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ILICITUDE E CULPABILIDADE

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ILICITUDE
 1. Introdução:
O ato ilícito é definido pelo Artigo 186, do Código Civil, nos seguintes termos:
“Artigo 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral comete ato ilícito.”
Para iniciar o estudo a respeito de ilicitude, vamos defini-la como sendo tudo aquilo que contraria a ordem jurídica. Assim, ilicitude é a contradição entre a conduta e o ordenamento jurídico. Tendo em vista este conceito, suponha que alguém estacione o veículo em local não permitido. Pergunta-se o ato é ilícito??? Para responder, basta verificar se o ato é contrário à lei. No caso em questão, verifica-se que o sujeito violou norma jurídica, portanto, é ilícito.
Novamente, pergunta-se, sabe-se que o sujeito que estaciona o veículo em local não permitido pratica ato ilícito, já que é contrário à lei, porém, o mesmo sujeito pratica crime???
Para responder o questionamento, cumpre esclarecer que o conceito de crime leva em consideração diversos aspectos, sejam, formais, analíticos ou materiais. Sabe-se, ainda, que dentre os conceitos analíticos do crime a ilicitude é, necessariamente, um dos elementos caracterizadores. Assim, atualmente, para conceituar crime, sabe-se que a ilicitude é um de seus elementos essenciais.
O sujeito que estaciona veículo em local não permitido pratica ilícito, porém, não pratica crime, pois, assim como a ilicitude é elemento imprescindível para a caracterização do crime, o fato típico também é. Desse modo, o sujeito que estaciona o veículo em local não permitido pratica ato contrário à lei, dessa forma, ilícito, mas, por outro lado, não pratica fato típico, já que a conduta “estacionar veículo automotor em local não permitido” não esta tipificada no ordenamento jurídico penal.
Concluindo, tem-se que a ilicitude, por si, é mera contrariedade ao ordenamento jurídico. Se verificada que a conduta ilícita também corresponde a fato típico, teremos caracterizado o crime, nos termos de um dos conceitos analíticos da criminologia.
 
 
2. Ilicitude x Injusto – Espécies de ilicitude
O ilícito consiste na contrariedade entre o fato e a lei. A ilicitude não comporta gradações, escalonamentos, isto é, a lesão corporal, por ser contrária à lei é tão ilícita quanto o latrocínio, porque também é contrário à lei. A constatação da ilicitude esta relacionada somente à sua contrariedade à lei.
Por outro lado, o injusto é a contrariedade do fato em relação ao sentimento social de justiça, ou seja, aquilo que o homem médio tem por certo, justo. Para ser constatado o injusto não é necessário haver contrariedade à lei. Um fato pode ser ilícito, na medida em que se contrapõe ao ordenamento jurídico, mas, ao mesmo tempo, pode ser considerado justo para a maior parte das pessoas, por ex., a prática de jogo do bicho é delito, porém, há pessoas que não consideram sua prática injusta.
Diferentemente do ilícito, o injusto apresenta diferentes graus, dependendo da intensidade da repulsa provocada. Ex: o estupro, embora tão ilegal quanto o porte de arma, agride muito mais o sentimento de justiça da coletividade.
 
A doutrina apresenta classificação à ilicitude subdividindo-a em : a) ilicitude formal, b) ilicitude material, c) ilicitude subjetiva e d) ilicitude objetiva.
 
a) ilicitude formal – trata-se da mera contrariedade do fato ao ordenamento legal, sem qualquer preocupação com a efetiva perniciosidade social da conduta. O fato é considerado ilícito porque não estão presentes as causas de justificação (excludentes), pouco importa o impacto social do fato.
b) ilicitude material: trata-se da contrariedade do fato em relação ao sentimento comum de justiça. O comportamento afronta o que o homem tem por justo e por correto. Para existir ilicitude material é necessário verificar uma lesividade social ínsita na conduta, a qual não se limita a afrontar o texto legal, provocando um efetivo dano à coletividade. Por exemplo: o deficiente mental que explora um comércio clandestino no meio da rua e não emite nota fiscal por mera ignorância. Seu ato é formalmente ilícito, mas materialmente sua conduta não se reveste ilicitude.
c) ilicitude subjetiva: para esse conceito a ilicitude esta relacionada à capacidade do autor da conduta. O fato só é ilícito se o agente tiver capacidade de avaliar seu caráter criminoso, não bastando que, objetivamente a conduta esteja coberta por causa de justificação. Segundo essa corrente doutrinaria o penalmente incapaz não comete fato ilícito.
d) ilicitude objetiva: independe da capacidade de avaliação do agente. Para existir ilicitude basta inexistir causa excludente.
 
3. Ilicitude e Caráter Indiciário do Fato Típico
Segundo o Professor Fernando Capez: “O tipo penal possui uma função seletiva, segundo a qual o legislador escolhe, dentre todas as condutas humanas, somente as mais perniciosas ao meio social, para defini-las em modelos incriminadores”.
O fato típico, por si só, é considerado ilícito, isto é, o fato típico, por si só, é considerado ato atentatório à ordem jurídica. Isto porque o direito penal tratou de separar todas as condutas que são consideradas mais danosas à sociedade, portanto, resta lógico, que se o fato típico prevê ação extremamente danosa aos bens mais relevantes da sociedade, evidentemente, que se configurado, por conseqüência, será ilícito.
Por exemplo, tenha em mente o tipo penal do homicídio, qual seja, “matar alguém”. A mera leitura do tipo ou a constatação da conduta na vida prática já nos faz pressupor que a conduta contraria a ordem jurídica. No entanto, a conduta “matar alguém” só não apresentará contradição à ordem jurídica, ou melhor, só não será ilícita, se apresentar uma causa que exclua a sua ilicitude (excludente de ilicitude).
Concluindo, o fato típico é por natureza ilícito, só não será ilícito se houver alguma causa que exclua sua ilicitude e é isto que vamos começar a estudar.
 
4. Causas de exclusão da ilicitude
Conforme abordado no item anterior, pressupõe-se, desde início, que todo fato típico é ilícito, salvo se presente algo (uma causa) que exclua a dita ilicitude.
As causas de exclusão da ilicitude podem ser a) causas supra legais ou b) causas legais. Vamos, agora, analisar, de forma resumida, cada uma delas:
a) causa supra legais de exclusão da ilicitude:
Muito embora a legislação imponha numero determinado de causas que excluem a ilicitude, sabe-se que o direito é o equilíbrio da vida social, sendo que este, em virtude de costumes impõe normas que possibilitam a exclusão do antijurídico.
 
Isto quer dizer que as hipóteses que permitem a exclusão da ilicitude não são limitadas ao rol legal, mas podem ser estendidas diante dos costumes da própria sociedade. Suponha que o recém nascido de sexo feminino tem suas orelhinhas furadas para inserção de brinco. Os pais, o farmacêutico ou o médico estariam praticando crime de lesão corporal??? Evidentemente que não, já que por costume social a ilicitude, nesse caso é excluída, não por causa legal (pois não esta expressa na lei) mas por causa supra legal (advinda dos costumes da sociedade).
b) causas legais de exclusão da ilicitude
Consistem nas causas, expressas na legislação, que, se constatadas, excluem a ilicitude do fato e, portanto, seu caráter de crime. São elas:
- estado de necessidade
- legítima defesa
- estrito cumprimento do dever legal
- exercício regular de um direito
ESTADO DE NECESSIDADE
1. Introdução e Conceito:
Como já analisamos na AULA 01, o estado de necessidade consiste em causa de exclusão de ilicitude legal, prevista no inciso I, do Artigo 23 e no Artigo 24, do CP.
O Artigo 24, do CP define o estado de necessidade como sendo:
Artigo 24. Considera-se em estado de necessidade quem pratica o fato para salvar perigo atual, que não provocou por sua vontade, nem podia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio cujo sacrifício, nas circunstancias, não era razoável exigir-se.
É causa de exclusão da ilicitude da conduta de quem, não tendo o dever legalde enfrentar uma situação de perigo atual, a qual não provocou por sua vontade, sacrifica um bem jurídico ameaçado por esse perigo para salvar outro, próprio ou alheio, cuja perda não era razoável exigir-se.
No estado de necessidade existem dois ou mais bens jurídicos posto em perigo de modo que a preservação de um deles depende do sacrifício do outro. Como o agente não criou a situação de ameaça, pode escolher, dentro de um critério de razoabilidade ditado pelo senso comum, qual deve ser salvo.
 
2. Teorias
A definição legal do estado de necessidade disposta na Parte Geral do Código Penal de 1984 não sofreu nenhuma alteração, inclusive, manteve a redação original do art. 20 do Código Penal de 1940. Dessa forma, manteve-se o ordenamento penal atado à teoria unitária.
Para melhor explicar, cumpre assinalar que a doutrina reconhece a existência de duas teorias (ou critérios) que podem ser utilizados pelo legislador para reconhecer a caracterização do estado de necessidade. As teorias são: a) teoria unitária e b) teoria diferenciadora.
 
a) Teoria Unitária – Para esta teoria a caracterização do estado de necessidade esta condicionada a razoabilidade do sacrifício do bem. Assim, considerando a existência de uma situação de perigo, bem como, diante da necessidade de sacrifico de um dos bens, para ser reconhecido o estado de necessidade, avalia-se se o sacrifício é razoável.
 
Para teoria unitária, não existe comparação de valores, pois ninguém é obrigado a ficar calculando o valor de cada interesse em conflito, bastando que atue de acordo com o senso comum daquilo que é razoável.
 
Importante frisar, ainda, que para a teoria unitária o estado de necessidade é sempre uma excludente de ilicitude.
 
b) Teoria Diferenciadora – Para os ordenamentos jurídicos que adotam a teoria diferenciadora, o reconhecimento do estado de necessidade deve ser realizado mediante a ponderação de valores entre os bens e deveres em conflito, de maneira que a ilicitude será excluída somente quando o bem sacrificado for reputado de menor valor.
 
Na teoria diferenciadora prevalece o critério objetivo de diferença de valor entre os interesses.
 
Ou seja, quando o bem destruído for de valor igual ou maior que o preservado, o estado de necessidade continuará existindo, mas como excludente de culpabilidade, enquanto modalidade supralegal de exigibilidade de conduta diversa. Somente ocorre, para teoria diferenciadora, a exclusão da ilicitude quando o bem salvo for de maior valor.
 
No caso do naufrago, por exemplo, que sacrifica a vida do companheiro para salvar a própria. Analisando dentro do raciocínio adotado pela teoria diferenciadora, há estado de necessidade, mas não há excludente da ilicitude e, sim da culpabilidade, como modalidade supralegal de exigibilidade de conduta diversa.
 
O Código Penal vigente adota a teoria unitária e não a teoria diferenciadora, porém, sabe-se que esta última foi adotada nos artigos 39 e 43, do Código Penal Militar.
 
Observações Interessantes!!!
 
Analise os fragmentos jurisprudenciais abaixo:
 
“Para configuração do estado de necessidade faz-se imperioso o requisito da proporcionalidade entre gravidade do perigo que ameaça o bem jurídico do agente ou alheio e a gravidade da lesão causada pelo fato necessitado.”( TACRIM-SP – Ap. – Rel. Feiez Gattaz – RT 724/686)
 
“Reconhece-se o estado de necessidade na conduta do agente que, sem possuir habilitação para dirigir veículo, toma a direção de automotor para levar o filho que estava acometido de febre ao hospital, pois estão evidentes os pressupostos legais da ocorrência da descriminante, isto é, proporcionalidade entre o bem que quis preservar e o que sacrificou.” (TACRIM – Ap. – Voto Vencido Eduardo Pereira – RJD 21/127)
 
Cabe ao juiz analisar se estavam presentes as circunstancias fáticas ensejadora do estado de necessidade. “Uma vida humana vale mais do que qualquer objeto, mesmo obras de arte ou históricas, e do que a vida de um animal irracional.” Por outro lado, não é razoável exigir atos de heroísmo ou abdicação sobre humana, por exemplo, sacrificar a própria a vida para salvar de terceiro. Nosso ordenamento jurídico não nos exige que sejamos heróis.
 
Assim, existe liberdade tanto para o julgador interpretar a situação concreta bem como consciência coletiva reinante à época dos fatos. Nos fragmentos acima transcritos, observamos que o julgador procura reconhecer o estado de necessidade de acordo com critérios de proporcionalidade. Por exemplo, no segundo fragmento, o agente, ao conduzir o veículo sem habilitação, coloca a coletividade em risco, em situação de perigo, em contrapartida, salva vida de pessoa humana. A proteção à coletividade é sacrificada de modo razoável diante da preservação da vida humana. Não se preocupa em verificar qual o bem que possui mais valor, mas simplesmente se foi razoável o sacrifício diante do perigo.
 
3. Requisitos:
 
São apenas dois, dos quais decorrem características: 1º) situação de perigo (o perigo deve ser atual e iminente, o perigo deve ameaçar direito próprio ou alheio, o perigo não pode ter sido causado voluntariamente pelo agente, deve inexistir dever legal de enfrentar o perigo) e 2º) Conduta Lesiva(inevitabilidade do comportamento, razoabilidade do sacrifício, conhecimento da situação justificante)
 
1º) Situação de Perigo
 
a) Perigo atual e iminente – É mister, antes de tudo, para caracterização do estado de necessidade, que o agente esteja diante de uma situação de perigo real e efetivo.
 
Tratar-se de perigo atual significa verificar ameaça no exato momento em que o agente sacrifica o bem jurídico.
 
A lei não apresenta a terminologia “perigo atual e iminente”, mas isto se deve ao fato de a situação de perigo já configurar, em sim mesma, uma iminência.
 
Analise o fragmento jurisprudencial abaixo transcrito:
 
“Estado de necessidade comprovado. Se alguns anos depois de constituída, a empresa encontra dificuldades financeiras, provocada pela crise econômica por que passa o país, para se manter, o que é demonstrado com a venda de seus bens patrimoniais e de seus sócios para fazer face aos seus débitos, preferindo pagar o salário dos empregados a deixar de recolher a contribuição previdenciária, há de se reconhecer o estado de necessidade, por ela não provocado. Exclusão da Ilicitude.”(TRF 1ª Região – Ap. Rel. Tourinho Neto – j. 17.02.1998 – RTJE 166/341)
 
O fragmento jurisprudencial é nítido quanto à necessidade atual de pagar os funcionários em detrimento do recolhimento de contribuições previdenciárias. Tanto o salário como a contribuição previdenciária estavam ameaçados pela crise econômica e, diante dos critérios da razoabilidade, a empresa entendeu que o salário, em razão de seu caráter alimentar (subsistência) deveria prevalecer em relação ao adimplemento diante do fisco e, dessa forma, optou-se pelo pagamento de salário.
 
A tese é bastante interessante, já que retira a ilicitude do não recolhimento das contribuições previdenciárias, no caso, até mesmo, impossibilitando a aplicação de multa.
 
O fragmento não se reporta a esfera penal, mas nos dá sólida noção do perigo atual que deve caracterizar o estado de necessidade.
 
 
Continuando a análise jurisprudencial para fins de exemplificação, observe o fragmento abaixo:
 
 
“Falta de habilitação para dirigir veículo em via pública – réu que toma veículo emprestado para dirigir-se a hospital onde sua esposa estava em processo de parto – paciente de organismo fraco e que não pode tomar determinados remédios – Informações de ser passadas aos responsáveis pelo parto – estado de necessidade caracterizado – absolvição mantida pela ocorrência desta hipótese” (TACRIM –SP – Ap. – Rel. René Ricupero – RT 725/593)
 
 
Temos caracterizada situação de perigo atual: pessoa de organismo frágil em processo de parto e conflito de bens: saúde humana e segurança social.
 
 
Outrossim, não estaria caracterizado o estado de necessidade, caso o perigo não fosse atual, como é o caso do sujeitoque porta indevidamente arma de fogo há muito tempo, sob alegação de garantia da segurança. Não é estado de necessidade, pois o perigo, no caso é futuro. Observe os fragmentos jurisprudenciais transcritos:
 
 
“Porte de arma – Contravenção caracterizada – Estado de necessidade – O estado de necessidade socorre aquele que, em determinadas circunstancias pratica um ilícito penal ou contravencional. Não pode, entretanto alegar estado de necessidade pessoa que viola norma contravencional há muito tempo e não se preocupa em regularizar sua situação perante as autoridades constituídas” (TACRIM – SP – AC. – Rel. Almeidas Braga – RTJE 99/259)
 
 
Portanto, o reconhecimento do estado de necessidade requer a ocorrência de perigo atual, que legitima a conduta do agente, e não um perigo em abstrato.
 
b) o perigo deve ameaçar direito próprio ou alheio – O estado de necessidade pressupõe sempre um conflito de interesses de bens lícitos, ou seja, conflito de interesse de qualquer bem que não contrarie o ordenamento legal, como a vida, a liberdade, o patrimônio etc. “É imprescindível que o bem esteja sob a tutela do ordenamento jurídico, do contrário não haverá direito a ser protegido. Exemplo: o condenado à morte não poderá alegar estado de necessidade contra o carrasco no momento da execução”.
 
Como já foi analisado nos fragmentos jurisprudenciais anteriores, a lei prevê o estado de necessidade para salvar bem de terceiro. Contudo, para tanto, o agente não precisa permitir a permissão do terceiro prejudicado. Suponha que um médico, sem autorização do paciente, realiza cirurgia para salvar a vida do mesmo. É hipótese de estado de necessidade, já que o médico lesionou a integridade física do sujeito para salvar sua vida, diante de uma situação de perigo atual. Lembrar que, em se tratando de exercício regular de direito, seria imprescindível o consentimento da vítima, como será visto adiante.
 
c) o perigo não pode ter sido causado voluntariamente pelo agente – Ou seja, supondo que “A” provoque incêndio em estabelecimento, colocando em perigo atual a vida das pessoas nele presentes, estas estarão amparadas pelo estado de necessidade, caso venham a se agredir para salvar a própria vida, por exemplo. No entanto, em principio, entende-se que “A” não esta amparado pela excludente da ilicitude, já que provocou a situação de perigo.
 
“Não caracteriza a excludente de criminalidade do estado de necessidade a coduta de acampados “sem terra” que subtraem carga de caminhão contendo gêneros alimentícios e produtos de limpeza e higiene pois os próprios agentes, voluntariamente criara a situação de necessidade eis que cientes de que faltariam alimentos para o sustento do grupo.”(TJMS – Ap. – j. 22.09.1999 – Rel Rubens Bergonzi Bossay – RT 773/637)
 
José Frederico Marques in Tratado de Direito Penal, Bookseller, 1997, exemplifica: “O motorista imprudente que conduz seu carro em velocidade excessiva não poderá invocar estado de necessidade se, ao surgir à sua frente, num cruzamento, outro veículo, manobrar o carro para lado oposto e apanhar um pedestre. O perigo criado pela marcha que imprimia ao carro, resultou de sua vontade ...”
 
No entanto, a doutrina não é pacifica quanto ao assunto, isto porque o Professor Damásio de Jesus entende que somente o perigo causado de forma dolosa não pode ser beneficiado pelo estado de necessidade. Para elucidar esta segunda posição utilizaremos do exemplo acima exposto. “A” joga fora o cigarro que fumava e, por um descuido, falta de dever de cuidado (culpa), o fogo do cigarro provoca um incêndio. Para o Professor Damásio de Jesus, a ilicitude de “A” esta excluída, não respondendo seja pelo crime de incêndio, seja por qualquer outro dano causado em razão de sua imprudência.
 
Resumindo, a respeito da impossibilidade de alegação de estado de necessidade quando o perigo é causado pelo próprio agente, concluímos que há duas posições a respeito do assunto:
 
1ª posição – se o perigo foi causado pelo próprio agente, não se reconhece a excludente da ilicitude de estado de necessidade, seja doloso ou culposo. (Prof. Damásio de Jeus)
 
2ª posição – se o perigo foi causado pelo próprio agente de forma culposa, o estado de necessidade poderá ser reconhecido como excludente de ilicitude. (Assis de Toledo, Nelson Hungria, José Frederico Marques)
 
d) Inexistência do dever legal de enfrentar o perigo – Não pode invocar o estado de necessidade aquele que tem o dever legal de arrostar o perigo. A expressão dever legal é controvertida para os doutrinadores, uns entendem que se refere somente às hipóteses legais, outros interpretam com amplitude maior.
 
De qualquer sorte, quando a lei impuser dever legal, estará obrigado a salvar o bem ameaçado sem destruir qualquer outro, mesmo que para isso tenha que correr risco inerentes à sua função.
 
Mesmo assim, quando for nítida a inutilidade do salvamento, o que inutilizaria o risco, a pessoa detentora do dever legal poderá recusar a cumpri-lo ... “ ... de nada adianta o bombeiro atirar-se nas correntezas de uma enchente para tentar salvar uma pessoa quando é evidente que, ao fazê-lo, morrerá sem atingir seu intento ...”
 
Vale relembrar que o Código Penal no parágrafo 2º do artigo 13, apresenta hipóteses relacionadas ao dever legal de agir, cujo descumprimento enseja a responsabilidade pelo resultado.
 
2ª) Conduta Lesiva
 
a) Inevitabilidade do comportamento – é requisito indispensável, pois diferentemente da legítima defesa, o estado de necessidade não consiste na repulsa a uma agressão, mas sacrifício de um dos bens que estãoem perigo.  Comenta o professor Fernando Capez “se a fuga for possível, será preferível ao sacrifício do bem, pois aqui, ao contrário da legítima defesa, o agente não esta sofrendo uma agressão injusta, mas tentando afastar uma ameaça de bem jurídico”.
 
Do mesmo modo, para evitar o excesso na conduta de estado de necessidade é essencial que a prática de delito menos grave prevaleça em relação à prática de delito mais grave.
 
Observe o fragmento jurisprudencial para fins de exemplificação do item:
 
“Motorista de ambulância que dispondo de outras opções, com culpa em grau acima da média, em momento crepuscular, sob chuva, adentra em contramão, em velocidade, provocando a colisão do veículo contra carro, de forma a destroçá-lo e a produzir a morte de pessoas – o estado de necessidade emana do conceito jurídico que não pode atingir elastério tal para encobrir condutas iníquas de indivíduos carentes de desequilíbrio, auto-controle emocional e precipitados a tal ponto que perpetrem desatinos exculpação, de todo descabida. Somente verte aceitável o estado de necessidade na existência de alternativa razoável capaz de evitar infortúnio maior. Apenas se materializa quando for o único meio presente no momento apto a conjurar o inesperado, dotado este de ingrediente lesivo imediato.” (TARS – Rel. Luiz Gonzaga Pila Hofmeister – JRARS 73/32)
 
 
O estado de necessidade para justificar uma ação típica deve ser da mais alta gravidade, sendo imperioso, ainda, a necessidade imprescindível do agente para salvar o bem. A jurisprudência também nos apresenta hipótese do sujeito que passa a desenvolver atividade criminosa alegando dificuldades financeiras. Contudo, a ação criminosa deve ser a última saída para salvaguardar o bem “subsistência” a que o exemplo se refere. Entende-se que existem vários outros modos de garantir a subsistência diferentes do crime e, portanto, a hipótese não se trataria de estado de necessidade.
 
 
Para aqueles que a lei impõe o dever legal a inevitabilidade possui significado mais abrangente, já que considera que o sacrifício só será inevitável na medida em que, mesmo correndo risco pessoal, será impossível a preservação do bem.
 
b) Razoabilidade do sacrifício – Adota-se a teoria unitária, já que a lei dispõe que o sacrifício deverá ser razoável, isto é, verifica-se se era ou não razoável exigir o sacrifício do direito ameaçado que foi preservado pela conduta típica. Essa razoabilidadedeve ser verificada nas circunstancias de fato, sendo relevante a confrontação entre o bem jurídico em perigo e o bem jurídico lesado.
 
A respeito da razoabilidade do sacrifício, analisamos com maiores detalhes no item “Teorias”.
 
c) Conhecimento da situação justificante – A excludente do estado de necessidade não pode ser analisada somente sob enfoque objetivo. Isto significa que, além da verificação dos pressupostos objetivos, é mister, para sua caracterização, que se analise o elemento objetivo da justificação, ou melhor, a opinião ou crença do agente no momento em que atua em situação de necessidade.
 
O agente DEVE atuar PARA SALVAR O BEM AMEAÇADO, ou seja, deve ter consciência da situação de perigo e agir para evitar lesão. A inexistência desse requisito faz desaparecer o estado de necessidade, sendo a ação antijurídica.
 
Assim, não age em estado de necessidade quem furta um medicamento raro e valioso para fins puramente lucrativos e, ao chegar em casa, o subministra a seu cônjuge que, nesse intervalo, havia contraído uma enfermidade delicada, só suscetível de regressão por esse meio ao qual o delinqüente não poderia recorrer em outras circunstancias, dada a exigibilidade de seus recursos.
 
Se na mente do agente cometia um crime, ou seja, se a sua vontade não era salvar alguém mas provocar um mal, inexiste estado de necessidade, mesmo que, por uma incrível coincidência, a ação danosa acabe por salvar um bem jurídico.
 
4. Formas de Estado de Necessidade
 
A doutrina nos apresenta três critérios quanto a forma pela qual o estado de necessidade é demonstrado:
 
a) quanto à titularidade do bem protegido:
 
a.1 – próprio – quando o bem jurídico próprio é defendido. Ex: “tabua da salvação – naufragos”
a.2 – de terceiro – quando o bem jurídico pertencente a terceiro é protegido. Ex: o marido para salvar a esposa, dirige veículo, mesmo sem habilitação, para levá-la ao hospital.
 
b) quanto ao aspecto subjetivo do agente:
 
b.1 – real – a situação de perigo existe
b.2 – putativa – a situação de perigo é imaginária (nesse caso, é necessário nos reportar à aula de “erro de tipo” , a existência ou não do crime estará condicionada na inevitabilidade do erro)
 
c) quanto ao terceiro que sofre a ofensa:
 
c.1- defensivo – a agressão dirigi-se contra o provocador dos fatos. Ex: náufragos – tabua da salvação, onde um tenta matar o outro para sobreviver.
c.2 -  agressivo – o agente destrói bem pertencente a terceiro inocente. Observe abaixo situação prática e real interessantíssima em que se verifica a existência do estado de necessidade agressivo:
 
“Se o agente, ferido a faca no peito e com sangramento preocupante – sem ter ninguém a lhe prestar socorro – utiliza-se do próprio veículo em busca de assistência médica, age, justificadamente, sob estado de necessidade, não lhe sendo de imputar culpa por atropelamento, devido à imprudência (excesso de velocidade) ou imperícia (desgoverno do conduzido), máxime em virtude de sofrer perda dos sentidos no momento do acidente. E, se sacrificar o próprio semelhante pode não ser moral, certamente é jurídico, pois o Direito não pode desconhecer o instinto da conservação.” (TACRIM – SP – AC – Rel. Gonçalves Nogueira – JUTACRIM 96/156)
 
No exemplo prático contido na jurisprudência transcrita temos que a integridade física de terceiro foi sacrificada para salvar a vida do agente. Houve agressão a bem de terceiro para salvar outro, seguindo os critérios da razoabilidade.
 
 
Observações Finais:
 
Para fins de complementação é interessante realizar a abordagem de três outras situações bastante comentadas no estudo do “estado de necessidade”, senão vejamos:
 
a) Crimes Habituais e permanentes -  Em regra, não se admite, em razão da ausência de atualidade no perigo. Observe os julgados abaixo:
 
“Jogo do bicho – Alegado estado de necessidade – a alegação consistente em ter o agente agido em estado de necessidade não encontra amparo no direito, posto não ser esta justificativa compatível com as infrações de caráter permanente.” (TACRIM – SP – AC – Rel. Jacobina Rabello – JUTACRIM 82/467)
 
Contudo, analise o julgado abaixo:
 
“O reconhecimento do estado de necessidade para quem exercita ilegalmente a arte dentária na zona rural é admissível quando não há profissional habilitado em região afastada dos grandes centros.” (TAMG – HC – Rel. Gudesteu Bíber – RTAMG 26-27/526  e RT 623/348)
 
Note-se que a jurisprudência e, acrescente-se que, também a doutrina admitem o estado de necessidade mesmo em crimes habituais e permanentes em casos extremos, como o de um particular que exerce ilegalmente a medicina em uma ilha onde não há profissional habilitado tampouco ligação com mundo externo.
 
b) estado de necessidade e dificuldades econômicas – a maior parte da jurisprudência não admite a mera alegação de miserabilidade do agente como causas excludentes da ilicitude. Somente, em se tratando de furto famélico, se comprovada a necessidade emergencial do furto de alimento para saciar, urgentemente, a fome do agente, é, em regra, aceita a excludente da ilicitude consistente no estado de necessidade.
 
“O fato do autor do delito estar passando por dificuldades, situação da maioria dos brasileiros, não permite o reconhecimento do estado de necessidade, pois, para sua caracterização, não basta invocar os problemas dos dias em que vivemos, caso contrário, estar-se-ia legalizando a conduta dos marginais que, por não exercerem profissão que lhes garanta a subsistência, atacam o patrimônio alheio.” (TACRIM – SP – Ap. – Rel. Eduardo Goulart – j. 28.05.1998 – RJTAcrim 39/130)
LEGÍTIMA DEFESA
 
1. Introdução e conceito
 
Trata-se de excludente da ilicitude, portanto, quando presente, descaracteriza o crime, que consiste em repelir injusta agressão, atual ou iminente, a direito próprio ou alheio, usando moderadamente dos meios adequados, nos termos do Artigo 25, do CP in fine:
 
Art. 25. Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem.
 
A ordem jurídica visa à proteção dos bens juridicamente tutelados. E não só punir agressões, mas preveni-la. Quem defende, seja embora, violentamente, o bem próprio ou alheio injustamente atacado, não só atua dentro da ordem jurídica, mas em defesa desta mesma ordem. Atua segundo a vontade do Direito. O seu ato é perfeitamente legítimo e, portanto, não há crime.
 
Não se põe direito contra direito, como seria o caso do estado de necessidade, mas direito contra ilícito.
 
“Constituindo a legítima defesa, no sistema jurídico penal vigente, uma causa de exclusão da antijuridicidade, tem-se que quem defende, embora violentamente, o bem próprio ou alheio, injustamente atacado, não só atua dentro da ordem jurídica, mas em defesa da mesma ordem. E que na legítima defesa não é poder publico, que confere ao agente a faculdade de repelir a violência pela violência, visto que tal atitude consitiui um direito primário do cidadão.” (TACRIM – SP – Ac. – Rel. Ferreira Leite – RT 441/405)
 
Não há uma situação de perigo pondo em conflito um ou mais bens, na qual um deles deverá ser sacrificado. Ao contrário, ocorre efetivo ataque ilícito contra o agente ou terceiro, legitimando a repulsa.
 
A legítima defesa esta amparada na denominada teoria objetiva, que a considera direito primário do homem o direito de se defender de uma agressão, já que o Estado não tem condições de oferecer proteção aos cidadãos em todos os lugares e momentos, logo, permite, que se defendam quando não houver outro meio.
 
2. Requisitos:
 
A legítima defesa apresenta os seguintes requisitos:
 
a) agressão injusta;
b) atual ou iminente;
c) a direito próprio ou de terceiro;
d) repulsa com meios necessários;
e) uso moderado de tais meios;
f) conhecimento de situação justificante
 
Vamos analisar cada um dos requisitos:
 
a) Agressão injusta – Injusta é a agressão ilícita e antijurídica. Um ato lícito pode ser até uma agressão,em certos casos (ex. penhora de bens), mas não será uma agressão ilícita. Por outro lado, não se exige que a agressão injusta (ilícita e antijurídica) seja necessariamente um crime. A legítima defesa pode ser exercida para proteção da posse, nos termos do Código Civil (art. 1210, parag. 1º), mesmo quando a ação agressiva não caracterize o crime de esbulho possessório previsto no artigo 161, II, do Código Penal.
 
Ainda, em se tratando de injustiça da agressão deve ser aferida de forma objetiva, independentemente da capacidade do agente. Assim, inimputável (ébrios habituais, doentes mentais, menores de 18 anos) pode sofrer repulsa acobertada pela legítima defesa.
 
Observe o julgado abaixo:
 
“A legítima defesa alegada pelo autor de crime de roubo não vinga, constituindo verdadeiro paradoxo, uma vez que o ladrão, ao praticar o delito patrimonial, não pratica ação legítima, sendo que o próprio criminoso, elide, por si mesmo, a excludente da antijuridicidade” (TACRIM – SP – Ap. – Rel. Leonel Ferreira – RJD 24/149)
 
No fragmento temos autor de roubo, alegando legítima defesa em relação à agressão da vítima, porém a ação do próprio autor do roubo é injusta o que torna legítima a ação da vítima.
 
Aspecto bastante importante é que a agressão deve ser AGRESSÃO HUMANA. Para efeitos de reconhecimento da legítima defesa, somente as pessoas humanas praticam agressão. No entanto, esclareça-se que “se uma pessoa açula um animal para que avance em outra, nesse caso, existe uma agressão não autorizada da legítima defesa, pois o irracional esta sendo utilizado como instrumento do crime (poderia usar uma arma de fogo, uma faca, mas preferiu fazer com o animal)”.
 
 
Em relação à caracterização da provocação do agente como sendo legítima defesa, isto dependerá de cada caso concreto, por exemplo, se o fato constituir em injúria grave, isto pode caracterizar agressão injusta havendo autorização para que o agredido se defenda legitimadamente. Contudo, se a provocação constituir uma mera brincadeira de mau gosto, não passar de um desafio, geralmente tolerado no meio social, a legítima defesa não estará autorizada.
 
Em se tratando de legítima defesa contra provocação do agente, também, é importante observar o requisito moderação, pois não pode invocar legítima defesa aquela que mata ou agride fisicamente quem apenas lhe provocou com palavras.
 
Assim temos que:
 
“Aquele que provoca os fatos não pode alegar em seu favor a legítima defesa.” (TJMG – Ap. Kelsen Carneiro – j. 06.04.1999 – JM 148/273)
 
“A legítima defesa não ampara o provocador dos fatos” (TAPR – Ac. Rel. Costa Lima – RT 53/258)
 
“Quem provoca e desafia não pode ser considerado como estando em legítima defesa. Esta pressupõe revide a agressão injusta, o que não ocorre se houver desafio inicial do agressor” (RT 572/340)
 
Ocorre que aquele que provoca os fatos, a agressão injusta, pode ser alvo de reação excessiva advinda da pessoa que, em principio, foi agredida. E, neste caso, para avaliar a existência ou não de legítima defesa procura-se medir o excesso, que será tratado adiante
 
O desafio, duelo, convite para briga não caracteriza legítima defesa, existindo, assim, responsabilidade penal pelos atos praticados. Analise os fragmentos jurisprudenciais abaixo:
 
 
“A aceitação do desafio não é atitude de defesa, pois o desafio não cria a necessidade irremovível de delinqüir.” (TACRIM-SP – Ac. Rel. Adauto Suannes – RT 576/396)
 
“Se alguém provocado ou ameaçado, vai ao encontro de seu inimigo e o afronta, não há duvidas de que nem um nem outro pode invocar a necessidade da defesa, portanto, o ataque à pessoa, que invoca a sua justificação: eles o quiseram. É assim que no duelo, de qualquer modo ele seja, não se pode falar em legítima defesa porque ambos adversários se colocam conscientemente nas condições recíprocas de ofensa e defesa.”(TJSP – Ac. – Rel. Hoeppner Dutra – RT 442/371)
 
 
Por fim, aspecto bastante relevante, em se tratando, ainda, da agressão é o chamado “comodus dicessus”, apresentado de forma diferente na legítima defesa se comparado ao estado de necessidade. Como vimos, em se tratando de estado de necessidade, o sacrifício do bem, embora seja a saída mais cômoda para o agente, deve ser realizado somente quando inevitável. No caso da legítima defesa, contudo, em que o agente sofre ou presencia uma agressão humana a solução é diversa. A lei não obriga a covardia, caso contrário, a vítima da agressão estaria obrigada a optar pelo comodismo da fuga a se defender.
 
 
                                                           a.1) Hipóteses de cabimento de legítima defesa
  
 
(i) legítima defesa contra agressão acobertada por qualquer outra causa de exclusão de culpabilidade –  Se o agressor for pessoa completamente embriagada de forma acidental, o ofendido pode reagir, em legítima defesa.
 
(ii) legítima defesa contra legítima defesa putativa – Nesse caso, em primeiro lugar,  temos que levar em consideração a hipótese de sujeito que pensa que esta em legítima defesa e agride. No entanto, o agredido não estava prestes a agredir o mencionado sujeito e, em razão da agressão deste último, age em legítima defesa.
 
Temos, ainda, que remontar o conceito de “putativo”. A expressão putativa equivale a imaginário.
 
Assim, melhor compreendendo a situação exposta, suponha que “A” estava passeando tranquilamente, quando avistou uma pessoa de má índole, inclusive, que já tinha lhe assaltado. “A” observa que a dita pessoa não lhe encarava e, repentinamente, a pessoa dirigiu a mão para o bolso da calça. Nesse momento “A” imaginou que a pessoa iria lhe agredir e reagiu contra a suposta agressão.
 
A solução para o exemplo é dada na aula de erro de tipo, o reconhecimento da legítima defesa esta condicionado a evitabilidade do erro de pensamento que “A” apresentou.
 
(iii) legitima defesa putativa x legitima defesa putativa – é situação extremamente teórica e a doutrina nos traz o exemplo de dois neuróticos inimigos que se encontram. Um pensa que será atacado pelo outro, mas, na verdade, nenhum iria agredir, caso não fosse agredido.
 
Na prática é muito difícil constatar a situação
 
(iii) legítima defesa real contra legítima defesa subjetiva – para discutir a respeito da situação é ideal partir de exemplo.
 
Suponha que “A” é agredido por “B”. “A”, portanto, inicia sua defesa. Contudo, quando esta já estiver dominando “B”, “A” continua a agredir “B”,excessivamente, sem consciência, sem vontade de exceder sua defesa.
 
Mas, nesse estágio, “A” não é mais ofendido, mas ofensor de “B” e aí é permitida B poderá agir em legítima defesa real contra “A”.
 
Evidentemente que a situação é puramente teórica, pois, na prática, aquele que deu causa aos acontecimentos jamais poderá invocar a legítima defesa, mesmo contra o excesso, cabendo-lhe dominar a outra parte, sem provocar-lhe qualquer outro dano. “É o caso, por exemplo, de um estuprador que, levando a pior começa a ser esfaqueado pela vítima.” Não seria razoável aceitar que para se defender das facadas desferidas em excesso pudesse matar a vítima, que há pouco agrediu, gravemente, o máximo que poderá fazer é desarmá-la, caso contrário responderá pelo mal causado.
 
(iv) legítima defesa putativa contra legítima defesa real – Tenho, por hábito, abordar esse tema em sala de aula e repito a doutrina, esse caso é constatado em se tratando de legítima defesa de terceiro.
 
Trata-se de quando “A” presencia um grande amigo sendo agredido por estranho. “A”, portanto, ciente da reputação ilibada de seu grande amigo, desfere agressões contra o estranho para defender seu amigo.
 
Contudo, ao final, descobre-se que o amigo de “A”, na verdade, era o agressor.
 
A solução para esse caso esta condicionada, também, a evitabilidade do erro de “A”. Se evitável (vencível), inexiste legítima defesa, havendo responsabilidade por culpa, se inevitável (invencível) não há crime.
 
 
(v) legítima defesa real contra legítima defesa culposa – A doutrina entende que ocorrea situação também quando há confusão mental na cabeça do agente que age em legítima defesa culposa. A dita confusão mental decorre da falta do dever de cuidado apresentada pelo agente.
 
Por exemplo, “A”, confundindo “B” com seu desafeto, sem qualquer cuidado de certificar-se disso, efetua disparos contra “B”. Há agressão injusta em relação a “B” e, portanto, cabe-lhe legítima defesa.
 
Muitos doutrinadores não reconhecem essa discussão, pois parece lógica. Afinal, a reação contra agressão injusta de “A” caberia de qualquer modo.
 
Observação Importante!!!! *
 
Boa parte da doutrina entende que em se tratando de:
 
- legítima defesa real contra legítima defesa real
- legítima defesa real contra estado de necessidade
- legítima defesa real contra estrito cumprimento do dever legal.
- legítima defesa real contra exercício regular de direito
 
não há cabimento de legítima defesa, diante da inexistência de agressão injusta.
 
b) Agressão atual ou iminente - Atual é o que esta correndo. Iminente é o que esta para acontecer. Para a legitima defesa ser admitida, a repulsa deve ser imediata, isto é, logo após ou durante a agressão atual.
 
Observe as jurisprudências que exemplificam situações de iminência:
 
“Acusado surpreendido com a amante de outro homem e vê-se na iminência de ser agredido – circunstancias subjetivas e objetivas que patenteiam a realidade da justificativa” (TJSP – Ac. Marino Falcão – RTJSP 86/366)
 
 
“Age em legítima defesa quem, na iminência de ser agredido a faca pela vítima, pessoa belicosa e de comportamento temível, nela desfere tiros de revolver, matando-a” (TJSP – Rec. – Rel. Camargo Sampaio – RT 529/332)
 
 
Em se tratando de crime permanente a defesa é possível em qualquer tempo, uma vez que a conduta se protrai no tempo, renovando-se a todo instante.
 
Não é possível se falar em legítima defesa contra agressão futura, por exemplo, o sujeito que ameaça que um dia irá matar. A pretensa vítima não pode iniciar a agressão alvejando o sujeito, pela simples crença de um dia ele a iria matar. Da mesma forma,  não é possível legítima defesa contra agressão passada (que já cessou), pois seria a legitimação da vingança, bem como abertura intolerável no monopólio da violência do Estado. Observe o caso abordado na jurisprudência abaixo:
 
Provocação para agredir – TACRSP “Não há que se falar na excludente da legítima defesa quando o agente se dirige ao ofendido de maneira afrontante, chamando-o à rua para brigar e, na saída deste à via pública, com injustificada atitude impulsiva e desproporcionada por aquele tomada, utiliza-se de arma de fogo no momento trazida consigo” (JATARIM 63/335)
 
Observe que não há instantaniedade entre o momento da agressão e o da repulsa, tampouco eminência, daí, o porque a situação acima não foi considerada como sendo amparada pela excludente de legítima defesa.
 
A legítima defesa pode ser aplicada tanto para proteção de direito próprio (legitima defesa própria) como para proteção de direito alheio (legítima defesa de terceiro). Desde que presente a proporcionalidade entre a lesão e a repulsa qualquer direito, ou seja, qualquer bem tutelado pelo ordenamento jurídico pode ser defendido pelo instituto da legítima defesa.
 
Há exemplo doutrinário bastante interessante no que se refere à legítima defesa de terceiro, em que se permite que a conduta pode se dirigir contra o próprio terceiro ofendido, ou melhor, em que a repulsa pode se dirigir contra o próprio terceiro ofendido, por exemplo alguém bate no suicida para impedir que ponha em risco a própria vida. A jurisprudência abaixo aponta caso relativo à legítima defesa de terceiro, senão veja-se:
 
“Age em legítima defesa de terceiro quem se vê na contingência de eliminar o próprio pai, ébrio habitual, em socorro da mãe, por ele agredida” (TJSP – Rec – Rel. Álvaro Curi – RT 581/293)
 
 
c) Meios necessários - Na reação, o agente deve utilizar moderadamente dos meios necessários para repelir agressão atual, iminente e injusta. Tem –se entendido que meios necessários são os que causam menor dano indispensável à defesa do direito, são os meios menos lesivos colocados à disposição do agente no momento em que sofre a agressão.
 
Há discussão doutrinária a respeito da relação entre o meio necessário e a forma em que o meio é empregado, mas neste trabalho não estou entrando no mérito disto neste trabalho.
 
“Não há que se falar em legítima defesa se, após ouvir palavrão e ser ameaçado com um tapa, o acusado saca de revolver e sai em perseguição da vítima, baleando-a pelas costas. A justificativa da legítima defesa exige que a agressão, além de atual ou iminente, seja repelida moderadamente, com o uso dos meios necessários. A só exibição da arma já foi suficiente para que o pretenso agressor se pusesse em fuga” (TACRIM-SP – Ac – Rel. Marrey Neto – Jutacrim 94/280)
 
“Havendo possibilidade de reação imediata incumbe ao ofendido rechaçar a agressão injusta, com os meios de que dispuser para neutralizar a atuação criminosa.” (TJSP – Rec. 103.103-3/2 – Relator Renato Naline)
 
“Na legítima defesa não pode o réu usar de meios ou formas que possam dificultar a defesa da vítima. Ao descarregar a arma de fogo (seis tiros) nas costas da mesma, como descrito no laudo de exame cadavérico, traz para seu ato as qualificadoras do art. 121, parágrafo 2º, do CP. Inaceitável o argumento de legítima defesa” (TJES – Ap – Rel. José Cupertino Leite de Almeida – RT 708/335)
 
O ordenamento jurídico não poderia permitir a reação desenfreada e os limites se iniciam com a escolha dos meios, que devem ser compatíveis com o necessário para conter a agressão. Evidentemente que a suficiência deve ser ponderada com as circunstancias, não se exigindo frieza ou precisão na escolha, bastando que seja razoável.
 
Há quem estabelece análise do uso moderado fora do tópico dos meios necessários, de qualquer sorte, os dois requisitos estão ligados. É também requisito para reconhecimento da legitima defesa o uso moderado dos meios necessários. Mais uma vez é importante salientar que a moderação será analisada diante da razoabilidade, não sendo necessário extrema precisão.
 
TJSP: “A legítima defesa é uma reação humana. Não se pode medi-la com um transferidor milimetricamente. Há situações de fato que forçam o agredido a se defender, mesmo por compreensível excesso” (RT 549/312)
 
Observe-se que os requisitos meios necessários e uso moderado destes variam de acordo com o caso concreto. Há doutrinadores que são taxativos e afirmam que o número reiterado de golpes retira a moderação da repulsa, mas devo frisar ao aluno que isto não é regra absoluta, tudo dependerá do desenvolvimento apresentado pelo caso, para exemplificar, observe as jurisprudências abaixo:
 
“O número de facadas desferidas pelo réu na vítima, matando-a já de si é fator que afasta a legítima defesa por ele invocada, pois revela fúria agressiva”(TJSP – Rel. Mendes França – RT 409/129)
 
Em contrapartida, analise a jurisprudência abaixo:
 
“Não elide a figura da legítima defesa própria a circunstancia de ter o réu desfechado cinco tiros na vítima, se esta, mesmo após o último disparo, continuou a agressão, pondo em risco a vida do acusado.” (TJSC – Rec.- Rel. Marcílio Medeiros – RT 406/277)
 
No último caso, os golpes reiterados para fins de repulsa à agressão da vítima não descaracterizaram a legítima defesa, por isso, que as afirmações realizadas por algumas doutrinas devem ser lidas com cautelas, em especial, pelos alunos que pretendem realizar exames na área jurídica.
 
A imoderação da repulsa enseja o excesso , que será analisado adiante.
 
d) Conhecimento da situação justificante – Assim como no estado de necessidade o agente deve conhecer a situação justificante. Se, na sua mente, ele queria cometer um crime e não se defender, ainda que por coincidência, o seu ataque acaba sendo uma defesa, o fato será ilícito.
 
TJBA: “A legítima defesa somente justifica as ações defensivas necessárias para afastar uma agressãoantijurídica de forma menos lesiva possível para o agressor. A necessidade deve ser considerada de acordo”
 
Inexistiria legítima defesa, por exemplo, o sujeito atirar em um ladrão que esta a porta de sua casa, supondo tratar-se do agente policial que vai cumprir o mandato de prisão expedido contra autor do disparo.
 
Observação Importante!!!! Quanto à inevitabilidade da agressão (commodus discessus) a lei brasileira, diferentemente da italiana, não exige a obrigatoriedade de evitar a agressão. No texto da legítima defesa não há menção, tal como ocorre no estado de necessidade, da expressão “nem podia de outro meio evitar”, de sorte que o agente sempre poderá exercitar a legítima defesa quando for agredido .
 
A lei brasileira não obriga alguém, “... sabendo que um desafeto o espera para agredi-lo, dê uma volta no quarteirão para ingressar em casa por outra entrada.”. Essa regra sofre atenuação quando se trata de crianças, jovens imaturos, doentes mentais, agentes que atuam em estado de erro etc., casos estes em que as agressões devem ser evitadas, desviadas, salvo quando consistem na única forma de defesa dos interesses legítimos.
 
3. Excesso
 
Ainda que a figura do excesso possa ser investigada em relação a todas descriminantes, vale o estudo, desde já, na legítima defesa, sendo questão de simples adaptação a aplicação à outras hipóteses. A escolha é feita, ainda, pela consagração do instituto na legítima defesa, que com maior incidência é comentada e questionada.
 
O excesso pode ser:
 
a) Doloso ou consciente,
b) Culposo ou inconsciente e
c) Exculpante
 
a) Excesso doloso consciente – o que reage extrapola os limites da legitima defesa propositadamente, sabendo que usa de meios ou modos mais lesivos que o necessário ou razoável para afastar a agressão. É o caso do sujeito que fere com faca o agressor e, mesmo percebendo que este esta fora de combate, aproveita a situação de persistir na agressão e eliminar o inimigo.
 
Conseqüência: a partir do momento em que há o excesso, o sujeito responde normalmente pelo crime, ou seja, no caso referido, a partir do segundo golpe de faca o sujeito seria punido como se não houvesse, em principio, legítima defesa.
 
b) Excesso Culposo ou inconsciente – a desnecessária lesividade dos meios ou modos é resultado de uma grave cautela na apreciação das circunstancias, ou seja, aquele que reage não toma as mínimas cautelas necessárias acerca da continuidade da agressão, de sua força, e do que seria necessário para afastá-la.
 
Conseqüência: A partir do momento em que a reação deixar de ser razoável, será punido pela lesão na forma culposa.
 
c) Excesso exculpante – Há excesso, ou seja, imoderação na realização, mas é fruto da compreensível falibilidade humana. É o caso da vítima que apavorada com a presença de seu agressor sobre seu corpo, dispara arma de fogo uma vez. Sentindo, ainda, o peso sobre seu corpo e as mãos em seu pescoço, não sabe que o agressor já perdeu a consciência e dispara novamente. Ainda que o uso não tenha sido moderado, a falta de moderação não é atribuída a uma grave falta de cautela (não seria razoável que ela perguntasse ao ofensor se continuava agredi-la antes do segundo disparo).
 
O excesso decorre de atitude emocional do agredido, cujo estado interfere em sua reação defensiva, impedindo que tenha condições de balancear adequadamente a repulsa. Trata-se de erro plenamente justificado pelas circunstancias, não deriva nem de dolo nem de culpa, havendo exclusão do fato típico.
 
Conseqüência: Inexistiu dolo (não teve consciência e não teve vontade em relação ao excesso). Inexistiu culpa (não houve falta de dever de cuidado). Não há crime, sendo que esta espécie de excesso é relevante penal.
 
Não há como se apontar de modo genérico quais situações seriam consideradas como sendo excesso doloso, culposo e exculpante, pois tudo dependerá do conjunto probatório que será apresentado no processo crime. De qualquer forma, tanto à acusação como à defesa é interessante conhecer o conceito e a conseqüência de cada espécie de excesso para fins de elaboração das teses abordadas na peças processuais, em especial, porque suas conseqüências são distintas.
 
Analise o quadro mnemônico para seu melhor aprendizado:
 
 
 
                  Doloso ou Consciente – quem reage extrapola os limites, propositadamente
                  Conseqüência – responde pelo resultado na forma dolosa, inclusive.
 
Excesso    Culposo ou Inconsciente – quem reage extrapola os limites, por falta de
                   cuidado
                  Conseqüência – responde pelo resultado na forma culposa  
 
                  Exculpante – quem reage é imoderado por falha humana compreensivel
                  Conseqüência – irrelevante penal, ausência de dolo e culpa. Não há crime.
 
 
 
 
 
Também tratando de excesso, leia os julgados abaixo transcritos:
 
TJRS: “Excesso culposo – a reiteração de golpes desferidos na mesma região do corpo da vítima, produzidos pela parte não laminada de um machado, consoante colhe-se dos depoimentos do acusado e da prova técnica, esta a compor um quadro que não afasta a precipitação desencadeada por atrudimento, emoção, temor, caracterizada pelo excesso culposo”
 
TJCE “Excesso doloso por imoderação de meios – tratando-se de prática de homicídio, o excesivo número de tiros desferidos contra a vítima, sendo um, inclusive, pelas costas, bem como a perseguição empreendida pelo agente ao seu suposto agressor, afastam a configuração da descriminante putativa da legitima defesa, pois inocorrente o uso moderado dos meios necessários  para repelir injusta, atual ou iminente agressão a direito próprio ou de outrem.” (RT 773/622)
 
Novamente, repita-se que a constatação do excesso dependerá da situação concreta, não sendo possível apontar, taxativamente, o que se adequa como sendo excesso e o que não se adequa.
 
4. Espécies de Legitima Defesa
 
Algumas espécies de legítima defesa são, em regra, segundo a maior parte da doutrina:
 
a) legítima defesa sucessiva
b) legitima defesa putativa
c) legitima defesa subjetiva
 
a) Legitima Defesa Sucessiva – é a repulsa ao excesso, aquele que se opõe ao excesso eventualmente constatado em legitima defesa. Suponha, por ex, que “A” agride “B”, que reage. No entanto, a reação é excessiva. Mesmo já tendo afastado a agressão de “A”, “B” persiste nos golpes. A partir do momento em que há excesso, “A” passa a poder agir em legítima defesa ao excesso de “B”, a que se dá o nome de legítima defesa sucessiva. Veja a jurisprudência abaixo:
 
 
TJDF: “Legítima defesa sucessiva (contra excesso) – o seu excesso importa agressão injusta, ensejando sucessiva situação de legítima defesa por parte do agressor inicial.” (RJEDFT 11/145)
 
TJMS: “Legitima defesa sucessiva (contra excesso) – se diante de troca de palavras entre o casal, a vítima excede a justa medida, ofendendo a dignidade do agente, a reação por parte deste se torna legítima, pois contra o excesso voluntário ofensivo deve-se admitir o exercício da defesa” (649/311)
 
b) legítima defesa putativa – supondo o agente, por erro, que esta sendo agredido, e repelindo a suposta agressão configura-se a legítima defesa putativa, considerada na lei como erro de tipo sui generis. Tendo em vista os comentários realizados a respeito do tema, seguem exemplos relacionados ao reconhecimento da legítima defesa putativa nos fragmentos jurisprudenciais abaixo colacionados:
 
 
STJ: “Legítima defesa putativa em suposto furto – Vítima que, ao tentar abrir, por equivoco, porta de carro alheio, induziu o proprietário com auxilio de outrem, a reagir violentamente, supondo tratar-se de furto. Legítima defesa putativa do patrimônio, excludente de dolo, em relação à acusação de lesão corporal. Ausência de resíduo culposo” (RSTJ 47/472)
 
TACRSP: “Na legítima defesa putativa também é indeclinável que o agente se contenha dentro dos limites da reação que seria necessária contra a imaginária agressão.” (JTACRIM 59/171)c) Legitima defesa subjetiva – é aquela derivada do erro de tipo escusável. É aquela em que há excesso exculpante, como foi abordado anteriormente
 
** em se tratando de “aberratio ictus”, isto é, quando o sujeito reage contra agressão injusta e erro na execução (erro de pontaria), reconhece-se a legítima defesa. Isto porque, aplicam-se as regras do próprio art. 73, ou seja, o agente que errou responde como se tivesse acertado a vítima virtual que, no caso da legítima defesa, seria o agressor inicial. Analise a jurisprudência:
 
“Se o agente estava procedendo em legítima defesa e houve erro na execução, nem por isso deixa a justificativa invocada de ser admissível, se comprovada. Em relação ao terceiro atingido haverá mero acidente ou erronia no uso dos meios de execução. E quem diz acidentalidade diz causa independente da vontade do agente.” (TJSP – Rec. – Rel. Adriano Marrey – RT 393/129)
 
 
OBSERVAÇÕES FINAIS !!!!
 
Obs1: Os exames da OAB e as provas de concurso questionam muito a respeito das diferenças existentes entre estado de necessidade e legítima defesa. Portanto, para facilitar seu estudo, vamos seguir o quadro abaixo:
 
 
	 
Estado de Necessidade
	 
Legítima Defesa
	 
1. Conflito de bens jurídicos expostos a perigo
 
2. O perigo pode ou não decorrer de conduta humana.
 
3. A conduta pode ser dirigida contra terceiro inocente
 
4.  A agressão não precisa ser injusta
 
 
	 
1. Repulsa ao ataque
 
2. A agressão praticada só pode ser praticada por pessoa humana.
 
3. A conduta só pode ser dirigida contra terceiro agressor.
 
 
4.  Só existe se a agressão for injusta.
 
ATENÇÃO!!! Conforme as considerações acima abordadas, é válido lembrar que é impossível a coexistência de estado de necessidade com legítima defesa.
 
Obs02: Será elaborada outra apostila com abordagens específicas a respeito da legítima defesa, tais como, legítima defesa da honra, da propriedade, dentre outros assuntos, mas para as avaliações da universidade o conteúdo desta apostila esta completo.
  Estrito Cumprimento do dever legal
 
1. Introdução - conceito
 
Inexiste crime quando o agente pratica o fato no estrito cumprimento do dever legal (inciso III, artigo 23, 1ª parte). É considerado causa excludente da ilicitude. “Quem cumpre um dever legal dentro dos limites impostos pela lei obviamente não pode estar praticando ao mesmo tempo um ilícito penal, a não ser que aja fora daqueles limites”.
 
Para muitos é desnecessária esta previsão, pois quem se atém aos estritos limites da lei, atendendo a seu comando, não poderia estar agindo de forma antijurídica. São exemplos de estrito cumprimento do dever legal o cumprimento do mandado de prisão e remoção bem feita por oficial de justiça (já que, em principio, poderiam ser tipificados como sendo seqüestro e furto, respectivamente).
 
“Crime contra o patrimonio – Dano – Policiais que invadem residência, sem mandado de busca e apreensão – Invasão que se deu para prenderem em flagrante a vítima, por tráfico de entorpecentes – Ato em cumprimento do legítimo dever de ofício – Sentença absolutória mantida – Cuidando-se de agentes da autoridade, tinham eles até mesmo a obrigação de prender a pessoa que se encontrava em flagrante delito. Houve, portanto, exclusão de ilicitude, uma vez que os agentes praticaram o fato em estrito cumprimento de dever legal” (TACRIM –SP – Ap. – Rel. Penteado Navarro – RT 720/463)
 
“Estrito cumprimento do dever legal – descaracterização – se o comportamento da vítima não ataca a ordem social, a ação de policial militar que a agride e prende é ilegítima, não caracterizando o regular exercício de suas funções ou o estrito cumprimento do dever legal.” (TACRIM-SP – Ap. – Rel. Junqueira Sangirardi – RJD 28/33)
 
A caracterização do estrito cumprimento do dever legal possui como requisito indispensável o cumprimento da ordem sempre dentro dos limites nelas discriminados.
 
2. O que é considerado dever legal?
 
Trata-se de toda obrigação originada de forma direta ou indireta de lei. Em se tratando de dever legal, entende-se “Lei” em sentido lato, isto é, qualquer ato com caráter legislativo, normativo, quais sejam decretos, regulamentes, inclusive atos administrativos infralegais.
 
Outrossim, o dever decorrente de decisões judiciais, que nada mais consistem em determinações do Poder Judiciário em cumprimento da ordem legal.
 
No caso, são excetuadas as resoluções administrativas de caráter específico dirigida ao agente sem conteúdo genérico que caracteriza os atos normativos, como por exemplo, as ordens de serviços específicas endereçadas ao subordinado. Nesses casos, quando superior hierárquico da esfera administrativa emite ordem de serviço a seu subordinado, a maior parte da doutrina entende que não se trata de estrito cumprimento do dever legal, mas obediência hierárquica (estudada em “culpabilidade”).
 
Tratando-se de dever legal estão excluídas da proteção as obrigações meramente morais, sociais ou religiosas. Haverá violação de domicilio, por exemplo, se um sacerdote forçar a entrada em domicilio para ministrar a extrema-unção, ocorrerá constrangimento ilegal se o policial forçar um passageiro do coletivo a ceder seu lugar a uma pessoa idosa.
 
 
3. Alcance da excludente
 
 
Importante saber que a excludente atinge somente os funcionários ou agentes públicos, que agem por ordem da lei. Não deixam de ser alcançados por esta excludente o particular que exerce função pública, na maior parte das vezes, de caráter transitório, em consonância com o artigo 327, do CP, como é o caso dos jurados, mesários eleitorais e perito.
 
Observe o teor da jurisprudência pesquisada e abaixo transcrita:
 
TARS – “Inexistencia de estrito cumprimento do dever legal em crime culposo – não configuração ... outrossim, com base no nosso sistema penal, a excludente aludida só é invocável pelo servidor público. Homicídio culposo caracterizado.” (JTAERGS 88/115)
 
 
4. Conhecimento da situação justificante
 
Assim como as demais excludentes de ilicitude, o individuo que age em estrito cumprimento do dever legal deve ter conhecimento que esta praticando um fato de um dever imposto pela lei, caso contrário, o ato é ilícito. Suponha, assim, que policial, flagra crime e, em razão disso, tenta prender o autor dos fatos, no entanto este entra em local para fugir do policial. Também, supondo que pessoa presente no local, percebe a intenção do policial e, em razão disso, tranca o autor dos fatos em um dos cômodos do local. Nesse caso, o estrito cumprimento do dever legal é estendido ao terceiro particular, já que tinha ciência do dever do policial.
 
Existe discussão a respeito do reconhecimento do estrito cumprimento do dever legal em se tratando de crime culposo. A doutrina entende que não se admite estrito cumprimento do dever legal quando houver crime culposo. “A lei não obriga à imprudência, negligencia ou imperícia. Entretanto, poder-se-á falar em estado de necessidade na hipótese de motorista de uma ambulância, ou de um carro de bombeiros, que dirige velozmente e causa lesão a bem jurídico alheio para apagar incêndio ou conduzir um paciente em risco de vida para o hospital ...”
 
No mais, a jurisprudência ratifica a tese doutrinária:
 
“A excludente prevista no item III do art. 19, do CP (atual art. 23, III) é incompatível com os delitos culposos, pois a toda evidencia só é aplicável às hipóteses em que o agente procede querendo o resultado ou assumindo o risco de produzi-lo.” (Tacrim – SP – Ac – Rel. Azevedo Junior – RT 383/346)
 
Mesmo assim, em que pesem as posições doutrinárias quanto ao não reconhecimento de crime culposo em se tratando de estrito cumprimento de dever legal, não deixo de manifestar concordância à tese, mas é bem verdade, também, que a modalidade culposa não nos parece apta à qualquer excludente da ilicitude. Afinal, como o ofendido poderá reagir a agressão injusta de forma culposa, por falta de dever de cuidado??? Note-se que ou reage à agressão com vontade e consciênciaou por causa putativa.
  Exercício Regular de Direito
 
1. Introdução e Conceito:
 
A lógica jurídica do exercício regular de direito decorre do principio constitucional da legalidade, previsto no inciso II, do art. 5º da Constituição Federal, de que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.
 
O fundamento constitucional possibilita o exercício de direito subjetivo por qualquer cidadão, seja penal ou extrapenal, bastando que não seja contrário à lei.
 
Assim, nasce o exercício regular de direito, pois ao mesmo tempo que determinadas condutas são limitadas e proibidas pela lei penal, a totalidade do ordenamento jurídico concede “brechas” para que determinadas pessoas exercitem determinadas condutas. Melhor exemplificando, um adulto não poderia agredir uma criança, em regra. Essa é a norma geral do ordenamento jurídico. Mas, diante do poder educacional, do pátrio poder conferido aos responsáveis pelo menor, inequivocadamente, concedido por nosso ordenamento jurídico (seja, no Código Civil, seja no ECA, seja no próprio Código Penal) há “brecha” feita ao responsável pela formação e educação pessoal do menor. Nesse caso, aquele que exerce o pátrio poder esta exercendo regularmente o direito de educar a criança, mesmo que para isso tenha que desferir uns tapinhas.
 
Afinal, “uma ação juridicamente permitida não pode ser, ao mesmo tempo, proibida pelo direito. Ou, em outras palavras o exercício regular de direito nunca é antijurídico”.
 
Há exercício regular de direito na correção dos filhos pelos pais, na prisão em flagrante por particular, na defesa do esbulho possessório recente (art. 1210, Parágrafo 1º, CC), no expulsar de pessoas, que permanecem indevidamente em local em que esta vedado o acesso.
 
Na parte especial do Código Penal há casos específicos de exercício regular de direito, tais como, a imunidade judiciária (art. 142, III, CP), a coação para evitar o suicídio ou para prática de intervenção cirúrgica (art. 146, parag. 3º, CP), o direito de crítica (art. 142, inciso II, do CP).
 
Há entendimentos que consideram a previsão do exercício regular de direito como sendo desnecessária, pois quem normalmente exerce conduta regulamentada pelo direito, de acordo com a norma, não poderia realmente estar praticando conduta antijurídica (contrária a todo ordenamento).
 
O exercício regular de direito alcança, como vimos, todos aqueles que podem exercitar um direito subjetivo ou uma faculdade prevista em lei penal ou extrapenal. Dessa forma, o significado da expressão direito possui sentido amplo abrangendo todas as formas de direito penal e extrapenal, conforme o exemplo já apontado, o jus corrigendi do pai de família (art. 1634, I, CC).
 
José Frederico Marques sustenta que o costume também é fonte que legitima determinadas ações e nos apresenta o curioso exemplo do trote acadêmico em que as injúrias e os constrangimentos que os veteranos praticam contra os bichos não são considerados atos antijurídicos. Evidentemente, que deve ser ponderado os excessos, já que, se verificados, terão as conseqüências nos termos analisadas na Aula 03 (legítima defesa).
 
2. Conhecimento da situação justificante:
 
Para a caracterização da excludente é indispensável que o agente conheça a existência da excludente que, no caso, é a autorização penal ou extrapenal para prática de um determinado direito, caso contrário, não há que se falar em exercício regular de direito.
 
Nos termos anotados pela doutrina, “é esse elemento subjetivo que diferencia, por exemplo, o ato de correção executado pelo pai das vias de fato, da injuria real ou até lesões, quando o genitor não pensa em corrigir, mas em ofender ou causar lesão”.
 
 
3. Intervenção Médico- cirúrgicas
 
Trata-se de exercício regular de direito, mas, para que exista a discriminante, é indispensável o consentimento do paciente ou de seu representante legal.
 
Não sendo possível o consentimento do paciente ou de seu representante legal poderá caracterizar estado de necessidade em favor de terceiro.
 
A intervenção médico cirúrgica não exclui o crime quando houver imperícia, negligencia ou imprudência do agente, havendo responsabilidade pelo crime culposo.
 
A jurisprudência cita exemplos de responsabilização penal nos casos em que o médico, que por imperícia, ao submeter a vítima à cirurgia para retirada de pino metálico inserido em osso lesado, pinça nervo ciático conjuntamente com vaso sangrante, acarretando total comprometimento desse nervo, atrofia do membro atingido e equismo do pé.
 
Por fim, importante frisar que o exercício regular de direito pressupõe o exercício habilitado, capaz de desempenhar a atividade a que por lei passou a ter direito. Se o particular, em situação urgente, realiza intervenção cirúrgica, o caso é de estado de necessidade.
 
4. Violência desportiva
 
Desde que inexistes excessos caracteriza o exercício regular de direito. Importante também ressaltar outros requisitos do alcance do exercício regular de direito em relação à violência desportiva, quais sejam, a existência de consentimento prévio do ofendido – deve estar ciente dos riscos do esporte, a atividade não pode ser contrária aos bons costumes, a agressão deve se dar dentro dos limites do esporte e de seus desdobramentos previsíveis.
 
“Partida de futebol – Cotovelada desferida no rosto da vítima – Ausência, entretanto, de elementos comprovadores da intencionalidade na conduta – só a circunstancia da expulsão não é motivo suficiente para dar pela procedência da denuncia, caso contrário, todo jogador de futebol expulso por jogo violento deveria ser processado. O que cabe verificar é se o réu – participante do jogo de futebol – infringiu regra daquela atividade esportiva. Embora expulso da partida, em função do depoimento prestado pelo arbitro daquela, o evento não pode deixar de ser considerado, sob o relativo ponto de vista jurídico penal, como uma infelicitas facti, um mero casus. É verdade que o seu depoimento se mostra contraditório com a decisão que tomou, expulsando o apelado do jogo. Aceita-se, porém, que tenha ele, passado algum tempo, tido a oportunidade de rever o seu entendimento quanto ao comportamento do apelado na partida. De qualquer maneira, à falta de elementos seguros para se poder afirmar que o réu teve conduta intencional em lesionar o adversário, assim, desrespeitando, deliberadamente, as regras do esporte, impossível prover o apelo. Resta alimentar o desinteresse de autoridades esportivas na apuração e punição dos atletas que se conduzem de forma inteiramente desleal na prática do futebol, profissional e amador.” (TJSP – AC- Rel. Andrade Cavalcanti – RTJSP 139/276)
 
No Brasil, a Lei 9.615/98 – Lei Pelé – revogou a Lei 8.672/93 – Lei Zico – e foi alterada pela Lei 9.981/00 e Lei 10.672/03, que instituiu normas gerais sobre a prática dos desportos.
 
Muito embora a doutrina apresenta afirmação no sentido de que “havendo lesões ou morte, não ocorrerá crime por ter o agente atuado em exercício regular de direito”. Manifesto a opinião de que a colocação nos parece um pouco radical, pois haverá crime sim, quando ocorrer excesso do agente, ou seja, quando a pessoa intencionalmente desobedecer às regras esportivas, causando resultados lesivos.
 
Por exemplo, o boxeador que, dentro das regras do esporte, desfere socos contra o adversário e este devido à fragilidade momentânea é acometido de reação biológica que desencadeia a morte. Nesse caso, de fato, há exercício regular de direito e inexiste crime em razão de ausência de antijuridicidade.
 
No entanto, se boxeador que, desrespeita as regras do esporte, ou mesmo após ter dominado totalmente o adversário que já se encontrava atirado ao solo, continua a desferir socos contra o mesmo. Nesse caso, há excesso e, portanto, não há que se falar em reconhecimento da excludente, respondendo, o boxeador, pelo resultado criminoso.
 
5. Ofendículos
 
Consistem em aparatos facilmente perceptíveis destinados à defesa da propriedadeou de qualquer outro bem jurídico, tais como, o arame farpado, o caco de vidro (citam-se os cães bravios).
 
Tendo em vista que o exercício regular de direito alcança a defesa da propriedade parte da doutrina entende que tratam-se de exercício regular de direito da propriedade.
 
Mesmo assim, há sólidos entendimentos no sentido de que os ofendículos consistem em legítima defesa preordenada, uma vez que, embora preparados com antecedência, só atuam no momento da agressão.
 
Não importa, seja o ofendículo considerado legítima defesa preordenada, seja considerado exercício regular de direito, sabe –se que o ofendículo exclui a ilicitude.
 
Contudo, a doutrina traz uma distinção bastante importante entre ofendiculo e defesa mecânica predisposta.
 
A defesa mecânica predisposta consistem em aparatos ocultos com a mesma finalidade que os ofendiculos e, por se tratar de dispositivos não perceptíveis, não são raras as vezes que configuram o excesso. Por exemplo o sitiante que instala tela elétrica na piscina, pois sabem crianças a invadem, responderá pelo resultado, seja por lesão ou por homicídio. Observe o entendimento jurisprudencial abaixo transcrito:
 
“Ofendiculo com excesso em exercício regular de direito – colocação de engenho provido de eletricidade para fins de proteção ao patrimônio próprio. Abuso reconhecido.” (JTACRIM 35/259).
 
“Age com manifesta imprudência quem, para proteger a sua propriedade, instala em seu interior sistema mecânico de defesa à base de eletricidade, olvidando outros direitos mais importantes que possam ser afetados ou sacrificados” (TACRIM – SP – AC – Rel. Geraldo Gomes – RT 476/374).
 
A doutrina também nos remete ao exemplo do pai que instala dispositivo ligando a maçaneta da porta ao gatilho de uma arma de fogo, objetivando proteger-se de ladrões, mas vem a matar a própria filha. Não restam dúvidas de que se trata de infração culposa e cuja punibilidade será extinta mediante aplicação do perdão judicial, que será estudado adiante, mesmo assim, é importante frisar que não se trata de excludente de ilicitude, o crime existe, não sendo reconhecido, no caso, o exercício regular de direito
CULPABILIDADE
 1. Introdução
 Em resumo, “conjunto de normas” reguladoras das relações sociais consiste em amplo conceito de direito.
 Partindo disto, temos que em se tratando de direito penal, sabe-se que este aponta “situações” que fere e ameaça a ordem jurídica de forma mais grave. Assim, o Direito Penal estabelece quais são estas “situações” e quais as regras técnicas a serem aplicadas às mesmas.
 Às retro mencionadas “situações”  atentatórias ao ordenamento jurídico, o Direito Penal as denominou “delitos”, mas como evitar a verificação dos delitos em nossa sociedade?
 Dessa forma, para evitar a ocorrência dos delitos em nossa sociedade, o Direito Penal estabelece “sanção penal” a cada “situação” que considera “delito”.
 Assim, conclui-se que para combater às atitudes mais atentatórias aos valores mais relevantes da sociedade o Direito Penal estabelece sanção penal ao autor das mesmas.
 Como já verificamos nas primeiras aulas do curso, mas quem está apto a constatar juridicamente a existência do crime e aplicar ao autor uma sanção penal???
 Resposta, somente o Estado. O Estado não só é competente para criar normas de Direito Penal, através do Poder Legislativo Federal (lembre-se da matéria “Fontes de Direito Penal” – Aula 1), mas também é somente o Estado quem, hoje em dia, esta legitimado a aplicar a sanção penal (pena e medida de segurança).
 Mas para aplicar a sanção penal, há necessidade de se constatar a existencia de delito.
 Em primeiro lugar, há que se fazer uma distinção entre delito e crime, já realizada em aulas anteriores. Para melhor esclarecer saiba que delito é gênero, o qual se subdivide em crime e contravenção penal.
 As contravenções penais serão estudadas no final do curso, pois se encontram em legislação especial (exparsa), qual seja, o Decreto-Lei 3688 de 03 de outubro de 1941. No entanto, somente para fins didáticos vamos conceituar as contravenções penais como sendo “crimizinhos”, ou melhor, nas lúcidas palavras do Professor Nélson Hungria, “crime anão”.
 Observe que para conceituar contravenção penal é necessário entender o conceito de crime – pois, como foi dito, contravenção é “crime anão” – e, só assim, vamos entender o que é delito.
 É bem verdade que já analisamos o conceito de crime diante de vários aspectos, mesmo assim, para fins didáticos, cabe recordar.
 Em primeiro lugar sabemos que existem duas teorias para conceituar CRIME.
 A primeira, segundo a maior parte dos doutrinadores, foi adotada pelo CP anterior e não é adotada pelo atual. Trata-se da TEORIA TRADICIONAL.
 Para TEORIA TRADICIONAL, crime é FATO TÍPICO, ANTIJURIDICO e CULPAVEL.
 Para TEORIA TRADICIONAL, o FATO TÍPICO é composto por – CONDUTA (comportamento do autor do crime, que pode ser ativo ou omissivo); RESULTADO (modificação advinda da conduta do agente feita no mundo externo); NEXO CAUSAL (a relação lógica e conseqüencial existente entre a conduta e o resultado) e, por fim, a tipicidade (previsão expressa em lei penal).
 No entanto, para TEORIA TRADICIONAL, o DOLO (a vontade e consciência de praticar a conduta criminosa) e a CULPA (a falta de dever de cuidado) não se encontram como elementos da conduta, mas estão presentes na CULPABILIDADE.
 Isto quer dizer que para o autor apresentar CULPABILIDADE (ser considerado culpado ou inocente) era necessário agir com DOLO ou com CULPA. O DOLO e a CULPA, para TEORIA TRADICIONAL, era considerado um juízo de valor e não estava embutido na constatação do fato típico.
 Vamos resumir os conceitos no fluxograma apresentado abaixo:
 TEORIA TRADICIONAL – É CRIME:
	FATO TÍPICO
	ANTIJURIDICIDADE
	CULPABILIDADE
	 
- conduta
- nexo causal
- resultado
- tipicidade
 
 
	 
Contrariedade ao ordenamento jurídico. Ausência de “excludentes”
	1) Imputabilidade
2) DOLO E CULPA (a) consciência da conduta, resultado e nexo causal; consciência da antijuridicidade e vontade de realizar a conduta e produzir o resultado)
3) exigibilidade de conduta diversa
 Não obstante o DOLO e a CULPA como elementos da culpabilidade e, por conseqüência, integrantes do “juízo de valor”, a exigibilidade de conduta diversa também é elemento da CULPABILIDADE.
 Verifica-se que o potencial consciência da ilicitude não integra a culpabilidade, isto porque, para TEORIA TRADICIONAL, a “consciência da antijuridicidade” esta embutida no DOLO e na CULPA.
 Por fim, para fins de estudo da matéria CULPABILIDADE, o aluno deve compreender que para a TEORIA TRADICIONAL, o DOLO e a CULPA integram a CULPABILIDADE e não o FATO TÍPICO.
 
Contudo, para a maior parte da doutrina, O CÓDIGO PENAL ATUAL ADOTOU A TEORIA FINALISTA E NÃO A TEORIA TRADICIONAL.
 Para TEORIA FINALISTA o crime é considerado, simplesmente, FATO TÍPICO e ANTIJURÍDICO.
 A CULPABILIDADE para TEORIA FINALISTA é mera apreciação de valor, reprovabilidade, censura de crime já existente.
 Cumpre ressaltar, ainda que, para TEORIA FINALISTA, o DOLO e a CULPA são elementos da conduta, do FATO TÍPICO, não consistindo em juízo de valor, mas vitais à existência do crime.
 Vamos resumir o conceito de crime de acordo com esta teoria no fluxograma abaixo, veja:
 TEORIA FINALISTA – É CRIME:
	FATO TÍPICO
	ANTIJURIDICO
	- conduta (DOLO e CULPA)
- nexo causal
- resultado
- tipicidade
	- contrário à lei. Necessária a ausência de excludentes
 
NÃO É ELEMENTO DO CRIME:
	CULPABILIDADE
	1)      Imputabilidade
2)      Potencial conhecimento da ilicitude
3)      Exigibilidade de conduta diversa
 
As teorias definidoras de crime é matéria meramente doutrinária, objeto de matéria ministrada em pós graduação. Na verdade, como conseqüência tanto da teoria tradicional como da teoria finalista temos o crime.
 
Para realizar nosso estudo, vamos adotar a TEORIA FINALISTA somente em virtude de sua adoção majoritária pela doutrina.
 
2. Culpabilidade – Conceito
 
Quando

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