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UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO – CAMPUS I CRIANÇAS COM TRANSTORNO DE DÉFICIT DE ATENÇÃO / HIPERATIVIDADE (TDAH) NO AMBIENTE ESCOLAR SARA CRISTINA ARANHA DE SOUZA PINHEIRO Salvador, BA 2010 2 SARA CRISTINA ARANHA DE SOUZA PINHEIRO CRIANÇAS COM TRANSTORNO DE DÉFICIT DE ATENÇÃO / HIPERATIVIDADE (TDAH) NO AMBIENTE ESCOLAR Trabalho de monografia apresentado a Universidade do Estado da Bahia, Departamento em Educação - Campus I, como requisito para conclusão de curso na graduação em Pedagogia com habilitação em Anos Iniciais. Orientadora: Prof.ª Ana Portela Salvador, BA 2010 3 TERMO DE APROVAÇÃO SARA CRISTINA ARANHA DE SOUZA PINHEIRO CRIANÇAS COM TRANSTORNO DE DÉFICIT DE ATENÇÃO / HIPERATIVIDADE (TDAH) NO AMBIENTE ESCOLAR Dissertação aprovada como requisito parcial para conclusão de curso na graduação em Pedagogia com habilitação em Anos Iniciais, pela Universidade do Estado da Bahia, pela seguinte banca examinadora: Ana Portela __________________________________________________ Ana Portela (Orientadora) – UNEB Ana Lago __________________________________________________ Ana Cristina Castro Lago – UNEB Solange Nogueira _____________________________________________________________________ Solange Maria do Nascimento Nogueira - UNEB Salvador, 11 de março de 2010 4 Dedicatória Dedico este trabalho aos meus pais pelo carinho, amizade e incentivo. E ao meu amado Marcelo Matos Correia por aturar todos os meus stresses e compreender. Amo muito Vocês! 5 Agradecimentos Para a realização desse trabalho gostaria de agradecer primeiramente a Deus, pois iluminou todo o meu caminho para que pudesse chegar até aqui, me dando forças para superar todos os obstáculos encontrados nesse longo caminho. Agradeço também a todos que, de alguma forma, contribuíram para tornar essa construção possível como: a minha amiga Liliani Costa, pelas dicas dadas ao logo desse trabalho, pela amizade, carinho e dedicação. Aos meus pais, pois sem eles nada disso seria possível porque tudo que sou hoje são frutos do seu amor por mim e pelos meus irmãos, pelo exemplo de força, garra, honestidade e dedicação. Aos meus irmãos Bruno, Tayza e Milena também dedico este trabalho, pois fazem parte de minha vida, tornando- a muito mais agradável e feliz. Aos meus familiares em geral, tios (a), primos (a), minhas avós lindas Haidêe e Elza pela torcida e incentivo, e avôs João e Lima, pois sem esse carinho e credibilidade nada disso seria possível. Agradeço aos meus queridos professores desse logo período de formação, dentre eles: Luciano Bomfim, pelo incentivo, mesmo sem saber, a me ensinar a lutar sempre pelos meus objetivos e nunca desistir, a Djalma por suas aulas de psicologia, a Virgínia Vaz pelo seu profissionalismo, dedicação e afeto e a professora Ana Lago pelo sorriso cativante, dedicação e amizade construída nesse pouco tempo em que tivemos trabalhando juntas. Sem esquecer a minha orientadora Ana Portela, pois sem a sua ajuda nada disso seria possível. Agradeço também a família Correia pelo acolhimento em todos os momentos em que passei em sua casa para almoçar para ir a Escola Municipal Presidente Médici, pelas conversas, conselhos, dedicação e carinho. E em especial a Marcelo Matos Correia pelo carinho, companheirismo, apoio, conselhos e todas às vezes que pôde ler meu trabalho para dar uma opinião do que ainda pode ser melhorado. Não posso também, deixar de agradecer a todos os professores da Escola Municipal Presidente Médici que ajudaram-me a realizar essa pesquisa e contribuíram com suas experiências e dedicação e apoio. Obrigada a todos! 6 “Fica estabelecida a possibilidade de sonhar coisas impossíveis e de caminhar livremente em direção aos sonhos” Luciano Luppi 7 RESUMO Pinheiro, Sara Cristina Aranha de Souza. CRIANÇAS COM TRANSTORNO DE DÉFICIT DE ATENÇÃO / HIPERATIVIDADE (TDAH) NO AMBIENTE ESCOLAR. 2010.62 f. Dissertação (Graduação em Pedagogia- Anos Iniciais) – Departamento de Educação – Campus I, Universidade do Estado da Bahia, Salvador. A presente pesquisa tem como objetivo esclarecer e divulgar mais sobre o TDAH para os profissionais de educação, áreas afins, pais, alunos e familiares no intuito de amenizar o baixo desempenho acadêmico e os altos índices de abandono escolar, dessas crianças, pois além de terem maiores chances de serem repreendidas e castigadas podem ter outros problemas associados que vão dificultar na leitura, na escrita, na comunicação e no relacionamento com os outros. Nesse sentido, descrições sobre o que caracteriza o transtorno, seu percurso histórico, diagnóstico e tratamento são descritos nesse trabalho. Para construção dessa pesquisa vários teóricos subsidiaram-me, como: Barkley (2008); Brown (2007); Mattos (2007); Vicari (2006), dentre tantos outros que foram imprescindíveis, assim como a bagagem construída ao longo da minha formação e as experiências de sala de aula que tornaram tudo isso possível, real e prazeroso. O método adotado para analise dos conteúdos obtidos a partir das informações coletadas por meio de um questionário com quatorze (14) questões do tipo objetivas e subjetivas, que se dividiam entre o perfil do professor e atuação, aspectos relacionados à formação acadêmica, interações entre aluno e professor e conhecimentos sobre o TDAH. Esses questionários foram aplicados com cinco professores de dez que estavam presentes na Escola Municipal Presidente Médici. Diante da análise de dados, observou-se que os professores dessa instituição sabem sobre a existência do transtorno e as características que mais descreve essas crianças, porém ainda não sabem diferenciar o comportamento excessivo dessas crianças de hábitos como má educação ou de força de vontade do aluno, como mesmo foi apontado na pesquisa. Por fim, evidenciou-se a importância de fomentar discussão sobre o modelo de gestão e metodologia usado em sala de aula, pois o estudo revelou a tendência dos professores em atribuir o comportamento inadequado do aluno a causas familiares, emocionais e sociais, esquecendo de refletir sobre outros fatores que poderiam influenciar tais comportamentos. Nesse trabalho também são discutidas questões relacionadas à inclusão, pois essas crianças acabam sendo excluídas do processo de aprendizagem por se acharem incapazes de aprender, de seguir o ritmo da turma, sendo rotuladas de forma negativas e ocasionando nelas sentimentos de culpa, de inferioridade, baixa auto-estima, desinteresse pelos estudos e ansiedade. Palavras-chaves: TDAH; comportamento desatento; hiperativo; impulsivo; educação especial, professores, educação. 8 ABSTRACT Pinheiro, Sara Cristina de Souza Aranha. CHILDREN WITH ATTENTION DEFICIT HYPERACTIVITY DISORDER (ADHD) IN THE SCHOOL ENVIRONMENT. 2010.62f. Dissertation (Graduation in Pedagogy – First Years) – Education Department – Campus I, Bahia State University, Salvador. The current research is aimed at clarifying and publish more about ADHD for education professionals, related areas,parents, students and relatives so as to minimize the low academic performance and the high school drop-out indexes of these children, thus, besides having higher chances of being reprimanded and punished, might have other related problems that will make reading, writing, communication and relationship with others difficult.. Thus, descriptions about what characterizes the disorder, its historical course, diagnosis and treatment are described in this report. For making this research, many theoretical bases were used, such as: Barkley (2008); Brown (2007); Mattos (2007); Vicari (2006), among several others, who were vital, as well as the knowledge acquired during studies and the classroom experiences which made it all possible, real and pleasant. The method used for analyzing the contents gotten from the collected information through a questionnaire of fourteen (14) objective and subjective questions, which were classified into teacher profile and acting, aspects related to the academic background, interactions between student and teacher and knowledge about ADHD. These questionnaires were applied to five out of the ten teachers that were present at President Medici City School. Based on the collected data, it was observed that the teachers in this institution know about the disorder existence and the characteristics that best describe these kids. However, they cannot differentiate these kids’ excessive behavior from students’ impolite habits or lack of will power, as pointed out in the research. Finally, it’s been made evident the importance of fomenting discussion on the management model and methodology used in the classroom, once the study has shown a tendency for teachers to impute inadequate student’s behavior to family, emotional and social reasons, forgetting to reflect on other factors that could influence such behaviors. In this work, questions related to the inclusion are discussed, once these kids end up being excluded from the learning process for finding themselves unable to learn, follow the group’s pace, being labeled negatively, thus causing blame, inferiority, low self- esteem, lack of interest and anxiety feelings. Keywords: ADHD, inattentive behavior, hyperactive, impulsive, special education, teacher education. 9 SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................10 2. BREVE HISTÓRICO SOBRE A DESCOBERTA DESSE TRANSTORNO, SEUS VÁRIOS NOMES E RÓTULOS ......................................................................16 2.1. Período de 1920 a 1950 .............................................................................. 18 2.2. Período de 1960 a 1980 .............................................................................. 20 2.3. O Progresso atingido nesse percurso histórico ........................................... 22 3. CARACTERÍSTICAS GERAIS DO TRANSTORNO DE DÉFICIT DE ATENÇÃO E HIPERATIVIDADE (TDAH) ............................................................ 24 3.1. As dificuldades das relações sociais nas crianças com TDAH ................... 26 3.2. Aprofundando mais as características do transtorno .................................. 29 3.3. A importância do diagnóstico e outros fatores ........................................... 31 4. O QUE DIZ O PROCESSO DE INCLUSÃO SOBRE ESSE TRANSTORNO 33 5. METODOLOGIA E ANÁLISE DE DADOS ...................................................... 39 5.1. A escolha do método de pesquisa ............................................................... 39 5.2. A Escola Municipal Presidente Médici e suas características .................... 42 5.3. Quem são esses profissionais e sua formação? ........................................... 44 5.4. O TDAH e suas implicações no cotidiano dos profissionais da educação 45 6. CONCLUSÃO .......................................................................................................... 47 7. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA ....................................................................... 51 8. APÊNDICE .............................................................................................................. 54 9. ANEXO ..................................................................................................................... 58 10 1. INTRODUÇÃO O presente interesse no tema foi intensificado quando participei do I Simpósio de TDAH para profissionais de educação, promovido pela a Associação Brasileira do Déficit de Atenção (ABDA), realizado em Salvador. Durante este evento fiquei impressionada com os depoimentos das pessoas que, quando crianças, eram apelidadas de várias formas estereotipadas tais como: “bicho carpinteiro”, “D Flash”, “No mundo da lua”, “Bagunceiro”, etc.. Isso ocorreu porque provavelmente elas não foram diagnosticadas adequadamente por parte dos profissionais da área de saúde e pelos professores, que, por sua vez não tinham um esclarecimento apropriado para lidar com essas crianças. Assim, em geral, essas dificuldades eram tratadas como se houvesse problemas de disciplina, de interesse ou até mesmo de educação. Hoje sabemos que o TDAH é definido como um transtorno neurobiológico que acontece em crianças, adolescentes e adultos, independente de país de origem, nível sócio-econômico, raça ou religião. O Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) é um transtorno neuropsiquiátrico, reconhecido pela Organização Mundial de Saúde e registrado oficialmente pela Associação Americana de Psiquiatria no manual chamado de Diagnostic and Statistic Manual (DSM), que está na sua quarta edição. Assim Barkley (2008) caracteriza o TDA/H como sendo: “(...) um transtorno mental válido, encontrado universalmente em vários países e que pode ser diferenciado, em seus principais sintomas, da ausência de deficiência e de outros transtornos psiquiátricos”. (p.123) A minha preocupação ao começar a estudar e conhecer um pouco mais sobre o tema deteve-se na concepção dos professores, pois, ainda que este transtorno esteja sendo hoje cada vez mais divulgado em tantos meios de comunicação, onde a disseminação das informações são bem mais rápidas, permanecem muitas concepções errôneas. No entanto, sendo os sintomas da hiperatividade, da desatenção e da impulsividade características de comportamento muito comum em crianças em fase de 11 desenvolvimento, pergunto-me como os profissionais da educação vêem as crianças que apresentam estes sintomas? De acordo com o autor Paulo Mattos (2007), as crianças que apresentam o TDAH podem ser rotuladas como mal educados, desinteressados, com problemas familiares, ou até mesmo com dificuldades de enxergar e ouvir, ou problemas de aprendizagem que dificultam seu desempenho acadêmico, ao invés de serem encaminhadas para profissionais da área de saúde para terem um diagnóstico mais adequado. Sabe-se, no entanto, que não podemos dizer que tais crianças não são capazes de aprender, e que, em geral, têm níveis normais ou elevados de inteligência. Entretanto, o despreparo e a falta de informação de alguns profissionais da docência podem contribuir para que essas características se acentuem de forma excessiva em algumas crianças, por não serem associadas ao TDAH, e se associem a outros transtornos que dificultam a aprendizagem, tornando o tempo acadêmico delas muito ruim, desgastante e sujeito ao abandono. É comum também, que esses mesmos profissionais se sintam despreparados para estimulá-los, no sentido de diminuir o impacto causado por esse transtorno. Em relação a isso pude constatar nas pesquisas para o Programa de Pós-Graduação em Educação realizada por Duek e Noujorks1 que relatam o seguinte: Visões diversas sobre ofenômeno da deficiência parecem se sobrepor no imaginário das professoras participantes do estudo, delineando um quadro de pouca clareza conceitual por parte delas, traduzido na dificuldade em identificar quem é o aluno com necessidades educacionais especiais, que necessidades são essas, se elas existem ou não, e em que casos o atendimento especializado se faz pertinente. Sendo assim, não posso deixar de falar sobre o processo de inclusão dessas crianças com o meio educacional e social, pois elas muitas vezes são excluídas do processo de aprendizagem por se acharem incapazes de aprender, de seguir o ritmo dos outros alunos sendo tachadas de burras, preguiçosas, desinteressadas e ainda acabam sendo excluídas pelos outros colegas nas brincadeiras, festinhas de aniversários, trabalhos em grupo, etc. Torna-se necessário também saber quem são essas crianças, 1 Revista da FAEEBA / Educação e Contemporaneidade - Docência e Inclusão: reflexões sobre a experiência de ser professor no contexto da escola inclusiva, Salvador, v. 16, n. 27, p. 41-53, jan./jun., 2007 12 saber diferenciá-las das outras e identificar quais as características que as tornam tão especiais. A inclusão de crianças com necessidades educativas especiais em escolas regulares passou, em 2008, a ser garantido por lei pela Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, porém a mesma lei que inclui também exclui na medida em que não prepara o ambiente escolar e nem os profissionais da educação para o acolhimento das crianças em rede regular de ensino. Nesse ponto, Duek e Noujorks¹ afirmam o seguinte: “a inclusão faz alusão à capacidade da escola rever sua estrutura organizacional como um todo, de modo a atender as necessidades de cada um dos seus alunos, engendrando estratégias em favor da sua formação integral (...)”. Então, a Educação Inclusiva, que antes limitava-se apenas à inserção física dos alunos com necessidades educativas especiais, muda, a partir da década de 90, quando os sistemas educacionais passam a ser responsáveis por criar condições de promover uma educação de qualidade para todos e fazer adaptações que atendam às necessidades educativas desses alunos, de acordo com a Declaração de Salamanca (1994) e a Declaração de Educação para Todos (Brasil. UNICEF, 1990). Contudo, é preciso esclarecer que as crianças que sofrem com o Transtorno de Déficit de Atenção (TDAH) não estão fora das escolas regulares, nem fazem parte de escolas especializadas, pois apesar da sua especificidade, elas não são vistas como crianças especiais na forma da lei que rege a educação inclusiva, porém sobre esse aspecto melhor discutirei no capítulo quatro. No decorrer do semestre, dando continuidade aos estudos, obtive um maior embasamento teórico através do contato com trabalhos de autores como Thomas E. Brow (2007), Paulo Mattos (2007), Russell A. Barkley (2008), Maria Isabel Vicari (2006), dentre outros que pesquisaram sobre o assunto. Estes autores assinalam que o TDAH é um fator de risco para o baixo desempenho acadêmico e para os altos índices de abandono escolar, pois essas crianças além de terem maiores chances de serem repreendidas e castigadas podem ter outros problemas associados, que vão dificultar na leitura, na escrita, na comunicação e no relacionamento com os outros, no mau rendimento escolar, além de criar dificuldades nos relacionamentos. Por outro lado, tais dificuldades vão contribuir muito para a sensação de mal-estar e, é lógico que no ambiente escolar, essas crianças começam a se sentir excluídas e desenvolvem 13 sentimentos de inferioridade por comparar-se aos outros colegas, o que gera desejo intenso de abandono escolar. Na adolescência, o risco ainda é maior, pois apresentam sentimentos propícios para uso excessivo de álcool e abuso de drogas ilícitas, assim como comportamentos irresponsáveis, que em parte são causados pela impulsividade. É com essa preocupação que o autor Paulo Mattos (2007) vai descrever sobre o desempenho acadêmico das crianças que são portadoras do TDAH: “A intervenção escolar é muito importante e em alguns casos pode facilitar o convívio dessas crianças com colegas e também evitar que elas se desinteressem pelo colégio, fato muito comum em adolescentes. O problema é a escola participar do tratamento; muitas escolas não apenas desconhecem o TDAH como também não têm o desejo ou possibilidade de participar do tratamento, pelas mais variadas razões” (MATTOS, 2007ª, p. 43). Dessa forma, cabe à escola e, mais precisamente aos professores, a possibilidade de identificar precocemente os sintomas e encaminhar a criança para uma avaliação médica. E nesse caso, não só o professor, mas toda a equipe técnica da escola exerce funções importantíssimas no diagnóstico e tratamento desse transtorno. No entanto, precisam estar bem informados e querer participar do tratamento apoiando não só as crianças, mas também os pais. Durante esses estudos várias questões me inquietaram considerando a realidade da maioria das escolas públicas brasileiras, pois é comum nessas instituições de ensino a falta de recursos, de materiais e de instalações, bem como são difíceis as condições dos professores, pois enfrentam baixa remuneração e condições precárias de trabalho. Assim, de que modo profissionais da educação estressados e despreparados podem, com baixa remuneração e escolaridade, sem tempo para uma reciclagem ou mesmo aperfeiçoamento, ampliar sua carga de trabalho com crianças que requerem mais atenção no processo de ensino-aprendizagem? Outra inquietação está relacionada às escolas que ainda têm caráter tradicionalista. Nestas escolas predomina ainda um ensino sem interação, que não contribui para formar alunos pensantes ou reflexivos. Como, então, nestas escolas se classificam as crianças que apresentam o transtorno de déficit de atenção / hiperatividade? Sobre o modelo tradicionalista Mattos (2007) diz: 14 O sistema educacional tradicionalista penaliza quem tem TDAH, pois exige que os alunos permaneçam quietos (em geral, sentados em carteiras desconfortáveis), que sempre sigam todas as regras, que mantenham a atenção por horas seguidas e que sejam avaliados por provas monótonas e sem permissão para interrupções. (p. 75) O modelo tradicional de ensino dificilmente compreende as crianças com problemas de TDAH, pois tende a classificar esse comportamento destoante da maioria e das expectativas estabelecidas pelos padrões da escola ou sociedade. A criança com TDAH é considerada, por uma ótica do senso comum, como inadequada, indisciplinada, produto de falha na educação familiar, ou mesmo como fruto de uma característica própria da personalidade do aluno. Por fim, outra inquietação diz respeito ao seguinte: Como trabalhar com o processo de inclusão desses alunos, visto que os portadores do TDAH têm problemas de interação, comportamento e relacionamento com o outro? Perante essas dificuldades de concentração, atenção, impulsividade e agitação as crianças com o transtorno estarão sempre “extrapolando os limites” e a tendência tanto dos pais, quanto dos docentes e colegas de classe será sempre de deixá-los de castigo, de puni-los e excluí-los. Ser portador de TDAH significa ter sempre que se desculpar por ter quebrado algo, mexido ou ofendido alguém que não merecia por ter falado sem pensar; significa ter que abrir mão do tempo do recreio para concluir atividades que não foram realizadas no tempo certo, ficar chateado por ter tirado nota baixa, ou seja, significa ser responsabilizado por coisas pelas quais tem pouco controle, gerando sentimentos de inferioridade, baixa auto-estima, desinteresse pelos estudos e ansiedade. Segundo PauloMattos (2007), o portador de TDAH é descrito como sendo pessoa inquieta, que muda de interesses e planos o tempo todo, tendo dificuldades em levar as coisas até o fim, pois detesta coisas monótonas e repetitivas. Além disso, algumas são impulsivas no seu dia a dia, tendem a ter problemas na sua vida acadêmica (em geral, as queixas começam na escola), bem como na vida profissional, social e familiar. Por esses motivos é que acredito ser importante trazer esclarecimentos sobre o tema tanto para os profissionais da área de educação como para outros profissionais de áreas afins, bem como para os pais dessas crianças e comunidade em geral, pois com mais estudos e informação, melhor será a adaptação dessas crianças na sociedade. 15 É importante esclarecer, mais uma vez, que o TDAH não afeta partes do cérebro responsáveis pela inteligência. As crianças com TDAH são tão inteligentes quanto qualquer outra criança, porém as características do transtorno podem acarretar problemas na aprendizagem e podem ainda estar associados a outras comorbidades2 como: dislexia, Transtorno Desafiante de Oposição (TOD), Transtorno de Conduta (TC), Discalculia, Disortografia, etc. Dessa forma Brown (2007) comenta: “A síndrome do TDAH é complicada. Inclui dificuldades crônicas nas múltiplas funções cognitivas. Além disso, aqueles com essa síndrome têm, muitas vezes, dificuldades com outros aspectos do seu aprendizado, regulação emocional, funcionamento social ou comportamento. (...) O TDAH tem taxas extraordinariamente altas de co-morbidades (sic) dentro de virtualmente todos os transtornos psiquiátricos listados no DSM-IV (...)”. (p.138) Diante destes problemas de estudo, percebi o desafio de aprofundar estudos teóricos e práticos para conclusão deste trabalho monográfico e, neste sentido baseei meus estudos em dados bibliográficos e experiências vivenciadas em período de estágio na Escola Municipal Presidente Médici, onde atuei como professora regente do ensino Fundamental I. Os dados desta pesquisa foram obtidos por meio de questionários que foram respondidos por alguns professores atuantes na mesma escola. Os capítulos deste trabalho estão divididos em quatro. O primeiro será um breve percurso histórico sobre a descoberta desse transtorno, seus vários nomes e rótulos. No segundo capítulo tentarei descrever sobre o que é esse transtorno, falando brevemente sobre suas principais características: desatenção, hiperatividade e impulsividade, diagnóstico e tratamento. No terceiro descreverei sobre como o processo de inclusão deve estar entrelaçado com as crianças que sofrem com o transtorno e no quarto capítulo apresentarei dados e características da escola Presidente Médici – onde atuei como estagiária - e discutirei os dados colhidos para atender aos objetivos desta pesquisa. Faz parte do meu objetivo, esclarecer e divulgar mais sobre esse transtorno aos profissionais de educação, para que os mesmos possam encaminhar essas crianças para um tratamento adequado com especialistas da saúde e assim terem um desenvolvimento 2 Termo médico para o caso de uma pessoa ter mais de um transtorno. Ver Brown (2007), p. 138. 16 escolar mais bem aproveitado. Desse modo, as crianças que sofrem com o transtorno terão menor impacto na evasão escolar, na repetência, no sentimento de culpa, na incapacidade e frustrações que os portadores de TDAH costumam ter quando não conseguem acompanhar a rotina de uma sala de aula, do sistema social em que vivem e da perspectiva profissional que talvez não seja alcançada se não tiverem um tratamento e acompanhamento adequado. 17 2. BREVE HISTÓRICO SOBRE A DESCOBERTA DESSE TRANSTORNO, SEUS VÁRIOS NOMES E RÓTULOS Transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade (TDAH) é, segundo Barkley (2008), o atual termo usado para denominar os significativos problemas apresentados por crianças quanto à atenção, a impulsividade e a hiperatividade. Sendo assim, para que o termo atual chegasse a esse ponto, seu percurso histórico foi longo e diversos rótulos pejorativos foram dados a essas crianças, por não pararem um só segundo, por serem desatentas e impulsivas no seu modo de ser: estabanadas, agressivas, maus alunos, incontroláveis, bichos carpinteiros, preguiçosos, desatentos, desinteressados, barulhentos, mal-educados, etc. Esse transtorno teve sua primeira descrição oficial em 1902, quando um pediatra inglês, George Still3 apresentou dados clínicos de crianças com hiperatividade e outras alterações comportamentais, que em sua opinião não poderiam ser explicadas por falhas educacionais ou ambientais, mas que deveriam ser provocadas por algum transtorno cerebral desconhecido na época Still acreditava que essas crianças apresentavam grande “defeito no controle moral”, que demonstravam ter pouca “volição inibitória” e uma predisposição em alguns casos a cometer atos cruéis, malevolentes, ilegais e criminosos em seu comportamento e que as crianças que apresentavam essas características haviam adquirido um defeito em decorrência de uma doença cerebral aguda. Tempos depois, Still concordou com a afirmação de outro teórico e levantou a hipótese de que os déficits em volição inibitória, controle moral e atenção prolongada tinham relação causal entre si e com a mesma deficiência neurológica, estipulando-se então que o intelecto seria dissociado da “vontade” de modo que poderia ser conseqüência de alterações neurais. Posteriormente, diversos teóricos citados por Barkley (2008) usaram a teoria das lesões precoces, leves e despercebidas para explicar as deficiências no comportamento e 3 Revista elaborada pela Associação Brasileira do Déficit de Atenção – ABDA, p.4 e Barkley (2008), p. 15. 18 na aprendizagem. Dessa forma, foi observado que era possível obter melhorias temporárias na conduta com alterações no ambiente ou por meio de medicamentos, mas enfatizando a permanência relativa da deficiência mesmo nesses casos. Daí o destaque da necessidade de ambientes educacionais especiais para essas crianças. 19 2.1. Período de 1920 a 1950 Ainda segundo Barkley (2008), citando outros autores, o presente interesse dos EUA pelo transtorno surgiu devido a uma crise de encefalite epidêmica em 1917 – 1918, onde inúmeras crianças que sobreviveram a essa infecção cerebral ficaram com seqüelas comportamentais e cognitivas, sendo essas seqüelas caracterizadas ao que hoje conhecemos por TDAH. Sendo assim o autor descreveu: Essas crianças eram descritas como limitadas em sua atenção, na regulação das atividades e da impulsividade, bem como em outras capacidades cognitivas, incluindo a memória. Muitas vezes também eram consideradas socialmente perturbadoras. (p. 17) Na época o transtorno era chamado de “distúrbio comportamental pós-cefálico”, que na verdade era resultado evidentemente de uma lesão cerebral. Foi identificada nessa época a presença da hiperatividade em algumas dessas crianças, decorrente da lesão dos lobos frontais que resultaram em inquietude excessiva e incapacidade de manter o interesse em atividades, entre outras alterações do comportamento. Assim, Strauss e Lehtimen (1947), citados por Barkley (2008), fizeram recomendações substanciais sobre a educação das crianças com lesões cerebrais. São elas: (...) colocar as crianças em salas de aula menores e mais reguladas, e reduzir a quantidade de estímulos no ambiente que pudessem distraí-las. (...) os professoresnão poderiam usar jóias ou roupas com cores fortes, e poucos quadros adornariam as paredes para não interferir desnecessariamente na educação desses estudantes, tão propensos a se distrair. (p.18) Essas recomendações serviram como precursoras para os serviços educacionais especiais adotados muito depois em escolas públicas norte-americanas. Barkley (2008) afirma que: “apesar de pouca eficácia dessas salas, elas têm importância histórica, pois foram predecessoras, assim como investigadoras dos tipos de recursos educacionais que seriam incorporados à primeira versão da lei de 1975”. Tal lei 20 tornava obrigatória a educação especial para crianças com dificuldades de aprendizagem e transtornos comportamentais. Em 1937 e 1941 uma série de artigos sobre o tratamento de crianças hiperativas ou com problemas comportamentais foi criada marcando o inicio da terapia com medicação, em geral estimulantes. Em 1937, Charles Bradley, citado por Brown (2008), descobriu acidentalmente, um tratamento medicamentoso através do composto de anfetamina, eficaz para a síndrome do TDA. 21 2.2. Período de 1960 a 1980 No final da década de 1950 e começo da década de 1960 surgiram questionamentos críticos sobre o conceito de uma síndrome unitária de lesão cerebral em crianças. Inúmeras pesquisas acompanharam as crianças com disfunções cerebrais mínimas, a partir das quais o Instituto Nacional de Doenças Neurológicas e Cegueira reconheceu pelo menos 99 sintomas para o transtorno. Daí então, o conceito de disfunções cerebrais mínimas foi perdendo a força por ser considerado muito vago, pois se descobriu outros fatores dissociados de questões ambientais. Ao longo destes períodos de estudos, a medicina reconheceu o transtorno com as seguintes denominações: “Síndrome da Criança Hiperativa”, “Lesão Cerebral Mínima”, “Disfunção Cerebral Mínima”, “Transtorno Hipercinético”, “Transtorno Primário da Atenção”, etc. Para Brown (2007), o transtorno ainda pode ser descrito como: “... “Distúrbio de Déficit de Atenção”, “Disfunção Executiva”, “Disfunção Mínima Cerebral”, “Distúrbio do Controle Regulador” e “Síndrome Disexecutiva”. O conceito da síndrome do TDA mencionado aqui inclui muitas dificuldades descritas por esses vários rótulos, dificuldades que, muitas vezes, aparecem juntas e têm a tendência de responder a tratamentos semelhantes”. (p.15). O que Thomas Brown (2008) cita em seus estudos é que todos os rótulos que o TDAH já teve, estão relacionados a uma de suas características e em muitos casos o transtorno ainda está associados a várias dessas características. Nessa mesma época, no final da década de 1950 e começo da década de 1960, o termo “disfunção cerebral mínima” foi substituído por rótulos mais específicos aplicados a transtornos cognitivos, comportamentais e da aprendizagem, tornando-os mais homogêneos como: dislexia, transtorno da linguagem, dificuldades de aprendizagem e hiperatividade. Esses novos rótulos foram considerados baseados nos déficits observados na criança, deixando de lado as doenças relacionadas ao cérebro que não poderiam ser observadas. 22 Em 1969, o transtorno não era mais atribuído a lesões cerebrais, mas era mantido o foco nesse mecanismo. Acreditava-se também que o transtorno tinha um conjunto de sintomas predominantes e homogêneos, que destaca o nível excessivo de atividade ou hiperatividade. Em 1970, a hiperatividade era atribuída a causas psicológicas, ou seja, conseqüência de uma criação que gerava crianças “mimadas” ou de ambientes familiares delinqüentes. Sendo assim, a idéia de que uma criação inadequada ou problemática causa TDAH, resulta dessa época. Nessa mesma época de 1970, pesquisadores notaram que crianças hiperativas tinham também a tendência de serem portadoras de problemas crônicos de desatenção. A administração de anfetamina resultava em uma melhora notável nos problemas comportamentais e no desempenho acadêmico. Então, na década de 1970, os medicamentos estimulantes estavam gradualmente se tornando o tratamento mais indicado para os sintomas comportamentais associados ao TDAH e permanecem até hoje como tal. Na década de 1970, a pesquisa teve grande progresso e mais de dois mil estudos foram publicados sobre o transtorno de déficit de atenção e hiperatividade. Em 1980, a Associação Americana de Psiquiatria usou pela primeira vez o termo: “Distúrbio de Déficit de Atenção” como um diagnóstico oficial. Nessa mesma época, o Manual Diagnóstico, conhecido como DSM, reconhece que o distúrbio origina-se na infância e que as dificuldades permanecem, muitas vezes, até a idade adulta. 23 2.3. O progresso atingido nesse percurso histórico A Associação Americana de Psiquiatria, em 1980, usou pela primeira vez o termo “Distúrbio de Déficit de Atenção” como um diagnóstico oficial. Na época, a associação reconheceu as dificuldades de atenção com ou sem os problemas hiperativos de comportamento, como sendo um distúrbio psiquiátrico. Nota-se também nessa versão, que apesar desse distúrbio normalmente se iniciar na infância, as dificuldades com a atenção, na maioria das vezes, permaneciam até a idade adulta O progresso nos estudos sobre o transtorno continuou e, em 1980, o TDAH passou a ser o transtorno psiquiátrico infantil mais bem estudado da última década. Essa década ficou marcada pela publicação do transtorno no DSM-III, sendo criados subtipos do TDA baseados na presença ou não da hiperatividade. Esse manual passado por novas atualizações, ainda descreve que para ser portadora do TDAH, a criança tem de ter no mínimo seis de uma lista de nove sintomas, segundo o Manual Diagnóstico – DSM-IV (1995). A exemplificar as três subcategorias do TDAH: • Forma predominantemente desatenta, quando existem mais sintomas da desatenção. Este, segundo os estudos de Mattos (2008), é a forma mais comum na população em geral; • Forma predominantemente hiperativa / impulsiva, quando existem mais sintomas da hiperatividade e impulsividade, esta é a forma mais rara e a • Forma combinada, quando existem muitos sintomas das duas outras formas mencionadas acima. Esta é a forma mais comum nos consultórios e ambulatórios, provavelmente porque causa mais problemas para o próprio portador e para os demais, o que leva os pais a procurarem ajuda para o filho, segundo o autor Mattos (2008). Em 1987, uma revisão no Manual Diagnóstico provocou uma mudança no nome de “Distúrbio de Déficit de Atenção”. Dessa condição para Transtorno de Déficit de 24 Atenção / Hiperatividade (TDAH) e desde então, o nome oficial continua agregando a desatenção aos problemas de comportamento hiperativos, negligenciando a importância independente das dificuldades cognitivas da síndrome. Segundo Barkley (2008), desde o ano 2000, o reconhecimento internacional do TDAH é devido ao desenvolvimento de grupos de apoio para pais em muitos países e principalmente pelo acesso a Internet, meio de comunicação que, segundo ele, deve ganhar maior crédito, pois as informações sobre o TDAH podem ser mostradas quase que instantaneamente a qualquer hora e lugar por meio desse tipo de conexão. Porém, nem todas as informações obtidas pela internet devem ser levadas em consideração, visto que há possibilidades de conter informações deturpadas. Sendo assim, em 2002, outro avanço pôde ser comemorado pelos pais e profissionais que têm parentes ou amigos sofrendo desse transtorno, que é a criação de uma Declaração de Consenso Internacional sobre o TDAH. Esta foi assinada por mais de 80 dos principais profissionais cientistas especializados nesse transtorno em todo o mundo.Dessa forma Barkley (2008) conclui: O TDAH adquiriu maturidade como transtorno e tema de estudo científico sendo amplamente aceito pelos profissionais pediátricos e da saúde mental como uma deficiência legítima do desenvolvimento. Atualmente, ele é um dos transtornos da infância mais estudados (...) Dessa forma, podemos verificar que o transtorno hoje, está muito bem reconhecido e deve ser considerado por todos como um problema sério, que pode acontecer em algumas crianças em fase de desenvolvimento e que necessitaram de melhor acompanhamento. 25 3. CARACTERÍSTICAS GERAIS DO TRANSTORNO DE DÉFICIT DE ATENÇÃO E HIPERATIVIDADE De acordo com o manual DSM-IV (Diagnostic and Statistical Manual, 4ª edição) o TDAH se caracteriza por uma combinação de dois grupos de sintomas: • Desatenção; • Hiperatividade e impulsividade. Esses sintomas são listados no DSM-IV para tornar o diagnóstico mais padronizado e se caracteriza da seguinte forma: A) Sintomas da desatenção (devem ocorrer frequentemente): 1. Prestar pouca atenção a detalhes e comete erros por falta de atenção. 2. Dificuldade de se concentrar tanto nas tarefas escolares quanto em jogos e brincadeiras. 3. Numa conversa, parece prestar atenção em outras coisas e não escutar quando lhe dirigem a palavra. 4. Dificuldade em seguir instruções até o fim ou deixar tarefas e deveres sem terminar. 5. Dificuldade de se organizar para fazer algo ou planejar com antecedência. 6. Evita, antipatiza ou reluta a envolver-se em tarefas que exijam esforço mental constante (como tarefas escolares ou deveres de casa); 7. Perda de objetos necessários para a realização de tarefas ou atividades do dia-a-dia. 8. Distrai-se com muita facilidade com coisas à sua volta ou mesmo com os próprios pensamentos. Daí que surgem as expressões que muitos pais e professores usam quando percebem sua distração: “Parecem que vivem no mundo da lua” ou que “sonham acordados”. 9. Esquecem coisas que deveriam fazem no dia-a-dia. B) Sintoma de hiperatividade e impulsividade (devem ocorrer frequentemente): 26 1. Ficar mexendo as mãos e pés quando sentados ou se mexer muito na cadeira. 2. Dificuldade de permanecer sentado em situações em que isso é esperado (sala de aula, mesa de jantar, etc.). 3. Correr ou escalar coisas, em situações nas quais isto é inapropriado (em adolescente e adultos pode se restringir a um sentir-se inquieto por dentro). 4. Dificuldades para se manter em atividades de lazer (jogos e brincadeiras) em silêncio. 5. Parecer ser “elétrico” e a “mil por hora”. 6. Falar demais. 7. Responder a perguntas antes de elas serem concluídas. È comum responder à pergunta sem ler até o final. 8. Não conseguir aguardar a sua vez (nos jogos, na sala de aula, em filas, etc.). 9. Interromper os outros ou se meter nas conversas alheias. Ou seja, de acordo com o DSM-IV, os sintomas do TDAH devem aparecer em um grau não adaptado e incoerente com o nível de desenvolvimento, tais intensidades dos sintomas apresentados vão causar problemas consistentes, diferenciando-o da maioria, pois apresentaram problemas significativos das habilidades sociais, acadêmicas ou ocupacionais. As crianças com TDAH são tão inteligentes quanto qualquer outra criança e caso apresentem problemas de aprendizagem devem ser consideradas outras comorbidades associadas ao transtorno, como: dislexia, Transtorno Desafiante de Oposição (TOD), Transtorno de Conduta (TC), Discalculia, Disortografia, etc. 27 3.1. As dificuldades das relações sociais nas crianças com TDAH Na criança, as condutas sociais são desenvolvidas nas relações de comunicação entre os familiares, professores, irmãos, colegas, parentes e outras crianças. Com essas relações sociais bem desenvolvidas, elas conseguem perceber e assimilar os papéis e as normas sociais estabelecidas em diversas situações e contextos, como se comportar na escola, em museus, etc. Essas habilidades são adquiridas mediante a aprendizagem (observação, imitação, ensaio e consequências). Sendo assim uma das teorias defendidas por Vygotsky citado por Rego (2002) refere-se à relação indivíduo/sociedade e afirma o seguinte: As características tipicamente humanas não estão presentes desde o nascimento do indivíduo, nem estão presentes desde o nascimento do indivíduo, nem são mero resultado das pressões do meio externo. Elas resultam da interação dialética do homem e seu meio sócio-cultural. Ou seja, ao mesmo tempo em que o homem transforma seu meio para atender as suas necessidades básicas, ele também se transforma. Para Bonet, Soriano e Solano (2008) o nosso sistema de comunicação é composto por um conjunto de elementos expressivos, receptivos e interativos que vão se combinando e se ajustando a cada situação e que, portanto, as dificuldades na relação com os outros podem ser explicadas por diferentes déficits no lobo frontal, que é uma parte do cérebro responsável pelo desenvolvimento das funções executivas. As funções executivas do cérebro são responsáveis não só pelo cognitivo, mas também, são as que fornecem mecanismos para a auto-regulação. As pessoas que são portadoras do TDAH por terem deficiência de atenção e dos processos cognitivos responsáveis por receberem e processarem as informações das mais diferentes fontes, não compreendem de forma correta os sinais para o bom desenvolvimento das interações sociais e o conhecimento das normas que regulam essas informações. Além disso, apresentam dificuldade de controlar seus impulsos e seguir as normas, têm dificuldades para resolver problemas, podem ser bruscos ou lentos, 28 movem-se em excesso, dão respostas inadequadas, não conseguem controlar suas emoções e tem dificuldade de relacionamento com os outros. Assim, Barkley (2008) cita Pelham e Bender4 (1982) que estimaram que “mais de 50% das crianças portadoras de TDAH têm problemas significativos nos relacionamentos sociais com outras crianças”. Em geral, essas crianças são excluídas constantemente das brincadeiras e jogos por não respeitarem as regras, parecem estar sempre distraídas, não conseguem esperar por sua vez de falar, são sempre chamadas à atenção por seus professores, pais, amigos, familiares e funcionários da escola; são desorganizadas e desatentas, conversam muito em classe, não param quietas, provocam seus colegas e amigos e quando sentadas estão sempre mexendo os pés ou as mãos. O cognitivo é responsável pela percepção e processamento das informações que recebemos das mais diferentes fontes. A capacidade de aprender através das experiências boas ou ruins, dos estímulos e das conseqüências nas respostas, assim como a habilidade da atenção, concentração, inibição e controle da excitação são tarefas executadas pelo cognitivo das pessoas. O desenvolvimento do estilo cognitivo na criança ajuda na comunicação, no processo de maturação e de construção dos esquemas mentais, mas quando a criança é portadora de TDAH seu estilo cognitivo não será desenvolvido de forma perfeita, apresentando muitas dificuldades, conforme descrevem as autoras Bonet, Soriano e Solano (2008): As crianças com TDAH podem apresentar dificuldades desde o primeiro nível, desenvolvendo uma linguagem interna pobre e inadequada (eventos cognoscitivos), o que impede o desenvolvimento adequado dos processos da metacognição e dos esquemas mentais. (p.56) Conseqüentemente, as crianças que possuem esse déficit terão problemas na atenção/concentração, sem necessariamente ter problemas com a hiperatividade, ou ainda poderão ter problemas na atenção/concentração e ainda serem impulsivas, hiperativas. Essas crianças necessitam de um guia externo,têm dificuldades na organização das informações, dificuldades para cumprir horários e prazos para entrega 4 Mais informações consultar referência: Barkley (2008), p. 210. 29 de trabalhos e avaliações, dificuldade em prestar atenção, dificuldade nas relações sociais e são pouco autônomas. Sendo assim, “os déficits cognitivos estão na base de todos os problemas das crianças com TDAH: na atenção, na concentração, na impulsividade, [...], na aprendizagem e na solução dos problemas sociais” (Bonet, Soriano e Solano, 2008, p.58). Ainda de acordo com as autoras citadas anteriormente as características básicas do transtorno são a desatenção, que por sua vez, que dizer que a concentração em uma determinada tarefa por muito tempo pode não ser muito atrativo para quem sofre desse transtorno, mas não quer dizer que o tempo todo a pessoa que seja portadora de TDAH esteja desatenta. Esse transtorno faz com que a capacidade atencional seja diminuída de forma persistente, aumente notavelmente a agitação e a impulsividade e cuja freqüência são maiores que aquelas tipicamente observadas nos demais indivíduos. Esses comportamentos seguem em muitas situações e são mantidos durante toda a vida, porém na adolescência e na vida adulta algumas manifestações tendem a diminuir. Na escola, as principais queixas dos professores em relação a esses alunos são de que se tratam de crianças muito ativas e inquietas, que têm dificuldades na aquisição de hábitos, são desobedientes, vivem se acidentando, agem de forma imatura nas brincadeiras que possuem regras, não cooperam em atividades em grupo e não prestam atenção nas explicações. Tais atitudes podem prejudicar o desempenho escolar e a vida social dessa criança, pois se torna muito comum que nas escolas os portadores de TDAH tenham rendimento escolar baixo, incapacidade para responder as exigências da aprendizagem, dificuldade para seguir normas e para aprender com a própria experiência, já que o transtorno faz com que eles tenham dificuldade de perceber a si próprios e aos outros. Os portadores de TDAH têm dificuldade de avaliar as conseqüências das próprias ações, têm baixa auto-estima e integração social pobre e agressiva. 30 3.2. Aprofundando mais as características do transtorno A impulsividade, que por sua vez se caracteriza por dificuldade no controle dos impulsos, dificuldade de avaliar seus atos antes de agir, deixando de lado a linguagem interna que em pessoas com nível de desenvolvimento equilibrado utilizam antes de se expressar ou agir, é o famoso falar consigo mesmo. As crianças portadoras desse transtorno são consideradas espontâneas, atiradas e por muitas vezes, consideradas mal- educadas. As conseqüências dessas ações atingem mais a área social, correspondentes a ambientes em que necessitam da interação, do respeito ao próximo, da habilidade da comunicação e da relação com o outro por meio de regras (direitos e deveres). Outra característica do transtorno é a hiperatividade (ou agitação) que é o excesso de atividade em relação à idade e às exigências do entorno. A hiperatividade não está só ligada à atividade motora ou verbal, ela também deve estar associada à freqüência, à duração e à intensidade da atividade, à capacidade de persistência para inibi-la e controlá-la, ajustando-a um contexto e a um fim. É fácil perceber isso nas crianças com o transtorno, pois elas parecem que tem um “motorzinho” que nunca descarrega, está em constantes movimentos, quando sentadas ficam se balançando ou mexendo os pés e mãos, se permanecem sentadas por muito tempo, mudam de posição, pois não conseguem ficar sentadas ou quietas, tocam tudo com as mãos, falam demais, cantarolam , assobiam ou fazem barulhos com a boca quando na verdade deveriam estar caladas e quietas, sentem menos necessidades de descansar ou dormir, mordiscam, chupam, mordem tudo (lápis, borracha, mangas das camisas, etc.). Por conseqüência, essas crianças são consideradas estabanadas, quebram as coisas, deixam objetos caírem, fazem muito barulho e são pouco cuidadosas. Por causa do jeito incontrolável acabam sendo rejeitados pelos colegas e adultos, atrapalham o ritmo da aula, o que acaba repercutindo no aprendizado escolar. Sobre isso Paulo Mattos (2007) diz: Ter TDAH significa ter sempre que se desculpar por ter quebrado ou mexido em algo que não deveria, por fazer comentários fora de hora, por não ter sido suficientemente organizado... Ou seja, significa ser responsabilizado por 31 coisas sobre as quais, na verdade, se tem pouco controle! Torna-se inevitável a sensação de que se é um sujeito meio inadequado. (p.76) As crianças com TDAH são inteligentes, porém tem dificuldades em focalizar a atenção, ouvir e lembrar-se das coisas, algumas ainda podem ser distraídas, impulsivas, agitadas, ter dificuldades para aprender, organizar-se, terminar as tarefas e até para fazer amizades, portanto a parceria com a escola na ajuda para identificar o transtorno precocemente é fundamental para uma vida mais saudável para a criança. A debilidade no funcionamento cognitivo e conseqüentemente nas funções executivas (responsáveis pela atenção, processamento de informações, flexibilidade cognitiva, memória operacional, controle inibitório e o estabelecimento de objetivos), na linguagem (receptiva e expressiva) e nas habilidades motoras fazem parte do quadro característico do TDAH, onde tais comprometimentos afetam a capacidade de aprendizagem e o desempenho acadêmico, impossibilitando o educador de obter um resultado satisfatório com as crianças com esse transtorno. É nesse sentindo que percebemos a importância do professor no processo de aprendizagem das crianças com déficit, pois os mesmos podem identificar quando algo não vai bem, e, em parceria com especialistas da área de saúde, os pais e familiares do aluno, podem desenvolver atividades que consigam atingir tais crianças, desenvolvendo estratégias eficazes de ensino e, assim, contribuindo para a melhora da qualidade de suas vidas. 32 3.3. A importância do diagnóstico e outros fatores O Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade, de modo geral, quando diagnosticado nas crianças encontra-se freqüentemente ligado à existência do mesmo transtorno ou, pelo menos, alguns dos sintomas dele, ou no pai ou na mãe. A incidência do TDAH em parentes de crianças com esse diagnóstico é, no mínimo, duas vezes maior que a encontrada no restante da população (esse número pode chegar até dez vezes). Mesmo o TDAH sendo de origem genética não existe um único gene que defina o transtorno, pois o mesmo é chamado de poligênico já que são vários os genes que em conjunto dão origem ao transtorno. Barkley (2008) afirma: “as novas pesquisas sobre hereditariedade e genética mostram uma forte base hereditária para o TDAH (...)” Está certo de que o ambiente familiar não é fator determinante para a origem do transtorno, pois na sua grande maioria o transtorno tem uma participação genética em torno de 90%, o que, segundo Mattos (2007), torna essa porcentagem muitíssima em termos da medicina. Porém a interação com o ambiente também pode somar-se aos sintomas. Durante a gravidez, alguns fatores não genéticos podem estar envolvidos no aparecimento do transtorno, como: o consumo de álcool, o uso de drogas, desnutrição, fumo e problemas durante o parto. No entanto, para que uma pessoa possa ser identificada como portadora do TDAH é necessário que estejam presentes no mínimo seis de uma lista de nove sintomas de desatenção e/ou, no mínimo, seis de uma lista de nove sintomas de hiperatividade de acordo com o manual DSM – IV, pois não existem pessoas que nãotenham nenhum dos sintomas que caracterizam o transtorno. O que pode acontecer é que em algumas pessoas os sintomas são maiores do que no restante da população e é nessas que os sintomas do transtorno aparecem. Dentre os inúmeros genes que caracterizam o transtorno, duas substâncias têm grande influência no comportamento das pessoas portadoras de TDAH e estão relacionados à produção de dopamina e noradrenalina, que são substâncias existentes no sistema nervoso e que permitem a comunicação entre as células nervosas. Nos portadores de TDAH essas substâncias estão alteradas, fazendo com que as informações não sejam passadas para as células nervosas, que são os chamados neurotransmissores. 33 Esses neurotransmissores são importantes para a comunicação do cérebro com sua região anterior, com o lobo frontal e com várias outras regiões do cérebro. O processo de diagnostico do TDAH é clínico, porém não existe até o presente momento nenhum exame específico ou teste que possa identificar sozinho o transtorno. O que se realiza são vários testes com abordagem multidisciplinar, ou seja, o médico vai coletar informações não apenas da observação da criança durante a consulta, mas também realizar entrevistas com os pais e/ou com os cuidadores dessas crianças, solicitar informações da escola sobre seu comportamento, sociabilidade e aprendizado, além da escala de avaliações da presença e gravidade desses sintomas descritos no Manual Diagnóstico e também pela consulta ao Código Internacional de Doenças, da Organização Mundial de Saúde, que está na sua décima versão (CID-10). Contudo é preciso ressaltar que esses critérios adotados não sejam utilizados de forma inadequada, pois os Manuais nunca devem ser usados para estigmatizar as pessoas, assim como é importante lembrar que o diagnóstico é o início do tratamento e não o seu fim. O tratamento envolve várias abordagens, como: intervenções psicoeducacionais (com a família, paciente e a escola), intervenções psicoterapêuticas, psicopedagógicas e de reabilitação neuropsicológicas e por fim intervenções psicofarmacológicas. 34 4. O QUE DIZ O PROCESSO DE INCLUSÃO SOBRE ESSE TRANSTORNO Segundo Bonet, Solano e Soriano (2008) para o processo de aprendizagem ocorrer é necessário que se preste bastante atenção, pois este mecanismo é quem permite passar as experiências para a memória, operação esta que supõe um armazenamento de dados e que vai solidificar as informações, permitindo que sejam armazenados a longo prazo para posterior utilização. Essa capacitação de armazenamento de dados necessitará do reconhecimento do estímulo, ou seja, reconhecer o seu significado e decidir se é interessante o suficiente para armazená-lo ou não. Esse processo implica a organização dos estímulos no cérebro, sendo assim as autoras afirmam: “... o processamento de dados ou a aprendizagem é um processo cognitivo ativo, por meio do qual acrescentamos novas informações às armazenadas anteriormente, sendo necessária a capacidade de organização e o uso de tais dados.” (p.90) Com isso, percebemos que o processo de aprendizagem não está limitado a um sistema decoreba de ensino de conteúdos, mas de um processo contínuo que opera sobre todos os dados que alcançam certo grau de significação e no qual se utiliza de diferentes capacidades cognitivas. Então, na escola é indispensável que no processo de aprendizagem as crianças prestem bastante atenção às explicações, que se concentrem ao máximo para ouvir o que está sendo ensinado e que anotem o que está sendo dito e participem com questionamentos interagindo com o outro e com o professor, para que possam armazenar todas as informações significativamente. Porém para uma criança que sofre com o transtorno de déficit de atenção e hiperatividade essa é uma tarefa difícil e para quem o observa e percebe seu desinteresse, ou mesmo sua desatenção ao que está sendo explicado, ou, ainda, as brincadeiras nas horas erradas e que acabam atrapalhando a aula, tirando a concentração dos colegas e provocando um incômodo no professor. Este, conseqüentemente, chamará 35 sua atenção, mandando-o para a diretoria, tirando-o da sala, ou mesmo mandando bilhetinhos para os pais comparecerem à escola. Para quem não entende esse transtorno, a atitude sempre será de advertir, irritar- se com ele ou mesmo castigar. Os coleguinhas também podem ir se afastando quando ele não espera a sua vez nos jogos, ou se intromete nas conversas dos outros, atrapalha a aula o tempo todo, é impulsivo, não escuta e nem espera sua vez de falar. Então, essas crianças acabam ficando de lado nas brincadeiras, nos trabalhos em grupo, na escola e, quando o problema não é percebido a tempo, ao entrarem na adolescência, acabam abusando de drogas, de bebidas alcoólicas e se metendo em confusões ainda maiores, como roubo. Para o portador do TDAH, entender e perceber suas atitudes é quase impossível, pois quem sofre com esse transtorno tem dificuldades em perceber que isto acontece porque, além de não prestar atenção às regras do jogo, não pára quieto e não consegue seguir as instruções de alguém. Não percebe também que, quando erra, ele não aceita as críticas, achando sempre que todos estão errados, que estão sendo injustos com ele e apresenta atitudes de violência, querendo brigar, xingando todo mundo, ficando muito bravo e achando que sempre tem razão em tudo e que sabe tudo. Dentre muitos depoimentos colhidos em atendimento clínico e analisados por Thomas Brown (2008), um feito pelos pais de uma criança diagnosticada com TDA/H revelou o seguinte: “Nosso filho, Phil, tem 12 anos. Sempre o achamos uma criança bem difícil de criar. Desde anos da pré-escola, tem sido realmente teimoso. Sempre tivemos problemas para fazer com que seguisse instruções em casa. Seus professores têm reclamado que ele não ouve ou obedece a ordens na escola (grifo meu). Está sempre discutindo com os membros da família e com outras crianças; algumas vezes as discussões chegam às vias de fato. (...)” (p.78) Com esse depoimento, percebemos que, muitas vezes, lidar com uma criança que apresenta tais características sem conhecer que tal comportamento é inerente à sua personalidade leva ao julgamento de que é mal-educado e que deve ser castigado de alguma forma. Quem sofre desse transtorno tem dificuldade em entender porque os amigos o evitam ou o excluem das brincadeiras; isso gera um sentimento muito negativo na criança, podendo se transformar em algo mais grave, pois como seu comportamento é involuntário, difícil de controlar, difícil de ser percebido por ele 36 mesmo, acaba gerando para a criança com TDA/H um sentimento de tristeza, baixa auto-estima, estado de ânimo rebaixado, depressão, ansiedade, somatização (sintomas físicos, como dores de cabeça ou de barriga), dentre outros sintomas. Sobre isso, remeto-me a outro depoimento também feito pelos pais de uma menina com o TDA/H e relatado nos estudos feitos por Brown (2008) que declara o seguinte: “Nossa filha tem 10 anos. Seu TDAH não foi diagnosticado antes do terceiro ano, provavelmente porque é extremamente inteligente e não representa problema algum aos professores. (...) mas teve problemas de relacionamento com as outras crianças e não conseguiu manter e fazer amizades desde que havia saído da pré-escola. Muitas crianças simplesmente não gostam dela. Fico de coração partido quando vejo como fica desapontada quando todas as outras meninas recebem convites para festas de aniversários e ela não recebe nenhum. (...) Ela é muito mandona e não sabe como cooperar com as outras crianças da sua idade.” (p.77) Nos dois depoimentos descritos mostram que tanto os meninos quanto as meninas tem problemasno comportamento apresentando uma tendência a exibir dificuldades de relacionamento, no temperamento e na comunicação com seus pares, da mesma forma como tendem a apresentar problemas significativos na cooperação com seus pais e outros adultos e tais comportamentos, para quem desconhece os sintomas desse transtorno, podem aparentar má educação, birra, mimo ou problemas de mau comportamento, porém essas atitudes podem ter sido agravadas, senão causados, por outros problemas que estão atrelados ao TDA/H, como o desenvolvimento da linguagem. Esta é importante para o processo de interação em qualquer tipo de relacionamento, pois é atreves dela que se vai promover essa interação. Então, é por isso que falar de TDAH sem falar do processo de inclusão, ou seja, educação inclusiva é algo impossível. A inclusão de crianças com necessidades educativas especiais passou a ser vigorada em lei desde 2008 pela Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva5; tal lei diz respeito à inclusão de todos os alunos com necessidades educativas especiais mediante matrícula em escolas regulares de ensino, definindo também os padrões de ensino e como deve ser oferecida a educação para 5 Mais detalhes a esse respeito podem ser encontrados em: Revista Nova Escola – Educação Especial, n° 24, p. 10 - 15. Ver referência no final do trabalho. 37 todos os portadores de deficiência. Com isso, as escolas especiais continuam existindo no turno oposto, fazendo um papel de auxiliar das escolas regulares e firmando parcerias para oferecer atendimento especializado no contra-turno. Abordar a educação inclusiva em escolas regulares significa preparar o professor para tal necessidade, revelar o significado do termo inclusão e sua implicação nas escolas regulares, pois há a necessidade de uma reestruturação das escolas a fim de se adequarem da melhor maneira à especificidade de cada criança, melhorando não só de forma estrutural, mas também de forma educacional, revendo ritmos de aprendizagem, conteúdos, estilos, reconhecendo as necessidades escolares e buscando a qualidade educacional. Qualidade esta, que vai ter que partir desde o diretor da escola até o funcionário que cuida da portaria da escola, pois todos lidarão com crianças que possuem suas particularidades especiais. No reconhecimento dessa complexa diversidade é que a Secretaria de Educação e a Secretaria de Educação Especial juntas solidificaram a criação de um material didático-pedagógico intitulado “Adaptações Curriculares”, que compõe o conjunto dos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN (1998), na tentativa de subsidiar os professores na sua tarefa de adaptações e integração desses alunos na escola regular de ensino e que propõe o seguinte: “(...) a adequação curricular ora proposta procura subsidiar a prática docente propondo alterações a serem desencadeadas na definição dos objetivos, no tratamento e desenvolvimento dos conteúdos, no transcorrer de todo processo avaliativo, na temporalidade e na organização do trabalho didático- pedagógico no intuito de favorecer a aprendizagem do aluno.” (p. 13) Tais adaptações baseiam-se do reconhecimento da diversidade que é marca de cada indivíduo, na necessidade de respeitar e de atender a essa dinamicidade, visando que o currículo seja uma ferramenta básica da escolarização tornando-se necessário as adaptações curriculares como estratégia e também critérios da atuação docente no sentido de que alcance a todos os alunos de modo que estes aprendam, considerando-se o processo de ensino-aprendizagem e a diversificação de necessidades dos próprios alunos. Sendo assim, Santos (2002), em seu artigo afirma: “a Educação Inclusiva se contrapõe à homogeneização padronizada de alunos, conforme critérios que não respeitam a diversidade humana.” 38 Segundo a Revista Nova Escola, edição especial sobre inclusão, em 2008 as escolas regulares passaram a atender as crianças com necessidades educativas especiais, tendo uma visão ainda um pouco limitada em relação ao que quer dizer o processo de inclusão. Para as doutorandas DueK e Naujorks (2007) a educação inclusiva é: “A inclusão, enquanto princípio educacional, volta-se para a construção de um projeto de ensino-aprendizagem norteado pelo respeito e a valorização das diferenças, visando oferecer a todos os alunos, não obstante suas peculiaridades, a oportunidade de construir o conhecimento no cerne da escola comum.” Essas escolas aceitavam matricular as crianças que necessitavam de uma educação especial tendo uma visão integracionista, ou seja, uma criança com deficiência só permanecia nessa escola regular se acompanhasse o ritmo da turma, então, o professor que muitas vezes não se sentia preparado para lidar com essa situação, poderia alegar que tal criança não aprendia igual às demais e, com isso, seria melhor retirá-lo da classe regular de ensino, a fim de voltar às escolas especializadas. Apesar de a educação inclusiva, sob a forma da legislação que rege sobre a Educação Especial, nada falar a respeito desses casos ou ainda não abranger de forma clara as crianças com dificuldades de aprendizagem ainda desconhecidas ou sobre as quais pouco se sabe, como é o caso do TDAH, há necessidade de que essas crianças devam ser tratadas de modo especial, tendo sua educação diferenciada de modo que a aprendizagem seja alcançada no seu ritmo. Em geral, sob olhar comum, elas são tidas como mal educadas, preguiçosas, incapazes intelectualmente, e, portanto, agredidas em seu direito de ser e de amar. Contudo, para isso acontecer, além de o professor se especializar, tem-se a necessidade de quebrar as barreiras paradigmáticas de como a educação é vista e de que o processo de inclusão é mais do que interagir ou acolher o outro em escolas regulares. Hoje, o processo de inclusão não se refere só à integração da criança com necessidades educativas especiais em escolas regulares, mas se refere principalmente às adaptações que deverão ser feitas para que o ensino-aprendizagem seja adequado a ela e que a interação e a aprendizagem sejam condições fundamentais para que esse processo ocorra. Além disso, a legislação que rege sobre a educação especial precisa esclarecer 39 quais crianças necessitam dessa educação, considerando as especificidades daquelas que sofrem com o TDAH. A visão de que crianças com deficiência só necessitavam de médicos e não de educação mudou a partir da Declaração Universal dos Direitos Humanos (1948), quando é garantido o acesso de todas as pessoas à educação, através do artigo XXVI, que regulamenta: “Toda pessoa tem direito à instrução. A instrução será gratuita, pelo menos nos graus elementares e fundamentais...” Com o passar dos anos, a velha idéia de integração foi reformulada e garantido o processo da inclusão e o acesso de todas as crianças à educação, independente da suas limitações. São criados então documentos como a: Declaração Mundial de Educação para Todos (1990), o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA (1990), que dá a pais ou responsáveis a obrigação de matricular os filhos em escolas regulares, a Declaração de Salamanca (1994), que define as políticas, princípios e práticas da Educação Especial e influi nas políticas públicas da Educação. Sendo assim, o processo de inclusão tem que respeitar a individualidade de cada um, possibilitando a todos uma educação igualitária e amorosa, onde as crianças se sintam à vontade e não diferentes umas das outras. É preciso entender as particularidades em diferentes situações do cotidiano escolar, para poder ajudar as crianças com dificuldades de aprendizagem, esquecendo-se qualquer classificação ou rotulação e voltando-se para total inclusão. Nesse processo,ainda vale destacar o caminho histórico percorrido para a inclusão das pessoas com necessidades especiais até a aceitação das diferenças individuais como mais um direito a acrescentar e jamais como obstáculo. O processo de inclusão deve ser encarado como uma nova maneira de pensar e encarar a função educativa, assumindo-se como prioridade as relações igualitárias, comprometida com a cidadania e com a formação de uma mentalidade não excludente que promova o convívio harmonioso com a diversidade. 40 5. METODOLOGIA E ANÁLISE DE DADOS Neste capítulo pretendo discorrer sobre o método, análise de dados e descrever como é a escola escolhida para esse trabalho e quem são os professores que contribuíram para que todos os objetivos traçados no início desse trabalho fossem alcançados. 5.1. A escolha do método de pesquisa Para essa pesquisa, pensei utilizar a metodologia qualitativa descritiva, no sentido de considerar que há uma relação dinâmica entre o mundo real e o sujeito entrevistado. Esse tipo de pesquisa proporcionou que meus objetivos fossem alcançados na medida em que permitiu observar, registrar, analisar e correlacionar fatos ou fenômenos a partir do significado que entrevistados dão às suas ações. Sendo assim, essa metodologia permitiu traduzir e interpretar as opiniões e informações transmitidas pelos entrevistados, obtendo uma melhor classificação e análise desses dados. Segundo os autores Cervo, Bervian e Da Silva (2007), o modelo de pesquisa qualitativa descritiva permite: “conhecer as diversas situações e relações que ocorrem na vida social, política, econômica e demais aspectos do comportamento humano, tanto individualmente como em grupo e/ou de comunidades mais complexas.” (p.61) É nesse sentido que acredito relacionar os dados obtidos da pesquisa com as situações vivenciadas no momento da pesquisa e na troca de experiências que fui privilegiada ao estagiar com pessoas generosas e disponíveis para oferecer-me informações importantes. Este modelo de pesquisa é desenvolvido principalmente por pesquisadores na área de ciências humanas e sociais por abordarem dados e problemas a partir de sua dinâmica e processos. 41 Os autores Cervo, Bervian e Da Silva (2007) ainda afirmam que esse tipo de metodologia pode assumir diversas formas, entre as quais se destacam: “Estudos Descritivos, Pesquisa de Opinião, Pesquisa de Motivação, Estudo de Caso e Pesquisa Documental.” Nesse aspecto, o tipo da apresentação desse trabalho se caracteriza por um Estudo de Caso, pois ainda segundo a esses autores um estudo de caso é: “a pesquisa sobre determinado indivíduo, família, grupo ou comunidade que seja representativo de seu universo, para examinar aspectos variados de sua vida.” (p.62). Contudo, devido ao curto tempo para aplicação e análise desses dados, foi escolhida como técnica de pesquisa a utilização de questionário, pois essa técnica, segundo Marconi e Lakatos (2002), proporciona: “respostas mais rápidas e precisas, maior liberdade nas respostas, em razões do anonimato e menos risco de distorção, pela influência do pesquisador”, dentre tantas outras vantagens listadas pelas autoras. É lógico, também, que, como em toda técnica de pesquisa são encontradas vantagens e desvantagens. Aqui as desvantagens encontradas foram a falta de tempo para aplicação dos questionários em outras instituições de ensino e a quantidade de professores dispostos a participar, assim como a pequena quantidade de questionários que obtive retorno, a impossibilidade de ajudar o informante em questões mal compreendidas, dentre outras desvantagens que podem ser listadas por Marconi e Lakatos (2002): (...) Devolução tardia prejudica o calendário ou a sua utilização; o desconhecimento das circunstancias em que foram preenchidos torna difícil o controle e a verificação; exige um universo mais homogêneo, (...). (p.99) Utilizei como técnica a aplicação de questionários porque eles podem ser respondidos sem a presença dos entrevistadores, possibilitando que os participantes da pesquisa respondam ao questionário de forma mais cautelosa e com mais tempo. Essa técnica também me proporcionou mais tempo para dedicação a leituras bibliográficas e maior coleta de dados, no sentido de desenvolver maior número de questões. Essas são as vantagens da técnica escolhida. 42 Os quesitos da pesquisa foram escolhidos de modo a atingirem os objetivos almejados com esse trabalho, respondendo as minhas inquietações e tendo por base o conhecimento teórico adquirido ao logo desse tempo. Apesar de a escola ter mais do que cinco professores o questionário dessa pesquisa só pôde ser aplicado apenas a estes cinco, devido à falta de tempo disponibilizado para a aplicação e os vários recessos ocorridos durante o período em que comecei a ir a campo para aplicá-lo, como as comemorações de fim de ano, carnaval e férias docentes. Contudo, a quantidade de entrevistados não impede a veracidade do questionário aplicado e nem que os objetivos sejam alcançados. 43 5.2. A escola Municipal Presidente Médici e suas características A Escola Municipal Presidente Médici, localizada em bairro do subúrbio de Salvador, foi escolhida pela facilidade de acesso encontrada para realização da pesquisa com os professores, pois estes, durante meu período de estágio como professora regente do 2° ano do fundamental I, foram além de colegas de trabalho, grandes exemplos de perseverança, esperança, coragem e força de vontade, pois a escola em que eles atuam, necessita de grandes transformações estruturais. Há mais de um ano, essa escola está funcionando em uma casa pequena de forma provisória, segundo a Secretaria de Educação, onde não há espaço suficiente para a quantidade de alunos que atende; não comporta todos os alunos que necessitam do seu serviço, os quais, na sua maioria, são do próprio bairro ou de bairros próximos. Muitos dos alunos são carentes e, muitas vezes, fazem a única refeição do dia na escol. Grande parte dos pais são analfabetos ou com pouco estudo, mas sabem o valor que a escola tem para o bairro e desejam que seus filhos sejam algo melhor do que eles são na vida. A escola procura manter os pais e a comunidade sempre próximos da escola. Estes são frequentemente chamados para reuniões, palestras em eventos promovidos pela escola em apoio à comunidade, como aconteceu na comemoração ao Dia Internacional da Mulher (08/03), quando a escola trouxe profissionais para falar sobre a Lei Maria da Penha e outros assuntos de valorização da mulher, ainda promovendo momentos de embelezamento para os cabelos e unhas, proporcionando além de atividades divertidas e dinâmicas, um momento de aprendizagem e descontração. Mesmo diante de várias greves para reivindicar ajustes salariais, plano de saúde e melhores condições de trabalho, os professores dessa escola nunca deixaram de apoiar os pais e alunos. As condições de trabalho nessa escola são péssimas, visto que algumas salas são bem apertadas e calorentas, com pouca iluminação e móveis inadequados para as crianças em fase de alfabetização. Outras ainda têm meia parede com outra sala e cozinha, o que as deixa barulhentas e quentes, forçando o professor a falar cada vez 44 mais alto para poder ser ouvido. Além disso, havia problemas de alagamento em período de chuva e aulas tinham que ser suspensas. Não havia também área para recreamento, pois com área pequena e salas próximas qualquer barulho atrapalharia a concentração das outras turmas. Mesmo assim, sempre que possível, momentos lúdicos eram proporcionados aos alunos para compensar e desenvolver neles um momento
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