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1 Parte 01 DA INTRODUÇÃO À PARTE ESPECIAL DO CÓDIGO PENAL 1) DA PARTE GERAL E DA PARTE ESPECIAL: O Código Penal Brasileiro é dividido em 02 partes: Parte Geral (art. 1° a 120) e Parte Especial (art. 121 a 361). A Parte Geral compreende o estudo da aplicação da lei penal, teoria geral do crime, culpabilidade, concurso de pessoas, penas, ação penal e causas de extinção da punibilidade. Contém apenas normas penais permissivas e explicativas (ou finais ou complementares). Normas penais permissivas: estabelecem a licitude, a inculpabilidade ou a impunidade de determinados comportamentos. Ex: legítima defesa (art. 25), inimputabilidade por doença mental (art. 26), extinção da punibilidade pela prescrição (art. 109) etc. Normas penais explicativas: esclarecem o conteúdo de outras normas ou então delimitam o âmbito de sua aplicação. Ex: territorialidade (art. 5°) contagem do prazo (art. 10). Por outro lado, as normas penais incriminadoras, que definem infrações penais e cominam as respectivas penas, estão previstas com exclusividade na Parte Especial e na Legislação Penal Extravagante. Na Parte Especial, todavia, excepcionalmente, são encontradas normas penais permissivas (art. 121, §5°, 128, II, 129, §8º, 142 etc) e normas penais explicativas (art. 150, §4°- conceito de “casa”, 327 - conceito de “funcionário público” etc). 2) DA PRECEDÊNCIA HISTÓRICA DA PARTE ESPECIAL Historicamente, a Parte Especial precedeu a Geral por uma exigência de ordem prática. As legislações positivadas tiveram origem na medida em que surgiram os fatos de natureza nociva à ordem pública e que exigiam, por isso, repressão por parte do Estado. 2 Não estavam, pois, sistematizadas porque o interesse do Estado era prever as condutas consideradas como crimes, bem como a respectiva sanção para o caso. O estudo de determinadas figuras penais, p. ex, o homicídio, levou à formação de institutos aplicáveis a outros delitos (legítima defesa, dolo, tentativa etc). 3) DA TEORIA GERAL DA PARTE ESPECIAL: A Parte Especial, para muitos, constitui o verdadeiro Direito Penal porque sem ela as normas da Parte Geral permaneceriam sem vida. Atualmente, discute-se a ideia de se formular uma teoria geral da Parte Especial a fim de se estudar os elementos comuns aos diversos tipos de delito e ligar as normas da Parte Geral com as leis incriminadoras, o que não ocorre no vigente ordenamento. Ao crime de homicídio, p. ex, aplicam-se quase todas as normas contidas na Parte Geral. Entretanto, o estudo de cada qual é realizado de modo estanque. Uma Teoria Geral da Parte Especial seria muito salutar, pois propiciaria uma maior harmonia entre a Parte Geral e a Especial, pois há uma evidente falta de entrosamento entre as duas Partes. 4) DA CLASSIFICAÇÃO DA PARTE ESPECIAL: A Parte Especial do CP Brasileiro está sistematizada de acordo com a natureza e a importância do bem jurídico protegido. Inicia com as condutas que afetam os bens jurídicos individuais e termina com os crimes que atentam contra os interesses do Estado. Segundo Hungria, “a ordem de classificação adotada pelo Código não só corresponde à ordem de apresentação histórica dos crimes (os atentados contra a pessoa foram, presumidamente, as formas primitivas de criminalidade), mas também atende ao critério metodológico de partir do mais simples ao mais complexo”. Eis a classificação dos Títulos dos crimes no CP: I- Crimes contra a pessoa; II- Crimes contra o patrimônio; III- Crimes contra a propriedade imaterial; IV – Crimes contra a organização do trabalho; V- Crimes contra o sentimento religioso e respeito aos mortos; 3 VI- Crimes contra a dignidade sexual; VII- Crimes contra a família; VIII- Crimes contra a incolumidade pública; IX- Crimes contra a paz pública; X- Crimes contra a fé pública; XI- Crimes contra a Administração Pública. 5) DOS CRIMES CONTRA A PESSOA O Título I da Parte Especial elenca os crimes contra a pessoa, tanto no aspecto físico, como no moral. Está dividido em 06 capítulos, que são: I- Dos Crimes contra a vida (art. 121 a128); II- Das lesões corporais (art. 129); III- Da periclitação da vida e da saúde (art. 130 a 136); IV- Da rixa (art. 137); V- Dos crimes contra a honra (art. 138 a 145); VI – Dos crimes contra a liberdade individual (art. 146 a 154). 6) DOS CRIMES CONTRA A VIDA O CP, no Capítulo I do Título I da Parte Especial, protege a vida humana extra e intrauterina, com a previsão de 04 delitos: 1) Homicídio (art. 121); 2) Induzimento, instigação ou auxílio ao suicídio (art. 122); 3) Infanticídio (art. 123); 4) Aborto (arts. 124 a 128). Todos os crimes contra a vida, salvo o homicídio culposo (art. 121, §3º), são julgados pelo Tribunal do Júri (art. 5°, inciso XXXVIII, alínea “d”, da Constituição Federal. Como consequência disso, a ação penal será sempre pública incondicionada. 4 Parte 02 DOS CRIMES CONTRA A VIDA EM ESPÉCIE HOMICÍDIO (art.121 do CP) 1) Conceito: É a eliminação da vida humana extrauterina praticada por outra pessoa. Segundo Nélson Hungria: “O homicídio é o tipo central dos crimes contra a vida. É o ponto culminante na orografia dos crimes. É o crime por excelência. É o padrão da delinquência violenta ou sanguinária, que representa como que uma reversão atávica às eras primevas, em que a luta pela vida, presumivelmente, se operava com o uso normal dos meios brutais e animalescos. É a mais chocante violação do senso moral médio da humanidade civilizada”. 2) Modalidades: O CP admite as seguintes modalidades do crime de homicídio: a) homicídio doloso simples (caput); b) homicídio doloso privilegiado (§1°); c) homicídio doloso qualificado (§2°); d) homicídio doloso majorado (§4°, segunda parte, §6º e §7º). e) homicídio culposo (§3°); f) homicídio culposo majorado (§4°, primeira parte). Obs: Em razão do disposto no art. 1°, inciso I, da Lei n° 8.072/90 (Lei dos Crimes Hediondos) são hediondos apenas o homicídio praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por um só agente, e o homicídio qualificado. Obs 2: Parcela da doutrina costuma denominar de “Homicídio Condicionado” ao homicídio simples praticado em atividade típica de grupo de extermínio porque apenas se presente tal condição é que esta modalidade de homicídio passará a ser considerada hedionda. 5 Obs 3: “Homicídio preterdoloso” é sinônimo de Lesões Corporais Seguidas de Morte (artigo 129, §3º, do CP). Não é crime doloso contra a vida e, por isso, não é julgado pelo Tribunal do Júri. 3) Sujeito ativo: Qualquer pessoa porque se trata de crime comum. A Lei não exige requisito especial algum. Admite, contudo, coatoria e participação. Autoria colateral: duas pessoas querem praticar um homicídio e agem simultaneamente, sem que uma saiba da intenção da outra, e o resultado morte decorre da ação de somente uma delas, que é identificada no caso concreto. Esta responderá por homicídio consumado, a outra por tentativa. Autoria incerta: ocorre quando, na autoria colateral, não se consegue apurar qual dos agentes envolvidos provocou o resultado letal. Prevalece na doutrina que, nesse caso, ambos respondem por tentativa. Obs: No curioso exemplo dos irmãos xifópagos (siameses), no qual a separação é impossível, se um deles quis praticar o delito e o outro não, a doutrina não aponta outra solução senão a absolvição de ambos. 4) Sujeito passivo: Qualquer pessoa com vida extrauterina. Obs: Magalhães Noronha aponta o Estado também como vítima imediata docrime, pois ele tem interesse na conservação da vida humana, sendo condição para a sua própria existência. Se a conduta recair sobre pessoa já sem vida, o crime será impossível por absoluta impropriedade do objeto (art. 17). É o caso do agente que desejando matar a vítima desfecha-lhe vários tiros, vindo a verificar, pouco depois, que a vítima já havia falecido muito antes. No caso dos irmãos xifópagos, se o agente desejar a morte de apenas um deles e o outro vier a óbito por decorrência da ação praticada, responderá por duplo homicídio em concurso formal (art. 70). Em virtude de características especiais da vítima, a tipificação do homicídio pode ser transferida para Leis Especiais. Assim, quem atenta contra a vida do Presidente da República, do Senado Federal, da Câmara dos Deputados ou do STF pratica o delito previsto no art. 29 da Lei n° 7.170/83 (Lei de Segurança Nacional). 6 Da mesma forma, aquele que, com intenção de destruir, no todo ou em parte, grupo nacional, étnico, racial ou religioso, matar membros do grupo, praticará genocídio (art. 1°, alínea “a”, da Lei n° 2.889/56). Não se deve confundir o crime de homicídio com o crime de genocídio (Lei nº 2.889/56). O crime de genocídio tutela a diversidade humana e, em razão disso, tem caráter coletivo ou transindividual, não atraindo a competência do Tribunal do Júri. Ocorre que uma das formas de praticar genocídio é por meio da morte de membros do grupo. Nessa hipótese sim, a competência para julgar o crime de genocídio será do Tribunal do Júri, em razão da conexão. Obs: O STF, no julgamento do RE nº 351.487/PR, decidiu que, havendo concurso formal entre genocídio e homicídio doloso, compete o julgamento ao Tribunal do Júri da Justiça Federal, sem que se fale de bis in idem. 5) Objeto jurídico: Objeto jurídico é o interesse protegido pela norma. É o bem juridicamente protegido. No caso do homicídio, é a vida humana extrauterina, já que a ofensa à vida intrauterina caracteriza aborto (art. 124 a 126). A prova da vida se faz pela respiração (tradicional) e também por outros meios: batimentos cardíacos, movimento circulatório etc. Obs: Quando se deixa de ter vida intrauterina e se passa a ter vida extrauterina? Com o início do parto. Considera-se início do parto o começo do nascimento, ou seja, o início das contrações expulsivas. Antes disso, haverá o crime de aborto. Nas hipóteses em que o nascimento não se produz espontaneamente pelas contrações uterinas, como ocorre com a cesariana, o começo do nascimento é determinado pelo início da operação, ou seja, pela incisão abdominal. 6) Objeto material: Objeto material é a pessoa ou a coisa sobre a qual recai a conduta delitiva. Na hipótese do homicídio é a pessoa que sofreu o ataque contra a sua vida. 7) Ação nuclear: O crime de homicídio tem por ação nuclear o verbo “matar”. 7 Trata-se de delito de ação livre, pois o tipo descreve nenhuma forma especial para praticá-lo. Desse modo, o agente pode fazer uso de todos os meios para praticar a ação típica. Exemplos: a) meios materiais: fazer uso de instrumentos vulnerantes em geral, veneno e transmissão de moléstias letais (aids); b) meio morais ou psíquicos: dizer a um pai cardíaco que o filho acabara de morrer. c) por palavras: dizer a um cego para avançar em direção a um abismo. d) por omissão: não alimentar o próprio filho recém- nascido. 8) Elemento subjetivo: É o dolo, denominado animus necandi ou animus occidenti, e a culpa, que será objeto de estudo posteriormente. Espécies de Dolo: a) Dolo direto ou determinado: o agente quer praticar a conduta e produzir o resultado morte. A doutrina costuma dividir o dolo direto em dolo direto de 1º grau e dolo direto de 2° grau: -Dolo direto de 1° grau: o agente prevê determinado resultado e seleciona meios para executá-lo. Não existem efeitos colaterais para se atingir o resultado almejado, já que a intenção é atingir bem jurídico certo e determinado no caso concreto. Ex: Desejando matar a vítima, o agente dispara-lhe um tiro certeiro na cabeça. Dolo direto de 2° grau: o agente pretende produzir determinado resultado (morte da vítima). Para tanto, prevê que poderá provocar consequências inerentes (efeitos colaterais) ao resultado pretendido, não diretamente desejado, mas inevitáveis em razão do meio escolhido para a execução. Ex: Terrorista deseja matar o Presidente da República e coloca uma bomba no carro-oficial que está sendo dirigido por seu motorista. A morte de ambos será imputada ao terrorista a título de dolo direto: de 1° grau no tocante à morte do Presidente e de 2° grau no tocante ao motorista. Diferenças entre o dolo direto de 2° grau e o dolo eventual com relação ao(s) resultado(s) paralelo(s): 8 Dolo direto de 2º grau Dolo eventual O resultado paralelo é certo e determinado (as consequências são inerentes aos meios escolhidos). O resultado paralelo é incerto, eventual, possível e desnecessário (não é inerente ao meio escolhido) Ex: O agente quer matar um piloto de avião. Para tanto, coloca uma bomba na aeronave. Sabe que a explosão causará a morte dos demais tripulantes, como consequência certa e imprescindível. Ex: O agente deseja matar determinada pessoa, que se encontra no meio de uma multidão, utilizando uma arma de fogo. Sabe que, além da vítima visada, os disparos poderão atingir outras pessoas que passam naquele local. A morte ou lesão dos demais transeuntes, contudo, não é imprescindível para que se realize a finalidade almejada e ser-lhe-á atribuída a título de dolo eventual. b) Dolo indireto ou indeterminado: divide-se em dolo eventual e dolo alternativo. No dolo eventual, o agente não quer diretamente o resultado, mas assume o risco de produzi-lo. Ex: Agente efetua disparos de arma de fogo em direção à rua movimentada, prevendo que possa atingir pessoas que passam no local. Não se confunde com o dolo direto de 2° grau. Já no dolo alternativo, o agente não se importa em produzir este ou aquele resultado. Ex: agente efetua disparos em direção à vítima, não importando se vai matá-la ou somente feri-la. c) Dolo geral ou aberratio causae: o agente, após praticar uma conduta, acreditando ter produzido o resultado, realiza outra que, efetivamente, produz o resultado naturalístico. Ex: Agente esfaqueia a vítima. Em seguida, acreditando tê-la matado, para desfazer-se das evidências, joga o corpo no mar. Descobre- se ao final, pelas provas periciais realizadas, que a vítima morreu por afogamento e não em consequência dos golpes de faca. O agente responderá por homicídio doloso na modalidade dolo geral. Obs: Discute-se se o homicídio praticado na direção de veículo automotor, quando o agente está embriagado ou participando de “racha” deve ser capitulado como homicídio culposo ou doloso (na modalidade eventual). Com o advento da Lei nº 12.971/14, que alterou o artigo 302, do Código de Trânsito Brasileiro (Lei nº 9.503/97), parcela da doutrina entende que o legislador colocou uma pá de cal no assunto ao afastar o dolo em tais situações. Vejamos: Art. 302. Praticar homicídio culposo na direção de veículo automotor: 9 Penas - detenção, de dois a quatro anos, e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor. (...) § 2o Se o agente conduz veículo automotor com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência ou participa, em via, de corrida, disputa ou competição automobilística ou ainda de exibição ou demonstração de períciaem manobra de veículo automotor, não autorizada pela autoridade competente: (Incluído pela Lei nº 12.971, de 2014) (Vigência) Penas - reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor. (Incluído pela Lei nº 12.971, de 2014) (Vigência) A questão, no entanto, está longe de ser pacificada. Há decisões, inclusive do STF, em ambos os sentidos. Obs: A Lei nº 13.546/17 acrescentou o §3º ao artigo 302, do CTB, e alterou a pena do homicídio culposo na direção de veículo automotor. Doravante, a pena será de 05 (cinco) a 08 (oito) anos. 9) Consumação: A consumação ocorre com a produção do resultado morte. O momento da morte, segundo o critério legal, é a cessação da atividade encefálica (art. 3º, da Lei n° 9.434/97, que trata da remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo humano para fim de transplante e tratamento). A prova da materialidade é feita pelo exame de corpo de delito (art. 158, do CPP), também conhecido por exame necroscópico ou cadavérico. Se não for possível o exame direto (o corpo da vítima desapareceu), a prova da materialidade é obtida por meio do exame de corpo de delito indireto (art. 167, do CPP), valendo-se da prova testemunhal. 10) Tentativa: O homicídio, por ser crime material, admite a tentativa (conatus). Haverá, quando praticada a ação, o resultado apenas não sobrevier por circunstâncias alheias à vontade do agente. Espécies: I- Quanto ao iter criminis percorrido: 10 a) Tentativa imperfeita (ou propriamente dita): o processo executivo é interrompido por circunstâncias alheias à vontade do agente. Ex: Após efetuar um disparo no braço da vítima, o agente é desarmado por populares. b) Tentativa perfeita ou acabada (“crime falho”): a fase de execução é integralmente cumprida, mas a vítima não morre por circunstâncias alheias à vontade do agente. Ex: o agente descarrega o revólver na vítima, mas ela é levada prontamente ao hospital e sobrevive. II- Quanto ao resultado produzido na vítima: a) Tentativa branca ou incruenta: a vítima não sofre dano algum. Ex: O agente por falta de pontaria erra todos os tiros. b) Tentativa cruenta (“vermelha”): a vítima sofre ferimentos. 11) Classificação doutrinária do crime de homicídio: a) simples: atinge um único bem jurídico; b) comum: pode ser praticado por qualquer pessoa; c) material: exige a produção do resultado para a consumação; d) de dano: exige a efetiva lesão ao bem jurídico; e) de ação livre: admite qualquer forma de execução; f) instantâneo: a consumação se dá em momento determinado, sem continuidade no tempo. Há quem diga que se trata de crime instantâneo de efeitos permanentes dada a irreversibilidade do resultado produzido. g) plurissubsistente: a conduta pode ser fracionada em vários atos que, somados, chegam à consumação. DO HOMICÍDIO PRIVILEGIADO (art. 121, §1°, CP) Caso de diminuição de pena § 1º Se o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral, ou sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima, ou juiz pode reduzir a pena de um sexto a um terço”. Trata-se de uma causa de redução de pena obrigatória variável entre 1/6 a 1/3. Aplica-se na 3ª fase da dosimetria da pena. 11 Não deixa de ser considerado homicídio do tipo básico (caput), mas diante da presença de circunstâncias de caráter subjetivo, a conduta homicida torna-se menos reprovável. Prevalece na doutrina e na jurisprudência que a redução da pena é obrigatória, diante de tais circunstâncias, o juiz é obrigado a diminuir a pena. Hipóteses: 1) Motivo de relevante valor social: é o que corresponde ao interesse coletivo. Ex: Matar o traidor da pátria, matar perigoso bandido que aterroriza a vizinhança (desde que não seja justiceiro). 2) Motivo de relevante valor moral: é o que corresponde a um interesse individual, ou seja, do próprio agente. É o que merece o apoio da moralidade média por estar ligado a sentimentos de compaixão, misericórdia ou piedade. Ex: Eutanásia, matar o estuprador da filha. Obs: A eutanásia está prevista na Exposição de Motivos do Código Penal. Diferenças entre eutanásia, ortotanásia e distanásia: Quadro sinótico: EUTANÁSIA ORTOTANÁSIA DISTANÁSIA Antecipação da morte natural, diante de uma doença incurável, sem que o paciente esteja em estado terminal. Pode ser ativa ou passiva: a) Ativa: quando presentes atos positivos com o fim de matar alguém, eliminando ou aliviando o sofrimento. b) Passiva: ocorre com a omissão de tratamento ou de qualquer meio capaz de prolongar a vida humana, irreversivelmente comprometida, acelerando o processo morte Termo médico para definir a morte natural sem interferência da ciência, suspendendo os meios medicamentosos ou artificiais de vida, permitindo ao paciente em coma irreversível, em estado terminal ou vegetativo, morte digna. Persistência terapêutica em paciente irrecuperável associada à morte com sofrimento. Na verdade refere-se ao prolongamento do curso natural da morte e não o prolongamento da vida por todos os meios existentes. Aqui a morte é inevitável. É crime (artigo 121, §1º, do Código Penal) 02 correntes: Não é crime. 12 a) É crime, não é autorizada por lei. b) Não é crime, desde que obedeça aos procedimentos legais 3) Domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima (“Homicídio emocional”): a) Domínio de violenta emoção: é aquela que é intensa, violenta, causando um verdadeiro choque emocional no indivíduo, de modo que ele não agiria desta forma se ela não existisse. b) Injusta provocação da vítima: é aquela sem motivo razoável, é o comportamento capaz de provocar a violenta emoção e a consequente prática do crime. Não há necessidade de ser uma agressão, mas qualquer conduta desafiadora, ainda que atípica. Ex: Ofensas verbais dirigidas à mãe, cônjuge que surpreende o outro em flagrante adultério. c) Reação imediata: ou seja, sem intervalo. Deve haver imediatidade entre a provocação e a ação do sujeito. A demora na reação exclui a minorante. Por outro lado, a jurisprudência diz que enquanto perdurar o domínio da violenta emoção qualquer reação será considerada imediata. Dependerá, portanto, do caso concreto. Obs: O privilégio não se comunica aos eventuais coatores e partícipes por ser circunstância de caráter pessoal (artigo 30, do Código Penal). No exemplo do pai que mata o estuprador da filha com a ajuda do vizinho, somente o genitor poderá ser beneficiado, salvo se o vizinho também estiver sob o domínio de violenta emoção. Obs 2: Difere o privilégio da circunstância atenuante da “influência da violenta emoção (art. 65, inciso III, alínea “c”, in fine). Nesta última, o agente não está dominado pela emoção, mas apenas sob a influência, o que é um minus em comparação com o privilégio. Além disso, não exige que a reação seja “imediata” à provocação. Assim, afastada a minorante, nada impede que os jurados reconheçam a atenuante do “domínio de violenta emoção”, que possui requisitos mais brandos (caráter residual). Como diz a doutrina: o domínio da violenta emoção “cega” o agente, a “influência da violenta emoção” deixa apenas a sua visão “turva”. “A atenuante incide residualmente naqueles casos em que, comprovado o motivo de relevante valor moral, não se pode afirmar que a conduta do agente seja fruto do instante dos acontecimentos” (STF, HC 89.814/MS, Rel. Carlos Britto). 13 DO HOMICÍDIO QUALIFICADO (art.121, §2°) Homicídio qualificado§ 2° Se o homicídio é cometido: I - mediante paga ou promessa de recompensa, ou por outro motivo torpe; II - por motivo fútil; III - com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum; IV - à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido; V - para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou vantagem de outro crime: Pena - reclusão, de doze a trinta anos. Feminicídio (Incluído pela Lei nº 13.104, de 2015) VI - contra a mulher por razões da condição de sexo feminino: (Incluído pela Lei nº 13.104, de 2015) VII – contra autoridade ou agente descrito nos arts. 142 e 144 da Constituição Federal, integrantes do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública, no exercício da função ou em decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até terceiro grau, em razão dessa condição: (Incluído pela Lei nº 13.142, de 2015) Pena - reclusão, de doze a trinta anos. § 2o-A Considera-se que há razões de condição de sexo feminino quando o crime envolve: (Incluído pela Lei nº 13.104, de 2015) I - violência doméstica e familiar; (Incluído pela Lei nº 13.104, de 2015) II - menosprezo ou discriminação à condição de mulher. (Incluído pela Lei nº 13.104, de 2015) Qualificadoras são causas que, agregadas ao tipo fundamental, tornam o fato mais grave e elevam as penas mínimas e máximas cominadas. O homicídio qualificado é considerado hediondo (Lei n° 8.072/90). 14 As qualificadoras previstas nos incisos I, II, V, VI e VII são de natureza subjetiva, por isso, no concurso de agentes, não se comunicam aos coautores e partícipes, por força do artigo 30, do CP. Por outro lado, as qualificadoras previstas nos incisos III e IV, por terem natureza objetiva, ou seja, são ligadas ao fato e não à motivação do agente, comunicam-se aos coautores e partícipes, desde que tenham conhecimento. Ex: O fato de o autor ter praticado o homicídio valendo-se de meio cruel, qualifica também o delito para o partícipe. Obs: Não condiz com a melhor técnica jurídica referir-se ao delito como sendo duplamente ou triplamente qualificado. É mais conveniente chamá-lo de homicídio com pluralidade de qualificadoras. Uma qualificadora será utilizada na subsunção ao tipo do §2° e a(s) outra(s) como circunstância agravante (posição majoritária). Hipóteses legais: Inciso I: Mediante paga ou promessa de pagamento ou outro motivo torpe: Trata-se de rol exemplificativo que admite interpretação analógica. “Paga e promessa de pagamento” são apenas exemplos de motivação que revela torpeza por parte do agente. - Paga e promessa de pagamento”. A “paga” é anterior, ao passo que “a promessa de pagamento” é posterior ao fato. É conhecido por “homicídio mercenário”, no qual o agente ceifa a vida de outrem em troca de uma prestação pecuniária. Trata-se, pois, de crime de concurso necessário no qual é imprescindível a presença das figuras do mandante e do executor (“sicário”). É qualificadora de ordem subjetiva que não se comunica ao coautor ou partícipe (posição majoritária). Assim, somente abrangerá o executor e não o mandante (art. 30). Ex: Pai que contrata pistoleiro para matar estuprador da filha. O genitor responderá por homicídio privilegiado e o pistoleiro por homicídio qualificado. Obs: Discute-se na doutrina se a contraprestação pode ser de qualquer natureza ou deve ser obrigatoriamente pecuniária. Havendo posicionamentos em ambos os sentidos. Entretanto, a questão não se reveste de maior importância, uma vez que qualquer outra promessa (casamento, relação sexual, emprego etc) pode configurar motivo torpe. Motivo torpe: é a motivação reprovável, vil, repugnante, ignóbil, profundamente imoral, que demonstra depravação ética e espiritual por parte do agente. 15 Exemplos retirados da jurisprudência: - matar em razão de preconceito de raça, cor ou etnia ou opção sexual; - matar a vítima em rituais de “magia negra” como parte da “oferenda”; - matar os pais para ficar com a herança (caso “Suzane Richthofen”); - matar a vítima para ocupar o seu cargo; - matar a vítima para ficar com o seu cônjuge; - matar traficante rival pelo domínio das “bocas-de-fumo”; - matar o cônjuge para ficar com o seguro. Obs: O ciúme e a vingança, por si sós, não são considerados motivos torpes. A torpeza, nesses casos, dependerá do caso concreto, ou seja, da causa que originou o ciúme ou a vingança. Exemplos: - Traficante mata outro traficante porque, no passado, este lhe tomou a “boca- de-fumo”: nesse caso, á vingança é manifestamente torpe. - Filho ceifa a vida do ex-padrasto por ele ter matado, anos antes, a sua mãe: a vingança aqui, em princípio, não pode ser considerada torpe. Inciso II: por motivo fútil: Motivo fútil: trata-se também de qualificadora de ordem subjetiva. É o motivo de somenos importância, insignificante, mesquinho, totalmente desproporcional com relação ao crime praticado. Em síntese, é a real desproporção entre o delito e a sua causa moral (“pequeneza de motivos”). Obs: Guilherme de Souza Nucci, citando as lições de Euclides Custódio da Silveira, entende que a “futilidade do motivo deve prender-se imediatamente à conduta homicida em si mesma, quem mata no auge de uma altercação oriunda de motivo fútil, já não o faz somente por este motivo mediato que se originou aquela”. Ensina o autor: “(...) costuma-se defender que uma mera briga ocorrida no trânsito, de onde pode sair um homicídio, constitui futilidade, qualificando o crime. Nem sempre. Se um motorista sofreu uma ‘fechada’, provocada por outro, sai em perseguição e tão logo o alcance, dispara seu revólver, matando-o, naturalmente, estamos diante um homicídio qualificado pela futilidade, pois esta é direta e imediata. Entretanto, se, após alcançar o outro motorista, ambos param na via pública e uma acirrada discussão tem início, com troca de ofensas e até agressões físicas. A morte do perseguido nessas circunstâncias, não faz nascer a qualificadora, pois o motivo fútil foi indireto ou mediato e não fruto direto do disparo do revólver. Em suma: há futilidade direta ou imediata, 16 que serve para qualificar o homicídio, bem como futilidade indireta ou mediata que não faz nascer o aumento de pena”. Exemplos retirados da jurisprudência: - matar porque recebeu uma “fechada” no trânsito (vide comentário acima); - matar dono do bar porque este não lhe vendeu fiado; - matar por causa de comentário jocoso sobre o time de futebol; -matar o filho porque chorava muito; -matar o fiscal de trânsito porque lhe aplicou uma multa; Obs: A ausência de motivos e o motivo injusto não configuram essa qualificadora por falta de previsão legal (analogia in mallam partem). Obs 2: O STJ, recentemente, decidiu que não incide a referida qualificadora na a hipótese de competição automobilística não-autorizada (“racha”). Vejamos: “HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO. DOLO EVENTUAL. MOTIVO FÚTIL. COMPATIBILIDADE. RACHA. EXCLUSÃO DA QUALIFICADORA. POSSIBILIDADE. 1. Motivo fútil corresponde a uma reação desproporcional do agente a uma ação ou omissão da vítima. No caso de "racha", tendo em conta que a vítima (acidente automobilístico) era um terceiro, estranho à disputa, não é possível considerar a presença da qualificadora de motivo fútil, tendo em vista que não houve uma reação do agente a uma ação ou omissão da vítima. 2. A qualificadora de motivo fútil é incompatível com o dolo, tendo em vista a ausência do elemento volitivo. 3. Ordem nãoconhecida, mas concedida de ofício, de modo a excluir a qualificadora de motivo fútil”. (HC 307.617/SP, Rel. Ministro NEFI CORDEIRO, Rel. p/ Acórdão Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 19/04/2016, DJe 16/05/2016) Aqui, conforme foi visto, o STJ reconheceu a incompatibilidade entre dolo eventual e motivo fútil. Inciso III: com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum; Trata-se de qualificadora objetiva, pois diz respeito ao modo de execução do homicídio, demonstrando certa perversidade por parte do agente. Há também um rol exemplificativo seguido de uma fórmula genérica (“outro meio insidioso ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum”). Aplica-se, outrossim, uma interpretação analógica. 17 -Veneno (venefício): qualquer substância de origem biológica, química, animal, mineral ou vegetal, capaz de colocar em perigo a vida ou a integridade física de alguém. Ex: Misturar raticida na comida da vítima. Obs: A doutrina entende que pode ser considerado “veneno” a ministração de açúcar para pessoa com diabetes. Obs 2: O veneno deve ser ministrado de forma insidiosa ou dissimulada, em outras palavras, a vítima não deve saber que está ingerindo substância letal. Se houver coação, haverá a incidência da qualificadora do meio cruel. -Fogo ou explosivo: cuida-se de meio cruel para a prática do homicídio ou , em algumas hipóteses pode caracterizar perigo comum (ex: incêndio/explosão em habitação coletiva). Ex: Homicídio do índio pataxó em Brasília. -Asfixia: é o impedimento da função respiratória por qualquer meio, seja mecânico (enforcamento, estrangulamento, esganadura, sufocação etc) ou tóxico (inalação de gases ou confinamento). -Tortura: emprego de suplício ou tormento que provoca na vítima um sofrimento atroz antes de morrer. É um meio cruel por excelência. Obs: Se o agente atuar com dolo apenas com relação à tortura e o resultado morte advier de culpa (delito preterdoso), responderá pelo crime de tortura qualificado (art. 1°, §3°, da Lei n° 9.455/97). Obs 2: A Lei n° 12.847/13 instituiu o Sistema Nacional de Prevenção e Combate à Tortura. -Meio insidioso: é o meio ardiloso, pérfido, dissimulado em sua eficiência maléfica, de modo que a vítima não percebe que será atingida. Ex: Sabotagem em freio de veículo, armadilhas etc. -Meio cruel: é o que causa sofrimento desnecessário na vítima. Revela um sadismo e uma brutalidade fora do comum por parte do agente em contraste com o mais elementar sentimento de piedade. Ex: choques elétricos, espancamento, corte dos pulsos, dilaceração do corpo com motosserra. Obs: Parcela da jurisprudência entende que a reiteração de golpes, por si só, não caracteriza o meio cruel. “A reiteração de facadas não constitui, por si só, circunstância que qualifica o delito de homicídio, se não demonstrado que o fato gerou sofrimento excessivo e desnecessário à vítima, cabendo o decote da respectiva qualificadora. (Rec em Sentido Estrito 1.0071.10.003460-3/001, Relator(a): Des.(a) Nelson Missias de Morais , 2ª CÂMARA CRIMINAL, julgamento em 15/09/2011, publicação da súmula em 30/09/2011) 18 “MEIO CRUEL - REITERAÇÃO DE GOLPES - CONDIÇÃO IRRELEVANTE DIANTE DA COMPLETA AUSÊNCIA DE PROVAS. Se a denúncia sustenta a qualificadora pela só reiteração de golpes contra a vítima, não sustentando outra condição narrativa a conduzir ao meio cruel, a única conclusão possível é que a só repetição de golpes não é circunstância capaz de autorizar a imposição da qualificadora do meio cruel, que só ocorre quando haja prova do meio bárbaro, martirizante, brutal, que aumenta, inutilmente, o sofrimento da vítima, revelando que a crueldade parte de um ânimo calmo, que permita a escolha dos meios capazes de infligir o maior padecimento desejado”. (Rec em Sentido Estrito 1.0024.04.439435-1/001, Relator(a): Des.(a) Judimar Biber , 1ª CÂMARA CRIMINAL, julgamento em 23/02/2010, publicação da súmula em 16/04/2010)”. -Meio de que possa resultar perigo comum: é o que expõe a perigo, não somente a vítima, mas um n° indeterminado de pessoas. Ex: Execução da vítima com vários tiros em meio a uma multidão, incêndio, desabamento etc). Inciso IV: à traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido: Trata-se também de qualificadora de natureza objetiva (modo de execução do crime) que admite interpretação analógica. -Traição: é a quebra de confiança depositada pela vítima no agente, que dela se aproveita para matá-la. Ex: Matar a esposa durante relação sexual, matar amigo pelas costas etc. Obs: Não configura a referida qualificadora quando a vítima percebe que vai ser atacada. Ex: Consegue ver a arma escondida. Obs 2: O ataque inesperado (ex: pelas costas, durante o sono), sem se valer da relação anterior com a vítima, pode configurar surpresa. -Emboscada: pressupõe o ocultamento do agente, que aguarda a passagem ou chegada da vítima para atacá-la com surpresa (tocaia). -Dissimulação: é a ocultação da intenção hostil para acometer a vítima de surpresa (Hungria). Nesse caso, o agente dá falsas mostras de amizade para apanhar a vítima desprevenida (ex: caso do “maníaco do parque”) ou utiliza de aparato ou disfarce (ex: veste farda ou uniforme de policial para entrar na casa e executar a vítima). -Qualquer outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido: Trata-se da fórmula genérica indicativa de meio análogo à traição, emboscada ou dissimulação. O recurso empregado pelo agente deve igualmente ser insidioso de modo a dificultar ou inviabilizar a defesa da vítima. Ex: a surpresa (vítima golpeada pelas costas, dormindo ou em estado de embriaguez, linchamentos, etc). 19 Obs: Discussões ou desentendimentos anteriores impossibilitam o reconhecimento da qualificadora em estudo, segundo a jurisprudência majoritária. Vejamos: “A qualificadora consistente no uso de recurso que dificultou ou impossibilitou a defesa da vítima, somente se caracteriza se houve ataque inesperado, insidioso, repentino. Por essa razão a jurisprudência vem afastando a qualificadora em tela quando o homicídio é precedido de desentendimento anterior, como no caso em discussão, em que houve luta corporal entre a vítima e agentes”. (TJMG - Rec em Sentido Estrito 1.0567.13.001961-3/001, Relator(a): Des.(a) Beatriz Pinheiro Caires , 2ª CÂMARA CRIMINAL, julgamento em 03/07/2014, publicação da súmula em 14/07/2014) “Se a prova dos autos é no sentido de que a prática do homicídio foi precedida de discussão entre as partes, afasta-se a qualificadora pela utilização de recurso que impossibilitou a defesa da vítima, uma vez que, nesse caso, não se pode afirmar que a vítima tenha sido atacada de inopino, sendo que, diante das circunstâncias do fato, o resultado era perfeitamente previsível. - Recurso provido em parte”. (TJMG - Rec em Sentido Estrito 1.0035.12.015638-1/001, Relator(a): Des.(a) Doorgal Andrada , 4ª CÂMARA CRIMINAL, julgamento em 12/02/2014, publicação da súmula em 18/02/2014) Obs 2: A idade da vítima, por si só, não qualifica o crime, pois constitui característica da vítima e não recurso utilizado pelo agente. Obs 3: A premeditação também, por si só, não qualifica o homicídio. Inciso V: para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou a vantagem de outro crime: São todas qualificadoras de natureza subjetiva, pois versam sobre os motivos determinantes do crime. Trata-se das hipóteses de conexão entre o homicídio e outros delitos. O agente responderá pelo homicídio em concurso material com o crime conexo. A doutrina divide a conexão do seguinte modo: 1) Conexão teleológica: o homicídioé cometido para assegurar a execução de outro crime. É anterior ao outro delito que se pretendia cometer. Ex: Matar o marido para estuprar a esposa. Obs: O crime será qualificado ainda que o crime futuro não ocorra. Se ocorrer, haverá concurso entre o homicídio e o crime conexo. 2) Conexão consequencial: o homicídio é cometido para assegurar a ocultação (ex: mata testemunha), a impunidade (ex: mata a vítima do estupro) 20 ou a vantagem de outro crime (ex: mata o comparsa do roubo para ficar com todos os lucros). É praticado posteriormente ao outro delito. Obs: “outro crime” pode se referir a delito praticado pelo próprio homicida ou por pessoa diversa (ex: irmão). Portanto, o crime passado não precisa ter sido praticado pelo homicida. Ex: O agente mata o segurança para o irmão estuprar a atriz. O agente mata a testemunha de crime praticado pelo irmão. Obs 2: Não configurará a referida qualificadora se se referir à contravenção penal. Nesse caso, haverá motivo torpe ou fútil. Inciso VI: contra a mulher em razão da condição de sexo feminino (feminicídio) A Lei nº 13.104/2015 acrescentou mais uma qualificadora ao rol do §2º, do artigo 121, do Código Penal, quando o homicídio for praticado contra a mulher por razões da condição de sexo feminino. Quando se fala em razões da condição de sexo feminino é lógico que se está diante de violência de gênero. Por isso, homicídio praticado contra mulher praticado com violência de gênero configura o feminicídio que nada mais é do uma qualificadora do crime de homicídio. Segundo a doutrina majoritária, cuida-se de mais uma qualificadora de natureza subjetiva, pois está ligada à motivação do delito e não ao meio ou ao modo de execução. Por outro lado, o STJ, em decisão recente, entendeu que a qualificadora do feminicídio é de natureza objetiva. Portanto, pode coexistir com a qualificadora do motivo torpe, conforme noticiado no Informativo de Jurisprudência nº 625, publicado em 01/06/2018, vejamos: “Observe-se, inicialmente, que, conforme determina o art. 121, § 2º-A, I, do CP, a qualificadora do feminicídio deve ser reconhecida nos casos em que o delito é cometido em face de mulher em violência doméstica e familiar. Assim, "considerando as circunstâncias subjetivas e objetivas, temos a possibilidade de coexistência entre as qualificadoras do motivo torpe e do feminicídio. Isso porque a natureza do motivo torpe é subjetiva, porquanto de caráter pessoal, enquanto o feminicídio possui natureza objetiva, pois incide nos crimes praticados contra a mulher por razão do seu gênero feminino e/ou sempre que o crime estiver atrelado à violência doméstica e familiar propriamente dita, assim o animus do agente não é objeto de análise" (Ministro Felix Fischer, REsp 1.707.113-MG, publicado em 07/12/2017). O legislador, por meio do também acrescentado §2º-A, pretendeu explicar quando se considera que há condição de sexo feminino. Tal norma explicativa, contudo, afigura-se inútil. 21 Além de uma redação confusa e tautológica (redundante), pode levar à interpretação de que todo homicídio praticado contra a mulher configura feminícidio. Vale a pena, então, fazer a distinção entre femicídio e feminicídio: Femicídio: é matar mulher. Feminicídio: é matar mulher em razão de “condição de sexo feminino”. Portanto, não é somente o fato de matar mulher que faz nascer a qualificadora, deve envolver ainda razão de condição de sexo feminino, ou seja, menosprezo ou discriminação quanto à condição de mulher (violência de gênero contra a mulher). É possível falar em feminicídio, se a vítima for transexual? Diante dos princípios norteadores do Direito Penal e, sobretudo, da vedação à analogia in malam partem, a doutrina majoritária entende não ser possível. Nesse caso, o homicídio pode continuar a ser considerado qualificado, mas a motivação será torpe ou fútil, conforme o caso. Obs: Há decisões judiciais aplicando a Lei Maria da Penha (Lei nº 11.340/06) para transexuais. Obs 2: Há doutrina que entende que se aplica a qualificadora do feminicídio, mesmo em se tratando de vítima transexual, se ela for reconhecida juridicamente como pessoa do sexo feminino. Contudo, trata-se de posição minoritária. VII – contra autoridade ou agente descrito nos arts. 142 e 144 da Constituição Federal, integrantes do sistema prisional e da Força Nacional de Segurança Pública, no exercício da função ou em decorrência dela, ou contra seu cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até terceiro grau, em razão dessa condição. A Lei nº 13.142/15 acrescentou o inciso VII no §2º, do artigo 121, do CP, passando a qualificar o delito se cometido contra as pessoas integrantes dos órgãos de segurança pública previstos nos artigos 142 e 144, da CF/88. A doutrina vem denominando essa nova modalidade de homicídio qualificado de “Homicídio Funcional”. Urge esclarecer que qualificadora do inciso VII é de natureza subjetiva, pois diz respeito à motivação do delito. Vejamos as hipóteses: a) Militares das Forças Armadas (artigo 142, da CF); 22 b) Integrantes da(s) Polícia Federal, Polícia Rodoviária Federal, Polícia Ferroviária Federal, Polícias Civis, Polícias Militares e dos Corpos de Bombeiros Militares (artigo 144, da CF); Obs: Homicídio praticado contra guardas civis municipais ou metropolitanos está abrangido pela referida qualificadora, segundo a melhor doutrina. Até porque o §8º, do artigo 144, da CF, prevê os guardas municipais como agentes da segurança pública. Mesmo raciocínio aplica-se aos agentes de trânsito, que também compõem os órgãos de segurança pública, conforme o §10, do artigo 144, da CF. c) Integrantes do Sistema Prisional; Obs: Abrangem não apenas os envolvidos diretamente com o sistema prisional (Diretor, agentes penitenciários etc), mas também os componentes de órgãos do Sistema Prisional, tais como os membros da Comissão Técnica de Classificação, da Comissão de Exame Criminológico, do Conselho Penitenciário etc. d) Integrantes da Força Nacional de Segurança Pública; e) Cônjuge, companheiro ou parente consanguíneo até 3º grau das pessoas mencionadas acima. Obs: É importante ressaltar que, em todas as hipóteses previstas, deve estar presente o nexo causal entre o homicídio e a função desempenhada pela vítima ou seu familiar. Portanto, não é o fato de a vítima ser policial que, por si só, fará presente a qualificadora. É indispensável que o motivo determinante do crime esteja relacionado diretamente com o exercício da função pela vítima. Ex: Um policial, à paisana e de folga, envolve-se numa briga de bar originada por uma discussão de futebol. Durante a contenda, o policial é morto a tiros por um torcedor do time rival que sequer o conhecia. Nesse caso, obviamente, não há de se falar da qualificadora em estudo, nada impedindo que haja o enquadramento em outra qualificadora subjetiva (motivo torpe ou fútil). Ex 2: Aproveitando o exemplo acima, vamos supor que a Polícia Militar seja acionada para atender a ocorrência. Ao avistar a viatura se aproximando, o mesmo torcedor acima efetua vários disparos em direção ao veículo militar a fim de não ser preso. Um dos tiros atinge um dos policiais, que vem a óbito. Nesse caso, o torcedor responderá pelos seguintes delitos, em concurso material (artigo 69, do CP): a) Homicídio qualificado pelo motivo torpe ou fútil com relação ao policial à paisana que sequer conhecia e, portanto, ignorava por completo sua condição funcional (artigo 121, §2º, inciso I ou II, do CP) 23 b) Homicídio qualificado por ter sido praticado contra policial militar em serviço (artigo 121, §2º, inciso VII, do CP) Obs 2: Como a Lei fala em “parentesco consanguíneo” como ficará a situaçãodo filho adotivo do agente de segurança?. Ex: Em represália a uma prisão ocorrida no passado, perigoso marginal mata filho adotivo do policial que o prendeu. Nesse caso, o criminoso responderá por homicídio qualificado pelo motivo torpe. Obs 3: Homicídio contra policial aposentado em decorrência da função exercida configura a qualificadora? 02 correntes: 1ª corrente: A qualificadora do inciso VII aplica-se somente se a vítima for policial da ativa. É o posicionamento de Cleber Masson. Nesse caso, nada impediria a incidência da qualificadora do motivo torpe. 2ª corrente: É perfeitamente possível. É o posicionamento de Cezar Roberto Bitencourt, Rogério Greco e Rogério Sanches Cunha. DO HOMICÍDIO PRIVILEGIADO-QUALIFICADO Privilegiadoras (§1°) Qualificadoras (§2º) Motivo de relevante valor social Meios de execução (inciso III) Motivo de relevante valor moral Modos de execução (inciso IV) Domínio de violenta emoção, logo em seguida à injusta provocação da vítima Discute-se na doutrina e na jurisprudência se o homicídio pode ser ao mesmo tempo privilegiado e qualificado. A posição amplamente majoritária é favorável, desde que as qualificadoras sejam de natureza objetiva (meio e modo de execução – incisos III e IV, §2°), uma vez que as privilegiadoras (minorantes) tem caráter subjetivo. Ex: Matar o perigoso traficante que aterroriza a comunidade local por emboscada. A doutrina lembra, contudo, ser incompatível uma qualificadora objetiva com o privilégio, na hipótese de “emboscada” e “violenta emoção”. Prevalece também que o homicídio privilegiado-qualificado não tem caráter hediondo (analogia ao artigo 67, do CP). Obs: No Tribunal do Júri, reconhecido o privilégio, o juiz-presidente pode quesitar o feminicídio? A resposta é negativa, pois a qualificadora do feminicídio possui natureza subjetiva, isto é, está ligada aos motivos determinantes do delito, incompatível com o privilégio. 24 DO HOMÍCIDIO DOLOSO MAJORADO (art. 121, §4°, parte final, §6° e §7º do CP): Art. 121: §4°: (...) “Sendo doloso o homicídio, a pena é aumentada de 1/3 (um terço) se o crime é praticado contra pessoa menor de 14 (quatorze) ou maior de 60 (sessenta) anos”. § 6º: “A pena é aumentada de 1/3 (um terço) até a metade se o crime for praticado por milícia privada, sob o pretexto de prestação de serviço de segurança, ou por grupo de extermínio” (Incluído pela Lei nº 12.720, de 2012). § 7o A pena do feminicídio é aumentada de 1/3 (um terço) até a metade se o crime for praticado: (Incluído pela Lei nº 13.104, de 2015) I - durante a gestação ou nos 3 (três) meses posteriores ao parto; (Incluído pela Lei nº 13.104, de 2015) II - contra pessoa menor de 14 (catorze) anos, maior de 60 (sessenta) anos ou com deficiência; (Incluído pela Lei nº 13.104, de 2015) III - na presença de descendente ou de ascendente da vítima. (Incluído pela Lei nº 13.104, de 2015) IV - em descumprimento das medidas protetivas de urgência previstas nos incisos I, II e III do caput do art. 22 da Lei nº 11.340, de 7 de agosto de 2006. (Incluído pela Lei nº 13.771, de 2018) A 2ª parte do §4° do art. 121, aplicada somente aos delitos dolosos, aumenta a pena do homicídio (simples, privilegiado e qualificado) quando praticado “contra pessoa menor de 14 anos ou maior de 60 anos”, em razão da demonstração de maior insensibilidade moral e de maior covardia por parte do homicida. O §6° prevê uma causa de aumento de pena incorporada pela Lei n° 12.720/12 de 27/09/2012. Trata-se do homicídio praticado por milícia privada, sob o pretexto de prestação de serviço de segurança, ou por grupo de extermínio (‘justiceiros”). A Lei nº 13.104/15 acrescentou o §7º ao artigo 121, do CP, aumentando a pena de 1/3 até a metade nas hipóteses de feminicídio. Ressalte-se que aqui não incide a causa de aumento do §4º a fim de se evitar o bis in idem. No mesmo sentido, a Lei nº 13.771/18 inseriu o inciso IV ao mesmo parágrafo acima, aumentando a pena na hipótese de feminicídio praticado em descumprimento de medidas protetivas previstas na Lei nº 11.340/06 (Lei Maria da Penha). 25 Obs: O artigo 59, do Estatuto do Índio (Lei nº 6.001/73) prevê causa de aumento de pena de 1/3 (um terço) para vítima índio não integrado. Vejamos: “No caso de crime contra a pessoa, o patrimônio ou os costumes, em que o ofendido seja índio não integrado ou comunidade indígena, a pena será agravada de um terço”. DO HOMICÍDIO CULPOSO (artigo 121, §3°, CP) Ocorre o homicídio culposo quando o sujeito realiza uma conduta voluntária, com violação do dever objetivo de cuidado a todos imposto, por imprudência, negligência ou imperícia, e assim produz um resultado naturalístico (morte) involuntário, não previsto e tampouco querido, mas objetivamente previsível, que podia com a devida atenção ser evitado. Em síntese, o agente, sem desejar e tampouco assumir o risco, produz a morte da vítima, por imprudência, negligência ou imperícia. Obs: Se o homicídio for praticado na direção de veículo automotor, em razão do princípio da especialidade, haverá o delito previsto no art. 302, da Lei n° 9.503/97 (CTB). Modalidades de culpa: a) Imprudência: é a culpa in faciendo ou positiva, consistente na prática de um ato perigoso sem as cautelas exigidas. É a precipitação, a afoiteza. Ex: Manejar arma de fogo em local de grande concentração de pessoas, trafegar na contramão, realizar manobra proibida na direção de veículo, fazer ultrapassagem em local proibido etc. b) Negligência: é a culpa negativa, consistente em deixar de fazer o que a cautela exige. É a ausência de precaução (omissão). Ex: Deixar arma carregada ou veneno ao alcance de criança. c) Imperícia: é a culpa profissional, consistente na falta de aptidão para o exercício de arte, ofício ou profissão. O agente, embora autorizado, não possui conhecimento ou habilidade necessária para a prática da conduta. Ex: Engenheiro que constrói prédio que, por erro de cálculo, vem a desabar e matar os moradores, policial que atira e acerta a vítima em vez do criminoso, médico clínico-geral que mata o paciente ao realizar uma cirurgia cardíaca. Obs: A culpa concorrente não isenta o agente de responsabilidade. O Direito Penal não admite compensação de culpa. Obs 2: A culpa exclusiva da vítima não gera responsabilidade penal do agente. DO HOMICÍDIO CULPOSO MAJORADO (artigo 121, §4°, 1ª parte, do CP): São 04 as hipóteses: 26 § 4o No homicídio culposo, a pena é aumentada de 1/3 (um terço), se o crime resulta de inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício, ou se o agente deixa de prestar imediato socorro à vítima, não procura diminuir as conseqüências do seu ato, ou foge para evitar prisão em flagrante. a) Inobservância de regra técnica de profissão, arte ou ofício. Parte da doutrina entende ser inaplicável a referida majorante por configurar bis in idem já que se confunde com o próprio conceito de imperícia. A doutrina e a jurisprudência majoritárias entendem que, de fato, não se deve aplicar a referida causa de aumento ao profissional que não detém conhecimento suficiente para exercer determinada arte, ofício ou profissão, mas sim àquele que o possui e que, mesmo assim, produz o evento morte por desídia ou desleixo. Ex: Cardiologista que não segue as regras elementares de uma cirurgia do coração. Desta forma, a referida majorante só deve incidir em desfavor do profissional, ao qual se impõe um dever de cuidado mais acentuado. Nesse sentido, o julgado do STJ: Informativo nº 0520 Período: 12 de junho de 2013. Quinta Turma DIREITO PENAL. NÃO CARACTERIZAÇÃO DE BIS IN IDEM NO CASO DE APLICAÇÃODE CAUSA DE AUMENTO DE PENA REFERENTE AO DESCUMPRIMENTO DE REGRA TÉCNICA NO EXERCÍCIO DA PROFISSÃO. É possível a aplicação da causa de aumento de pena prevista no art. 121, § 4º, do CP no caso de homicídio culposo cometido por médico e decorrente do descumprimento de regra técnica no exercício da profissão. Nessa situação, não há que se falar em bis in idem. Isso porque o legislador, ao estabelecer a circunstância especial de aumento de pena prevista no referido dispositivo legal, pretendeu reconhecer maior reprovabilidade à conduta do profissional que, embora tenha o necessário conhecimento para o exercício de sua ocupação, não o utilize adequadamente, produzindo o evento criminoso de forma culposa, sem a devida observância das regras técnicas de sua profissão. De fato, caso se entendesse caracterizado o bis in idem na situação, ter-se-ia que concluir que essa majorante somente poderia ser aplicada se o agente, ao cometer a infração, incidisse em pelo menos duas ações ou omissões imprudentes ou negligentes, uma para configurar a culpa e a outra para a majorante, o que não seria condizente com a pretensão legal. Precedente citado do STJ: HC 63.929-RJ, Quinta Turma, DJe 9/4/2007. Precedente citado do STF: HC 86.969-6-RS, Segunda Turma, DJ 24/2/2006. HC 181.847-MS, Rel. Min. Marco Aurélio 27 Bellizze, Rel. para acórdão Min. Campos Marques (Desembargador convocado do TJ/PR), julgado em 4/4/2013. O STF entendeu de outra forma: Homicídio culposo: inobservância do dever de cuidado e “bis in idem” Por inadequação da via processual eleita, a 1ª Turma julgou extinto habeas corpus e, ante o empate na votação, concedeu, de ofício, a ordem para afastar a exasperação da pena-base decorrente da inobservância do dever de cuidado na direção de veículo automotor (CTB, art. 302), uma vez configurado bis in idem. Na espécie, o paciente fora condenado por homicídio culposo em razão de imprudência por dirigir com excesso de velocidade. A Ministra Rosa Weber, relatora, destacou que o magistrado, na primeira fase da dosimetria, fundamentara o aumento da pena-base tão somente na elevada velocidade do veículo no instante do atropelamento, que culminara com a morte da vítima. Reputou equivocada a consideração do excesso de velocidade e do resultado morte, porquanto consubstanciariam elementares do tipo. Assim, à míngua de outras circunstâncias desfavoráveis, a pena-base deveria permanecer no mínimo legal. Os Ministros Marco Aurélio e Luiz Fux votaram pela não concessão da ordem, de ofício, por não vislumbrarem ilegalidade. HC 117599/SP, rel. Min. Rosa Weber, 3.12.2013. (HC-117599) b) Deixar de prestar imediato socorro à vítima: A referida causa de aumento de pena visa a punir com maior severidade a falta de solidariedade daquele que, culposamente, deu causa ao dano sofrido pela vítima e que, apesar de poder, nada faz para impedir que ela venha a morrer em consequência das lesões produzidas. Obs: Não incide a majorante se a vítima for socorrida por terceiros, se tiver morte instantânea ou se o agente corria perigo, seja porque estava ferido também, seja porque corria risco pessoal (ex: linchamento). Vejamos, o julgado do STJ: “DIREITO PENAL. MORTE INSTANTÂNEA DA VÍTIMA E OMISSÃO DE SOCORRO COMO CAUSA DE AUMENTO DE PENA. No homicídio culposo, a morte instantânea da vítima não afasta a causa de aumento de pena prevista no art. 121, § 4°, do CP – deixar de prestar imediato socorro à vítima –, a não ser que o óbito seja evidente, isto é, perceptível por qualquer pessoa. Com efeito, o aumento imposto à pena decorre do total desinteresse pela sorte da vítima. Isso é evidenciado por estar a majorante inserida no § 4° do art. 121 do CP, cujo móvel é a observância do dever de solidariedade que deve reger as relações na sociedade brasileira (art. 3º, I, da CF). Em suma, o que pretende a regra em destaque é realçar a importância da alteridade. Assim, o interesse pela integridade da vítima deve 28 ser demonstrado, a despeito da possibilidade de êxito, ou não, do socorro que possa vir a ser prestado. Tanto é que não só a omissão de socorro majora a pena no caso de homicídio culposo, como também se o agente “não procura diminuir as consequências do seu ato, ou foge para evitar a prisão em flagrante”. Cumpre destacar, ainda, que o dever imposto ao autor do homicídio remanesce, a não ser que seja evidente a morte instantânea, perceptível por qualquer pessoa. Em outras palavras, havendo dúvida sobre a ocorrência do óbito imediato, compete ao autor da conduta imprimir os esforços necessários para minimizar as consequências do fato. Isso porque “ao agressor, não cabe, no momento do fato, presumir as condições físicas da vítima, medindo a gravidade das lesões que causou e as consequências de sua conduta. Tal responsabilidade é do especialista médico, autoridade científica e legalmente habilitada para, em tais circunstâncias, estabelecer o momento e a causa da morte” (REsp 277.403-MG, Quinta Turma, DJ 2/9/2002). Precedente citado do STF: HC 84.380-MG, Segunda Turma, DJ 3/6/2005. HC 269.038-RS, Rel. Min. Felix Fischer, julgado em 2/12/2014, DJe 19/12/2014”. Obs 2: A majorante não se confunde com o crime de omissão de socorro (art. 135). Neste o agente não foi o causador dos danos sofridos pela vítima. c) Não procurar diminuir as consequências do seu ato: É uma decorrência da hipótese anterior. O agente, além de não ter prestado socorro imediato, nada faz para minorar o mal causado. Ex: Agente que se afastou do local do sinistro em virtude de risco de linchamento e não procurou ajuda dos órgãos competentes. d) Fugir para evitar prisão em flagrante: Pretende a Lei Penal impedir que o agente fuja para garantir a impunidade do fato. A doutrina aponta que a referida majorante é de discutível constitucionalidade, já que não se pode obrigar o agente a se apresentar perante a autoridade para ser preso. Se não se exige referido comportamento por parte de autor de homicídio doloso, não se pode exigir de quem pratica crime culposo. DO PERDÃO JUDICIAL (art. 121, §5°) § 5º - Na hipótese de homicídio culposo, o juiz poderá deixar de aplicar a pena, se as conseqüências da infração atingirem o próprio agente de forma tão grave que a sanção penal se torne desnecessária. Trata-se de causa de extinção da punibilidade prevista na hipótese de 29 homicídio culposo. Ocorre nas situações em que as consequências da infração atingem o agente de modo tão grave, que acaba por se tornar desnecessária a aplicação da pena. O próprio resultado naturalístico já é em si uma severa penalidade. A gravidade e a extensão demandam a análise do caso concreto. Podem atingir o próprio autor (ex: fica paraplégico) ou pessoa que ele nutre grande afeto (ex: filho morre etc). O perdão judicial é concedido na sentença, já que depende da análise do mérito. Se não houver provas da autoria ou materialidade, o agente será absolvido e não perdoado. Além disso, deve-se fazer prova da desnecessidade de aplicação da pena. Acrescente-se que o perdão judicial alcança todos os crimes ocorridos no contexto. Ex: Num acidente morrem o filho e um estranho, o perdão alcançará ambos os delitos. Prevalece que natureza jurídica da sentença é declaratória de extinção da punibilidade, consoante Súmula n° 18, do STJ. Assim, não subsiste qualquer efeito condenatório (ex: reincidência). Cuida-se de direito subjetivo do réu e não depende de sua aceitação. AÇÃO PENAL NOS CRIMES DE HOMÍCIDIO DOLOSO E CULPOSO Ação Penal Pública Incondicionada. 30 Parte 03 INDUZIMENTO, INSTIGAÇÃO OU AUXÍLIO AO SUICÍDIO (art.122 do CP) Induzimento, instigação ou auxílioa suicídio Art. 122 - Induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou prestar-lhe auxílio para que o faça: Pena - reclusão, de dois a seis anos, se o suicídio se consuma; ou reclusão, de um a três anos, se da tentativa de suicídio resulta lesão corporal de natureza grave. Parágrafo único - A pena é duplicada: Aumento de pena I - se o crime é praticado por motivo egoístico; II - se a vítima é menor ou tem diminuída, por qualquer causa, a capacidade de resistência. 1) Conceito de Suicídio: É a eliminação voluntária e consciente da própria vida. Por razões de Política Criminal e com fundamento no Princípio da Alteridade (só se pune a ofensa a bens jurídicos alheios e não próprios), não se pune aquele que atenta contra a própria vida e, sim, aquele que induz, instiga ou auxilia outrem a fazê-lo. Houve época em que ao suicida era vedada a realização de cerimônias fúnebres e religiosas, podendo, inclusive, sofrer confisco de seus bens. 2) Objeto jurídico: A vida humana. 3) Sujeito ativo: Qualquer pessoa, admitindo-se coautoria e participação. 4) Sujeito passivo: Qualquer pessoa com capacidade de discernimento e resistência. Desta forma, quem induz, instiga ou auxilia uma criança de tenra idade ou um enfermo mental a suicidar-se responderá por homicídio. 31 Além disso, a vítima tem de ser pessoa certa e determinada. Assim, não é punível a participação genérica nesse delito, como ocorreu na obra Os sofrimentos do jovem Werther, do escritor alemão Goethe em 1774 ou o caso do cantor Ozzy Osbourne que compôs a música Suicide Solution. Em ambos os casos, houve pessoas que se suicidaram por suposta influências das mesmas. 5) Ações nucleares: O tipo penal é constituído pelos verbos induzir, instigar e auxiliar a prática do suicídio. Trata-se de crime de ação múltipla ou de conteúdo variado. Ainda que o agente pratique 02 ou mais condutas, será responsabilizado apenas uma vez. Contudo, sofrerá maior juízo de reprovabilidade na fase do art. 59, do CP. a) Induzir: significa criar a ideia, incutir na mente alheia a ideia do suicídio. Ex: Diante do desespero do amigo, o agente sugestiona-o a praticar o suicídio como única solução para seus problemas. b) Instigar: significa reforçar a idéia preexistente, encorajar a prática do suicídio. Ex: Perguntado se o suicídio seria a única solução a ser tomada, agente diz que é a única decisão a ser tomada por pessoa de honra e brio. c) Auxílio: é a ajuda material ao ato suicida. Ex: Sabendo das intenções suicidas de outrem, o agente empresta-lhe a corda para se enforcar. O auxílio pode ser antes ou durante o suicídio. Ex: Segurar a espada contra qual se lança o suicida. Obs 1: O auxílio deve sempre ser uma atividade acessória. Se o agente pratica atos executórios, responderá por homicídio. Ex: Atendendo aos apelos da vítima, o agente aperta o gatilho da arma. Obs 2: O auxílio deve ser o meio empregado para a prática do ato extremo. Se, embora tenha emprestado a corda, a vítima empregou o veneno para se matar, o agente não responderá por participação em suicídio. Obs 3: Prevalece ser possível a participação por omissão, quando o agente tinha o dever de impedir o resultado (art. 13, §2°, CP). Ex: Pai que assiste ao filho se suicidar sem nada fazer. 6) Elemento subjetivo: É o dolo direto ou eventual. Nesta última modalidade, quando o agente assume o risco de provocar a ideia suicida por parte da vítima. A doutrina cita o exemplo do marido que prática sevícias contra a esposa, não obstante saber da intenção dela em suicidar-se, caso as agressões não cessem. Também o exemplo do pai que expulsa a filha desonrada de casa, tendo fortes razões para supor que ela vai cometer suicídio. 32 Não se admite a modalidade culposa. 7) Consumação: Exige a produção do resultado morte ou lesões corporais de natureza grave na vítima (artigo 129, §1º e 2º, do CP). Se, a despeito da participação, a vítima sofrer lesões corporais leves, o fato não é punível (em verdade, trata-se de atipicidade). 8) Tentativa: Não é possível, pois só é punível o fato se houver a produção do resultado naturalístico (morte ou lesões corporais graves). Trata-se, pois, de crime condicionado. 9) Causas de aumento de pena (art.122, incisos I e II): A pena será duplicada nas seguintes hipóteses: a) Motivo egoístico (inciso I): é o que diz respeito a obtenção de vantagem pessoal. Ex: Incentivar o amigo a se suicidar para ficar com sua esposa. Auxiliar o pai a se matar para ficar com a herança. b) Vítima menor (inciso II): é a pessoa com idade entre 14 e 18 anos. Se a vítima for menor de 14 anos, haverá homicídio. c) Vítima com capacidade de resistência diminuída (inciso II): a vítima, por qualquer causa, não tem condições plenas para refletir sobre as consequências do ato extremo, seja pela idade avançada, pelo uso de drogas ou álcool etc. Obs: Se a vítima for completamente incapaz de compreender as consequências de seu ato extremo (ex: doença mental grave), quem a induziu, a instigou ou a auxiliou a suicidar-se responderá por homicídio. 10) Pacto de morte: O Pacto de morte ocorre quando 02 pessoas resolvem se suicidar juntas, em geral, em razão de não superação de dificuldades. O mais comum é o da sala fechada com gás aberto. Aquele que abriu a torneira de gás sempre estará incurso no art. 121, podendo ser consumado (se o outro suicida morrer) ou tentado (se ou outro suicida sofrer lesões graves). Por outro lado, a outra pessoa (que não abriu a torneira) vai responder por participação em suicídio (art. 122), se a que abriu morrer ou sofrer lesões corporais graves. Em síntese: 33 a) se houver um sobrevivente: - quem abriu a torneira responde pelo crime de homicídio (art. 121); - quem não abriu, responde por participação em suicídio (art. 122): neste caso, a pessoa que abriu a torneira foi quem faleceu; b) se os dois sobrevivem e não há lesão corporal grave: - quem abriu o gás responde por tentativa de homicídio; -quem não abriu responde por nada (fato atípico); c) se os dois sobrevivem e ambos abriram a torneira: -ambos respondem por tentativa de homicídio. 11) Roleta-Russa e Duelo Americano Na Roleta-Russa há um revólver cujo tambor é girado sucessivamente pelos participantes, ao passo que no Duelo Americano há 02 armas e apenas uma delas está carregada, sendo que os participantes escolhem uma delas para apertar o gatilho contra si. Em ambos os casos, os sobreviventes respondem por participação em suicídio (art. 122). 12) Ação Penal: Pública Incondicionada. 34 Parte 04 INFANTICÍDIO (art.123 do CP) Infanticídio Art. 123 - Matar, sob a influência do estado puerperal, o próprio filho, durante o parto ou logo após: Pena - detenção, de dois a seis anos. 1) Conceito: Segundo o art. 123, trata-se da morte do filho praticada pela própria mãe, sob a influência do estado puerperal, durante o parto ou logo após. O crime de infanticídio em muitas legislações é tratado como uma forma privilegiada do homicídio. De fato, o tipo do art. 123 possui as mesmas elementares do art. 121 com mais algumas especializantes referentes aos sujeitos, ao tempo e à motivação do delito. 2) Objeto jurídico: É a vida humana extrauterina. 3) Objeto material: É o ser nascente ou recém-nascido. 4) Sujeito ativo: Trata-se de crime próprio, pois só pode ser praticado pela mãe puérpera. Admite coautoria e participação. Nesse caso, o terceiro que concorre para a prática do delito responde por qual crime? Homicídio ou infanticídio?Embora tenha havido certa divergência no passado, sobretudo com relação ao entendimento de Hungria a respeito do tema, atualmente a posição é praticamente pacífica: o terceiro que concorre para a prática do infanticídio responde também por este delito, com fundamento no art. 30, do CP (“Não se comunicam as circunstâncias e as condições de caráter pessoal, salvo quando elementares do crime”). 35 Em síntese: a) Mãe que mata o filho, contando com o auxílio de terceiro: -mãe: responderá por infanticídio; - terceiro: responderá também por infanticídio, por força do artigo 30, do CP. b) Mãe e terceiro matam o recém-nascido: -mãe: responderá por infanticídio; - terceiro: responderá também por infanticídio, por força do artigo 30, do CP. c) Terceiro mata o recém-nascido, contando com a participação da mãe: -terceiro: responderá por homicídio (posição de Hungria nas primeiras edições de sua obra), infanticídio (posição de Hungria na última edição de sua obra. É o entendimento amplamente majoritário); -mãe: a rigor responderia por homicídio também, em razão do artigo 29, do CP. Entretanto, com fundamento no princípio da proporcionalidade, continuará a responder por infanticídio, já que se praticasse a conduta principal responderia por este delito. Desta forma, não pode uma conduta acessória ser punida mais severamente do que a conduta principal. 5) Sujeito passivo: É o ser nascente ou neonato. Obs: Para se evitar o bis in idem, não incidem as agravantes genéricas previstas no art. 61, inciso II, alínea “e” (crime contra descendente) e “h” (crime contra criança). Obs 2: Se a mãe, nas condições do art. 123, matar outra criança, acreditando ser o próprio filho, responde também por infanticídio em razão do erro de tipo (art. 20). Obs 3: Se a mãe praticar a conduta contra filho natimorto, caracterizará hipótese de crime impossível (art. 17). Mesmo caso, se o filho for acometido de anencefalia, em consonância com os fundamentos lançados no julgamento da ADPF n°54/DF. 6) Ação nuclear: É o verbo “matar”. Trata-se de crime de forma livre, pode ser praticado tanto por ação, como por omissão. 36 7) Elemento temporal: Trata-se da elementar “durante o parto ou logo após”. Considera-se parto, o período entre a contração do útero materno e o deslocamento do feto até expulsão da placenta. A expressão “logo após”, segundo a melhor doutrina, deve ser analisada caso a caso, não havendo critério temporal definido. 8) Elemento psicofisiológico: O legislador brasileiro adotou o critério psicofisiológico para conceituar “estado puerperal”. Cuida-se o estado puerperal do conjunto de alterações físicas e psíquicas que acometem a mulher e que são decorrentes do parto. Por vezes, acarreta transtornos de ordem mental na mulher, tais como, angústia, ódio, desespero, terminando por matar o próprio filho. Não se deve confundi-lo, pois, com a inimputabilidade, ainda que relativa (art. 26). Desta forma, se o estado puerperal provocar transtorno psíquico ao ponto de suprimir total ou parcialmente a capacidade de entendimento e determinação da genitora, esta ficará isenta de pena ou terá a pena reduzida. No caso do infanticídio, a genitora está sob a “influência do estado puerperal” sem que se possa falar de doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, já que constitui um período de tempo delimitado (temporário). 9) Elemento subjetivo: O crime pode ser praticado a título de dolo direto ou eventual. Não há modalidade culposa do delito. Na hipótese de a genitora provocar culposamente a morte do filho, sob a influência do estado puerperal, durante ou logo após o parto, responderá por homicídio culposo (posição majoritária). Damásio entende que ela não responderá por delito algum. 10) Consumação: Ocorre com a morte do neonato ou nascente (crime material). 11) Tentativa: É perfeitamente possível. 37 12) Ação Penal: Pública Incondicionada. 38 Parte 05 ABORTO (art. 124 a 128 do CP) 1) Conceito: É a interrupção da gravidez com a destruição do produto da concepção. É a morte do ovo (até 03 semanas de gestação), do embrião (de 03 semanas a 03 meses) ou do feto (após 03 meses), não implicando, necessariamente sua expulsão. Com relação ao início da gravidez para fins penais, há 02 correntes: A 1ª entende que a gravidez se inicia com a fecundação, ou seja, a partir do momento da concepção. A 2ª corrente entende que, em verdade, o legislador brasileiro considerou a nidação, isto é, a implantação do óvulo no útero materno. A razão está no fato de que se permite o uso de contraceptivos que agem após a fecundação (DIU e “pílula do dia seguinte”), com a finalidade de impedir o alojamento do ovo no útero, sem que haja a caracterização do delito em estudo. Desta forma, para aqueles que entendem que a gravidez tem início com a fecundação, o uso de tais contraceptivos constitui exercício regular de direito (art. 23, inciso III, parte final, do CP), ao passo que para aqueles que entendem que é a nidação, trata-se de atipicidade. A doutrina prefere a expressão abortamento, já que aborto se refere ao produto da interrupção da gravidez. Obs: Quem anuncia produtos ou métodos abortivos, sem concorrer para o crime, pratica a conduta prevista no artigo 20, da LCP (Decreto-Lei n° 3.688/41). Obs 2: A 1ª Turma do STF, num verdadeiro ativismo judicial, entendeu que não é crime o aborto consentido até o terceiro mês de gestação. Os ministros fundamentaram a decisão na autonomia da mulher, princípios constitucionais da razoabilidade (proporcionalidade), da dignidade da pessoa humana etc 2) Espécies de aborto: a) natural: é a interrupção espontânea da gravidez, ocasionada por problemas de saúde da gestante. b) acidental: provocado por traumatismos, como choques e quedas. 39 c) criminoso: é a interrupção dolosa da gravidez. Encontra previsão legal nos artigos 124 a 127, do CP. d) legal ou permitido: são as 02 hipóteses previstas no art. 128, quando não houver outro meio para salvar a vida da gestante (aborto necessário) ou no caso de gravidez resultante de estupro (aborto humanitário ou sentimental). e) eugênico ou eugenésico: é o aborto que visa a evitar o nascimento de criança com deformidade ou enfermidade incurável. O aborto de feto anencefálico é uma espécie de aborto eugênico ou eugenésico permitida pelo STF, que considera o fato atípico. f) econômico, miserável ou social: proveniente da falta de recursos financeiros para sustentar o filho. No Anteprojeto do Código Penal, é permitido até a 12ª semana de gestação. 3) Modalidades de aborto criminoso: a) Autoaborto (art. 124, 1ª parte); b) Aborto consentido (art. 124, 2ª parte); c) Aborto provocado por terceiro sem o consentimento da gestante (art. 125); d) Aborto provocado por terceiro com o consentimento da gestante (art. 126). 4) Objeto jurídico: a) Autoaborto: é o direito à vida do feto (vida humana intrauterina). b) Aborto praticado por terceiro: além do direito à vida do feto, o direito à vida e à integridade física da gestante. 5) Objeto material: a) Autoaborto: o feto. b) Aborto praticado por terceiro: o feto e a gestante. 6) Sujeito ativo: a) Autoaborto ou aborto consentido: somente pode ser a genitora (crime de mão própria). b) Aborto provocado por terceiro: qualquer pessoa (crime comum). 7) Sujeito passivo: a) Autoaborto ou aborto consentido: o feto. 40 b)
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