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Modelo de abordagem progressiva ao jogo no ensino do voleibol. Conceção, metodologia, estratégias pedagógicas e avaliação Isabel Mesquita; José Afonso; Patrícia Coutinho; Rui Araújo Faculdade de Desporto, Universidade do Porto Centro de Investigação, Formação, Intervenção e Inovação em Desporto (CIFI2D) Centro de Estudos dos Jogos Desportivos (CEJD) 1. ACERCA DA CRIAÇÃO DO MODELO DE ABORDAGEM PROGRESSIVA AO JOGO O processo de ensino-aprendizagem reclama que o reduto da indissolubilidade entre teoria e prática seja garantido, onde as estratégias formativas a aplicar cumpram a transmutação de um saber baseado em regras e teorias para um saber situado, no qual esse saber, mais teórico, assume significado e contextualização. Só assim se torna possível a conformação dos ensinamentos teóricos em situação prática, o aportar do verdadeiro significado das aprendizagens legitimado pelos constrangimentos situacionais que ditam a sua apropriação e significado. Estes enunciados fundamentam a necessidade do ensino do jogo não ser ausente de um quadro teórico de referência, de uma visão e projeto de formação e educação, de uma conceção de ensino do jogo, enfim de um modelo de ensino. O modelo de ensino do Voleibol designado de Modelo de Abordagem Progressiva ao Jogo (doravante designado de MAPJ) teve a sua génese no início da nossa atividade como docente1 da Faculdade de Desporto2, quando edificamos o programa de Didática do Desporto - Voleibol, constituindo, desde então, um dos temas eleitos, tanto na investigação como na docência. Nesse momento, e pela primeira vez, fomos confrontados com a necessidade de apresentar uma proposta de ensino do Voleibol que almejasse uma formação desportiva de crianças e jovens, cultural e eticamente fundada, independentemente do contexto de prática. Sendo um Jogo Desportivo de difícil aprendizagem, principalmente no tocante aos aspetos de natureza técnica, o seu ensino e treino, durante largos anos, resvalou para que a técnica tomasse dianteira e fosse, por isso, o principal critério na escolha das situações de aprendizagem; concomitantemente, o jogo era conotado como veículo de aplicação das habilidades técnicas aprendidas e exercitadas em contextos analíticos, desprovidos de significado, assistindo-se a uma cristalização e a um formalismo das ideias e das práticas de ensino do jogo. Mais se acrescenta que, até então, os aspetos de formação pessoal e social não figuravam, frequentemente, nos programas de formação desportiva como aspetos de 1 Isabel Mesquita, 1ª autora deste texto. 2 Então designada Instituto Superior de Educação Física, remontando ao ano letivo de 1989/1990. desenvolvimento, sendo perspetivados, quando tal acontecia, mais como consequência do que propósito. O acervo bibliográfico que outorga o MAPJ coligiu contributos substantivos, desde a sua criação até ao momento atual, com destaque para aqueles que constituíram marcos de divulgação e catapultaram transformações substantivas no seu processo de desenvolvimento. A primeira publicação data de 1991 (Mesquita, 1991), momento em que pretendemos conferir lógica e sequência ao tratamento didático da matéria no ensino do Voleibol. Mais tarde, em 1994, o ideário de ensino do jogo, assente na enformação dos desígnios táticos e técnicos, é intentado através de uma outra publicação de maior fôlego e interesse pedagógico (Mesquita, 1994). Esta publicação foi replicada em edições posteriores, duas nacionais e duas internacionais, em língua castelhana, entre 1994 e 1999. Os axiomas do MAPJ – ainda designado, timidamente, como Proposta metodológica de ensino do Voleibol –, nortearam o tema de investigação da nossa tese de doutoramento defendida em 1998 (Mesquita, 1998b), na qual crença, convicção, experiência feita e ciência atestaram a sua valência formativa. Mais tarde, em 2004, pelo advento das ideias construtivistas e cognitivistas, que perpassaram a década de noventa, o ensino do jogo acolhe estas novas ideias, patentes em dois modelos pioneiros3, adquirindo o MAPJ, pela mesma influência, maior robustez conceptual. É nesse preciso momento que é designado pela primeira vez como Modelo de Abordagem Progressiva ao Jogo (Mesquita & Graça, 2004). Posteriormente, inicia-se a investigação sobre a eficácia do modelo e, entre os estudos realizados, destaca-se o de maior extensão, publicado numa revista inglesa de circulação internacional com fator de impacto (Mesquita, Graça, Gomes & Cruz, 2005). A sua confirmação como modelo coerente, lógico e substantivo para o ensino do Voleibol, no âmbito das etapas iniciais de formação desportiva, asseverado por valores sociais e culturais que dão sentido à prática desportiva, catapulta uma nova publicação, onde, pela primeira vez, a inclusão de todas estas valências é consumada (Mesquita, 2006). Em síntese, o reconhecimento da necessidade de se criar um modelo de ensino do Voleibol que fornecesse uma estrutura global e coerente, que clarificasse os objetivos de aprendizagem em torno de grandes propósitos, que perspetivasse a natureza das tarefas de aprendizagem, que equacionasse os papéis do treinador/professor e dos praticantes, que acautelasse a coexistência de práticas de aprendizagem precursoras da aquisição do sentido e do valor do Desporto, da partilha de experiências de aprendizagem autênticas e entusiásticas e da equidade de oportunidades constituiu o mote impulsionador da criação e aperfeiçoamento do MAPJ. Desde a sua génese tem sofrido constantes metamorfoses, fruto da sua extensa aplicação em diferentes contextos de prática, os 3 O Teaching Games for Understanding (Bunker & Thorpe, 1982) e o Sport Education (Siedentop, 1994). quais integram o âmbito do treino desportivo e o escolar, tanto nas aulas de Educação Física como no Desporto Escolar. A sua aplicação tem evocado achegas pertinentes, por parte de treinadores e professores, ao que se acrescentam os resultados oriundos da investigação pela avaliação da sua eficácia, contribuindo para o alvorar de refinamentos sucessivos do modelo. Deste modo, o MAPJ não constitui um modelo perfeito e acabado; bem pelo contrário, encontra-se numa fase de franca expansão e desenvolvimento sedento de novas avaliações e de novos contributos, fruto da relação perene e auspiciosa entre teoria e prática. O presente capítulo visa proporcionar aos estudiosos do ensino do jogo, professores e treinadores conhecimento simultaneamente eclético e particular4 em relação à matriz conceptual e aos procedimentos didático-metodológicos que fundamentam e corporizam, respetivamente, o MAPJ. Deste modo, pretende-se, a partir do quadro teórico que o sustenta, desaguar paulatina e regradamente nas tarefas de aprendizagem, nas estratégias pedagógicas, nos modos de avaliação e nos resultados da investigação a partir da sua aplicação. Face aos propósitos visados importa dar resposta às seguintes questões nucleares: - Em que medida o MAPJ rompe com os modelos tradicionais do ensino do Voleibol? - De que forma é que o MAPJ é capaz de contribuir para uma formação eclética dos praticantes, onde a formação pessoal e social é assegurada em alinhamento com a desportiva? - Quais o papel (ou papéis) da competição no MAPJ? De que formasão garantidas oportunidades de participação e de sucesso a todos os praticantes? - Em que medida é que o instrumento de avaliação das competências de jogo, perfilhado pelo MAPJ, consegue estabelecer o círculo de validade ecológica entre aprendizagem e avaliação? 2. MATRIZ CONCETUAL DO MODELO DE ABORDAGEM PROGRESSIVA AO JOGO No Voleibol, o facto das habilidades técnicas serem realizadas em referência a padrões de execução relativamente estáveis, derivado da punição regulamentar e da maior previsibilidade do jogo, conduziu à treinabilidade da técnica, durante largos anos, em situações analíticas desprovidas da perturbação ambiental que é apanágio do jogo. Todavia, a instabilidade provocada pela descontinuidade na relação com a bola, por não poder ser agarrada e apenas tocada, alicerçada no facto de todo o terreno do jogo se constituir como alvo, impõe a necessidade de serem tomadas decisões num decurso temporal extremamente reduzido. Simultaneamente, a interação do primor técnico, imposto pelas exigências regulamentares, com a elevada velocidade de processamento de 4 Eclético na abrangência formativa que integra e particular no tratamento didático que é conferido aos conteúdos de treino bem como às estratégias de ensino e de aprendizagem elencadas. informação, derivada da brevidade dos contactos, reclama ao jogador grande capacidade adaptativa. Deste modo, a necessidade do treino da técnica ser situacional é legitimada, devido à especificidade dos cenários de prática interferirem com a realização das habilidades técnicas, alterando, inclusive, a dinâmica de realização dos movimentos. Mesquita, Maia & Marques (2001), num estudo realizado no treino em Voleibol juvenil, verificaram que as jogadoras que usufruíram do treino das habilidades técnicas em tarefas modeladas em referência às exigências do jogo, progrediram mais na aprendizagem em relação às que as praticaram em tarefas analíticas complementadas pelo jogo, na sua versão formal (6x6). A acessibilidade ao uso intencional e oportuno da técnica passa pela compreensão dos processos mediadores, na medida em que sem o praticante compreender o que faz e porque faz, a sua ação perde significado, como é anunciado no estudo de caso de Mesquita & Graça (2002). Tal remete para a necessidade do praticante, desde a primeira etapa de formação, conhecer não só o padrão motor da técnica, como também a forma como esta se realiza (conhecimento declarativo e processual, respetivamente) e, não menos importante, o porquê e o quando da sua utilização (expressos na relação se/então) (conhecimento condicional); sendo este que confere apropriação ecológica aos contornos particulares, isto é, às variações paramétricas que as habilidades técnicas assumem. Neste sentido, a relação entre perceber e agir é estabelecida, criando-se condições para que o praticante percecione variáveis especificadoras, isto é, informação disponível no cenário de prática indiciadora de sinais pertinentes consentâneos com as soluções possíveis a adotar e desvalorize variáveis não especificadoras, conducentes a perceções desviantes. Nesta conformidade, impõe-se que no ensino e treino dos JD em geral, e no Voleibol em particular, tática e técnica coabitem e se influenciam, porquanto se, por um lado, o jogador tem que compreender os eventos correntes, para tomar decisões acertadas, por outro, tem que possuir um vasto repertório técnico que só adquire significância e autenticidade quando aplicado apropriadamente na lógica funcional do jogo. Nesta perspetiva, uma habilidade é mais do que uma técnica: é um módulo de aprendizagem que integra unitariamente a capacidade de perceber sinais pertinentes, a capacidade estratégica e a capacidade de execução de movimentos. Apesar destas evidências, nomeadamente em Portugal no âmbito da Educação Física, assiste-se a uma proliferação de agendas concetuais perfilhadas pelos professores em relação ao ensino do jogo, que vão desde o ensino isolado das habilidades técnicas, passando pelo estabelecimento de progressões assentes no treino das habilidades em referência ao jogo, até à valorização dos jogos modificados e da precedência dos problemas de jogo, da consciência tática e da tomada de decisão. O MAPJ acentua a necessidade do praticante compreender o jogo e fazer da aprendizagem um processo de procura de soluções (dimensão cognitiva), oferece a todos oportunidades de prática e de participação equitativa (dimensão social), assegura a construção de valores eticamente fundados pela promoção do fair-play e da literacia desportiva (dimensão pessoal) e legitima a aquisição de competências táticas, técnicas e físicas pela prática do jogo modelado, em referência ao jogo formal (dimensão motora) (Mesquita, 2006a). É gerado e desenvolvido em torno de uma conceção de aprendizagem situada do jogo, enformando uma perspetiva holística e unitária do ensino do Desporto, e em particular do Voleibol, pela valorização integrada e entrelaçada das dimensões de formação pessoal, social, cultural, cognitiva e motora. Para responder a estes propósitos, o MAPJ abandona a perspetiva molecular da aprendizagem das habilidades técnicas, privilegiando uma abordagem holística, em referência às prerrogativas emanadas do jogo. Em termos conceptuais, o MAPJ apoia-se em alguns modelos, os quais oferecem uma proposta pedagógica sólida e coerente em referência aos valores e sentido do Desporto, ao mesmo tempo que enfatizam a tomada de decisão e a aquisição de competências de jogo. Estes modelos dão corpo e substância, no ensino dos JD, às ideias oriundas das perspetivas cognitivistas, ligadas às teorias do processamento da informação, e às perspetivas construtivistas de pendor mais piagetiano ou radical e de pendor mais vygotskiano, social e cultural como a teoria da aprendizagem situada (Graça & Mesquita, 2007). Entre esses modelos destacam-se: - O Modelo de Ensino do Jogo para a Compreensão5, o Tactical Games Approach (Mitchell, 1996) e o Play Practice (Launder, 2001), os quais enfatizam a componente cognitiva na aprendizagem do jogo. Têm como propósitos basilares trazer a equação do problema e respetivas soluções para um nível de compreensão consciente e de ação deliberadamente tática no jogo; - O Modelo de Educação Desportiva6, que por valorizar a dimensão humana e cultural do Desporto, funda-se na importância de democratizar o Desporto e de vitalizar a competição, estabelecendo um compromisso pedagógico entre inclusão, competição e aprendizagem. Parte da premissa de que um Desporto mais inclusivo será necessariamente um Desporto mais plural e mais diferenciado, onde cada um, segundo as suas possibilidades e os seus interesses, poderá encontrar parceiros compatíveis na viabilização da prática que lhe é mais conveniente. Comporta a inclusão de três eixos fundamentais de formação desportiva: o da competência desportiva, o da literacia desportiva e o do 5 O modelo de Ensino do Jogo para a Compreensão foi pioneiro, tendo surgido na década de 60 em Inglaterra, na Universidade de Loughborough. Ver em: Werner, P., Thorpe, R. & Bunker, D. (1996). Teaching games for understanding: Evolution of a model. JOPERD, 67:28-33. A sua formalização ocorreu bem mais tarde. Ver em: Bunker, D. & Thorpe, R. (1982). A Model for the Teaching of Games in SecondarySchools. Bulletin of Physical Education. 5-8. 6 Duas obras lançaram o Modelo de Educação Desportiva: (1) Siedentop, D., Mand, C. & Taggart, A. (1986). Physical education: Teaching and curriculum strategies for grades 5-12. Palo Alto: Mayfield Publishing Company e (2) Siedentop, D. (1987). The theory and practice of sport education. In G, Barrette,; R, Feingold,; C, Rees & M. Piéron (Eds.), Myths; models and methods in sport pedagogy, pp. 79-85. Champaign IL; Human Kinetics. A sua consolidação confirmou-se, mais tarde, na seguinte obra: Siedentop, D. (1994) Sport education: Quality PE trhough positive sport experiences. Champaign, IL: Human Kinetics. entusiasmo pelo Desporto, sendo o seu propósito formar a pessoa desportivamente competente, desportivamente culta e desportivamente entusiasta. Acrescenta-se, ainda, o Modelo Desenvolvimental das Tarefas e do Jogo (Rink, 1985), o qual assenta no postulado de que nem só o domínio da matéria de ensino é suficiente para estruturar o processo de ensino-aprendizagem, nem mesmo o aporte de técnicas didáticas se oferece suficiente para realizar eficazmente esta tarefa. É do entrelaçamento da matéria de ensino com os princípios didáticos que resulta a estruturação eficaz do processo de instrução, ofertando, este modelo, uma proposta coerente, lógica e cientificamente suportada (Mesquita & Graça, 2009). Embora com incidências distintas, e num esforço de síntese, é possível aglutinar premissas que todos estes modelos postulam, das quais se destacam: valorização dos aspetos da perceção, compreensão e tomada de decisão; adequação das formas de jogo à capacidade dos praticantes; ancoragem dos aspetos afetivos e sociais, de forma a garantir a participação equitativa de todos os praticantes e fomentar a autonomia no processo de aprendizagem; desenvolvimento da capacidade para jogar, consumado pela certificação de uma avaliação autêntica, isto é, alinhada entre conteúdos de ensino e de avaliação (Mesquita & Graça, 2002). Através do reconhecimento destes desígnios, o MAPJ conferiu corpo e substância aos pressupostos concetuais vigentes nos modelos anunciados. A base concetual em que se revê, bem como a estrutura funcional que assume, permite a sua aplicação em diferentes contextos de prática (clube, escola, autarquias, entre outros), visando o desenvolvimento de competências tático-técnicos propedêuticas do jogo formal (6x6), bem como a construção de atitudes e comportamentos precursores de uma formação pessoal, social e desportiva, ética e culturalmente fundada. Mais se adita que a matriz conceptual e estrutural que caracteriza o MAPJ encontra eco no projeto Gira-Volei (Mesquita & Araújo, 2002) criado pela Federação Portuguesa de Voleibol em 1999, extensamente difundido em Portugal, desde então até ao momento atual. Nesta medida, e tendo por referência as teorias alicerçadas à formação desportiva de longo prazo7, o MAPJ situa-se, inquestionavelmente, na etapa inicial da formação desportiva, onde assume relevância a formação multilateral, pautada pela vivência de experiências motoras diversificadas e pela prática do jogo deliberado8. Neste âmbito, constitui propósito desta etapa de formação a 7 Côté e colaboradores criaram o Developmental Model of Sport Participation o qual concebe três etapas de formação desportiva: os anos de experiências variadas (6-12 anos), os anos de especialização (13-15 anos) e os anos de investimento (+16 anos). Ver em: Côté, J., Baker, J. & Abernethy, B. (2003). From play to practice: a developmental framework for the acquisition of expertise in team sports. In Starkes, J. & Ericsson, A. (Eds.), Expert Performance in Sports – Advances in Research on Sport Expertise, pp. 89-114. United States of America: Human Kinetics. 8 Consiste na prática voluntária do jogo modelado ao nível da adaptação estrutural e regulamentar, com objetivos de aprendizagem centrados nas habilidades motoras mais gerais e fundamentais, onde a busca do prazer é essencial. Ver em: Côté, J. & Hay, J. (2002). Children’s involvement in sport: a developmental perspetive. In J.M. Silva & D. Stevens (Eds.), Psychological foundations of sport (2nd Edition). Boston: Merrill. aquisição dos pressupostos inerentes à dotação motora geral e ao desenvolvimento da capacidade para aprender a treinar. A matriz conceptual do MAPJ estabelece, assim, uma interação imediata e íntima das componentes tática e técnica, em consonância com a dinâmica interna do jogo e os objetivos de aprendizagem, num esforço de alinhamento dos conteúdos de aprendizagem com a prática do jogo. O mesmo será afirmar que não nega a necessidade do ensino da técnica, apenas sustenta que o seu trabalho específico surja após a apreciação do jogo e a contextualização da sua necessidade a partir de situações modificadas de jogo. Nesta conformidade, o jogo, objetivado numa forma modificada concreta, é a referência central para o processo de ensino e incide sucessiva e ciclicamente sobre: a apreciação dos aspetos constituintes do jogo; a identificação dos princípios táticos; a consciencialização da tomada de decisão; a exercitação das habilidades técnicas adequadas e necessárias à resolução de problemas emergentes; e, finalmente, a treinabilidade do jogo e dos respetivos conteúdos conducentes à melhoria da performance. No MAPJ, o jogo, desde a sua versão mais simples (1x1) até à sua versão mais complexa (6x6), constitui o eixo vertebrador da estruturação das atividades, decorrendo do seu tratamento didático a manipulação de constrangimentos que torna acessível a sua prática qualificada. Neste sentido, as formas de jogo são modificadas e adaptadas ao nível de desempenho e de experiência, o que significa que é o repertório motor do praticante e o teor do conteúdo de aprendizagem que definem a forma de jogo selecionada (Kirk & Macphail, 2002; Maxwell, 2003). A estrutura curricular do modelo projeta a passagem por quatro Etapas de Aprendizagem do Voleibol, entre as quais são estabelecidas progressões assentes num compromisso permanente entre articulação horizontal (variantes da mesma tarefa) e vertical (tarefas de nível de dificuldade distinto) da matéria de ensino. O mesmo será dizer que, na aprendizagem, a repetição é sujeita a variação, o que significa, segundo Vereijken & Whitting (1990), repetir sem repetir. Trata-se de repetir o conteúdo de treino em situações que possuem o mesmo nível de dificuldade e dificuldade superior, resultando, daí, uma progressão dinâmica e interativa semelhante ao efeito em hélice. Na determinação das progressões é controlada a sequência dos conteúdos (ordem de abordagem), a extensão (volume, ou seja, a quantidade de conteúdos abordados), a profundidade (o nível de aprofundamento dos conteúdos) e a ênfase (determinação dos aspetos essenciais, momento a momento do processo de aprendizagem) (Rink, 1993). No sentido de estabilizar a progressão e conferir aplicabilidade aos conteúdos, alvo de aprendizagem, são aplicados os conceitos de refinamento e de aplicação, estruturantes da planificação e condução do ensino9. Estas prerrogativas não encontram expressão cabal no domínio da prática, ao verificar-se que raramente os treinadores valorizam os procedimentos de refinamento e aplicação, denotando um desenvolvimentopobre do tratamento didático do conteúdo de treino (Mesquita, Farias, Pereira & Arroyo, 2008). No tratamento didático do conteúdo, o MAPJ projeta a aprendizagem de novas habilidades técnicas, gradativamente, de etapa para etapa, de acordo com as demandas táticas do jogo praticado, de forma a tornar viável a existência de fluxo de jogo. Uma vez que a modelação regulamentar constitui um requisito didático crucial para conferir ao jogo sequencialidade e fluidez, a adaptação das regras de jogo modela as condições de prática, promovendo a aprendizagem em contextos situacionais portadores de validade ecológica. Neste âmbito, a adaptação regulamentar passa pela manipulação da área de jogo, do número de jogadores, do material (tipo de bolas e altura da rede) e pela modelação das regras. Tem como propósito facilitar a ocorrência de sucesso cumprindo uma intencionalidade didática, ao condicionar o espaço de ação, o tempo de atuação e as ações a desenvolver. A aplicação combinada de dois princípios didáticos (modificação por representação e por exagero) (Holt Strean & Bengoechea, 2002) otimiza a aplicação das formas de jogo simplificadas (Mesquita, 2006a). A primeira tem como propósito proporcionar o fluxo de jogo (ex. sustentação de bola através da redução das dimensões do terreno de jogo e pelo incremento de número de toques por jogador e por equipa) e a segunda focaliza a atenção dos praticantes na escolha apropriada da solução para o problema tático ou para o incremento da performance no uso das habilidades técnicas (através da adaptação funcional da área de jogo, restrições ofensivas e defensivas, manipulação de critérios na realização das tarefas) (Mesquita, 2006a). A passagem para um nível superior de prática requer que os conteúdos abordados na etapa, em questão, sejam do domínio dos praticantes; a avaliação efetiva-se nas formas modificadas de jogo abordadas, durante a referida etapa e as exigências assentam nas componentes críticas prescritas para os diferentes conteúdos. Os problemas táticos gerais, tanto do domínio ofensivo como defensivo, os princípios que subjazem as ações táticas sem bola e as habilidades e fundamentos técnicos vão sendo introduzidos, de acordo com a configuração estrutural e informacional que o jogo assume. A configuração estrutural e funcional do MAPJ tem como base o cumprimento de cinco princípios (Mesquita, 2006a): A lógica didática tem por base a lógica do jogo; a aquisição de competências para jogar tem por base a apreciação e a compreensão do jogo, onde o ensino da técnica decorre da 9 Refinamento - Definição do aprofundamento dos elementos de execução técnica e/ou uso estratégico; Aplicação - Tarefas de aprendizagem centradas na competição e na autoavaliação. Ver em Rink, J. (1993). Teaching physical education for learning (2ª Edição). St. Louis: Mosby. necessidade de se responder a problemas táticos emergentes; o ritmo individual dos praticantes é considerado em todos os momentos do processo de ensino-aprendizagem; o processo de avaliação esta intimamente associado ao processo de ensino-aprendizagem sendo realizado não apenas num momento específico mas ao longo de todo o período instrucional, elegendo as formas simplificadas de jogo como os meios privilegiados para a sua consumação. 3. TIPOLOGIA DE TAREFAS DE APRENDIZAGEM DO MODELO DE ABORDAGEM PROGRESSIVA AO JOGO Uma das premissas didáticas no ensino dos JD fundamenta-se na assunção de que a lógica conferida ao ensino dos conteúdos deve refletir a lógica do jogo, como referido anteriormente. Assim, e dada a especificidade do Voleibol, jogo de não-invasão de elevada exigência técnica, o MAPJ integra uma tipologia de tarefas que visa manipular o grau de complexidade do jogo na versão formal, suportada nos princípios da continuidade e no incremento gradual de dificuldade (Munsch et al., 2002). A referida tipologia de prática integra as seguintes tarefas: (1) tarefas de aquisição, (2) tarefas de estruturação e (3) tarefas de adaptação (Mesquita, 2006a). Salienta-se que, das primeiras para as últimas, a interferência contextual10 é incrementada, no sentido das condições de prática incluírem de forma gradativa e dinâmica as exigências proclamadas pelo jogo. Evidencia-se, assim, que a ordem de utilização das tarefas pode ser alterada, uma vez que a sua aplicação não obedece a uma hierarquização rígida, considerando-se as características dos procedimentos tático-técnicos, o nível do desempenho dos praticantes e os objetivos de aprendizagem para a respetiva aplicação das tarefas. A especificidade dos conteúdos de cada uma das etapas e as necessidades particulares e pontuais dos praticantes, revelam-se os indicadores pelos quais se deve pautar a aplicação dos diferentes tipos de tarefas, em cada uma das Etapas de Aprendizagem. A legitimação das tarefas de aquisição funda-se no reconhecimento de que a capacidade de jogo pode ser limitada e enviesada por constrangimentos de ordem técnica, retroagindo sobre a leitura das situações correntes, ampliando ou reduzindo as possibilidades e disponibilidades de busca, de perceção e de tomada de decisão. Como a designação indica respondem às necessidades de um domínio técnico basilar para intentar a ocorrência de fluxo de jogo. Visam prioritariamente a 10 Este conceito reporta-se especificamente à forma de organização da prática variada. Quando esta integra a realização de um conjunto de repetições da mesma tarefa designa-se por prática variada por blocos; quando a prática integra a realização de séries ordenadas de repetições denomina-se de prática variada por séries e, ainda, quando a distribuição das variantes da tarefa é realizada ao acaso designa-se de prática aleatória. Ver em: Godinho, M.; Mendes, R.; Barreiros, J. & Melo, F. (2002). Organização da prática. In M. Godinho (Ed.), Controlo Motor e Aprendizagem: Fundamentos e aplicações, pp.164-171. Lisboa: Edições FMH. eficiência11 e são consumadas em situações de interferência contextual baixa, ou seja, em tarefas analíticas desprovidas de referência ao jogo. Devem estar presentes no processo de aprendizagem o menor tempo necessário, porquanto não permitem a contextualização das habilidades técnicas nos ambientes de aplicação, isto é, no jogo e tarefas afins. As tarefas de estruturação promovem o comportamento tático e o uso das habilidades técnicas em situações que preservam a lógica acontecimental do jogo (tarefas de encadeamento), incrementando o seu fluxo (jogo cooperativo) em condições de interferência contextual moderada. Desta feita, focalizam a atenção dos praticantes na eficiência técnica, ao mesmo tempo que são incluídos critérios de êxito baseados na eficácia12 e onde emerge, já, alguma necessidade de adaptação13. Nas tarefas de estruturação, o trabalho de educação da atenção é concomitante com a ativação do sistema percetivo-decisional através da manipulação explícita de constrangimentos afetos à tarefa (Williams & Ward, 2003), como sejam a manipulação de princípios de ação e regras de gestão. A complexidade inerente ao jogo de oposição é manipulada no jogo cooperativo, permitindo aos praticantes a captação calibrada das informaçõesdisponíveis, base do acoplamento perceção-ação, ou seja, do alinhamento entre o que se perceciona e a forma como se age. Do mesmo modo, a ativação do controlo cinestésico - orientação da atenção para a perceção da informação relevante - é gradativamente consumada em detrimento do controlo visual - necessidade do jogador olhar e se centrar na bola. Aliás como anuncia Tani e colaboradores (2006), através do refinamento das especificações da técnica, o qual requer menor atenção, o praticante pode ocupar-se com outros aspetos do desempenho, nomeadamente, do foro percetivo e cognitivo, desde que a informação disponível não seja demasiada para a capacidade de assimilação do praticante. O domínio técnico na presença de fluxo de jogo, a aquisição dos princípios táticos elementares e a aplicação das ações sem bola, reclamam a progressão para as tarefas de adaptação. Integram o jogo de oposição desenvolvendo a antecipação, a imprevisibilidade e a inteligência tática. Os praticantes disponibilizam de uma vivência do jogo em formas modificadas, bem como da apreciação e da compreensão dos problemas táticos e, ainda, da aplicação oportuna e eficaz das habilidades técnicas, onde se ambiciona a confluência da eficiência, eficácia e adaptação. Estudos aplicados no Basquetebol (Landin & Hebert, 1997) e no Voleibol (Mesquita, 2006b) evidenciam que os praticantes atingem níveis de evolução superiores quando praticam tarefas de interferência contextual moderada, nomeadamente pela prática de jogos modificados, o que reitera, mais uma vez, a 11 Eficiência – qualidade de realização da habilidade técnica de acordo com os padrões mecânicos pré-estabelecidos. Ver em: Rink, J. (1993). Teaching physical education for learning (2ª Edição). St. Louis: Mosby. 12 Eficácia – resultado obtido pela realização da habilidade técnica. Ver em: Rink, J, (1993), Teaching physical education for learning (2ª Edição). St. Louis: Mosby. 13 Adaptação - Uso oportuno e ajustado da habilidade técnica em situação de jogo. Ver em: Rink, J. (1993). Teaching physical education for learning (2ª Edição). St. Louis: Mosby. necessidade das tarefas serem modeladas em referência à especificidade dos conteúdos e ao nível de desempenho dos praticantes. A prática de tarefas sujeitas a elevada interferência contextual, como seja, o jogo 6x6 ou situações afins, exige modelação regulamentar e funcional progressiva e sistemática; mais se anuncia que, na sua ausência, a alteração do padrão motor geral pode ocorrer, sob pena de o praticante ser desviado para soluções motoras ausentes de significado e intencionalidade. O mesmo será afirmar que se a prática variada induzir uma modificação no programa motor geral, significa que a quantidade de variabilidade excedeu a capacidade do praticante (Boyce, 1991). 4. ALINHAMENTO ENTRE O DESEMPENHO EM JOGO DOS PRATICANTES (NÍVEIS DE JOGO) E OS CONTEÚDOS DE ENSINO (ETAPAS DE APRENDIZAGEM) NO MODELO DE ABORDAGEM PROGRESSIVA AO JOGO A matéria de ensino deve ser didacticamente tratada com base na identificação do nível de desempenho dos praticantes, sendo o jogo, no contexto dos JD, o melhor meio para caracterizar o nível de desempenho dos praticantes. No MAPJ, a identificação do nível de jogo em que se encontra o praticante constitui o ponto de partida para se determinar a Etapa de aprendizagem a abordar. Deste modo, às quatro Etapas de Aprendizagem consideradas correspondem quatro níveis de jogo, os quais possuem indicadores, que caracterizam os comportamentos dos jogadores, bem como o modo como estes se refletem na dinâmica do jogo (Mesquita, 1998b). Os níveis de jogo referenciam-se exclusivamente à prática do Voleibol na fase de iniciação e abarcam os comportamentos tático-técnicos mais rudimentares até à transição para a prática do jogo 6x6. A sequenciação dos níveis de jogo é determinada pela estruturação progressiva das ações de jogo, integrando a componente tática e técnica. Esta sistematização constitui um “retrato” genérico, tendo como grande objetivo auxiliar o professor/treinador no diagnóstico do nível de desempenho dos praticantes, o que significa que na prática nem sempre se verifica exatamente o enunciado. No MAPJ, o 2x2 constitui a forma modificada de jogo mais indicada para a avaliação diagnostica, ou inicial, do nível de jogo dos praticantes, antes da determinação da Etapa de Aprendizagem. Possibilita, por um lado, a identificação de níveis de desempenho elementares (quando os praticantes não conseguem sustentar minimamente a bola mesmo jogando no plano frontal) evidenciando que os mesmos se encontram no início da 1ª Etapa e, por outro, a identificação de níveis de desempenho superiores que vão desde a capacidade mínima de sustentar a bola (início da 2ª Etapa) até à capacidade de encadear as ações de jogo, desde o 1º toque até ao 3º toque (início da 3ª Etapa) ou, ainda, a capacidade de diferenciar as soluções mais ajustadas (início da 4ª etapa). Seguidamente, serão apresentados os comportamentos caracterizadores de cada Nível de Jogo e a correspondente Etapa de Aprendizagem. A título exemplificativo serão apresentados alguns exercícios ilustrativos do desenvolvimento temático para cada Etapa de Aprendizagem. Salienta-se a identificação de cada exercício por tipologia de tarefa, no sentido de se atender à especificidade do Voleibol. Do mesmo modo, são incluídas variantes em cada exercício acautelando-se, assim, a necessidade de considerar tarefas distintas para o mesmo nível de dificuldade, de forma a ser estabelecida a progressão horizontal, já que a vertical é conseguida pela dificuldade crescente incrementada na passagem de tarefas mais simples para mais complexas. 4.1. Caraterização do Nível I (Jogo Estático) e 1ª Etapa de Aprendizagem O nível I é denominado de jogo estático, devido ao imobilismo frequente dos praticantes no terreno de jogo, fator indiciador de dificuldades na movimentação e controlo da bola. Usualmente, a posição vertical (ou próxima desta) é a mais adotada, sendo o contato com a bola estabelecido pelo praticante mais para se defender dela do que para jogar, reagindo mais do que agindo. Neste sentido, os projetos de ação são amplamente individuais, pautados por uma ausência de relações funcionais no espaço de jogo. O principal objetivo é rebater a bola, não havendo compreensão tática nem domínio técnico que permitam a realização de ações. A dificuldade em atuar eficientemente sobre o objeto de jogo induz receio em assumir a responsabilidade pelo contacto, daqui resultando poucas intervenções sobre a sobre e uma elevada percentagem de erros aquando do contacto (Tabela 1). TABELA 1 – Nível 1: Jogo Estático Comportamentos dos intervenientes Implicações para a dinâmica do jogo Ausência de relações no espaço de jogo (jogador joga ‘sozinho’). Imobilidade em posição vertical – inexistência de pré- dinamismo para a ação. Projetos de ação individuais. Comportamentos motores descoordenados e bruscos, com fracas sinergias musculares e muitos movimentos parasitas. Problemas técnicos e falta de compreensão do jogo induzem comportamentos de ‘salvar’ a bola, sem preocupações táticas. Intervenções raras sobre a bola. Reenvios diretos,quase sempre sem êxito. Grande percentagem de erros de serviço e de receção – jogo de um toque: não existe um projeto coletivo de construção do ataque. Ausência de deslocamentos - ‘a bola joga o jogador e não o contrário’. Descontrolo da trajetória a imprimir à bola, aquando do contacto. Falta de intencionalidade tática na devolução da bola ao adversário. PRIMEIRA ETAPA DE APRENDIZAGEM: “Envia a bola por cima da rede” Atendendo aos problemas mais frequentes deste nível do jogo, pretende-se que na primeira etapa o jogador consiga adquirir os comportamentos tático-técnicos basilares que lhe permitem sustentar minimamente a bola e enviá-la para o campo adversário. Consequentemente, devolver a bola por cima da rede para o campo adversário constitui propósito fundamental da primeira etapa de aprendizagem. Neste sentido, existem duas estratégias complementares a serem implementadas simultaneamente nesta fase. O jogo 1x1 demonstra-se vantajoso numa fase inicial de contacto com a modalidade, proporcionando a existência de fluxo de jogo, dada a obrigatoriedade de jogar no plano frontal (alinhamento corpo-bola-alvo). Através da compreensão da lógica do jogo (1x1), preconiza-se que o praticante resolva os problemas táticos defensivos e ofensivos elementares, intercete a bola e conquiste ponto. Ao nível tático, as componentes críticas consubstanciam-se na aquisição de noções elementares de oposição, no reenvio da bola dentro dos limites do campo adversário e na escolha de alvos para atacar. Para almejar uma resolução eficaz dos problemas táticos inerentes a esta Etapa de Aprendizagem, é importante a aplicação das primeiras ações sem bola, abrir espaço e prosseguir. Abrir espaço diz respeito à ocupação do espaço oportuno para intervir, enquanto prosseguir corresponde ao seguimento da jogada, permitindo que o praticante se mantenha disponível para jogar, quer após a ação de serviço, quer de ataque. Para o praticante ser capaz de intercetar a bola, afigura-se necessária a abordagem a alguns conteúdos do foro técnico: o passe (toque de dedos), a posição média, o serviço por baixo e os deslocamentos. No que concerne ao passe (toque de dedos), para além de ser uma habilidade tecnicamente simples, promove maior sustentação de bola, permitindo a manutenção da rede no campo visual do jogador, mantendo este o olhar dirigido para cima e para a frente. Por sua vez, a posição média constitui-se elementar nesta etapa, porquanto permite a adoção de uma atitude pré- dinâmica facilitadora da leitura do jogo e da intervenção posterior sobre a bola. De igual forma, deverá ser introduzido o serviço por baixo, implementando-se a lógica acontecimental do jogo, isto é, o início do jogo através desta ação. Todavia, será necessário refletir se poderá ser introduzido no início da etapa, uma vez que pode influenciar o fluxo de jogo, por dificuldades causadas à sua receção. Desta forma, caso seja necessário, numa fase inicial, a ação de serviço poderá ser substituída pelo passe ou, simplesmente, pelo lançamento, de forma a ser consumada mais facilmente a ação de (re)iniciar o jogo. Considerando a intervenção sobre a bola um objetivo crucial desta primeira etapa, urge a abordagem aos deslocamentos. Todavia, deverão ser distinguidos dois tipos de deslocamentos, dada a sua especificidade e exigências próprias: o deslocamento antero-posterior e o deslocamento lateral. No jogo 1x1, é recorrente a utilização do deslocamento antero-posterior, sendo vantajoso realizar este tipo de deslocamento em corrida (para a frente e para trás), de forma a realizar uma intervenção mais fácil e rápida para o local de queda da bola. No caso de curtas distâncias, privilegia-se o recurso ao passo caçado, por facilitar a orientação corporal para o alvo e promover o equilíbrio durante o deslocamento, principalmente no deslocamento lateral. O regulamento formal da modalidade de Voleibol impõe determinadas dificuldades na desenvoltura do jogo, o que reclama a adaptação do regulamento ao nível de jogo dos praticantes (modificação por representação), de modo a que o sucesso se verifique. Como tal, esta adaptação poderá começar pela redução do espaço de jogo e o aumento da altura da rede, o que promove o incremento da densidade motora do jogo pela facilitação da receção/defesa. Poderá também ser utilizada uma bola mais leve e macia, de modo a facilitar o contacto, sendo esta menos agressiva para o praticante. Este poderá também realizar até 3 toques, de forma a corrigir um primeiro toque deficitário, e um ressalto da bola no solo antes do 1º toque, o que permite mais tempo para ler trajetórias e para se deslocar, embora esta última adaptação se revele arriscada na medida em que poderá prejudicar a leitura específica do jogo de Voleibol. Paralelamente, a estrutura do jogo 2x2 deve ser introduzida, dando corpo ao caráter coletivo da modalidade e aos ângulos não lineares entre envio e reenvio da bola. Por um lado, concretizando exercícios de apenas uma ação, nomeadamente recebendo para um alvo não linear, e recebendo bola do primeiro toque, reorientando apoios para passar para zona-alvo. A conjugação dos três momentos de jogo (receção-distribuição-ataque) deverá acontecer em situação de jogo 2x2, mas sendo permitido agarrar a bola no primeiro e no segundo contactos. Esta estratégia mista (1x1, ações isoladas em estrutura de 2x2 e 2x2 agarrando a bola nos dois primeiros contactos) potencia a aprendizagem do jogo, possibilitando um bom domínio da bola em paralelo com uma compreensão adequada da lógica sequencial e organizacional do jogo 2x2. Deverá, ainda, ser utilizado o princípio da modificação por exagero, de forma a enfatizar determinado conteúdo. Um bom exemplo deste tipo de modificação poderá ser a manipulação do espaço de jogo em profundidade e em largura, para focalizar a atenção do praticante na utilização apropriada dos deslocamentos. A tabela 2 apresenta os objetivos, conteúdos e adaptações regulamentares da 1ª Etapa de Aprendizagem. TABELA 2 – Objetivos, conteúdos e adaptações regulamentares da 1ª Etapa de Aprendizagem Objetivos Ações de jogo a dominar Adaptações regulamentares Co ns eg ui r de vo lv er a b ol a po r cim a da re de pa ra o ca m po do ad ve rs ár io . M ei o pr iv ile gi ad o de jo go : 1 x1 e 2 x2 co m p re en sã o da b ol a. Ler trajetórias simples, assumir uma postura pré-dinâmica (posição fundamental média) e realizar deslocamentos simples (passo caçado lateral, corrida para a frente e para trás) – para ser capaz de intercetar a bola. Progredir para a rede e reenviar a bola para o campo adversário (em passe de frente e, no início do jogo, também serviço por baixo) – para poder conquistar ponto. No 2x2 adaptado, saber redirecionar a bola utilizando ângulos não lineares. Poder agarrar a bola no primeiro toque. Triplo toque – permitir ao jogador, no 1x1, a realização de 3 toques na bola. Bola mais leve e macia – facilita o contacto e é menos agressiva para o aprendiz. Rede mais alta – obriga a trajetórias de bola mais altas, facilitando a defesa e aumentando, assim, a densidade motora do jogo. Por sua vez, os exercícios para a primeira etapa enfocam o trabalho simplificado depasse de dedos em apoio, introduzindo pequenos deslocamentos. Através desta abordagem é possibilitado o controlo mínimo da bola no primeiro toque, seguido do segundo toque na tentativa de progressão para a rede, de forma a permitir a finalização ao terceiro toque com envio da bola para o campo adversário. Paralelamente, é introduzido o serviço por baixo, veículo de (re)início formal de cada jogada e ação relativamente acessível e com elevada taxa de sucesso em principiantes. Constroem- se, adicionalmente, situações de encadeamento de ações, nomeadamente ligando o serviço por baixo e a receção em passe, permitindo a iniciação à ocorrência de jogo. O jogo 1x1 emerge como a forma de jogo privilegiada, possibilitando elevado número de contactos com a bola e reduzindo a complexidade para potenciar a aprendizagem, dada permitir o alinhamento corpo-bola-alvo (tabela 3). TABELA 3 - Tipologia de exercícios para a 1ª Etapa de Aprendizagem Ti po lo gi a Descrição Esquema Critérios de Êxito Aq ui siç ão Passe de Dedos No espaço, com bola, realiza: lançamento/passe/ ressalto/agarra a bola em posição de passe; Variante 1: sem agarrar a bola, continua com a sequência passe/ressalto/passe; Variante 2: retirando o ressalto, procura realizar uma sequência de autopasses, vendo o máximo de tentativas conseguidas. - Coordena a flexão/extensão dos MI e MS; - Coloca o corpo atrás da bola; - Contacta a bola acima e à frente da testa. Serviço por baixo Lançamento da bola com a mão dominante, procurando acertar no arco colocado na vertical e acima da rede; Variante 1: procurar acertar no arco colocado no chão do campo adversário; Variante 2: realização do serviço para o mesmo alvo da variante anterior. - MS de lançamento/ batimento esticado; - Orientação dos apoios e superfície de batimento para o alvo; - Mão rígida no batimento. Es tr ut ur aç ão Serviço-Enquadramento/passe Grupos de 2. De uma lado da rede, um jogador serve por baixo e o outro desloca-se para se enquadrar com a bola e realizar um autopasse para a sua frente, agarrando a bola de seguida. - Dirige o serviço para o colega; - Desloca-se rapidamente para se colocar atrás da bola e de frente para a rede Serviço-construção de 3 toques Grupos de 2. De uma lado da rede, um jogador serve por baixo e ocupa um dos arcos. O outro jogador realiza 2 autopasses, devolvendo a bola para o arco vazio ao 3º passe. Variante: atrasar a ocupação do arco, ou seja, o servidor só pode ocupar um dos arcos após a realização do 2º toque do colega. - Dirige o serviço para o colega; - Enquadra-se rapidamente com a bola para efetuar os autopasses altos e controlados para a sua frente; - Procura observar o campo adversário antes de enviar o 3º passe. Construção de ações de jogo isoladas em contexto de jogo 2x2 a) Lançar bola para recebedor, que procura reenviar a bola para alvo (zona de distribuição). 1.1.1.1.1 b) Lançar bola para distribuidora, que reorienta apoios para colocar a bola na zona de ataque. -Enquadramento com a bola e reorientação dos apoios para colocar a bola na zona-alvo Ad ap ta çã o Jogo 1x1 Utilização do lançamento por baixo para iniciar o jogo. Antes de efetuar o passe, pode deixar ressaltar a bola no chão. Realizar 3 passes (podendo ser utilizada a preensão da bola) para devolver a bola ao adversário. - No passe, bola acima e à frente da testa; - Deslocamento e enquadramento rápido com a bola; - Colocar o lançamento ou o serviço de modo a dificultar a ação do adversário. Jogo 1x1 Utilização do serviço por baixo para iniciar o jogo e do passe de dedos como meio de contacto da bola para realização obrigatória de 3 toques. Variante: Permitir a escolha de realização de 2 ou 3 toques. Jogo 2x2 adaptado 1.1.1.1.2 Jogo 2x2 em estrutura 0:2, podendo os jogadores agarrar a bola ao primeiro e segundo toques. - Não mais de 3 segundos de preensão por contacto - Não-recebedor entra cedo para a rede 4.2. Caraterização do Nível II (Jogo Anárquico) e 2ª Etapa de Aprendizagem O Nível II de jogo é denominado de jogo anárquico, na medida em que existe uma maior intencionalidade e dinamismo dos jogadores embora o jogo se paute por uma escassa organização. As zonas de responsabilidade são parcamente definidas e a comunicação ocorre raramente, culminando em intervenções tardias e pouco eficazes sobre a bola. Contudo, devido ao maior dinamismo e iniciativa, há mais contactos com a bola e as jogadas com dois toques tornam-se mais comuns. Devido às dificuldades na construção de um jogo de qualidade, o serviço mantém-se como a principal forma de pontuar (tabela 4). TABELA 4 – Nível 2: Jogo Anárquico Comportamentos dos intervenientes Implicações para a dinâmica do jogo Mobilidade ocasional para intercetar a bola, mas com deslocamento tardio dos apoios. Indefinição das zonas de responsabilidade. Maior percentagem de acertos no serviço. Maior número de bolas intercetadas na receção, mas com reduzida eficácia – não orientação do corpo para o distribuidor. Dificuldade de dissociação das ações de MS e MI. Dinamismo superior ao nível precedente. Aglutinação no ponto de queda da bola. O 2º toque emerge mais regularmente, embora persistam os reenvios ao 1º toque. Pouca consecução e intencionalidade na construção de jogadas coletivas. O serviço mantém-se como principal arma de ataque. O ataque tem fraca eficácia e tende a ser realizado afastado da rede. SEGUNDA ETAPA DE APRENDIZAGEM: “Coloca-se para receber e reenvia de seguida” Os problemas táticos ofensivos e defensivos são dilemas que se encontram privilegiados nesta segunda etapa de aprendizagem através da prática e do desenvolvimento do jogo 2x2, onde o propósito principal se encontra em posicionar-se para receber e deslocar-se para enviar a bola para o campo adversário. Assim, relativamente aos problemas táticos ofensivos, um dos objetivos fundamentais consiste no encadeamento do primeiro para o terceiro toque, que exige a introdução da noção recebedor/não recebedor e da ação sem bola de transição (encadeamento das ações). Assim, o momento do primeiro toque exige de imediato uma diferenciação de papéis entre os praticantes. O praticante que fica encarregue de realizar o primeiro toque, deve realizá-lo no sentido da rede e preparar-se para realizar o terceiro toque. Por sua vez, se o praticante fica responsável pela realização do segundo toque deve, aquando da realização do primeiro toque pelo seu colega, deslocar-se para junto da rede, de forma a realizar o segundo toque. Para que esta diferenciação de ações seja possível, é imprescindível uma correta cooperação com o colega de equipa, onde a comunicação verbal se revela um elemento fulcral para o eficiente desenvolvimento deste conceito. A abordagem à transição denota-se, tal como foi mencionado anteriormente, de igual importância, uma vez que se concretiza na ação sem bola que corresponde à ligação sequencial de duas ações (após contacto o praticante estabiliza nova posição para agir). No que concerne aos problemas de ordem defensiva, o objetivo principal relaciona-se com o desenvolvimento da noção de defesa doespaço ocupado, conseguido através da introdução às zonas de responsabilidade. Salienta-se que as zonas laterais do campo são frequentemente descuradas pelos principiantes na ação defensiva, levando a que estes permaneçam sempre no mesmo espaço, independentemente das características da trajetória da bola. Desta forma, nesta fase é igualmente necessário ressalvar a atenção ao nível do ajustamento, isto é, à adequação da posição corporal face às características da trajetória da bola. Considerando a existência de um maior domínio do passe, abordado na etapa anterior, os praticantes atacam com trajetórias mais baixas/tensas, colocando maiores dificuldades ao adversário. Para além disso, verifica-se maior proficiência no serviço por baixo, dificultando a ação de receção. Assim, torna-se fundamental a abordagem à manchete, que vai permitir responder às exigências provocadas pela ação do adversário neste nível de jogo. Na adaptação ao regulamento, ao nível da modificação por representação, perspetiva-se a aplicação do Duplo Toque, dada a necessidade da bola ser enviada para o companheiro que se encontra, usualmente, num espaço fora do plano frontal, permitindo a correção de um 1º toque deficitário e garantindo a manutenção do fluxo de jogo. Ao nível da modificação por exagero é pertinente o aumento inicial do número de toques por jogada (num máximo de 5 toques), com decréscimo progressivo até aos 3 toques, permitindo a resolução dos problemas tático-técnicos emergentes e a estruturação funcional do espaço organizacional (divisão do campo em termos longitudinais e transversais). A Tabela 5 apresenta os objetivos, ações de jogo a dominar e adaptações regulamentares respeitantes a esta Etapa de Aprendizagem. TABELA 5 – Objetivos, ações de jogo a dominar e adaptações regulamentares da 2ª Etapa de Aprendizagem Objetivos Ações de jogo a dominar Adaptações regulamentares Po sic io na r-s e pa ra re ce be r e de slo ca r- se p ar a en vi ar a b ol a pa ra o ca m po ad ve rs ár io . J og o 2x 2 Cooperação racional com o colega de equipa. Encadeamento de ações do 1º para o 3º toque. Defesa do espaço ocupado. Utilização da manchete frontal e do deslocamento em passo caçado lateral. Recurso ao conceito de Transição pela ligação sequencial de duas ações. Duplo toque – permite compensar um eventual mau domínio do 1º toque, evitando que a rotura se dê por mérito do serviço e potenciando a construção do ataque. Mais do que 3 toques – ideia semelhante à anterior, visando aumentar a continuidade das ações e a possibilidade de construir jogadas de ataque coletivas. Nesta segunda etapa, assume particular importância os exercícios destinados à aprendizagem e aperfeiçoamento da manchete, ampliando as possibilidades de sucesso no primeiro toque, nomeadamente em resposta ao serviço ou à finalização. Procede-se, como na etapa precedente, ao encadeamento do serviço por baixo com a receção em manchete, mas evolui-se para a construção de jogadas com diferenciação de funções – recebedor e não-recebedor, exercitando-se a relação entre o primeiro toque (preferencialmente em manchete) e o segundo toque (preferencialmente em passe de dedos). O jogo 2x2 surge como forma de aplicação destes conteúdos, através da introdução da noção de cooperação e diferenciação de zonas de responsabilidade. A versão 2x2, permite assim uma elevada oportunidade de contactos com a bola, estimula a organização coletiva do jogo e o incremento da comunicação entre os jogadores (tabela 6). TABELA 6 - Tipologia de exercícios para a 2ª Etapa de Aprendizagem Ti po lo gi a Descrição Esquema Critérios de Êxito Aq ui siç ão Manchete Com o MS em extensão e com a palma da mão virada para a frente, dar o maior número de toques consecutivos. Variante 1: só apenas com um dos MS; Variante 2: alternando o batimento entre os dois MS - MS sempre em extensão; - Palma da mão virada para a frente, com os dedos direcionados para o chão; Manchete Com um dos joelhos no solo, devolver a manchete à bola lançada (ou jogada) pelo colega. Variante: No momento do contacto com a bola, o MI que tinha o joelho no chão sobe e avança para a frente do MI contrário (progressão). - Pega realizada corretamente; - MS em extensão; - MS afastados do tronco; - MS não podem elevar-se acima da linha dos ombros. Manchete No espaço, com bola, realiza: lançamento/manchete/ ressalto/agarra a bola em posição de manchete; Variante 1: sem agarrar a bola, continua com a sequência machete/ressalto/manchete; Variante 2: retirando o ressalto, procura realizar uma sequência de automanchetes, vendo o máximo de tentativas conseguidas. - MS em extensão; - MS afastados do tronco; - MS não podem elevar-se acima da linha dos ombros; - Correta coordenação entre a flexão/extensão dos MS e MI. Es tr ut ur aç ão Serviço-Receção Serviço para receção do colega que se encontra do outro lado da rede. A receção deverá ser dirigida para um alvo fixo (atleta com um arco). Troca de funções após cada sequência de ações. - Serviço dirigido para o colega da receção; - Na receção, deslocamento para um bom enquadramento com a bola; - Orientação do corpo para o alvo. Serviço-Receção-Passe Serviço dirigido para um dos colegas que está na receção e que se encontra do outro lado da rede. Dos dois recetores, quem vai receber deverá assumir previamente o 1º toque. O não-recebedor deverá avançar imediatamente para perto da rede, afim de efetuar o 2º toque. O 2º toque será feito para um atleta-alvo que se encontra num plano superior com um arco. Troca de funções após cada 3 sequências de ações. - Assumir rapidamente as funções de recebedor/não- recebedor; - Dirigir o 1º toque para perto da rede e para o local onde o colega se encontra; - No 2º toque, colocar o pé mais perto da rede à frente, realizando um ângulo perpendicular entre os ombros e a rede. Serviço-Receção-Passe Idêntico ao exercício anterior. Contudo, o 2º toque deverá ser realizado, não para um alvo, mas para o jogador recebedor/atacante, que efetuará um terceiro toque. Variante: definir alvos com pontuação para a concretização do 3º toque. - Assumir rapidamente as funções de recebedor/não- recebedor; - 1º toque dirigido para perto da rede; - 2º toque realizado para perto da rede e para a frente do recebedor/atacante; - Recebedor/atacante, após receber a bola deverá avançar progressivamente para perto da rede Ad ap ta çã o Jogo 2x2 Utilização do serviço por baixo para iniciar o jogo e do passe de dedos e da manchete como meio de contacto da bola para realização obrigatória de 3 toques. Variante: Permitir a escolha de realização de 2 ou 3 toques. - Diferenciação do recebedor/não-recebedor; - Realização do 1º toque para perto da rede; - Realização do 2º toque alto, para perto da rede e para a frente do colega; - O recebedor-atacante, após o 1º toque deve avançar progressivamente para a rede. 4.3. Caraterização do Nível III (Organização Rudimentar do Ataque) e 3ª Etapa de Aprendizagem O nível III de aprendizagem apresentajá um esboço de organização ofensiva. O pré-dinamismo e a disponibilidade para atuar sobre a bola aumentam, bem como a comunicação entre os colegas de equipa, resultando em intervenções mais frequentes e mais eficientes sobre a bola. Como tal, a construção de jogadas com três toques torna-se regular, embora ainda sem grande qualidade. A finalização ainda não é eficaz porque o distribuidor tende a orientar-se para o recebedor e não para a zona de ataque, dificultando, desta forma, a progressão para a rede. Contudo, o jogador que não toca na bola já consegue descentrar-se do objeto de jogo e preparar a ação subsequente (p.e., o não- recebedor prepara a ação de distribuição) (tabela 7). TABELA 7 – Nível 3: Organização rudimentar do ataque Comportamentos dos intervenientes Implicações para a dinâmica do jogo Comunicam verbalmente. Atitude pré-dinâmica mais frequente. Maior eficácia no serviço e na receção, com ação mais coordenada entre MS e MI e orientação da plataforma para o alvo. Discriminação do jogador que recebe (diferenciação de funções: recebedor vs não-recebedor). Distribuidor tende a orientar-se para o recebedor e não para a zona de ataque. Progressão para a rede é reduzida ou inexistente. Estabelecem-se relações de cooperação no espaço de jogo. Descentração em torno da bola. Realização mais frequente dos 3 toques, com maior consciência do projeto coletivo de jogo. Serviço deixa de ser a principal arma de ataque. Ataque aparece mais frequentemente ao 3º toque, mas ainda com pouca agressividade, fruto da ausência de progressão para a rede. TERCEIRA ETAPA DE APRENDIZAGEM – “Recebe e vai atacar” Com a emersão de um maior número de opções ofensivas e defensivas, a capacidade de adaptação é desenvolvida na terceira etapa de aprendizagem através do jogo 3x3, no qual os praticantes aguçam o sentido tático. O objetivo principal desta terceira etapa de aprendizagem é a organização do ataque, onde as componentes críticas ao nível tático baseiam-se no encadeamento de tarefas sucessivas (receber e atacar a bola), na identificação do espaço de ataque e na distinção do espaço de intervenção, de acordo com o fluxo do jogo. Assim, a forma de jogo característica desta etapa (3x3) pressupõe mais uma opção de ataque que a forma anterior (1 passador e dois atacantes), elevando a exigência dos problemas táticos ofensivos para um patamar superior, onde a variabilidade das opções de ataque, determinada pelo contexto de aplicação, é a nota dominante. Ademais, surge a necessidade da abordagem ao retorno, ação sem bola que significa o regresso ao ponto de partida após uma intervenção (por exemplo, voltar à posição de partida após ajustamento no primeiro toque, para uma finalização mais eficaz) e defensivas (por exemplo, recuperar a posição- base após ações ofensivas). O retorno induz maior dinamismo e intencionalidade ao jogo, permitindo maior continuidade das ações. O passe em suspensão e o remate em suspensão são as habilidades técnicas mais apropriadas para a resolução dos problemas táticos específicos inerentes a esta etapa, sendo o primeiro propedêutico do segundo no desenvolvimento dos pressupostos para atacar em suspensão. No entanto, se não for possível chegar ao remate em suspensão por dificuldades de realização técnica, não se afigura problemático, pois o mais importante é atacar (não confundir esta ação de jogo com a habilidade técnica do remate) em suspensão o que permite o desenvolvimento do raciocínio tático. Adicionalmente, o serviço por cima, tipo ténis, é introduzido pela sua similitude estrutural com o remate, desde que a sua aplicação não perturbe o fluxo de jogo. Com o desenvolvimento e incremento da eficácia ofensiva, o jogo anuncia a necessidade de uma maior eficácia defensiva, surgindo a necessidade de desenvolver a defesa baixa, tal como supracitado. Desta feita, será necessária a aprendizagem da posição baixa. Relativamente à adaptação regulamentar, a terceira etapa de aprendizagem pressupõe a utilização do regulamento formal. Todavia, tal não significa que, numa fase inicial, não se realizem modificações por exagero, com vista à melhoria do desempenho dos praticantes como, por exemplo, jogo temático (apenas ataca quem recebe/não recebe, etc.). Por outro lado, poderá ser necessária a obrigatoriedade de realizar no mínimo 2/3 toques por equipa, com vista ao aumento da frequência na realização dos três toques, evitando reenvios diretos, de forma a desenvolver projetos coletivos (tabela 8). TABELA 8 – Objetivos, ações a dominar e adaptações regulamentares da 3ª Etapa de Aprendizagem Objetivos Ações de jogo a dominar Adaptações regulamentares O rg an iza r o at aq ue . Pa ss ar e a ta ca r. Jo go 3x 3 Ganhar espaço de ataque após o 1º toque. Assumir uma zona de responsabilidade na defesa e servir-se da posição baixa. Retorno – recuperar a posição-base após ações ofensivas. Utilizar o passe em suspensão e o remate como meios de finalização. Aplicar o serviço por cima tipo ténis. Se possível, utilizar o regulamento formal na generalidade. Eventual obrigatoriedade de dar um mínimo de 2 toques, evitando reenvios diretos e favorecendo, assim, projetos coletivos. Solucionadas determinadas questões relacionadas com a construção dos três toques, a terceira etapa preconiza a introdução de exercícios simples de ataque, visando a capacitação dos jogadores nas ações ofensivas que, futuramente, irá estimular o desenvolvimento das ações de bloco e de defesa baixa. Pela complexidade da sua ação, o remate em particular requer exercícios didáticos faseados, resolvendo, de cada vez, pequenos problemas. Derivado da introdução do remate, surgem exercícios de iniciação à defesa baixa, a qual assume contornos distintos da receção ao serviço, quer técnica quer taticamente. Associado à melhoria da capacidade organizadora do jogo, introduz-se o serviço por cima, visando aumentar a rotura no primeiro contacto adversário. As tarefas de encadeamento de ações mantêm situações de exercitação com duas ações, mas deverão incluir a passagem para três ações. O jogo 3x3 aparece como instrumento poderoso de preparação, pelas possibilidades de aumentar a complexidade ofensiva e consequentemente defensiva, sendo o 4x4 a versão adotada no final da etapa. O nível de complexidade aumenta, as oportunidades de tomar decisões envolvendo múltiplas escolhas são superiores, expandem-se as necessidades comunicacionais e preparam-se os praticantes para o jogo formal – 6x6 (a abordar na 4ª etapa de aprendizagem) (tabela 9). TABELA 9 - Tipologia de exercícios para a 3ª Etapa de Aprendizagem Ti po lo gi a Descrição Esquema Critérios de Êxito Aq ui siç ão Remate em suspensão Batimento analítico 1. Cada um com uma bola, segurando-a na mão esquerda, realiza o movimento de ataque com o braço direito (trazendo-o de baixo para cima, realizando a rotação externa do cotovelo, batendo por cima da bola com o braço esticado e levando a bola até à anca). 2. Repete, mas terminando com o batimento contra a parede. Corrida Preparatória isolada 1. Realizar apenas a sequência dos dois últimos apoios (direito-esquerdo), recorrendo a marcas no solo, e terminando com salto; 2. Realizar a chamada de ataque completa, com bolasde ténis (na parede ou na rede) Remate completo 1. Ataque com bolas lançadas pelo treinador (primeira bola agarra, segunda bola remata). Começar por realizar apenas os dois primeiros apoios e ir progredindo para a realização completa dos 3 apoios. 2. Treinador, situado num plano elevado, segura a bola onde esta vai ser batida. Realizar a chamada de ataque e rematar a respetiva bola. Batimento - Elevação do MS de batimento com rotação externa do cotovelo; - MS de batimento esticado no batimento Corrida Preparatória - Atacar o solo pelo calcanhar no 2º apoio; - Realizar rápida dos 2 últimos apoios; - Coordenar a ação dos MS com a chamada de ataque; Remate completo - Coordenar a corrida preparatória com o batimento; - Coordenar o domínio técnico do remate com o correto tempo de salto Serviço por cima tipo ténis 1. Bola na mão não dominante, com o MS esticado, realizar o lançamento da bola. 2. Repete, mas terminando com um pequeno batimento da bola para a parede, e fixando-a na parede com o MS dominante esticado; 3. Estando mais afastado da parede, realizar um batimento forte contra a parede. 4. Realizar o serviço por cima, no campo, procurando acertar em diferentes alvos dispostos ao longo do campo. - Lançamento com MS não dominante esticado; - Batimento na bola com o MS dominante esticado; - Punho fixo e palma da mão rija durante o batimento. Defesa baixa – posição e técnica base Atletas no campo, ocupando posições defensivas. Do outro lado, o treinador coloca bolas com trajetórias diversificadas para o atleta defender. Pelas trajetórias mais tensas, estes deverão adotar uma posição mais baixa e aprender a dar altura na bola – prioridade de colocar a bola jogável e não de ter precisão. Es tr ut ur aç ão Ataque na rede Realização de um primeiro toque do jogador A para o jogador B. Este último faz um passe para o ataque do jogador A. Roda após cada ação. - Coordenar o domínio técnico do remate com o tempo correto de salto. Serviço-Receção-Ataque Serviço do jogador A, para receção do jogador B. Após receber, este vai atacar um passe direcionado pelo jogador C para a sua zona de ataque. Roda após cada ação. - Direcionar os apoios no serviço para o Jogador B; - Rotação dos apoios e da plataforma na receção para a zona do jogador C; - Após receber, abrir para atacar; Jogo 3x3 de cooperação Duas equipas de 3 elementos realizam jogo 3x3 de cooperação. Os elementos de cada equipa rodam após cada passagem de rede. O objetivo será realizar 20 passagens consecutivas. Variante 1: ataque com passe em suspensão (realizando a chamada de ataque do remate). Variante 2: ataque com remate em suspensão - Antecipar a ação do adversário para evitar que a bola caia ao chão; - Utilizar um remate controlado/enrolado para facilitação da defesa adversária. Ad ap ta çã o Jogo 3x3 de competição Duas equipas de 3 elementos realizam jogo 3x3 onde o objetivo será pontuar o maior número de vezes possível e evitar que o adversário faça o mesmo. Apenas serve uma das equipas. Para ambas rodarem, terão de efetuar 2 pontos seguidos. Vence a primeira equipa a chegar à posição inicial. Depois, serve a outra equipa. - Correta organização dos 3 toques, de acordo com as posições/funções de cada jogador; - Realizar de forma sistemática os dois pontos consecutivos. Jogo 3x3 de competição Idêntico ao exercício anterior, mas, agora, recorrendo às regras formais do jogo (sem recurso ao jogo temático) - Correta organização dos 3 toques, de acordo com as posições/funções de cada jogador; 4.4. Caraterização do Nível IV (estruturação defensiva de acordo com o ataque do adversário) e 4ª Etapa de Aprendizagem O nível IV tem como tema central, a estruturação defensiva de acordo com a ação de ataque adversário, uma vez que foram abordadas quase todas as ações de jogo e os praticantes estão na fase de refinar as componentes técnico-táticas adquiridas. Fruto duma melhor compreensão das responsabilidades em campo e dos propósitos e dinâmica do jogo, as intervenções sobre a bola são bastante frequentes e mais efetivas, pautadas pela oportunidade e intencionalidade. O jogo coletivo torna-se mais coordenado e as entreajudas emergem mais regularmente. O ataque torna-se mais consequente, devido a uma mais regular e eficaz progressão para a rede. O bloco surge constantemente como forma de oposição ao ataque adversário finalizado junto à rede, diferenciando-se inequivocamente a defesa alta da defesa baixa. Contudo, a defesa baixa e a cobertura ao próprio ataque são, ainda, deficitárias, constituindo tema de particular desenvolvimento nesta Etapa (tabela 10). TABELA 10 – Nível 4: Estruturação ofensiva e defensiva em função do ataque adversário Comportamentos dos intervenientes Implicações para a dinâmica do jogo Maior compreensão das responsabilidades de cada jogador em campo. Maior eficácia no serviço e na receção. Deslocamento oportuno para intercetar a bola. Discriminação oportuna do jogador recebedor. Definição d jogador que realiza a distribuição: compreende a necessidade de fazer progredir a bola para a rede. Há progressão para a rede do 2º para o 3º toque. Os futuros atacantes ganham espaço de ataque. Maior coordenação das funções entre os jogadores Jogadas de três toques tornam-se frequentes, aumentando a eficácia ofensiva e defensiva. O ataque torna-se a principal forma de conquistar pontos. Persistem dificuldades na construção do contra- ataque, devido a problemas posicionais na defesa. A cobertura ao próprio ataque é deficitária. QUARTA ETAPA DE APRENDIZAGEM: “Diferencia a defesa próxima da defesa afastada da rede” Na IV etapa de aprendizagem o incremento de combinações entre ações com e sem bola, associadas à especificidade dos momentos do jogo, traduz-se num aprofundamento e refinamento dos conceitos de organização coletiva ofensiva e defensiva. Assim, esta etapa foca-se na organização da defesa e do ataque após ataque adversário, isto é, preocupa-se fundamentalmente com a organização do contra-ataque. As componentes táticas referenciam-se à adaptação das ações à trajetória da bola, na distinção entre defesa alta e defesa baixa e na ocupação de espaço para intervir no jogo, após ataque. Concomitantemente, será necessário o aumento da variabilidade do ataque, de forma a fornecer aos praticantes maior reportório ofensivo e fomentar a adaptação defensiva anteriormente referida. Após a consolidação de todas as ações sem bola adquiridas nas etapas anteriores, predomina nesta etapa o conceito tático de cobertura ao ataque, pela aplicação do suporte (apoio) das ações dos colegas de equipa. Uma vez que se verifica um contínuo aumento da eficácia das ações ofensivas (tendo em conta os conteúdos introduzidos em etapas anteriores), surge a noção de defesa baixa e, concomitantemente, a distinção entre o espaço de intervenção de acordo com o fluxo de jogo. Mais ainda, é crucial a abordagem à posição alta e à técnica de bloco individual. O bloco é a habilidade mais apropriada para travar um maior poderio ofensivo, permitindo manter o equilíbrio ataque/defesa. Numa