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CAPÍTULO 62 – PRINCÍPIOS GERAIS DA FUNÇÃO GASTROINTESTINAL – MOTILIDADE, CONTROLE NERVOSO E CIRCULAÇÃO SANGUÍNEA Por Allan Catarino Kiska Torrani 1. Princípios Gerais da Motilidade Gastrointestinal Anatomia Fisiológica da Parede Gastrointestinal Parede intestinal composta pelas camadas serosa, muscular lisa longitudinal, muscular lisa circular, e submucosa Fibras musculares lisas medindo de 200 a 500 μm por 2 a 10 μm, em feixes de 1000 fibras paralelas, unidas por junções comunicantes, funcionando como um sincício Atividade Elétrica do Músculo Liso Gastrointestinal A atividade elétrica intrínseca, contínua e lenta, consistindo em ondas lentas e potenciais em ponta. Ondas lentas: intensidade de 5-15 mV, frequência de 3-12 por minuto, geradas por células de Cajal (marca-passo). Potenciais em ponta: ocorrem automaticamente quando o potencial de repouso da membrana do músculo liso GI fica mais positivo do que cerca de -40 mV; quanto maior o potencial da onda lenta, maior a frequência dos potenciais em ponta (cerca de 10 pontas/s), durando cerca de 10-20 ms; os canais desse músculo liso são denominados canais para cálcio- sódio. Fatores que despolarizam a membrana: estiramento, acetilcolina, hormônios GI específicos Fatores que hiperpolarizam a membrana: NE e EPI, nervos simpáticos NE. O cálcio age sobre a calmodulina, que ativa os filamentos de actina e miosina. O musculo liso GI exibe contração tônica, contínua e durando vários minutos ou horas, sendo causada por hormônios e fatores que despolarizam parcialmente, como a entrada contínua de cálcio. 2. Controle Neural da Função Gastrointestinal – Sistema Nervoso Entérico O sistema nervoso entérico começa no esôfago e se estende ao ânus, possui cerca de 100 milhões de neurônios. É formado pelos plexos mioentérico (Auerbach) e submucoso (Meissner). O plexo de Auerbach controla os movimentos GI, e o plexo de Meissner controla a secreção GI e fluxo sanguíneo. Fibras aferentes GI se dirigem para os gânglios pré-vertebrais do SNsimpático, medula espinhal, e tronco cerebral pelos nervos vagos. Diferenças Entre os Plexos Mioentérico e Submucoso O plexo mioentérico aumenta a concentração tônica, aumenta a intensidade das concentrações rítmicas, aumento do ritmo da contração, e aumento da velocidade de condução das ondas excitatórias. Os neurônios inibitórios desse plexo liberam VIP e outros NT inibitórios, uteis na inibição muscular de alguns esfíncteres (pilórico e ileocecal). O plexo submucoso está envolvido no controle da parede interna do intestino, além de controlar localmente a secreção, absorção e contração do musculo submucoso. Tipos de Neurotransmissores Secretados por Neurônios Entéricos Acetilcolina excita a atividade GI. NE e epinefrina quase sempre inibem a atividade GI. Outros NT são: ATP, serotonina, DA, CCK, substância P, VIP, somatostatina, leuencefalina, metencefalina, bombesina. Controle Autônomo do Trato Gastrointestinal As fibras nervosas parassimpáticas cranianas, através do vago, inervam esôfago, estômago, pâncreas, e primeira metade do intestino grosso. O parassimpático sacral se origina de L2-L4, através dos nervos pélvicos, inervam a metade distal do intestino grosso até o ânus. Os neurônios pós-ganglionares parassimpático GI estão nos plexos mioentérico e submucoso, e estimulam a atividade GI. As fibras simpáticas se original de T5-L2, pelas cadeias simpáticas, passam pelos gânglios celíaco e mesentéricos, e terminam liberando epinefrina e NE, inibindo a atividade GI ao inibir o músculo liso GI e por inibição dos neurônios do sistema nervoso entérico. Fibras Nervosas Sensoriais Aferentes do Intestino São estimulados pela irritação da mucosa, distensão ou presença de substâncias químicas. Podem inibir ou excitar os movimentos. Elas transmitem sinais do TGI para o bulbo cerebral, desencadeando sinais vagais reflexos. Reflexos Gastrointestinais Reflexos integrados na parede intestinal controlam a grande parte da secreção GI, peristaltismo, contrações de mistura, efeitos inibitórios. Reflexos para os gânglios simpáticos pré-vertebrais transmitem os reflexos gastrocólico (evacuação), reflexo enterogástrico (inibi motilidade e secreção estomacal), e reflexo colonoileal (inibe esvaziamento do íleo). Reflexos para a medula e para o tronco cerebral incluem aqueles que controlam a atividade motora e secretória gástrica e duodenal (pelos nervos vagos), reflexos de inibição geral, reflexos de defecação. Controle Hormonal da Motilidade Gastrointestinal A gastrina é secretada pelas células G do antro do estomago em resposta a estímulos associados à digestão de refeição. Ela estimula secreção gástrica de ácido e o crescimento da mucosa gástrica. O peptídeo liberador da gastrina é liberado pelos nervos da mucosa gástrica através da estimulação vagal. A CCK é secretada pelas células I da mucosa do duodeno e jejuno, em reposta à gordura, ácidos graxos e monoglicerideos. Ela contrai fortemente a vesícula biliar, inibe a contração do estomago, inibe o apetite ao enviar informação pelo vago aos centros da alimentação. A secretina é secretada pelas células S da mucosa do duodeno em resposta ao conteúdo gástrico ácido. Tem pequeno efeito na motilidade, e promove a secreção pancreática de bicarbonato. O peptídeo inibidor gástrico (GIP) é secretado pelas células K mucosa do intestino delgado superior em resposta aos ácidos graxos e aminoácidos. Ele diminui a atividade motora do estômago, estimula a secreção de insulina (chamado de peptídeo insulinotrópico glicosedependente). A motilina é secretado pelas células M do duodeno superior durante o jejum. Ela aumenta a motilidade GI, de maneira cíclica, estimulando ondas que se propagam pelo estomago e intestino delgado a cada 90 minutos. 3. Tipos Funcionais de Movimentos no Trato Gastrointestinal Movimentos Propulsivos – Peristaltismo O movimento básico é o peristaltismo, no qual um anel contrátil surge em um ponto e se move para adiante. O estimulo usual do peristaltismo é a distensão, que estimula o sistema nervoso entérico a provocar a contração da parede 2-3 centímetros atrás desse ponto. Outros estímulos são a irritação química ou física, e intensos sinais nervoso parassimpáticos. Ele fica bastante deprimido ou completamente bloqueado quando a pessoa é tratada com atropina (anticolinérgico). O peristaltismo em direção à boca cessa rapidamente quando comparado com o movimento em direção ao ânus, isso porque ele seja polarizado na direção anal. O conteúdo intestinal é empurrado em direção anal por 5-10 cm antes de cessar. O intestino também relaxa vários centímetros adiante, na direção anal, chamado de “relaxamento receptivo”. Movimentos de Mistura Ocorre quando a progressão dos conteúdos intestinais é bloqueada por esfíncter, de maneira que a onda peristáltica pode então apenas agitar os conteúdos intestinais, em vez de impulsioná-los para frente. Em outros momentos, contrações constritivas locais ocorrem em regiões separadas por poucos centímetros da parede intestinal, durando apenas de 5 a 30 segundos. 4. Fluxo Sanguíneo Gastrointestinal – “Circulação Esplâncnica” A circulação GI é denominada circulação esplâncnica, no qual todo o sangue passa pelo intestino, baço e pâncreas flui, imediatamente para o fígado por meio da veia porta. Esse fluxo de sangue pelo fígado, antes de retornar à veia cava, permite que as células reticuloendoteliais, revestindo os sinusoides,removam bactérias e outras partículas que poderiam entrar na circulação sanguínea do TGI. Os nutrientes não lipídicos e hidrossolúveis, absorvidos no intestino (carboidratos e proteínas), são transportados no sangue venoso da veia porta para os mesmos sinusoides hepáticos. As células hepáticas absorvem e armazenam temporariamente de metade a três quartos dos nutrientes. Quase todas as gorduras absorvidas pelo TGI são transportadas pelo sistema linfático intestinal, e são levadas ao sangue circulante sistêmico por meio do ducto torácico, sem passar pelo fígado. Anatomia da Circulação Sanguínea Gastrointestinal As extremidades das artérias perimetrais convergem no lado diametralmente oposto ao da artéria maior de que se originaram. Os seus ramos se espalham pelos feixes musculares, pelas vilosidades intestinais, e pelos vasos submucosos. Efeito da Atividade Intestinal e Fatores Metabólicos no Fluxo Sanguíneo Gastrointestinal O fluxo sanguíneo pelas vilosidades e nas regiões adjacentes da submucosa aumente por cerca de oito vezes durante a absorção ativa dos nutrientes. Depois da refeição, a atividade motora, a atividade secretória e a atividade absortiva aumentam, então o fluxo de sangue aumenta bastante, mas depois diminui para os valores de repouso no período seguinte de 2-4 horas. Várias substâncias vasodilatadoras são liberadas pela mucosa do TGI, de hormônios peptídicos como CCK, VIP, gastrina e secretina. Algumas das glândulas GI liberam calidina e bradicinina, potentes vasodilatadores que se supõe causarem grande parte da vasodilatação intensa. A redução da concentração de oxigênio na parede intestinal pode aumentar o fluxo de sangue intestinal por 50% a 100%, podendo ainda quadruplicar a concentração de adenosina. O fluxo arterial entra no vilo e o fluxo venoso sai dele, ocorrem em direções opostas, e os vasos são paralelos e próximos. Devido a isso, grande parte do oxigênio sanguíneo se difunde das arteríolas, diretamente, para as vênulas adjacentes, sem passar pelas extremidades dos vilos, sendo que até 80% do oxigênio pode passar dessa forma. Em condições patológicas, nos quais o fluxo sanguíneo para o intestino fica bastante comprometido como no choque circulatório, o déficit de oxigênio nas pontas das vilosidades pode ser de tal monta que as pontas ou, até mesmo, todas as vilosidades podem ter morte isquêmica e se desintegrar. Controle Nervoso do Fluxo Sanguíneo Gastrointestinal A estimulação dos nervos parassimpáticos, para o estômago e o cólon distal, aumenta o fluxo sanguíneo local, ao mesmo tempo em que aumenta a secreção glandular. A estimulação simpática tem efeito direto em, essencialmente, todo o TGI causando vasoconstrição intensa das arteríolas, com grande redução do fluxo sanguíneo. O fluxo, em geral, retorna aos valores dos normais por meio do mecanismo denominado “escape autorregulatório”. Umas das principais utilidades adaptativas da vasoconstrição simpática, no intestino, é permitir a interrupção sanguínea GI e esplâncnico por breves períodos de tempo, durante o exercício pesado, quando o coração e os músculos esqueléticos necessitam de mais fluxo. No choque circulatório, quando todos os tecidos vitais do corpo estão em risco de morte celular, por ausência de fluxo sanguíneo, a estimulação simpática pode reduzir em muito o fluxo sanguíneo esplâncnico por algumas horas. A estimulação simpatia também pode promover forte vasoconstrição das veias intestinais e mesentéricas de grande calibre. No choque hemorrágico ou em outros estados de baixo volume de sangue, esse mecanismo pode fornecer de 200 a 400 ml de sangue extra para manter a circulação sistêmica.