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RUMO AO PALÁCIO AS ESTRATÉGIAS DE DOMINAÇÃO DOS ESPAÇOS POLÍTICOS NA BAHIA DURANTE A DITADURA (1966 – 1982)

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Universidade Federal do Rio de Janeiro 
 
 
RUMO AO PALÁCIO: AS ESTRATÉGIAS DE 
DOMINAÇÃO DOS ESPAÇOS POLÍTICOS NA BAHIA 
DURANTE A DITADURA 
(1966 – 1982) 
 
 
 
José Alves Dias 
 
 
 
 
 
 
 
 
2009 
 
 
RUMO AO PALÁCIO: AS ESTRATÉGIAS DE 
DOMINAÇÃO DOS ESPAÇOS POLÍTICOS NA BAHIA 
DURANTE A DITADURA 
(1966 – 1982) 
 
José Alves Dias 
 
 
Tese de doutoramento apresentada ao Curso de Doutorado do 
Programa de Pós-graduação em História Social do Instituto de 
Filosofia e Ciências Sociais da UFRJ como parte dos requisitos 
necessários à obtenção do título de doutor em História Social. 
Linha de pesquisa: Sociedade e Política 
Orientador: Carlos Fico 
 
 
RIO DE JANEIRO 
2009 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 Confecção da Ficha Catalográfica: Elinei Carvalho Santana – CRB 5/1026 
 
 
 
D532r Dias, José Alves. 
 Rumo ao palácio: as estratégias de dominação dos espaços 
políticos na Bahia durante a ditadura (1966-1982) / José Alves 
Dias, 2009. 
 Vi, 218 f.: il.; 30 cm. 
 Orientador: Carlos Fico. 
 Tese (Doutorado) – Universidade Federal do Rio de Janeiro 
 Programa de Pós-Graduação em História Social, Instituto de 
 Filosofia e Ciências Sociais, Rio de Janeiro, 2009. 
 Referências: f. 206-210. 
 
 1. Bahia – política e governo (1966-1982). 2. Carlismo (Bahia) 
– Ditadura Militar. 3. Sociedade e política – tese. I. Fico, Carlos. 
II. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Instituto de Filosofia e 
Ciências Sociais, Programa de Pós-Graduação em História Social. 
III. T. 
 CDD: 320.8142 
 
AGRADECIMENTOS 
 
A dívida que contraímos ao concluir um trabalho como este é enorme, como também 
são as possibilidades de cometer injustiças, esquecendo-se de pessoas que colaboraram para 
que ele se tornasse viável. Ainda assim, é preciso correr o risco, esperando que as pessoas não 
mencionadas compreendam que a omissão é fruto de uma memória depauperada e não da 
ignorância de sua contribuição. 
Deste modo, gostaria de agradecer à Fundação de Amparo à Pesquisa na Bahia – 
FAPESB – pela bolsa de estudos; ao pessoal do CEDIG da UFBA, especialmente, Fábio e 
Luís, facilitadores do meu acesso aos microfilmes do jornal A Tarde; aos funcionários do 
CPDOC da Fundação Getúlio Vargas, do Arquivo Público Nacional, da biblioteca do Instituto 
Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro – IUPERJ e do Arquivo Público da Bahia, pela 
gentileza e auxílio na consulta aos respectivos acervos. Às funcionárias do Programa de Pós-
graduação em História da UFRJ, Gleides e Sandra, pelo cuidado constante com os detalhes e a 
rotina acadêmica. 
Um agradecimento especial à banca de qualificação, professoras Marieta de Moraes 
Ferreira e Ângela de Castro Gomes que corrigiram os rumos da teses e deram indicações 
preciosas. Particularmente, agradeço ao meu orientador, Carlos Fico, pela paciência diante de 
minhas indefinições e limitações que foram resolvidas com sua precisão cirúrgica nos 
encontros de orientação. 
Tenho nítidos os momentos agradáveis de conversa com Renato Lemos, que entre um 
café amargo e outro, me emprestou alguns livros e os ouvidos para que eu resolvesse um 
rosário de questionamentos. 
Minha família, conquanto tenha se resignado, jamais aceitou passivamente a saudade 
nos longos dias de afastamento. Ainda assim, foi solidária nas incontáveis horas de 
distanciamento e reclusão para concluir a tese. 
Aos meus pares, no Departamento de História da Universidade Estadual do Sudoeste 
da Bahia, que se sobrecarregaram com as minhas disciplinas para que eu fosse liberado 
integralmente durante esse período, o meu reconhecimento e gratidão. 
No mesmo patamar estão os que colaboraram para revisão, formatação e finalização da 
tese e aos professores que, gentilmente, aceitaram compor a banca final de defesa. 
 
INTRODUÇÃO 
 
Durante mais de trinta anos o carlismo controlou a política baiana, manteve uma base 
parlamentar sólida, influenciou em quase todas as decisões presidenciais e acumulou cargos 
importantes na estrutura organizacional do Estado brasileiro. Tudo isso despertou um grande 
interesse pelas razões de seu vigor e de sua longevidade. 1 
Dentre as explicações existentes para esse fato, a do “autoritarismo congênito”, 
embora bastante simplificadora, é a mais difundida. Segundo essa interpretação, a dominação 
carlista resultou da identificação autoritária entre Antônio Carlos Magalhães e os governos 
militares e em decorrência disso, as administrações carlistas foram favorecidas com grandes 
somas de recursos federais que permitiram a expansão de suas bases. 2 
O carisma e a popularidade foram os traços marcantes da imagem pessoal de Antônio 
Carlos Magalhães que explicariam seu sucesso político, derivado, exclusivamente, dessas 
características individuais. Esse ponto de vista, igualmente simplista, ignora a existência dos 
mesmos predicados em líderes de outras correntes como o lomantismo, o vianismo, o 
juracisismo e tantos outros grupos que disputaram, ainda que sem êxito, o poder com o 
carlismo. 3 Quando o registro dos fatos é feito a partir dessa percepção, descarta-se, sumária 
ou parcialmente, a maior parte destas frações e lideranças que compunham a elite política da 
Bahia no período, absolvendo-as, assim, de suas responsabilidades ou punindo-as com o 
ostracismo histórico. 
Contrariando essa interpretação, este estudo se propõe a encontrar as razões para o 
predomínio do carlismo no conjunto de idéias propostas e sistematizadas pela elite 
conservadora do país durante a ditadura. O viés autoritário, naquela situação excepcional, 
compunha a estrutura ideológica, entretanto, não definia os critérios de organização das 
políticas públicas ou as relações estabelecidas entre o governo central e seus representantes 
nos estados da federação. 
Durante a pesquisa, ao aprofundar a análise e ampliar o foco da questão para o cenário 
político nacional foi possível perceber que há uma infinidade de razões para o crescimento e 
 
1 Considera-se aqui apenas o período de atuação conjunta e sistemática do grupo político de Antônio Carlos 
Magalhães que se inicia com a campanha para o seu primeiro governo estadual em 1970 e recrudesce com a 
derrota de seu candidato para o mesmo cargo em 2006. 
2 A síntese desse entendimento encontra-se em João Carlos Teixeira Gomes. Memórias das trevas: uma devassa 
na vida de Antônio Carlos Magalhães. São Paulo: Geração Editorial, 2001. 
3 A popularidade e o carisma de Antônio Carlos Magalhães estão bem destacados em José Batista Freitas Mattos. 
ACM: o mito. Rio de Janeiro: RGB, 2001. 
 10 
afirmação do carlismo na Bahia. Entre elas, destacam-se a sincronia com o ritmo político dos 
governos militares, a disposição para a coesão ideológica em torno de temas convergentes do 
pensamento conservador e o controle efetivo dos espaços decisivos do poder estadual. A 
hegemonia carlista, vista por esse ângulo, ocorreu como resultado das mudanças conjunturais 
e da cadência imposta pelos atores históricos naquele processo político em mutação. 
A percepção do movimento sincrônico entre o carlismo e a ditadura é mais evidente 
nos períodos de crise acentuada e nos processos eleitorais. Um desses momentos destacadosno texto é a participação de Antônio Carlos Magalhães na época precedente ao golpe de 1964. 
Na condição de deputado federal, ele atuou como uma espécie de âncora parlamentar da 
bancada baiana semeando as idéias anticomunistas e conspirando contra o governo de João 
Goulart. 
Esgotada essa etapa do processo, ele se concentrou na formação do diretório regional 
da ARENA para atender aos reclamos da reforma partidária imposta no ano seguinte - essa é a 
fase embrionária do carlismo e a ocasião de afirmação da liderança política de ACM. Mais 
adiante, quando ocupou a prefeitura da capital baiana e o governo estadual direcionou suas 
ações para a urbanização e a industrialização, em consonância com os objetivos de construção 
e transformação do Brasil em uma grande potência. 
Durante todo o seu percurso como político da ditadura preocupou-se com o 
sincronismo das idéias. Moderou o discurso repressivo e continuísta nas primeiras e últimas 
sucessões presidenciais – momentos de afirmação e refluxo da ditadura – mas firmou posição 
autoritária e conservadora nas eleições intermediárias quando “a linha dura” ocupava o poder. 
Em tais condições a sincronia com a ditadura gerou resultados bastante satisfatórios para o 
carlismo. 
O contexto político da ditadura também foi favorável ao carlismo. A inexistência de 
simetria e continuidade nas propostas políticas dos governos militares afetaram a hegemonia 
habitual de antigos chefes políticos da Bahia, de modo que estes não conseguiram se manter 
no poder estadual por um longo período, após o golpe de 1964. 
Políticos como Luiz Viana, Lomanto Júnior e Juracy Magalhães integravam correntes 
políticas estaduais que subsistiam desde a década de 1930, mantiveram-se com o golpe e 
lideraram até o início da década de 1970. Não desapareceram depois disto, porém, após esse 
período, a sua permanência na política nacional não se converteu em vigor político para 
superar as demais etapas da ditadura. 
O apelo do carlismo à unidade ideológica da elite, após a reforma partidária e a 
imposição do bipartidarismo, foi um recurso para minimizar os efeitos da desagregação destes 
 11 
grupos tradicionais, especialmente nos pequenos municípios da Bahia. Esses desafios, 
impostos por uma conjuntura dinâmica e complexa, exigiram unidade da elite brasileira e de 
seus representantes nos estados. Essa integração, todavia, só seria possível com a formação de 
uma coligação entre as correntes tradicionais, o predomínio de uma delas com extinção das 
demais ou o surgimento de um outro grupo que absorvesse todas as diferenças. Prevaleceu a 
última hipótese. 
Com o carlismo em ascensão, o período compreendido entre 1970 e 1982 pode ser 
definido como de acomodação das forças políticas remanescentes ou originárias do golpe de 
1964. Ainda que cada um, ao seu modo, buscasse intervenção decisiva no diretório regional 
da ARENA e na Assembléia Legislativa da Bahia, o que prevaleceu foi a coesão do bloco 
conservador liderado por Antônio Carlos Magalhães. Isso porque, a certa altura, os grupos 
tradicionais, impossibilitados de dominarem individualmente os espaços de decisão, aceitaram 
a investidura de Antônio Carlos Magalhães como intermediador. O carlismo, então, surgiu 
como alternativa conciliadora dos interesses conservadores e autoritários. 
Desse modo, a inserção política estadual no movimento que desestabilizou o governo 
Goulart e implantou a ditadura no país foi resultado de uma articulação carlista entre os 
diversos setores da elite na Bahia e os temas convergentes que compunham a base teórica do 
pensamento conservador brasileiro. 
Assim, o carlismo além de estar em sincronia com o poder central nos momentos 
cruciais da política nacional, também manteve a integração da elite política na Bahia. Para 
tanto, foi fundamental a manutenção de um relacionamento no qual se garantissem o respeito 
à hierarquia e o funcionamento orgânico. A cooptação de indivíduos com potencialidades 
políticas e eleitorais para integrar-se ou associar-se ao carlismo não deveriam representar 
risco à liderança de Antônio Carlos Magalhães e isso explica atitudes refratárias com aqueles 
que ameaçaram a unidade do grupo ou sua hierarquia interna. Essa articulação foi essencial 
para a sobrevivência do carlismo em tempos de ditadura, nos quais a harmonia era um 
atributo raro, mas essencial para manutenção do status quo e preservação da proposta política 
conservadora da elite. 
Sem dúvida, Antônio Carlos Magalhães utilizou artifícios de intimidação, 
constrangimento e violência para articular essa integração. Entretanto, não foi o método, e sim 
o resultado, que diferenciou o carlismo das demais correntes políticas da Bahia. 
A escolha de uma plataforma ideal, composta de temas centrais como o 
anticomunismo e o desenvolvimento, além de manterem-se acima dos interesses locais e 
pessoais, causou boa impressão nas diferentes dissidências militares ocupantes do poder 
 12 
durante a ditadura. Naturalmente que a convergência da elite para esses interesses não se 
efetivou automaticamente. Ela forjou-se mediante o convencimento constante de sua 
necessidade e pela ameaça crescente que o carlismo passou a representar para todos quantos 
estivessem à margem de sua influência. 
O carlismo também estabeleceu uma relação de interdependência com os governos da 
ditadura. Ao tempo em que buscava sua afirmação e apoio político federal, os mandatários 
desse período desejavam a normalidade institucional, dado ao caráter instável do regime, que 
sofria pressões internacionais e constante oposição interna, inclusive armada. Nesse contexto, 
a estabilidade das instituições e a segurança de seus dirigentes dependiam, em grande parte, 
do equilíbrio entre os diversos setores de apoio ao governo. A aparência de democracia que os 
militares tentaram transmitir em sua propaganda oficial forçosamente induzia a essa 
necessidade, sendo a unidade da elite uma medida prioritária. 
Entretanto, somente a intervenção dos militares na política dos estados não garantiu a 
unidade, ao contrário, rompeu com a hegemonia anterior a 1964 criando um movimento 
rotatório das forças políticas e, consequentemente, a sua renovação. Na Bahia, isso ocorreu 
precisamente nas eleições de 1970, quando Antônio Carlos Magalhães tornou-se governador. 
Como ocorria tradicionalmente, era imprescindível que o presidente da República 
avalizasse a indicação do diretório regional da ARENA para que o nome do eleito fosse 
resultado de um consenso. Desta forma, Castelo Branco aprovou a escolha da elite baiana, 
mas, ainda que o aval fosse um sinal importante, a construção do carlismo não dependeu 
apenas disto. 
Foi protegido por uma teia de relações meticulosamente construída, sustentado por 
uma engenhosa articulação política e sincronizado com os princípios ideológicos da elite 
dominante brasileira que Antônio Carlos Magalhães conseguiu ocupar o palácio do governo. 
Esse passo foi fundamental para a estruturação do carlismo como grupo aspirante à 
hegemonia política estadual, uma vez que, no comando do poder, foi possível a ele atuar 
decisivamente para cumprir a agenda da elite brasileira, credenciando-se para galgar posições 
superiores. 
A ocupação do referido cargo possibilitou a ACM o controle do diretório regional da 
ARENA e de sua bancada na Assembléia Legislativa. Não era suficiente ser governo e ter 
maioria parlamentar formal se não houvesse consenso nas decisões. As diferentes sublegendas 
com suas infinitas disputas locais podiam colocar em risco os interesses do governo e facilitar 
a intervenção da oposição. Com isso é importante notar que não havia um alinhamento 
 13 
automático com as propostas governistas e nem se confirmao caráter submisso e dependente 
do Legislativo. 
Sendo assim, recusamos a interpretação do “autoritarismo congênito” encontrada 
também nos meios acadêmicos, onde se espera uma apreciação moderada e exaustiva dos 
temas. Porque se despreza com isso a ligação de Antônio Carlos Magalhães com uma elite 
ideologizada e ciente de suas funções na sociedade que pretende dominar. Ignora-se, por outro 
lado, o papel das oposições que, por esse viés, pareciam lutar contra o destino indócil e não 
por uma causa democrática. 
Para que o essencial não seja abandonado, a materialização dos fatos que compõem a 
trajetória da elite política na Bahia deve ser vista dentro de um contexto social, econômico e 
político e as instituições que direcionam, acolhem e legitimam o poder devem ser dissecadas 
juntamente com os agentes sociais que lhes atribuem essas funções. 
Deste modo, não se pode ignorar que a estratégia carlista foi vitoriosa porque Antônio 
Carlos Magalhães, consciente das contradições inerentes às conjunturas ao longo de sua 
trajetória política, atuou com desenvoltura no trato dessas diferenças. Sem a pretensão de 
fundir, aparar ou superar essas desigualdades, impôs, no curso dos acontecimentos, alguns 
ajustes que lhe garantiram apoio para materialização do controle dos espaços de poder ou 
execução pragmática de seus objetivos. 
Também se buscará demonstrar aqui que a hegemonia carlista na Bahia foi a 
combinação de uma mudança na conjuntura política e da adoção de estratégias eficazes e 
ideologicamente referenciadas no pensamento elitista da época. Por esse motivo, adiante se 
busca rever a atuação das elites políticas da Bahia nos partidos políticos e no parlamento, 
espaços importantes para definir quem ocupou os cargos eletivos e em que condições elas 
definiram suas estratégias de conquista e manutenção do poder. Aqui se explicitará a 
dinâmica da relação entre os elementos enunciados na problemática, no diretório regional da 
ARENA e na Assembléia Legislativa da Bahia durante o referido período, salientando, 
especialmente, aqueles que se relacionam com a disputa entre os vianistas, os juracisistas e os 
carlistas pelo poder estadual. 
Pretende-se com isso relativizar as atitudes passivas do “partido do governo” e a 
“submissão” do legislativo estadual chamando a atenção para as ações ativas e, por vezes, 
conflitantes da elite política na Bahia no processo de consolidação de suas bases nesse cenário 
excepcional. 
Por isso, ao longo dos sete capítulos que compõe este texto, iremos caracterizar essas 
correntes políticas que atuavam entre 1966 - ano das primeiras eleições indiretas para 
 14 
governadores no bipartidarismo - e 1982 - quando o carlismo se consolida, em eleições diretas 
e pluripartidárias, como grupo. Verificar-se-á, concomitantemente, o grau de importância do 
partido e do legislativo estadual como espaços decisivos de cooptação e controle desses 
grupos políticos e de apoio às políticas dos governos estaduais. 
O mesmo período abrange desde a criação do sistema bipartidário e as primeiras 
eleições dentro dessa configuração partidária, até as primeiras eleições após o retorno ao 
pluripartidarismo. Pela ordem, foram eleitos governadores da Bahia nesse período: Luiz 
Viana Filho (1966), Antônio Carlos Magalhães (1970), Roberto Figueira Santos (1974), 
Antônio Carlos Magalhães - pela segunda vez - (1978) e, finalmente, João Durval Carneiro 
(1982). 
As articulações, conflitos e composições entre Juracy Magalhães, Luiz Viana Filho e 
Antônio Carlos Magalhães e seus aliados políticos, aspirando à dominação dos espaços 
decisivos do poder político, ou seja, o governo, o partido e o parlamento, são o foco principal 
deste estudo. No plano secundário, porém não menos importante, está o governo federal, num 
regime ditatorial dirigido por militares de alta patente e suas estratégias de controle político e 
social, incluindo a imposição do bipartidarismo e do pluripartidarismo em momentos 
estratégicos. Observar como essas lideranças e seus aliados se movimentaram para ocupação 
desses espaços, quais são suas estratégias, qual foi a manobra vitoriosa e que razões 
motivaram esse sucesso são finalidades primordiais. 
Tudo isso foi analisado a partir do conhecimento da trajetória política dos envolvidos, 
pela interseção de suas trajetórias individuais naquela conjuntura, através da percepção da 
rede de relações estabelecidas, com a análise dos discursos oficiais e das correspondências, 
pelo estudo da estrutura orgânica e inorgânica das instituições em apreço e com o exame dos 
depoimentos e entrevistas. 
Para conhecer a trajetória política, foi imprescindível a leitura da produção biográfica 
das referidas lideranças da elite política baiana, além dos verbetes do Dicionário Histórico-
Biográfico Brasileiro. Uma revisão da literatura permitiu o conhecimento dos partidos 
políticos, do parlamento e do governo estadual no lapso de tempo coberto pela pesquisa. Os 
discursos oficiais, compreendendo principalmente mensagens governamentais e 
pronunciamentos parlamentares, foram consultados no Diário Oficial da Assembléia 
Legislativa no arquivo dessa instituição e no Arquivo Público da Bahia, como também em 
jornais de grande circulação dentro e fora do estado, particularmente, A Tarde e o Jornal da 
Bahia. Subsidiariamente, os Anais e Diários da Câmara dos Deputados, do Senado e do 
Congresso Nacional, disponíveis “on line”, também foram consultados. 
 15 
No arquivo pessoal de Juracy Magalhães, no CPDOC/FGV, consultamos a 
correspondência pessoal rica em detalhes sobre a política baiana. Ela narra especificamente os 
desentendimentos entre o titular e Antônio Carlos Magalhães, mas também realça a 
participação de deputados estaduais e federais ligados ao ex-interventor de Vargas. Do mesmo 
modo, exploramos as agendas, anotações, correspondências, memoriais do arquivo de Luiz 
Viana Filho no Arquivo Nacional com atenção especial ao relacionamento do autor com 
outros políticos. Essas fontes foram copiadas, catalogadas e organizadas por tema e 
permitiram conhecer as origens da elite da Bahia e sua trajetória política. 
De posse dessas informações, foi possível situar alguns dos atores preferenciais deste 
estudo, avaliar suas relações, analisar as suas estratégias e a emergência de um dos segmentos 
no plano político local e nacional. Para proceder a uma consulta objetiva e sistemática 
utilizamos alguns instrumentos como os resumos de documentos e publicações, fichas de 
catalogação por tema, tipo de documento ou ordem cronológica. 
Em suas caminhadas rumo ao palácio do governo, as elites deixaram rastros de suas 
estratégias de dominação basilares para o esclarecimento dos fatos que envolveram o período 
político mais intenso da ditadura. 
 
ABSTRATC 
 
 
This work presents a research on the association between the political elite in Bahia and 
the military, during the dictatorship, and how this stimulated many questions, especially 
with regard to the rise of carlism as a hegemonic power. Generally, the carlist 
domination is interpreted as a result of the authoritarian identification between Antônio 
Carlos Magalhães and the military governments. However, the complexity of the 
relationships formed in that situation requires a broader assessment. It is a context 
permeated with conflicts, doubts and contradictions also involving juracisists, vianists 
and lomantists. The established links were not limited to the personnel convenience, the 
political pragmatism or the authoritarian identification. The driving questioning was the 
success of the carlist strategy in the hegemonization process of Bahia’s politics during 
dictatorship. The timeframe comprised the period between 1966 and 1982 andis 
justified because it was a time marked by the change in the correlation of political 
forces in Bahia. Thus, this study aims to find the reasons for the predominance of 
carlism within the set of ideas proposed and systematized by the conservative elite of 
the country during the mentioned period. The research was based on documentary 
analysis in biographies, statistics and letters, as well as literature on the main concepts 
addressed in the work. Therefore, even recognizing that this study is not conclusive and 
does not end in this research, one can infer that the carlist strategy was to integrate 
Bahia’s political elite around relevant political themes and of common interest. 
Anticommunism and the development stand out as unifying the conservative thought 
and this unit allowed the consolidation of this group and the dominion of decisive 
spaces in Bahia’s politics for several decades. 
 
Key-words: Bahia. Politics. Elites. Dictatorship. 
 
RESUMO 
 
 
 
Este trabalho apresenta uma pesquisa sobre a associação entre a elite política na Bahia e os 
militares, no período da ditadura, e como essa estimulou diversos questionamentos, 
especialmente, no que tange à ascensão do carlismo como força hegemônica. Geralmente, a 
dominação carlista é interpretada como resultado da identificação autoritária entre Antônio 
Carlos Magalhães e os governos militares. Entretanto, a complexidade das relações 
constituídas nessa conjuntura impõe uma apreciação mais alargada. Trata-se de um contexto 
permeado de conflitos, dúvidas e contradições envolvendo, também, juracisistas, vianistas e 
lomantistas. Os vínculos estabelecidos não se limitaram à conveniência pessoal, ao 
pragmatismo político ou à identificação autoritária. O questionamento impulsionador foi o 
sucesso da estratégia carlista no processo de hegemonização da política baiana durante a 
ditadura. O recorte temporal compreendeu o período entre 1966 e 1982 e justifica-se por ter 
sido uma época marcada pela alteração na correlação de forças políticas na Bahia. Desta 
forma, este estudo se propõe a encontrar as razões para o predomínio do carlismo no conjunto 
de idéias propostas e sistematizadas pela elite conservadora do país no período citado. A 
pesquisa baseou-se na análise documental em biografias, estatísticas e correspondências, 
como também bibliográfica sobre os principais conceitos abordados no trabalho. Portanto, 
mesmo reconhecendo que esse estudo não é conclusivo e também não se esgota nesta 
investigação, pode-se inferir que a estratégia do carlismo foi integrar a elite política baiana em 
torno de temas políticos relevantes e de interesse comum. O anticomunismo e o 
desenvolvimento destacam-se como unificadores do pensamento conservador e essa unidade 
permitiu a consolidação desse grupo e o domínio dos espaços decisivos da política baiana por 
várias décadas. 
 
 
 
Palavras-chave: Bahia. Política. Elites. Ditadura. 
 
SUMÁRIO 
 
 
 
Introdução. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 09 
Capítulo I - O golpe e a ditadura: formação da elite dirigente e ampliação 
das bases de sustentação. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 
 
16 
Capítulo II - Os referenciais de integração na Bahia: caminhos e 
descaminhos da elite política renovada em busca do poder. . . . . . . . . . . . . . . 
 
36 
Capítulo III - A criação do bipartidarismo em 1966 e a formação da 
ARENA na Bahia. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 
 
59 
Capítulo IV - A atuação dos partidos e das sublegendas no bipartidarismo e 
do legislativo estadual numa ditadura. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 
 
93 
Capítulo V - O predomínio do consenso: a defesa do desenvolvimento 
baiano nas estratégias da elite política. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 
 
117 
Capítulo VI - A ferro e a fogo: o conflito como estratégia equivocada do 
carlismo para as eleições de 1974. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 
 
142 
Capítulo VII - O retorno ao consenso: as bases nacionais do carlismo e os 
despojos regionais do vianismo e do juracisismo nas eleições de 1978. . . . . . 
 
179 
Considerações finais. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 202 
Referências bibliográficas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 206 
Anexos. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 211 
 
 
CAPÍTULO I 
 
O golpe e a ditadura: 
formação da elite dirigente e ampliação das bases de sustentação 
 
Perspectivas iniciais 
 
Há versões variadas para a conspiração e o golpe ocorrido em 1964 que originaram um 
universo considerável de interpretações sobre os agentes provocadores, os instrumentos e os 
desdobramentos desses fatos nas décadas seguintes. Os principais pontos de divergência 
referem-se às motivações do golpe e à extensão política e social alcançada nos anos seguintes. 
A conspiração realizada pelos setores militares e civis para a intervenção militar que 
depôs o presidente João Goulart foi impulsionada pela infiltração comunista nas instituições 
políticas e militares e pelo insatisfatório desenvolvimento econômico do país. Desta forma, 
essa intervenção se caracterizou como uma missão de tutela à democracia cumprida no tempo 
determinado e necessário. 1 
Evidentemente a extensa bibliografia produzida durante as últimas décadas sobre o 
assunto não ratificam essas alegações, como também os fatos revelados pela própria 
documentação oriunda dos arquivos particulares e institucionais atualmente conhecidos. 
Parece mais coerente argumentar a existência de um pretexto conservador para o golpe, 
movido pelo temor das reformas de base e o crescimento da participação trabalhista. 2 
De qualquer modo, ainda interessa continuar investigando em que momento, após 
1945, se iniciam os preparativos para a desestabilização da democracia e quão diversa é a 
amplitude de suas conseqüências. 
 
1 O entendimento de que as Forças Armadas são instituições militares autônomas que tutelam a Constituição 
Federal e a democracia está presente em quase todos os discursos de apoio ao golpe de 1964. Alfred Stepan 
(1975) concluiu que os militares participam de um sistema e reagem a todos os estímulos que afetam o seu 
funcionamento. As evidências demonstram que há restrições ao papel “moderador” dos militares no episódio 
brasileiro e que sua atuação não se traduziu em tutela da democracia, e sim, numa intervenção conspiratória 
contra um governo legalmente constituído. 
2 Em que pesem as diferenças analíticas entre marxistas, não-marxistas, militares, etc., o conjunto bibliográfico 
sobre esse período é praticamente unânime nessa conclusão. 
 
 
 
17 
Ressalta-se ainda que, mesmo quando se sustenta a idéia de uma conspiração 
conservadora cuja intervenção, por meio de um golpe de Estado, desencadeou uma ditadura, 
não se pode ignorar as profundas divergências entre seus executores. Apesar de esse tema ter 
sido objeto de diversas pesquisas no meio acadêmico, ainda permanece como uma incógnita a 
amplitude das consequências provocadas por essas fissuras na correlação de forças existentes 
no interior dos diferentes governos que atuaram durante esse período. Isso porque, 
possivelmente, a disputa entre as forças heterogêneas do sistema autoritário vigente no Brasil 
exigissem, dos segmentos em conflito, uma movimentação constanteem direção aos seus 
aliados para garantir uma ampla base de sustentação no governo. Provavelmente, a dinâmica 
dos acontecimentos implicou em rearticulação dessa base aliada, cooptando uns e descartando 
outros, de acordo com o momento e as motivações. Sendo assim, possivelmente essas cisões 
na estrutura governamental afetaram diretamente as elites políticas nos estados da federação e 
interferiram sobremaneira nas indicações para governador e nas eleições proporcionais. 
No caso particular da Bahia, encontraremos Juracy Magalhães, Luiz Viana Filho e 
Lomanto Júnior como pivôs dessa engrenagem política e, mais adiante, Antônio Carlos 
Magalhães, como um novo ator político surgido durante a ditadura, que superou antigas 
lideranças e colaborou para materializar o projeto político e econômico da elite brasileira na 
última metade do século XX. 
Este capítulo pretende propiciar uma visão geral da situação política e econômica do 
país, bem como permitir uma exata contextualização dos agentes e dos episódios narrados 
adiante. Essa conexão entre a política global e suas ramificações na Bahia amplia, 
sobremaneira, a compreensão do modus operandi dos agentes da política baiana e explica 
certos comportamentos aparentemente tidos como fruto do autoritarismo congênito, como é o 
caso de Antônio Carlos Magalhães nesse processo. 
 
O golpe de 1964 e seus antecedentes 
 
As tentativas malogradas de um golpe de estado que possibilitasse aos civis do Partido 
Social Democrático (PSD) e da União Democrática Nacional (UDN) - como também a certos 
setores militares - a oportunidade de controlar o poder e dirigir a nação retrocedem a 1955, no 
início do governo Juscelino Kubitscheck. Porém, se apresentaram de maneira mais consistente 
em 1961, com a escolha da chapa Jânio Quadros (UDN) e João Goulart, do Partido 
Trabalhista Brasileiro (PTB), para presidência e a posterior renúncia do primeiro alguns 
 
 
18 
meses depois da posse. A garantia constitucional da investidura do cargo vacante pelo vice-
presidente eleito foi obstaculizada pelos referidos segmentos golpistas. 3 
João Goulart, conhecido como Jango, era apoiado por Leonel Brizola e adepto de 
soluções reformistas para os problemas básicos que afetavam o país. Sua atuação ocorreu num 
período em que era evidente a polarização entre a direita e a esquerda, quando o comunismo e 
o liberalismo se expandiam e as contraposições entre as teorias sobre política e economia 
ocorriam na mesma proporção da polarização ideológica. 
Os políticos e economistas liberais compreendiam que o governo deveria ter menor 
intervenção em suas respectivas áreas, regulando-as quando necessário, mas, garantindo sua 
fluidez. Foram esses princípios que nortearam, em grande parte, o planejamento econômico 
desse período. Entretanto, ao longo desse estudo será possível perceber que, para a elite 
brasileira que dirigiu o país durante a ditadura, o liberalismo não era um conceito tão sólido 
quanto o anticomunismo que se tornou um grande elemento de coesão dos grupos 
reacionários. 
Em paralelo, o comunismo propunha um acirramento da luta de classes da qual 
originaria a revolução que inverteria as posições na sociedade garantindo igualdade para 
todos. Excepcionalmente, admitia-se a intermediação com fragmentos de classes distintas 
apenas como atalho para o objetivo final: possibilidade de fusão entre classes distintas, dentro 
de um mesmo país, para vencer o imperialismo. Essa solução intermediária permitiu a 
aproximação de Jango com grupos de esquerda causando inconformismo e desconfiança. 
O fato, porém, é que as posições de Jango, mesmo sendo apenas reformistas, atendiam 
às expectativas dos sindicalistas. Denis de Moraes percebeu na plataforma reformista de 
Jango uma resposta institucional aos anseios populares porque “as propostas nacionalistas, 
desenvolvimentistas, antiimperialistas e pelas reformas de base encontravam, nesses 
segmentos, uma audiência crescente”. 4 
Nesse ponto Gorender foi ainda mais abrangente e percebeu que “apesar da imprecisão 
e de certa inclinação populista, a idéia de reformas de base correspondia às aspirações das 
massas trabalhadoras, de vastos setores das camadas médias e do setor nacionalista da 
burguesia”. 5 
 
3 Houve uma tentativa de golpe, impedida pela ação do marechal Henrique Batista Duffles Teixeira Lott, que 
garantiu a eleição e a posterior posse de Juscelino Kubitschek. 
4 MORAES, Denis de. A esquerda e o golpe de 64. Rio de Janeiro: Espaço e Tempo, 1989. 
5 GORENDER, Jacob. Combate nas trevas; a esquerda brasileira: das ilusões perdidas à luta armada. São 
Paulo: Ática, 1990, p. 51. 
 
 
19 
Os conservadores acreditavam que as reformas de base seriam o estopim para o 
despertar da consciência social que, alimentada pelo comunismo, colocaria em risco o 
capitalismo e, consequentemente, suas posições no poder e seus negócios no Brasil. De 
imediato, parte do PSD se afastou da coligação de apoio ao governo João Goulart, 
principalmente após 1963, quando se tornou inevitável um posicionamento do presidente. A 
UDN, em bloco, fazia oposição sistemática ao governo, enquanto dentro do PTB e do 
movimento sindical não havia consenso no apoio a Goulart. O fato de não conseguir a 
conciliação das forças políticas na base governista facilitou a desestabilização pretendida 
pelos conspiradores e espalhou o medo de uma crise política e econômica generalizada. 6 
As articulações para desestruturar o governo federal ocorriam desde 1961: nos quartéis 
os generais se movimentavam para intervir militarmente a qualquer momento. Enquanto isso, 
a grande maioria dos empresários favoráveis a uma linha política conservadora produziu e 
disseminou para a sociedade, por meio do IPES e do IBAD, uma intensa propaganda 
anticomunista e divulgou sua proposta desenvolvimentista para vencer a crise econômica, 
demonstrando a inviabilidade daquele governo. 
O Instituto Brasileiro de Ação Democrática (IBAD) surgiu em 1959 com o objetivo de 
financiar candidatos opostos ao populismo e direcionar capital para a propaganda 
anticomunista. O Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES) foi criado em 1962 por 
empresários brasileiros, especialmente do Sudeste, ansiosos por uma forma de organização 
capaz de enfrentar o crescimento qualitativo das organizações sindicais dos trabalhadores e 
intervir na base do governo – ou contra ele – para reverter os efeitos das reformas de base em 
seus empreendimentos. Quando o IBAD foi extinto por Goulart em 1963, o IPES manteve o 
financiamento de artigos e filmes anticomunistas. Somente no início dos anos 1970, 
cumpridos os seus objetivos, essa entidade foi dissolvida. 
Uma outra forma de conspiração contra o governo Goulart foi promovida por grupos 
femininos como a CAMDE, apoiados pelos IPES e o IBAD. As Marchas da Família com 
Deus Pela Liberdade foram mais que atos de reação da comunidade católica conservadora. 
Foi uma manifestação política, na tentativa de legitimar o anticomunismo como sentimento 
 
6 Em depoimento ao autor, Ubirajara Pereira de Brito confirmou que João Goulart “tentou reunir todas as forças 
antiimperialistas para fazer as reformas de base”. Provavelmente, um movimento muito amplo, entretanto, 
sem a força política e militar necessária. Sua análise sobre o golpe de 1964 é muito bem fundamentada, visto 
que, sendo assessor muito próximo do gabinete de Jango presenciou vários dos acontecimentos que 
precederam ao golpe. Quando vários membros da equipe do governo deposto se exilou, Ubirajara Brito foi 
presença constante ao lado destes na articulação de estratégias para o retorno do país ao sistema democráticosendo, inclusive, assessor especial na candidatura de Trancredo Neves. 
 
 
20 
pleno e deliberado de toda sociedade e, com isso, alavancar, a propósito de um pretenso apoio 
popular, o golpe que se consumaria no final daquele mês de março. 
Aos poucos, a pressão dos setores políticos, industriais, empresariais e eclesiásticos, 
bem como de parte das Forças Armadas, tornou imperativo o posicionamento do governo 
federal. Numa análise recente sobre a construção memorialista sobre o golpe de 1964, 
Adriano Codato define a oposição a João Goulart, da seguinte forma: 
 
Os limites políticos da democracia brasileira estão definidos, nessa 
conjuntura, por duas impossibilidades. Pela impossibilidade de origem anti-
liberal para aceitar as "regras do jogo" (daí a campanha direitista pela 
renúncia de Vargas e a campanha militar para impedir a posse de João 
Goulart após a renúncia de Janio Quadros). E pela impossibilidade de 
origem anti-republicana para aceitar a legitimidade do conflito político como 
constituinte da própria democracia. Por isso que, para as camadas médias 
tradicionais, para as cúpulas das Forças Armadas e para a burguesia 
brasileira, toda contestação aparecia como "desordem", todo movimento 
social conduzia à "instabilidade" e tudo isso junto instaurava o "caos". 7 
 
Assim expressa, a opinião de Codato confirma a hipótese de que a crise desencadeada 
em 1964 foi a expressão-limite da luta de classes. Vejamos o complemento de suas idéias: 
 
O resultado do golpe de 1964 é muito menos a saída desastrada de mais uma 
crise do populismo conduzida pela inabilidade de um político – Jango – sem 
disposição para ativar o "dispositivo militar" e resistir a mais um golpe de 
Estado, e sim a reação política mais ou menos organizada de uma parte da 
sociedade brasileira à ameaça (ou melhor, à percepção subjetiva da ameaça) 
de uma "república sindical" ou, na pior das hipóteses, da instauração do 
"comunismo". Essa percepção estava ligada a três processos: o crescimento 
da pressão operária sobre o Estado em nome da «proteção social» diante de 
um capitalismo em rápida transformação. Daí o número crescente de greves 
e o reforço do movimento sindical urbano; a radicalização ideológica do 
movimento nacionalista, liderada pelo ISEB e pelo PCB; e o questionamento 
efetivo da estrutura agrária através das Ligas Camponesas no Nordeste. É 
justamente a perda de controle dos políticos populistas diante da ascensão do 
movimento de massas, e não a sua instrumentalização maquiavélica pelos 
"demagogos", que está no centro da ruptura dessa estrutura de poder. É ela 
que, no fim das contas, põe em xeque o compromisso assumido em 1930 e 
instiga o conjunto das classes dominantes a solicitar às Forças Armadas a 
restauração da "ordem social". 8 
 
7 CODATO, Adriano Nervo. O golpe de 1964: luta de classes no Brasil - a propósito de 'Jango', de Silvio 
Tendler. In: Revista Espaço Acadêmico, Maringá (PR): v. 36, 6 maio de 2004. p. 1. 
8 Ibidem, p.1. 
 
 
 
21 
 
O presidente João Goulart, impossibilitado de mediar a contento as tensões sociais e 
impedir as tentativas de desestabilização política ao seu governo, assistiu prevalecer a força 
da elite possuidora de meios para controlar subsidiariamente os preços e provocar a inflação 
descontrolada. A inconsistência da política e da economia provocada por todos esses fatores 
tornou o ambiente favorável aos golpistas de outrora que se mantinham a postos em busca de 
novas oportunidades. 
Em várias oportunidades Jango foi alertado para o perigo de golpe, inclusive pelos 
baianos Ubirajara Brito, Waldir Pires e Fernando Santana. Ubirajara presenciara reuniões de 
fazendeiros com o general Amaury Kruel e soubera do levantamento de recursos e da compra 
de armas para combater o comunismo e a reforma agrária. No dia 16 de fevereiro de 1964, o 
primeiro, assessor de Jango, reuniu os demais colegas e dirigiu-se ao presidente para relatar a 
manobra do general Kruel, presenciada no interior de Minas Gerais. 
O presidente ouviu o relato e estranhou o comportamento de seu compadre 
Kruel. Mesmo assim, mandou-nos conversar com o general Assis Brasil, 
chefe da Casa Militar. Esse estranhou ainda mais do que o presidente, disse-
nos que tudo estava sob controle e que poderia ser uma ação diversionista do 
general Kruel ou destinada a evitar que lideranças golpistas perigosas 
assumissem o controle da região. 9 
Entretanto, a nova tentativa de golpe de estado se materializou e, por conseguinte, 
manteve o status quo da elite brasileira. Daí por diante, os objetivos desses setores foram 
reordenar e “sanear” os partidos e as instituições para executar os seus propósitos. Pretendiam 
ocupar todos os espaços de poder com a finalidade de acelerar o crescimento econômico 
industrializado para potencializar os negócios no mercado interno e no exterior. A 
reordenação e o saneamento foram estabelecidos com imposição de um estado de exceção, no 
qual a ruptura dos direitos legais e a restrição dos processos eleitorais foram fundamentais. O 
processo industrializador foi imposto a um custo social altíssimo, somente percebido nas 
décadas posteriores. 
Um dos primeiros e principais articuladores dessa proposta foi o general Castelo 
Branco e, juntamente com ele, um grupo de assessores muito próximos. Certamente, não 
houve unanimidade entre eles, contudo, as divergências concentravam-se na forma e nunca no 
conteúdo ideológico que impulsionava o grupo. Por isso, a visão doutrinária da ditadura será 
vista nesse estudo a partir de alguns pressupostos gerais que englobam todo o período. Essa 
 
9 BRITO, Ubirajara. Kruel. Ou...adesão antecipada. In: Nosso Caminho: Revista de arquitetura, arte e cultura. 
Rio de Janeiro: Sete Letras, 2008, p. 60. 
 
 
22 
caracterizou-se por estabelecer o anticomunismo e a confiança no desenvolvimento industrial 
do país como pontos de convergência entre todos os setores da elite durante a ditadura. 
 
Os “revolucionários” e o governo Castelo Branco 
 
Visto que essa apreciação contextual busca a correspondência entre a formação da 
elite dirigente brasileira durante a ditadura e ampliação de suas bases de sustentação na Bahia 
seria razoável ouvir a voz dos agentes centrais desse ciclo histórico. Desse modo, as visões 
que Luiz Viana Filho, Juracy Magalhães e Antônio Carlos Magalhães tiveram do governo 
Castelo Branco talvez sejam as mais indicadas como ponto de partida para a apreciação dessa 
matéria, visto que muito irão contribuir para validação das conclusões apresentadas. 10 
Pela apreciação das obras legadas, tentaremos demonstrar que o “saneamento”, as 
reformas e as adaptações legais - providências tomadas durante o primeiro governo da 
ditadura - foram essenciais para a consolidação das propostas política e econômica da elite 
brasileira, dispersas num primeiro momento, embora bastante consistentes no início dos anos 
1970. 
Evidentemente, não houve uma prévia articulação entre os golpistas no sentido de 
criar um projeto de gestão governamental sólido para o período em que ficaram no poder. A 
ação de grupos políticos e empresariais, como também as iniciativas militares antes do golpe, 
foram esparsas e, até certo ponto, desagregadas umas das outras. Somente no governo Castelo 
Branco, foram traçadas as primeiras metas e se constituíram, de fato, as diretrizes para 
atuação conjunta de todas as forças da elite, existentes nos campos político e econômico. 
Os depoimentos de Luiz Viana Filho, Juracy Magalhães e Antônio Carlos Magalhães 
também possibilitam a percepção da tentativa de unidade em torno dessas propostas que têm, 
prioritariamente, um caráter político com o anticomunismoe econômico, com o 
desenvolvimentismo. As reformas em todos os níveis pretendiam a conformação legal e 
institucional ao novo modelo e foram estratégicas para as ações seguintes. O anticomunismo 
foi, ao mesmo tempo, instrumento de pressão, propaganda e de força contra a oposição. O 
entusiasmo transparecia vividamente quando se expunha a idéia de desenvolvimento 
 
10 São as seguintes as obras referidas: FILHO, Luiz Viana. O governo Castelo Branco. Rio de Janeiro: Livraria 
José Olympio, 1975; ABREU, Alzira Alves de et. all Juracy Magalhães: Minhas memórias provisórias – 
depoimento prestado ao CPDOC/FGV. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1972; GÓIS, Ancelmo & et. all. 
Política é paixão: quem é Antônio Carlos Magalhães. Rio de Janeiro: Revan, 1995. 
 
 
23 
industrializado - elemento impulsionador do crescimento capitalista que as elites desejavam 
para se adequar, atender às exigências e manter sua posição na dinâmica do mercado 
internacional. 
Convém fazer, todavia, uma apresentação preliminar do personagem e dos primeiros 
atos desse cenário histórico. O general Castelo Branco foi um dos articuladores do golpe que 
destituiu o presidente João Goulart e, eleito pelo Congresso Nacional, assumiu como primeiro 
presidente militar do Brasil em 15 de abril de 1964. Nascido em Fortaleza, Ceará, obteve sua 
formação no Colégio Militar de Porto Alegre, na Escola Militar de Realengo, na Escola de 
Aperfeiçoamento de Oficiais da Armada, na Escola de Estado-Maior e na Escola de Aviação 
Militar. Durante a Segunda Guerra Mundial, foi à Itália acompanhando a Força 
Expedicionária Brasileira junto à Seção de Planejamento e Operações. Durante sua carreira 
foi subchefe do Estado-Maior das Forças Armadas (EMFA), comandante da Escola de 
Estado-Maior e diretor do departamento de estudos da Escola Superior de Guerra (ESG). Em 
1962, foi nomeado comandante do IV Exército, em Recife, após ser promovido a general-de-
exército, cargo no qual ficou até o ano seguinte quando passou a chefe do Estado-Maior do 
Exército, onde conspirou contra o governo João Goulart. 11 
Juracy Magalhães julgou que a escolha do nome de Castelo Branco, ainda general, em 
detrimento de outros - como o ex-presidente Eurico Dutra, preferido do governador da 
Guanabara, Carlos Lacerda; o general Amauri Kruel, potencial postulante à vaga na avaliação 
do governador de São Paulo, Ademar de Barros; o ministro da Guerra, general Costa e Silva, 
o mais graduado no Rio de Janeiro a aderir ao golpe de 1964 - adveio em função da 
articulação das “forças políticas de Brasília” que, seguramente, eram os deputados e 
senadores simpáticos ao movimento militar. 
A articulação no Congresso Nacional foi realizada por Juracy Magalhães, a pedido de 
Castelo Branco, por meio de três baianos: Rui Santos, Luiz Viana Filho e Antônio Carlos 
Magalhães. Ordem unida em torno do governo castelista, esses quatro, além de Manoel 
Novais e Lomanto Júnior, se rivalizaram nos anos seguintes, quando tiveram que garimpar 
espaço dentro da nova configuração de forças formada nos meios militares com as sucessões 
presidenciais. (Quadro 1) 
 
11 ABREU, Alzira Alves de et. all. (Coord.). Dicionário Histórico-Biográfico Brasileiro Pós – 30. 2.ª ed., Rio 
de Janeiro: Ed.Fundação Getulio Vargas, 2001. 
 
 
24 
A unidade era o ponto de partida para a concretização e o sucesso das propostas da 
elite para a reorganização do país nos moldes do capitalismo industrializado, e o presidente 
Castelo Branco não ignorava isso: 
 
Naquele dédalo de problemas, o presidente não perdia de vista o Congresso, 
peça essencial dentro da legalidade. Ganhara o gosto ao diálogo político, o 
conhecimento dos homens e o tato às composições de cada hora. Tudo era 
difícil num Congresso em que militavam treze partidos, dos quais os mais 
numerosos, o PSD e o PTB, haviam sido virtualmente contrários à 
Revolução. A própria UDN estava longe de se apresentar como um bloco, 
dividindo-se ao sabor das ocasionais posições dos governadores da 
Guanabara e de Minas Gerais. 12 
 
Havia razão nas considerações de Luiz Viana Filho, visto que a resistência imediata à 
indicação de Castelo Branco para a eleição indireta no Congresso Nacional procedeu de dois 
governadores de estados influentes da federação. 
A resistência não ocorreu apenas no campo político, com realce especial dado a Carlos 
Lacerda e Magalhães Pinto. Houve críticas ao governo, também, nos quartéis, entre 
empresários, economistas. Os ataques mais intensos foram contra as medidas econômicas de 
controle da inflação e não partiram de opositores sistemáticos posicionados à esquerda. Os 
principais assessores do governo, entre eles Roberto Campos, insistiam na “contenção 
progressiva da inflação” através do controle monetário e cambial. Como disse Luiz Viana 
Filho, o presidente Castelo Branco tinha consciência de seu “governo de entressafra” e sabia 
que seu papel era preparar a economia e o país para um desenvolvimento ulterior que 
solidificasse a elite e evitasse novas tensões sociais como as que ocorreram entre Juscelino 
Kubitscheck e João Goulart. 
Um tratamento de choque na economia poderia aumentar seu prestígio entre os 
empresários e industriais ou mesmo com os trabalhadores assalariados, contudo não 
recuperaria o crédito internacional e inviabilizaria os investimentos em longo prazo na 
compra de bens de capital e insumos necessários ao desenvolvimento industrializado, em 
marcha desde os anos 1950, conquanto comprometido na década seguinte. 
Debelar a oposição dentro do próprio governo e controlar o poder legislativo exigiram 
medidas drásticas, dentre as quais a reforma do sistema político e partidário. O bipartidarismo 
pareceu a solução mais propícia para evidenciar situação e oposição, contudo a imensa 
 
12 Viana Filho, Op. Cit, p. 144 e 145. 
 
 
25 
diversidade de posições e interesses não se diluiu a bico de pena. A ARENA, partido de 
sustentação do governo, era ambivalente, pois esteve coesa nos temas políticos amplos e 
relevantes, como o combate ao comunismo, o estímulo ao desenvolvimento e a sustentação da 
propaganda otimista, porém tropeçou na política de varejo e na definição dos interesses 
regionais. 
Para garantir a unidade, Castelo Branco combinou o controle político do Congresso 
com a cooptação de governadores aliados e capazes de manter a unidade dentro do diretório 
regional do partido governista. Já eleito, o presidente e seus assessores diretos acharam 
conveniente “sanear” a política com o enfraquecimento das oposições. Alguns, como 
Juscelino Kubitscheck, foram exilados do país, contudo, não pouparam os críticos internos 
com receio de “fogo amigo”. A opção para afastar Carlos Lacerda foi muito original, como 
ressaltou Juracy Magalhães: 
 
Julgando conveniente afastar Carlos do país, a fim de evitar que seu 
temperamento inquieto e suas posições extremadas lhe criassem problemas e 
ao próprio governo, amigos seus, entre os quais o presidente Castelo, 
conceberam a idéia de incumbi-lo de visitar vários países, com todo o apoio 
oficial, para explicar a revolução e compor uma boa imagem do novo 
governo. 13 
 
Uma vez que a ditadura optou por manter o funcionamento de parte dos instrumentos e 
das instituições democráticas, era preciso continuar manipulando a rede de relações 
constituída como forma de controle e prevenção. Sem a coesão, também estavam em risco as 
questões macro políticas e econômicas - objeto de convergência na elite civil que sustentava o 
governo militar do general Castelo Branco. Todavia, uma vez estabelecidas as eleições 
indiretasnos estados, o presidente tinha o trunfo de opinar na indicação dos governadores e 
utilizou os seus critérios para escolha dos candidatos como instrumento a favor da unidade. 
Ao abrir o processo sucessório direto em 1965, o comando da ditadura percebeu os 
riscos de subestimar a participação popular quando alguns canais democráticos de 
manifestação estão abertos, mesmo em condições adversas. Em 1966, em outros onze estados 
do país, a disputa acirrada por uma indicação indireta das Assembléias Legislativas alertou o 
presidente Castelo Branco para o risco da dissidência nos diretórios regionais se a rivalidade 
 
13 Alzira Abreu (coord.) Juracy Magalhães: minhas memórias provisórias. Rio de Janeiro: Civilização 
Brasileira, 1972, p. 177. 
 
 
26 
se mantivesse naqueles níveis. Estabeleceram-se, pois, condições mínimas de acesso ao grupo 
dos elegíveis, bem como um ritual para o processo eleitoral, como transcrito adiante: 
 
Condições políticas: a) Dispor de bom trânsito nos meios políticos e 
revolucionários; b) Ser filiado à ARENA; c) Não ter antagonismos frontais 
com o presidente da República e o governador do estado nem, de modo 
geral, com a orientação política e administrativa de cada um deles; d) Não 
ser elemento de posições radicalizadas, nem ter comprometimento com erros 
e vícios do passado, notadamente com a corrupção e a subversão; e) Poder 
reunir em torno de seu nome a maioria dos representantes da ARENA na 
Assembléia Legislativa; f) Permitir, por sua formação moral, plena confiança 
quanto à manutenção dos compromissos com o atual esquema político da 
ARENA ou do partido em que ela se transformar e bem assim com o 
presidente da República a ser eleito pela ARENA. 14 
 
Note-se que os requisitos foram tão restritivos quanto subjetivos e o processo de 
escolha, organizado pelos diretórios estaduais, pretendia a articulação convergente para 
facilitar o pronunciamento do presidente da República. Todos os candidatos que cumprissem 
os requisitos e aceitassem as condições acima expostas seriam submetidos a uma eleição 
prévia pelo governador do estado, senadores, deputados federais e estaduais, bem como os 
integrantes do diretório regional que não ocupassem cargo algum. Os votantes deveriam 
escolher três nomes dentre os destacados e os candidatos que alcançassem pelo menos 1/3 dos 
votos do universo eleitoral seriam submetidos à escolha final do chefe da nação. Finalmente, 
esse nome seria referendado na Assembléia Legislativa. 15 
Portanto, a reforma eleitoral foi importante para discernir o posicionamento político 
dos parlamentares no Congresso Nacional, nas assembléias legislativas e nas câmaras 
municipais e as eleições indiretas foram fundamentais para garantir a unidade no partido e no 
governo. Por isso, “a palavra do presidente era sempre conciliadora, atenuando divergências, 
em alguns estados profundas, entre antigos partidários da UDN e do PSD, por ele convocados 
para se reunirem na mesma agremiação”, ressaltou Luiz Viana Filho. 16 
 Em muitos casos, a obstinação de Castelo Branco em promover o alinhamento de 
posições no governo e, notadamente, nos estados da federação para garantir uma safra 
 
14 Ibidem, p. 410. 
15 Esse processo não era obrigatório, porém, recomendado. Não havia legislação que amparasse esse processo de 
escolha, sendo ele, de iniciativa pessoal de Castelo Branco. A lista final deveria ser tríplice ou quíntupla e, 
caso um, dois ou nenhum dos candidatos obtivesse a votação mínima de 1/3 do total de eleitores arrolados 
nesses critérios, ela poderia ser completada com os melhores colocados. 
16 Op. Cit. p. 419. 
 
 
27 
opulenta aos seus sucessores, apresentou um alto custo. Ademar de Barros e Magalhães Pinto, 
por exemplo, em virtude de constantes atritos com o governo federal, foram lentamente 
repelidos do centro das decisões políticas até que o apoio recíproco se tornou penoso e 
escasso. Por outro, o apoio irrestrito ao governo Castelo Branco, como ocorreu com Luiz 
Viana Filho e Juracy Magalhães, dificultou o trânsito nas gestões posteriores pelo desgaste 
provocado pela defesa intransigente das posições castelistas. 
Enfim, ao falecer em acidente aéreo no Ceará, a 18 de julho de 1967, Castelo parecia 
ter as mesmas convicções de Luiz Viana Filho que defendia: 
 
Para o presidente, que assumira a responsabilidade das eleições, por muitos 
consideradas temerárias devido a impopularidade de medidas 
governamentais, e não admitira afastar-se do calendário estabelecido, a 
vitória da ARENA tinha particular significação, pois, além de traduzir o 
apoio do país à política revolucionária, permitia-lhe entregar a Costa e Silva 
um partido forte, com ampla margem de voto nas duas Casas do Congresso. 
Este não teria os mesmos percalços, para compor maiorias ocasionais, que 
havia variado frequentemente, e a Revolução, solidamente implantada no 
parlamento, poderia continuar confiante o seu trabalho de renovação. 
Vigilante, tenaz, hábil, Castelo soubera preparar bons ventos. Estes, agora, 
enfunavam as velas. 17 
 
Resguardas as apologias que Luiz Viana Filho faz ao golpe e à ditadura, há em seu 
texto um raciocínio sensato, produzido poucos anos depois, sobre o papel desempenhado pela 
primeira equipe de governo após o golpe de 1964. O autor em tela demonstra que Castelo era 
cônscio de que, naquele momento político, o Congresso Nacional e a ARENA eram espaços 
de decisão importantes para a manutenção do regime. Evidentemente que o presidente possuía 
restrições aos políticos brasileiros, especialmente, em função da “crise moral” que supunha 
existir no país, contudo, acreditava na “assepsia” promovida pela ditadura. 
Ao mesmo tempo, o primeiro presidente militar construiu um projeto político e 
econômico sustentado em um nacionalismo híbrido, ou seja, extremamente otimista quanto às 
possibilidades de crescimento do país e, ao mesmo tempo, preocupado com o fluxo do 
mercado internacional e suas necessidades. Para atender tais expectativas, o projeto 
econômico definiu-se tendo o desenvolvimento industrial como meta principal. 
Concomitantemente, o anticomunismo predominou no campo político como medida de 
precaução às investidas estrangeiras de interferência na “democracia brasileira”. 
 
17 Ibidem, p. 420 
 
 
28 
Na verdade, esses temas transversais ultrapassaram as barreiras da sucessão de Castelo 
e de Costa e Silva e chegaram intactos aos anos do “milagre econômico”. Pode-se afirmar 
que, nos anos 1970, a ditadura estava bastante consolidada e os setores de apoio da elite 
política nos estados também já haviam sido definidos. Por conseguinte, as ponderações de 
Luiz Viana Filho sobre o desempenho do governo Castelo Branco no processo de 
estabilização da ditadura fazem sentido. Entretanto, os resultados não prescindiram de um 
planejamento e de um ordenamento jurídico prévio. 
 
O planejamento e a legislação de amparo à nova ordem 
 
A equipe do governo Castelo Branco compunha-se de indivíduos comprometidos em 
preparar a economia brasileira para o desenvolvimento industrializado e manter, ao mesmo 
tempo, o controle social e político do país. 18 
Como não havia um projeto sistematizado antes do golpe, os primeiros meses de 
trabalho foram dedicados à elaboração de propostas e ao estabelecimento de uma legislação 
capaz de viabilizar os projetos em gestação e legitimar os atos já consumados. 
O Plano de Ação Econômica do Governo (PAEG), ainda que criticado e adaptado nos 
governos posteriores, tornou-se um dos mais importantes referenciais teóricos para a 
condução da política econômica durante a ditadura. 19As divergências eram sempre em torno do método que, na visão de alguns, afetava o 
desenvolvimento. Magalhães Pinto criticou a “desnacionalização da indústria” e o deputado 
federal Herbert Levi, amigo de Lacerda, banqueiro e vinculado aos produtores industriais e 
rurais de São Paulo, ressentiu-se da falta de crédito e subsídios para as referidas categorias, 
bem como, da previsão de aumento dos impostos. 20 
Mais contundentes, diz Luiz Viana Filho, foram as críticas de Delfim Neto e Dias 
Leite, relator e membro do Conselho Consultivo do Planejamento, respectivamente. O 
 
18 Octávio Gouvêa de Bulhões e Roberto de Oliveira Campos foram, respectivamente, ministros da Fazenda e do 
Planejamento e Coordenação Econômica, durante todo o período do governo Castelo Branco. O baiano Edmar 
de Souza assumiu interinamente o ministério extraordinário ocupado por Roberto Campos. Outro baiano, Luiz 
Augusto Navarro de Brito assumiu o Gabinete Civil nos últimos meses em substituição a Luiz Viana Filho, 
indicado governador da Bahia. Além desses, Juracy Montenegro Magalhães respondeu pela pasta das 
Relações Exteriores entre janeiro de 1966 e março de 1967. 
19 O PAEG foi escrito entre maio e julho de 1964 sob à coordenação do economista Roberto Campos. Viana 
Filho, Op. Cit, p. 208 e 209. 
20 Viana Filho, Op. Cit, p. 216 a 224. 
 
 
29 
primeiro, além de temer a falta de controle sobre as transações internacionais e a dependência 
de recursos estrangeiros para concretizar o plano, preocupava-se com a incompatibilidade 
entre as medidas de combate à inflação e a possibilidade de retomada do desenvolvimento 
brasileiro. As reflexões do autor sobre o professor Dias Leite são da mesma natureza, 
entretanto, pela riqueza dos detalhes, merece a transcrição integral: 
 
 Embora discutisse vários aspectos do plano, o âmago da crítica consistia na 
posição atribuída ao desenvolvimento, diante do qual a inflação era 
irrelevante, devendo ser absorvida através da poupança e da eficiência do 
sistema econômico. O desenvolvimento se incumbiria de devorar a inflação. 
21 
 
O desenvolvimento foi um dos aspectos principais de coesão da elite dirigente do país 
durante parte do período da ditadura. Centrados em torno de um tipo de liberalismo 
econômico e político adaptado às circunstâncias autoritárias e movimentando-se na órbita do 
capitalismo norte-americano, esses grupos superaram as demais divergências e mantiveram 
sua hegemonia no poder durante mais de duas décadas. A sobrevivência dos fragmentos dessa 
elite nos estados, também, só foi possível com a internalização desses princípios e a 
conformação de suas metas a esse modelo. 
Do ponto de vista político, as reformas do governo Castelo Branco exigiram um amplo 
lastro jurídico. Os primeiros atos institucionais foram promulgados, essencialmente, para 
reordenar as instituições de acordo com as novas diretrizes e com a finalidade de sanear, em 
todos os níveis da sociedade, as oposições ao novo governo. O Ato Institucional n.º 2, em 27 
de outubro de 1965, instituiu eleições indiretas para a presidência e vice-presidência da 
República, a extinção dos partidos políticos e o julgamento de civis por tribunais militares; o 
Ato Complementar n.º 4 (AC-4), de 20 de novembro de 1965, impôs o bipartidarismo e 
estabeleceu novas regras para a reorganização partidária; o Ato Institucional n.º 3, de 5 de 
fevereiro de 1966, determinou eleições indiretas para o governo dos estados e a indicação dos 
prefeitos das capitais pelos governadores; e o Ato Institucional n.º 4, de 7 de dezembro de 
1966, impôs ao Congresso Nacional reunir toda essa legislação dispersa em vários atos 
institucionais numa nova Constituição, promulgada em 24 de janeiro de 1967. 
 
 
21 Ibidem, p. 218. 
 
 
30 
A Bahia dentro da nova ordem 
 
Em 1964, o governador da Bahia, Lomanto Júnior, apoiava-se numa base política de 
largo espectro que incluía tanto políticos da UDN como Juracy Magalhães e Antônio Carlos 
Magalhães, quanto do PTB de João Goulart, partido do governador. 
Em suas primeiras manifestações, diante da possibilidade de resistência de Leonel 
Brizola no Rio Grande do Sul, Lomanto preferiu uma posição difusa lastreada no discurso da 
legalidade democrática. Nas primeiras semanas de abril, entretanto, quando a situação estava 
definida e a UDN fortalecida dentro do novo contexto, ele anunciou seu apoio irrestrito aos 
militares. (Documento 01) 
Por intervenção do cardeal dom Augusto Álvaro da Silva e do general Justino Alves 
Bastos, comandante do 4.º Exército, o governador manteve-se no cargo. Contornadas as 
dificuldades no governo estadual, o comando da 6.ª Região Militar focou suas ações em 
outros espaços políticos de decisão. Na Assembléia Legislativa da Bahia, a mesa diretora 
iniciou, sob vigilância do exército, o processo de cassação de vários deputados. Mesmo o 
prefeito de Salvador, Virgildásio Sena, eleito pela UDN em 1962, conquanto apoiador 
discreto das reformas de base, foi afastado do cargo, denunciado e cassado. 
O general Manoel Mendes Pereira enviou, ainda, tropas aos municípios do interior 
para cumprir a missão de “sanear” as prefeituras e câmaras municipais. O prefeito de Vitória 
da Conquista, José Fernandes Pedral Sampaio, submetido a este processo, relatou: 
Eu tive o direito político suspenso, o mandato cassado pela câmara de 
vereadores, numa sessão violenta, de metralhadoras, o quarteirão todo 
cercado. Prenderam os vereadores que podiam resistir, reagir. Convocaram 
os suplentes que não podiam ser convocados e uma reunião de cassação do 
mandato foi feita no mesmo dia da minha prisão. Posteriormente - eu estava 
preso ainda - li nos jornais que tinha tido os direitos políticos suspensos, por 
dez anos. 22 
 
Esse prefeito, apesar de oriundo da elite conservadora no sertão baiano, se articulou à 
denominada “campanha da esperança” - composta por um grupo de jovens idealistas, com a 
finalidade projetar a cidade no cenário estadual - e, para isso, elegeu-se em 1962. Ele era 
muito próximo de Régis Pacheco (PSD) e postulou, juntamente com Goulart, as reformas de 
base. Desta forma, sua biografia de reformador determinou a sua prisão, assim referida: 
 
22 Em depoimento ao autor entre os dias 15 e 20 de julho de 1999. 
 
 
31 
 
A minha prisão foi em circunstâncias assim muito de traição, como 
praticamente tudo que foi feito nesse golpe militar. [...] De manhãzinha, eu 
tive notícia de que tinha chegado uma companhia, vieram cem homens do 
exército, muitos armados, até carros, muitas metralhadoras, pra humilhar a 
cidade. A prisão foi da seguinte maneira: então eu soube que eles estavam 
aqui, [...] me aprontei pra ir ao quartel. Quando sai, - defronte da minha casa 
é o clube social - e o pessoal, a tropa [es]tava parada ali, o capitão Bendochi 
e outras pessoas, outros militares. Eu passei, cumprimentei e disse até que ia 
fazer uma visita lá no quartel. Ele disse: Ah! O senhor vai? Então ‘vum bora 
pra lá’. Na mesma hora entraram dois tenentes no meu carro e a gente seguiu 
até lá no quartel, que é a companhia, hoje, o batalhão militar, lá [...], 
mandaram eu me identificar, imediatamente disseram que eu [es]tava preso e 
me transferiram para uma cela onde eu fiquei incomunicável. Eles levaram 
pelo menos umas trinta e seis ou quarenta e oito horas sem fornecer, 
inclusive, alimentação. Nessa prisão aí, acho que cheguei a contar mais de 
sessenta companheiros que foram presos, ficaram detidos ou foram ouvidos 
e mandados embora. Depois então, [...] muitos deles foram transferidos pra 
Salvador e nós ficamos em prisões diferentes. 23Em Feira de Santana, outra cidade do interior do estado, muito próxima a Salvador, o 
seu prefeito, combinado com operários e estudantes, resolveu resistir ao bloqueio das tropas e 
retomar a capital, conforme afirmação do próprio Francisco Pinto: 
 
A cidade de Salvador encontrava-se cercada pelas tropas e centenas de 
prisões foram efetuadas. Vários líderes operários e estudantis que escapavam 
se deslocaram para o nosso município. Discutimos o que fazer e resolvemos 
resistir. Uma série de providências foram adotadas para enfrentar os 
golpistas. Não cabe aqui enumerá-las. A ausência de reação no resto do país 
nos levou à desmobilização. Providenciamos a fuga para a maioria dessas 
lideranças. 24 
 
Francisco Pinto dos Santos originou-se de uma família politicamente diversificada. 
Sua mãe era getulista, seu pai udenista e ele um advogado socialista. Era, segundo ele mesmo 
definiu, “um produto do populismo, da rígida ética que a UDN pelo menos externava e, mais 
tarde, dos ideais socialistas absorvidos na universidade”. 25 
Chico Pinto era respeitado pelos estudantes e sindicalistas passando a ser visto como 
opção de resistência por governar o segundo maior município do estado, com localização 
 
23 Ibidem. 
24 NADER, Ana Beatriz. Os autênticos do MDB: semeadores da democracia. História Oral de vida política. São 
Paulo: Paz e Terra, 1998. p. 148 e 149. 
25 Ana Beatriz Nader. Op Cit., p. 142. 
 
 
32 
próxima de Salvador. Como uma ação conjunta de resistência, os mais afoitos pretendiam 
convocar a guarda municipal de Feira de Santana, fazer comícios e armar barricadas, na 
tentativa de transformar a cidade no centro da resistência, de onde sairiam para libertar a 
capital. 26 
Tendo em vista essas manifestações, alguns anos depois, a propaganda da ditadura 
insistia que a principal motivação do golpe foram as crises econômica, política e institucional 
provocadas pela associação de Goulart com os trabalhadores: 
 
Esteve instalado no Brasil um movimento geral de subversão e corrupção, 
inclusive da própria cúpula administrativa, que tinha por objetivo 
desmoralizar o regime democrático existente no país. O solapamento das 
instituições adrendemente preparado por profissionais agitadores conduziu 
todos à descrença. A guisa de defender o país de grupos econômicos, 
pregavam contra o regime, exaltando as qualidades de sistemas de governo 
que atentam contra a ordem político-social estabelecida na nossa 
constituição. Pregava-se o crime contra as instituições abertamente. Por isso, 
era indispensável a [sua] segregação do meio social, por suas atividades 
antidemocráticas. 27 
 
Entretanto, o movimento de reação foi inócuo diante da inexpressiva manifestação dos 
demais grupos no restante do país, bem como em função dos resultados políticos e militares 
alcançados pelos conspiradores poucas horas após o golpe. Ao final, as principais lideranças 
estaduais do PCB, AP e POLOP estavam presas ou escondidas. As propostas reformistas 
haviam caído com João Goulart, do mesmo modo que sucumbiram as alianças, os sindicatos e 
as lideranças populistas municipais. 
Apesar de todos os tropeços, a oposição à ditadura na Bahia se reorganizou e 
recompôs suas lideranças rapidamente. No final de 1964, o governo Castelo Branco decretou 
a Lei Suplicy, que atingia diretamente os estudantes baianos e previa a transformação dos 
antigos centros em diretórios acadêmicos subordinados à direção das faculdades, forçava a 
realização de novas eleições e tornava obrigatório o voto dos estudantes, sob pena de não 
poderem se submeter a exame parcial ou final, imediatamente subseqüente à eleição. Esses 
 
26 JÚNIOR, Franklin Oliveira. A Usina dos sonhos: sindicalismo petroleiro na Bahia 1954/1964. Salvador: 
EGBA, 1996, p. 188. 
27 Arq. da 6.ª RM. Apud: Autos do IPM, fls. 301 a 310. 
 
 
33 
reagiram violentamente a essa intervenção na autonomia da atividade política estudantil, 
como será visto adiante. 28 
Não restam dúvidas quanto à rearticulação dos grupos de oposição à ditadura, 
especialmente estudantes, após 1964. Entretanto, pouco se discute a necessidade de 
reordenação das forças políticas dentro da Bahia após o mesmo episódio. Essa percepção é 
essencial para se compreender as mudanças ocorridas no panorama político daquele 
momento. 
 
As rearticulações da elite e da oposição 
 
A Universidade Federal da Bahia e o Colégio da Bahia foram ambientes de profundos 
embates políticos nos anos imediatamente anteriores e posteriores ao golpe de 1964. No 
primeiro período letivo de 1965, as lideranças estudantis universitárias reagiram à imposição 
autoritária da Lei Suplicy e recomendaram aos estudantes o voto nulo. Era uma 
recomendação, na prática, pouco eficaz numa conjuntura autoritária em que faltavam vagas 
para os cursos superiores na Universidade Federal da Bahia e os estudantes temiam a punição 
prevista na legislação educacional recentemente imposta. Entretanto, do ponto de vista 
simbólico, foi uma ação bastante representativa, especialmente porque, na Faculdade de 
Filosofia, do total de setecentos e dezoito votos válidos, quinhentos e setenta e nove foram 
nulos. 29 
Entre 1967 e 1968, os estudantes realizaram grandes manifestações contra a Lei 
Orgânica de Ensino proposta no acordo entre o Ministério da Educação e a agência USAID. 
O assunto esteve em discussão por vários dias na Assembléia Legislativa e os estudantes se 
mantiveram mobilizados e atuantes, praticamente parando o centro de Salvador nesse período. 
A participação da Bahia como área de recuo para os grupos de luta armada, as panfletagens e 
até mesmo ações armadas foram intensas até o período de refluxo das organizações que 
davam suporte a essas manifestações. 30 
Do ponto de vista da elite, também houve preocupação com a nova ordem. O 
governador Lomanto Júnior, como dito, estava numa posição incômoda e optou por um 
 
28 Lei Federal n.º 4464 de 09/09/1964, regulamentada pelo Dec. 56241 de 04/05/1965. 
29 A Tarde, 23/08/1965, p. 11. 
30 Sobre o assunto consultar Sandra Regina Barbosa da Silva. Ousar lutar, ousar vencer: histórias da luta 
armada em Salvador (1969-1971). Dissertação de Mestrado. Salvador: UFBA, 2003. 
 
 
34 
posicionamento difuso e prudente. A Assembléia Legislativa, enquanto importante espaço de 
decisão, deixou transparecer a força majoritária do grupo udenista apresentando a seguinte 
moção de apoio ao golpe: 
 
A Assembléia Legislativa do estado, fiel aos sentimentos democráticos do 
povo baiano, expressa sua solidariedade às forças democráticas, civis e 
militares, que, obedientes às lideranças dos governadores Magalhães Pinto e 
Adhemar de Barros, Carlos Lacerda, Ney Braga, Mauro Borges e Hugo 
Meneguetti e os generais Amaury Cruel, Mourão Filho, Humberto Castelo 
Branco, Justino Alves e outros ilustres militares, que estão lutando para 
restaurar no Brasil a legalidade democrática vítima da traição de um governo 
que se acumpliciava com os piores inimigos da liberdade, os comunistas. 31 
 
Na 6ª Região Militar, sob o comando do general de Brigada Manoel Mendes Pereira, 
as visitas corteses de empresários e políticos passaram a ser constantes. Entre os estudantes, 
também havia apoio aos militares. Algumas entidades estudantis, como o Movimento 
Universitário Democrático (MUD), a Associação Soteropolitana de Estudantes Secundaristas 
(ASES) e o Movimento Estudantil Patriótico (MEP) firmaram nota pública contra a 
infiltração das idéias comunistas no movimento estudantil da Bahia e convocaram os 
voluntários para apoiar as Forças Armadas. 32 
Todos esses acontecimentos

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