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Efeitos do transporte no bem-estar e na qualidade da carne
	07/06/2006
Efeitos do transporte no bem-estar e na qualidade da carne
Por José Rodolfo Panim Ciocca1, Stavros Platon Tseimazides1 e Mateus J.R. Paranhos da Costa1 
Anualmente são abatidos mais de 45 milhões de bovinos de corte no Brasil (Anualpec, 2005). A grande maioria dos animais destinados ao abate é transportada em caminhões por rodovias. A rede de rodovias no Brasil tem mais de 1,6 milhões de quilômetros, sendo 1,3 milhão Km de rodovias municipais, 230 mil Km de rodovias estaduais e 73 mil Km de rodovias federais. Apenas 10% das rodovias federais são pavimentadas. De acordo com a Confederação Nacional do Transporte (CNT 2006) apenas 11% das rodovias pavimentadas estão em ótimas condições e 17% em boas condições.
O transporte de bovinos, um dos segmentos do manejo racional pré-abate, é considerado relevante quando se trata em bem-estar animal. Vários estudos mostraram que o transporte de bovinos pode provocar estresse, perda de peso e contusões, podendo inclusive levar animais à morte quando realizado em condições muito desfavoráveis (Tseimazides, 2006). Havendo assim perdas quantitativas e qualitativas da carne, com prejuízos diretos ou indiretos para produtores, frigoríficos e consumidores finais, deteriorando o produto final e conseqüentemente depreciando seu valor comercial.
Perdas quantitativas, as que ocorrem principalmente devido a contusões, causam prejuízos diretos ao produtor, resultando em queda no rendimento da carcaça após a retirada das áreas contundidas antes da pesagem, e ao frigorífico, quando as contusões são percebidas apenas durante o processo de desossa. Ocorrendo ainda, em pequena quantidade, casos em que o hematoma só é detectado na mesa do consumidor.
Perdas qualitativas, decorrentes de estresse durante o manejo pré-abate, resultam em alterações metabólicas que comprometem a qualidade da carne. Quando o animal sofre o estresse ou faz esforço físico, ocorre a queima da reserva de glicogênio presente nos músculos, que pode levar a carnes com valores de pH indesejáveis. 
Para certos mercados, a União Européia, por exemplo, os limites de pH devem ficar entre 5,5 e 5,8. Além disso, carnes com pH igual ou maior que 6,0 (tipo DFD) são consideradas de pior qualidade, sendo destinadas a mercados menos exigentes, que pagam menos.
Uma das principais variáveis que afeta o bem-estar dos animais durante o manejo pré-abate é o comportamento das pessoas que estão dirigindo o veículo e manejando esses animais durante o embarque e o desembarque. 
Foi realizada uma pesquisa em um frigorífico no Estado de São Paulo e verificou-se que, após o treinamento dos funcionários envolvidos no transporte (embarque, viagem e desembarque) ocorreu uma evolução em ganhos quantitativos e qualitativos da carne.
Por exemplo, Tseimazides (2006) observou redução no valor médio de pH de carcaças de bovinos da raça Nelore com o treinamento dos motoristas dos caminhões em boas práticas de manejo durante o embarque, condução do veículo e desembarque, sendo que não houve efeito significativo para animais cruzados (Figura 1). O fato de não haver diferença significativa para os animais cruzados pode estar ligado a menor reatividade dos mesmos em relação ao Nelore.
As freqüências médias de hematomas em cada grupo genético antes e após o treinamento são apresentadas na Figura 2. Houve redução significativa na quantidade de hematomas após o treinamento para ambos os grupos genéticos. 
 
 
 
Figura 1. Valores médios de pH dos diferentes grupos genéticos e respectivos erros padrão antes e após o treinamento dos motoristas. Letras diferentes no mesmo grupo genético diferem estatisticamente entre si pelo teste de Tukey (P<0,001). Adaptado de Tseimazides (2006).
 
 
Figura 2. Freqüências médias de hematomas (dados transformados) para os diferentes grupos genéticos e respectivos erros padrão antes e após o treinamento. Letras diferentes no mesmo grupo genético diferem estatisticamente entre si pelo teste de Tukey (P<0,001). Adaptado de Tseimazides (2006).
 
Estes resultados refletem de forma prática os benefícios proporcionados pelo treinamento, que orientou os motoristas de caminhões em como proceder aos manejar os animais de forma racional, modificando a rotina usual de manejo, geralmente agressiva. 
O manejo em si se torna mais fácil, melhorando a interação com os animais, com reflexos positivos no bem-estar dos animais e dos humanos que com eles trabalham, bem como na carne com melhor qualidade.
 
Entretanto, deve-se ter em conta que para assegurar que os animais cheguem ao momento de abate com menor nível de estresse possível deve-se ter em conta vários aspectos, dentre eles: distância percorrida, tipo e condições dos veículos, conservação das estradas e formação de lotes de abate, além das características dos próprios animais (raça, idade e sexo) e dos manejos executados durante o transporte (embarque, condução do veículo e desembarque) e nos currais do frigorífico.
 
Muitas vezes elevamos nossos gastos com a aquisição de novos equipamentos, mas esquecemos de implementar boas práticas de manejo, que podem levar a resultados tão bons quanto a aplicação de novas tecnologias (Grandin, 2003). 
 
O manejo realizado de forma correta certamente melhora nossos resultados econômicos, proporcionando melhor bem-estar aos animais e minimizando perdas quantitativas e qualitativas da carne. 
Trabalhar em instalações adequadas e com equipamentos que facilitem e contribuam com o bem-estar dos trabalhadores e dos animais melhora a eficiência dos serviços, resultando também em maior produtividade. São, portanto, requisitos fundamentais para impulsionar o desempenho de uma organização.
 
Literatura consultada
 
Grandin, T. Introduction management and economic factors of handling and transport. In: Grandin, T. Livestock Handling and Transport, 2nd. Ed. Wallingford: C.A.B.I. 2000. p. 1-14
Knowles, T. G. A review of the road transport of cattle. Veterinary Record, London, v. 144, n.8, p.197-201, 1999
Luchiari Filho, A. Pecuária de Carne Bovina. São Paulo: R Vieira, 2000. 134p.
Paranhos da Costa, M. J. R.; Zuin, L. F. S.; Piovezan, U. Avaliação preliminar do manejo pré-abate de bovinos do programa de qualidade de carne bovina do Fundepec. Jaboticabal: FCAV, UNESP, 1998. 21p. (Relatório Técnico).
Tseimazides, S. P. Efeitos do transporte rodoviário sobre a incidência de hematomas e variações de pH em carcaças bovinas. 2006. 60p. Dissertação de Mestrado - Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias, Universidade Estadual Paulista, Jaboticabal, 2006.
1José Rodolfo Panim Ciocca, Stavros Platon Tseimazides e Mateus J.R. Paranhos da Costa, Grupo ETCO - Grupo de Estudos e Pesquisas em Etologia e Ecologia Animal, Departamento de Zootecnia, FCAV-UNESP, Jaboticabal-SP, Brasil