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Juliana Aguiar Leal – 2018.1 – Unicap 1 INTRODUÇÃO AO DIREITO DE FAMILIA Perguntas relacionado ao que parece ser família. 1. Qual a concepção de família? 2. Qual conhecimento que você tem de família do passado? 3. Com base nisso, o que mudou? 4. Como você distingue os propósitos existenciais do matrimônio? 5. Como se definiria liberdade para o direito e se essa liberdade se distingue da liberdade em outros ramos? 6. Qual a distinção do sistema common law do civil law? - O conceito de relação entre os membros da família é a AFETIVIDADE, pois esse sentimento se constitui independentemente de serem as pessoas ligadas por vinculo de sangue ou não. - A família passou a ser um instrumento que desenvolve os seus membros. Há membros dependentes, tais como as crianças, são relações existenciais. - Responsabilidade = Afetividade e/ou Biológico. - Antigamente existia desigualdade no casal, o homem era o patrono da casa, detentor dos bens e provedor da casa. Famílias eram constituídas através de concordância de duas famílias em oferecer seus filhos. Havia hierarquia. - O matrimônio era exclusivamente da igreja, era a religião quem legitimava o casamento. Apenas em 1861 surgiu um pequeno sinal que demonstrou progresso em direção à desvinculação entre Igreja Católica e o Estado: o Decreto n.º 1.144/1861 passou a autorizar o casamento entre nubentes de outras seitas. - Hoje o matrimônio é legitimado pelo Estado, diante de leis, contudo, a igreja ainda pode celebrar a união, desde que seja levado a registo e siga as formalidades da lei. - O casamento blindava o homem casado de ter a ele ligado os filhos fora do casamento, não legitimando nem a busca por reconhecimento de paternidade. Juliana Aguiar Leal – 2018.1 – Unicap 2 → A VIRADA DE COPÉRNICO, Edson Fachin O Ministro Fachin situa-se na liderança de diversas gerações de estudiosos que, por distintos matrizes e correntes de pensamento, propõem o deslocamento da centralidade hermenêutica do direito civil (do patrimônio) para a pessoa humana e a promoção de sua dignidade. Designado como personalismo ou despatrimonialização das relações privadas, identifica-se aí movimento teórico que, fiel à solidariedade social e à igualdade substancial, dedica-se a revisitar as categorias tradicionais (patrimoniais e individualistas) do direito civil, enaltecendo a função promocional dos valores existenciais subjacentes à ordem pública constitucionalmente estabelecida. - - - - - - - - - → SURGE A IDEIA DE REPERSONALIZAÇÃO DO DIREITO CIVIL E DAS CONCEPÇÕES FAMILIARES A família, ao converter-se em espaço de realização da afetividade humana e da dignidade de cada um de seus membros, marca o deslocamento da função econômica-política-religiosa- procracional para essa nova função. Essas linhas de tendência enquadram-se no fenômeno jurídico-social denominado repersonalização das relações civis, que valoriza o interesse da pessoa humana mais do que suas relações patrimoniais. O advento do Código Civil de 2002 não pôs cobro ao descompasso da legislação, pois várias de suas normas estão fundadas nos paradigmas passados e em desarmonia com os princípios constitucionais referidos. → Deslocamento da função econômica/política/religiosa da família para a função de realização da afetividade. Maria Berenice Dias esclarece que “[...] o novo modelo da família funda-se sobre os pilares da repersonalização da afetividade, da pluralidade e do eudemonismo, impingindo nova roupagem axiológica ao direito de família. Agora, a tônica reside no indivíduo e não mais nos bens ou coisas que guarnecem a relação familiar. A família instituição foi substituída pela família-instrumento, ou seja, ela existe e contribui tanto para o desenvolvimento da personalidade de seus integrantes, como para o crescimento e formação da própria sociedade, justificando, com isso, a sua proteção pelo estado”. Juliana Aguiar Leal – 2018.1 – Unicap 3 Ensina Luiz Edson Fachin que: “Eis o que sustentamos: opera-se, pois, em relação ao Direito dogmático tradicional, uma inversão do alvo de preocupações do ordenamento jurídico, fazendo com que o Direito tenha como fim último a proteção da pessoa, como instrumento para seu pleno desenvolvimento. Nossa tese, pois, é a de que a Constituição Federal de 1988 impôs ao Direito Civil o abandono da postura patrimonialista herdada do século XIX, em especial do Código Napoleônico, migrando para uma concepção em que se privilegiam a subjetividade, o desenvolvimento humano e a dignidade da pessoa concretamente considerada, em suas relações interpessoais. É por isso que cabe enfatizar a concepção plural de família presente na Constituição, apta a orientar a melhor exegese do novo Código Civil brasileiro” A família contemporânea rompe os limites impostos por qualquer moldura solidificada pela codificação, seja ela oitocentista ou atual. A ela não cabem mais normas que reflitam valores arcaicos, com aplicabilidade ou preocupação incoerentes com o sistema constitucionalmente assegurado. Impõe-se a leitura dos dispositivos atinentes ao Direito Civil em um viés de personalidade, na busca da superação da ética patrimonialista que marcou o espírito do legislador do Código de 1916 e o legislador atual, na esteira do Novo Código Civil. É preciso que se compreenda, neste novo viés constitucionalizado do Direito de Família, o papel dos Direitos Fundamentais enquanto garantidores desta tutela aos indivíduos nas suas relações afetivas. A concepção jurídica de família há de ter a flexibilidade suficiente para renovar-se em harmonia com as transformações sociais — tendo em vista o importante papel que desenvolve para a realização de seus membros —, configurando-se enquanto espaço de “abrigo “sentimental e afetivo. É o passo à frente a ser dado para que as mudanças nas relações familiares, tendo por fundamento o elemento afetivo entre os seus membros, sejam levadas a efeito, descortinando a concepção eudemonista da família no século XXI. (A REPERSONALIZAÇÃO DAS RELAÇÕES FAMILIARES. Rodrigo Wasem Galiao). Juliana Aguiar Leal – 2018.1 – Unicap 4 CASAMENTO - INTRODUÇÃO → CONSTITUIÇÃO 1934 – ART. 144. Art 144 - A família, constituída pelo casamento indissolúvel, está sob a proteção especial do Estado. Parágrafo único - A lei civil determinará os casos de desquite e de anulação de casamento, havendo sempre recurso ex officio, com efeito suspensivo. - Desquite (são pessoas que não estão quites com a sociedade) são pessoas marginalizadas, que viviam num limbo social. O adultério e o abandono do lar conjugal eram graves violações ao ambiente matrimonial. Quanto ao adultério, porém, havia uma grade permissividade social com relação ao homem. Mulher que traia e era pega no ato, dava permissão ao homem de matá-la, a traição era excludente de culpabilidade. - Anulação de casamento: Significa o reconhecimento de um vício que anula o casamento, desfaz por completo uma união e devolve o estado civil de solteiro para ambos, o que é bem diferente do divórcio e da separação. A primeira grande modificação dessa estrutura foi dada pela Lei de Divórcio (EC 09/2010 – LEI 6.515/77). O DIVÓRCIO que finda o casamento foi a primeira grande mudança no casamento. - - - - - - - - Juliana Aguiar Leal – 2018.1 – Unicap 5 Evolução histórica dos institutos da separação e do divórcio no direito brasileiro e a Emenda Constitucional n.º 66/2010EDUARDO PEREIRA DE ARAUJO. http://www.conteudojuridico.com.br/artigo,evolucao-historica-dos-institutos- da-separacao-e-do-divorcio-no-direito-brasileiro-e-a-emenda-constitucional-n,29383.html Em 13 de julho de 2010 foi promulgada a Emenda Constitucional n.º 66, que modificou o §6º do art. 226 da Constituição Federal, eliminando de uma vez por todas o requisito da separação judicial e os pressupostos temporais para a obtenção do divórcio. Além de promover muito mais celeridade para os consortes, haja vista que o divórcio direto pode ser intentado a qualquer tempo, o novo regramento propõe a redução do intervencionismo estatal no casamento, em prol da autonomia da vontade das partes, facilitando a sua dissolução. Ao longo dos anos o legislador promoveu uma amenização paulatina dos rigores das normas que disciplinavam tanto a separação como o divórcio, em virtude da inegável existência de um clamor social nesse sentido. A evolução do direito brasileiro, o divórcio e a separação sofreram diversas mudanças. Das mais polêmicas às mais simples, todas as reformas legislativas no que diz respeito à dissolução da sociedade ou do vínculo matrimonial apontaram no sentido da retirada de obstáculos para a sua obtenção. A evolução, regulamentação e instituição do divórcio e da separação, sejam judiciais ou administrativos, se deram de maneira tão lenta quanto polêmica, notadamente porque o tema sempre esteve intimamente ligado com a religião e seus dogmas. Por conseguinte, qualquer inovação relativa à extinção do casamento vinha acompanhada de discussões fervorosas e eram obtidas de forma bastante penosa. Juliana Aguiar Leal – 2018.1 – Unicap 6 Império Inicialmente, vale ressaltar que o casamento tal qual como fora introduzido no Brasil do tempo do Império era regido pelas normas da Igreja Católica, haja vista que o catolicismo era a religião oficial da nossa metrópole, qual seja, Portugal. Sendo assim, aplicavam-se as disposições estabelecidas no Concílio de Trento, realizado entre 1545 e 1553. Com relação ao matrimônio, o maior dogma instituído referia-se à sua indissolubilidade. Monarquia Séculos se passaram e, mesmo com o advento da monarquia, o que torna o Brasil independente de Portugal, nada muda com relação à autoridade da normatização eclesiástica com relação ao matrimônio. Apenas em 1861 surgiu um pequeno sinal que demonstrou progresso em direção à desvinculação entre Igreja Católica e o Estado: o Decreto n.º 1.144 passou a autorizar o casamento entre nubentes de outras seitas. República Não obstante o advento desse ínfimo passo, durante muitos anos o casamento continuou a ser regido pelas leis eclesiásticas, não havendo qualquer interferência do Estado no instituto. Decreto 119-A/1890 – Casamento perde o caráter confessional “Somente com a República, mercê da laicização do Estado através do Decreto 119-A, de 07.01.1890, veio o instituto a perder o caráter confessional. Decreto 181/1890 – Casamento civil e divórcio (separação de corpos) Nesse momento, surgiram as condições favoráveis para a implantação, com o Decreto 181/1890, do casamento civil no Brasil, em que pese ainda continuasse a existir o casamento religioso. Mas, ante a resistência, a nova lei limitou-se à implantação do casamento civil. Com o surgimento do referido diploma, também passou a existir a separação de corpos, denominada de divórcio. As causas que a justificavam esse divórcio (=separação de corpos) eram as mesmas que depois foram utilizadas para autorizar o desquite no Código de Beviláqua (a seguir). • Além do adultério, admitia-se como causa para a separação de corpos a tentativa de morte, a sevícia ou injúria grave, o abandono voluntário do domicílio conjugal por dois anos contínuos e o mútuo consentimento dos cônjuges que fossem casados há mais de dois anos. Juliana Aguiar Leal – 2018.1 – Unicap 7 Código Civil de 1916 – Desquite Com o advento do Código Civil de 1916, surge no direito brasileiro o instituto do desquite, que era, nas palavras de Pontes de Miranda, “a separação sem quebra do vínculo”. Percebe-se, por conseguinte, que a modificação efetuada pelo Código Beviláqua foi apenas terminológica. O novo instituto introduzido nada mais era do que o divórcio (= separação de corpos) regido pelo pelo Decreto n. 181/1890, mas com outra nomenclatura. → O Decreto n. 181/1890, que instituiu entre nós o casamento civil, ainda utilizava a expressão divórcio, embora não o admitisse com o efeito de romper o vínculo conjugal. De forma que o Código Civil, fora modificações menores, nada inovou ao direito anterior, a não ser o nome do instituto. O desquite põe termo à vida em comum, separa os cônjuges, restitui-lhes a liberdade, permite-lhes dirigir-se, como entenderem, na vida, sem que dependa um do outro, no que quer que seja; mas conserva íntegro o vínculo do matrimônio. Dessa forma, junto à morte de um dos cônjuges e a nulidade ou anulação do casamento, o desquite se estabeleceu como mais uma causa do fim da sociedade conjugal. • O Código de Beviláqua elencou os motivos que poderiam dar ensejo a uma ação de desquite. São eles o adultério, a tentativa de morte, a sevícia ou injúria grave e o abandono voluntário do lar conjugal por dois anos contínuos. Constituição Federal de 1934 – Retrocesso: indissolubilidade do casamento Frente ao crescimento do movimento divorcista, que aos poucos vinha ganhando força principalmente entre os congressistas, o legislador constitucional se antecipou a uma possível regulamentação infraconstitucional da separação e do divórcio e inseriu a indissolubilidade do casamento na Constituição de 1934, o que conferiu status constitucional a esse preceito. O art. 144 da então Constituição era claro: “Art 144 - A família, constituída pelo casamento indissolúvel, está sob a proteção especial do Estado”. Constituições Federais de 1937, 1946 e 1967 – Manutenção do retrocesso Não obstante o número de defensores da dissolubilidade do vínculo matrimonial estivesse crescendo em progressões geométricas, as Constituições de 1937, 1946 e 1967 mantiveram-se fiéis à indissolubilidade, frustrando as expectativas de boa parte da sociedade e não permitindo a regulamentação de um fato que já vinha ocorrendo na prática, qual seja, a formação de novas famílias pelos ex-cônjuges desquitados. Juliana Aguiar Leal – 2018.1 – Unicap 8 Emenda Constitucional 09/77 – Eliminação definitiva da indissolubilidade e da perpetuidade do vínculo matrimonial no desquite Conquanto tenha havido a constitucionalização da indissolubilidade do matrimônio, a luta dos divorcistas não se deu por terminada. Após anos de intensos debates, em meados de 1977 houve a promulgação da Emenda Constitucional n.º 9, que alterou o §1º do art. 175 da Constituição de 1967. A partir de então, o Brasil eliminava de uma vez por todas o caráter indissolúvel do casamento e a perpetuidade do vínculo matrimonial mesmo após o desquite. O §1º do art. 175 da Constituição de 1967 passou a vigorar com uma nova redação, que afirmava que “o casamento somente poderá ser dissolvido, nos casos expressos em lei, desde que haja prévia separação judicial por mais de três anos". Lei 6.515/77 – Lei do Divórcio Após esse marco normativo, não demorou muito para que, em 26 de dezembro de 1977, fosse promulgada a Lei 6.515/77. Conhecida como Lei do Divórcio, esse diploma revogou os arts. 315 a 328 do Código Civil de 1916, inserindo o divórcio definitivamente no ordenamento jurídico brasileiro. Além disso, passou a chamar de separação judicial o que até então era conhecido como desquite. O art. 2º da Lei do Divórcio foi claro ao elencar a separação judicial e o divórciocomo causas terminativas da sociedade conjugal: “Art 2º - A Sociedade Conjugal termina: I - pela morte de um dos cônjuges; Il - pela nulidade ou anulação do casamento; III - pela separação judicial; IV - pelo divórcio. Parágrafo único - O casamento válido somente se dissolve pela morte de um dos cônjuges ou pelo divórcio”. “Art 24. O divórcio põe termo ao casamento e aos efeitos civis do matrimônio religioso”. O art. 24 da Lei 6.515/77 também não deixou dúvidas acerca de sua intenção, ou seja, conferir ao divórcio o condão de romper definitivamente o vínculo conjugal entre os cônjuges, possibilitando a contração de novas núpcias, na medida em que se eliminava o impedimento legal. Juliana Aguiar Leal – 2018.1 – Unicap 9 Conforme já mencionado, o escopo da separação judicial, inaugurada pela Lei 6.515/77, era o mesmo do desquite regulamentado Código Civil de 1916. Tanto que o art. 3º da Lei do Divórcio praticamente repetia a ideia do art. 322 do Código Beviláqua. Interessante comparar os dois dispositivos: Art. 322, Código Civil de 1916: “a sentença do desquite autoriza a separação dos cônjuges, e põe termo ao regime matrimonial dos bens, como se o casamento fosse dissolvido”. Art. 3º, Lei 6.515/77: “a separação judicial põe termo aos deveres de coabitação, fidelidade recíproca e ao regime matrimonial de bens, como se o casamento fosse dissolvido”. Assim como a ação de desquite, que poderia ser intentada na forma amigável ou litigiosa, o mesmo ocorreu com a separação judicial. Constituição Federal de 1988 – Divórcio Divórcio-conversão: separação judicial + 1 ano Divórcio-direto: separação de fato + 2 anos Após a Lei do Divórcio, uma nova, porém pequena modificação nos institutos do divórcio e da separação só veio ocorrer com a Constituição de 1988. Além de manter o caráter dissolúvel do vínculo conjugal como preceito constitucional, a Carta Magna trouxe de forma expressa os casos em que esse vínculo pode ser dissolvido (art. 226, §6º). § 6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio, após prévia separação judicial por mais de um ano nos casos expressos em lei, ou comprovada separação de fato por mais de dois anos. Ao analisar o impacto que a Constituição Federal de 1988 causou no ordenamento jurídico então vigente, Carlos Roberto Gonçalves assevera: “A Constituição de 1988 modificou, no entanto, esse panorama, reduzindo o prazo da separação de fato para um ano, no divórcio-conversão, e criando uma modalidade permanente e ordinária de divórcio direto, desde que comprovada a separação de fato por mais de dois anos”. Lei 7.841/89 – Alterações na Lei de Divórcio Já em 1989 houve a edição da Lei 7.841, que teve como escopo amoldar a Lei do Divórcio aos novos ditames encravados no ordenamento jurídico pela então recente Constituição de 1988. “A Lei 7.841 cuidou de adaptar a Lei 6.515/77, quanto ao tempo exigido para o divórcio- conversão e para o divórcio-direto, mas igualmente revogou o art. 38 da Lei do Divórcio, eliminando a restrição à possibilidade de divórcios sucessivos”. Juliana Aguiar Leal – 2018.1 – Unicap 10 Lei 8.408/92 – Alterações na Lei de Divórcio A Lei 8.408/92 veio, tardiamente, atualizar, de acordo com a nova Constituição, alguns dispositivos da Lei 6.515/77 que foram esquecidos pela Lei 7.841/89. Foram eles o §1º do art. 5º e todo o art. 25 da Lei do Divórcio. No §1º do art. 5º foi inserido apenas um novo lapso temporal como pressuposto para a propositura da ação de separação judicial com base na ruptura da vida conjugal. A exigência de cinco anos da Lei 6.515/77 foi substituída pelo exíguo prazo de um ano de ruptura da vida em comum. Código Civil de 2002 Com a entrada em vigor, no ano de 2002, do novo Código Civil, o disciplinamento da separação e do divórcio teve seu devido lugar dentro do diploma. Sendo assim, as disposições contidas na Lei do Divórcio referentes ao direito material foram revogadas, restando em vigor as normas de direito processual e as que não foram mencionadas no Código Civil. Repetindo o art. 2º da Lei do Divórcio, o atual Código Civil dispõe em seu art. 1.571 as causas que implicam o fim da sociedade conjugal. Dentre elas estão a separação judicial e o divórcio. A maior novidade, porém, está no §1º do dispositivo, onde o legislador, ao elencar o divórcio e a morte de um dos cônjuges como motivos ensejadores da extinção do casamento, inclui nesse rol a morte presumida de um dos consortes. Veja-se o referido artigo: “Art. 1.571. A sociedade conjugal termina: I – Pela morte de um dos cônjuges; II – Pela nulidade ou anulação do casamento; III – Pela separação judicial; IV – Pelo divórcio. §1º O casamento válido só se dissolve pela morte de um dos cônjuges ou pelo divórcio, aplicando-se a presunção estabelecida nesse Código quanto ao ausente”. Como na Lei do Divórcio, permaneceu no novo Código Civil a separação por mútuo consentimento e a separação litigiosa, bem como o divórcio conversão e o direto. Juliana Aguiar Leal – 2018.1 – Unicap 11 Lei 11.441/07 – Separação e Divórcio consensuais (administrativos) O último disciplinamento referente à separação e ao divórcio tinha ocorrido em 2007, com a entrada em vigor da Lei 11.441/07. Nessa oportunidade, foram inseridas no direito brasileiro as espécies administrativas dos institutos. O art. 3º da lei inseriu no Código de Processo Civil o art. 1.124-A. Eis o teor do dispositivo: “Art. 1.124-A. A separação consensual e o divórcio consensual, não havendo filhos menores ou incapazes do casal e observados os requisitos legais quanto aos prazos, poderão ser realizados por escritura pública, da qual constarão as disposições relativas à descrição e à partilha dos bens comuns e à pensão alimentícia e, ainda, ao acordo quanto à retomada pelo cônjuge de seu nome de solteiro ou à manutenção do nome adotado quando se deu o casamento. § 1o A escritura não depende de homologação judicial e constitui título hábil para o registro civil e o registro de imóveis. § 2o O tabelião somente lavrará a escritura se os contratantes estiverem assistidos por advogado comum ou advogados de cada um deles, cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial. § 3o A escritura e demais atos notariais serão gratuitos àqueles que se declararem pobres sob as penas da lei”. Neste diapasão, para que os consortes pudessem se valer da separação ou do divórcio administrativos exigia-se que não tivessem nenhum filho menor ou incapaz; que dispusessem sobre partilha de bens comuns, pensão alimentar e manutenção ou não do nome de casado; que estivessem assistidos por advogado; e que fossem respeitados os prazos legais. Juliana Aguiar Leal – 2018.1 – Unicap 12 Emenda Constitucional n. 66/10 A Emenda Constitucional n.º 66, promulgada em 13 de julho de 2010, modificou o §6º do art. 226 da Constituição Federal. O antigo dispositivo asseverava que o casamento podia ser dissolvido pelo divórcio, após prévia separação judicial por mais de um ano nos casos expressos em lei, ou comprovada separação de fato por mais de dois anos. Indispensável colacionarmos in totum o novo §6º do art. 226 da Constituição Federal, a fim de verificarmos sua atual redação: “Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. (...) § 6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio”. Dessa forma, como consequência lógica, a alteração legislativa possuiu o escopo de eliminar de uma vez por todas não só o requisito da separação judicial, como também os pressupostos temporais para a obtenção do divórcio. Tal reforma, como ficou claro no presente trabalho,foi fruto de um movimento legislativo que há anos vem reduzindo o intervencionismo estatal da vida privada dos cônjuges, notadamente no que se refere à dissolução do matrimônio, sempre buscando promover alterações que implicam na facilitação de sua obtenção. Juliana Aguiar Leal – 2018.1 – Unicap 13 Pontos colocados: - De 1977 até 1989 (quando adveio a Lei 7.841/89, modificando a Lei 6.515/77 – Lei de divórcio), havia restrição quanto a possibilidade de divórcios sucessivos. Naquela época, só podia se divorciar 1x, pois “o erro de casar só pode ser cometido uma vez”. - Com o advento do Código Civil de 1916, surge no direito brasileiro o instituto do desquite, essa modificação foi apenas terminológica, pois nada mais era do que o divórcio regido pelo Decreto n. 181/1890. Lembre-se que esse decreto instituiu o casamento civil e a figura do divórcio que rompia a sociedade conjugal, mas não dissolvia o vínculo do casamento. Portanto, o desquite nada mais era do que esse divórcio, mas com outra nomenclatura. - Em 1977 houve a promulgação da Emenda Constitucional n.º 9, o Brasil eliminava de uma vez por todas o caráter indissolúvel do casamento e a perpetuidade do vínculo matrimonial mesmo após o desquite. O §1º do art. 175 da Constituição de 1967 passou a vigorar com uma nova redação, que afirmava que “o casamento somente poderá ser dissolvido, nos casos expressos em lei, desde que haja prévia separação judicial por mais de três anos". Surge a Lei de divórcio em (Lei 6.515/77) inserindo o divórcio definitivamente no ordenamento jurídico brasileiro, além de passar a chamar de separação judicial o que até então era conhecido como desquite. Em suma: 1. Antes de 1977 existia apenas o desquite, era o SISTEMA UNITÁRIO (“parcial” – fim da sociedade conjugal, mas não do vínculo matrimonial). 2. A partir de 1977, surgiu o SISTEMA BINÁRIO, que contava com separação judicial (que, igual ao desquite, era “parcial” – fim da sociedade conjugal, mas não do vínculo matrimonial) e com o divórcio (“total” - fim da sociedade conjugal e também do vínculo matrimonial). 3. A partir de 1988, houve uma mudança grande no conceito de família (união estável, união homoafetiva). Surge a EC 66/2010, que altera o art. 226, § 6º da CF, tirando todos os prazos e a extinguindo separação judicial, deixando de forma civil mais privada, isso na relação matrimonial. Ainda assim, o Estado tem poder de intervir e retirar os filhos dos pais, fazendo um movimento inverso na relação parental. - Doutrina majoritária – Calcou a separação judicial - Doutrina minoritária - Ainda acredita que haja na letra da lei a possibilidade na separação judicial. Juliana Aguiar Leal – 2018.1 – Unicap 14 OBS: DISSOLUÇÃO DA SOCIEDADE CONJUGAL x DISSOLUÇÃO VÍNCULO MATRIMONIAL. (http://phmp.com.br/artigos/diferenca-entre-separacao-e-divorcio/) “A sociedade conjugal e o vínculo matrimonial são inconfundíveis, pois a sociedade conjugal, de forma simples, significa o convívio, os deveres entre os cônjuges, já o vínculo matrimonial seria o casamento válido propriamente dito, sendo o vínculo matrimonial um instituto maior que a sociedade conjugal. Discorre sobre isso Maria Helena DINIZ (2008): “O casamento é, sem dúvida, um instituto mais amplo que a sociedade conjugal, por regular a vida dos consortes, suas relações e suas relações e suas obrigações recíprocas, tanto morais quanto as materiais, e seus deveres para com a família e a prole. A sociedade conjugal, embora contida no matrimônio, é um instituto jurídico menor do que o casamento, regendo apenas o regime matrimonial de bens dos cônjuges, os frutos civis do trabalho ou indústria de ambos os consortes ou de cada um deles. Daí não se pode confundir o vínculo matrimonial com sociedade.” - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - (((IMPORTANTE))) Questão controversa que decorreu do advento da Emenda n.º 66/2010 se refere à permanência ou à extinção do instituto da separação no ordenamento jurídico brasileiro. Os defensores da extinção da separação argumentam que ela se prestava tão somente à preparação do divórcio sendo que por isso o instituto perdeu sua serventia. Assim, parte da doutrina enxergava a separação como uma mera etapa preliminar ao divórcio, deixando de atribuir àquele instituto importantes finalidades. Corrente diversa defende que o instituto da separação deve ser observado à luz dos princípios constitucionais de proteção à família vigentes, sendo que a modificação ocorrida por meio da Emenda n.º 66/2010 aduziu tão somente a inexigência de separação prévia, seja ela judicial, extrajudicial ou de fato, para a dissolução do vínculo matrimonial. Defendem que, o simples fato de um instituto jurídico não mais se encontrar expressamente previsto no texto constitucional não significa sua inexistência no mundo jurídico. Para eles, o instituto continua perfeitamente válido para aqueles que desejam romper a sociedade conjugal sem a dissolução imediata do vínculo matrimonial, se mostrando necessário para que os cônjuges possam melhor refletir quanto à conveniência da dissolução ou manutenção do matrimônio. Dessa forma, a separação se revelaria como um importante instrumento para a especial proteção que o Estado dá à família, e admitir a extinção da entidade familiar sem possibilidade de reconciliação contrariaria verdadeira norma principiológica, pois retira do cidadão a possibilidade jurídica da reconciliação e do restabelecimento do casamento, devendo este recorrer ao instituto mais gravoso, que é o divórcio. Juliana Aguiar Leal – 2018.1 – Unicap 15 Paulo Lobo defende a extinção do instituto da separação judicial: Artigo - Divórcio: Alteração constitucional e suas consequências - Por Paulo Lôbo RESUMO: Investigação das consequências jurídicas da aprovação em 2009 da proposta de emenda constitucional, que altera os requisitos para o divórcio no Brasil. Sustenta-se a extinção da separação judicial e a revogação das normas infraconstitucionais que a regulam, por total incompatibilidade com a dissolução do casamento pelo divórcio, única via tutelada pela nova redação do § 6º do art. 226 da Constituição. Esclarece-se como pode ser promovido o divórcio, abstraído de causas subjetivas, principalmente da culpa, ou mesmo objetivas. 1. A ALTERAÇÃO CONSTITUCIONAL A "PEC do Divórcio" (nº 413-C), aprovada pelo Congresso Nacional em 2009, protagoniza a mais simples e intensa regulamentação constitucional da dissolução do casamento por decisão livre dos cônjuges. Fecha o ciclo iniciado em 1977 com a Lei do Divórcio. O parágrafo 6º do art. 226 da Constituição passa a vigorar com a seguinte redação: "§ 6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio". Comparemos com a redação originária de 1988:"§ 6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio, após prévia separação judicial por mais de um ano nos casos expressos em lei, ou comprovada separação de fato por mais de dois anos". Ou com a redação da Constituição de 1967-69, introduzida em 1977 em relação ao art. 175: "§ 1º O casamento somente poderá ser dissolvido, nos casos expressos em lei, desde que haja prévia separação judicial por mais de três anos". Assim, temos a seguinte evolução: a) em 1977, a separação judicial era requisito necessário e prévio para o pedido de divórcio, que tinha de aguardar a consumação do prazo de três anos daquela; não havia, portanto, divórcio direto; b) em 1988, a separação judicial deixou de ser requisito para o divórcio, passando a ser facultativa, tendo duas finalidades: 1. ser convertida em divórcio, após um ano da decisão da separaçãojudicial (ou da separação de corpos), o que a tornava em requisito por decisão dos cônjuges; 2. permitir a reconciliação dos separados, antes do divórcio por conversão; o divórcio direto, por sua vez, dependia de requisito temporal (dois anos) da separação de fato; c) em 2009, com a "PEC do Divórcio", a separação judicial deixou de ser contemplada na Constituição, inclusive na modalidade de requisito voluntário para conversão ao divórcio; desapareceu, igualmente, o requisito temporal para o divórcio, que passou a ser exclusivamente direto, tanto por mútuo consentimento dos cônjuges, quanto litigioso. im po rt an te Juliana Aguiar Leal – 2018.1 – Unicap 16 2. UM POUCO DA HISTÓRIA DA "PEC DO DIVÓRCIO" A "PEC do Divórcio" resultou de proposta elaborada por grupo de juristas, sob patrocínio da Diretoria Nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família-IBDFAM. A redação proposta era a seguinte: "§ 6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio consensual ou litigioso, na forma da lei" Em boa hora, a Câmara dos Deputados, durante a votação nos dois turnos em plenário, suprimiu as expressões sublinhadas. Por certo, o texto resultante ficou mais adequado ao espírito da proposta, particularmente no que concerne à remissão à lei infraconstitucional. A norma passou a ter eficácia imediata e direta - e não contida -, sem os riscos de limitações que poderiam advir de lei ordinária, inclusive com a reintrodução dos requisitos subjetivos (culpa) ou até mesmo de prévia separação judicial, o que configuraria verdadeira fraude à Constituição. É ser imprescindível recordar o cerne da justificativa que fundamentou a decisão do legislador constituinte, contida na proposta de emenda constitucional: "Não mais se justifica a sobrevivência da separação judicial, em que se converteu o antigo desquite. Criou-se, desde 1977, com o advento da legislação do divórcio, uma duplicidade artificial entre dissolução da sociedade conjugal e dissolução do casamento, como solução de compromisso entre divorcistas e antidivorcistas, o que não mais se sustenta. Impõe-se a unificação no divórcio de todas as hipóteses de separação dos cônjuges, sejam litigiosos ou consensuais. A submissão a dois processos judiciais (separação judicial e divórcio por conversão) resulta em acréscimos de despesas para o casal, além de prolongar sofrimentos evitáveis. Por outro lado, essa providência salutar, de acordo com valores da sociedade brasileira atual, evitará que a intimidade e a vida privada dos cônjuges e de suas famílias sejam revelados e trazidos ao espaço público dos tribunais, com todo o caudal de constrangimentos que provocam, contribuindo para o agravamento de suas crises e dificultando o entendimento necessário para a melhor solução dos problemas decorrentes da separação". Extraem-se daí duas significativas finalidades: I - A extinção da separação judicial; II - A extinção das causas subjetivas (culpa) e até mesmo de causas objetivas (tempo). Juliana Aguiar Leal – 2018.1 – Unicap 17 3. EXTINÇÃO DA SEPARAÇÃO JUDICIAL É possível argumentar-se que a separação judicial permaneceria enquanto não revogados os artigos que dela tratam no Código Civil, porque a nova redação do § 6º do art. 226 da Constituição não a teria excluído expressamente. Mas esse entendimento somente poderia prosperar se arrancasse apenas da interpretação literal, desprezando-se as exigências de interpretação histórica, sistemática e teleológica da norma. Como se demonstrou, a inserção constitucional da separação judicial evoluiu da consideração como requisito prévio ao divórcio até sua total desconsideração. Em outras palavras, a Constituição deixou de tutelar a separação judicial. A consequência da extinção da separação judicial é que concomitantemente desapareceu a dissolução da sociedade conjugal que era a única possível, sem dissolução do vínculo conjugal, até 1977. Com o advento do divórcio, a partir dessa data e até 2009, a dissolução da sociedade conjugal passou a conviver com a dissolução do vínculo conjugal, porque ambas recebiam tutela constitucional explícita. Portanto, não sobrevive qualquer norma infraconstitucional que trate da dissolução da sociedade conjugal isoladamente, por absoluta incompatibilidade com a Constituição, de acordo com a redação atribuída pela PEC do Divórcio. A nova redação do § 6º do artigo 226 da Constituição apenas admite a dissolução do vínculo conjugal. No que respeita à interpretação sistemática, não se pode estender o que a norma restringiu. Nem se pode interpretar e aplicar a norma desligando-a de seu contexto normativo. Tampouco, podem prevalecer normas do Código Civil ou de outro diploma infraconstitucional, que regulamentavam o que previsto de modo expresso na Constituição e que esta excluiu posteriormente. Inverte-se a hierarquia normativa, quando se pretende que o Código Civil valha mais que a Constituição e que esta não tenha força revocatória suficiente. No direito brasileiro, há grande consenso doutrinário e jurisprudencial acerca da força normativa própria da Constituição. Sejam as normas constitucionais regras ou princípios não dependem de normas infraconstitucionais para estas prescreverem o que aquelas já prescreveram. O § 6º do art. 226 da Constituição qualifica-se como norma-regra, pois seu suporte fático é precisamente determinado: o casamento pode ser dissolvido pelo divórcio, sem qualquer requisito prévio, por exclusivo ato de vontade dos cônjuges. Juliana Aguiar Leal – 2018.1 – Unicap 18 No plano da interpretação teleológica, indaga-se quais os fins sociais da nova norma constitucional. Responde-se: permitir sem empeço e sem intervenção estatal na intimidade dos cônjuges, que estes possam exercer com liberdade seu direito de desconstituir a sociedade conjugal, a qualquer tempo e sem precisar declinar os motivos. Consequentemente, quais os fins sociais da suposta sobrevivência da separação judicial, considerando que não mais poderia ser convertida em divórcio? Ou ainda, que interesse juridicamente relevante subsistiria em buscar-se um caminho que não pode levar à dissolução do casamento, pois o divórcio é o único modo que passa a ser previsto na Constituição? O resultado da sobrevivência da separação judicial é de palmar inocuidade, além de aberto confronto com os valores que a Constituição passou a exprimir, expurgando os resíduos de quantum despótico: liberdade e autonomia sem interferência estatal. Ainda que se admitisse a sobrevivência da sociedade conjugal, a nova redação da norma constitucional permite que os cônjuges alcancem suas finalidades, com muito mais vantagem. Por outro lado, entre duas interpretações possíveis, não poderia prevalecer a que consultasse apenas o interesse individual do cônjuge que desejasse instrumentalizar a separação para o fim de punir o outro, comprometendo a boa administração da justiça e a paz social. É da tradição de nosso direito o que estabelece o art. 5º da Lei de Introdução ao Código Civil: na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum. O uso da justiça para punir o outro cônjuge não atende aos fins sociais nem ao bem comum, que devem iluminar a decisão judicial sobre os únicos pontos em litígio, quando os cônjuges sobre eles não transigem: a guarda e a proteção dos filhos menores, os alimentos que sejam devidos, a continuidade ou não do nome de casado e a partilha dos bens comuns. 4. EXTINÇÃO DAS CAUSAS SUBJETIVAS E OBJETIVAS A nova redação da norma constitucional tem a virtude de pôr cobro à exigência de comprovaçãoda culpa do outro cônjuge e de tempo mínimo. O divórcio, em que se convertia a separação judicial litigiosa, contaminava-se dos ressentimentos decorrentes da imputação de culpa ao outro cônjuge, o que comprometia inevitavelmente o relacionamento pós-conjugal, em detrimento sobretudo da formação dos filhos comuns. O princípio do melhor interesse da criança e do adolescente, incorporado ao ordenamento jurídico brasileiro, como "absoluta prioridade", dificilmente consegue ser observado, quando a arena da disputa é alimentada pelas acusações recíprocas, que o regime de imputação de culpa propicia. O divórcio sem culpa já tinha sido contemplado na redação originária do § 6º do art. 226, ainda que dependente do requisito temporal. A nova redação vai além, quando exclui a conversão da separação judicial, deixando para trás a judicialização das histórias pungentes dos desencontros sentimentais. Juliana Aguiar Leal – 2018.1 – Unicap 19 O direito deixa para a história da família brasileira essa experiência decepcionante de alimentação dos conflitos, além das soluções degradantes proporcionadas pelo requisito da culpa. Os direitos legítimos eram aviltados em razão da culpa do cônjuge pela separação: os filhos tinham limitado o direito à convivência com os pais considerados culpados; o poder familiar era reduzido em razão da culpa; os alimentos eram suprimidos ao culpado, ainda que deles necessitasse para sobreviver; a partilha dos bens comuns era condicionada à culpa ou inocência. O Código Civil de 2002 reduziu bastante esses efeitos, mas não conseguiu suprimi-los de todo: o culpado perde o direito ao sobrenome do outro (art. 1.578); os alimentos serão apenas o necessário à subsistência para o culpado (art. 1.694); o direito sucessório é afetado se o cônjuge sobrevivente for culpado da separação de fato (art. 1.830). Frise-se que o direito brasileiro atual está a demonstrar que a culpa na separação conjugal gradativamente perdeu as consequências jurídicas que provocava: a guarda dos filhos não pode mais ser negada ao culpado pela separação, pois o melhor interesse deles é quem dita a escolha judicial; a partilha dos bens independe da culpa de qualquer dos cônjuges; os alimentos devidos aos filhos não são calculados em razão da culpa de seus pais e até mesmo o cônjuge culpado tem direito a alimentos "indispensáveis à subsistência"; a dissolução da união estável independe de culpa do companheiro. A culpa permanecerá em seu âmbito próprio: o das hipóteses de anulabilidade do casamento, tais como os vícios de vontade aplicáveis ao casamento, a saber, a coação e o erro essencial sobre a pessoa do outro cônjuge. A existência de culpa de um dos cônjuges pela anulação do casamento leva à perda das vantagens havidas do cônjuge inocente e ao cumprimento das promessas feitas no pacto antenupcial (art. 1.564 do Código Civil). Também são extintas as causas objetivas, ou seja, aquelas que independem da vontade ou da culpa dos cônjuges. Para a separação judicial havia duas causas objetivas: a) a ruptura da vida em comum há mais de um ano; b) a doença mental de um dos cônjuges, deflagrada após o casamento. Para o divórcio direto, havia apenas uma: a separação de fato por mais de dois anos. Todas desapareceram. Não há mais qualquer causa, justificativa ou prazo para o divórcio. Se houve erro sobre a pessoa do outro cônjuge, revelado após o casamento e utilizado como motivação do pedido, a hipótese é de anulação do casamento e não do divórcio. Portanto, não há espaço no pedido de divórcio para qualquer explicitação de causa subjetiva ou objetiva; simplesmente, os cônjuges resolvem se divorciar, guardando para si suas razões. E podem fazê-lo logo após o casamento, sem aguardar qualquer prazo. Essa circunstância levará certamente ao desuso a anulação do casamento, permanecendo apenas as hipóteses de nulidade, pois estas independem da vontade dos cônjuges. A anulação era utilizada logo após o casamento, principalmente porque não dependia de prazo de separação de fato, que eram requisitos da separação judicial e do divórcio direto. Juliana Aguiar Leal – 2018.1 – Unicap 20 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - A união homoafetiva (termo criado por Maria Berenice Dias) tem entendimento consolidado pelo STF, no sentido de não ser tratada nem como casamento e nem como união estável, contudo, tem a mesma força de lei que a união estável. IBDFAM - Supremo reconhece união homoafetiva (06/05/2011) Os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), ao julgarem as Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4277 e da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 132, reconheceram a união estável para casais do mesmo sexo. O relator das ações, ministro Ayres Britto, votou no sentido de dar interpretação conforme a Constituição Federal para excluir qualquer significado do artigo 1.723, do Código Civil, que impeça o reconhecimento da união entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar. Argumentou que o artigo 3º, inciso IV, da CF veda qualquer discriminação em virtude de sexo, raça, cor e que, nesse sentido, ninguém pode ser diminuído ou discriminado em função de sua preferência sexual. "O sexo das pessoas, salvo disposição contrária, não se presta para desigualação jurídica", observou o ministro, para concluir que qualquer depreciação da união estável homoafetiva colide, portanto, com o inciso IV do artigo 3º da CF. [...] Com a decisão, os homossexuais passaram a ter alguns direitos que por muito tempo eram exclusivos dos heterossexuais, tais como: direito de comunhão parcial de bens; direito a pensão alimentícia no caso de separação; direito a pensão do INSS em caso da morte do parceiro; direito de colocar o companheiro como dependente em Planos de Saúde; direito a mencionar o parceiro como dependente ao declarar o Imposto de Renda; direito a adotar crianças, não dando, agora, preferência apenas a casais heterossexuais; etc. Conforme o posicionamento de Paulo Lobo, presidente do Instituto Brasileiro de Direito da Família (CORREIO DA BAHIA, 2011), “o Supremo Tribunal Federal fez o que o Congresso Nacional não fez. A união entre pessoas do mesmo sexo se equipara à união estável heterossexual, com todos os direitos e proteções legais garantidos”. Lobo lembra ser inquestionável a decisão da suprema corte, de modo que todos os tribunais e juízes, mesmo não concordando, terão que observá-la ao analisar o caso concreto. Ele destacou que esta decisão do STF tem um efeito vinculado, ou seja, vale tanto para o Poder Judiciário quanto para a administração pública em geral. “Ninguém mais pode questionar essa decisão. Mesmo que os tribunais ou os juízes não concordem, eles têm que observar a decisão do STF”, frisou Lobo. Juliana Aguiar Leal – 2018.1 – Unicap 21 É interessante destacar, ainda, que o STF igualou a união estável homossexual à heterossexual, mas não ao casamento. No entanto, a nossa Carta Magna, em seu Art. 226, estabelece que a lei deve facilitar a conversão de uniões estáveis em casamento. Para fortificar ainda mais a decisão do STF e o Art. 226 da Constituição, no dia 14 de maio de 2013, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), por 14 votos a favor e 1 contra, aprovou uma resolução obrigando todos os cartórios brasileiros a realizarem o casamento entre pessoas do mesmo sexo. Contudo, no Brasil não é estabelecido em lei, de forma taxativa, o casamento homoafetivo. É perfeitamente possível, com base na resolução do CNJ, a aplicação do § 3° do art. 226 da Lei Maior, bem como o artigo 1.726 do Código Civil, podendo os companheiros, de comumacordo e a qualquer tempo, requerer a conversão da união estável em casamento, através de pedido dirigido ao juiz e assento no Registro Civil. [...] Tendo em vista a demanda pela asseguração dos direitos dos homossexuais, cabe aos magistrados, advogados e doutrinadores, o entendimento desse fenômeno como parte do meio social para a utilização dos princípios e métodos adequados à defesa dos interesses dessas pessoas. Qualquer posição em sentido contrário, além de deformar a realidade, deforma o próprio direito, ao negar a ele seu caráter naturalmente transformador, na proteção das minorias. E é justamente a proteção dos direitos subjetivos das minorias, que se funda o Estado de direito. Juliana Aguiar Leal – 2018.1 – Unicap 22 Função contramajoritária e reconhecimento da união homoafetiva: um debate (Justificando – carta capital – Paulo Iotti, 10/09/2017) - Introdução Com a histórica decisão do Supremo Tribunal Federal, a união duradoura, pública e contínua entre pessoas do mesmo gênero (união homoafetiva) foi reconhecida como entidade familiar, em “Reconhecimento que é de ser feito segundo as mesmas regras e consequências da união estável heteroafetiva” (ADPF 132 e da ADI 4277). Por ter sido decisão em controle concentrado de constitucionalidade, à qual a Constituição impõe efeito vinculante e eficácia erga omnes, ou seja, “força de lei”, por se tratar de decisão de obrigatório cumprimento (vinculante) no país inteiro (erga omnes), juízes e Tribunais ficaram obrigados a respeitá-la. Por isso, não houve mais debates sobre a possibilidade jurídica da união estável homoafetiva, no Judiciário, desde então. E, como uma das “consequências da união estável heteroafetiva” é a possibilidade de conversão em casamento civil, este passou a ser reconhecido, inicialmente mediante conversão de prévia união estável, e, posteriormente, de forma direta (cf. STJ, REsp 1.183.378/RS, e CNJ, Resolução 175/2013). Em razão disso, muitas e muitos acreditam que o tema está, definitivamente, decidido. Mas, infelizmente, não está, ante notórias tentativas de parte do Congresso Nacional, para aprovação de lei que restrinja o conceito de família conjugal apenas à união entre homem e mulher, como tenta fazer o texto do PL 6.583/2013, conhecido como “Estatuto da Família”. Uma família totalitária, já que quer ser reconhecida em prejuízo de outras – este projeto é uma clara reação ao “Estatuto das Famílias” (no plural), atualmente em trâmite no Senado Federal (PLS 470/2013), que visa reconhecer diversas modalidades familiares e não uma única. Enfim, o ponto é que, se aprovado, referido “Estatuto da Família” (ou similar) fará com que o tema retome ao Judiciário e, fatalmente, retornará ao Supremo Tribunal Federal. Juliana Aguiar Leal – 2018.1 – Unicap 23 PARA ALÉM DO ARCO-ÍRIS: A FAMÍLIA CONSTITUCIONAL E A UNIÃO HOMOSSEXUAL (Paulo Ramon da Silva Solla) 1. A INTERPRETAÇÃO EXCLUDENTE E O NÚMERO CLAUSUS. Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. § 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento. § 4º Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes. Não é pacífico na doutrina sobre o §3º do artigo 226 da Carta Política constituir número clausus ou apertus. Para alguns, como o ilustre mestre baiano Orlando Gomes (2001, p. 3-30), há ali uma cláusula excludente, referindo apenas à união estável entre o homem e a mulher, bem como a família monoparental como entidades familiares. Para outros, principalmente entre os membros da doutrina atual como Paulo Lobo e Maria Berenice Dias (2006, p. 40-45) há ali repertório apenas ilustrativo de tais entidades, sendo então um dispositivo de inclusão. O texto constitucional se faz em sua interpretação por um todo, devendo serem encarados e ponderados os princípios existentes, quando conflitantes, visando a busca da máxima realização de cada um deles [...]. A interpretação do texto constitucional não se faz por um dispositivo isolado, mas levando em conta todos os vetores de racionalidade que emanam deste mesmo. Para, com isso, chegar-se à realização de um direito legítimo, que se faz clamar pela sociedade e se expressa no texto constitucional. Interpretar não é construir verdades universais, estáticas e incontestáveis como parecem entender os defensores da cláusula de excludência. A atividade do intérprete é a de perceber o sentido que hora se apresenta. [...] Como bem mostra Paulo Luiz Netto Lôbo, “a exclusão não está na constituição, mas na interpretação” (LÔBO, 2002, p. 50). Sendo a família que goza de especial proteção do Estado e, mais ainda, sendo a affectio sua força propulsora, percebemos que esta é o gênero do qual advém várias espécies, que não fazem desmerecer-lhe a tutela da juridicidade. Há de se ver que no texto constitucional não há mais a cláusula “constituída pelo casamento”, que não foi por nenhuma outra substituída. [...] Sabemos que o casamento é o ato solene que regula a união entre duas pessoas. Mas não significa que seja ele a única e preferencial forma de constituição do vínculo afetivo. De fato, sua solenidade isenta aos consortes da necessidade de comprovação da relação e tem seus aspectos normativos patrimoniais mais amplamente regulados. Daí que se deva facilitar, ou seja, não criar óbices à conversão da união estável em casamento. Juliana Aguiar Leal – 2018.1 – Unicap 24 Novamente é de Paulo Lôbo a lição: “A regra do §4º do art. 226 integra-se à cláusula geral de inclusão, sendo este o sentido do termo “também” nela contido. “também” tem o significado de igualmente, da mesma forma, outrossim, de inclusão de fato sem exclusão de outros. Se dois forem os sentidos possíveis (inclusão ou exclusão), deve ser prestigiado o que melhor responda à realização da dignidade da pessoa humana, sem desconsideração das entidades familiares não explicitadas no texto” (LÔBO, 2002, p. 53) Assim, concluímos que, de fato, não há nota de exclusão no parágrafo terceiro do artigo 226 e que as prescrições do §4º visam somente dar maior formalidade, preenchendo de forma mais precisa o critério de ostensibilidade na constituição da família, que é o seu reconhecimento público como tal. As novas famílias. Censo do IBGE reconhece a pluralidade da família brasileira e confirma cenário apontado pelo IBDFAM desde seu surgimento. (24/10/2012). O censo 2010, divulgado na última semana pelo IBGE, revela o que já se sabia: a família brasileira é plural e vem se transformando continuamente. Confirmando esse cenário, o IBGE aponta que, entre 2000 e 2010, ganha espaços as famílias recompostas, houve um aumento das uniões consensuais, das famílias lideradas por mulheres e do divórcio que quase dobrou em dez anos. Pela primeira vez, o IBGE pesquisou casais do mesmo sexo. O diretor do IBDFAM nordeste, Paulo Lobo, aponta que essas pesquisas revelaram e revelam o que já se sabia, mas que se encontrava na penumbra da ilegalidade ou desconsideração do direito. “A constituição de 1988 abriu as comportas, permitindo a inclusão das demais entidades familiares, represadas pela exclusividade que o direito atribuía à família matrimonial. A pluralidade familiar, de lá para cá, cresceu e o direito ainda tem muita tarefa de adaptação pela frente”, aponta. Mosaico familiar Paulo Lôbo explica que a simplificação do divórcio e a superação da separação judicial (o antigo desquite) asseguraram a liberdadedas pessoas em constituírem novas famílias, com respaldo legal, principalmente por novo casamento ou união estável. Para o presidente do IBDFAM, ao se extinguir o instituto da separação, o Estado evita longos processos judiciais onde se buscava quem era o culpado pelo fim do casamento. “Simplificar a dissolução do casamento não significa de maneira alguma incentivar separações, ao contrário, significa apenas que a responsabilidade pelos vínculos conjugais diz respeito tão somente ao casal e que eles devem ter liberdade para manter ou não tal vinculo”, explica. [...] Juliana Aguiar Leal – 2018.1 – Unicap 25 - Outro ponto da aula: NOVO ESTATUTO DA FAMILIA Manifesto do IBDFAM contra a PL 6.583/2013 1) O Projeto de Lei 6583/2013, denominado Estatuto da Família, que está em tramitação na Câmara Federal, restringe o conceito de família para aquela constituída por homem e mulher ou relação monoparental - quando apenas um dos pais arca com criação do (s) filho (s) - e descendentes; 2) Em nossa sociedade existem outros tipos de família como aquelas constituídas por avós e netos, tios e sobrinhos, filhos adotivos e pessoas do mesmo sexo que também conquistaram o direito à tutela do Poder Público; 3) Em uma decisão histórica, o Supremo Tribunal Federal garantiu que a união entre pessoas do mesmo sexo está inserida no rol dos direitos fundamentais do indivíduo, sendo uma manifestação do princípio da dignidade da pessoa humana. Ao desconsiderar essa decisão do Tribunal Constitucional, o projeto fere a Constituição Federal; 4) A família é o núcleo social básico constituído de laços consanguíneos e socioafetivos e tem assegurada proteção prioritária do Estado em todas as suas formas de expressão; Neste sentido, conclamamos aos senhores e senhoras parlamentares que rejeitem o PL 6583/2013, visto que é discriminatório, violador da dignidade humana e, portanto, inconstitucional, sendo também contrário aos compromissos internacionais assumidos pelo Estado brasileiro junto ao Sistema Internacional de Proteção dos Direitos Humanos. Conclamamos também a toda a sociedade brasileira para que se levante em defesa de todas as famílias, considerando que família é amor, é afeto e que, por isso, merece ser reconhecida pelo Estado. Alternativa: o Estatuto das Famílias Enquanto o Estatuto da Família é discutido na Câmara, tramita em paralelo no Senado o Projeto de Lei 470/2013. De iniciativa da senadora Lídice da Mata, o projeto pretende criar o Estatuto das Famílias – e o uso do plural faz toda a diferença nesse caso. Em análise desde 2013 na Comissão de Direitos Humanos do Senado, esse projeto reconhece a relação homoafetiva como entidade familiar, assim como outros arranjos familiares, como famílias fora do casamento, de casamentos anteriores e aquelas formadas por enteados, padrasto ou madrasta. Portanto, esse projeto contradiz o Estatuto da Família. A ideia, segundo a senadora, é criar uma cultura de paternidade responsável, responsabilizando aqueles que mantêm famílias paralelas. Além disso, o reconhecimento de arranjos homoafetivos garantiria a elas um amparo legal ainda pouco estruturado atualmente. Juliana Aguiar Leal – 2018.1 – Unicap 26 - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - Pós debate: Art. 226 ao 230 Constituição Federal 1988. • Direitos Fundamentais – Dignidade e Solidariedade Familiar. • Direitos Gerais – Igualdade; Liberdade; Afetividade; Convivência paternal; Melhor interesse; Responsabilidade Familiar. Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. § 1º O casamento é civil e gratuita a celebração. § 2º O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei. § 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento. → Princípio da Solidariedade Familiar → Solidariedade Familiar: É quando a preocupação é maior com a pessoa do que com o patrimônio ou instituição. Em se tratando de criança e adolescente, os familiares, a sociedade ou o Estado podem intervir para condicionar o melhor exercício das obrigações parentais. Nos § 1, § 2 e § 3, a lei aplica à família a questão da formação da família, primeiramente como sendo base especial de proteção do Estado, sendo sua formação por celebração de casamento, no caso do religioso a celebração tem efeito civil, com base na lei. O §3º fala sobre a união estável entre homem e mulher como forma de entidade familiar, sendo a ela facilitada a conversão em casamento, dando impressão de hierarquia (primeiro casamento depois união estável), NO CASAMENTO O ESTADO TEM O REGISTRO DO MATRIMÔNIO, DIFERENTE DA UNIÃO ESTÁVEL. Juliana Aguiar Leal – 2018.1 – Unicap 27 → O § 3º promoveu o concubinato a um nível de entidade familiar: união estável. ► DO CONCUBINATO À UNIÃO ESTÁVEL Todas as Constituições anteriores à Constituição de 1988, excetuando-se a de 1967, definiam a Família como aquela constituída pelo casamento civil e que este era indissolúvel, estando sob a proteção estatal. Neste sentido, sob esta égide, surgiu dois polos distintos: à priori uma família legítima, baseada no casamento civil e estritamente dentro dos amparos legais; e de outro lado a família ilegítima, criada às margens legais e não tendo as mesmas prerrogativas da primeira. O concubinato sempre foi associado a uma ideia de imoralidade, libertinagem, uma visão marginalizada, colada em posição inferior ao casamento. Resta evidente que o antigo Código Civil, norteado por uma sociedade moralista e puritana, não tinha como escopo a proteção do núcleo familiar, mas simplesmente evitar os escândalos provocados dentro daquela sociedade, toda vez que uma amante requeria seus direitos após anos de convivência ou um filho “bastardo” postulava ser reconhecido. A Família somente merecia receber tal “título” se adviesse de um casamento válido, isto é, dentro dos preceitos da lei, sendo assim legitimada social e juridicamente. Contrariamente, aquela relação que se desse fora destes preceitos não detinha proteção do Estado e sequer era considerada como uma família. No direito brasileiro, a união estável era vista como concubinato. Tal denominação anterior à Constituição Federal de 88 refere-se ao fato da união entre o homem e a mulher, sem casamento, os quais eram conhecidos como aqueles que "viviam como se casados fossem", mas com algumas restrições a esse modo de convivência. Por exemplo, proibindo doações ou benefícios testamentários, inclusão da concubina como beneficiária de contrato de seguro de vida e ademais restrições. Juliana Aguiar Leal – 2018.1 – Unicap 28 Maria Helena Diniz traz definição de concubinato: "O concubinato pode ser: puro ou impuro. Será puro se se apresentar como uma união duradoura, sem casamento civil, entre homem e mulher livres e desimpedidos, isto é, não comprometidos por deveres matrimoniais ou por outra ligação concubinária. Assim, vivem em concubinato puro: solteiros, viúvos e separados judicialmente. Ter-se-á concubinato impuro se um dos amantes ou ambos estão comprometidos ou impedidos legalmente de se casar. Apresenta-se como: a) adulterino, se se fundar no estado de cônjuge de um ou de ambos os concubinos, p. ex., se o homem casado mantém, ao lado da família legítima, outra ilegítima; e b) incestuoso, se houver parentesco próximo entre amantes". Hoje a expressão"concubinato" apenas é utilizada para designar o relacionamento amoroso envolvendo pessoas casadas que infringem o dever de fidelidade (adulterino), pois com a Constituição de 1988 passou a ser reconhecido o concubinato puro como UNIÃO ESTÁVEL. Configura-se o concubinato, segundo o Código Civil de 2002, em seu art. 1.727: "As relações não eventuais entre o homem e a mulher, impedidos de casar, constituem concubinato". E na Constituição Federal no artigo 226, §3º reconheceu a distinção entre concubinato puro que passou a chamar união estável e concubinato impuro, e ainda, a união estável passou a ser entidade familiar; ou seja, da clandestinidade para tolerância e da tolerância para efeitos jurídicos, mas concubinato até hoje é sociedade de fato e não é entidade familiar. EM SUMA: a) Concubinato Puro: Pessoas solteiras e desimpedidas para contrair casamento. Com a evolução do Código e Constituição, o que era denominado Concubinato puro passa a ser União Estável, a partir da CR/88. b) Concubinato Impuro: Dava-se pela relação eventual de pessoas impedidas de se casar. Hoje, é previsto no art. 1.727 como simplesmente “concubinato”, referindo-se relacionamento amoroso envolvendo pessoas casadas que infringem o dever de fidelidade (adulterino) Juliana Aguiar Leal – 2018.1 – Unicap 29 → PONTO: O art. 226 §3 estabeleceu uma hierarquia entre União estável e Casamento? Para Paulo Lobo, “A interpretação dominante do art. 226 da Constituição, entre os civilistas, é no sentido de tutelar apenas os três tipos de entidades familiares, explicitamente previstos, configurando numerus clausus. Os que entendem que a Constituição não admite outros tipos além dos previstos controvertem acerca da hierarquização entre eles, resultando duas teses antagônicas: Tese I – Há primazia do casamento, concebido como o modelo de família, o que afasta a igualdade entre os tipos, devendo os demais (união estável e entidade monoparental) receberem tutela jurídica limitada; O principal argumento da tese I, da desigualdade, reside no enunciado final do § 3o do art. 226, relativo à união estável: “devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”. A interpretação literal e estrita enxerga regra de primazia do casamento, pois seria inútil, se de igualdade se cuidasse. Tese II – Há igualdade entre os três tipos, não havendo primazia do casamento, pois a Constituição assegura liberdade de escolha das relações existenciais e afetivas que previu, com idêntica dignidade. O isolamento de expressões contidas em determinada norma constitucional, para extrair o significado, não é a operação hermenêutica mais indicada. Impõe-se a harmonização da regra com o conjunto de princípios e regras em que ela se insere. Com efeito, a norma do § 3º do artigo 226 da Constituição não contém determinação de qualquer espécie. Não impõe requisito para que se considere existente união estável ou que subordine sua validade ou eficácia à conversão em casamento. Configura muito mais comando ao legislador infraconstitucional para que remova os obstáculos e dificuldades para os companheiros que desejem casar-se, se quiserem, a exemplo da dispensa da solenidade de celebração. Em face dos companheiros, apresenta-se como norma de indução. Contudo, para os que desejarem permanecer em união estável, a tutela constitucional é completa, segundo o princípio de igualdade que se conferiu a todas as entidades familiares. Não pode o legislador infraconstitucional estabelecer dificuldades ou requisitos onerosos para ser concebida a união estável, pois facilitar uma situação não significa dificultar outra. A tese II, da igualdade dos tipos de entidades, consulta melhor o conjunto das disposições constitucionais. Além do princípio da igualdade das entidades, como decorrência natural do pluralismo reconhecido pela Constituição, há de se ter presente o princípio da liberdade de escolha, como concretização do macro princípio da dignidade da pessoa. Consulta a dignidade da pessoa humana a liberdade de escolher e constituir a entidade familiar que melhor corresponda à sua realização existencial. Não pode o legislador definir qual a melhor e mais adequada. ” Juliana Aguiar Leal – 2018.1 – Unicap 30 → Reflexão: Haveria interesse do Estado em colocar tal hierarquia entre C e UE, tendo em vista que sem registro (como é o caso da UE), não tem como o Estado controlar. A estatística é frágil. Esse interesse do Estado, esse controle, é um resquício inadequado, ainda, de intervenção. Outra ideia é a de que, a segunda parte do §3 trata-se de uma facilitação procedimental e não de hierarquia. Essa leitura pretende que a única hierarquia entre C e UE seria histórica, pois traz a ideia de que a formalidade traz maior segurança jurídica. Juliana Aguiar Leal – 2018.1 – Unicap 31 Art. 226. § 4º Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes. Quanto ao §4º trata da família como comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes, fica aberta a possibilidade de outras formas de família, ex: dois irmãos sem pais, que não é união estável e nem casamento. O parágrafo não estabelece classe de descendentes, deixando a expressão ampla. A “família monoparental” não pode restar como sendo a única interpretação válida desse parágrafo. A interpretação é de RELAÇÃO PARENTAL, podendo referir-se a irmão-irmão, por exemplo. A relação parental independe de relação conjugal. § 5º Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher. Quanto ao §5º há igualdade entre homens e mulheres na relação conjugal para os direitos e seus deveres. Essa igualdade merece a (((REFLEXÃO))) entre IGUALDADE FORMAL x IGUALDADE MATERIAL. A igualdade formal, igualdade perante a lei ou igualdade jurídica, consiste no tratamento equânime conferido pela lei aos indivíduos, visando subordinar todos ao crivo da legislação, independentemente de raça, cor, sexo, credo ou etnia. Essa igualdade é insuficiente, na medida em que desconsidera as peculiaridades dos indivíduos e grupos sociais menos favorecidos, não garantindo a estes as mesmas oportunidades em relação aos demais. O advento do Estado Social, o Estado adquire uma feição intervencionista com o fito de proteger os grupos menos favorecidos, efetivando os seus direitos fundamentais. Nesse momento, surge a concepção de igualdade material/substancial, que não se limita apenas ao plano jurídico-formal, mas busca uma atuação estatal positiva, tem por finalidade igualar os indivíduos, que essencialmente são desiguais. Juliana Aguiar Leal – 2018.1 – Unicap 32 → Paulo Lobo pontua que até a expressão ADOTIVO é discriminatória. Como leciona Paulo Lôbo, no Brasil, a filiação é conceito único, não se admitindo adjetivações ou discriminações. Desde a constituição de 1988 não há mais filiação legítima, ilegítima, natural, adotiva ou adulterina. Art. 227, § 6º. Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação. Flávio Tartuce ensina que não se pode mais utilizar expressões como filho adulterino, filho incestuoso, filho espúrio ou filho bastardo, admitindo-se, para fins didáticos, a expressão filho havido forado casamento, pois todos os filhos são iguais, repercutindo tanto no campo patrimonial quanto no pessoal. Vale acrescentar ao ensinamento doutrinário, a propósito, a proibição de utilizar até mesmo expressões que não seriam, em princípio, discriminatórias, mas que poderiam desaguar numa distinção injustificável, como a adjetivação “adotivo” após a palavra filho. Assim, o Estatuto da Criança e do Adolescente proíbe o fornecimento de certidão sobre a sentença de adoção inscrita no registro civil mediante mandado para a constituição do vínculo filial. Seguindo o mesmo norte, a Lei n. 8.560/92, atendendo à exigência de isonomia constitucionalmente imposta, proibiu a inserção, no registro de nascimento, de qualquer referência à natureza da filiação, bem como determinou que as certidões não contenham indícios de a concepção haver sido de corrente de relação extraconjugal. Juliana Aguiar Leal – 2018.1 – Unicap 33 § 6º O casamento civil pode ser dissolvido pelo divórcio. § 7º Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas. Quanto ao §7º, a questão da paternidade responsável está na consequência do ato, tanto para a mulher que resolve ser mãe sozinha, quanto a possibilidade do aborto, nesses casos existe uma problemática que pondera a liberdade. - Planejamento familiar: Liberdade. Verifica-se quando, por exemplo, não há controle estatal para o número de filhos. A política adotada no Brasil para o controle do planejamento familiar é “neutra”, pois o entendimento do Constituinte é de que este controle pertence única e exclusivamente à família, sem a necessidade de qualquer interferência Estatal. Assim, cada família tem o poder de escolher os meios, métodos e técnicas para controlar a natalidade e regular a fecundidade, sem qualquer interferência estatal. → (((REFLEXÃO))): Mas posso ter filho do jeito que eu quiser? Como escolher a cor dos olhos? Não! A dignidade é o limite dessa liberdade. O conceito de paternidade responsável está voltado à responsabilidade e obrigação dos pais em prover a assistência material, intelectual, moral, e afetiva aos filhos. Mais que isto, garantir que a dignidade do menor vulnerável sujeito ao poder familiar seja preservada. Por isso, o legislador ao dispor acerca do planejamento familiar, ressalvou que a livre escolha do casal deve respeitar o princípio da dignidade da pessoa, ao lado da paternidade responsável. Afinal, inexiste paternidade responsável quando não há o respeito ao princípio da dignidade humana da criança e do adolescente. Juliana Aguiar Leal – 2018.1 – Unicap 34 → (((PONTO))): A CF estabelece que o planejamento familiar é LIVRE DECISÃO DO CASAL, enquanto a Lei 9.263/96, que regula o § 7º do art. 226 da CF, que trata do planejamento familiar, estabelece como sendo um conjunto de ações pela MULHER, pelo HOMEM ou pelo CASAL. Lei 9.263/96 Art. 1º O planejamento familiar é direito de todo cidadão, observado o disposto nesta Lei. Art. 2º Para fins desta Lei, entende-se planejamento familiar como o conjunto de ações de regulação da fecundidade que garanta direitos iguais de constituição, limitação ou aumento da prole pela mulher, pelo homem ou pelo casal. Art. 3º O planejamento familiar é parte integrante do conjunto de ações de atenção à mulher, ao homem ou ao casal, dentro de uma visão de atendimento global e integral à saúde. - - - - - - - - § 8º O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações. Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. O artigo 227 trata de uma RESPONSABILIDADE TRINÁRIA: Família, sociedade e Estado devem assegurar à criança e adolescente tais direitos. Paulo Lobo fala em SOLIDARIEDADE FAMILIAR, que “deve entender-se como solidariedade recíproca dos cônjuges e companheiros, principalmente quanto à assistência moral e material. A solidariedade em relação aos filhos responde à exigência da pessoa de ser cuidada até atingir a idade adulta, isto é, de ser mantida, instruída e educada para sua plena formação social. - - - - - Juliana Aguiar Leal – 2018.1 – Unicap 35 CASAMENTO - Noções aprofundadas • Natureza jurídica ► Teoria Contratualista – A teoria contratualista não nega a institucionalista, mostrando a necessidade do contrato para a existência do casamento, nessa teoria o casamento é um negócio jurídico; {Para os adeptos da teoria contratualista, o casamento é um negócio jurídico que depende da livre manifestação de vontade das partes para sua realização, de modo a produzir seus efeitos patrimoniais regulados pelo regime de bens, assim, o matrimônio seria um “contrato” a ser apreciado diante do plano da existência, validade e eficácia.} ► Teoria Institucionalista – O Estado é quem vai estabelecer todos os parâmetros para a elaboração do casamento, bem como a sua manutenção e continuação, ainda assim precisa da manifestação da vontade das partes. Tratando o casamento como uma instituição social; {Identifica o casamento como uma instituição, pois o mesmo é regido por normas de ordem pública, que define de forma pormenorizada seus efeitos jurídicos, impondo deveres e estabelecendo os direitos dos cônjuges, não podendo ser mitigados pela livre vontade das partes. Outrossim, não poderia se subsumir à condição de um contrato pois o casamento não regula apenas efeitos patrimoniais, mas, também, acarreta efeitos pessoais que não são objetos de um contrato.} ► Teoria Eclética – A teoria eclética determina que ambas as duas teorias se precisam, elas se complementam. {Diante do impasse, surge uma terceira corrente que o concebe como um ato complexo de natureza mista, híbrida ou eclética, pois reconhece no mesmo a coexistência de características contratuais com as institucionais. Para esta terceira corrente, a autonomia da vontade das partes se resume apenas à liberdade de escolher o parceiro, o regime de bens e a permanência ou não da relação familiar. Por seu turno, efeitos pessoais como alteração do estado civil, surgimento dos vínculos de parentesco, alteração do nome, deveres de fidelidade e coabitação, entre outros, retiram do casamento sua essência contratualista, já que efeitos pessoais não podem ser regulados por contrato. Assim, esta terceira corrente sustenta que o casamento é um contrato na sua formação, mas no seu curso é uma instituição, de modo que toma uma feição mista, híbrida e eclética que mescla, de forma mais ponderada, as duas correntes anteriores.} Juliana Aguiar Leal – 2018.1 – Unicap 36 o Pressupostos de existência: A inobservância desses pressupostos acarreta a inexistência jurídica, o ato fica privado de qualquer eficácia. Na lei, não está expresso como “pressuposto de existência”. O que significa ser um casamento inexistente? Significa
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