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AUTOGESTÃO E ECONOMIA SOLIDÁRIA UMA NOVA METODOLOGIA 3º VOLA É, ao Secretaria de Políticas Públicas de Emprego hr Departamento de ANTEAG Qualificação Ministério do ” E Trabalho e Emprego um pais DE TODOSGOVERNO FEDERAL Autogestão & economia solidária Presidente da República Luíz Inácio Lula da Silva Ministro do Trabalho e Emprego Luiz Marinho Secretário de Políticas Públicas de Emprego SPPE Remígio Todeschini Diretor do Departamento de Qualificação - DEQ Antonio Almerico Biondi Lima Coordenadora-Geral de Qualificação - CGQUA Tatiana Scalco Silveira Autogestão Coordenador-Geral de Certificação e Orientação Profissional- CGCOP Marcelo Alvares de Sousa e economia solidária . . UMA NOVA ME eCoordenador-Geral de Empreendedorismo Juvenil TODOLOGIA, 3º VOL. Misaél Goyos de Oliveira O copyright 2005 - Ministério do Trabalho e Emprego Secretaria de Políticas Públicas de Emprego - SPPE Departamento de Qualificação - DEQ Esplanada dos Ministérios, Bloco F - 3º andar, Sala 306 CEP 70059-900 - Brasília - DF Telefones: (0xx61) 3317-6239 / 3317-6004 Fax.: (0xx61) 224-7593 E-mail: qualificacaoOmte.gov.br Tiragem: 3000 exemplares Elaboração edição e distribuição: ANTEAG “ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS TRABALHADORES E EMPRESAS DE AUTOGESTÃO E PARTICIPAÇÃO ACIONÁRIA Rua Mauá, 836/842 - Casa 29 - Luz 01028-000 São Paulo - SP Telefax: (11) 3313-4230 anteagúterra.com.br www.anteag.org.br Entidade conveniada: ANTEAG “ASSOCIAÇÃO NACIONAL DOS TRABALHADORES E EMPRESAS DE AUTOGESTÃO E PARTICIPAÇÃO ACIONÁRIA Rua Mauá, 836/842 - Casa 29 - Luz 01028-000 São Paulo - SP Telefax: (11) 3313-4230 anteagOterra.com.br www.anteag.org.br Sé, o Secretaria de Políticas AVI Públicas de Emprego AMPAROAO Departamento de Qualificação Eatias) Ministério do» Trabalho e Emprego 1 Obm: Os textos nãorefletem necessariamente a posição do Ministério do Trabalho e CO GOVERNO FEDERAL Emprego, DIRETORIA DA ANTEAG Presidente Ivan Roberto Westphal (Cooperminas/SC) Vice-Presidente Arnaldo Liberato da Silva (Usina Catende - Cia. Harmonia/PE) Secretário José Araújo Barbosa (Coopervest/SE) Tesoureiro Ivan de Souza (Cooperminas/SC) Diretor Executivo José Jackson P. da Silva (Coopavil/PE) Suplente Ailson Carlos de Souza (Coopram/SP) Conselho Fiscal Elói Lira (Bruscor/SC) Adauto Rosado Filho (Fundecoop/RS) Rosana Aparecida Ferreira Bento (Cooperjeans/SP) Antônio Luis da Silva (Facit/MG) Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Autogestão e economia solidária : uma nova metodologia, 3º vol. - São Paulo : ANTEAG - Associação Nacional dos Trabalhadores e Empresas de Autogestão e Participação Acionária, 2007. Vários colaboradores. Bibliografia 1. Autogestão 2, Economia 3. Sociedades cooperativas 4. Solidariedade 07-0911 CDD-330 Índices para catálogo sistemático: , 1. Economia solidária 330 PREPARAÇÃO E EDIÇÃO: Maíra Cavalcanti Rocha (organização e edição de textos) Patrícia Leança Adriano (revisão e edição de textos) Luigi Humberto Verardo (revisão e edição de textos) Sylvia Leser de Mello (revisão de textos) CONTRIBUÍRAM NESSA EDIÇÃO: Adão Daniel da Silva, Cátia Cristina dos Santos Costa, Dea Lucia, Derly de Carvalho, Erasmo Pavesi, Francisca Rodrigues, José Reitor Rizzardi, Maxwel Moraes, Patrícia Freitas, Ronaldo Sousa, Sandra Campos, Wagner Augusto. SUMÁRIO 1. APRESENTAÇÃO .............. reinante dramaraiar“Mu O SURGIMENTO DA ANTEAG E A FORMALIZAÇÃO DAS EMPRESAS DE AUTOGESTÃO .esconcorcencrascosenssooneorcorero u O PAPEL DA EDUCAÇÃO E O DESENVOLVIMENTO DE METODOLOGIA DE FORMAÇÃO DOS TRABALHADORES .. 12 PUBLICIZAÇÃO DOS RESULTADOS DO PROJETO E REPERCUS- SÃO .ecermercorescerassreccaceceerecarerorsoresceraenancanrareseeeeeo 13 1.1 INTRODUÇÃO ....iccsccrseesenererserrareserecercrsncecesensess LT DESENVOLVIMENTO DAS ATIVIDADES 17 CAPACITAÇÃO COMO CENTRO DO PROCESSO ..ceeeemeeeenemaeas 17 QUALIDADE E TECNOLOGIA ....cceceereerrereererenecerereenceata 20 MEIO AMBIENTE E SAÚDE NO TRABALHO ....ccceesrcreeenemeremo 20 JURÍDICO ....cceesenserrereenesecerencanamo 20 GESTÃO E FIABILIDADE .....cccccsteeeerereereariecerseraeeaereara 21 ELABORAÇÃO DE PROJETOS DE FINANCIAMENTO ....veemmeeres 21 REDES .ecccerecererterrr erre en crcntanaanceesrenamenanercannara 22 RELAÇÕES INTERPESSOAIS ...cessenereereeneacrecaanaamraniereca 22 SISTEMATIZAÇÃO DOS RESULTADOS.esceccscereesenescecnsos 23 2. METODOLOGIA DE QUALIFICAÇÃO EM AUTOGESTÃO E ECONO- MIA SOLIDÁRIA «essanesesceserrenesereoseersenenesemcsaessesesnecseso DD BASES PARA QUALIFICAÇÃO EM AUTOGESTÃO E ECONO- MIA SOLIDÁRIA erceronsecreeroreneerosscenencoransanrtersanceso 2D 25 AUTOGESTÃO, CONCEITO, IMPORTÂNCIA E SEU PAPEL NA ECONOMIA RESGATE DO CONCEITO DE ECONOMIA SOLIDÁRIA .. SOLIDÁRIA .eserecrereereranenecaaearoerarerreacareereareaa 27 A QUALIFICAÇÃO EM AUTOGESTÃO E ECONOMIA SOLIDÁRIA ..... 28 APROFUNDANDO CONCEITO DE COOPERATIVA ....cccesereemeneo 29 RELAÇÃO DO SÓCIO-TRABALHADOR COM A COOPERATIVA....... 32 .32TENDÊNCIA À INFORMALIDADE......... AUTOGESTÃO E ECONOMIA SOLIDÁRIA |7 GESTÃO .scsssererecercaresrosresanesassaanaancercasanssssscassanaas 3 ESTABELECIMENTO DE OBJETIVOS COMUNS ....ccrccrecrieeier 33 ORGANIZAÇÃO DOS TRABALHADORES X ORGANIZAÇÃO DU NEGÓCIO ... cer rercenerieere ninar cercam ren man eanaercercencanto 35 IMPORTÂNCIA DA GESTÃO DO NEGÓCIO /PROCESSO ...........o. 36 IMPORTÂNCIA DA GESTÃO DA SOCIEDADE ....cccsiceeririeceiema 38 RELAÇÕES COM A SOCIEDADE.. 44 ESTUDO SETORIAL E CONSOLIDAÇÃO DE DADOS SECUNDÁRIOS . 47 FERRAMENTAS PARA (JPERACIONALIZAÇÃO DA REDE DE EMPREENDI- da 48 ELABORAÇÃO DE PROJETOS DE FINANCIAMENTO ........... 52 MENTOS AUTOGERIDOS...... FINANCIAMENTO PARA À AUTOGESTÃO E A ECONOMIA SOLIDÁRIA 54 DESDOBRAMENTO À PARTIR DAS NECESSIDADES IMEDIATAS ..... 57 3. SUGESTÕES PARA ABORDAGEM DAS QUESTÕES DE GESTÃO .. 62 RELAÇÕES INTERPESSOAIS EM EMPRESAS E EMPREENDIMEN- TOS DE AUTOGESTÃO ....ccccceseerecerereessassreesaosserasanos OS AS INTELIGÊNCIAS MÚLTIPLAS ..crcereernecemerneeseaacaracrnerão 63 PROCESSO DE INTERAÇÃO HUMANA NO TRABALHO .....eros 64 A LIDERANÇA... cics scrcrserrean erra rren cera renner ren eeraas 69 MANEIRAS DE LIDAR COM CONFLITOS .....ccecrceeererreees 73 PRINCÍPIOS PARA QUEM ESTÁ NO CONFLITO .......oiciiiiiio 75 CONCLUSÃO ...cccieeaanaer encena neem enioeareraraneaavenro 71 ASPECTOS TRIBUTÁRIOS DAS SOCIEDADES COOPERATIVAS 78 OS PRINCÍPIOS DO COOPERATIVISMO E A CONSTITUIÇÃO FEDERAL ... 78 O SISTEMA TRIBUTÁRIO NACIONAL E O ATO COOPERATIVO ...... 81 A LEI 5764/71 COMO MODELO TRIBUTÁRIO COOPERATIVISTA .. 82 ATOS COOPERATIVOS ..... cce crtesierrserireaneranarerarenaes 84 ATOS NÃO COOPERATIVOS ...icrereerinererereceererirenenreees 84 O ATO COOPERATIVO E A DOUTRINA ....cciiicsersirerrrreier 87 PROCEDIMENTOS CONTÁBEIS ESPECÍFICOS....cccrrerecarisenasts 89 AS CONTRIBUIÇÕES SOCIAIS ....... . 90 CONCLUSÃO ....cccrteereeerceacaner ren rrananeraneeranreanrannno 91 B| SUMÁRIO 4. CASOS ILUSTRATIVOS DE QUALIFICAÇÃO EM AUTOGESTÃO E ECONOMIA SOLIDÁRIA «erscscercorconsencanasorsancaserernoasenceros DI INTERVENÇÃO EM GESTÃO .eceesemcscersecereracercoracrasnanaa DI SITUAÇÃO DA EMPRESA ..ccccreeeeereercencecreenenneanseneeners 94 DIAGNÓSTICO DA ANTEAG SOBRE O PROCESSO DA COOPERYZ ... 96 INTERVENÇÃO DA ANTEAG «e ceeerereeesecereanaae cce cenrenas 100 REDE DE AGROECOLOGIA ..sscceserercoreccrmacanssssersreosas LOZ CONTEXTO ecc ccccericiniseranaerranraencaniertan rea ranaaana 102 REFERENCIAL EM AGROECOLOGIA .... cer cereererrereereererees 103 AGROECOLOGIA E AUTOGESTÃO .......ccercreceerrerrereiara 104 ELABORAÇÃO DE PROJETOS DE FINANCIAMENTO + 110 PROGRAMA DE APOIO À CONSOLIDAÇÃO DE EMPREENDIMENTOS AUTOGESTIONÁROS — BNDES... 110 ACESSO AO PRONAF «cccercerrerecarenos 112 ASSENTAMENTOS AUTOGESTIONÁRIOS .......Terrenos Ra 114 16 DESENVOLVIMENTO METODOLÓGICO E IMPACTOS OBSER- 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS ..eceseseseesa ..118 DESDOBRAMENTOS E NOVAS POSSIBILIDADES .......000.00 [20 VADOS .. AVANÇOS OBSERVADOS.. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.... ... 129 AUTOGESTÃO E ECONOMIA SOLIDÁRIA | 9 1 . APRESENTAÇÃO O SURGIMENTO DA ANTEAG E A FORMALIZAÇÃO DAS EMPRESAS DE AUTOGESTÃO As primeiras discussões que levaram à formação da ANTEAGco- meçaram no início da década de 1990, na iminência do fechamen- to de uma fábrica de calçados em Franca, a Makerly, Frente a essa situação, um grupo de pessoas que atuavam no movimento sindi- cal, começou a buscar alternativas para os trabalhadores dessa empresa que, com falência da empresa,ficariam desempregados, disputando postos de trabalho em um mercado adverso,já que se tratava de um momento de crise impulsionado pelo Plano Collor. A opção pela autogestão, num primeiro momento causou es- tranheza, quando não desconfiança quanto à viabilidade dessa al- ternativa. Foi necessário um trabalho de convencimento para que o antigo proprietário se dispusesse a passar os meios de produção para o controle dos trabalhadores, assim como aos trabalhadores de que essa poderia ser umaalternativa viável. A definição pela autogestão foi nesse momento uma inovação considerável. Não havia até o momento outras experiências de re- cuperação de empresas falidas pelos trabalhadores em autogestão que pudessem servir de referência e, com isso, esse grupoqueveio fundar em 1994 a Associação Nacional dos Trabalhadores e Em- presas de Autogestão (ANTEAG),teve queiniciar a construção de uma metodologia de assessoria e qualificação dos trabalhadores para a gestão coletiva. Inicialmente, a equipe procurou o DIEESE,buscando referên- cias de gestão pelos trabalhadores. Foi apresentada a experiência norte americana da “Employee Stock Ownership Plans” (ESOPs), trata-se de um modelo de controle acionário dos trabalhadores que, participam da distribuição dos lucros. Contudo, a gestão da empresa nesse modelo ainda se referenciava nos moldes tradicio- nais, com uma gerência especializada, sem a participação efetiva dos trabalhadores. Conforme se pode ver no caderno “ComoSair da Crise” de 1996, a ANTEAGbusca constituir projetos de auto- AUTOGESTÃO E ECONOMIA SOLIDÁRIA [11 gestão através de diversas formas: a) a partir de experiência de co- gestão; b) utilizando formasjurídicas comoas associações comuni- tárias, sociedades com controle das ações (S/A) ou então das cotas (Ltda) pelos trabalhadores. O critério fundamental para associação à ANTEAG sempre foi a autogestão. No início, foram desenvolvidas algumasexpressivas experiências de co-gestão (um modelo mais próximo das ESOPs), a estratégia adotada, era fazer da co-gestão um processo para a instituição da autogestão nas empresas, Dentre as empresas co- gestionárias que foram organizadas e acompanhadas pela ANTE- AG, podemos lembrar: no setor de agroindústria, da Frunorte (RN); no metalúrgico, da Conforja, em Diadema (SP) e da Bernar- dini, em São Paulo (SP); nosetor de borracha, da Cooperbor(SP). No processo de amadurecimento,a experiência das Associa- ções Comunitárias, contribuiu significativamente, pois mesmo que embrionariamente,já trazia em seu cernea questão da autogestão. O formato jurídico de Cooperativa, surgiu logo depois e mos- trou-se como o modelo mais adequado para a garantia da autoges- tão. Com a possibilidade de se consolidar empresas como coope- rativas de produção e demarcar características mais originárias do cooperativismo, ressignifica-se esse formato jurídico contrastando com as inúmeras cooperativas brasileiras, principalmente agrico- las, tão descarnadas do autêntico cooperativismo. O PAPEL DA EDUCAÇÃO E O DESENVOLVIMENTO DE METODOLOGIA DE FORMAÇÃO DOS TRABALHADORES A autogestão é um sistema cujo bom funcionamento está inti- mamenteligado qualitativamente c quantitativamente à participa- ção do trabalhador. Isso implica em uma mudança na cultura de produção e de gestão da empresa, e, necessariamente, em uma mudança cultural de cada trabalhador. A ANTEAG, com isso, já surge tendo comoatividade prioritária educar para a autoges- tão, Partindo de uma concepção de que a forma como se educa está diretamente ligada aos resultados que se atinge, a ANTEAG busca adotar a autogestão em todososseus espaçosdesdea definição das assessorias até a construção de sua metodologia de qualificação. No ano de 1997 a ANTEAG começou a desenvolver seus ca- dernos deformação do trabalhador. Os trabalhadores das em- presas associadas à ANTEAG participaram ativamente de sua ela- boração levantando as demandas de formação com a equipe de assessoria que, em resposta, elaborou dez cadernos que abordam aspectos centrais da gestão de uma empresa de autogestão e que foram utilizados nos cursos de formação para milhares de traba- lhadores das empresas. A partir da demanda das empresas que eram, agora, geridas portrabalhadores na maioria das vezes sem experiência gerencial, foram desenvolvidos os denominados MBAs(“Master in Business Administration”) regionais e nacionais. Em parceria com Univer- sidades, foram realizadas atividades de qualificação para os gesto- res das empresas de autogestão, Esse foi o primeiro convenio da ANTEAG com o Ministério do Trabalho em 1997 para o desenvol- vimento de atividades de Qualificação Profissional, propondo uma nova forma de atuação para a qualificação de trabalhadores, uma vez queaslinhas existentes para qualificação, não davam conta das necessidades apresentadas pelas Empresas de Autogestão de ori- gem falimentar. Os programasde qualificação aquele momento eram concebi- dos a partir da lógica de recolocação no mercado de trabalho, de modogeral, oferecendo treinamento em atividades como manicu- re, costura, pintura, marcenaria, etc, Apesar dos trabalhadores as- sociados à ANTEAG nãoestarem fora do mercado detrabalho, ou seja, de não se tratar de um público de desempregados, estavam em situaçãoderisco de desemprego, pois, organizando cooperati- vas e assumindo umaestrutura produtiva, estavam ocupados, mas dependiam deviabilizar a empresa para normalmente perderem o posto de trabalho. Na maioria doscasos,a gerência não permanece após a passagem da empresa para o sistema de autogestão, Com isso, muitas vezes, a direção da nova empresa vinha do “chão de fábrica” e necessita de qualificação gerencial, Ainda como compli- cador, a ANTEAG,lida com empresas que, por conta dasituação prê-falimentar, vêm, muitas vezes, de situação de desgaste com fornecedores,clientese instituições bancárias. Isso aponta necessi- dade iminente de qualificação dessestrabalhadores e, dado que a opção foi de organizar em autogestão, uma qualificação voltada para esse público, considerando suas peculiaridades. Os MBAsforam nossa primeira experiência nessesentido,ainda no âmbito do SEFOR (PNQP) na gestão anterior. Consideramos um avanço significativo, dado que foi a primcira experiência de investimento público em qualificação dos gestores nas Empresas de Autogestão, e dos trabalhadores sem função diretiva na com- preensão da nova relação de trabalho instituída com a autogestão pelostrabalhadores. O Convênio da ANTEAG com o SEFORdu- rou até 1999, mas ainda era considerada uma experiência atípica no âmbito do antigo PNQP. Em 2003 com a reformulação do Plano de Qualificação pela nova gestão Federal, e a criação dos ProEsQs, tivemosa oportuni- dade de iniciar no âmbito do PNQ, o desenvolvimento de uma metodologia voltada à Autogestão e Economia Solidária. A ANTE- AG,dadoo acúmulo de mais de dez anos de trabalho nessa área,foi a propositora de um projeto piloto para Autogestão e Economia Solidária, envolvendo outras entidades atuantes no cenário nacio- nal da Economia Solidária, que contribuíram com suas metodolo-gias na formulação do produto final do projeto (a publicação “Au- togestão e Economia Solidária: uma nova metodologia”— primeiro volume) por meio de participação nas atividades desenvolvidas, avaliação do projeto e revisão do produtofinal. Este primeiro ProEsQ, permitiu a elaboração de um quadro geral das demandas em qualificação pelas empresas através dole- vantamento dos problemas e a construção de propostas de como superá-los, forjando assim,as bases para o desenvolvimento de uma metodologia voltada especificamente para empresas e empreendi- mentos! de autogestão. Em 2004, foi firmado novo convênio para execução do Pro- EsQ que viabilizou o desenvolvimento de bases mais sólidas para uma metodologia em Autogestão e Economia Solidária. Desta vez, ! A partir do convênio firmado com o Governodo Estado do Rio Grande do Sul em 1999, a ANTEAG passou a organizar e assessorar empreendimentos po- pulares e outras cooperativas que não tinham origem falimentar, mas que, necensariamente, têm a autogestão como forma de organização e funciona- mento, a partir das demandas levantadas no projeto de 2003, fizemos um levantamento bibliográfico dos materiais já utilizados nas mais di- versas ocasiões e, com a assessoria de especialistas nos diversos temas abordados, organizamos um material-base que foi discutido em todas as regiões do país com empresas associadas e entidades parceiras. A sistematização desse processo definiu as bases meto- dológicas para a qualificação em Autogestão e Economia Solidária. Ouseja, definindo parâmetros para a formação dos profissionais que atuam com esse tipo de empresa ou empreendimento, uma metodologia para levantamento de informações necessárias ao de- senvolvimento do trabalho na empresa ou empreendimento,e, com o arcabouço de informaçõessistematizadas, os caminhospara abor- dagem nos temas levantados pelo projeto. PUBLICIZAÇÃO DOS RESULTADOS DO PROJETO E RE- PERCUSSÃO Osdois volumes desenvolvidos no âmbito do ProEsQ,foram am- plamente divulgados” nas empresas e empreendimentos de auto- gestão, instâncias governamentais (Municipais, Estaduais e Nacio- nais), universidades, entidades parceiras (principalmente as atuantes em Economia Solidária) e entidades internacionais. Embora ampla, optamos por umaformade distribuição quali- ficada das publicações,o que permitiu que houvesse endereçamento aos fóruns de todos os Estados do Brasil através dos encontros re- gulares das atividades do Fórum Brasileiro de Economia Solidária. Além de servir de instrumento de interlocução das diversas experiências entre as entidades que compõem o Fórum Brasileiro, pode-se observar que muitas vezes o movimento de Economia Solidária utilizou os livros como forma de subsídio às discussões junto aos trabalhadores. O retorno sobrea utilização dessas publi- cações apontou casos bem diversos no uso. Por exemplo: -Atividades de formação para comunidades indígenas em Roraima; 2? O primeiro volume do ProEsQ 2003 teve tiragem de 1.000 exemplares,já esgotado, O volume 2, do ProEsQ 2004, com tiragem de 3.000 exemplares já tem cerca da 90 % dos exemplaresdistribuídos. ' Subsídio à elaboração do programa Apoio à Consolidaçãode Empreendimentos Autogestionários do BNDES; * Formação de pesquisadores para o Mapeamento de Eco-nomia Solidária (Estado de São Paulo), inclusive côma uti-lização do indice de indicadores da autogestão; * Formação de gestores públicos, assessores e formadoresem cntidades de economia solidária'. * Utilização em disciplinas de graduação; E outros relatos dãoconta desuautilização comosubsídio paraa realização de outros trabalhos: discussão sobre metodologia de pesquisas para empresas e empreendimentos de autogestão e de economia solidária; estudos acadêmicos; assessorias a empreendi-mentos sociais e, consequentemente, divulgação da autogestão eda economia solidária. *O livro vem sendo utilizado na formação de assessores da ANTEAG, por di-versas Incubadoras Universitárias, pela UNICAFS, pela UINISOL Brasil, FE-TRABALHOSP, Cáritas PA, entre outras. 16 | CAPÍTULO | - APRESENTAÇÃO 1.1 INTRODUÇÃO O PNQ/ ProEsQ/ 2004 — termoaditivo, foi elaborado a partir das conclusões do projeto anterior, PNQ- ProEsQ / 2004 seguin- do semprea linha orientadora de pensar uma metodologia que respondesse a realidade e aos diferentes momentos dos empreen- dimentos de Economia Solidária, extraindo sua validade naintera- ção com os trabalhadores envolvidos. Asoficinas realizadas no PNQ/ ProEsQ 2004, apontavam que as demandas de formação e de aprofundamento são bastante dife- renciadas e nossa primeira conclusão foi que o acompanhamento dessas experiências em seu cotidiano poderia ser o primeiro passo para garantir um processo de formaçãoeficiente. A partir do trabalho de acompanhamentoatravés de Incubação ou Assessoria Permanente temos a base para a identificação dessas demandas e planejamento da(s) estratégia(s) de formação a serem adotadas. Dentro do projeto, essa formação poderia ocorrer em dois níveis diferentes, de acordo com a demandae a realidade da empresa ou empreendimento, chamaremos de Cursos de Sensibili- zação e Cursos de Aprofundamento. Outro recurso formativo, muitas vezes subestimado pelos pro- gramas de formação, mas sempre lembrado pelos trabalhadores, é a realização de Intercâmbio entre trabalhadores de diferentes em- presas/ empreendimentos ou regiões como forma de comparti- lhar o conhecimento consolidado (ou mesmo os problemas en- frentados, o que também é formativo) com outras experiências. Porisso, no projeto PNQ/ ProEsQ/ 2004 — termo aditivo, busca- mos dar ênfase a esta estratégia para sua validação. DESENVOLVIMENTO DAS ATIVIDADES CAPACITAÇÃO COMO CENTRO DO PROCESSO Ientificamosno projeto anterior a necessidade de aumentar a atenção e importância da atividade de capacitação tornando-a centro do pro- cesso de validação de metodologia, Entendemos a capacitação como cursos e assessorias, bem como metodologia de acompanhamento. AUTOGESTÃO E ECONOMIA SOLIDÁRIA | 17 Definimos para este segundoTermo Aditivo que o eixo temáti- co para todos os temas deveria ser a qualificação paraa (auto) ges- tão dos empreendimentos e empresas de autogestão: metodologia para a melhoria da gestão e não apenas qualificação em Economia Solidária. Tal mudança tinha como objetivo ajudar-nos a dar mais foco aos conteúdos e maior efetividade nas propostas. Oscursos deveriam ser realizados em algumas empresas esco- lhidas de acordo com suas demandas, nas quais seriam desenvolvi- dos e validados, de maneira completa, os conteúdos c ferramentas de trabalho propostas nos PNQs anteriores. Ao fim do processo seriam realizadas oficinas, para coroar as experiências validadas na capacitação. Estas atividades de capacitação deveriam ser executadas den- tro das empresas e deveriam estar intimamente relacionadas com as oficinas, que teriam o caráter de fechamento do trabalho reali- zado. A idéia era validar instrumentos, ferramentas e métodos apon- tados nos PNQs2003 e 2004 através das capacitações e apresentar os resultados dos trabalhos nas oficinas, validando-os novamente. O projeto deveria desenvolver metodologia de acompanha- mento das empresas em diversos níveis: uma metodologia de ca- pacitação que não fosse 100% presencial e sim marcada pela alter- nância entre capacitação e aplicação dos conteúdos no dia-a-dia, mesclando-se teoria e prática nas empresas/ empreendimentos. Assim,teríamos um trabalho desenvolvido para cada empresa que partiria de uma avaliação inicial da demanda por parte dos forma- dores e/ ou coordenadoreslocais, seguida de suporte de um espe- cialista por área temática, responsável por formatar junto com esse formador e/ ou coordenadorlocal o conteúdo e a metodologia da capacitação e/ ou assessoria à ser desenvolvida na empresa. Além disso, uma equipe de sistematização estaria responsável pelo de- senvolvimento domaterial teórico de referência junto aos especi- alistas e pela sistematização dos resultados no kitdidático (produ- to final do projeto). A proposta era que fossem desenvolvidas assessorias especifi- cas para umaárea ou problema detectado ou mesmoa articulação de duas ou mais assessorias para cada empresa. O processo de as- sessoria teria que dialogar com os trabalhadores a partir da capa- citação destes para gerir as estratégias e/ ou ferramentas apresen- tadas pela assessoria. Assim os trabalhadoresestariam sendo simul- taneamente capacitados na área de desenvolvimento dos cursos de capacitação. Esse processo deveria ser feito em três etapas: (a) dis- cussão teórica e disponibilização de instrumentos/ ferramentas; (b) avaliação da aplicação do conhecimento na prática, reflexão, realização de ajustes e aprofundamento do tema; (c) avaliação dos ajustes e socialização dos resultados nas oficinas. Outra alteração noplanode trabalho,foi a consolidação, como parte da atividade, do processo de preparação e articulação das empresas e entidades para as oficinas: visitas que incluissem deba- tes, apresentação detalhada da entidade e do projeto e a realização de diagnósticos. Nosestados onde tivemos esse trabalho desenvol- vido pelos coordenadoreslocais em 2004, o resultado foi bastante positivo. O primeiro mês do ProEsQ/2004 - Termo Aditivo, deveria ser majoritariamente dedicado ao planejamento de capacitação da equipe e diretoria da ANTEAG,de maneira que se pudesse alinhar bem as concepções e tê-las sempre como parâmetro. Procuramos estender esse período por mais um mês a fim de aprofundarmos, no planejamento a discussão com as empresas sobre o projeto. Fo- camos, assim, primeiramente,as visitas para apresentação do Pro- EsQ e daatividade que seria realizada, número de participantes, local apropriado, de maneira que a mesma pudesse ser melhor apro- veitada pela empresa e pelo projeto. Haviamosprevisto a formação técnica inicial de 24 horas para o primeiro mêse,a partir do desenvolvimento da primeira etapa de trabalho (os dois meses iniciais), seria realizado um segundo momento de formaçãotécnica para aprofundamentoe planejamen- to global da segunda etapado projeto. Contudo,consideramos mais interessante realizar uma única capacitação/planejamentono ter- ceiro mês com subsídios suficientes extraídos das discussões prévi- as com as empresas, Ao longo do projeto, foram realizadas duas reuniões de avaliação com a equipe de coordenação direção da ANTEAG,onde fizemos balançosdos projetos e agregamosnovas demandas, No último mês do projeto, como previsto,foi realizada umaatividade deavaliação e planejamento com duração de 16 horas. Propusemose executamos 7 atividades a serem desenvolvidos nas empresas, com estratégias diferenciadas, de acordo com a de- manda. Os temastrabalhados em cada uma das atividades seguem abaixo: QUALIDADE E TECNOLOGIA Desenvolvido como curso/ assessoria cm empresas específicas al- ternando momentos presenciais e o desenvolvimento de tarefas pelas empresas com três seminários para socialização dos resulta- dos. Os conteúdos pertinentesa essaatividade seguem abaixo: - Conscientização da importância de haver um olhar siste- mático paraas questões relacionadasà qualidadee tecnologia. - Estudo, monitoramento e melhoria de processos. * Elaboração deestratégia de desenvolvimento tecnológico, identificação de dificuldades e potencialidades. - Método de solução de problemas de qualidade « tecnológicos — aproveitamento do saber do trabalhador. - Relações de trabalho e organização para o trabalho com vistas à qualidade. - Análise de mercados: identificação e conquista de clientes, oportunidades e tendências. MEIO AMBIENTE E SAÚDE NO TRABALHO Foi desenvolvido por meio de assessorias e intercâmbios entre tra- balhadores em empresas especificas alternando momentos presen- ciais e o desenvolvimento de tarefas pelas empresas. Os conteúdos pertinentes a essa atividade seguem abaixo: * Conscientização em relação a saúde e Meio Ambiente * Desenvolvimento de "Tecnologias limpas, o que é c comofazer? * Agroecologia - Segurança: como implementar - Qualidade de Vida; como implementar Jurídico Desenvolvido a partir de atividades de assessoria nas empresas e 5 seminários de aprofundamento. Os conteúdos pertinentes a essa atividade seguem abaixo: * Marcolegal - Legislação (trabalhista, falência e tributária). E obrigações legais de cooperativas e cooperados... - Adequação de Estatuto e Regimento Interno * Assessoria a empreendimentos que nascem da falência do negócio anterior. * Participação nas assembléias e reuniões. * Responsabilidade jurídica dos sócios e atualização do patrimônio social, GESTÃO E VIABILIDADE Foi desenvolvido em dois níveis: sensibilização e aprofundamen- to, Comosensibilização, tratamos gestão de uma maneira mais ampla, passando por todos os demais temas a exemplo do con- teúdo para capacitação desenvolvido em 2004. Como apro- fundamento, abordamos os temas abaixo mais especifica- mente desenvolvendo nas empresas atingidas estudos de viabilidade e sustentabilidade econômica e/ou planejamento estratégico. * Administração econômicae financeira. * Planejamento Estratégico: - Formaçãopara análise conjuntural; - Desenvolvimento de diagnósticos; - Desenvolvimento de Plano de Negócios; - Estratégia de implementação do planejamento. ELABORAÇÃO DE PROJETOS DE FINANCIAMENTO Realização de 5 Seminários sobre o papel do crédito, linhas es- pecíficas de financiamento e requisitos para acesso. Assessoria para claboração de Plano de Ação para implementação de es- tratégias de acesso a crédito ou para a elaboração de projetos para financiadoras. Os conteúdos pertinentes a essa atividade seguem abaixo: * Cooperativas de crédito; - Acessibilidade a crédito; * Linhas decrédito, requisitos e finalidades; - Planejamento para acesso a crédito. REDES Desenvolvidoa partir de Seminários Setoriais e elaboração de Pla- no de Ação porsetor. Os conteúdos pertinentes a essaatividade seguem abaixo: * Central de negócios (intermediação de negócios) * Cadeias produtivas - Experiências práticas de diferentes tipos em diferentes regiões - Modelo jurídico de redes * Transferência Tecnológica * Rede de Autogestão RELAÇÕES INTERPESSOAIS Será desenvolvido como curso/ assessoria em empresas especifi- cas alternando momentos presenciais e o desenvolvimento deta- Desenvolvimento das Atividades do PNQ/ ProEsQ/ 2005 Capacitação para Autogestão e RJ, RS, PE, AC, Economia Solidária Go Seminário de Avaliação do Projeto SP Seminário de Formação da Equipe Técnica SP Seminários de Qualidade e Tecnologia - Assessoria Técnica |SP, SC, SE Seminários Jurídicos - Assessoria |MG, SC, RS, AC, Técnica SP Seminários de Meio Ambiente |SP, SC, PE Seminários de Redes - Assessoria Técnica SP, RJ, PE BA, GO, SC, SP, Viabilidade Econômica RS, PE Seminários - Estudose Seminários de Gestão e Elaboração de Projetos de Financiamento RJ, SP, R$, PE, CE Seminários de Relações Interpessoais SC, MG refas pelas empresas. Os conteúdos pertinentes a essa atividade seguem abaixo: * Conscientização para a importância da compreensão das características individuais no ambiente de trabalho,as dife- renças de cada um. * Desenvolvimento de equipes e gestão de conflitos * Comunicaçãointerna e externa, liderança participativa - Conscientização da importância das questões de gênero e etnia nas relações de trabalho. SISTEMATIZAÇÃO DOS RESULTADOS Como também havíamos apontado nas publicações anteriores, a segmentação entre os temas abordados nos seminários, é uma se- paração meramente formal. Ao nos relacionarmos com realida- de, ou seja, quando entramos em uma empresa, os problemas se misturam e muitasvezes são influenciados simultaneamente por várias dessas questões. Assim, muitas vezes, o problema de acesso a crédito, para ser sanado precisará de umaintervenção em ques- tões jurídicas e/ ou de gestão e assim por diante. Com isso, organizamos essa publicação em dois grandes blo- cos, no primeiro (Capítulo II), levantamos, a partir do trabalho desenvolvido, os princípios metodológicos e o método de aborda- gem dos conteúdos no contexto geral da qualificação. Em seguida (Capítulo II), selecionamosalguns casos emblemá- ticos queilustram o processo de qualificação desenvolvidos no âmbi- to do PNQ/ ProEsQ/ 2005. Esses casosilustram bem a complexa articulação entre os diversos temas narealidade das empresas. A quarta sessão do livro, traz as Considerações Finais, com uma avaliação do processo, apontando algumas conclusões e le- vantando passos seguintes para o aprimoramento da metodologia de qualificação em autogestão e economia solidária. É importante apontar que a metodologia aqui apresentada, é fruto de um processo quese iniciou no primeiro convênio realiza- do com o ProEsQ em 2003, quandoo principal produto foi o le- vantamento e sistematização das principais demandas de qualifica- ção em autogestão e economia solidária. No ano de 2004 quando + desenvolvemos o primeiro Termo Aditivo do ProEsQ,definimos os princípios metodológicos em que essa qualificação deveria se fundamentar, assim comoosdiferentes formatos que essa qualifi- cação deveria atingir. O que buscamos apresentar a seguir, é um retrato das atividades de qualificação desenvolvidas neste último ano destacando os aspectos mais gerais e apresentando casos de assessorias especificas nas empresas e empreendimentos de auto- gestão. 24 | CAPÍTULO | - INTRODUÇÃO 3. METODOLOGIA DE QUALIFICAÇÃO EM AUTOGESTÃO E ECONOMIA SOLIDÁRIA BASES PARA QUALIFICAÇÃO EM AUTOGESTÃO E ECO- NOMIA SOLIDÁRIA A partir do acúmulo da ANTEAGe do desenvolvimento do proje- tonesse terceiro PNQ/ ProEsQ,asatividades de validação e expe- rimentação,levaram para dentro das empresas de autogestão uma discussão sobre a organização do trabalho autogestionário com enfoque nas cooperativas. À discussão com os trabalhadores sobre as relações de trabalho que se estabelecem em um ambiente auto- gestionário é a base para o bom desenvolvimento dasatividades de gestão, produção,e para a organização social do trabalho coletivo. A assessoria desenvolvida pela ANTEAG tem como foco res- gatar alguns conceitos fundamentais na formação de todos os tra- balhadores envolvidos na empresa ou empreendimento de auto- gestão. Nessa perspectiva, o conhecimento dos processos presentes dodia-a-dia da empresa entre os envolvidos tem grande importân- cia, pois cria bases para uma maior participação e responsabiliza- ção pelos trabalhadores com relação à gestão da empresa/ empre- endimento, Nos cursos desenvolvidos nas empresas, foram abordados di- versos conteúdos que vêm resumidos a seguir. Este processo foi fundamental para viabilizar o confronto entre os conteúdos pro- postos para discussão com as experiências práticas de autogestão, possibilitando a realização dosajustes necessários ainda durante a execução do projeto, considerando, além da avaliação das ativida- des pelos trabalhadores, a adaptação a realidades locais bastante diversas em suas particularidades. RESGATE DO CONCEITO DE ECONOMIA SOLIDÁRIA O primeiro passo nas atividades de capacitação, é, em maior ou menor grau de detalhamento, resgatar o que é a economia solidá- ria. Comojá apontado no volume 2 do livro “Autogestão e Econo- mia Solidária — uma nova metodologia”, o processo de formação AUTOGESTÃO E ECONOMIA SOLIDÁRIA | 25 não se completa com o mero despejar de conteúdos.A assimilação pelo educando, passa pelo sentido que o conteúdo assumena di- mensãoprática de suas vidas. Assim, para tratar de temastão amplos e que têm relação dire- ta com a forma com que o trabalhadorse relaciona com o mundo, faz-se necessário um diálogo constante entre as questões gérais apontadas pela economiasolidária, e o reflexo de uma nova con- cepção de mundo em seu dia-a-dia concreto. Portanto, destaca- mosalguns pontos que são elementos-base no processo de qualifi- cação em economia solidária e autogestão: * Economiasolidária é uma forma de organização econômica, que tem, contudo,bases diferenciadas de relacionamento, focada na pessoa que no capital; : Isso se expressa principalmente pela organização coletiva da gestão, tanto com relação ao negócio, onde as decisões estra- tégicas devem ser tomadas com a participação do coletivo de sócios, quanto com relação à gestão política do empre- endimento, o que define as formas de participação do mes- mo no universo da economia solidária; - Enquanto perspectiva, a economia solidária deve ter como base, tanto em suas relações internas quanto as externas, a solidariedade. Ou seja, se para viabilizar o negócio, um em- preendimento econômico solidário deve buscar uma estruturação que seja competitiva no mercado convencio- nal no quese refere a organização da produçãoe distribuição, as relações internas devem ser orientadas pela solidarieda- de. As relaçõessolidárias, no ambiente interno, são de mais fácil implementação, pois não sofrem as pressões do merca- do convencional, organizado prioritariamente a partir de práticas competitivas, porém os valores do capitalismo (dos ganhosindividuais, o outro visto comoadversário, não como companheiro) estão tão arraigados nos trabalhadores e são tão difundidospelas instituições, que a solidariedade não se dá espontaneamente, * Apesar de ter que conviver e atuar no mercado convencio- nal, seguindo suas regras, a Economia Solidária busca,atra- vés do estabelecimento de redes, articulações em torno de cadeias produtivas e da criação de sistemas de distribuição, o estabelecimento de práticas no ambiente externo mais condizentes com seus princípios, como veremos adiante. * Economia Solidária, na definição do Sistema Nacional de rInformações da Economia Solidária (SIES)', é “o conjunto de atividades econômicas — de produção, consumo, pou- pança e crédito — organizadas e realizadas solidariamente por trabalhadores e trabalhadoras sob forma coletiva e autogestionária”, AUTOGESTÃO, CONCEITO, IMPORTÂNCIA E SEU PAPEL NA ECONO- MIA SOLIDÁRIA Segundo o Dicionário Aurélio?, autogestão é “Gerência de uma empresa pelos próprios trabalhadores, que se fazem representar por umadireção e um conselho de gestão” o conceito em si, apon- ta para a autonomia tanto com relação à subordinação a regras definidas coletivamente por todos os sócios trabalhadores e não impostas por terceiros, Desde o surgimento da ANTEAG,a Autogestão é o conceito central na organização de empresas e empreendimentos. Nessesen- tido,a forma de organização interna com bases democráticas é o que garante um salto qualitativo na gestão do negócio e na qualidade de vida dos trabalhadores, uma vez que sc supera a relação dicotômica entre ação e planejamento dos modosconvencionais de organização empresarial, promovendorelações mais orgânicas e não alienadas. Historicamente, a ANTEAG tem atuado com o que chamamos de empresas de autogestão, empreendimentos que apresentam maior grau de complexidade, e, com a formalização do negócio,se rela- cionam com o mercado como qualquer empresa, sobretudo com relação a suas obrigações legais e tributárias. Para organizações menos complexas, muitas vezes não formalizadas ou com o predo- múínio de práticas informais, consideramos como empreendimento de autogestão. Todas as empresas e empreendimentos de autogestão, ! Atlas da Economia Solidária, claborado pelo MTE/ SENAES,2006. Essas e outras informações estão disponíveis no endereço: www.sies.mte.gov.br ? Ferreira, Aurélio Buarque de Holanda, Novo dicionário Aurélio da Lingua Por- tuguesa, 1* edição (15º impressão). Rio de Janeiro, Editora Nova Fronteira,no entanto, independente de seu formato jurídico, têm a demo- cracia na base de seu funcionamento e uma preocupação que não se restringe ao negócio em si, mas que leva em conta aspectosre- lacionados à sustentabilidade do projeto autogestionário. Com a organização do movimento de economia solidária, a estruturação dos Fóruns, a criação da Secretaria Nacional de Eco- nomia Solidária e do Sistema Nacional de Informações da Econo- mia Solidária, fez-se necessária uma orientação mais clara sobre o que caracteriza um empreendimento econômico solidário. Com isso, a autogestão foi assumida como umadas principais caracteris- ticas da economia solidária. Embora a Economia Solidária se orga- nize das mais diversas formas (cooperativas, associações, empre- endimentos informais entre outras formas de sociedade), todo empreendimento,se faz parte da Economia Solidária, deve funcio- nar de forma autogestionária. Com isso, empreendimentos sub- meétidos a outra lógica de hierarquia como os empreendimentos familiares individualmente” ou subordinadosa outras organizações, ficam à parte da Economia Solidária, pois. Considera-se como Eco- nomia Solidária aos empreendimentos onde os trabalhadores são sócios e definem coletivamente os rumos de suas empresas. Uma empresa ou empreendimento de autogestão é parte da Economia Solidária na medida em que tem como objetivo a arti- culação com ações mais amplas deste movimento. Isso vai além da questão da geração de renda para a sobrevivência de seus sócios e um processo de distribuição mais justa dos resultados, mas tem aliadoa isso, propostas e umaatuação prática em prol de umaor- ganização mais justa da sociedade. Ouseja, um empreendimento ou empresa de economia solidária, em sua atuação questiona: * a organização hierárquica do trabalho; - a distribuição dos resultados fundamentada no capital; : a inserção não critica/ estratégica no mercado convencional; * a atuação não responsável com a sociedade (comunidade, meio ambiente ou relações de consumo). “não trataremosaqui do caso de organizações familiares associadas mas das com- postas apenas por membros do mesmo núcleo familiar. 4 QUALIFICAÇÃO EM AUTOGESTÃO E ECONOMIA SOLIDÁRIA Uma metodologia voltada para essa realidade, deve priorizar pro- cessos participativos, que incentivem o fortalecimento de umain- teligência coletiva e que relacionem pensamento e ação,a prática cotidiana e seu relacionamento com um contexto mais amplo para umaatuação estratégica no campo político. A forma como os conteúdos da qualificação em autogestão e economia solidária em seusdiversos temasdeve ser abordada, deve levar necessariamente em conta essas bases para maior efetividade do processo, pois acreditamos que o método de abordagem e de relacionamento é determinante no conteúdo do trabalho educati- vo. Assim, o ambiente de curso contribui para o planejamento do negócio, promovendo espaçosparticipativos onde se desenvolve o diagnóstico participativo de problemas que a empresa ou empre- endimento possam enfrentar, e planejar coletivamente as soluções. O desenvolvimento deassessorias, diferentemente de uma em- presa convencional, não deve ser tratada como uma ferramenta pontual para resolver problemas, sejam eles de gestão, mercado, jurídica, ambiental, ou de quaisquer outras naturezas. À adesão dos sócios ao processo de resolução dos problemasé fundamentalpara o sucesso da assessoria. Os cursos cumprem opapel de manter o trabalhador envolvido com os rumos do empreendimento. A partir do diagnóstico realizado! nas empresas e empreendimen- tos da ANTEAG, constatou-se que algumas das cooperativas, assesso- radas por profissionais do mercado convencional, adotavam procedi- mentos de gestão c de controle inadequados à sua natureza formal. Nesses casos, além da atuação das assessorias na realização deajustes formais, foram realizados cursos com ostrabalhadorespara resgatar o conceito de cooperativa e aprofundar algumas questões fundamentais. APROFUNDANDO CONCEITO DE COOPERATIVA Embora nem todas as empresas de autogestão tenham a formaju- rídica de uma cooperativa, as cooperativas apresentam o melhor modelo de organização do trabalho coletivo autogestionário. Se forem seguidos os princípiose as regras do cooperativismo, temos um bom referencial para pensarmos a autogestão. * Anexo II da publicação da ANTEAG — Autogestão é Economia Solidária — uma nova metodologia, vol 2. Em um primeiro momento, é importante deixar claro que não vemos a organização cooperativa como algode e para os mais po- bres. Muito do senso comum sobre a formação de cooperativas vêem-nas somente como umaalternativa ao desemprego. Embora possa e deva ser uma boa alternativa para a superação da crise do mundo do trabalho e, inclusive, das desigualdades sociais, precisa- mosdestacar que se trata, principalmente, de uma forma de ges- tão extremamente dinâmica e racional. Essa alternativa tem se mostrado bastante eficaz na resposta aos desafios do mundo atual, marcado pela velocidade das informações c do extremo dinamis- mo do capital, que gera crescente concentração de poder, tanto econômico, quanto político. Assim, o associativismo e o trabalho coletivo possibilitam a união de recursos, habilidades e saberes dos trabalhadores, que, potencializados pelo bom uso da inteligência coletiva, é capaz de tornar mais fortes os mais fracos. Destacaremosaqui alguns pontos que caracterizam a coopera- tiva e sua organização — que a diferenciam do modo de produção convencional — e que,a nosso ver, constituem as bases para que se possa desenvolver uma boa gestão coletiva. “As Cooperativas são organizações voluntárias, abertas a todas as pessoas capazes de seusserviços e dispostas a aceitar as responsabilidade de ser sócio, sem discriminação social, política,religiosa, racial ou de sexo” * A lei cooperativista do Brasilº, diz que trata-se de: q . - . o'umasociedadeecapital, de natureza civil, cons- tituída para serviçosaosassociados... salvo limitação técnica” Um olhar mais atento ao significado desses pressupostos nos revela algumas idéias neles embutidas que podem nos apontar ca- minhos para pensarmosa qualificação em gestão de cooperativas. - A associação livre e voluntária (não sem razão, o primeiro $ Segundo a Declaração Mundial Sobre a Identidade Cooperativa da ACI. * Lei 5764/71 30 | CAPÍTULO It - METODOLOGIA princípio cooperativista), Implica em Mm atoGT ponsabilidade por parte do indivíduo que escolhe associar- se e assumir os riscos do negócio, submeter-se às definições do coletivo e trabalhar pelo projeto da cooperativa. Traz embutida a idéia de pessoas que se responsabilizam pelos seus atose suas escolhas. O ingresso na sociedade, portanto, não pode ser por imposição, nem por um interesse outro que não seja associar-se para exercer uma profissão € conse- guir renda de forma autônomae coletiva. : Umasociedade que não visa lucro, quando há excedente, este volta para o cooperado.Temos que o objetivo central da organização é o bem estar de todas as pessoas que se associ- am, o que implica na idéia de igualdade perante a sociedade independente da quantidade de capital aportado. Essa idéia se refletirá nas assembléias onde impera que “cada cooperado(a), um voto”, independentemente do valor das quotas que os cooperados tenham. - Ser uma sociedade de pessoas e não de capital constituída para prestar serviço ao cooperado. A idéia de que não é o cooperado que presta serviço para à cooperativa vendendo sua força de trabalho,e sim a cooperativa (Pessoa Jurídica) que presta serviço ao cooperado ao possibilitar que eleexerça seu trabalho autônomo em melhores condições, também é central, Através da cooperativa esse trabalhador pode exer- cer sua profissão, comercializar seu produto ou serviço, ge- rar renda para si e conseguir uma série de benefícios, os quais não conseguiria se estivesse só. Portanto, ela, a socie- dade cooperativa,subordina-se ao sócio (através das assem- bléias) e não o contrário. Não temos o empregador ou tomador de serviços intermediando o trabalho, à sociedade possibilita que se alcance os objetivos sem o intermediário. « A limitação do ingresso à sociedade cooperativa se da ape- nas pela capacidade técnica da cooperativa, ou seja, pelas condições que esta tenha de prestar serviços para seus asso- ciados. De nadaadianta querer abrir a cooperativa para to- dosse sua atividade necessitar, e a estrutura comportar, ape- nas um número “x” de trabalhadores qualificadospara a con- AUTOGESTÃO E ECONOMIA SOLIDÁRIA |31 secução dos objetivos da sociedade. * Porfim, destacamosa lógica inclusiva das cooperativas que prega a não discriminação de gênero, racial, religiosa e poli- tica. Essa característica implica em uma gestão da diversida- de, a aprendizagem da convivência, do lidar com as diferen- ças, divergências, a liberdade de expressão contanto que não fira os interesses coletivos. O coletivo exige essa aprendiza- gem doviver junto. RELAÇÃO DOU SÓCIO-TRABALHADOR COM A COOPERATIVA. Entender cooperativa como uma sociedade de pessoas, onde a sociedade constituida presta serviço ao associado tem reflexo di- reto na relação entre cooperado e cooperativa isso influi na visão geral do que é cooperativa, de quem são os recursos, pressupostos para distribuição dos resultados, tributação, etc. como veremos mais adiante no Capítulo TI. A relação que a cooperativa estabelece com seus associados e com outras cooperativas associadas é diferenciada da relação que estabelece com eventuais empregados e com o mercado convenci- onal, Denomina-se Ato cooperativo esse tipo de relação. De acordo com lei do cooperativismo (número da lei) ”Art. 79 Denomi- nam-se atos cooperativos os praticados entre a cooperativa e seus associados, entre estes e aquelas e pelas cooperativas entresi quan- do associadas, para a consecução dos objetivossociais”, Osatos cooperativossão isentos de impostos, mas é importan- te ressaltar que nem todos os atos realizados pela sociedade são atos cooperativos e que os mesmos devem estar devidamente con- tabilizados para que se possa tributar adequadamente as operações da cooperativa. Mais adiante veremos como os ajustes nessa con- cepção extrapolam ajustes no campo jurídico, requerendo ajustes também no campo contábil e da gestão. TENDÊNCIA À INFORMALIDADE Parte dos empreendimentos da economia solidária no Brasil, não está formalizada. Entre os motivos que levam esses empreendi- mentos a não se formalizarem é a atual legislação cooperativa que limita o número mínimo de associados a 20 pessoas para a forma- lização de uma cooperativa. Além disso, a carga tributária também é apontada como limite, sobretudo pelafragilidade desses peque- nos empreendimentos em início de operação. Muitos acabam per- dendo oportunidades por falta de mcios para comprovação. Mesmo empresas formalizadas, por inexperiência, acabam ado- tando procedimentos informais, desde o registro inadequado de suas operações ao cálculo equivocado ou o não pagamento de tri- butos. Nesses casos é evidente que há demanda de assessoria em tributação, contudo essa assessoria, sem aliar a demanda a uma revisão dos processos de gestão, pode ser uma ação inócua. É importante que se faça umadiscussão bem feita sobre a im- portância dos tributos. No Brasil há uma tendência em se dizer quea cargatributária é excessiva, sendo que o que deveria-se ques- tionar é o retorno desses tributos em benefícios coletivos como saúde e educação,se essestributos estão sendo bem aplicados. Deve- se discutir a cobrança por parte da sociedade ao governo de como eles estão sendo investidos c não apenas dizer que eles são excessivos. Tanto o processo de formalização das práticas (inclusive para empreendimentos informais) quanto a prática dos aspectos for- malizados (no Estatuto Social, e no Regimento Interno) são funda- mentais para a elaboração de registros e contabilização de resulta- dos de forma condizente. Isso influi decisivamente numa tributação adequadaàs cooperativas. A compreensão dessas questões subsídia a busca de melhorias no marco jurídico, GESTÃO ESTABELECIMENTO DE OBJETIVOS COMUNS Para que o trabalho coletivo scja eficiente e eficaz o funcionamen- to de uma cooperativa ou outro empreendimento de autogestão deve ter participação qualificada de seus membros. Ouseja,a dis- tribuição de funçõesc tarefas tem que potencializar o trabalho co- letivo, caso contrário, as atuações poderão ser inadequadas: mar- cadas por ações individualistas e fortes conflitos de interesses. O que motiva as pessoasa ingressarem em um grupo e a traba- lhar juntas é o fato de terem um objetivo em comum,quanto mais claro esse objetivo estiver para as pessoas e maior significado estas atribufrem a este objetivo, mais o grupo é coeso e as pessoas com- prometidas, O grau de envolvimentopessoal com os objetivos do grupo determina o quantoas pessoas serão capazes de abrir mão de seus interesses individuais em prol dos interesses coletivos e, assim, cooperarão com os demais. Quando o significado deste ob- jetivo se afrouxa, os interesses individuais afloram. Assim, por mais que o cooperado seja um trabalhador autônomo associado em prol de interesses comuns, o que rege seu funcionamento é a atuação comunitária e nãopráticas individualistas. Quando miramos à realidade das cooperativas no Brasil hoje, temos umadistorção nessc sentido, uma vez que, muito freguen- temente, estas não são criadas por opção (adesão livre e voluntá- ria) dos cooperados. Estes trabalhadores se vêem premidos pela dificil situação econômicae crise empregatícia e ingressam na so- ciedade cooperativa para escapar à precariedade de sua situação e não por queesta seja um projeto de vida e de sociedade seu. Bus- cam, na grande maioria das vezes, um emprego e ingressam na sociedade sem compreender o queela realmente é: um trabalho e não um emprego, uma forma de organização que visa uma socie- dade maisjusta e igualitária, não meramente o pagamento de salários. No caso das empresas recuperadas essa característica é ainda mais gritante, pois o ato de formar uma cooperativa (c ainda perma- necer nas mesmasinstalações e organizadas de formasimilar à em- presa antecessora), após a falência se dá pela intençãode se manter o emprego, muitas vezes, pelo receio em não se conseguir uma reco- locação no mercado. Vemos recorrentemente um entusiasmo inicial logo da recuperação da empresa, em que se tinha um culpado (o patrão), quase um inimigo contra o qual todos se organizam e se empenham em reconstruir a cooperativa. Com o tempo,essa moti- vação vai dando lugar à nova realidade:a realidade de uma empresa, que necessita enfrentar inúmeros desafios e responsabilidades para osquais estes trabalhadores muitas vezes não estão preparados. É comumostrabalhadores da produção delegarem a responsa- bilidade pela gestão apenas aos que estão responsáveis pela admi- nistração. Geralmente sem muita experiência (principalmente em gestão coletiva) e pouca qualificação. Com isso, a administração adota comumente práticas defensivas e pouco transparentes, in- 34| CAPÍTULO Il - METODOLOGIA - vestem poucoou nada em capacitação, mantém comunicação falha com a produção, tomam decisões isoladamente, instaurando-se, assim, a antiga relação hierárquica conflituosa entre patrão/em- pregado agora entre diretoria e conjunto dos trabalhadores. A par- ticipação, base da autogestão, dessa maneira, não se realiza. Nas cooperativas que não são empresas recuperadas, vemos a mesmatendência de polarização de forma um pouco menos arrai- gada por não se tratarem das mesmas pessoas nas mesmas instala- ções, como é o caso das empresas recuperadas. Essa tendência, porém, é bastante forte por ser a relação empregatícia ainda o re- ferencial dos trabalhadores em nossa sociedade atual. O estabelecimentodo objetivo: a razão social da cooperativa, o produto ou o serviço, o resgate dos objetivos do cooperativismo na luta dos trabalhadores, o papel das cooperativas dentro do movi- mento de economiasolidária, enfim, o reconhecimento do coopcra- do comosujeito inserido dentro de um processo econômico,histô- rico e social é etapa fundamental à formação para a gestão coletiva. ORGANIZAÇÃO DOS TRABALHADORES X ORGANIZAÇÃO DO Negócio Parase pensarna gestão de umacooperativa é imprescindível com- preender-se a separação entre a organização dos trabalhadores na gestão da cooperativa e a gestão do negócio. Por que? Ostrabalhadores, na assembléia têm o poder de to- mada de decisão acerca das metas a serem alcançadase das diretri- zes políticas a serem seguidas pela cooperativa, As grandes ques- tões, os rumos que ela deve seguir; o ingresso ou desligamentos de sócios ou empregados, aceitar ou não parcerias, investir ou não em uma máquina,etc cabe aos cooperadosdiscutirem c deliberarem, Para isto devem ter acesso a todasas informaçõesnecessárias para que tomem cstas decisões. O dia-a-dia, no entanto, a opcracionalização das diretrizes e metas estabelecidas coletivamente, necessita autonomia da produ- ção ou da prestação de serviços para que se possa atender às exi- gências de clientes e mercados: cumprimento de prazos, realiza- ção do trabalho da forma mais adequada para que sc atinjam os padrões de qualidade, a escolha das pessoasideais para realizar deter- AUTOGESTÃO E ECONOMIA SOLIDÁRIA |35 +. minada ação, a operacionalização desse trabalho em conjunto ne- cessita uma coordenação que não está relacionada à coordenação da organização política. Enquanto os conselhos, da organização política, são eleitos como representantes em assembléias, os coor- denadores técnicos são escolhidos por sua capacidade técnica e responsabilidade profissional. O presidente da cooperativa representa a cooperativa perante à sociedade, mas não tem a palavra final em uma assembléia e não necessariamente coordena o setor da produção na qual trabalha. Ele pode ser o presidente da cooperativa em um momento é em um segundo momento, no mesmo dia, por exemplo, ocupar o cargo de torneiro mecânico subordinado ao coordenador dosetor. IMPORTÂNCIA DA GESTÃO DO NEGÓCIO / PROCESSO Comojá apresentamos,a empresa de autogestão está dividida entre a organização dos trabalhadores — possuindo umaestrutura própria de divisão do poder — e a organização do negócio que às vezes apresenta semelhanças com o funcionamento das empresas convencionais, Há quem pense que nas empresas de autogestão não deve ha- ver divisão de trabalho, todos devem fazer tudo porterem os mes- mosdireitos de decidirem sobre os rumos da empresa em assem- bléia. Tal visão é equivocada, pois o produto ou serviço a ser executado exige uma divisão de tarefas própria a ser seguida para que se atinjam os padrões de qualidade necessários à viabilidade econômica da empresa. Sendo assim, a divisão do trabalho deverá garantir uma boa organização da produção/ prestação de serviços e a administração. Evidentemente que se quisermos garantir a coerência da par- ticipação, a divisão do trabalho não deve seguir o modelo tayloris- ta/fordista de tarefas fragmentadas com clara separação entre ela- boração e operação. É importante que os cooperados conheçam todo o processo da produção ou prestação de serviços e que discu- tam em grupos de trabalho de seus sctores as possibilidades de melhoria dos processos, a exemplodas ferramentas de gestão da qualidade dos produtos e serviços. A autogestão como proposta para novas relações de trabalho — que tem o ser humano comocentro, a justiça social como ob- jetivo — deve ser economicamente viável. Para isso, devem bus- 36| CAPÍTULO Il - METODOLOGIA car a excelência na produção, prestação de serviço e atendimen- to aocliente e buscar as melhores técnicas de gestão do negócio. Além domais, a produção ou prestação de serviço de qualidade, que satisfaz as necessidades e expectativas dos clientes, além de proporcionar retorno financeiro, produz o retorno do bom re- aultado do trabalho coletivo,a satisfação em ser reconhecido pelo produto do próprio trabalho. Além disso, como apontamos no livro Autogestão e Economia Solidária - uma nova metodologia, volu- me2, a viabilidade da autogestão também passa pela sustentabi- lidade, o que envolve outras questões como à relação com a co- munidade, a intercooperação e a relação com o meio ambiente entre outros. “Todos possuem direitos iguais como sócio, mas diferentesfunções na empresa” É fundamental que os papéis e funções estejam bastante claros, bem como as suas diferenças. De maneira geral a convivência en- tre diferentes sabercs é fundamental para a realização dos objeti- vos da sociedade, A compreensão sobre o grau de complexidade, conhecimento, experiência ou qualificação exigido para cada fun- ção é importante, poisinflui diretamente na estrutura de trabalho e de remuneração. Há quese realizar boas discussões sobre o valor do trabalho aliado ao valor do produto ou serviço. Essa discussão auxilia bastante na hora de se esclarecer sobre possíveis diferenças nas retiradas, ou no valor do repasse, algo que sempre envolve bastante polêmica. Se por um lado temosa reali- dade dos profissionais que devem se valorizados de acordo com o mercado de trabalho, sob risco de que os mesmos deixem a coope- rativa, esse não deve ser o único critério, tampouco deve justificar diferenças gritantes, deve haver um limite para diferenças e um esclarecimento acerca do valor do trabalho, deixando-se claro os diferenciais de cada um e a realidade externa queinfluem no valor do produto ou serviço, bem como o trabalho. A experiência pro- fissional e o quanto essa pessoa investiu em sua qualificação são exitérios a serem considerados. Uma forma de tornar a questão maisjusta é as cooperativas possuírem uma política de incentivo a AUTOGESTÃO E ECONOMIA SOLIDÁRIA |37 qualificação de todos, de maneira que se caminhe para a igualdade da remuneração. O fundo do FATESexiste paraisto. IMPORTÂNCIA DA GESTÃO DA SOCIEDADE » A participação na produção é algo já bastante desenvolvido pelas empresas convencionais com suas células de produção semi-autô- nomas, círculos de controle de qualidade (CCQs), produção just in time. A participação na organização da empresa, nas macro-deci- sões, no entanto, não ocupa o mesmo lugar. O motivo é bastante simples, não é de interesse dos detentores dos meios de produção desenvolver estratégiase ferramentasde socialização do pader.Este deve ser restrito aos detentores do capital. A autogestão quebra justamente com essa lógica. Não existe um grupo restrito deten- tor do poder e um grupo mais amplo cumpridor de ordens. A totalidade dos sócios/ trabalhadoresé a detentora do poder. A autogestão é umaprática diária que sc reflete nas ações dos trabalhadores. O caderno 3 “Organização da Empresa, Produção e Administração” destaca a necessidade de se investir na construção de uma prática em que “todos possam exercer os direitos de dar opinião, criticar, argumentar, decidir. É condição dessa prática a existência da transparência, da solidariedade, do interesse social combinado com os interesses individuais”. ASSEMBLÉIASGERAIS Para quea gestão democrática seja de fato umarealidade, há que sc criar espaços e canais de participação. O maior canal de participa ção em umacooperativa é a assembléia geral. À assembléia geral ordinária (AGO) deve acontecer uma vez ao ano para aprovação de balançoe eleições de direção,de acordo com o estatuto, Assem- bléias extra-ordinárias (AGESs) podem scrfeitas na fregiiência que a cooperativa quiser, para tratar de outros assuntos de acordo com as definições da legislação e do estatuto social da cooperativa. Uma assembléia não deve ser chamada para a tomada de pe- quenas decisões, ela deve definir as grandes metas a serem atingi-das. Vemos que muitas vezes ocorre nas cooperativas tratarem em assembléias questões quotidianas, dando-lhes o mesmo peso que ? Caderno 3 ANTEAG: “Organização da Empresa, Produção e Administração” 38 | CAPÍTULO Il - METODOLOGIA questões maiores - e multas vezes os cooperados tendem interes- sar-se: mais por exemplo pelas decisões sobre pequenosgastos, do «ue de temas maiores, do qual não entendem. Esse tipo de prática pode levar à inoperância da cooperativa uma vez que seu funciona- mento torna-se extremamente moroso, Contudo, outros espaços de participação devem ser garantidos além da AGO e eventuais AGEs (comissões, grupos de trabalho, reuniões de trabalho,etc.) «que viabilizem a participação dos associados na gestão do empre- endimento. Para o funcionamento da assembléia, enquanto instância de representação, é necessário o entendimento por parte dos sócios acerca dos temasa serem tratados. As pautas devem ser comunica- das e discutidas em grupos menores com a antecedência necessá- ria, como reuniões de setor, por exemplo, ou comissões. Com a pauta estabelecida com antecedência e assuntosjá “digeridos” pe- los trabalhadores, escolhe-se um coordenador da reunião para as inscrições das falas. As sugestões apresentadas devem ser registra- das de maneira a ficarem visíveis a todos. Após a exposição das falas, passa-se para as deliberações. Cabe ao coordenador da assembléia delimitar o tempo e ga- rantir o direito à expressão dos associados. Deve também cuidar de queasfalas não fujam ao tema. Muitas vezcs o coordenador da assembléia é o presidente, ou outro membro do Conselho de Ad- ministração, masisto não é regra e torna-se exercício interessante rodiziar tal coordenação. Cabe ao presidente abrir c fechar a as- sembléia. Na assembléia não se pretende o consenso.Ele pode exis- tir, mas não necessariamente, caminhando-sc comumente para a votação e vitória das opiniões majoritárias. É um espaço e um mo- mento em que não raro emergem conflitos de interesses que de- vem passar por negociações entre as partes em prol da escolha do interesse do coletivo. É nas assembléias em que os interesses indi- viduais submetem-se aosinteresses do coletivo. OS CONSELHOS E COMISSÕES Todosos trabalhadores são responsáveis pelas decisões na assem- bléia geral, para que as coisas sejam encaminhadas de maneira or- denada,no entanto, é necessário eleger um conselho de administra- AUTOGESTÃO E ECONOMIA SOLIDÁRIA |39 ção, ou seja, um grupo de pessoas com mandatodefinido em esta- tuto e outorgadopelocoletivo de sócios em assembléia, que moni- torará o encaminhamento das deliberações da assembléia, O con- selho de administração deve ter alguma autonomia para tomar decisões « tocar atividades do dia-a-dia desde que não passem por cimadas decisões da assembléia (que em geral apresentam diretri- zes mais amplas). O conselho fiscal, eleito pela Assembléia Geral, tem poder e obrigação de fiscalizar tudo o que ocorre no interior da empresa, garantindo que as decisões da Assembleia Geral sejam realizadas. Para a aprovação do balanço do exercício de uma cooperativa, é necessário que o conselho fiscal, responsável por acompanhar as contas da cooperativa, emita seu parecer ao conjunto de sócios. Evidentemente que a separação da organização política da or- ganização do negócio não é algo facilmente assimilado pelos traba- lhadorcs. É comum haver nas cooperativas grande dificuldade em se compreender as diferentes funções, principalmente o duplo papel de sócio trabalhador, bem comoas diferentes instancias de poder dentro da organização autogestionária. Osdirigentes do conselho administrativo, por não compreen- derem também sua função, colocam-se na posição de “para raio” de todos os assuntos, como se fossem dirigentes de uma empresa” convencional, envolvendo-se com questões da organização do ne- gócio tanto quanto o da organização política. LO DIAN É importante que os acordos coletivos definidos em assembléia se mantenham para que se preserve a autoridade do coletivo. À auto- ridade dos dirigentes está apenas na função a eles delegadas de encaminhar as decisões da assembléia geral. Essa autoridade deve ser rodiziada para que não se personalize o poder em uma ou pou- cas pessoas. Os conselhos administrativose fiscais, não dão conta da totali- dade dos assuntos da cooperativa. Para fortalecer a descentraliza- ção das decisões sugere-se a criação de grupos de trabalho e co- missões. São maneiras de se promover encontros entre os trabalhadores para que possam estudar, refletir e fazer propostas 40 | CAPÍTULO II - METODOLOGIA = para questões especificas. Essa prática é o que permite que mais gente pense ccric saídas para as questões a serem enfrentadas den- tro da empresa. A empresa de autogestão deve ser um lugar onde todos às trabalhadores produzam conhecimentos, idéias e cami- nhos «de modo que não apenas gerem trabalho e renda parasi e suas famílias, como também se desenvolvam profissionalmente e pes- noalmente. CUMUNICAÇÃO Paraisto é necessário que todas as informações sejam transmi- tidas de forma transparente, Transparência dos números, dados, acontecimentos transmitidos através de canais diversos de comu- nicação: boletins, jornais, murais, radio peão (aquela favorável à gestão, não a famosa “fofoca”, atas. A quantidade de canais é bastante importante, mas também a qualidade da informação, além do preparo prévio do interlocutor ao receber a informação. Cursos de compreensão básica acerca da gestão da cooperativa e de outros temassão sempre bastante úteis para facilitar o acompanhamento por parte dos trabalhadores da situação da empresa, Também o exercício de apresentar os dadose informações de maneira didática é bastante oportuno, principal- menteas financeiras, geradoras de maior polêmica e alvo de maior interesse. A prática de tornar mais claras as informações, além de neces- sária, torna-se, com o tempo,prazerosa ao cooperado, a medida em quefacilita a participação dos demais, possibilitando que todos possam auxiliar o responsável pela tomada de decisões. Este, por sua vez, sente- * como quealiviado por nãoestar só com infor- mação e transmiti-la de modo a afastar possíveis desconfianças. No caderno 3 da ANTEAG,“Organização da Empresa, Produ- ção e Administração”, temos algumas condições para quea infor- mação seja transmitida de maneira eficaz: - “numa empresa autogestionária, nenhumainformação deve ser escondida. Isto gera desconfiança e podecriar ditadores; “ o registro das informações deveser ficl ao ocorrido; - à informação deve ser transmitida com clareza; - informação deve chegar a todos com agilidade; AUTOGESTÃO E ECONOMIA SOLIDÁRIA | 41 * o comunicadodeve ser por inteiro c sem insinuações com gestos ou palavras. Antes da Assembléia Geral, devem ocorrer reuniões do Conselho de Administração, do ConselhoFiscal ou dos Gru- pos de Trabalho. Precisamos nos preparar. Para isso deva mosestar informados, Saber é uma forma de poder” Ou seja, não basta haver canais de difusão da informação, como a assembléia, para que se alcance a participação. Participação se relaciona também com a possibilidade do cooperado compreen- der a empresa, saber formular propostas « responsabilizar-se porelas. ACOMPANHAMENTO DAVIDAFINANCEIRA Para se compreendera vida financeira de uma cooperativa, há que se resgatar o ato cooperativo. Os termos contábeis de entrada e saída de dinheiro no ato cooperativo diferem dosatos não coope- rativos: ao invés de receita, como nosatos não cooperativos, o ter- mo utilizado para caracterizar a entrada de recursos financeiros em uma cooperativa é Ingresso. O termo equivalente às despesas, por sua vez, é denominado dispêndio. Então, do dinheiro que entra, o ingresso, a cooperativa precisa reservar primeiramente umaparte para pagar os dispêndios; ou- tra deveir para os fundose investimentos e, com o recursorestante, fazer o repasse aos sócios, que comumente chamamos de retirada. Ingressos — Dispêndios da Sociedade — Fundos e Investimentos Repasse líquido dos resultados É importante que o trabalhador cooperado tenha claro que os ingressos da cooperativa são de todos os cooperados, assim como também o são os seus dispêndios. O repasse somente pode ocorrer após a cooperativa haver garantido o recurso para os dispêndios. Tais conceitos devem orientar a organização financeira da cooperativa. Os resultados a serem distribuidos, devem ser calculados da seguinte maneira: Sobras: São, em geral, apuradas anualmente, no 42 | CAPÍTULO Il - METODOLOGIA final do exercício, e representam a diferença entre o que foi provi- aloniado mensalmente para o pagamento dos dispêndios da socie- dude é o que de fato se gastou. Não é equivalente ao lucro, como muitos pensam. E os fundos. Existem os obrigatórios - o FATES (educação) e o Fundo de Reserva, como podem ser criados ilimi- tadamente fundospara as mais diversasfinalidades, desde que conta- bilizados. Trata-se de uma boa maneira de capitalizar a cooperativa Algo comumente dificil de ser compreendido pelo cooperado é o repasse não ser algo fixo todos os meses, depender da situação financeira da cooperativa. Comose ele ainda fosse empregado que vende sua força de trabalho a um patrão. Isso por que as cooperati- vas têm dificuldade em tornarclara e participativa a sua vida finan- «eira. Não estamos falando de discutir miudezas com todos os co- operados. Estamos falando da discussão de criar fundos, comprar máquinas, explicar a natureza dos dispêndios, fazer provisionamento para descanso dos cooperados e indicar quais as fontes de recurso para tudoisto,etc. É preciso fazer com que entendam comose dão os ingressos e como administrá-los bem, garantindo não só a re- muneração mensal dos sócios, masa sustentabilidade do negócio, que acaba sendo, também,sua própria sustentabilidade. O desconhecimento da vida financeira de uma cooperativa aca- ba levando a atrasos ou endividamentos com fornecedores para pa- gamento das “retiradas"ou a equivocos como“endividamentoda coopera- tive”com “tetiradas”atrasadas. Ora,o dinheiro da cooperativa é dinheiro . dos cooperados; da mesma maneira comoas dívidas da cooperativa são dívidas do cooperado. Contudo, muitas vezes ainda prevalece a idéia de que as obrigações da cooperativa nada tem a ver com o cooperado individualmente, assim como em uma empresa conven- cional onde as despesas eram responsabilidade do patrão,assim como a de gerar recursos suficientes para garantir os salários em dia. Um fluxo de caixa atualizado, organizado de forma adequada paraa visualização pelos cooperadosa ser apresentado periodica- mente, com boasjustificativas e a boa compreensão do mecanismo de ingresso, dispêndio, repasse e sobras, auxilia em muito o acom- panhamento da vida financeira da cooperativa. À capacitação nes- ses conteúdosé de imenso valor para que sc consiga atingir a com- preensão e participação dos cooperados. AUTOGESTÃO E ECONOMIA SOLIDÁRIA | 43 RELAÇÕES COM A SOCIEDADE À economia solidária, ao priorizar as relações de solidariedade ecooperação às de individualismo e competição, está propondoumaoutra relação entre um empreendimento econômicgea so-cidade, Para isso, o estabelecimento de relações entre o empre-endimento e a comunidade, com outras empresas e empreendi-mentos de autogestão com redes de apoio, tem importânciacentral, Trata-se da possibilidade de “empoderamento” dos empreen-cimentos através da sua organização de maneira a fortalecê-lospolítica e economicamenteatravés de relações comerciais mais jus-tas e do estabelecimento da intercooperação no lugar da competi-sãoa fim dese atingir os mesmos objetivos. Dessa maneira,a arti-culação em redes se constitui comoa única maneira das empresase empreendimentos da economia solidária sobreviverem em ummercado oligopolizado, que ameaça constantementea sobrevivên-cia dessas iniciativas. Ondeestão os “pontos fortes” que podemos explorar para al-cançar estes objetivos? na força produtiva e criativa excepcional representada pelo trabalho associado, presente nas empresas cooperativas;na capacidade produtiva que deriva da atitude solidáriapresente entre a maioria dos trabalhadores da maioria das empresas cooperativas; na capacidade potencializada por um aprendizado econô-mico e tecnológico permanente por parte dos trabalhado-res, que se realiza coletivamente: “a inteligência coletiva”,na possibilidade da intercoopcração entre empresas coo-perativas que compartilham valores autogestionários e soli-dários, que fazem da atividade produtiva um espelho da so-ciedade que almejam. Portanto, se as empresas c empreendimentos de EconomiaSolidária pretendem cumprir o papel de construção de uma alter-nativa viável e real ao desemprego, à injustiça e à miséria, precisamde umapolítica firme dc potencialização das redes, como conjun- 44 | CAPÍTULO II - METODOLOGIA e anômico, por um lado, e como movimentosocial dos traba- lotes associados, por outro, Entas estruturas de “empoderamento” das empresas, que lhes permitem sobreviver e crescer, são as redes de intercooperação. CAÉ Mravés das quais é possível reduzir custos e compartiridéias e ações. Ar ações de intercooperação permitem melhorar o desempe- : nho econômico das empresas e estreitar os laços de solidariedade entre as empresas e entre os trabalhadores das diversas empresas, É gomo por exemplo: constituição de fundos comunsde investimento; é. Gontratação ou compras compartilhadas de serviços e insumos; estabelecimento de um sistema compartilhado de representações gemerciais; formação de cooperativas de consumo entre ostraba- lhadores das diversas empresas e mesmo buscarem assessorias c capacitações conjuntas. Nos volumes anteriores apontamos aspectos importantes a se- rem levados em conta no estabelecimento de redes, uma demanda há tempos colocada para o desenvolvimento das empresas e em- preendimentos e que vinha se realizando, até então,de forma em- brionária em experiências tímidas e de pouco relevo. Contudo,as bases para um salto qualitativo estava em construção e as diretrizes levantadas no segundo volume do“Autogestão e Economia Solidá- Fla - uma nova metodologia” impulsionaram ações importantes no desenvolvimento de redes, sobretudode saberese de informações. Retomamos abaixo os desafios conceituais e práticos que fo- ram apontados nos volumes anteriores: - À importância em se atuar tendo uma visão global dos empreendimentos e empresas autogestionárias, entenden- do-as e trabalhando-as a partir das suas diferentes realida- des, culturas, regiões etc. - É central para a empresa ou empreendimento visualizar e entender em que cadeia produtiva e em que lugar dela se está inserido. - Ter claro o desafio posto por se estabelecer um processo de rede nos moldes de uma economia solidária e autogestionária, levando em conta que a lógica corrente do mercado convencional aponta para valores antagônicos e que AUTOGESTÃO E ECONOMIA SOLIDÁRIA | 45 os empreendimentos e empresas estãoinseridos nesse mercado. * Analisar e intervir -a partir de uma compreensão contextual das questões internas e externas às empresas e empreendimentos de autogestão — para a criação de redes que contribuam para a viabilidade não apenas econômica, mas também política e social desta organização coletiva. * Darsubsídios c provocara criação de políticas públicas de apoio à autogestão e à economia solidária. * Promover estratégias de acesso a crédito, formandoo tra- balhador para que ele conheça os caminhos para acesso, ou reivindicação de outras modalidades de apoio à redes e aos empreendimentos nos moldes da solidariedade. * Criar meios de comunicação permanentes entre pessoas e empreendimentos, com especial atenção às formas com que se transmitem e se recebem as informações. Numaboa articula- ção em rede,a informação tem