração pelo novo) estão presentes em todas as fases da vida, principalmente na infância, e interferem no comportamento e nas escolhas alimentares. U1 - História da alimentação e sua evolução 40 É sempre importante reforçar que a família é um grande exemplo para as crianças e que esse exemplo é essencial para a formação de hábitos saudáveis – não adianta oferecer alimentos saudáveis para os filhos e não os consumir. Também é responsabilidade da família e dos responsáveis incentivar o consumo dos alimentos, especialmente os rejeitados, permitindo contato com os sabores, cheiros e texturas – o uso dos sentidos, pegar, cheirar, lamber e amassar estimula o contato e aumenta a aceitação de alimentos diferentes e novos. Reflita Uma dieta monótona desde a primeira infância restringe as experiências alimentares e dificulta a aceitação de novos itens. Como é a variedade da sua alimentação? O que mudou ao longo de sua vida? A escola, onde hoje as crianças desde pequenas passam grande parte do tempo, pode influenciar de maneira positiva, pois em grupo a maior parte das crianças tende a aceitar melhor alguns alimentos. Na fase escolar (a partir dos 6 anos), as crianças passam a ter menor controle dos pais sobre a sua alimentação e ficam sujeitas a uma grande oferta de alimentos coloridos, saborosos, calóricos e pobres em nutrientes. As crianças crescem e, ao atingir a adolescência, fazem suas próprias escolhas. Esse é um período de transição para a fase adulta e apresenta muitas mudanças físicas – crescimento e maturação sexual –, emocionais e sociais. Para atingir de maneira satisfatória o seu crescimento e amadurecimento, existe uma necessidade nutricional aumentada, contraditória, com alguma frequência, em relação ao padrão de alimentação dos adolescentes, com grande consumo de lanches, fast-food, refrigerantes e salgadinhos – muitas vezes substituindo as refeições principais. O consumo de frutas e vegetais tende a cair nessa fase. Outra questão importante nessa etapa – e que costuma se estender para a fase adulta – é a ausência do café da manhã, justificada pela falta de tempo e de fome ao acordar. O impacto das propagandas se mantém e é reforçado pela influência dos amigos e grupos, pois vale sempre lembrar que a comida, além de fornecer os nutrientes necessários para o organismo e suas funções, é uma U1 - História da alimentação e sua evolução 41 fonte de prazer e tem um papel social muito importante. Percebe- se claramente que os adultos também repetem o consumo de alimentos do seu grupo social. Considerando os grupos sociais, pensamos nas famílias e suas transformações nos últimos tempos: famílias menores e com composições diferentes. Além de a mulher trabalhar fora e contribuir para a renda, temos um grande número de famílias chefiadas por elas. Os filhos adultos jovens têm sido importantes na formação da renda e permanecido por mais tempo na casa dos pais. Com menos tempo para cozinhar, temos o aumento do consumo de alimentos prontos e semiprontos por toda a família em consequência da necessidade de praticidade e variedade. No entanto, é cada vez mais frequente e precoce o surgimento de doenças como hipertensão, diabetes, dislipidemias e cânceres associados aos maus hábitos alimentares e ao sedentarismo. Exemplificando Estudos associam a piora no estado de saúde da população à ausência das refeições feitas em família, ao isolamento ao comer e ao uso de embalagens e utensílios descartáveis que permitem que as refeições sejam realizadas assistindo à televisão, ao computador, em pé, dirigindo ou até mesmo andando. Com a melhora da tecnologia, inclusive médica e farmacêutica, pode-se notar o envelhecimento da população e uma consequente preocupação com esse grupo, que se apresenta como uma boa oportunidade de mercado, tanto de lazer como de serviços de saúde e alimentação. Com o envelhecimento, o funcionamento do corpo humano se altera e podem surgir limitações (visuais, auditivas, locomotivas, de deglutição e gustativas) e doenças (diabetes, pressão alta e dislipidemias), gerando necessidades diferenciadas no estilo de vida e nos hábitos alimentares. As práticas alimentares indicam a história do indivíduo e não podem ser descartadas. O hábito de cozinhar é muito importante para a satisfação dos idosos, bem como consumir os alimentos preferidos. Fatores econômicos– como custo das refeições – se refletem nas escolhas de todos os grupos, mas com maior ênfase nessa faixa etária. U1 - História da alimentação e sua evolução 42 Reflita Um artigo bastante simples e interessante a esse respeito é: DIEZ-GARCIA, R. W. Reflexos da globalização na cultura alimentar: considerações sobre as mudanças na alimentação urbana. Revista de Nutrição, Campinas, v. 16, n. 4, p. 483- 492, 2003. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S14155 2732003000400011&script=sci_ abstract&tlng=pt>. Acesso em: 31 maio 2017. Aproveite e assista a alguns documentários: Muito além do peso. Disponível em: <http://www.muitoalemdopeso. com.br/>. Acesso em: 31 maio 2017. Gordo, doente e quase morto. Disponível em: <https://www.youtube. com/watch?v=kwe0AGLHCAs>. Acesso em: 1 jun. 2017. Fed up. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=fNjIyn19sno>. Acesso em: 1 jun. 2017. Será muito difícil com apenas um prato agradar toda a família – dos recém-nascidos até o vovô, passando pelos hábitos de cada núcleo familiar, vindos de diversas regiões e países. No entanto, essas informações devem ser consideradas na escolha do cardápio do jantar. Outro ponto a ser observado são as restrições: existe alguma restrição religiosa? Algum diabético? Ou alguma outra doença que restrinja a alimentação? Vegetarianos? Em relação às diferentes idades, é interessante verificar se também se faz necessária alguma alimentação diferenciada – como papinhas para os bebês ou uma refeição mais macia (abrandada) para os idosos. Em uma situação como essa, o interessante é preparar pratos simples, que agradem a maior parte e que, preferencialmente, tenham relação com a história da família e com memórias afetivas – como aquela macarronada que a avó italiana fazia aos domingos, o frango com angu e quiabo da avó mineira, o churrasco da família gaúcha ou a carne de sol com macaxeira lá do Ceará. Sem medo de errar U1 - História da alimentação e sua evolução 43 Avançando na prática Hábitos regionais Descrição da situação-problema Aline ajuda a sua mãe a preparar o jantar com pratos que lembram e traduzem a história da família e, além de agradar, emociona todos os convidados. Ao descobrir que agora ela é uma estudante do curso de graduação em Nutrição e o fascínio que tem pelo tema, todos convidam-na a passar alguns dias de férias em suas casas para conhecer a culinária local. Aline não se contém de tanta felicidade e mergulha nos estudos já imaginando e estudando os pratos que irá degustar com sua família. Pensando que nessas primeiras férias Aline irá para Belém (PA), Fortaleza (CE), Maceió (AL), Vitória (ES), Belo Horizonte (MG), Goiânia (GO), Campo Grande (MS) e Porto Alegre (RS), quais pratos ela conhecerá? Quais os hábitos desses locais? Resolução da situação-problema Belém (PA) – tacacá, maniçoba, açaí, pato no tucupi, vatapá paraense, pirarucu e caranguejo. Ela irá encontrar muitos alimentos à base de mandioca e farinha. O uso de tupi, jambu, peixes de rio e frutas da região é muito presente. Fortaleza (CE) – moqueca de peixe e caldeirada. Frutos do mar (destaque para lagosta e caranguejo) e frutas. A comida tem toques tropicais e tempero marcante. Maceió (AL) – sururu, siri mole ao coco, pituzada e umbuzada. Forte presença de peixes e frutos do mar, além das frutas, especialmente o coco. Vitória (ES) – moqueca capixaba, pirão e torta capixaba. Muito uso de peixes e frutos do mar. Utilização da panela de barro. Sem utilização de dendê nem leite de coco. Herança negra e indígena. Belo Horizonte (MG) – pão de queijo, tutu de feijão, bambá de couve, frango ao molho pardo e leitão à pururuca. Forte presença de frango, porco (carne, bacon, linguiça), feijão, couve e polvilho. Doces tradicionais – como abóbora e leite. U1 - História da alimentação e sua evolução 44 Goiânia (GO) – arroz com pequi, empadão goiano, pamonha e galinhada. Uso de milho, pequi e guariroba. Comida feita no fogo a lenha. Campo Grande (MS) – tereré, pintado, quebra torto e quibebe de mandioca. Herança dos países que fazem fronteira. Uso de peixes de rio e frutas do serrado. Porto Alegre (RS) – churrasco, arroz de carreteiro, matambre recheado, paçoca de pinhão e tainha na taquara. Mistura das culinárias brasileira, italiana e alemã. Forte presença das carnes e dos doces típicos alemães, como as cucas. Faça valer a pena 1. O comportamento e o hábito alimentar se refletem nas escolhas dos indivíduos. Com base nisso, podemos afirmar que: ( ) O comportamento alimentar reflete a história do grupo no qual o indivíduo está inserido, sua história pessoal e a cultura. ( ) O comportamento alimentar reflete apenas questões fisiológicas. ( ) O hábito alimentar de um indivíduo depende daquilo que ele sabe, acredita e vivenciou. ( ) A mídia, principalmente a televisão, influencia nos hábitos alimentares da população. ( ) Os produtos processados – prontos e semiprontos – são práticos, saborosos e mais saudáveis do que os alimentos in natura. Leia as afirmações e assinale-as como verdadeiras (V) ou falsas (F). Em seguida, escolha a alternativa correta: a) V; F; V; F; F. b) F; V; V; V; F. c) V; F; V; V; F. d) F; V; F; V; F. e) V; F; F; V; V. 2. As escolhas alimentares – opção por determinados alimentos em detrimento de outros – refletem fatores biológicos, socioculturais e psicológicos dos indivíduos. Pensando dessa forma, leia as afirmações a seguir e escolha a alternativa correta: a) As características sensoriais (sabor, aparência e odor) dos alimentos não interferem na escolha. b) Os aspectos nutricionais (quantidade de calorias, nutrientes e aditivos e a U1 - História da alimentação e sua evolução 45 3. O comportamento e escolhas alimentares variam muito ao longo da vida de um indivíduo. Pensando dessa forma, leia as afirmações a seguir e escolha a alternativa correta: a) Apenas a partir da adolescência existe associação entre prazer e alimentação. b) Os hábitos alimentares começam a ser desenvolvidos durante a gestação, através do líquido amniótico. c) A alimentação dos adultos, diferentemente da dos adolescentes, não sofre influência do grupo em que estão inseridos. d) A indústria de alimentos não investe em desenvolvimento de produtos e propaganda para crianças, pois elas não interferem nas escolhas da família. e) O envelhecimento não traz limitações à escolha dos alimentos. presença de alimentos restritos para parte da população) são os únicos que devem ser considerados ao comprar um alimento. c) Uma alimentação saudável pode e deve ser prazerosa. d) O ambiente não interfere no momento da refeição. e) O conceito de comida boa ou ruim é igual para todos os indivíduos. U1 - História da alimentação e sua evolução 46 Referências ABREU, E. S. de et al. Alimentação mundial: uma reflexão sobre a história. Saúde e Sociedade, São Paulo, v. 10, n. 2, p. 3-14, ago./dez. 2001. ALVARENGA, M.; KORITAR, P. Atitude e comportamento alimentar – determinantes de escolhas e consumo. In: ALVARENGA, M.; ANTONACCIO, C.; FIGUEIREDO, M.; TIMERMAN, F. Nutrição comportamental. São Paulo: Manole, 2016. p. 23 – 50. ALVARENGA, M. et al. Nutrição comportamental. São Paulo: Manole, 2016. BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Guia alimentar para a população brasileira. 2. ed. Brasília: Ministério da Saúde, 2014. CARNEIRO, H. Comida e sociedade – uma história da alimentação. Rio de Janeiro: Elsevier, 2003. CASCUDO, L. da C. História da alimentação no Brasil. São Paulo: Global, 2011. COLETTI, G. F. Gastronomia, história e tecnologia: a evolução dos métodos de cocção. Contextos da Alimentação – Revista de Comportamento, Cultura e Sociedade, v. 4, n. 2, p. 41-55. mar. 2016. DIEZ-GARCIA, R. W. Reflexos da globalização
Compartilhar