Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Acadêmica: Ana Carolina Lopes de Souza Prof Dr Marcos Valério Zschornack Capítulo III Robbins & Cotran Reparo tecidual: regeneração, cicatrização e fibrose Reparo – refere-se à restauração da arquitetura tecidual e da função após uma lesão; Envolve dois tipos de reações: Regeneração – tecidos que são capazes de restituir os componentes lesados e essencialmente retornar ao seu estado normal; Cicatrização – os tecidos lesados são incapazes de uma reconstituição completa, ou as estruturas de suporte do tecido estão gravemente danificadas, sendo que o processo de reparo ocorre por deposição de tecido conjuntivo (fibroso); Fibrose – utilizado para descrever a deposição extensiva de colágeno que ocorre nos pulmões, fígado, rins e outros órgãos, como uma consequência da inflamação crónica, ou no miocárdio após necrose isquêmica extensa (enfarte); Se a fibrose se desenvolve numa área de tecido ocupada por um exsudato inflamatório, chama- se organização (ex.: pneumonia organizada que afeta o pulmão). O controlo da proliferação celular. A proliferação dos remanescentes do tecido lesado, das células endoteliais vasculares e dos fibroblastos é coordenada por proteínas que são coletivamente chamadas fatores de crescimento. Ciclo celular Os processos-chave na proliferação das células são a replicação do DNA e a mitose; A proliferação celular é regulada por cíclicas que, quando conjugadas com CDK’s, regulam a fosforilação de proteínas envolvidas na progressão do ciclo celular, levando à replicação do DNA e à mitose; O ciclo celular consiste numa série de etapas nas quais a célula confere a precisão dos processos e instrui a si mesma a prosseguir para a próxima etapa; É rigorosamente regulado por estimuladores e inibidores e contém pontos de controlo intrínsecos para evitar a replicação de células anormais. Capacidade proliferativa dos tecidos Os tecidos são divididos em: Tecidos lábeis As células lábeis estão continuamente a ser perdidas e repostas pela maturação das células-tronco e pela proliferação das células maduras; Ex.: células hematopoiéticas da medula óssea; epitélios de superfície; epitélio cuboide dos ductos que drenam órgãos exócrinos; epitélio colunar do TGI, útero e tubas uterinas; epitélio de transição do trato urinário; Tecidos estáveis Possuem células quiescentes (estão na fase G0 do ciclo celular); Possuem somente uma atividade explicativa mínima no seu estado normal; Estas células são capazes de proliferar em resposta a uma lesão ou perda de massa tecidual; Ex.: parênquima da maioria dos tecidos sólidos; células endoteliais, fibroblastos e as células musculares lisas; Com a exceção do fígado, estes tecidos possuem uma capacidade limitada para se regenerar após uma lesão. Tecidos permanentes As células destes tecidos são consideradas terminalmente diferenciadas e não- proliferativas na vida pós-natal; Ex.: neurónios e biócitos; Uma lesão no cérebro ou no coração é irreversível e resulta numa cicatriz. Células-tronco Os tecidos que se dividem continuamente (tecidos lábeis) contêm células-tronco que se diferenciam para repor as células perdidas e manter a homeostasia tecidual; As células-tronco são caracterizadas por duas propriedades importantes: capacidade de auto- regeneração e replicação assimétrica; As células-tronco de embriões (células estaminais) são pluripotentes; os tecidos adultos, particularmente a medula óssea, contêm células-tronco adultas capazes de gerar múltiplas linhagens celulares. A natureza e os mecanismos de ação dos fatores de crescimento Os fatores de crescimento poli pépticos têm como papel principal promover a sobrevivência e a proliferação celulares, e são importantes na regeneração e na cicatrização; A expansão das populações de células geralmente envolve aumento do tamanho celular (crescimento), divisão celular (mitose) e proteção da morte apoptótica (sobrevivência); A maioria dos fatores de crescimento possui efeitos pleiotrópicos, ou seja, além de estimularem a proliferação celular, eles estimulam a migração, a diferenciação e a contractilidade, e intensificam a síntese de proteínas especializadas; Induzem a proliferação celular pela ligação a receptores específicos e afetam a expressão de genes cujos produtos caracteristicamente possuem muitas funções; A atividade principal dos fatores de crescimento é estimular a função dos genes que controlam o crescimento, muitos dos quais são chamados de proto-oncogenes; Alguns fatores de crescimento estimulam a proliferação de algumas células e inibem o ciclo de outras células; Na verdade, um fator de crescimento pode ter efeitos opostos na mesma célula dependendo da sua concentração. Mecanismos de sinalização dos receptores dos fatores de crescimento A sinalização pode ocorrer diretamente na mesma célula, entre células adjacentes ou a grandes distâncias: Sinalização autócrina: uma substância age predominantemente (ou exclusivamente) na célula que a secreta (ex.: resposta imune, hiperplasia epitelial compensatória); Sinalização parácrina: uma substância afeta as células que estão na adjacência imediata da célula que a libertou (ex.: resposta inflamatória e cicatrização da ferida); Sinalização endócrina: uma substância reguladora é libertada na corrente sanguínea e age em células-alvo à distância; As proteínas receptoras estão geralmente localizadas na superfície da célula, mas podem ser intracelulares, sendo que neste último caso, os ligantes devem ser suficientemente hidrofóbicos para entrar na célula (ex.: hormonas esteroides); A união de um ligante ao seu receptor de superfície celular induz uma cascata de eventos intracelulares secundários que culmina na ativação ou repressão do fator de transcrição, o que leva a respostas celulares; Diferentes classes de receptores de fatores de crescimento incluem: Receptores com atividade de quinase intrínseca (ex.: EGF e HGF); Receptores acoplados à proteína G-7; Receptores sem ação enzimática intrínseca; As citocinas geralmente ligam-se a estes receptores que por sua vez interagem com os fatores de transcrição citoplasmáticos que se dirigem para o núcleo (são lançados diretamente no núcleo); A maioria dos fatores de crescimento possui efeitos múltiplos, como a migração celular, diferenciação celular, estimulação da angiogénese e da fibrogénese, além da proliferação celular. Matriz extracelular (MEC) e interações entre a célula e a matriz O reparo do tecido não depende somente da atividade dos fatores de crescimento, mas também de interações entre as células e os componentes da MEC; A MEC é um complexo macromolecular dinâmico, de remodelação constante, sintetizado localmente, que se organiza numa rede que circunda as células; Por fornecer um substrato para a adesão celular e servir como um reservatório para fatores de crescimento, a MEC regula a proliferação, o movimento e a diferenciação das células existentes dentro dela; A MEC existe sob duas formas básicas; Matriz intersticial: entras as células, constituída de colágeno e várias glicoproteínas; Membrana basal: subjacente ao epitélio e que circunda os vasos sanguíneos, constituída de colágeno não-fibrilar tipo IV e laminina. Papéis da matriz extracelular Suporte mecânico: papel principal do colágeno e da elastina; Controlo do crescimento celular e manutenção da diferenciação celular: os proteoglicanos ligam-se a fatores de crescimento e apresenta-os em alta concentração, e a fibronectina e a laminina estimulam as células por meio de receptores de integrina celulares; Arcabouço para renovação tecidual; Estabelecimento de microambientes teciduais; Armazenamento e apresentação de moléculas reguladoras. Componentes da matriz extracelular Existem três componentes básicos da MEC: Proteínas estruturais fibrosas (ex.: colágeno e elastina), que conferem força elástica e capacidade de retração; Géis hidratados com água (ex.: proteoglicanos e hialuronano), que permitem resiliência e lubrificação; Glicoproteínas adesivas (ex.: fibronectina, laminina e integrinas),que conectam os elementos da matriz a outros elementos ou a células; A MEC intacta é necessária para a regeneração tecidual, e se a MEC estiver danificada o reparo só poderá ser realizado pela formação de cicatriz. Célula e regeneração tecidual A renovação celular ocorre continuamente nos tecidos lábeis (ex.: medula óssea); A renovação das células hematopoiéticas é conduzida por fatores de crescimento chamados de fatores estimulantes de colónias (CSFs), que são produzidos em resposta ao consumo aumentado ou à perda de células sanguíneas; Não se sabe se os fatores de crescimento desempenham algum papel na renovação do epitélio lábil; A regeneração pode ocorrer nos órgãos parenquimatosos com populações de células estáveis, que é geralmente um processo limitado, exceto no fígado; A regeneração extensiva ou a hiperplasia compensatória podem ocorrer somente se o tecido residual estiver estrutural e funcionalmente intacto, como após uma ressecção cirúrgica; Do contrário, se o tecido estiver danificado por uma infecção ou inflamação, a regeneração é incompleta e é realizada por cicatrização. Reparo por tecido conjuntivo O reparo ocorre pela reposição das células não-regeneráveis por tecido conjuntivo, ou por uma combinação de regeneração de algumas células e formação de cicatriz; O termo “tecido de granulação” (tipo especializado de tecido, característico da cicatrização) é derivado da sua aparência granular, rosada e de consistência mole, tal como é visto sob a crosta da ferida cutânea; O seu aspecto histológico é caracterizado pela proliferação de fibroblastos e capilares neoformados, delicados, de paredes finas (angiogénese), na MEC fraca; Então, o tecido de granulação acumula progressivamente matriz de tecido conjuntivo, resultando, finalmente, na formação de uma cicatriz, que se pode remodelar com o tempo; O reparo por deposição de tecido conjuntivo consiste em quatro processos sequenciais: formação de novos vasos sanguíneos (angiogénese); migração e proliferação de fibroblastos; deposição de MEC (formação de cicatriz); e maturação e reorganização do tecido fibroso (remodelação). Angiogenese Os vasos sanguíneos são desenvolvidos por dois processos: Vasculogénese: a rede vascular primitiva é estabelecida a partir dos angioblastos (precursores de células endoteliais) durante o desenvolvimento embrionário; Angiogénese ou neovascularização: vasos pré-existentes emitem brotos capilares para produzir novos vasos; A angiogénese é um processo crítico para a cicatrização de locais lesionados, no desenvolvimento da circulação colateral nos locais que sofreram isquemia, e permite o crescimento de tumores, em tamanho, além do seu suprimento sanguíneo inicial; Foi descoberto recentemente que as células precursoras endoteliais podem migrar da medula óssea para áreas de lesão e participar da angiogénese nestes locais; Podem participai na reposição das células endoteliais perdidas, na reendotelização dos implantes vasculares, na neovascularização de feridas cutâneas e tecidos isquêmicos, e no desenvolvimento tumoral; As principais etapas que ocorrem na angiogénese a partir de vasos pré-existentes estão listadas a seguir: Vasodilatação em resposta ao NO e aumento da permeabilidade dos vasos pré- existentes induzido pelo VEGF; Migração de células endoteliais em direção à área de lesão tecidual; Proliferação de células endoteliais logo após as células migratórias iniciais; Inibição da proliferação da célula endotelial e remodelagem dos tubos capilares; Recrutamento de células Peri endoteliais (pericitos para os pequenos capilares e células musculares lisas para os grandes vasos) para formar o vaso maduro; Os vasos sanguíneos neoformados durante a angiogénese são permeáveis porque: As junções interendoteliais não estão completamente formadas; O VEGF aumenta a permeabilidade do vaso; Esta permeabilidade explica por que o tecido de granulação é muitas vezes edematoso e é parte da causa do edema que pode persistir na ferida em cicatrização muito tempo após a resposta inflamatória aguda ter sido resolvida; As proteínas estruturais da MEC participam do processo de brotamento do vaso na angiogénese, basicamente por meio de interações com os receptores de integrinas nas células endoteliais; As proteínas não-estruturais da MEC contribuem para a angiogénese por desestabilizarem as interações MEC-célula para facilitar a migração celular contínua (ex.: trombospondina e tenascina) ou permitir a remodelação e involução dos vasos (ex.: ativador de plasminogénio e metaloproteinases da matriz). Fatores de crescimento envolvidos na angiogénese Vários fatores induzem a angiogénese, mas as mais importantes são o VEGF e o FGF; VEGF Estimula tanto a proliferação como a migração das células endoteliais (inicia o processo de brotamento capilar); O VEGF-2 mobiliza as células precursoras endoteliais da medula óssea e induz a proliferação e migração destas células para os locais de angiogénese; As angiopoetinas 1 e 2 e os fatores de crescimento PDGF e TGF-β participam do processo de estabilização pelo recrutamento de pericitos e células musculares lisas e pela deposição de tecido conjuntivo; FGF FGF-2 estimula a proliferação das células endoteliais, promove a migração de macrófagos e fibroblastos para a área danificada; FGF-7 (fator de crescimento dos queratinócitos) pode participar na cicatrização de feridas por intensificar a proliferação e migração de queratinócitos e pode proteger a integridade do epitélio da cavidade oral e do TGI. Migração de fibroblastos e deposição da MEC (formação de cicatriz) A formação de cicatriz desenvolve-se na rede de tecido de granulação com vasos neoformados e MEC fraca que se desenvolve inicialmente no local de reparo; Ocorre em duas etapas: migração e proliferação de fibroblastos para o local de lesão e deposição de MEC por estas células; Os macrófagos são constituintes celulares importantes do tecido de granulação e elaboram inúmeros mediadores que induzem a proliferação dos fibroblastos e a produção de MEC; Conforme a cicatrização progride, o número de fibroblastos proliferantes e vasos novos diminui; no entanto, os fibroblastos assumem progressivamente um fenótipo mais sintético e, consequentemente, há um aumento de deposição da MEC; A acumulação da rede de colágeno depende não só do aumento da síntese, mas também da diminuição da degradação do colágeno; O arcabouço de tecido de granulação evolui para uma cicatriz composta de fibroblastos fusiformes inativos, colágeno denso, fragmentos de tecido elástico e outros componentes da MEC; Conforme a cicatriz amadurece, há uma regressão vascular progressiva e o tecido de granulação altamente vascularizado transforma-se numa cicatriz pálida, basicamente avascular. Fatores de crescimento envolvidos na deposição da MEC e a formação de cicatriz TGF-β No contexto da inflamação e reparo, desempenha duas funções principais: É um agente fibrinogênio potente (estimula a produção de colágeno, fibronectina e proteoglicanos e inibe a degradação do colágeno); Inibe a proliferação de linfócitos e pode ter um efeito anti-inflamatório forte; PDGF Causa migração e proliferação de fibroblastos e células musculares lisas e macrófagos. MEC e remodelação tecidual A deposição de MEC depende do equilíbrio entre os agentes fibrogénicos, metaloproteinases (MMPs, ex.: colagenases intersticiais, gelatinases e estromelisinas) que digerem a MEC e inibidores teciduais da MMPs (TIMPs). Cicatrização da ferida cutânea As fases principais da cicatrização cutânea são: inflamação, formação de tecido de granulação e remodelação da MEC; As feridas cutâneas podem cicatrizar por união primária (primeira intenção) ou união secundária (segunda intenção); A cicatrização por primeira intenção consiste numa incisão cirúrgica limpa, não-infectada, aproximada por suturas cirúrgicas; Na cicatrização por segunda intenção, a reação inflamatória é mais intensa, existe um tecido de granulação abundante e a cicatriz contrai-se pela ação dos miofibroblastos,seguido da acumulação de MEC e a formação de uma cicatrização grande. Aspectos patológicos do reparo A cicatrização da ferida pode ser alterada por muitas condições, particularmente pela infecção e pelo diabetes; O tipo, o volume e a localização da lesão são fatores importantes para a cicatrização; A produção excessiva da MEC pode causar queloides na pele; A estimulação persistente da síntese do colágeno nas doenças inflamatórias crónicas leva à fibrose do tecido.
Compartilhar