Logo Passei Direto
Buscar
Material
páginas com resultados encontrados.
páginas com resultados encontrados.
left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

left-side-bubbles-backgroundright-side-bubbles-background

Crie sua conta grátis para liberar esse material. 🤩

Já tem uma conta?

Ao continuar, você aceita os Termos de Uso e Política de Privacidade

Prévia do material em texto

ISSN 0104-3293 (Versão impresso)
ISSN 2447-5246 (Versão on-line)
Vol. 20, nº 3
Vol. 20, nº 3
nov.2015 / fev.2016
E
D
U
C
A
Ç
Ã
O
 em
 F
O
C
O
EDUCAÇÃO em FOCO
Narrativas e Trajetórias de Formação: Um Diálogo entre Literatura e Memórias
Eda Maria de Oliveira Henriques
Mônica Maria de Azevedo
Inspetor de ensino e diretor escolar na legislação educacional de Minas Gerais (1906-24)
Betânia O. Laterza Ribeiro
Luciana B. O. B. Carvalho
Sandra M. Oliveira
Formação continuada do professor universitário: Orientação de estágio com pesquisa
Cláudia Chueire de Oliveira
Maura Maria Morita Vasconcellos
Neusi Aparecida Navas Berbel
Preencher potências e inventar educações possíveis
Cristian Poletti Mossi
Marilda Oliveira de Oliveira
Cansadas de esperar Godot quebramos espelhos
Carmen Lúcia Vidal Pérez
Luciana Pires Alves
 Compromisso e amor como elementos centrais das representações do ser professor na E.I
Idélia Manassés de Barros Silva 
Laêda Bezerra Machado
A criação do Grupo Escolar Silveira Brum e seus primeiros anos de funcionamento: 
relações entre a república e as festas escolares (1912-1930)
Denilson Santos de Azevedo
Talitha Estevam Moreira Cabral
Higienismo, imprensa e educação na Parahyba do Norte: O papel da mulher e a 
pedagogização dos hábitos
Charliton José dos Santos Machado 
Larissa Meira de Vasconcelos
Ludicidade, expressividade e formação da criança no primeiro ano do E.F.
Patrícia Vieira Bonfim 
Lucia Helena Pena Pereira 
“Compaixão pela Messe” : Filhas do divino zelo e as pedagogias missionárias em ação na 
Vila Operária de Içara”
Alcides Goularti Filho
Giani Rabelo
A documentação pedagógica como instrumento de formação profissional
Amanda Cristina Teagno Lopes Marques 
Maria Isabel Almeida
Historia de la infancia observada desde los ejes del juego, juguete y desigualdad
Patricia Castillo-Gallardo
Entre o seminário e o grupo escolar: a história da educação em Mariana-MG (XVIII XX)
Tatiana Aparecida Pereira
Sumário
Temas em educação
Capa v20 n3.indd 1 17/03/2016 14:12:23
Ed. Foco Juiz de Fora V.20 n.3 p. 01-355 Novembro 2015/Fevereiro 2016
Temas em educação
Juiz de Fora – MG - Brasil
ISSN: 0104-3293
Reitor: Marcus Vinicius David
Vice-Reitor: Girlene Alves da Silva
Diretor da Editora: Fernando Perlatto
Diretor da Faculdade de Educação: Prof. Dr. André Silva Martins
Endereço para correspondência: 
Faculdade de Educação / Centro Pedagógico 
Campus Universitário da UFJF
CEP: 36036-330 - Juiz de Fora MG
Telefone/Fax: (32) 2102-3656 
E-mail: revista.edufoco@ufjf.edu.br 
Home Page: www.ufjf.edu.br/revista.edufoco
Editora UFJF 
Rua Benjamin Constant, 790
MAMM - Museu de Arte Moderna Murilo Mendes
Centro - Juiz de Fora - MG
CEP: 36015-400
Telefax: (32) 3229-7646 / 3229-7645
E-mail: editora@editoraufjf.com.br / distribuicao.editora@ufjf.edu.br
Home Page: www.editoraufjf.com.br
Home Page: educacaoemfoco.ufjf.emnuvens.com.br/edufoco
Ficha Técnica
Diagramação 
Henrique de Abreu Oliveira Bedetti
Fabrício Angelo Soares
Arte e Diagramação da Capa 
Henrique de Abreu Oliveira Bedetti
Foto capa
Jardim Sensorial da UFJF 
Bolsistas da Revista
Larissa Oliveira
Marianna Palace Cardoso
Revisão Geral 
Marianna Palace Cardoso
Indexadores
- http://www.geodados.uem.br
- http://ibict.br/comut/htm
- www.inep.gov.br
- www.bve.cibec.inep.gov.br
- www.latindex.unam.mx
- diadorim.ebict.br
- Livre Revistas de Livre Acesso - CNEN
- Portal de Periódicos CAPES
Ficha Catalográfica
Educação em Foco: revista de educação / Universidade Federal de Juiz de Fora, 
Faculdade de Educação, Centro Pedagógico – Vol. 20, n. 3 (nov. 2015/fev. 2016) 
– Juiz de Fora: EDUFJF, 2015 – 355 p.
Quadrimestral
Disponível em: http://educacaoemfoco.ufjf.emnuvens.com.br/edufoco
ISSN 0104-3293 (Versão impressa) 
ISSN 2447-5246 (Versão on-line)
1. Educação – Periódicos. I. Universidade Federal de Juiz de Fora. Faculdade de 
Educação. Centro Pedagógico.
CDU 37
Ficha catalográfica elaborada por Adriana A. Oliveira – Bibliotecária – CRB6/1537
Nenhuma parte desta publicação pode ser reproduzida por qualquer meio, sem a 
prévia autorização da editora.
educação em Foco – IssN 0104-3293
coNselho edITorIal execuTIvo
Prof. Dr. Jader Janer (Editor-Chefe)
Prof. Dr. Aimberê Guilherme Quintiliano Rocha do Amaral
Prof.ª Dr.ª Cristhiane Cunha Flor
Prof. Dr. Daniel Cavalcanti Albuquerque Lemos
Prof.ª Dr.ª Luciana Pacheco Marques
Técnico Administrativo Israel Pinheiro Marques
coNselho cIeNTíFIco INTerNacIoNal
Prof. Dr. Abdeljalil Akkari - Universidade de Genebra - Suíça
Prof. Dr. Adrian Ascolani - Universidade Nacional de Rosário - Argentina
Prof.ª Dr.ª Ana Cecilia Vergara Del Solar - Universidade Diego Portales - Chile
Prof. Dr. Antônio Gomes Ferreira - Universidade de Coimbra - Portugal
Prof. Dr. Bernard Fichtner - Universidade de Siegen - Alemanha
Prof. Dr. Carlos Bernardo Skliar - Flacso - Argentina
Prof. Dr. Fernando Bárcena - Universidade Complutense de Madrid - Espanha
Prof. Dr. Fernando Hernandez - Universidade Barcelona - Espanha
Prof. Dr. Hubert Vincent - Universidade de Rouen - França
Prof. Dr. Jean Hébrard - École des Hautes Études en Sciences Sociales - França
Prof. Dr. Manuel Sarmento - Universidade do Minho - Portugal
Prof. Dr. Michalis Kontopodis - Universidade de Roehampton - Inglaterra
Prof.ª Dr.ª Margarida Louro Felgueiras - Universidade do Porto - Portugal
Prof.ª Dr.ª Patricia Eliana Castillo Gallardo - Universidade Diego Portales - Chile
coNselho cIeNTíFIco NacIoNal
Prof.ª Dr.ª Ana Ivenicki (ex - Ana Canen) - UFRJ
Prof.ª Dr.ª Ana Chystina Venancio Mignot - UERJ
Prof. Dr. Amarilio Ferreira Junior - UFSCAR
Prof. Dr. Carlos Henrique de Carvalho - UFU
Prof.ª Dr.ª Suzani Cassiani - UFSC
Prof.ª Dr.ª Clarice Nunes - UFF
Prof. Dr. Cleiton de Oliveira - UNIMEP
Prof.ª Dr.ª Daniela Barros da Silva Freire Andrade - UFMT
Prof.ª Dr.ª Diana Gonçalves Vidal - USP
Prof.ª Dr.ª Edméia Oliveira dos Santos - UERJ
Prof.ª Dr.ª Ilka Santos Schapper - UFJF
Prof. Dr. Irlen Antônio Gonçalves - CEFET-MG
Prof. Dr. José Silvério Baia Horta - UFAM
Prof. Dr. Laerthe de Moraes Abreu Junior - UFSJ
Prof.ª Dr.ª Lia Ciomar Macedo Faria - UERJ
Prof. Dr. Luciano Mendes de Faria Filho - UFMG
Prof.ª Dr.ª Magda Becker Soares - UFMG
Prof. Dr. Marcelo Soares Pereira da Silva - UFU
Prof. Dr. Marcio da Costa - UFRJ
Prof.ª Dr.ª Maria de Lourdes de A. Fávero - UFRJ
Prof.ª Dr.ª Maria Lidia Bueno Fernandes - UNB
Prof.ª Dr.ª Maria Teresa Assunção Freitas - UFJF
Prof.ª Dr.ª Maria Teresa Eglér Mantoan - UNICAMP
Prof.ª Dr.ª Marisa Bittar - UFSCar
Prof. Dr. Ubiratan D’Ambrósio - UNICAMP
Prof.ª Dr.ª Neuza Salim - UFJF
Prof.ª Dr.ª Nilda Alves - UERJ
Prof. Dr. Osmar Fávero - UFF
Prof.ª Dr.ª Rosemary Dore Heijmans - UFMG
Prof.ª Dr.ª Rosimar de Fátima Oliveira - UFMG
Prof. Dr. Rubem Barbosa Filho - UFJF
Prof.ª Dr.ª Sandra Zakia - USP
Prof.ª Dr.ª Sonia Maria de Castro Nogueira Lopes - UFRJ
Prof.ª Dr.ª Terezinha Oliveira - UEM
Prof. Dr. Orlando Ednei Ferretti - UFSC
Prof.ª Dr.ª Rosangela Duarte - UFRR
Prof.ª Dr.ª Vânia Alves Martins Chaigar - FURG
Prof. Dr. Wenceslau Gonçalves Neto - UFU
sumárIo
Apresentação .......................................................................9
Narrativas e Trajetórias de Formação: Um Diálogo entre 
Literatura e Memórias .......................................................15
Eda Maria de Oliveira Henriques
Mônica Maria de Azevedo
Inspetor de Ensino e Diretor Escolar na Legislação 
Educacional de Minas Gerais (1906–24) ...........................37
Betânia O. Laterza Ribeiro
Luciana B. O. B. Carvalho
Sandra M. Oliveira
Formação continuada do professor universitário: orientação 
de estágio com pesquisa .....................................................67
Cláudia Chueire de Oliveira
Maura Maria Morita Vasconcellos
Neusi Aparecida NavasBerbel
Preencher Potências e Inventar Educações Possíveis: pela 
experimentação de uma Formação-Sem-Órgãos ................99
Cristian Poletti Mossi
Marilda Oliveira de Oliveira
Cansadas de esperar Godot quebramos os espelhos ..........117
Carmen Lúcia Vidal Pérez
Luciana Pires Alves
Compromisso e amor como elementos centrais das 
representações do ser professora de educação infantil .......137
Idélia Manassés de Barros Silva 
Laêda Bezerra Machado
A criação do grupo escolar silveira brum e seus primeiros 
anos de funcionamento: relações entre a república e as festas 
escolares (1912-1930)......................................................165
Denilson Santos de Azevedo
Talitha Estevam Moreira Cabral 
Higienismo, imprensa e educação na parahyba do norte: o 
papel da mulher e a pedagogização dos hábitos ................187
Charliton José dos Santos Machado 
Larissa Meira de Vasconcelos 
Ludicidade e formação da criança no primeiro ano do ensino 
fundamental ....................................................................215
Lucia Helena Pena Pereira
Patrícia Vieira Bonfim 
“Compaixão pela messe!”: Filhas do divino zelo e as 
pedagogias missionárias em ação na Vila Operária Mineração 
de Içara (SC-Brasil) 1959 a 1968 .....................................237
Alcides Goularti Filho
Giani Rabelo 
A Documentação Pedagógica como instrumento de 
formação profissional .......................................................269
Amanda Cristina Teagno Lopes Marques 
Maria Isabel Almeida
Historia de la infancia observada desde los ejes del juego, 
juguete y desigualdad ......................................................289
Patricia Castillo-Gallardo
reseNha
Entre o seminário e o grupo escolar: a história da educação 
em Mariana-MG (XVIII XX) ..........................................325
Tatiana Aparecida Pereira
auTores
Autores ............................................................................337
summary
Presentation ........................................................................9
Narratives and Formation Trajectory: A Dialogue Between 
Literature and Memories ...................................................15
Eda Maria de Oliveira Henriques
Mônica Maria de Azevedo
School-inspector and school-director in the educational 
legislation of Minas Gerais (1906-24) ................................37
Betânia O. Laterza Ribeiro
Luciana B. O. B. Carvalho
Sandra M. Oliveira
Continuous development of the higher education teacher: 
internship supervision with research ..................................67
Cláudia Chueire de Oliveira
Maura Maria Morita Vasconcellos
Neusi Aparecida Navas Berbel
Fill powers and invent possible educations: the trial of a –
Without-organs Training ...................................................99
Cristian Poletti Mossi
Marilda Oliveira de Oliveira
Tired of waiting for Godot broken mirrors ......................117
Carmen Lúcia Vidal Pérez
Luciana Pires Alves
Commitment and love as core elements of representations of 
being early childhood education teacher ..........................137
Idélia Manassés de Barros Silva 
Laêda Bezerra Machado
The creation of the School Silveira Brum Group and its first 
years of operation : relations between the republic and the 
school holidays ................................................................165
Denilson Santos de Azevedo
Talitha Estevam Moreira Cabral 
Hygienism, press and education of north parahyba: the 
woman's paper and pedagogization of the habits .............187
Charliton José dos Santos Machado 
Larissa Meira de Vasconcelos 
Playfulness and education of children in the first grade of 
elementary school ...........................................................215
Lucia Helena Pena Pereira
Patrícia Vieira Bonfim 
"Compassion for the harvest": Daughters of Divine Zeal 
and the missionary pedagogies in action on workers' village 
mining Içara (Brazil-SC)? 1959-1968. .............................237
Alcides Goularti Filho
Giani Rabelo 
Documentation as a teaching tool for training .................269
Amanda Cristina Teagno Lopes Marques 
Maria Isabel Almeida
Historia de la infancia observada desde los ejes del juego, 
juguete y desigualdad ......................................................289
Patricia Castillo-Gallardo
reseNha
Between the seminary and the school group: the history of 
education in Mariana, Minas Gerais (XVIII XX) .............325
Tatiana Aparecida Pereira
auTores
Autores ............................................................................337
9
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 9-14,
nov. 2015/ fev. 2016
apreseNTação
O Conselho Editorial da Revista Educação em Foco nos 
solicitou que prefaciássemos este número a fim de realizar um 
balanço da longa gestão de 18 anos em que estivemos à frente 
da editoria da revista. Aproveitamos a oportunidade para 
constituir nessas linhas que foram oferecidas certa memorização 
institucional não apenas da revista, mas também da unidade 
acadêmica a que ela está ligada, a Faculdade de Educação da 
UFJF. Ainda que todo recorte já esteja comprometido com 
a interpretação, não se trata em sentido forte de historiar o 
quadro evolutivo da instituição, pois é cedo para o voo noturna 
da coruja. Os sentidos fortes da interpretação estabelecem-se 
com o tempo. Por outro lado, o nosso envolvimento com os 
acontecimentos não nos faz o melhor autor desta história. 
 Quando chegamos à Universidade, no início do ano de 
1993, na primeira gestão da Profª Diva Sarmento na direção 
da Faculdade, já havia sido lançado em 1992 o número zero, 
em comemoração aos 45 anos de fundação da Faculdade de 
Filosofia , Ciências e Letras, origem da Faculdade de Educação, 
contendo a sua história.. O volume 2, n. 1, de meados de 
1993, também fora lançado com artigos exclusivamente de 
professores da Casa. Ingressamos no corpo editorial da revista 
precisamente quando da preparação do volume 3, n.2, do 
qual participamos com artigo. No prefácio deste número se 
diz que a finalidade precípua da publicação é repercutir artigos 
de professores e alunos da Faculdade, embora já neste último 
número apareçam alguns professores de fora, como Solange 
Jobin, professora da PUC-Rio, e Tiago Adão Lara, da UFU. 
Estamos no ano de 1995. Ano seguinte, fez-se uma reforma 
no Conselho Editorial do qual assumimos a coordenação. 
Naquele momento, ocorria em âmbito nacional o início 
de uma classificação de periódicos pelo CAPES. As categorias 
classificatórias então vigentes eram: publicações nacionais, 
regionais e locais, sendo as primeiras classificadas entre A e C. 
Também nesse momento assume como diretor da Editora da 
Universidade o artista plástico Profº. Jorge Arbach, buscando 
estabelecer uma política para todas as revistas da Universidade, 
10
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.9-14 ,
nov. 2015/ fev. 2016
tais como critério comum de numeração e formatação, tanto 
em tamanho como no miolo. A equipe de arte da Editora, com 
ele à frente, passa a assumir as capas das revistas. Ao longo da 
nossa, gestão procurei preservar a formatação por ele proposta, 
pois oferecia ao leitor melhor arejamento do texto, tornando-o 
menos compacto e permitindo anotações em suas margens, tão 
importante ao bom leitor. Diga-se que, no âmbito interno da 
Faculdade, viveu-se um momento muito criativo, onde núcleos 
de pesquisa começam a proliferar. Foi também o tempo de 
criação na Faculdade da pós-graduação stricto senso. 
A nossa revista teria necessariamente que corresponder 
ao novo tempo. Aquela formulação explicitada no prefácio 
do v.3, n.2, de se pretender como veículo de publicação 
fundamentalmente de trabalhos internos ao corpo de professores 
da Casa, teria deser mudada. Atingir a classificação Nacional, 
segundo os critérios do CAPES, implicava precisamente em 
superar o caráter endôgeno da publicação. Optamos então 
por constituir revistas temáticas, cada qual ligada a um núcleo 
de pesquisa. Havia núcleos mais antigos existentes, outros 
estavam em processo de formação. O fato novo é que esses 
núcleos proliferavam, como se disse, inaugurando ali uma 
nova fase da própria Faculdade, agora também voltada para a 
pesquisa e a pós-graduação.
 Não foi sem resistências que essa transformação ocorreu. 
O fato é que tais núcleos se encarregariam de expressar na 
revista os trabalhos internos que ali se faziam, bem como dos 
contatos externos, de colaboradores do núcleo, solicitando 
deles artigos, critério fundamental para sair do localismo. Os 
núcleos se revessavam nessas tarefas organizatórias de cada 
número. Mais tarde, quando os núcleos tornaram-se grande 
demais para abrigar a diversidade de temas e questões de 
pesquisa que ali se alocaram, a organização da revista passou 
a ser feita por um ou dois professores ligados a um grupo de 
pesquisa, às vezes inclusive incorporando professores de fora, 
quiçá estrangeiros, colaboradores da pesquisa. A saída por 
nós encontrada para evitar a endogenia, tão repudiada pelas 
agências classificatórias e as de fomento, pareceu adequada, 
11
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 9-14,
nov. 2015/ fev. 2016
pois ao mesmo tempo que incorporava autores externos não 
perdia o foco na produção da Casa. 
Foi surpreendente conseguirmos obter, já no triênio 
seguinte, após a publicação dos três primeiros números da 
nova fase (um a cada semestre), a classificação de Nacional 
C. Sair de uma revista meramente local para outra de caráter 
Nacional, ainda que no menor nível (C), não foi pouca coisa. 
Aparentemente tarefa muito árdua para um corpo de editores 
executivos inicialmente de 3 membros, todos professores, 
e que um ano depois se reduziu apenas ao coordenador, 
com a secretaria formada por aluna bolsista. Foi o trabalho 
dos núcleos de pesquisa no encaminhamento dos números 
temáticos que tornou a tarefa bem mais palatável. Restou 
ao corpo editorial o fechamento da revista, com as revisões 
necessárias, bem como os encaminhamentos de impressão 
feitos com a colaboração de Editora da Universidade.
Com o tempo, a revista tornou-se mais conhecida e 
começaram a surgir demandas espontâneas que chamamos de 
“balcão”. Inevitavelmente a revista abriu-se a essa demanda, 
publicando a cada número dois a três artigos de balcão, 
passados pelos crivos dos critérios de seleção (aprovação de 
dois pareceristas). Ao longo da nossa gestão a revista foi sempre 
de demanda induzida, tornando-se porém crescentemente 
de demanda espontânea, como este número de agora, 
inteiramente composto segundo este critério.
Em classificações posteriores da CAPES, fomos, no triênio 
seguinte, mantidos na mesma qualificação. Já no seguinte, 
após recurso nosso, conseguimos a classificação Nacional B, 
demonstrando que cumprimos a exigência da colaboração 
internacional em todos os nossos números do triênio, conforme 
o exigido para a nova qualificação. Logo em seguida, no triênio 
que se seguiu, houve reformulação dos critérios classificatórios 
da CAPES, estabelecendo nos periódicos de nível Nacional 
as sub-categorias 1 e 2 para A; e 1 a 5, decrescente, para B. 
Obtivemos na reclassificação a categoria B 2, considerada 
então o limite mínimo para a melhor pontuação do professor 
no ranking das publicações. Em seguida, concorremos a edital 
da ANPED, voltado exclusivamente para publicações B 2. Os 
12
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.9-14 ,
nov. 2015/ fev. 2016
vencedores publicariam, com financiamento dessa entidade, 
trabalhos premiados por ela, com o compromisso da ANPED 
de se empenhar junto ao CAPES para uma redefinição 
ascendente na próxima classificação. Fomos uma das quatro 
revistas premiadas nacionalmente. E assim ascendemos para 
a qualificação B 1. Estávamos então no ano de 2012. Esta é a 
classificação que a nossa revista permanece.
Com o uso intensivo da internet, já na década passada, 
nos preocupamos em colocar a revista on-line, com acesso livre 
a todo conteúdo dos números a partir do primeiro semestre 
de 2002. Infelizmente os números anteriores, guardados 
em disquetes, se tornaram de difícil recuperação. Hoje o 
movimento, iniciado no final da nossa gestão, é o de colocar 
outro acesso on-line, não apenas o do site da revista acoplado 
ao da Faculdade. Agora também via sistema SEER.
Ao longo desses anos a revista teve aprovado inúmeros 
projetos para financiamento por agências de fomento como 
o CNPq, a FAPEMIG, a própria CAPES e a ANPED. O 
primeiro financiamento deu-se pelo CNPq, de três números, 
com contrapartida pela Casa de mais três. Isso ocorreu entre 
os anos de 2000 a 2003 (até v.7, Nº 2 – set./fev. 2002/2003). 
Seguiram-se mais três financiamentos da FAPEMIG entre 
os anos de 2008 e 2015. Em 2012, o tal financiamento 
premiação pela ANPED, que nos elevou a categoria B 1. 
Houve ainda dois números financiados pela CAPES, nos anos 
de 2012 e 2013. Enfim, durante a nossa gestão, ocorreram 
sete projetos financiados, num total de onze números da 
revista com financiamento público, sem contar os números 
de contrapartida e os números especiais vinculados a outros 
projetos com verba designada a publicação. De todos esses 
projetos, cinco foram por nós formulados. 
Outra dimensão importante do nosso empenho deu-se 
na preocupação com a indexação da revista. Trata-se de um 
campo de resultados demorados. A nossa primeira indexação 
deu-se na geodados (www.geodados.uem.br),. Seguiu-se as 
tradicionais indexações do ibict (http://ibict.br/comut/htm) e 
do Inep (www.inep.gov.br) , além naturalmente do Qualis da 
CAPES (Web Qualis: www.qualis.capes.gov.br). A primeira 
13
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 9-14,
nov. 2015/ fev. 2016
internacional conseguida foi a latindex (www.latindex.unam.
mx), do México. A nova gestão editorial corre atrás de outros 
tantos indexadores nacionais e internacionais. Para a área 
de periódicos de educação, o EDUCA, da Fundação Carlos 
Chagas, é fundamental. Esta indexação substitui o SCIELO 
na área da educação, já que este hoje em dia é de muito 
difícil acesso. Nos dois anos finais da nossa gestão, tomamos 
iniciativas para tal indexação, ainda não conseguida. 
Educação em Foco é órgão oficial da Faculdade de Educação 
e como tal por ela financiado. No entanto, durante a nossa gestão, 
poucos foram os números da revista financiados ou inteiramente 
financiados pela Faculdade. Além do financiamento dos projetos, 
assinale-se aqui que tivemos uma grande colaboração da Pro-
Reitoria de Pesquisa (PROPESQ), especialmente na gestão da 
Profª Marta D’Agosto, custeando diversos números.
Não poderia fechar a breve história da Revista Educação 
em Foco, durante a nossa gestão, sem fazer referência à dedicação 
da Profª Jane de Souza na secretaria da revista, a qual se 
vinculou desde o ano de 2004. Inicialmente como bolsista, e 
permanecendo nesta condição por muito tempo, até se tornar 
funcionária CLT da Casa, na segunda gestão da Profª Diva, ela 
não poupou esforços em sua dedicação. Já nos anos finais da 
nossa gestão, tornou-se Gerente Executiva, orientando bolsistas 
de treinamento profissional. Qualquer mérito que nos possa ser 
atribuído nessa longa gestão, divido-o com ela. 
Saúdo nossos leitores,
 Marlos Bessa Mendes da Rocha
 (Editor-Chefe da Revista Educação 
em Foco – 1996/2014)
15
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 15-36,
nov. 2015/ fev. 2016
Narrativas e Trajetórias 
de Formação: Um 
Diálogo entre Literatura 
e Memórias
NARRATIVAS E TRAJETÓRIAS DE 
FORMAÇÃO: UMDIÁLOGO ENTRE 
LITERATURA E MEMÓRIAS
Eda Maria de Oliveira Henriques1
Mônica Maria de Azevedo2
Resumo
O desprestígio crescente da profissão docente vem afetando 
um grande número de alunos que chegam às Licenciaturas 
com sérias dúvidas em relação à carreira docente. Diante 
deste quadro, desenvolveu-se uma pesquisa que procurou 
entender de que forma os alunos significam a sua trajetória 
de formação. Para conhecer tais trajetórias concebeu-se 
uma metodologia inspirada na proposta do memorial de 
formação de acordo com a concepção de Passeggi. Para 
deflagrar as narrativas utilizou-se o potencial discursivo e 
produtor de sentidos de crônicas da literatura brasileira, 
com as contribuições de Benjamin, Vygotsky e Iser. A partir 
da leitura da crônica, os alunos tornaram suas trajetórias um 
espaço de narrativa, análise e reflexão.
Palavras-chave: Trajetória de formação; Narrativas; 
Memória.
Abstract
The teaching profession's increasing discredit has affected 
a large number of the teaching course undergraduated 
students who have had serious doubts about the teaching 
profession. Facing this situation, a research was developed 
trying to understand how students have directed their 
trajectories towards graduation. To know such trajectories 
a methodology was designed based on written memories, 
1 Eda Maria de Oliveira Henriques – Universidade Federal Fluminense (UFF).
 E-mail: dahenriques@gmail.com
2 Mônica Maria de Azevedo – Universidade Federal Fluminense (UFF).
 E-mail: azevedo-monica@uol.com.br
16
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.15-36 ,
nov. 2015/ fev. 2016
Eda Maria de O. Henriques
Mônica Maria de Azevedo
related to professional formation processes according to 
Passeggi. To trigger the narrative it was used the discursive 
potencial and the different meanings from the Brazilian 
chronicle literature plus Benjamin, Vygotsky and Ise 
contributions.From the chronicle readings, students 
transform their trajetories into a space of narrative, analyses 
and reflection. 
Keywords: Trajectory; Formation; Narratives; Memory.
17
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 15-36,
nov. 2015/ fev. 2016
Narrativas e Trajetórias 
de Formação: Um 
Diálogo entre Literatura 
e Memórias
NARRATIVAS E TRAJETÓRIAS DE 
FORMAÇÃO: UM DIÁLOGO ENTRE 
LITERATURA E MEMÓRIAS.
 INTRODUÇÃO
Ao final do século XX, segundo Villa (1998), uma série 
de fatores heterogêneos torna problemática a situação em que 
se encontram os professores, desenhando um quadro negativo 
para o professorado atual que remete a aspectos como a 
diminuição do prestígio da profissão, um mal-estar indefinido 
que se associa a uma certa crise de identidade. Para o autor, 
tal mal estar pode ser atribuído ao fato de que a figura do 
professor vem sofrendo um enfraquecimento, uma diluição 
que ele atribui a três tendências que podem ser definidas 
como: a dessacralização da ciência e da cultura, o surgimento 
de novas tecnologias e o enfraquecimento dos papéis sociais 
tradicionais. Independente do peso que cada um destes 
aspectos possa ter no enfraquecimento do prestígio e da crise 
de identidade do professor, o que se constata é que a profissão 
parece ser cada vez menos atrativa para os jovens e no que se 
refere a este trabalho, paradoxalmente, para os próprios jovens 
licenciandos, uma vez que a opção por este tipo de formação é 
fruto de sua própria escolha.
Nesta direção, se observa que um número crescente de 
alunos que chega às Licenciaturas já vem com a certeza de 
que não irão seguir a carreira docente, ou então segui-la como 
última opção, com dificuldades de articular motivos para uma 
ou outra possibilidade. Assim, este trabalho apresenta o relato 
parcial de uma pesquisa realizada junto a turmas de licenciatura 
da Universidade Federal Fluminense, que procurou entender 
de que forma os alunos significam sua trajetória de formação e 
como articulam suas escolhas. 
18
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.15-36 ,
nov. 2015/ fev. 2016
Eda Maria de O. Henriques
Mônica Maria de Azevedo Para conhecer tais trajetórias concebeu-se uma 
metodologia inspirada na proposta do memorial de formação 
de acordo com Passegi (2008), procurando organizar fatos 
relacionados a atividades de formação, pondo em foco 
experiências e expectativas em relação a estas trajetórias. 
A autora situa o memorial como um gênero acadêmico 
autobiográfico que propicia ao profissional “tecer uma figura 
pública de si”, registrando recortes sobre processos de formação 
intelectual e trajetória profissional no magistério, formação 
inicial e continuada, incluindo relatos sobre a vida familiar e 
escolar e o define como:
Um gênero acadêmico autobiográfico, 
por meio do qual o autor se (auto) avalia 
e tece reflexões críticas sobre seu percurso 
intelectual e profissional, em função de 
uma demanda institucional. O interesse 
de sua narrativa é clarificar experiências 
significativas para a sua formação e 
situar seus projetos atuais e futuros no 
processo de inserção acadêmica e ascensão 
profissional. Por se tratar de um documento 
institucional, o memorial autobiográfico 
caracteriza-se como uma escrita semipública 
de si, podendo, ou não, ser objeto de defesa 
pública. (Passegi, 2008, p.120). 
Partindo então do termo memorial autobiográfico 
como uma designação genérica do espectro das escritas de si, 
Passegi (2008) se propõe a distinguir dois tipos de memorial: 
o memorial acadêmico e o memorial de formação. O primeiro 
se refere aos que são elaborados por professores e pesquisadores 
em concurso público, ingresso ou ascensão funcional na 
carreira docente ou outras funções no âmbito de instituições 
do ensino superior. O segundo designa memoriais escritos ao 
longo do processo de formação inicial ou continuada para fins 
de trabalho de conclusão de curso no ensino superior.
Embora a pesquisa apresentada neste trabalho, não 
lance mão de memoriais produzidos em nenhuma das duas 
19
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 15-36,
nov. 2015/ fev. 2016
Narrativas e Trajetórias 
de Formação: Um 
Diálogo entre Literatura 
e Memórias
circunstâncias acima, aposta no potencial das escritas de si, no 
que se referem à possibilidade de acompanhar o outro, no caso 
o aluno das Licenciaturas, em sua reflexão sobre o modo e as 
formas nas quais ele dá sentido às suas escolhas em sua trajetória 
de formação. Concordando com Passegi (2008), trata-se de 
permitir que este aluno possa tecer e entretecer os fios que 
relacionam fatos entre si explicando os efeitos e os reflexos 
dos mesmos nos direcionamentos e encaminhamentos da sua 
formação profissional. E não menos importante, viabilizar um 
olhar que priorize o processo e não o produto criando um 
espaço de reflexividade sobre sua história como processo de 
formação. 
Um outro aspecto importante a ser assinalado é que, 
embora esta pesquisa tenha acontecido em um contexto 
institucional, não apresentou as mesmas injunções 
institucionais presentes nos memoriais acadêmicos e de 
formação, que remetem ao fato dos mesmos se darem muitas 
vezes em situações de avaliação explícita. O que não isenta que 
as narrativas dos alunos das licenciaturas, ao serem solicitados 
a escrever sobre suas trajetórias de formação, corram o risco de 
uma avaliação implícita ou de uma autocensura, decorrentes 
de padrões e estruturas de uma escrita que se dá em um 
contexto acadêmico no qual prepondera como uma de suas 
características marcantes a valorização da resposta certa ou, no 
mínimo, a resposta esperada a partir de determinados cânones 
do discurso deste contexto. 
Nesta perspectiva, pensou-se em uma metodologia que, 
ao recorrer ao potencial simbólico dos diversos textos literários, 
procura viabilizar e mediar narrativas que pudessem contornar 
a questão das respostas prontas e estereotipadastão comuns 
nas entrevistas tradicionais promovendo novas possibilidades 
de leitura da experiência de formação. Tais experiências 
muitas vezes são responsáveis pela constituição de concepções 
e modelos de ensino que perpetuam as mais tradicionais 
crenças sobre a escola e os processos em torno do ensinar e 
aprender. Assim, entendemos que as diversas experiências e 
20
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.15-36 ,
nov. 2015/ fev. 2016
Eda Maria de O. Henriques
Mônica Maria de Azevedo práticas de formação podem instituir formas de relação com o 
conhecimento, atribuindo-lhe os mais variados sentidos, que 
através de seus registros simbólico e imaginário podem ser 
transmitidos e conservados sem nenhum tipo de formalização 
sem perder sua força produtiva de valores e subjetividades.
Desta forma, para propiciar esta compreensão e uma (re) 
leitura de sentidos sobre experiências e trajetórias no âmbito da 
formação do professor, pensou-se em uma metodologia onde a 
leitura de contos e crônicas da literatura brasileira e universal, 
que poderiam versar ou não sobre o universo da escola, se 
constituíssem em um poderoso mediador de narrativas sobre 
as experiências nas trajetórias de formação. Nessa direção, a 
crônica é compreendida na perspectiva da narrativa a partir 
de Benjamin (2012) e a leitura compreendida como uma 
experiência subjetiva, que se alimenta de impressão artística 
imediata, denominada por Vygotsky (1999) de “crítica de 
leitor”. Tal concepção de crítica literária, segundo Bezerra 
(1999), antecipa em algumas décadas, a crítica da recepção 
e a discussão sobre o papel do leitor no jogo com autor e o 
texto questão que, neste trabalho, será ampliada por Iser. 
Tal abordagem favorece o que para Passegi (2008) é a atual 
configuração do memorial, ou seja, uma tentativa de subjetivar 
o discurso objetivo ou objetivar a escrita subjetiva. 
BENJAMIN E VYGOTSKY: UM BREVE DIÁLOGO.
Ao buscarmos o conceito de narrativa no dicionário 
Aurélio nos deparamos com os termos narração, história 
ou conto. Etimologicamente, a palavra narrativa deriva do 
vocábulo latim narrare que quer dizer ato de contar, relatar 
ou expor uma história ou fato. No entanto, para Benjamin 
(2012), o conceito de narrativa está permeado por muitos 
outros sentidos/significados que vão além da ação de relatar 
ou contar uma história ou fato. Este conceito carrega em si 
um significado histórico e social apresentado e discutido em 
seu ensaio “O Narrador”. No prefácio das Obras Escolhidas I. 
Magia e Técnica, Arte e Política, Gagnebin (2012) aponta que 
21
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 15-36,
nov. 2015/ fev. 2016
Narrativas e Trajetórias 
de Formação: Um 
Diálogo entre Literatura 
e Memórias
Benjamin discute formas distintas de narrativas tais como a 
utilizada na historiografia progressista que trata da ideia de um 
progresso inevitável e cientificamente previsível e a utilizada 
na historiografia burguesa que diz respeito ao historicismo, 
“oriundo da grande tradição acadêmica” e que “pretendia 
reviver o passado através de uma espécie de identificação 
afetiva do historiador com seu objeto”, ambas se apoiando 
numa concepção de tempo cronológico e linear, homogêneo e 
vazio. Seguindo o pensamento de Benjamin, a autora mostra 
que o historiador materialista deveria então criar um novo 
conceito de tempo, o tempo de agora, que implicaria na 
constituição de uma experiência com o passado sobre a qual a 
obra de Benjamin irá desenvolver.
Dessa forma, Benjamin (2012) em seu texto “O 
Narrador”, ao destacar a experiência como fonte da narrativa, 
resgata sua importância e ligação com uma tradição viva e 
coletiva, onde a arte do narrador é a arte de contar preservando 
aos acontecimentos sua força secreta, sem encerrá-los em uma 
única versão. Ao mesmo tempo, segundo Gagnebin (2012), 
o autor observa que a arte de narrar se torna cada vez mais 
rara porque se baseia, sobretudo, em uma transmissão de 
experiência cujas condições de expressão plena já não existem 
na sociedade capitalista moderna. Experiências que seriam 
comuns ao narrador e ao ouvinte e que segundo Gagnebin 
(2012), possibilitariam a inserção de ambos dentro de um 
fluxo narrativo comum onde a história permaneceria aberta 
a novas propostas e a novas continuidades. Este conceito de 
experiência permitiria a escrita de uma anti-história, porque ao 
invés de encerrar o passado em uma interpretação definitiva, 
reafirma a abertura de seu sentido, de seu caráter inacabado. 
Assim, como nos diz Benjamin (2012), o extraordinário e 
o miraculoso são narrados com grande exatidão, sem que o 
contexto psicológico da ação seja imposto ao ouvinte, que é livre 
para interpretar a história como quiser, o que de acordo com 
Gagnebin (2012), se constituiria em uma teoria antecipada da 
obra aberta. Assim, o cronista se torna o narrador da história, 
22
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.15-36 ,
nov. 2015/ fev. 2016
Eda Maria de O. Henriques
Mônica Maria de Azevedo que não se preocupa com a exatidão dos fatos, mas com a sua 
inserção no fluxo de outras histórias, tecendo uma rede de 
histórias que se articulam e se constituem entre si, preservando 
suas forças e seu potencial inesgotável de significação. Essa 
ideia de não acabamento essencial vai estar presente também, 
como nos mostra a autora, em alguns ensaios literários de 
Benjamin, como por exemplo, no ensaio sobre a obra “Em 
Busca do Tempo Perdido”, de Proust, intitulado “A Imagem 
de Proust”. Neste ensaio, entre outras coisas, o autor tece 
uma interessante relação entre experiência, memória, passado 
e presente, mostrando que a genialidade de Proust está 
justamente no fato de transformar uma experiência particular 
e privada de uma existência individual burguesa em uma busca 
universal, através da lembrança, pois para Benjamin (2012, 
p.37) “...o acontecimento lembrado é sem limites, porque 
é apenas uma chave para tudo que veio antes e depois”. O 
que retrata, de acordo com Gagnebin (2012), que Proust não 
estava em busca do passado em si, mas da presença do passado 
no presente e do presente que já se encontrava anunciado no 
passado. Nesta perspectiva, a lembrança poderia subtrair os 
acontecimentos das contingências do tempo, mostrando as 
semelhanças e analogias entre passado e presente inscritos 
nas linhas do atual. Assim, compreender contos e crônicas 
da literatura numa perspectiva de obra aberta e como veículo 
de narrativas pode também trazer a possibilidade de novas 
conexões que atualizam o passado e redimensionam o olhar 
do presente sobre as experiências de formação, viabilizando 
novas construções de sentido sobre as mesmas. É dentro desse 
espírito, que o jovem Vygotsky (1999) vai, em um trabalho 
de conclusão de curso escrito em 1915, tratar da relação do 
crítico com o autor e sua obra em “A Tragédia de Hamlet, 
Príncipe da Dinamarca” no qual faz uma crítica desta obra 
de Shakespeare a partir do que ele denomina “crítica de 
leitor”, onde defende a ideia de que a obra de arte após sua 
criação separa-se de seu autor e é recriada pelo leitor a partir 
da multiplicidade polissêmica de toda obra, adiantando em 
23
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 15-36,
nov. 2015/ fev. 2016
Narrativas e Trajetórias 
de Formação: Um 
Diálogo entre Literatura 
e Memórias
algumas décadas a crítica da recepção. Nesta perspectiva, a 
obra é apenas uma possibilidade que o autor realiza, podendo 
o mesmo inclusive desconhecer a sua profundidade, e levar o 
crítico a revelações que ele como autor nem sequer suspeitava. 
Isto faz com que a força da obra não esteja naquilo que o 
autor subentendeu por ela, mas na maneira como age sobre 
o leitor. Desse modo, a leitura não está presa a um modelo 
semântico fechado, mas se abre sempre e infinitamente para 
a diversidade e universosde onde o leitor a enfoca. Universos 
que podem conter experiências de vida, experiências de leitura, 
experiências em torno do ensinar e do aprender. Assim, é o 
texto que se oferece com seu potencial simbólico na construção 
de outras narrativas, para a superação da “angústia da palavra” 
(Vygotsky, 1999), do inexprimível de alguns sentidos, do 
indizível do discurso interior. Neste trabalho, o autor antecipa 
sua futura discussão sobre a relação pensamento-linguagem, 
onde se destaca a questão da complexidade da passagem do 
pensamento à palavra, que nesta perspectiva não se trata de 
uma tradução direta da linguagem interior para a linguagem 
exterior, nem de uma simples incorporação do aspecto sonoro 
ao aspecto silencioso da fala, ou seja, não é apenas a vocalização 
da linguagem interior, mas:
... a reestruturação da linguagem, a 
transformação de uma sintaxe absolutamente 
original, da estrutura semântica e sonora 
da linguagem interior em outras formas 
estruturais inerentes à linguagem exterior” 
(Vygotsky, 2001, p. 474).
Dessa forma, a passagem da linguagem interior para a 
exterior consiste em uma transformação dinâmica, ou seja, na 
transformação de uma linguagem predicativa e idiomática em 
uma linguagem sintaticamente decomposta e acessível a todos. 
Assim, o pensamento é sempre algo integral, compacto, maior 
em sua extensão e volume do que uma palavra isolada. O 
que no pensamento existe em simultaneidade, na linguagem 
se desenvolve sucessivamente. Para Vygotsky (2001), a 
24
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.15-36 ,
nov. 2015/ fev. 2016
Eda Maria de O. Henriques
Mônica Maria de Azevedo complexidade da decomposição do pensamento e sua recriação 
em palavras se devem ao fato de que o pensamento não 
coincide com as palavras e com os significados das palavras, 
o que faz com que a transição do pensamento à palavra passe 
pelo significado e que em nosso pensamento sempre exista 
um subtexto oculto. Nesse sentido, há uma imperfeição da 
palavra na possibilidade de expressar o pensamento, pois o 
pensamento nunca é igual ao significado direto das palavras. O 
que leva o autor a afirmar que o caminho entre o pensamento 
e a palavra é um caminho indireto, internamente mediatizado 
pelo significado. Tal constatação tem como consequência o 
fato de que a comunicação imediata entre as consciências 
seja impossível psicologicamente, só podendo ser atingida 
via mediata, pelo significado das palavras. Ao que o autor 
acrescenta que para entendermos o discurso do outro não 
é necessário entendermos apenas algumas palavras, mas é 
preciso entender também seu pensamento e principalmente o 
motivo que o levou a emiti-lo. Assim, a compreensão efetiva e 
plena do pensamento de outrem só se torna possível quando 
descobrimos o que Vygotsky (2001) denomina de “causa 
profunda afetivo-volitiva”, que encerra o desejo que está na 
origem de todo o pensamento. Dessa forma, a crítica de leitor 
oferece a possibilidade de superar o indizível, o inexprimível 
do discurso interior que Vygotsky (1999) metaforicamente 
remete a tirar sons de um instrumento rebelde enquanto ouve 
com o “ouvido da alma” uma melodia potente e triste. Assim o 
criar com a própria alma a obra alheia, significa compromisso 
apenas com a sua interpretação, sem a preocupação a respeito 
de outros estudos sobre a obra. A possibilidade de transformar 
a experiência da leitura no que Vygotsky denominou de 
crítica estética promovendo o crítico a crítico artista, crítico 
criador, traz não só novas possibilidades de significação 
através do potencial simbólico do texto, como também 
novas possibilidades de ressignificação dos sentidos em torno 
das experiências do ensinar e do aprender. Tais experiências 
geralmente se apresentam marcadas por práticas educativas 
25
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 15-36,
nov. 2015/ fev. 2016
Narrativas e Trajetórias 
de Formação: Um 
Diálogo entre Literatura 
e Memórias
escolarizadas, que por suas próprias características, muitas vezes 
não viabilizam uma maior comunicação entre pensamentos de 
professores e alunos e dos próprios alunos entre si, através da 
compreensão dos desejos e necessidades, interesses e emoções, 
que estão na base do significado das palavras. Esta abordagem 
viabiliza ao professor conhecer não só o conteúdo objetivo 
da experiência do aluno, mas também o sentido da mesma e 
os atos de pensamento que os apreendem. Nesta perspectiva, 
entendendo que o texto literário pode vir a tornar-se veículo 
de revelação e ressignificação de experiências e concepções que 
nem sempre encontram espaço de expressão na sala de aula é 
que se acredita que deixar falar a obra pelo leitor é também 
deixar o leitor se falar pela obra. Assim a leitura do texto 
instaura um jogo entre autor e leitor, que Iser vai ampliar em 
sua discussão. 
ISER: O JOGO DO TEXTO
Para Iser (2002), um dos principais representantes da 
corrente literária Estética da Recepção, a ideia de que autor, 
texto e leitor estão intimamente conectados em uma relação 
que produz algo que antes não existia, se contrapõe à noção 
tradicional de representação, relacionada a uma realidade pré-
dada que se pressupõe estar representada. Assim, a idéia de 
jogo do texto pretende privilegiar o aspecto performativo da 
relação autor-texto-leitor, onde o pré-dado não é concebido 
como objeto de representação, mas como a relação através da 
qual algo novo é modelado. 
Nessa perspectiva, autores jogam com os leitores e o texto 
é o campo do jogo (Iser, 2002, p. 107) e nesse jogo, o texto é 
composto por um mundo que desafia o leitor a imaginá-lo e a 
interpretá-lo levando o mesmo a visualizar as múltiplas formas 
possíveis de imaginar o mundo do texto, que nesse sentido, 
começa a sofrer modificações. 
De acordo com o autor, não importam as novas formas 
que o leitor produz, todas transgridem e modificam o mundo 
contido no texto. O aspecto ficcional do texto invoca então, 
26
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.15-36 ,
nov. 2015/ fev. 2016
Eda Maria de O. Henriques
Mônica Maria de Azevedo um contrato entre autor e leitor onde o mundo textual 
deve ser concebido, não como realidade, “mas como se fosse 
realidade” (p. 107), isto é, embora possa repetir uma realidade 
identificável, o que acontece dentro dele não acarreta as 
conseqüências relativas ao mundo real referido. Essa dimensão 
assinala a esfera ficcional em que tudo deve ser considerado 
como se fosse o que parece ser, ou seja, como um jogo.
Dessa forma, o jogo que se encena no texto não é um 
espetáculo que o leitor apenas observa, mas um evento em 
processo que demanda sua participação nos procedimentos e 
na encenação, e ao realizar o jogo do texto a seu modo, o leitor 
produz um –“suplemento”- individual, que considera como o 
significado do texto. 
O significado do texto torna-se uma espécie de 
-“suplemento”- que é gerado por meio do jogo, como algo que 
se adiciona ao texto, não havendo, portanto, significado prévio 
ao jogo. De acordo com o autor, a produção do -“suplemento”- 
por meio jogo, compreende diferentes desempenhos por 
diferentes leitores no ato da recepção, que incluem desde o 
alcance da -“vitória”- com o estabelecimento do significado, 
ou com a manutenção do jogo livre, com a conservação em 
aberto do significado. 
A unicidade do jogo estaria, então, no fato de que ele 
produz (suplementos) e, ao mesmo tempo permite que o 
processo de produção seja observado, o que leva o leitor a 
uma duplicidade inexorável, isto é, participa de uma ilusão 
sabendo que é uma ilusão. Será, então, nessa oscilação entre 
ilusão fechada e ilusão revelada que a transformação efetivada 
pelo jogo do texto se faz sentir pelo leitor.
A PESQUISA: REVELANDO ALGUMAS NARRATIVAS E 
SIGNIFICADOS
A partir destas concepções de narrativa e de leitura, 
pensou-seem uma metodologia que privilegiasse o potencial 
simbólico dos textos literários na mediação de narrativas de 
27
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 15-36,
nov. 2015/ fev. 2016
Narrativas e Trajetórias 
de Formação: Um 
Diálogo entre Literatura 
e Memórias
alunos de Licenciaturas sobre suas experiências e expectativas 
em relação à sua trajetória de formação. A pesquisa foi realizada 
no primeiro semestre de 2014, na Universidade Federal 
Fluminense, com alunos de turmas de Licenciaturas (Letras, 
História, Geografia, Ciências Sociais, Matemática, Filosofia) 
num total de cem alunos aproximadamente.
Como procedimento de pesquisa e coleta de dados, 
os alunos foram convidados a fazer uma leitura da crônica 
“Escola e sofrimento”, de Rubem Alves e a redigir um pequeno 
texto onde as impressões suscitadas por esta leitura fossem 
relacionadas com fatos e aspectos das experiências do contexto 
escolar que pudessem remeter a reflexões sobre tal contexto 
e às trajetórias de formação do futuro docente. A análise das 
narrativas resultantes da leitura e discussão da crônica acima 
citada foi realizada através da análise de conteúdo de Bardin 
(2011) através da unidade de significação ou unidade de 
registro temático, onde o “tema” se constitui na unidade de 
base que promove a busca de núcleos de sentido que compõem 
a comunicação. 
Na crônica em referência, o autor mostra sua 
preocupação pelo fato de que a grande maioria das crianças 
vai para a escola ansiosa e amedrontada, comportamento este 
que não condiz com o perfil das crianças que são ensinadas 
a serem felizes. Aborda também que a escola não está 
interessada na felicidade dos alunos por exigir o aprendizado 
de uma quantidade enorme de conhecimentos, mas não 
fazer nenhuma relação desses conhecimentos com a vida dos 
alunos. Fala do comportamento dos professores que causam a 
impressão de que seus alunos são seus inimigos e que acabam 
por intimidar a inteligência dos alunos. Enfim, fala de uma 
escola que, ao invés de felicidade, causa sofrimento aos alunos 
por ter se esquecido do seu papel de despertar o potencial 
único presente em cada aluno.
A seguir, apresentaremos algumas narrativas suscitadas 
pela leitura da crônica onde procuraremos observar e analisar 
28
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.15-36 ,
nov. 2015/ fev. 2016
Eda Maria de O. Henriques
Mônica Maria de Azevedo como os alunos significam fatos, escolhas e expectativas 
relacionados à sua trajetória de formação.
Aluno A – “A partir da leitura do texto 
Escola e Sofrimento de Rubem Alves, tive 
a possibilidade de lembrar meu período 
escolar, que hoje me traz magníficas 
lembranças e enormes saudades. Tive em 
meu processo de formação, momentos que 
são bem destacados no texto em questão, 
onde a pressão e a ideia de obrigação 
atormentavam os alunos diariamente. 
As aulas eram na sua maioria um tanto 
monótonas e cansativas, segundo o modelo 
de ensino padrão utilizado pela sociedade. 
Eram matérias com conteúdo absurdamente 
grande e, por vezes, complexos, ensinados 
de modo acelerado, com o intuito de passar 
o máximo de conhecimento em um curto 
espaço de tempo e para que o cronograma 
escolar fosse obedecido e concluído. Eram 
nos momentos de intervalo e descanso que 
eu mais me divertia e me alegrava. A mente 
relaxava, o corpo acelerava e o sorriso abria, 
tendo em minhas amizades um mantra para 
a felicidade. Contudo destaques podem ser 
feitos, já que nem todas as aulas serviam 
como forma de alienação. Ótimos professores 
passaram por minha vida, contribuindo cada 
um com seus ensinamentos e vivências tão 
importantes para a minha formação como 
aluna. Eram educadores que amavam o que 
faziam e passavam a todo momento o quanto 
eram felizes por exercer aquela profissão, 
servindo de influência para o meu futuro”.
Aluno B – “Entrando em retrospectiva, é 
inevitável que me deixe ser levado a memórias 
que remetem à minha formação durante o 
ensino médio, período tão importante na 
minha vida e que definiu, pouco a pouco, 
as escolhas que faria no futuro. Durante 
toda a vida fui seduzido pelo raciocínio 
lógico e analítico, tão presente nas ciências 
29
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 15-36,
nov. 2015/ fev. 2016
Narrativas e Trajetórias 
de Formação: Um 
Diálogo entre Literatura 
e Memórias
exatas, o que culminou na minha escolha 
profissional. Hoje como aluno e professor 
de matemática, concluo que a minha 
formação básica como um todo não foi o 
fator exclusivo que norteou essa sequência 
de eventos. O fator marcante foi a inspiração 
que o meu professor me passou durante 
todo o ensino médio. Seu nome é Juarez dos 
Santos, protagonista dessa história. Tudo no 
trabalho do professor Juarez era metódico, 
mas não escondia sua paixão pela docência, 
tampouco pela disciplina. Enquanto era 
rígido com as turmas mais novas, passava 
serenidade as turmas mais velhas uma vez 
que estas já o respeitavam imensamente 
e não questionavam a sua pedagogia. Era 
conhecido de todo o colégio, dos pais aos 
alunos, até mesmo de outras instituições. 
Não se gabava porém de sua notoriedade, 
pelo contrário, refletia humildade por 
onde passava. Me senti totalmente imerso 
e apaixonado pela matemática, graças ao 
grande mestre Juarez. A paixão pela docência 
também é seu mérito, uma vez que hoje uma 
das maiores certezas que eu tenho é a de que 
o professor pode moldar futuros brilhantes. 
Espero seguir os passos de meu querido 
mestre e buscar resultados semelhantes aos 
dele”.
Aluno C – “Baseado na minha vida 
acadêmica, lembro de terem sido os piores 
anos da minha vida, “taxada” de mais burra 
da turma por ter grandes dificuldades com 
as matérias de ciências exatas, também tive 
dificuldade de me relacionar com os colegas 
de turma. Sendo assim eu tive sempre 
poucos amigos na escola e na faculdade não 
mudou muita coisa. Quando cheguei no 
ensino médio um professor despertou em 
mim um imenso carinho pela literatura, 
então passei a me dedicar mais a tal matéria, 
deixando de lado o apelido adquirido no 
30
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.15-36 ,
nov. 2015/ fev. 2016
Eda Maria de O. Henriques
Mônica Maria de Azevedo
ensino fundamental. Deixei de ser “a burra” 
e me tornei viciada em leitura. Aos 17 anos 
estava no último ano do ensino médio, louca 
para me ver livre da escola, porém com o 
sonho de ser professora. Meio contraditório 
querer voltar para um local onde durante 
anos me fazia sentir como se fosse o pior 
ser humano da face da terra. Mas minha 
vontade vai além do que sofri. Meu desejo é 
voltar as salas de aula e mostrar que ninguém 
é melhor do que ninguém. Cada um é bom 
a sua maneira, cada um vai se sair melhor em 
alguma matéria, porém achará o seu lugar. 
Não serei uma professora que agrega rótulos 
aos alunos, quero ser a base que faça o 
imaginário dele voar. Assim como eu queria 
ter tido. Eu quero e vou ensinar a felicidade”.
Aluno D – “Acredito que quando entramos 
no ginásio a escola, ou talvez o sistema de 
educação, passa a nos ver como pré-adultos. 
De uma hora para a outra (ou melhor de 
um ano para outro) perdemos os motivos 
mais felizes de estar na escola: nos tiram a 
hora da soneca, nos tiram a possibilidade de 
dialogarmos com nossos amigos durante as 
aulas, até mesmo se quisermos comentar o 
próprio assunto da aula. Nos dizem também 
que agora o esquema vai mudar e colocam 
uma professora que não podemos mais 
chamar de “tia” em cima de um tablado, 
tudo isso assim junto e de uma só vez. E 
então temos que passar a encarar a escola 
como um lugar sério (pois é o que nos 
dizem) e não podemos falar, levantar, é como 
se a sala de aula fosse um lugar de regime 
militar. E para piorar tudo, as escolas estão 
cada vez mais cedo preparando os alunos 
para o vestibular.Então a sala de aula não 
é um lugar de aprender, mas sim um lugar 
de aprender a passar em uma prova que 
irá decidir toda a nossa vida. Dessa forma, 
fica difícil para o aluno conseguir aprender. 
31
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 15-36,
nov. 2015/ fev. 2016
Narrativas e Trajetórias 
de Formação: Um 
Diálogo entre Literatura 
e Memórias
A gente tem a tendência a gostar daquilo 
que a gente entende e com o sistema de 
ensino atual, está difícil gostar de qualquer 
coisa. Me parece que não temos hoje a 
chance de realmente saber se gostaríamos 
de determinadas matérias, pois elas nos são 
ensinadas de uma maneira tão quadrada, que 
nos tornam gaveteiros do conhecimento, 
e então quando nos deparamos com um 
professor diferente, nos agarramos a ele e a 
matéria que ele ensina e passamos a adorá-la 
e queremos seguir aquela área. Mas será que 
se tivéssemos mais professores assim, não 
teríamos uma chance mais justa de aprender 
nossas matérias e escolher nossas carreiras?“
Aluno E – “Lembro-me de que era uma 
tortura ir à escola das primeiras vezes, 
não conhecia ninguém e nem entendia 
porque tinha que sair de casa, deixar de 
conversar e brincar com meus amigos, para 
ir a um outro lugar fazer tarefas com outras 
crianças até então desconhecidas. As coisas 
começaram a mudar quando me familiarizei 
com o ambiente e as pessoas ao meu redor. 
Tornou-se divertido ir à escola. Como no 
ensino fundamental não tinham muitas 
obrigações, o dia no colégio se resumia em 
conversas descontraídas e brincadeiras. No 
final desse período (acredito que sétima ou 
oitava série) tive a oportunidade de conviver, 
e de admirar muito, dois professores: o 
de matemática, um cara simples, genial e 
sincero que é meu amigo até hoje, e a de 
ciências, uma professora muito divertida 
que me mostrou como essa disciplina está 
relacionada a tudo e quão surpreendente 
ela poderia ser. Chegando ao ensino médio 
compreendi que a escola era também lugar 
de aceitação, que os outros te observam, 
te julgam e que ser nova e estar longe dos 
seus amigos é angustiante. Nessa fase, a 
escola tomou outro significado, tornou-se 
32
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.15-36 ,
nov. 2015/ fev. 2016
Eda Maria de O. Henriques
Mônica Maria de Azevedo
objeto de pressão e delineadora do futuro. 
Percebi que o estudar era seletivo, que o 
mundo pede pessoas aplicadas e, assim, o 
aprender deixou de ser tão gostoso para 
tornar-se algo obrigatório. Ao final, tinha de 
escolher o que iria fazer depois do colégio, 
e acabei de decidir pela química que era a 
matéria que mais gostava e tinha facilidade. 
Não fui influenciada por ninguém, e essa 
minha escolha ainda está muito confusa. A 
faculdade nos traz uma carga muito pesada 
de conhecimento. Meu estudo é sempre 
pressionado, quase não me sobra tempo 
para visualizar as coisas que aprendemos na 
teoria. Com isso não consigo saber se estou 
no caminho certo, se isso vai me fazer feliz. 
Não vejo os meus próximos passos. Não 
tenho em mente o que esperar para mim. E 
o estudar, parece-me pouco lógico e útil sem 
a experiência de vida, que é o que me falta 
tempo para obter”. 
Nestas narrativas, alunos de licenciatura de vários cursos 
trazem relatos que identificam, o ambiente escolar como 
“monótono”, “cansativo”, “piores anos de minha vida”, “lugar 
de regime militar”, trazendo alguns dramas pessoais vividos 
nesse contexto, geralmente, relacionados a não aceitação ou a 
algum tipo de discriminação como o vivido pela aluna que foi 
vista como a “mais burra da turma por ter grandes dificuldades 
com as matérias de ciências exatas”. As poucas menções ao 
ambiente escolar caracterizado como “divertido”, parecem 
estar relacionadas aos primeiros anos do ensino fundamental 
e a educação infantil, onde “não haviam muitas obrigações” e o 
dia na escola se resumia a “conversas distraídas e brincadeiras”. 
Assim, de modo geral, esses alunos identificam a entrada no 
“ginásio” (atualmente anos finais do ensino fundamental), 
com a “perda dos motivos mais felizes de estar na escola” e assim, 
a escola vai se tornando cada vez mais cedo uma preparação 
para o vestibular ou “um lugar de aprender a passar em uma 
prova que irá decidir toda a nossa vida” o que é agravado 
33
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 15-36,
nov. 2015/ fev. 2016
Narrativas e Trajetórias 
de Formação: Um 
Diálogo entre Literatura 
e Memórias
com a entrada no ensino médio, tornando-se então “objeto 
de pressão e delineadora do futuro”, processo acompanhado 
de muitas angústias e incertezas, acentuadas pelo fato de 
que “com o sistema de ensino atual, está difícil de gostar de 
qualquer coisa”. Nesse contexto, em vários relatos surge como 
“fator marcante”, “inspiração”, um professor “diferente” que 
faz com que “nos agarremos a ele e a matéria que ele ensina 
e passamos a adorá-la e queremos seguir aquela área”. Vários 
relatos apontam professores como “fator marcante” e mesmo 
como “protagonista desta história”, tal a importância que os 
mesmos parecem ter nos direcionamentos destas trajetórias de 
formação. Em uma das narrativas um aluno chega a colocar 
que “será que se tivéssemos mais professores assim, não teríamos 
uma chance mais justa de aprender nossas matérias e escolher 
nossas carreiras?”. Escolhas que se dão de outra forma também 
trazem um nível de angústia e incerteza como a do aluno que 
escolheu o curso que ia seguir pela “matéria que mais gostava 
e que tinha facilidade” porém, reafirma que “não consigo saber 
se estou no caminho certo e se isso vai me fazer feliz”. Enfim, 
nestas narrativas a forma como os alunos de licenciatura 
significam alguns fatos e experiências em sua trajetória de 
formação apontam o contexto escolar como um cenário de 
boas e más lembranças, sendo que estas últimas muitas vezes, 
coincidem com os últimos anos do ensino fundamental e 
o ingresso no ensino médio, período em que, segundo os 
mesmos, inicia a maior pressão para as escolhas profissionais 
e para o vestibular. Assim, de um modo geral, apontam 
o ambiente escolar e as situações formais e não formais de 
aprendizagem proporcionadas por ele, como um contexto de 
cobranças e exigências quanto a escolhas e definições relativas 
ao encaminhamento de sua vida profissional, mas sem oferecer 
o suporte necessário para que isso aconteça.
34
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.15-36 ,
nov. 2015/ fev. 2016
Eda Maria de O. Henriques
Mônica Maria de Azevedo
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como considerações finais e provisórias, torna-se 
importante destacar, a inspiração proporcionada pelo memorial 
de formação, tal como entendido por Passegi (2008), com 
o seu potencial de deflagrar uma escrita de si organizando 
fatos relacionados a propostas de formação e pondo em foco 
experiências e expectativas em relação a esta trajetória. Nesta 
mesma direção, foi interessante observar que a leitura da 
crônica como experiência, abriu a possibilidade da inserção de 
uma história no fluxo de outras histórias, que se articulam e se 
constituem entre si, preservando seu potencial inesgotável de 
significação e de expressão de subjetividade deixando, como diz 
Benjamin (2012), “a marca do oleiro na argila do vaso”. Assim, 
a narrativa do autor, se entrelaça com as experiências, memórias 
e concepções do leitor, nos revelando nestas narrativas, alguns 
sentidos construídos em torno de experiências de um passado/
presente escolar que se tornam presentes no fio condutor do 
relato da crônica. Neste sentido, a mediação da crônica nesta 
pesquisa, ofereceu o texto e o seu potencial simbólico para 
que os alunos das Licenciaturas expressassem suas lembranças, 
ideias e concepções sobre a escola, mas como também mostra 
Yunes (2003), a possibilidade de ressituá-los em relação à 
experiência que está sendo contada, numadupla oportunidade, 
a de se conectar com suas lembranças, suas formas de pensar e 
a de repensar sobre as mesmas. Isto porque, embora os alunos 
das licenciaturas sejam universitários e possuírem, portanto, 
vários anos de escolaridade, de um modo geral, não fazem 
das memórias de suas experiências neste contexto, objeto de 
reflexão. As narrativas aqui registradas apontam que uma das 
possíveis causas para esta questão pode estar relacionada ao fato 
de que a escola não tem favorecido espaços de reflexão sobre o 
processo de formação, ou seja, promove a leitura de conteúdos 
disciplinares, mas não viabiliza possibilidades de “leitura” e 
objetivação crítica sobre o processo de formação vivido.
35
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 15-36,
nov. 2015/ fev. 2016
Narrativas e Trajetórias 
de Formação: Um 
Diálogo entre Literatura 
e Memórias
REFERÊNCIAS
BARDIN, Laurence. Análise de Conteúdo. São Paulo: 
Edições 70, 2011.
BENJAMIN, W. Obras Escolhidas I. Magia e Técnica, 
Arte e Política. Tradução por Sérgio Paulo Rouanet. São Paulo: 
Braziliense, 2012.
BEZERRA, P. Prefácio In: A Tragédia de Hamlet, 
Príncipe da Dinamarca. São Paulo: Martins Fontes, 1999.
GAGNEBIN, J. M. Prefácio In: BENJAMIN, W. 
Obras Escolhidas I. Magia e Técnica, Arte e Política. Tradução 
por Sérgio Paulo Rouanet. São Paulo: Braziliense, 2012.
ISER, W. O jogo do Texto. In: COSTA, L. (coordenação 
e tradução) A Literatura e o Leitor: textos da estética da 
recepção. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979.
PASSEGI, Maria da Conceição. Memoriais auto-bio-
gráficos: a arte profissional de tecer uma figura pública de si. 
In: PASSEGI, M. C. , BARBOSA, Tatyana M. N. (Org.). 
Memórias, memoriais: pesquisa e formação docente. Rio Grande 
do Norte: EDUFRN, 2008. 
VILLA, F. G. O Professor em Face das Mudanças 
Culturais e Sociais. IN: VEIGA, I. P. A. (org.) Caminhos da 
Profissionalização do Magistério. Campinas, SP: Papirus, 1998. 
VYGOTSKY, L. S. A Tragédia de Hamlet, Príncipe da 
Dinamarca. São Paulo: Martins Fontes, 1999.
.VYGOTSKY, L. S. A Construção do Pensamento e da Lin-
guagem. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
YUNES, E. Leitura como Experiência. In: YUNES, E., 
OSWALD, M. L. (orgs.) A Experiência da Leitura. São Paulo: 
Edições Loyola, 2003.
Data de recebimento: março de 2015
Data de aceite: setembro de 2015
37
INSPETOR DE ENSINO 
E DIRETOR ESCOLAR 
NA LEGISLAÇÃO 
EDUCACIONAL 
DE MINAS GERAIS 
(1906–24)
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 39-66,
nov. 2015/ fev. 2016
INSPETOR DE ENSINO E 
DIRETOR ESCOLAR NA 
LEGISLAÇÃO EDUCACIONAL 
DE MINAS GERAIS (1906–24)
Betânia O. Laterza Ribeiro 1
Luciana B. O. B. Carvalho2
Sandra M. Oliveira3
Resumo 
Na primeira República (1889–1930), a legislação 
possibilitou pensar na organização da educação. As reformas 
se proliferaram país afora, institucionalizado um modelo de 
escola para um modelo de cidadão. Institucionalizar supôs 
controlar e hierarquizar a administração do grupo escolar 
pela ação do inspetor de ensino e do diretor. Este estudo 
verifica a constituição e o surgimento desses agentes em leis 
e decretos da legislação mineira. Tomados aqui tomados 
como fontes históricas, são lidos no campo da gênese das 
políticas educacionais e da organização e do funcionamento 
do grupo escolar. O estudo objetiva analisar tanto o efeito 
da força político-legal na administração e estruturação 
técnico-pedagógica para controlar a ação escolar quanto 
seus reflexos no ensino primário, sobretudo de Minas. Os 
resultados mostram que os cargos de inspetor (criado em 
1835) e diretor (criado em 1906) deviam ser exercidos 
por homens; e que sua atividade fiscalizadora previa fazer 
a escola funcionar, fiscalizar tal funcionamento e atestá-lo 
mediante documentos para o governo. O estudo mostra 
que a ação desses sujeitos supunha outros conhecimentos 
que não os pedagógicos e administrativos. Mais que isso, 
1 Betânia Oliveira Laterza Ribeiro – Universidade Federal de Uberlândia (UFU).
 E-mail: laterzaribeiro@uol.com.br
2 Luciana B. O. B. Carvalho – Universidade Federal de Uberlândia (UFU).
 E-mail: lucianabeatrizcarvalho@yahoo.com.br
3 Sandra M. Oliveira – Rede Municipal de Uberlândia.
 E-mail: sandra-olivy@hotmail.com
38
Betânia O. Laterza Ribeiro 
Luciana B. O. B. Carvalho
Sandra M. Oliveira
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.37-66 ,
nov. 2015/ fev. 2016
reforça a ideia de centralização das decisões educacionais a 
ser tomadas com base em documentos da burocracia escolar 
que faziam a interface do governo mineiro com a escola.
Palavras-chave: Ensino Primário; Grupo Escolar; 
Fiscalização; Administração; Burocracia. 
Abstract
In Brazil, between 1889 and 1930, legislation helped to 
think of the organization of education. Educational reforms 
spread across the country to consolidate a school model to 
educate a model of citizen, which meant to control and 
create an administrative hierarchy that included school-
inspector and principal. This study focuses on the profile of 
these agents in laws and edicts, which are taken as historical 
sources analyzed in the field of educational policies genesis 
and schools organization and functioning. The analysis 
considers not only the effect of the legal and political force 
on schools’ pedagogical and technical management as a 
way of controlling the schooling action, but also its echoes 
on primary education, especially in Minas Gerais state. 
Results show that according to the law it was men who’d 
held school-inspector and principal positions (created 
in 1835 and 1906, respectively); and that the inspecting 
and administrative activity meant to make schools work in 
classrooms, oversee such functioning and prove it through 
documents delivered to the government. If it points an 
action dependent on knowledge other than the pedagogic 
and administrative ones, it reinforces a centralization of the 
decision-making process based on bureaucratic documents 
to keep government informed of the schooling activity as 
well. 
Keywords: Primary Education; School; Overseeing; 
Administration; Bureaucracy.
39
INSPETOR DE ENSINO 
E DIRETOR ESCOLAR 
NA LEGISLAÇÃO 
EDUCACIONAL 
DE MINAS GERAIS 
(1906–24)
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 39-66,
nov. 2015/ fev. 2016
INSPETOR DE ENSINO E 
DIRETOR ESCOLAR NA 
LEGISLAÇÃO EDUCACIONAL 
DE MINAS GERAIS (1906–24)
CONSIDERAÇÕES INICIAIS
No Brasil da primeira República (1889–1930), a 
burguesia liberal usou a legislação como instrumento para 
pensar na escola pública e em sua organização coerentemente 
com a nova feição política e social: o republicanismo e a 
cidadania. Fenômeno de pouca manifestação até então, as 
reformas educacionais, concebidas e executadas por intelectuais 
que se alçaram à condição de políticos, espalharam-se país 
afora nas primeiras décadas do século XX. A legislação ajudou 
a institucionalizar uma escola primária para formar o cidadão 
republicano; isto é, projetou-se num período marcante 
para consolidar um ideário: o do progresso, para o qual a 
alfabetização maciça seria essencial, daí a necessidade de novas 
concepções de educação e escola. 
Se assim o for, então inquirir leis educacionais e demais 
documentos reguladores da educação como fonte histórica 
mostra ser uma via profícua para refletir sobre a história 
da educação e as relações entre esta e a sociedade; permite 
compreender a constituição da escola na ótica do Estado e 
o significado de sua construção num contexto econômico, 
político e social que exigia da educação ora um fim (por 
exemplo, estimular o progresso e formar mão de obra para 
a nascente indústria); ora outro (por exemplo, aumentar 
o eleitorado). Entre as duas — talvez — pode ter havido 
contradições que, se não puseram em xeque a execução das 
proposições legais, denunciaram o jogode interesses de grupos 
de poder, seja econômico ou político. 
40
Betânia O. Laterza Ribeiro 
Luciana B. O. B. Carvalho
Sandra M. Oliveira
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.37-66 ,
nov. 2015/ fev. 2016
Tomar a lei educacional como fonte histórica pressupõe 
considerar que não se trata de um registro neutro, “inócuo” 
— diria Le Goff (1990, p. 548) — do passado. A legislação 
contém marcas da sociedade que a engendrou: concebeu, 
articulou, elaborou, redigiu, publicou num processo de “[...] 
montagem, consciente ou inconsciente, da história, da época, 
da sociedade” cuja significação pode ter mudado nas “[...] 
épocas sucessivas durante as quais continuou a viver [...]” — 
talvez esquecida, talvez em “silêncio” — em atividades variadas 
de manipulação; seja no momento mesmo de sua produção 
material, seja depois como vestígio daquele momento. 
Como matéria manipulável pelos sujeitos históricos 
em épocas distintas, as fontes estabelecem uma relação com o 
passado que exige problematizá-las como objeto que permite 
reconstruir não só a história, mas também sua historicidade. 
Não ignoramos a importância da historicidade dos documentos 
de valor histórico, mas neste trabalho consideramos as fontes 
históricas para reconstituir a história da educação mineira e a 
gênese das políticas educacionais republicanas para a educação. 
Na condição de estudo que permeia a história da 
educação, este trabalho toma como fontes leis e decretos 
educacionais mineiros, lidos e analisados com base em estudos 
(acadêmicos) que enfocaram a ação pedagógico-administrativa 
do inspetor de ensino e do diretor. Situamos a leitura de tais 
fontes no campo da organização e do funcionamento do 
grupo escolar de 1906 a 1924. Em parte, problematizamos 
sua constituição social à luz da lei: a criação legal de cargos e as 
exigências para o cumprimento das funções pelos titulares; em 
parte, sua instituição ao enfocarmos prescrições (regulamentos, 
normas, decretos e programas), seu cumprimento e seu 
efeito sobre sujeitos e relações sociais (de poder, políticas, 
pedagógicas, pessoais etc.) na escola. 
No plano geral, o estudo objetivou identificar e 
analisar mudanças e transformações associáveis com a gênese 
e consolidação do grupo escolar. Especificamente, objetivou 
analisar o efeito da força político-legal na administração e 
41
INSPETOR DE ENSINO 
E DIRETOR ESCOLAR 
NA LEGISLAÇÃO 
EDUCACIONAL 
DE MINAS GERAIS 
(1906–24)
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 39-66,
nov. 2015/ fev. 2016
estruturação técnico-pedagógica dessa instituição, sobretudo 
por intermédio do inspetor de ensino e do diretor escolar: 
agentes controladores da ação educacional e o funcionamento 
do grupo escolar na prática, tendo em vista seus reflexos no 
ensino primário de Minas Gerais, cuja educação ostentava 
porcentuais preocupantes na virada do século XIX para o XX. 
SITUAÇÃO DA EDUCAÇÃO PÚBLICA
Quando a República foi proclamada, certas condições 
da educação primária davam o tom da crise (econômica) por 
que passava Minas Gerais. Havia muito trabalho a ser feito 
para reduzir as taxa de analfabetismo e tornar a escolarização 
pública em fator de progresso, como queriam os republicanos; 
afinal, o propósito de escolarizar maciçamente reverberava em 
Minas, sobretudo porque havia contrastes entre matrícula e 
frequência — 51% de desistência e 5% de aprovação relativa 
aos frequentes. Uma educação que apresentasse índices tais não 
se coadunava com os anseios da sociedade que se encorpava 
com a proclamação da República nem com o propósito de 
fazer o país progredir à custa da alfabetização pública. 
O então secretário do Interior Wenceslaw Braz Pereira 
Gomes se incomodou; eis o que diz, na transcrição de Faria 
Filho e Vago (2000, p. 34): 
“Escolas havia que tinha apenas 1, 2 
e 3 alunos! Era recorrente a referencia 
à necessidade de superar ‘os gravos’ 
inconvenientes produzidos por casas de 
escolas sem luz e sem ar, e pelos miseráveis 
assentos que ai estão espalhados por quase 
todas as escolas do estado”, que “não raro 
compromete o futuro de inúmeros alunos”, 
como escreve ele no ano seguinte. 
Para o presidente do estado Silviano Brandão (1898–
1902), a “[...] completa decadência [...] do ensino primario 
[...]” estava nas condições materiais das escolas, em “[...] 
predios que não são proprios, acanhados, sem as necessárias 
42
Betânia O. Laterza Ribeiro 
Luciana B. O. B. Carvalho
Sandra M. Oliveira
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.37-66 ,
nov. 2015/ fev. 2016
condições hygienicas, desprovidos quasi todos de mobília e 
material escolar convenientes [...]”; e na administração, pois 
as escolas não eram “[...] inspeccionadas e ás vezes nem [...] 
visitadas pelas auctoridades litterarias [...]” (MINAS GERAIS, 
1893, p. 18). Vejamos esse último ponto para ver o que foi 
feito para mudar tal “[...] estado de cousas [...]” — diria o 
presidente. Isso porque, no discurso da legislação educacional, 
a frequência é alvo de controle da inspeção e direção escolar. 
Essa ação de controle, além de outras, aconteceu num lócus 
específico: o grupo escolar.4
Grupo escolar Na edIFIcação da educação públIca
Coube ao inspetor do Ensino Estevam Oliveira instituir 
o grupo escolar após conhecê-lo em São Paulo, em 1902; 
quando “[...] ficou deslumbrado com o espetáculo de ordem, 
civismo, disciplina, seriedade e competência que disse observar 
nas instituições de instrução primária da capital paulista” 
— diria Faria Filho (2000, p. 27). Oliveira (1902) viu um 
modelo de educação eficiente e organizado que poderia tirar 
da Minas da “decadência” a situa educacional mineira. Para 
ele, criar grupos escolares e organizar seu funcionamento 
na lógica pedagógico-administrativa destes poderia anular 
as dificuldades mediante o cultivo de uma cultura escolar, 
formação e profissionalização mediadora das relações entre 
cidadãos e sociedade. Essa escola ideal, para Oliveira (1902), 
supunha uma educação organizada à luz do conhecimento 
4 A concepção de grupo escolar surgiu na cidade de São Paulo. Era a tradução, 
no campo educacional, dos propósitos republicanos para a escola no processo 
de fazer o país progredir. Em essência, o grupo escolar reunia escolas dispersas, 
isoladas, não graduadas; mais: supunha um sistema de ensino ao qual subjaziam 
novas concepções de escola, de educação e aluno fundadas numa pedagogia 
embasada, por exemplo, em estudos sobre o desenvolvimento psicológico e 
biológico da criança. Além da seriação e renovação pedagógica, a concepção 
de grupo escolar supunha uma feição arquitetônica, supostamente, apropriada 
à prática da escolarização (FARIA FILHO; VAGO, 2000): prédios específicos 
para substituir as escolas “inapropriadas” e “acanhadas”.
43
INSPETOR DE ENSINO 
E DIRETOR ESCOLAR 
NA LEGISLAÇÃO 
EDUCACIONAL 
DE MINAS GERAIS 
(1906–24)
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 39-66,
nov. 2015/ fev. 2016
de profissionais e especialistas, dos preceitos higienistas e da 
pedagogia moderna.
O Estado mineiro — dizem Gatti Júnior et al., (1997) 
— já havia mostrado aceitação a tal ideal em 1891: atas da 
Assembleia Legislativa citam uma associação das noções de 
democracia e civilidade (civismo) com a ideia de modernizar a 
educação e formar cidadãos, de educação pública e obrigatória, 
de moralização pública. Ao estado caberia concretizar tal 
ideal; isto é, reformar a educação primária: redimensionar 
a face administrativa e pedagógica sob orientação e 
acompanhamento de profissionais técnicos e competentes. A 
reforma coube a João Pinheiro, que governou Minas de 1906 
a 1910. Formalizada pela lei 434, de 28 de setembro de 1906, 
sua proposta reformista determinou “[...] a construção de 
espaços próprios para a educação escolar, a fim de reunir e 
de abrigar em um só prédio as escolasque estavam isoladas, 
provocando, então, o aparecimento das Escolas Agrupadas e 
dos ‘Grupos Escolares’” (FARIA FILHO, 2000, p. 37). Como 
instituição para suprir as necessidades de expansão da escola 
primária, os grupos escolares — símbolo da modernização e 
do progresso — substituíram a escola isolada — símbolo do 
“atraso”. Assim, surgia o grupo escolar mineiro, o ensino laico 
se sobrepunha ao confessional, e a razão dava lugar à fé (o 
grupo escolar aboliu a instrução religiosa nas escolas públicas, 
assim como o Estado aboliu os subsídios aos seminários). 
Presidente do Estado e republicano, João Pinheiro 
investiu na educação (na escola) como recurso civilizatório e 
para fazer Minas progredir ao ritmo almejado pela República. 
Tal desenvolvimento em âmbito educacional, segundo 
Araujo (2007, p. 233–4), previa a “[...] centralidade da 
inspeção escolar e do seu papel fiscalizador e do andamento 
pedagógico-escolar”. Essa perspectiva reformista — diria 
Bomeny (1994) — explicitava um projeto modernizador 
para educação ao qual subjazia o binômio trabalho–educação: 
a convicção de que esforço e dedicação ao trabalho podem 
resultar em ascensão social e aprimoramento pessoal — 
44
Betânia O. Laterza Ribeiro 
Luciana B. O. B. Carvalho
Sandra M. Oliveira
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.37-66 ,
nov. 2015/ fev. 2016
convicção fundada, talvez, nas origens de João Pinheiro, cuja 
educação fora custeada por um irmão no início, depois por 
um tio. Diz ele, segundo transcrição de Bomeny (1994, p. 
145): “Sou fanático dos grandes obstáculos que exigem as 
forças supremas; o imprevisto me deslumbra e a necessidade 
das grandes ocasiões me fascina”.
INSPETOR E DIRETOR: CONTROLE E ADMINISTRAÇÃO NO 
GRUPO ESCOLAR 
“Forças supremas” (seriam forças divinas?) sugerem a 
capacidade de superar obstáculos e imprevistos, a convicção 
de alguém que encara os entraves sem se intimidar. Por outro 
lado, a força suprema pode ser lida como poder de mando: 
autoridade com força de decisão, palavra final, voz que ordena. 
Não seria implausível reconhecer esse sentido na proposta 
reformista educacional de João Pinheiro, pois submete a ação 
de professores — e seu poder de decisão em sala de aula — ao 
controle fiscalizador de um poder hierárquico e centralizador 
que passou a regular as relações internas na administração do 
nascente grupo escolar. Dentro deste, tinha “voz suprema” o 
diretor: topo da hierarquia; fora, a “supremacia” de sua voz se 
relativizava ante a do inspetor de ensino; e ambos se submetiam 
à fiscalização administrativa e técnica da voz maior, mais alta: 
a do secretário do Interior... 
INspeção e coNTrole
A Lei Orgânica do Ensino Primário, de 1835, introduziu 
o inspetor — então chamado de delegado — no cenário 
educacional como fiscalizador e controlador de atividades e 
cargos escolares. O art. 29 atribuía às províncias o direito de 
designar “[...] Delegado para cada comarca [...]”; enquanto 
o art. 30 especificava suas funções: “[...] nomear visitadores, 
suspender professores, nomear substitutos, autorizar 
funcionamento das aulas”. A nomeação do inspetor cabia ao 
governo estadual. O cargo incluía funções elementares como 
visitar escolas públicas — para ver se os professores cumpriam 
45
INSPETOR DE ENSINO 
E DIRETOR ESCOLAR 
NA LEGISLAÇÃO 
EDUCACIONAL 
DE MINAS GERAIS 
(1906–24)
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 39-66,
nov. 2015/ fev. 2016
seus deveres e informar sobre frequência discente e população 
escolar — e escolas particulares — para verificar as condições 
de funcionamento daquelas subvencionadas pelo Estado e 
propor subvenção às que merecessem; tal indicação supunha 
informar “[...] minuciosamente sobre as habilidades de seus 
professores, frequencia de alumnos e numero dos approvados 
nas materias de ensino obrigatorio nos exames do anno lectivo 
precedente” (MINAS GERAIS, 1892, p. 48–9).
Em 1892 — esclarece Mourão (1962) —, o sistema de 
inspeção mudou, por força do primeiro governo republicano 
mineiro: Afonso Pena. A lei 41, de 1892, criou o cargo de 
inspetor ambulante: “[...] encarregados da fiscalização das 
escolas e mais estabelecimentos de instrucção do Estado [...]” 
(MINAS GERAIS, 1892, p. 48–9). Sua nomeação caberia ao 
presidente do estado, mediante “[...] concurso perante uma 
commissão composta por professor de pedagogia da Escola 
Normal da Capital, como presidente, e de dois professores 
do Gymmasio, eleitos pela respectiva congregação” (MINAS 
GERAIS, 1892, p. 48–9). Afonso Pena estendeu a fiscalização 
a um conselho municipal para, supostamente, dar mais 
eficiência e agilidade à ação fiscalizadora. 
Como se lê no art. 32, o conselho atuaria nas “[...] 
escolas no districto escolar da séde do municipio, creadas [...], 
subvencionadas pelo Estado ou particulares”; isso significava, 
sobretudo, verificar a aplicação da “[...] da lei e regulamentos da 
instrucção publica, especialmente pela execução das medidas 
relativas ao ensino obrigatório”: por exemplo, conhecer — e 
registrar — as “[...] escusas dos reponsaveis pelo ensino das 
crianças que estiverem isentas da frequencia obrigatória [...]”; 
“Julgar as causas de falhas de alumnos, de confirmidade com 
art. 80” (MINAS GERAIS, 1892, p. 48–9). 
O ensino obrigatório ao discente não poderia ocorrer 
sem a obrigatoriedade da presença de docentes, daí a função de 
“Prestar ao governo ou ao inspector escolar as informações que 
forem exigidas, em relação aos professores [...]”: “Certificar 
e attestar, a requerimento dos professores do municipio, 
46
Betânia O. Laterza Ribeiro 
Luciana B. O. B. Carvalho
Sandra M. Oliveira
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.37-66 ,
nov. 2015/ fev. 2016
e informar seus requerimentos sobre licenças e remoções, 
relativamente á veracidade dos motivos justificativos que 
allegarem” (MINAS GERAIS, 1892, p. 48–9)
Havia funções indiretamente menos fiscalizadoras; 
por exemplo, conhecer a realidade local mediante a “[...] 
organização da estatística das escolas publicas e particulares 
[...]” — cujo mapa seria remetido “[...] annualmente [...] ao 
Secretario do Estado [...]” (§ 2º) — e o “[...] recenseamento 
da população escolar [...]” — cuja aprovação tinha de ocorrer 
em 15 dias (talvez após “[...] receber reclamações sobre elle 
e decidil-as” [§ 5º]). Os resultados deviam ser submetidos 
ao poder competente. Com dados da realidade escolar 
local, talvez o conselho tivesse condições de propor medidas 
convenientes para o bem da educação local, a “[...] creação de 
novas cadeiras, e a suspensão do ensino nas que não tiverem 
frequencia legal e sua restauração” (§ 12) (MINAS GERAIS, 
1892, p. 48–9). 
As funções menos fiscalizadoras não anulavam os 
mecanismos de controle, pois a ação devia ser reportada ao 
governo de Minas, ainda que o conselho estabelecesse “[...] 
fiscalização do ensino público pelo povo” — diria Torres (1980, 
p. 1.432). Isso porque o conselho devia ser eleito — embora 
a lei não diga por quem nem como; se não o fosse, caberia 
“Nomear três cidadãos conceituados que acompanham o 
conselho districtal nas localidades onde a eleição não haja sido 
feita” (MINAS GERAIS, 1892, p. 48–9) — embora a lei não 
diga quem nomearia. Nesse caso, seria implausível cogitar, na 
formação de conselhos, critérios mal resolvidos, para não dizer 
ambíguos? Se sim, então isso não põe em xeque a condição 
de fiscalização popular de que fala Torres? Não está claro se o 
povo elegia o conselho. 
Se há quem diga que, entre 1882 e 1900, a fiscalização 
inspecional fundada em relatórios, mapas estatísticos e 
demais documentos da burocracia escolar tendeu a dar lugar 
a uma atividade mais interpretativa e judiciosa da atuação de 
docentes e discentes (VEIGA, 1990), não se pode negar que 
47
INSPETOR DE ENSINO 
E DIRETOR ESCOLAR 
NA LEGISLAÇÃOEDUCACIONAL 
DE MINAS GERAIS 
(1906–24)
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 39-66,
nov. 2015/ fev. 2016
a inspeção fiscalizante tenha sido ação prevalente na primeira 
década do século XX. Em 1903, o presidente Francisco Salles 
(1902–6) afirmou faltar “[...] inspecção de ensino” (MINAS 
GERAIS, 1903, p. 30). Em 1906, ela se tornou objeto de 
reforma: o decreto 1.947, de 30 de setembro, reviu a função 
e importância da inspeção na direção e administração escolar; 
e a revisão a projetou de tal modo que o traço fiscalizar deu 
lugar a outra identidade: a de “[...] alma do ensino [...]”, 
afirmada no Regulamento da Instrução Primária e Normal do 
Estado de Minas Gerais; e trouxe outros agentes: “[...] pessoal 
técnico, susceptível de apaixonar-se pela causa que lhe vai ser 
confiada” (MINAS GERAIS, 1906d, p. 8). 
O art. 18 da lei 439, de 28 de setembro de 1906, criou 
o cargo de inspetor técnico, cuja ação se alinhava à do inspetor 
ambulante da lei de 1892. “[...] agente da confiança do Governo, 
[...] de comprovada capacidade moral e de competencia 
profissional manifestada em trabalhos anteriores” (MINAS 
GERAIS, 1906a, p. 183), os inspetores ressurgiam, então, 
como “[...] auctoridades escolares creadas em lei [...]”, que se 
reportava ao “[...] Presidente do Estado [...] por intermedio 
do Secretario do Interior” (MINAS GERAIS, 1906a, p. 182). 
Mais que isso, sua ação se estenderia à vida extraescolar: dele 
se esperava conhecimentos mais amplos que os pedagógicos, 
isto é, conhecimentos das condições e dos determinantes 
culturais, sociais, econômicos e políticos que poderiam fazer 
avançar ou retardar o desenvolvimento (da educação escolar) 
da comunidade onde ficava a escola. Ora, à inspeção caberia 
conhecer as “[...] causas que influem sobre a instrucção do 
povo, mediante a observação attenta das escolas, da sociedade 
e do territorio do Estado e a favorecer o seu progresso, agindo 
sobre o professor, no meio social e as auctoridades” (MINAS 
GERAIS, 1906a, p. 182).
Contudo, relatório técnico de visita ao Grupo Escolar de 
Lavras cujo diretor era Firmino Costa aponta uma apreensão 
ainda fiscalizadora e atenta ao domínio escolar: prédio — “[...] 
novo, vasto e apropriado edifício [...]”, doado ao estado pela 
48
Betânia O. Laterza Ribeiro 
Luciana B. O. B. Carvalho
Sandra M. Oliveira
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.37-66 ,
nov. 2015/ fev. 2016
municipalidade de Lavras e onde funcionam “[...] cinco para 
o sexo masculino e três para o feminino”; frequência — média 
diária de “[...] de 280 [dentre] 427 alunos”; ao diretor — 
senhor Firmino Costa, “[...] criador previdente e carinhoso 
de tal estabelecimento, que vai atingindo vitória e eficazmente 
os elevados fins a que se destina”; asseio, ordem, regularidade e 
disciplina no grupo — “[...] irrepreensíveis”; e ao programa de 
ensino — “[...] tem tido amplo e eficaz desenvolvimento por 
parte dos docentes e é bastante apreciável o aproveitamento 
dos discentes [...]”, supostamente notável nos próprios alunos, 
cujos rostos exibiam “[...] um ar agradável de saúde e bem-
estar [...]” (VIDA ESCOLAR, 1908, p. 1).
O art. 198 do decreto 1.947 prescreveu as atribuições 
do inspetor técnico. Em essência, sua ação supunha aferir e 
atestar o cumprimento da lei no grupo escolar, sobretudo na 
dimensão pedagógica: “[...] programma do ensino primario 
[...] bem e fielmente praticado”; caso não estivesse, ele devia 
assistir ao funcionamento das aulas para “Dar ao professor 
as necessarias instrucções caso verifique não ter elle bem 
comprehendido o espírito do programma”, indicando-lhe 
“[...] tudo quanto repute necessario modificar no methodo 
por elle seguido”; o inspetor devia averiguar a quantidade 
de alunos matriculados e frequentes; a “[...] capacidade e a 
solicitude do professor no desempenho de sua missão [...]”; na 
“[...] disciplina, ordem e regularidade dos trabalhos [...]”; no 
material didático: “[...] compêndios [...] livros [dos] alumnos 
e o estado em que se acharem” (MINAS GERAIS, 1906b, p. 
185–6). 
Funções mais pedagógico-administrativas conviviam 
com outras mais administrativo-burocráticas, como verificar 
“O estado da escripturação das escolas, examinando os livros 
de matricula, ponto diario e outros” e enviar à Secretaria do 
Interior documentos escritos e outras registros com “[...] 
descripções, vistas photographias e plantas dos edifícios das 
escolas e do respectivo material de ensino”, com um quadro 
“[...] das escolas e estabelecimentos particulares e municipaes 
49
INSPETOR DE ENSINO 
E DIRETOR ESCOLAR 
NA LEGISLAÇÃO 
EDUCACIONAL 
DE MINAS GERAIS 
(1906–24)
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 39-66,
nov. 2015/ fev. 2016
[...]” com os “[...] nomes dos respectivos professores, 
directores, o numero de alumnos matriculados e freqüentes” 
e, quinzenalmente, um “[...] relatorio synthetico da inspecção 
que tiver feito, o qual será publicado no jornal official, a juiz 
daquella auctoridade” (MINAS GERAIS, 1906b, p. 185–6).
Havia ainda funções com propósitos mais ideológico-
partidários, tais como “[...] Propagar o espírito de associação 
para o fim de realizar os intuitos do ensino publico”, 
especialmente entre “[...] auctoridades e outras pessoas 
prestigiosas das localidades [...] [para] despertar o seu interesse 
pela causa do ensino [...]” (assiduidade discente e melhoria das 
condições técnicas e materiais da escola), pela “[...] fundação 
de bibliothecas e museus escolares”; enfim, “Inaugurar [...] 
as escolas de creação nova ou restauradas [...]” como um 
acontecimento ser comemorado, mediante “[...] actos em que 
tomem parte os professores, paes de familia ou auctoridades 
locaes, salientando o alcance do facto” (MINAS GERAIS, 
1906b, p. 185–6; grifo nosso), função que deixa entrever a 
propaganda estatal (publicizar sempre que possível as ações 
do estado).
A importância da inspeção aumentou a tal ponto, que 
foi preciso criar duas instâncias: uma administrativa, outra 
técnica. A primeira seria “[...] exercida, permanentemente, 
pelos inspectores escolares municipaes e districtaes e, 
extraordinariamente, pelos inspectores technicos ambulantes” 
(MINAS GERAIS, 1906b, p. 183) e supunha controlar 
e acompanhar “[...] todos os atos e relações das professoras 
com a secretaria [...]” no âmbito do regulamento mediante 
os chamados inspetores escolares municipais (FARIA FILHO, 
2000, p. 94); a segunda seria “[...] exercida por inspectores 
ambulantes” (MINAS GERAIS, 1906b, p. 183), “[...] 
responsáveis pela relação mais direta com as professoras, as 
diretoras e os alunos [...]”; isto é, com processos e sujeitos 
educacionais de fato (FARIA FILHO, 2000, p. 94). 
O art. 194 do decreto 1.947 prescreveu as atribuições dos 
inspetores municipais e distritais — ainda fiscalizadoras; afinal, 
50
Betânia O. Laterza Ribeiro 
Luciana B. O. B. Carvalho
Sandra M. Oliveira
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.37-66 ,
nov. 2015/ fev. 2016
tinham de “Velar pela fiel observancia da lei e regulamentos da 
instrucção publica, relativos ao ensino oficial”. A fiscalização 
supunha atividades de controle hierárquico-burocráticas: 
§ 4.º Prestar ao governo as informações que 
lhe forem exigidas em relação aos professores 
e ás escolas do município [...] § 9.º Certificar 
a frequencia dos professores do districto da 
séde do município [...] § 15. Chamar a 
attenção dos professores do municipio para a 
fiel e exacta observancia dos seus deveres [...] 
§ 11. Visar os boletins e mappas escolares, 
lançando nelles as observações resultantes 
da sua inspecção, as copias das actas de 
exames e de visitas, as listas nominaes de 
alumnos, depois deconfrontal-as com o livro 
de matricula e, bem assim, quaesquer outros 
documentos, que para esse fim lhes forem 
apresentados pelos professores públicos [...]§ 17. Fiscalizar os exames e promoções de 
alumnos nas escolas publicas, nos termos 
regulamentos. (MINAS GERAIS, 1906b, p. 
183–5).
Também previa atividades de administração de pessoal 
e recursos materiais: 
§ 5.º Informar os requerimentos dos 
professores, relativos a licença e remoções [...] 
§ 7.º Communicar á Secretaria do Interior as 
vagas de cadeiras, logo que estas se verifiquem 
[...] § 8.º Communicar á Secretaria do 
Interior, o dia em que os professores publicos 
assumirem ou reassumirem o seu exercício, 
entrarem no goso de alguma licença ou 
fecharem a escola por motivo de permuta, 
remoção ou exoneração; § 10. Receber 
o compromisso dos professores publicos 
primarios e dar-lhes posse no município [...] 
§ 13. Justificar durante o mez, até tres, as 
falhas dos professores [...] § 14. Conceder 
licença aos professores, dentro de um 
anno, até 30 dias, sem vencimentos [...] § 
16. Nomear examinadores para as escolas 
51
INSPETOR DE ENSINO 
E DIRETOR ESCOLAR 
NA LEGISLAÇÃO 
EDUCACIONAL 
DE MINAS GERAIS 
(1906–24)
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 39-66,
nov. 2015/ fev. 2016
publicas no districto da séde do municipio, 
presidir os exames e delegar essa atribuição as 
pessoas idôneas [...] § 19. Fazer inventariar 
a mobília e o material technico das escolas, 
quando os respectivos professores entrarem 
no exercício de suas funções e retificar o 
inventario quando os mesmos tenham de 
deixar e exercício [...].(MINAS GERAIS, 
1906b, p. 183–5)..
A princípio, “Os inspectores municipaes e districtaes, 
[eram] agentes gratuitos da confiança do governo [...]” 
(MINAS GERAIS, 1906b, p. 183). Para Oliveira (1902, p. 
179), a “[...] gratuidade [a falta de remuneração] do cargo 
enfraquece a responsabilidade daquele que a exerce, a inspeção 
não tem regularidade necessária, não é exercida com a firmeza 
que requer o interesse de instrução e a educação do povo”. 
Ele via a remuneração como central para remodelar o ensino 
público mineiro. A gratuidade motivou debate, a ponto de a lei 
mudar a redação no decreto 3.191, que se refere a agentes “nos 
cargos” de confiança. Talvez a não remuneração se justificasse 
porque os nomeados ao cargo de inspetor já eram remunerados, 
pois o art. 46 de um decreto 3.191, de 1911 previa que “[...] 
para as nomeações de inspectores municipaes serão preferidos: 
a) os promotores de justiça; b) como premio, os professores de 
merecimento excepcional” (MINAS GERAIS, 1911, p. 181). 
O art. 56 do decreto 3.191, de 1911, prescreveu que 
“[...] aos inspectores districtaes cabem [...] como aos auxiliares 
[...] as mesmas attribuições e deveres conferidos neste 
regulamento aos inspectores municipaes” (MINAS GERAIS, 
1911, p. 184); e o art. 98 do decreto 6.655, de 1924, previu 
a condição do cargo nestes termos: “Os inspectores districtaes 
são, como os municipaes, agente de confiança do Governo, 
e, como elles, livremente nomeaveis e demissiveis” (MINAS 
GERAIS, 1924, p. 244); igualmente, o art. 99 propõe que, 
“[...] nos povoados e colônias, a inspecção do ensino será feita 
por inspectores auxiliares, também livremente demissíveis” 
(MINAS GERAIS, 1924, p. 244). 
52
Betânia O. Laterza Ribeiro 
Luciana B. O. B. Carvalho
Sandra M. Oliveira
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.37-66 ,
nov. 2015/ fev. 2016
A substituição de um inspetor — por exemplo, demitido 
— seguia o art. 48 do decreto 3.191 (que replicava o de 1906), 
onde se lê que: “[...] os inspectores municipaes e districtaes 
serão substituídos em suas faltas ou impedimentos pelos 
respectivos supplentes, também de nomeação do Presidente 
do Estado”; e o art. 55 aponta as condições para substituição 
do inspetor distrital: “[...] a) nas faltas e impedimentos, por 
supplentes; b) nos povoados e colônias, por auxiliares, uns e 
outros de nomeação do governo” (MINAS GERAIS, 1911a, 
p. 181; 184). 
Se a nomeação de inspetores técnicos previa critérios 
fundados na moral social republicana e no desempenho 
profissional, a designação se vinculava ao lugar onde iriam 
atuar, isto é, as “[...] circumscripções literarias5 que lhes forem 
designadas [...]”, onde permaneceriam mais “[...] que 6 mezes” 
(MINAS GERAIS, 1906b, p. 183). Havia um pré-requisito 
à posse: pagar antes “[...] os direitos do respectivo titulo” 
(MINAS GERAIS, 1906b, p. 183). Como tinham de atuar 
fora de seu domicílio, a legislação oferecia garantias — vide 
o art. 191 do decreto: “[...] vencimentos 3:600$00 annuaes e 
bem assim a diaria de 8$000 e passagem nas estradas de ferro 
[...]” (MINAS GERAIS, 1906b, p. 183). O decreto de 1911 
mantém esses valores, mas o de 1924 extinguiu a garantia: 
“Os inspectores regionaes são obrigados a residir e permanecer 
nas circumscripções para que foram designados” (MINAS 
GERAIS, 1924, p. 239). 
Todavia, residisse ou não na “circumscripção” designada, 
o inspetor tinha de se deslocar para cumprir suas funções; e o 
deslocamento devia ser relatado ao governo nestes termos: “I. 
O itenerario seguido pelo fiscal e as povoações encontradas em 
seu trajecto [...]”; não bastava informar dados factuais (lugar, 
data, tempo despendido...) do deslocamento; era preciso dar 
provas verbais de que de fato houve visita, pois o relatório 
supunha, por exemplo, “[...] descripção dos predios escolares e 
5 Conforme Araujo (1997), equivaliam às atuais superintendências de ensino.
53
INSPETOR DE ENSINO 
E DIRETOR ESCOLAR 
NA LEGISLAÇÃO 
EDUCACIONAL 
DE MINAS GERAIS 
(1906–24)
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 39-66,
nov. 2015/ fev. 2016
si são estaduaes, municipaes e particulares; dimensões de seus 
commodos e si sua situação facilita a frequencia dos meninos 
da localidade” (MINAS GERAIS, 1906b, p. 185–6). A lei não 
só estabelecia meios de (auto)controle da ação do inspetor; 
também o obrigava a agir ao exigir relatórios quinzenais. 
Os recortes da legislação apresentados até aqui mostram 
que a função do inspetor ia além da fiscalização inspecional 
propriamente dita. Dentro da escola, além de ações burocráticas, 
o inspetor tinha de usar sua percepção para observar seus 
sujeitos e a ação deles de modo que pudesse delinear (e relatar) 
perfis morais, profissionais e de comprometimento; afinal, 
tinha de instruir professores primários e diretores quanto a 
seus deveres, à maneira de vestir, à postura, à importância 
da cooperação de familiares para ações cívicas e culturais no 
grupo escolar e da participação de autoridades (políticas) na 
vida escolar; sobretudo, cabia-lhe organizar e reger a direção 
do grupo escolar, isto é, “[...] dar instrucções [...] quanto ao 
cumprimento de [...] deveres” (MINAS GERAIS, 1924. p. 
240).
a dIreção e a admINIsTração 
O decreto 1.947 introduziu o (papel do) diretor na 
instrução pública mineira. Como se lê no art. 24: cada grupo 
escolar teria “[...] um diretor incumbido de sua superintendencia 
administrativa e technica, que será especificada em regimento 
especial”; enquanto o art. 26 estabeleceu sua competência: 
“[...] fiscalizar e disciplinar os alumnos, os professores e todos 
os funccionarios que servirem sob sua direcção, solicitando do 
inspector escolar as providencias necessarias, que esse por sua 
vez pedirá ao governo quando fora da sua alçada” (MINAS 
GERAIS, 1906b, p. 159). 
O gênero masculino na escrita da lei deve ser tomado 
em sentido literal, porque a legislação prescrevia que homens 
— supostamente mais aptos ao papel de controlar as atividades 
da escola — desempenhassem o cargo de diretor escolar. Para 
Souza (1998, p. 80), se isso reforçava relações de gênero 
54
Betânia O. Laterza Ribeiro 
Luciana B. O. B. Carvalho
Sandra M. Oliveira
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.37-66 ,
nov. 2015/ fev. 2016
desiguais de um universo social mais amplo, havia exceções: 
diretoras de escolas-modelos como “[...]Marcia Browne, 
Maria Guilhermina Loureiro de Andrade e Eliza de Andrade 
Macedo”; mais que replicar as desigualdades das relações de 
gênero no espaço escolar, atribuir a homens apenas cargos 
superiores de instrução pública “[...] pode ser visto como 
uma reserva de mercado no qual os professores normalistas 
podia contar com os melhores salários e prestigio social”. Daí 
a afirmação de Demartini e Antunes (1993) de que magistério 
primário era profissão feminina e carreira masculina. 
O decreto 3.191 diversificou sua ação, ainda 
fiscalizadora, pois tinha de “[...] Inspeccionar a frequencia 
dos alumnos e dos professores”, de percorrer classes, “[...] 
fiscalizando o ensino e a disciplina e dando as providencias 
que se fizerem necessárias”, deixar o professorado ciente das 
“[...] irregularidades de ensino e disciplina, verificadas nas 
suas classes ou fora dellas”; e, sobretudo, tomar providências 
em “[...] occurrencias extraordinarias, dando de tudo conta ás 
auctoridades escolares [...]”; se preciso, “Substituir, na regencia 
da classe [...]”; “[...] observar o programma e o horário”, 
velando pela “[...] disciplina do grupo e asseio do prédio”; se 
fosse preciso, “Impor penas disciplinares”. Ampliou o contato 
com o público escolar em funções como “[...] dar posse aos 
professores e empregados do grupo”, matricular e classificar 
“[...] alumnos, e designar a cada professor uma classe e a sala 
[...]” e “Entender-se por escripto ou pessoalmente com as 
auctoridades escolares locaes, ou com os paes e tutores sobre 
a matricula e frequencia de alumnos”. A atividade burocrática 
incluía organizar “[...] ‘boletim diário’ de occurrencias do 
estabelecimento [...]” (presença/ausência docente/discente, 
visitas); cuidar da “[...] escripturação e correspondencia 
escolares, remettendo á Secretaria do Interior, até o dia 5 de 
cada mez, o boletim mensal e, até 10 dias depois de findo 
cada semestre, o mappa semestral dos trabalhos escolares [...]”; 
elaborar um “[...] relatorio annual sobre o movimento do 
55
INSPETOR DE ENSINO 
E DIRETOR ESCOLAR 
NA LEGISLAÇÃO 
EDUCACIONAL 
DE MINAS GERAIS 
(1906–24)
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 39-66,
nov. 2015/ fev. 2016
grupo [...] durante o anno lectivo [...]” e enviar ao secretario 
do Interior (MINAS GERAIS, 1911, p. 187–9).
Como se lê, a “superintendencia administrativa e technica” 
tem de ser entendida como atividade que previa fazer a escola 
funcionar na sala de aula, fiscalizar tal funcionamento e atestá-
lo mediante documentos de interface com o governo e com 
pais e tutores. Trata-se de função pedagógico-administrativa, 
pedagógico-docente e mediadora, pois o profissional tinha de 
responder, ao governo estadual, sobre questões e problemas 
internos da escola. Essas atribuições — diz Guimarães (2007, 
p. 202) — davam ao diretor uma função centralizadora: “[...] 
pode-se considerar que o perfil de uma escola dependia, em 
grande parte, de postura gestora empreendida pelo ocupante 
desse cargo, da maneira que pensava e agia”.
O diretor não perde sua condição de educador; em 
compensação — diz Leão (1945, p. 167) — ganha a de “[...] 
coordenador de todas as peças da máquina que dirige, o líder 
de seus companheiros de trabalho, o galvanizador de uma 
comunhão de esforços e de ações em prol da obra educacional 
da comunidade”. A dimensão pedagógica supunha não só 
observar a atividade discente e docente; também analisar e 
julgar métodos e processos para apreciar resultados, orientar 
e conduzir o trabalho. Assim, ao conhecimento didático-
pedagógico presumível, agrupava-se o conhecimento da 
política educacional e dos saberes técnico-administrativos, 
pois cabia ao diretor pensar nas diretrizes e linhas gerais e pô-
las em prática. 
O decreto 6.655, de 19/8/1924, reiterou as atribuições 
modulando-as aqui e ali; por exemplo, ao prever apoio de “[...] 
mais professores por elle designados, e do porteiro [...]” para 
manter a disciplina”; aumentar a quantidade de documentos 
a ser vistos e preenchidos — “portarias de licença”, “termos de 
visitas” —, inventariar “[...] o material escolar sob sua guarda 
e responsabilidade, e escripturar as despesas auctorizadas, bem 
como as quotas pecunarias destinadas á compra de expediente 
e utensílios de hygiene”. Mais que isso, amplia-se o contato 
56
Betânia O. Laterza Ribeiro 
Luciana B. O. B. Carvalho
Sandra M. Oliveira
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.37-66 ,
nov. 2015/ fev. 2016
com autoridades externas à educação ao ter de “Communicar 
á auctoridade sanitaria os casos de moléstia infecciosa, 
verificados em alumnos matriculados” (MINAS GERAIS, 
1924, p. 235–6). 
Relatório sobre o movimento do Grupo Escolar de 
Uberaba (MG) expõe o contato com autoridades educacionais 
— a “V. Excia”— e convergência ao regulamento geral da 
instrução pública de então: 
As aulas funccionarem regularmente nos 
208 dias lectivos do anno. Não houve 
feriado extraordinario. Observou-se com 
escrupulo, nos dous turnos, o que dispõe 
o Regulamento quanto aos trabalhos nos 
institutos de ensino publico primario. O 
ensino, directamente fiscalizado por mim, 
foi ministrado de accordo com o programma 
em todas as classes. Tenho a satisfação de 
informar a V. Excia, que os professores do 
estabelecimento, cuja nominata consta dos 
boletins mensaes que enviei á Secretaria, 
deram aos alumnos, durante todo o 
anno, o bom exemplo de assiduidade aos 
trabalhos escolares. (ARQUIVO PÚBLICO 
MINEIRO, 1916, p. III).
Essa passagem mostra uma atividade intensa do diretor 
na administração de frequência, licença e substituição. Além de 
organizar o funcionamento das aulas e o programa de ensino, 
tinha de fiscalizar; por isso se diz que à “[...] direção cabia a mesma 
atribuição dada ao inspetor, em nível micro” (GONÇALVES, 
2006, p. 77); e talvez por isso o secretário Carvalho Brito tenha 
afirmado a importância dos diretores em relatório: 
O êxito dos grupos escolares depende, em 
regra, da sua direção. Os diretores são a 
alma desses estabelecimentos, depende de 
sua boa vontade, de seus esforços, de sua 
competência, de seu patriotismo, a divisão 
regular dos trabalhos escolares, a fiscalização 
permanente, a uniformidade na execução 
dos programas, o estímulo ao professores e 
57
INSPETOR DE ENSINO 
E DIRETOR ESCOLAR 
NA LEGISLAÇÃO 
EDUCACIONAL 
DE MINAS GERAIS 
(1906–24)
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 39-66,
nov. 2015/ fev. 2016
alunos, a ordem, a disciplina e a higiene, sem 
o que não realizam os grupos escolares os 
intentos de sua vocação. (MINAS GERAIS, 
1908, p. VII).
Como “alma do [estabelecimento de] ensino” tal qual 
o inspetor, os diretores deviam — segundo prescreviam o art. 
73 do decreto 3.191, de 1911, e o art. 74 do decreto 6.655, 
de 1924 — chegar “[...] quinze minutos, pelos menos, antes 
da hora de começarem os trabalhos escolares” (MINAS 
GERAIS, 1924, p. 234). Chegar mais cedo supunha preparar 
funcional, administrativa e pedagogicamente o grupo escolar 
para receber os alunos. Vago (2009, p. 117–8) dá o tom da 
cobrança relativa ao horário do diretor em carta de um pai 
reclamando do diretor do grupo escolar de Carangola (MG), 
José Francisco Lopes Nunes, em 4 de junho de 1912: “Ilmo. 
Sr. Venho a presensa de V. Sa. para representar a V. Sa. os 
desmandos do Grupo Escolar daqui desta cidade. O director 
chega sempre ao Grupo duas horas depois das profeçoras e 
alega de ser doente para chegar assim tarde, embora apesar de 
morar numa casa mesmo juntinha do grupo.” O caso não se 
desdobrou e foi arquivado pelo diretor de Instrução.
O art. 363 do decreto 6.655 salientou a responsabilidade 
pelo prédio e pelos objetos da dimensão material do grupo 
escolar em certas atribuições, a exemplo destas:
1.º Proceder, perante a auctoridade escolar 
local, ao inventario a que se refereo art. 
203 — Do mobiliario e material constantes 
dos artigos anteriores, a direcção de cada 
estabelecimento fará, sempre que fôr mudada, 
com a presença da auctoridade escolar local, 
um inventario minucioso, descrevendo o 
estado de conservação dos mesmos, e do predio, 
quando de propriedade publica. Paragrapho 
unico. Este inventario será lançado em livro 
proprio, e delle se enviará copia, visada 
pela mesma auctoridade, á Directoria da 
Instrucção; [...] 3.º Conservar o predio e o 
material escolares, pelos quaes responderá 
58
Betânia O. Laterza Ribeiro 
Luciana B. O. B. Carvalho
Sandra M. Oliveira
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.37-66 ,
nov. 2015/ fev. 2016
na fórma do art. 211. Os professores, 
directores de grupos e mais funccionarios 
do ensino, a quem competirem a guarda e a 
conservação do mobiliario e material escolares, 
são por elles responsaveis civil, criminal e 
adminstrativamente. Paragrapho unico. Não 
poderão, sob qualquer pretexto, cedel-o por 
emprestimo, bem como o predio, nem delles 
utilizar-se para fins extranhos ao ensino, sob 
as mesmas responsabilidades. [...]. (MINAS 
GERAIS, 1924, p. 305–6; grifo nosso).
Se essa passagem do texto legal aponta a incumbência do 
diretor de preservar e zelar do prédio e do mobiliário escolares, 
a passagem de um relatório das atividades do Grupo Escolar 
de Uberaba dirigido ao secretário de Estado dos Negócios 
do Interior de Minas Gerais revela o receio de sanções legais 
— afirmadas pelo decreto — por causa de descumprimento. 
O texto se refere a mobiliário que havia sumido: “Duas 
peças, de cuja falta se ressentia o mobiliario, foram feitas 
no corrente anno pelos alumnos do Curso Technicos; uma 
caixa de madeira envernizada para a Bandeira e um armario 
pequeno para a pharmacia escolar” (ARQUIVO PÚBLICO 
MINEIRO, 1916, p. V). Mais que isso, a referência à 
bandeira sugere a formação de um espírito republicano e o 
culto a um símbolo seu. Ao diretor cabia influenciar os corpos 
docente, administrativo, operacional e, sobretudo, discente a 
aprender a amar a pátria sob os auspícios da escola e respeitar 
à simbologia da sociedade republicana. Nagle (2001, p. 64) 
afirma que “[...] as primeiras manifestações nacionalistas 
aparecem, de maneira mais sistemática e mais influenciadora, 
no campo da educação escolar”; e Schueler e Magaldi (2008, 
p. 45) reiteram essa afirmação dizendo que a escola pública 
primária propagou “[...] mensagens de caráter moralizante e 
cívico [...], por meio de formas diversas, como presença de 
símbolos patrióticos no dia-a-dia e nas situações festivas”. 
Outra passagem do relatório citado há pouco reforça esse 
59
INSPETOR DE ENSINO 
E DIRETOR ESCOLAR 
NA LEGISLAÇÃO 
EDUCACIONAL 
DE MINAS GERAIS 
(1906–24)
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 39-66,
nov. 2015/ fev. 2016
patriotismo na escola pela relevância que tinha a solenidade 
comemorativa de datas cívicas:
O Grupo Escolar comemorou, por meio de 
festas organizadas com caracter educativo, 
as datas nacionaes de 21 de abril, 7 de 
setembro de 19 de novembro. Ao ensejo 
da comemoração da data de 7 de setembro, 
realizamos a festa da arvore, de accordo 
com as instrucções expedidas pela Secretaria 
do Interior. (ARQUIVO PÚBLICO 
MINEIRO, 1916, p. V).
Se o cargo era de confiança, também era confiável a 
poucos: do candidato a ocupá-lo exigia-se formação normal ou 
origem em grupo de cidadãos interessados na educação. Talvez 
por isso o decreto 3.191, de 1911, tenha determinado que 
o ocupante fosse nomeado: “Para as nomeações de directores 
de grupos serão preferidos: a) os professores normalistas das 
escolas urbanas, mantidas no exercício do cargo as actuaes 
directoras. b) os cidadãos notaveis por serviços prestados á 
instrucção” (MINAS GERAIS, 1911, p. 187). Vieira (2011, 
p. 101) exemplifica esse tipo de nomeação em Mariana, onde 
em lugar de um professor de carreira foi indicado ao cargo 
de diretor escolar o cidadão José Ignácio, que supostamente 
prestou serviços à educação e era personagem de renome 
na sociedade, pois fora “[...] vereador e um dos principais 
farmacêutico da cidade [...]”; isso sugere que o cargo não 
só era prestigioso, como também dava “[...] centralidade 
administrativa. O art. 72 do decreto 6.655, de 19/8/1924, 
avança um pouco quanto a prescrever condições para nomear 
diretores, sobretudo o mérito:
Em cada grupo escolar haverá um director, 
nomeado dentre os professores públicos ou 
particulares, de reconhecido merecimento, e 
demissível a juízo do Governo. Paragrapho 
único. Na falta de professores, será nomeado 
qualquer cidadão, maior de 21 annos, que 
apresentar os seguintes documentos: a) folha 
corrida; b) attestado de aptidão pedagogica 
60
Betânia O. Laterza Ribeiro 
Luciana B. O. B. Carvalho
Sandra M. Oliveira
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.37-66 ,
nov. 2015/ fev. 2016
e pratica profissional, dado pelo director 
do estabelecimento de ensino que lhe 
fôr designado pelo Secretario do Interior 
para um estagio de 30 a 90 dias. (MINAS 
GERAIS, 1924, p. 234). 
Ainda assim, é provável que o critério mérito não 
excluísse nomeação fundada em vínculos partidários e sociais. 
Firmino Costa, educador indicado para dirigir grupo escolar 
em Lavras (MG) — diz Hamdan (2007, p. 47) —, era amigo 
de Fabriciano Carvalho de Brito, político que trabalhou 
pela criação de grupos escolares no estado. Esse autor não 
questiona o mérito do diretor; mas não descarta a importância 
de sua rede de sociabilidades. Mesmo em caso de demissão, 
o mérito parecia prevalecer. O art. 72 do decreto de 1911 
previa que diretores “[...] dispensados do cargo teriam direito 
a ser providos; independente do concurso, em qualquer escola 
vaga” (MINAS GERAIS, 1911, p. 187). Em vez de não poder 
trabalhar noutra escola, a exoneração de um cargo garantia o 
direito a outro. Eis algumas justificativas para exonerar: 
Art. 380 [...] a) a falta de preparo profissional 
ou inaptidão pedagógica; b) o abandono 
injustificavel do cargo; [...] Art. 381. Serão 
exonerados a bem do serviço publico: 1.º os 
funccionarios condemnados por sentença 
definitiva, em juízo criminal, a pena que 
acarrete a de perda do emprego, com ou sem 
inhabilitação para exercer outro, ou os que 
o forem pelos crimes previstos nos numeros 
2.º aos que tiverem sido condemnados por 
crime de falsidade, estellionato, ou qualquer 
outro considerado infamante e 4.º aos que 
tiverem sido condemnados por crimes contra 
a independencia, integridade e dignidade da 
Patria do art.9 deste regulamento; 2.º os que 
praticarem actos contrarios á moral e aos 
bons costumes. (MINAS GERAIS, 1924, p. 
309–10).
61
INSPETOR DE ENSINO 
E DIRETOR ESCOLAR 
NA LEGISLAÇÃO 
EDUCACIONAL 
DE MINAS GERAIS 
(1906–24)
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 39-66,
nov. 2015/ fev. 2016
Ora, a possibilidade de realocar um diretor exonerado 
por motivos tais — inaptidão pedagógica, abandono do cargo, 
condenação criminal — põe em xeque as intenções do governo 
relativas à qualidade e ao compromisso com a escola — com 
a educação —, bem com o controle e a conduta disciplinar. 
Como manter a ordem e a disciplina nos grupos escolares com 
diretores cuja postura não é ilibada nem profissional? No início 
da República, uma visão tal contraria os que queriam reformar 
a sociedade segundo “[...] uma nova hegemonia política e 
social, através de um novo conteúdo, em que a formação da 
moral e do caráter deveriam ser ensinadas [sic]” (SILVA, 2004, 
p. 12).
Diferentemente dos decretos de 1906 e 1911, o de 
1924 regulou a remoção do diretor no art. 369: “Os directores 
de grupos escolares poderão ser livremente removidos por 
conveniência do ensino a juízo do governo” (MINAS GERAIS, 
1924, p. 308). O texto legal não explana o processo de remoção, 
mas passagemde carta do ex-diretor Francisco Mello Franco 
comentada por outrem e transcrita por Guimarães (2007, p. 
203) dá pistas: a nova lei “[...] incompatibiliza a função de 
diretores em grupo onde existam parentes professores [...]”. O 
decreto de 1924 não aponta justificativas para remover dado 
diretor por tais razões, e Guimarães (2007) não especulou essa 
ausência. Uma vez removido o diretor, suas funções, segundo 
o art. 370 do decreto de 1924, “[...] cessarão immediatamente 
[...]”, e ele terá 30 dias para assumir o novo cargo,
[...] salvo si aquella se fizer de um 
estabelecimento para outro na mesma 
localidade. § 1.º Este prazo poderá 
ser prorrogado por mais trinta dias, 
si o requererem, provando legitimo 
impedimento. § 2.º O primeiro prazo será 
contado da data em que fôr publicado, no 
orgão official, o acto da remoção. (MINAS 
GERAIS, 1924, p. 308).
62
Betânia O. Laterza Ribeiro 
Luciana B. O. B. Carvalho
Sandra M. Oliveira
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.37-66 ,
nov. 2015/ fev. 2016
Como a remoção do diretor poderia o afastar do convivo 
familiar, a lei garantia “[...] direito a passes nas estradas de 
ferro, para si e pessoa de sua família, ou a uma ajuda de custo, 
arbitrada pelo Secretario do Interior, no caso do respectivo 
transporte haver de ser feito por outro meio” (MINAS 
GERAIS, 1924, p. 309). A remoção ordenada — conforme o 
art. 373 — poderia ocorrer [...] em qualquer época do anno 
[...]” (MINAS GERAIS, 1924, p. 309); mas a remoção pedida 
pelo diretor pedida só poderia ser acontecer “[...] na vigência 
das férias escolares” (MINAS GERAIS, 1924, p. 309). 
É provável que a ida repentina do diretor para outra 
escola, para outra cidade fosse motivada por divergência pessoal 
ou política com professores, alunos, pais, inspetores e demais 
funcionários da instituição ou autoridades locais; isto é, por 
razões pouco associáveis com a competência profissional, a 
qual o obrigava a permanecer até a ocasião das férias na escola 
de onde queria sair. Se assim o for, então é provável também 
que tais motivações tivessem de ser atestadas por outra voz que 
compunha o sistema de controle, fiscalização e administração 
escolar como responsável por fazer cumprir as atribuições 
que a legislação prescrevia ao cargo de diretor: o inspetor de 
ensino: representante direto do governo que acompanhava a 
escolarização nos distritos e municípios segundo os interesses 
oficiais. 
CONSIDERAÇÕES FINAIS 
Conceber o inspetor e o diretor como “almas” da 
escola permite vê-los como “almas gêmeas” quanto a agir nos 
grupos escolares de Minas, sobretudo do ponto de vista da 
fiscalização (do cumprimento da lei). Na ação fiscalizadora, a 
hierarquia reservava uma posição centralizadora para o diretor 
— porque atuava direta e cotidianamente com o ensino — 
e intermediária para o inspetor — porque mediava a relação 
entre governo e diretor: a ele cabia não o controle constante 
dos grupos escolares, mas a orientação direta pela burocracia 
documental. Nesse sentido, alinhavam-se mais ao governo, 
63
INSPETOR DE ENSINO 
E DIRETOR ESCOLAR 
NA LEGISLAÇÃO 
EDUCACIONAL 
DE MINAS GERAIS 
(1906–24)
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 39-66,
nov. 2015/ fev. 2016
e menos à escola; por isso podem ser vistos como figuras 
centrais na consolidação da educação proposta pela reforma 
João Pinheiro, que centralizava a educação. 
Um e outro traduziram uma nova estrutura 
burocrático-administrativa da escola que racionalizava o 
ensino e o submetia à presença diária de um representante 
do governo: fiscal do ensino primário: do trabalho docente 
e de sua efetivação no ambiente escolar, da disciplina, da 
conduta. Agir como inspetor de ensino e diretor de grupo 
escolar supunha ir além dos muros da escola: esperava-se que 
tivessem conhecimentos que não só os pedagógicos, didáticos 
e administrativos, pois tinham de estimular e articular a 
educação sob o brasão da escola republicana para desenvolver 
a sociedade que circundava o grupo escolar. Assim, agiam em 
prol da consolidação e manutenção não só de um modelo 
escolar, mas também de uma sociedade (a modelar). Para 
isso, esperava-se que tivessem conhecimentos que não só os 
pedagógicos, didáticos e administrativos para agir de modo 
a contribuir para desenvolver a sociedade que circundava o 
modelo do grupo escolar. 
FONTES LEGAIS
MINAS GERAIS. Lei n. 13, de 28 de março de 1835. 
Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1835.
MINAS GERAIS. Mensagem do vice-presidente da 
Província de Minas Gerais Barão de Camargos, dirigida ao 
Congresso Mineiro em 1889, p. 2. Disponível em: http://
www.crl.edu/content.asp?11=4&12=18&13=33&14=22. 
Acesso em: 10 dez. 2011.
MINAS GERAIS. Lei n. 41 de 3 de agosto de 1892. 
Lex: Dá organização à instrução pública do Estado de Minas. 
Imprensa Oficial. Belo Horizonte: 1892.
MINAS GERAIS. Mensagem do vice-presidente da 
Província de Minas Gerais Silviano Brandão, dirigida ao 
Congresso Mineiro em 1893, p. 18. Disponível em: http://
64
Betânia O. Laterza Ribeiro 
Luciana B. O. B. Carvalho
Sandra M. Oliveira
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.37-66 ,
nov. 2015/ fev. 2016
www.crl.edu/content.asp?11=4&12=18&13=33&14=22. 
Acesso em: 10 dez. 2011.
MINAS GERAIS. Mensagem do vice-presidente da 
Província de Minas Gerais Francisco Salles, dirigida ao 
Congresso Mineiro em 1903, p. 30. Disponível em: http://
www.crl.edu/content.asp?11=4&12=18&13=33&14=22. 
Acesso em: 10 dez. 2011.
MINAS GERAIS. Lei n. 439, de 28 de setembro 
de 1906, autoriza o governo a reformar o ensino primario, 
normal e superior do estado e dá outras providencias. Belo 
Horizonte: Imprensa Oficial, 1906a.
MINAS GERAIS, Decreto n. 1.947, de 30 de dezembro 
de 1906. Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1906b 
MINAS GERAIS. Relatório do secretário do Interior 
ao Presidente do Estado, 1908, p. 37. Arquivo Público 
Mineiro (APM). Secretaria do Interior (SI). Relatórios do 
Secretário do Interior ao Presidente do Estado de Minas 
Gerais, 1906–1913. Belo Horizonte, MG. 
MINAS GERAIS. Decreto n. 3.191, de 9 de junho de 
1911. Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1911.
MINAS GERAIS. Decreto n. 6.655, de 19 de agosto 
de 1924. Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1924.
REFERÊNCIAS 
ARAUJO, J. C. S. Os grupos escolares em Minas Gerais 
como expressão de uma política pública: uma perspectiva 
histórica. In: VIDAL, D. Grupos escolares: cultura escolar 
primária e escolarização da infância no Brasil (1893–1971). 
Campinas: Mercado de Letras, 2007.
ARQUIVO PÚBLICO MINEIRO. Direção de grupo 
escolar: Pasta SI 3681. Belo Horizonte, 1916.
BOMENY, H. Guardiões da razão: modernistas 
mineiros. Rio de Janeiro: ed. UFRJ/Tempo Brasileiro, 1994.
65
INSPETOR DE ENSINO 
E DIRETOR ESCOLAR 
NA LEGISLAÇÃO 
EDUCACIONAL 
DE MINAS GERAIS 
(1906–24)
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 39-66,
nov. 2015/ fev. 2016
DEMARTINI, Z. B. F.; ANTUNES, F. F. Magistério 
primário: profissão feminina, carreira masculina. Cadernos 
de Pesquisa, São Paulo, n. 86, p. 5–14, ago.1993.
FARIA FILHO, L. M.; VAGO, T. M. A reforma João 
Pinheiro e a modernidade pedagógica. In: _____. Lições de 
Minas. 70 anos da Secretaria de Educação. Belo Horizonte, 
Governo de Minas Gerais, setembro de 2000.
GATTI JÚNIOR, D. et al. História e memória 
educacional: gênese e consolidação do ensino escolar no 
Triângulo Mineiro. Revista História da Educação, Pelotas, v. 
2, p. 5–28, set., 1997.
GONÇALVES, I. A. Cultura escolar: práticas e 
produção os grupos escolares em Minas Gerais (1891–1918). 
Belo Horizonte: Autêntica/FCH-FUMEC, 2006.
GUIMARÃES, R. M. C. Templo do bem: o grupo 
escolar de Uberaba, na escolarização republicana (1908–
1918), 2007. 230 f. Dissertação (Mestrado em Educação) — 
Faculdade de Educação, Universidade Federal de Uberlândia.
HAMDAN,J. C. Do método intuitivo à escola ativa: o 
pensamento educacional de Firmino Costa (1907 – 1937), 2007. 
230 f. Tese (Doutorado em Educação) — Faculdade de Educação, 
Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte.
IANNI, O. Estado e capitalismo. São Paulo: 
Brasiliense, 1988.
LEÃO, A. C. Introdução à Administração Escolar. 
São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1945.
LE GOFF, J. História e memória. Campinas: ed. 
UNICAMP, 1990.
MOURÃO, P. K. C. O ensino em Minas Gerais no 
tempo da República: 1889/1930. Belo Horizonte: Centro 
Regional de Pesquisas Educacionais, 1962.
NAGLE, J. Educação e sociedade na primeira 
República. São Paulo: ed. USP, 2001.
OLIVEIRA, E. de, Reforma de ensino público 
primário e normal em Minas: Relatório apresentado ao 
secretario do Interior de Minas Gerais, pelo comissionado 
Estevam de Oliveira, Belo Horizonte: Imprensa Oficial, 1902.
66
Betânia O. Laterza Ribeiro 
Luciana B. O. B. Carvalho
Sandra M. Oliveira
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.37-66 ,
nov. 2015/ fev. 2016
OLIVEIRA, R. T. C. Legislação educacional como 
fonte história da educação brasileira. Texto elaborado para 
videoconferência organizada pelo HISTEDBR e apresentado na 
Faculdade de Educação/UNICAMP, em 29.9.2005. Disponível 
em: <http://www.histedbr.fae.unicamp.br/.../Regina%20_
Tereza_Cestari_de_Oliv...>. Acesso em: 4 out. 2011.
SCHUELLER, A. F. M.; MAGALDI, A. N. B. M.. 
Educação escolar na Primeira República: memória, história 
e perspectivas de pesquisa, p. 32 a 53, 2008. Disponível em: 
<http://www.scielo.br/pdf/tem/v13n26/a03v1326.pdf>. 
Acesso em: 5 nov. 2011.
SILVA, J. C. Utopia positivista e instrução pública no Brasil. 
HISTEDBR On-line, Campinas, n.16, p. 10–16, dez. 2004
SOUZA, R. F. Templos de civilização: a implantação 
da escola primária graduada no Estado de São Paulo (1890–
1910). São Paulo: ed. UNESP, 1998.
TORRES, J. C. O. História de Minas Gerais. Belo 
Horizonte: Lemi; Brasília: INL, 1980.
VAGO, T. M. Sobre o “sonho glorioso de derramar sobre 
a infância mineira o balsamo vivificador do ensino publico”: 
fragmentos de recepção da reforma do ensino primário em 
municípios das Minas Gerais (1906–1912). Currículo sem 
Fronteiras, Portugal, Universidades do Rio Grande do Sul e 
Pelotas, v. 9, n.1, p.103–134, jan./jun. 2009. 
VEIGA, C. G. A formação dos educadores: entre os 
mitos e a história. Educação Revista, Belo Horizonte, n. 15, 
p. 14–20, jun. 1999.
VIDA ESCOLAR. Boletim quinzenal do Grupo Escolar 
de Lavras. Lavras, ano 2, n. 25, 1908
VIEIRA, L. C. Das escolas isoladas ao grupo escolar: 
a instrução pública primaria em Mariana – MG (1889–1915), 
2011, 135 f. Dissertação (Mestrado em Educação) — Faculdade 
de Educação, Universidade Federal de São Carlos, 2011.
Data de recebimento: setembro de 2014
Data de aceite: junho de 2015
67
Formação continuada do 
professor universitário: 
orientação de estágio 
com pesquisa
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 71-98,
nov. 2015/ fev. 2016
FORMAÇÃO CONTINUADA DO 
PROFESSOR UNIVERSITÁRIO: 
ORIENTAÇÃO DE ESTÁGIO 
COM PESQUISA
 Cláudia Chueire de Oliveira1
Maura Maria Morita Vasconcellos2
Neusi Aparecida Navas Berbel 3
Resumo
Este texto é um dos resultados da pesquisa A teoria e a prática 
da Metodologia da Problematização com o Arco de Maguerez: 
um processo em construção. O objetivo foi extrair lições da 
experiência de construir conhecimentos teórico-práticos da 
vivência dessa metodologia em estágio curricular do Curso 
de Pedagogia. Entre os conhecimentos gerados, houve a 
preocupação de destacar os componentes de formação 
continuada da equipe de docentes envolvidas. O processo 
registrado pelas supervisoras / pesquisadoras, decorrente das 
observações e discussões, e os relatórios de estágio dos alunos 
formaram o conjunto de informações tratado na pesquisa, 
de cunho exploratório-descritivo. Como resultado, as lições 
extraídas confirmam a viabilidade de desenvolvimento do 
processo de ensino com pesquisa em cursos de graduação, 
a importância do papel da supervisão permanente, 
intencional e sistematizada no estágio e a possibilidade 
de desenvolvimento de trabalhos com a Metodologia da 
Problematização como alternativa efetiva para os objetivos de 
estágio, para o propósito de formar o professor-pesquisador e 
para a formação continuada do docente do ensino superior.
1 Cláudia Chueire de Oliveira – Universidade Estadual de Londrina (UEL). 
 E-mail: cchueire@uel.br
2 Maura Maria Morita Vasconcellos – Universidade Estadual de Londrina (UEL).
 E-mail: mauramorita@uel.br
3 Neusi Aparecida Navas Berbel – Universidade Estadual de Londrina (UEL).
 E-mail: berbel@uel.br
68
Cláudia Chueire de Oliveira
Maura Maria M. Vasconcellos
Neusi Aparecida N. Berbel
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.67-98 ,
nov. 2015/ fev. 2016
Palavras-chave: Formação de professores; Ensino superior; 
Prática pedagógica.
Abstract
This study is one of the results obtained from the research 
entitled “Theory and Practice of the Problematization 
Methodology with Maguerez’s Arch: a process under 
construction”. The objective was to withdraw lessons from 
the theoretical-practical knowledge construction within 
this methodology’s experience during a Pedagogy course’s 
curricular internship. Amongst the generated knowledge, 
there was a concern to emphasize the involved team of 
professors’ continuous education components. The progress 
recorded by the supervisors/researchers deriving from the 
observations and discussions, in addition to the students’ 
internship reports, composed the set of information which 
was worked on in this research, of an exploratory-descriptive 
nature. As a result, the lessons extracted have confirmed the 
viability of the teaching process development allied with 
research in undergraduate courses, as well as the important 
role of permanent, intentional and systematized supervision 
during internship. And it also reveals the possibility of 
developing studies with the Problematization Methodology 
as an effective alternative for meeting internship objectives, 
with the aim of preparing the teacher-researcher and with 
the intention of promoting the higher education teacher’s 
continuous pedagogical improvement. 
Keywords: Teachers’ education; Higher education; 
Pedagogical practice.
Resumen
Este texto es uno de los resultados de la investigación “La 
teoría y la práctica de la Metodología de la Problematización 
con el Arco de Maguerez: un proceso en construcción”. El 
objetivo fue extraer lecciones de la experiencia de construir 
conocimientos teórico-prácticos de la vivencia de esa 
metodología en la práctica curricular del curso de Pedagogía. 
Entre los conocimientos generados, hubo la preocupación 
de destacar los componentes de formación continuada 
69
Formação continuada do 
professor universitário: 
orientação de estágio 
com pesquisa
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 71-98,
nov. 2015/ fev. 2016
del equipo de docentes envueltos. El proceso registrado 
por las supervisoras/ investigadoras decurrentes de las 
observaciones y discusiones y los informes de práctica de 
los alumnos formaron el conjunto de informaciones tratado 
en la investigación, de cuño exploratorio descriptivo. Como 
resultado, las lecciones extraídas confirman la viabilidad del 
desarrollo del proceso de enseñanza con pesquisa en cursos 
de graduación, la importancia del papel de la supervisión 
permanente, intencional y sistematizada en la práctica y la 
posibilidad de desarrollo de trabajos con la Metodología 
de la Problematización como alternativa efectiva para los 
objetivos de la práctica, para el propósito de formar al 
profesor investigador y para la formación continuada del 
docente de la enseñanza superior.
Palabras clave: Formación de profesores;Enseñanza superior; Práctica pedagógica. 
71
Formação continuada do 
professor universitário: 
orientação de estágio 
com pesquisa
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 71-98,
nov. 2015/ fev. 2016
FORMAÇÃO CONTINUADA DO 
PROFESSOR UNIVERSITÁRIO: 
ORIENTAÇÃO DE ESTÁGIO 
COM PESQUISA
O presente texto aborda uma instância da educação 
brasileira merecedora de atenção especial, em razão de que as 
pesquisas relativas ao tema ainda se caracterizam por estudos 
que estão em constituição rumo à sólida produção científica. 
Trata-se do docente da educação superior e dos processos 
de sua formação pedagógica. “Estas linhas ousam pensar a 
educação e o educador a partir do que o educador faz. Um 
caminho tão óbvio quanto raro”. Com estas palavras, Codo e 
Vasques-Menezes (1999, p. 17) nos convidam à reflexão sobre 
a prática social – educação, como objeto de estudo completo 
e complexo. Isto porque é impossível pensar educação sem 
considerar filosofia ou política educacional, ou ainda, teoria 
pedagógica. Da mesma forma, segundo os mesmos autores, 
“[...] também é inócuo pensar a educação na ausência do que 
faz o educador” (p. 17).
Como pedagogas, docentes e pesquisadoras da área da 
Didática, renovamos, constantemente, o propósito de pesquisa 
sobre a educação superior e os aspectos pedagógicos que se 
voltam para a formação do professor neste e para este nível. 
Consideramos que a prática da construção de conhecimento 
nas salas de aula das universidades é favorecedora dos processos 
de formação docente.
Nesse campo amplo e fértil de construção, verificamos 
que uma das possibilidades de investigação, surgida da 
necessidade de entender parte da nossa prática profissional 
docente, estava relacionada aos estágios supervisionados 
na graduação. O estágio no Curso de Pedagogia, na nossa 
instituição de ensino, é considerado:
72
Cláudia Chueire de Oliveira
Maura Maria M. Vasconcellos
Neusi Aparecida N. Berbel
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.67-98 ,
nov. 2015/ fev. 2016
[...] conjunto de atividades elaboradas com 
o objetivo de promover oportunidades de 
aprendizagem profissional, social e cultural, 
através da participação em situações reais de 
trabalho, envolvendo supervisores, estudantes 
e campos de estágio. A especificidade do 
Curso de Pedagogia é lidar com o espaço 
educacional, sendo seu objeto de trabalho as 
situações de ensino e aprendizagem em suas 
múltiplas manifestações (UNIVERSIDADE 
ESTADUAL DE LONDRINA, 2005, p. 59) 
Por outro lado, enquanto desenvolvemos e orientamos 
trabalhos com a Metodologia da Problematização por meio 
do Arco de Maguerez, temos tido a oportunidade de refletir 
com nossos alunos e outros interessados, além de ouvir muitas 
observações e manifestações de interesse em conhecer sobre as 
implicações de seu uso. 
Desse modo, em consonância com os aspectos acima 
descritos, a disciplina de estágio foi tomada como oportunidade 
de pesquisa e considerou-se a Metodologia da Problematização 
como uma alternativa que poderia contribuir para o processo 
de formação do professor, incluindo a investigação e a 
ação transformadora. Consideramos ainda que a proposta 
permitiria a superação da: 
[...] formação estritamente técnica, uma vez 
que o profissional da educação é, por dever 
de oficio, uma pessoa. A complexidade do 
ato educativo, que envolve seres humanos em 
interação, exige a participação total de todos 
os seus protagonistas, especialmente daqueles 
que são profissionalmente responsáveis por 
essa ação. (UNIVERSIDADE ESTADUAL 
DE LONDRINA, 2005, p. 5) 
Com inspiração em trabalhos com a Metodologia da 
Problematização através do Arco de Maguerez – M. P. (BERBEL; 
OLIVEIRA; VASCONCELLOS; GOMES; SOUZA, 2001 e 
OLIVEIRA; BERBEL; VASCONCELLOS, 2006), elegemos 
73
Formação continuada do 
professor universitário: 
orientação de estágio 
com pesquisa
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 71-98,
nov. 2015/ fev. 2016
como problema de estudo a questão: “Quais as possibilidades 
de utilização da Metodologia da Problematização – M. P. 
em estágios acadêmicos junto à realidade escolar?”. Para 
responder ao problema formulado, priorizamos o objetivo de 
ampliar a construção do conhecimento teórico-prático sobre 
a Metodologia da Problematização com o Arco de Maguerez 
em situação de ensino com pesquisa no âmbito da formação 
de professores no ensino superior. Focalizamos a pesquisa 
nos estágios curriculares no Curso de Pedagogia de nossa 
instituição, registrando o processo vivenciado e contando com 
a análise de 24 relatórios de estágio, elaborados pelas alunas.
Tal proposta orientou-se pelo desafio de estabelecer 
um processo efetivo de relação entre a teoria e a prática, de 
modo que as ações de cada etapa da M. P. fizessem sentido e 
contribuíssem para a formação profissional não só das alunas, 
como nossa. Consideramos que “o exercício da docência nunca 
é estático e permanente, é sempre processo [...] e a relação da 
teoria com a prática é sempre mediada pela cultura, e essa 
condição precisa ser percebida pelo professor” (CUNHA, 
2007, p. 16). 
Os cursos de formação de professores preocupam-
se cada vez mais em estabelecer como meta a formação de 
profissionais que reflitam sobre o seu fazer, sejam capazes 
de analisá-lo criticamente e de confrontá-lo com os saberes 
teóricos construídos na academia e possam produzir, a partir 
desse confronto crítico, novos conhecimentos. Assim, ao 
mesmo tempo que as estagiárias passariam pelas atividades 
relativas a cada etapa prática do estágio com a Metodologia da 
Problematização, incluindo a fundamentação teórica e o registro 
de todo o percurso, o planejamento, o acompanhamento e a 
avaliação da execução aconteceriam por parte das professoras 
supervisoras (pesquisadoras), por intermédio de reuniões 
constantes da equipe e do registro descritivo e analítico do 
processo. Nossa pretensão foi também construir sínteses 
reveladoras de lições extraídas da prática com a M. P., no 
trabalho de reflexão teórico-prática em equipe, como condição 
74
Cláudia Chueire de Oliveira
Maura Maria M. Vasconcellos
Neusi Aparecida N. Berbel
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.67-98 ,
nov. 2015/ fev. 2016
de formação continuada na área da Didática da universidade a 
que pertencemos. Isaia (2000, p. 21) expressa que a trajetória 
profissional: “[...] envolve uma multiplicidade de gerações que 
não só se sucedem, mas se entrelaçam na permanente tarefa de 
produzir o mundo. Assim cada uma, em um mesmo percurso 
histórico, possui papel diferenciado nessa tessitura” 
Nosso percurso metodológico de pesquisa qualitativa, 
descritiva e analítica, teve apoio em Lüdke e André (1986) 
e Richardson (1999), entre outros. A existência de uma 
“[...] relação dinâmica entre o sujeito e o objeto em vínculo 
indissociável entre o mundo objetivo e a subjetividade do 
sujeito”, destacada por Chizzotti (1991, p. 79), justificou 
nossa opção metodológica, visto que ele alerta que:
[...] o conhecimento não se reduz a um rol 
de dados isolados, conectados por uma teoria 
explicativa; o sujeito-observador é parte 
integrante do processo de conhecimento e 
interpreta os fenômenos, atribuindo-lhes 
um significado. O objeto não é um dado 
inerte e neutro; está possuído de significados 
e relações que os sujeitos concretos criam em 
suas ações (p. 79).
Orientadas por tais pressupostos, pensamos que a 
explicitação dos aspectos e condições do uso da Metodologia 
da Problematização nas diferentes situações poderia vir a 
servir de referência para outros usos, sempre com a necessária 
consideração do contexto e das particularidades de cada caso. 
Além disso, a variedade de situações descritas e analisadas, 
pelas lições delas extraídas, poderia constituir uma forma de 
enriquecer essas referências para outros momentos,outros 
sujeitos e outros contextos, entendendo, como Bogdan e Biklen 
(1994), que a utilidade de determinado estudo é a capacidade 
que tem de gerar teoria, descrição e compreensão. Para estes 
autores: “os investigadores qualitativos acreditam que as 
situações são complexas e, deste modo, tentam descrever muitas 
dimensões e não restringir o campo de observação” (p. 68).
75
Formação continuada do 
professor universitário: 
orientação de estágio 
com pesquisa
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 71-98,
nov. 2015/ fev. 2016
Complementando a ideia acima descrita, Bogdan 
e Biklen (1994, p. 67) afirmam que “os objetivos dos 
investigadores qualitativos é o de melhor compreender o 
comportamento e experiência humanos. Tentam compreender 
o processo mediante o qual as pessoas constroem significados 
e descrever em que consistem esses significados”. Trazendo 
estas ideias para nosso campo de atuação, deduzimos que não 
basta ao professor, enquanto profissional, e ao profissional 
que ele prepara, o conhecimento teórico já acumulado 
da área científica com a qual eles lidam. É preciso inserir 
o conhecimento teórico sobre a sua prática social como 
profissional e como homem que participa da construção da 
história de seu tempo. 
Entre os aspectos que merecem ser esclarecidos pelo 
homem, está a sua própria prática social. Para que ele possa 
cumprir plenamente sua dimensão mais propriamente 
humana, é preciso ascender ao plano da criação, ao plano 
da instauração de uma nova realidade que não existe por si 
só, mas somente pela sua própria atividade transformadora. 
Com base neste princípio, orientamos nossas alunas de 
Pedagogia a vivenciarem as cinco etapas da Metodologia 
da Problematização, para construírem seu processo de 
problematizar a realidade escolar, estudar e se preparar até 
o ponto de poderem intervir sobre esta parcela da realidade 
com algum grau de contribuição/transformação, atribuindo 
sentido científico, pedagógico e político a essa atividade 
curricular de seu processo formativo. Vale destacar que o 
processo de orientação das alunas foi para nós um exercício 
de problematizar nossa realidade, estudar e intervir sobre a 
parcela da realidade com a qual estávamos envolvidas, mas, 
sobretudo, atribuímos maior sentido científico, pedagógico 
e político às nossas atividades acadêmicas em nosso processo 
formativo docente. Consideramos ainda que, em cada ação 
docente, há o coletivo dos participantes nela envolvidos, seja 
no ensino ou na pesquisa, como fontes de conhecimentos ou 
76
Cláudia Chueire de Oliveira
Maura Maria M. Vasconcellos
Neusi Aparecida N. Berbel
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.67-98 ,
nov. 2015/ fev. 2016
de ressignificação dos mesmos. Leite (2000) é quem oferece 
suporte para esta reflexão:
O que parece qualificar essa ação é o próprio 
processo que a sustenta, o processo de dar voz 
a conhecimentos antes ausentes, oprimidos 
ou subjugados. Na busca e no processo, 
experimentam-se rupturas. No horizonte, 
está presente a idéia de uma sociedade 
mais justa e igualitária, está a questão da 
sobrevivência, da satisfação das necessidades 
humanas, das mais básicas às mais complexas. 
O conhecimento construído responde 
a essas necessidades, que têm contornos 
diversos, que são trazidas da prática concreta 
para a discussão e o aprofundamento na 
universidade. Esse conhecimento se gera 
e se nutre a partir do coletivo, formado, 
muitas vezes, por categorias subalternas 
da sociedade (longe da sala de aula), pela 
categoria dos trans-indivíduos – estudantes, 
junto com a categoria dos professores. 
Os docentes passam a ser, nessa relação, 
os mediadores de um conhecimento que, 
enquanto se constrói no coletivo, contribui 
para sua autoformação. Sobre essa base, a das 
necessidades humanas refletidas no coletivo, 
assenta-se a valorização das coisas através 
do trabalho – físico, manual, intelectual –, 
mas tendo sempre presente seu caráter de 
transformação (p. 57).
Esforçamo-nos ainda para garantir, de acordo com 
Severino (2000), o desenvolvimento de um trabalho de 
pesquisa e de reflexão que fosse “pessoal, autônomo, criativo e 
rigoroso”. “Pessoal”, no sentido de que o nosso envolvimento 
com os objetivos da investigação fizesse parte de nossa vida 
profissional, tal como afirma o mesmo autor:
A temática deve ser realmente uma 
problemática vivenciada pelo pesquisador, 
ela deve lhe dizer respeito. Não obviamente 
num nível puramente sentimental, mas 
77
Formação continuada do 
professor universitário: 
orientação de estágio 
com pesquisa
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 71-98,
nov. 2015/ fev. 2016
no nível da avaliação da relevância e da 
significação dos problemas abordados para o 
próprio pesquisador, em vista de sua relação 
com o universo que o envolve. (SEVERINO, 
2000, p. 145)
O caráter “pessoal” do trabalho de pesquisa, segundo este 
autor, tem uma dimensão social que lhe confere um sentido 
político, sua contribuição para o mundo dos homens. Neste 
caso, o olhar das estagiárias trouxe considerações relacionadas à 
nossa atuação como supervisoras, demonstrando nossa parcela 
de contribuição. Trazemos, aqui, alguns dos exemplos relatados 
e registrados pelas alunas em seus relatórios de estágio:
Vale destacar que a professora [...] com seu 
jeito [...] de orientar, provou que o professor 
realmente influencia na formação do aluno, 
passando segurança, gosto pela investigação, 
disciplina e ordenamento lógico da reflexão. 
(Relatório 15).
A concretização do trabalho não seria possível 
sem o acompanhamento das professoras 
envolvidas, que sempre estavam atentas ao 
ato de orientar e educar todas as alunas [...]. 
(Relatório 20).
As manifestações das alunas nos levaram a confirmar que 
é necessário estabelecer uma relação pessoal e social inerente 
à formação de professores, visto que o olhar e o agir “atentos” 
na supervisão das atividades foram marcados também pela 
certeza da natureza investigativa da docência. Portanto, o 
caráter pessoal ampliou-se para o social e político do processo 
de docência no qual estamos envolvidas cotidianamente. Em 
outras palavras, vivenciamos docência tomando por base a 
investigação sobre uma maneira de exercê-la, supervisionando 
estágios em curso de formação de docentes, e atribuímo-nos 
a possibilidade de intervir no mundo dos homens por meio 
de nós mesmas e de nossas alunas, procurando atingir o 
objetivo de expandir a construção do conhecimento teórico-
78
Cláudia Chueire de Oliveira
Maura Maria M. Vasconcellos
Neusi Aparecida N. Berbel
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.67-98 ,
nov. 2015/ fev. 2016
prático de uma situação de ensino com pesquisa. Como 
resultado deste processo, o desenvolvimento pessoal foi visto 
no trajeto do grupo, já que cada sujeito interagiu com outros 
que possibilitaram a pavimentação de um conhecer mais 
coletivo, construído na relação educativa que estabelecemos, 
na mediação ensino com pesquisa que proporcionamos, tendo 
como protagonistas docentes e alunas.
Cunha (2000) ajuda nesta discussão quando expressa a 
importância do componente pessoal: 
[...] pois só a sensibilidade humana pode 
intervir interpretativa e interativamente 
no conhecimento. Essa função é ser ponte 
entre o conhecimento disponível de todas as 
maneiras e as estruturas cognitivas, culturais 
e afetivas dos educandos. Venho defendendo 
que é nessa direção que precisamos 
reconstruir a função docente, aceitando 
o desafio de uma nova perspectiva para a 
profissionalização (p. 48).
Outro ponto enfatizado por Severino (2000) é o trabalho 
“autônomo”, entendido como fruto de um esforço próprio 
dos pesquisadores, num trabalho que, ao mesmo tempo 
em que incorpora a contribuição de outros, busca superá-
lo pelo pensamento autônomo. Isto significa afirmarque o 
sentido de nossa formação nos levou a um aprofundamento 
científico-profissional e didático-pedagógico para conduzir e 
tratar, teoricamente, a nossa própria prática, superando-a pela 
relação estabelecida entre ensino e pesquisa. Como anuncia 
um relatório de estágio:
Esta metodologia [...] é diferente do que estou 
acostumada. Em todos os trabalhos que realizei, 
pude verificar e comprovar em livros, nas 
opiniões dos autores para escrever sobre o assunto. 
Agora vou poder escrever, além da opinião dos 
autores, a minha própria opinião, através do 
que pude verificar da realidade [...] (R22).
79
Formação continuada do 
professor universitário: 
orientação de estágio 
com pesquisa
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 71-98,
nov. 2015/ fev. 2016
A manifestação das alunas no Relatório 22 permitiu que 
verificássemos que a situação da pesquisa no ensino favorece 
a apreciação de um dado objeto de estudo por três diferentes 
caminhos: na tomada de posse da literatura pedagógica ou na 
percepção dos cientistas da área sobre o assunto, no saudável 
confronto com a realidade em questão, e na expressão de outro 
olhar, próprio de quem vê, em relação aos dois primeiros. 
Sob a perspectiva acima descrita e com base em Bogdan 
e Biklen (1994) e Lüdke e André (1986), colocamos em prática 
algumas das características da pesquisa qualitativa. Procuramos 
descrever as informações colhidas em diferentes momentos e 
analisá-las, considerando o processo de desenvolvimento dos 
estágios, na forma de construção de abstrações sobre a realidade 
em busca de significados, componente de vital importância na 
pesquisa.
Da ação contida na realidade e da compreensão inicial 
sobre ela, extrai-se um tipo de saber, um tipo de pensar e agir 
sobre o meio. Pela ação de investigação e reflexão durante 
o processo, chega-se a outro nível de compreensão, mais 
organizado, mais justificado teoricamente e mais consciente 
política e socialmente. Tais movimentos permitiram a nós, 
alunas e docentes, a conquista de graus diferenciados de 
autonomia e liberdade pelo conhecimento, pelas habilidades 
intelectuais desenvolvidas e graus diferenciados de consciência 
política, pela percepção do nosso papel social dentro de um 
contexto multideterminado. Leite (2000) é quem auxilia na 
percepção do processo vivido ao explicitar as categorias de 
autoria, protagonismo e complementaridade na construção 
do conhecimento. 
Autoria e protagonismo: Todos produzem 
conhecimento e, por isso, são autores, 
qualquer que seja a condição da sua 
possibilidade de abstração; os sujeitos 
são protagonistas da ação de produzir; os 
conhecimentos estão em circulação e, a 
cada nova necessidade, problema, interesse, 
precisam ser puxados da gaveta do cotidiano, 
80
Cláudia Chueire de Oliveira
Maura Maria M. Vasconcellos
Neusi Aparecida N. Berbel
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.67-98 ,
nov. 2015/ fev. 2016
da gaveta teórica, da gaveta do laboratório, 
da gaveta da tecnologia, de uma, de muitas 
ou de todas as gavetas ao mesmo tempo. 
O grupo, tanto quanto cada sujeito, é 
presença nucleada, central, protagonista da 
construção coletiva. [...] Complementaridade: 
Os conhecimentos e saberes estão em 
ebulição permanente; os fragmentos são 
instâncias de um todo que se refaz em um 
processo vital (com vida porque atende a 
necessidades); a complementaridade pode 
ser trans e interdisciplinar; pode ser inter e/
ou correlacional; pode se dar entre a prática 
concreta relatada e a teoria repensada e 
revisitada com diferentes olhares (LEITE, 
2000, p. 57, grifos da autora).
Neste caso, a multideterminação da autoria, do 
protagonismo e da complementaridade na formação de 
professores ocorreu em três dimensões: das alunas de 
Pedagogia em relação aos cursos de formação de docentes em 
nível médio; da nossa, enquanto formadoras de formadores de 
professores; e como pesquisadoras da educação que ocorre nos 
processos gerais de formação de professores. 
Ainda de acordo com Severino (2000), o desenvolvimento 
do trabalho de pesquisa deve ser criativo. Ser “criativo” 
consiste em não só aprender e apropriar-se de conhecimentos 
acumulados, mas, em avançar nesse conhecimento, almejando 
o seu desvendamento e sua explicação, numa busca de 
esclarecimentos originais para o assunto, até então não 
percebidos. Esta é uma perspectiva distinta da apropriação do 
conhecimento, porque é decorrente de uma ação didática, no 
nosso caso, a de possibilitar a um grupo de alunas a produção 
de conhecimento e, simultaneamente, produzir conhecimento 
a partir daquela produção e de forma intencional. O 
depoimento escrito em um relatório explicita:
[...] trabalharmos com a realidade, isto é, 
com o concreto, foi de grande valia. Agora 
entendemos o que é uma pesquisa, uma 
81
Formação continuada do 
professor universitário: 
orientação de estágio 
com pesquisa
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 71-98,
nov. 2015/ fev. 2016
investigação, acreditando que esta não deva 
ficar só no papel, mas que, ao levantarmos 
os problemas, temos clareza que devemos 
retornar à realidade a fim de contribuir para 
a solução do problema (R15).
Autores, como Pimenta (1995), Piconez (2001), Moraes 
(1982), entre outros, têm chamado a atenção para situações 
precárias de estágios, mesmo dentro de um currículo em que 
se estabelece a docência como base da formação do Pedagogo. 
Concordamos com Alves e Garcia (1993) quando afirmam:
[...] a teoria precisa ser permanentemente 
confrontada com o concreto social/escolar, e 
este ser olhado a partir da teoria, recuperando-
se a unidade dialética teoria-prática. Mas 
apreender o real exige mais do que o olhar 
da Filosofia, Sociologia, Psicologia ou 
Antropologia. Exige a articulação das 
diferentes áreas do conhecimento na 
interdisciplinaridade, redefinindo métodos e 
categorias (p. 77).
De modo especial, a nosso ver, o papel do supervisor 
de estágio contempla a função de mediador junto aos alunos 
no confronto teórico-metodológico das mais diversas 
situações, propiciando-lhes vivenciar formas inovadoras de 
interação com a realidade e entre os saberes. Tal aspecto 
permite que os espaços/tempos de estágios para supervisores e 
alunos sejam locus da produção de conhecimento (PICONEZ, 
2001). Percebemos, durante o processo, que a adoção de uma 
postura crítica permitiu estabelecer relações dialógicas entre os 
saberes acadêmicos e os fazeres profissionais da nossa prática 
pedagógica, que não está circunscrita apenas à academia, mas 
ao sentido dela na formação de pessoas. 
Por último, preocupamo-nos em realizar um trabalho 
de pesquisa “rigoroso”, caracterizado pela logicidade, pela 
competência, pelo empenho e compromisso, sem os quais 
não há ciência e nem resultados válidos. Como pesquisadoras, 
descrevemos as informações colhidas em diferentes momentos 
82
Cláudia Chueire de Oliveira
Maura Maria M. Vasconcellos
Neusi Aparecida N. Berbel
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.67-98 ,
nov. 2015/ fev. 2016
antes de analisá-las. Tivemos a preocupação com o processo 
de desenvolvimento dos estágios e, consequentemente, 
com a elaboração dos nossos registros escritos sobre o 
mesmo. Encontramos nos relatórios das alunas indicação do 
rigor científico, favorecedor da aprendizagem, tal como o 
exemplificamos: 
Realizar este trabalho utilizando a 
Metodologia da Problematização foi uma 
experiência gratificante, pois a forma como 
as etapas dessa metodologia é organizada 
permite visualizar passo a passo uma 
pesquisa científica em todo o seu rigor e 
sistematização (R 22).
Tivemos o cuidado de nos manter centradas no eixo 
da investigação e na atuação comum na orientação e no 
acompanhamento das estagiárias (seja em duplas, como a 
maioria se organizou, seja individualmente ou em trios),porque sabíamos que convivíamos com uma variedade de 
manifestações, as quais pudemos confirmar pelos relatórios, em 
relação à construção de processos e resultados bastante variados.
Este fato nos levou a algumas ponderações. Em primeiro 
lugar, o nosso reconhecimento das inúmeras especificidades 
relativas à nossa formação e experiência como supervisoras 
de estágio. As múltiplas expressões das estagiárias, em termos 
de conhecimentos e experiências prévias, de capacidade de 
elaboração pessoal dos objetivos de estudo e até mesmo de 
captação das orientações recebidas, foi outro ponto importante 
para ponderar. 
Para explicar os dois destaques relatados anteriormente, 
encontramos em Marques (1989) a afirmação de que, sendo 
parte do sistema escolar, a universidade atende à demanda 
da produção permanente do saber que implica a superação 
de um saber anterior e até mesmo a negação de um saber já 
estabelecido. É nesse momento que a universidade produz 
conhecimento, exercendo a crítica do saber. Portanto, a função 
do docente-pesquisador não pode ser exercida abstratamente, 
83
Formação continuada do 
professor universitário: 
orientação de estágio 
com pesquisa
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 71-98,
nov. 2015/ fev. 2016
ela se constrói e, ao mesmo tempo, é construída, recriada 
e atualizada por meio das ações e práticas de indivíduos e 
grupos que atuam numa determinada organização social, 
administrativa e pedagógica. Entre outras atividades, o ensino 
pode contribuir para a criação de um clima de efervescência 
intelectual que desemboca num determinado problema de 
pesquisa, e a pesquisa pode trazer algo novo que se expõe a 
uma avaliação determinativa de limites e possibilidades que o 
conhecimento produzido traz para a transformação da prática 
social. (MARQUES, 1989).
Entendemos que tal diversidade se constituiu em fator 
de enriquecimento quando colocada à disposição do outro, 
em situação de estudo/investigação. Não tivemos por objetivo 
controlar tais variáveis presentes no grupo e sim verificar a 
viabilidade e validade da utilização da M. P. num estágio 
curricular do Curso de Pedagogia. Importava-nos muito 
mais a provocação para o desenvolvimento de habilidades 
de pensamento de nossas alunas para construir uma postura 
mais científica diante das questões da educação do que o 
próprio tema, já que este último poderia ser um entre muitos 
associados ao problema eleito e aos objetivos do estágio.
Desta forma, a construção do processo de pesquisa das 
alunas foi um grande aprendizado para nós, considerando-se 
que, além dos rituais de desenvolvimento de uma pesquisa, 
havia a preocupação com a elaboração de um processo de 
ensino parceiro na construção de conhecimentos pedagógicos. 
Esta parceria é, primeiro, conceitual, visto que:
[...] educação e formação são fenômenos 
políticos e sociais e têm interesse público, 
[portanto] as funções da instituição 
educativa têm seu foco central na formação, 
entendida aqui em seus sentidos plenos de 
emancipação pessoal e participação ativa 
na construção da sociedade democrática, 
conjuntamente com o desenvolvimento da 
ciência, o enfrentamento crítico [...]. (DIAS 
SOBRINHO, 2003, p. 8-9) 
84
Cláudia Chueire de Oliveira
Maura Maria M. Vasconcellos
Neusi Aparecida N. Berbel
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.67-98 ,
nov. 2015/ fev. 2016
Sob esta perspectiva, podemos asseverar que nossa 
formação baseada no conhecimento didático-pedagógico 
foi sendo incorporada por ações sistemáticas que foram 
experienciadas em uma proposta dupla de docência e pesquisa 
em seus sentidos plenos. As reflexões geradas pelas práticas 
significaram mais uma fonte de transformação do agir 
cotidiano, conjuntamente com o desenvolvimento da ciência. 
Em outros momentos, anunciamos que o peso de 
analisar o ensinar e o aprender em um dado contexto cultural 
não é restrito ao que se passa no ambiente de formação, mas 
está no relacionamento e no movimento do significado social 
do que é vivido dentro e fora desse espaço. Frigotto (1995, p. 
32) é quem nos ajuda a esclarecer este processo:
Os desafios no plano da realidade que se quer 
conhecer não são menores sobretudo quando 
o objeto do conhecimento é a própria práxis 
humana. Quando nos esforçamos para 
conhecer determinado aspecto ou fato das 
múltiplas práticas e relações sociais que os 
homens estabelecem num determinado 
tempo, numa determinada cultura, 
percebemos que mediata ou imediatamente 
o sujeito que busca conhecer este aspecto da 
realidade está nela implicado.
Ampliando um pouco mais a ideia de construção do 
conhecimento mediante a articulação de método e teoria 
em um conjunto de “conexões estruturais”, Noronha (2002) 
faz considerações sobre a pesquisa educacional, lembrando 
que “os dados não surgem nem falam por si mesmos. Eles 
são sempre respostas a indagações teoricamente claras que o 
pesquisador deve fazer do real [...] sempre articulados a uma 
problemática determinada historicamente” (p. 14-17). Na 
continuidade dessa ideia, está posto que não se trata de “[...] 
colecionar dados e ler documentos teorizando-os a partir 
de suas manifestações visíveis e aparentes”, que resultam na 
parcialidade de compreensão e inutilidade de abstração sobre 
a realidade. O rigor teórico-metodológico na leitura dos dados 
85
Formação continuada do 
professor universitário: 
orientação de estágio 
com pesquisa
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 71-98,
nov. 2015/ fev. 2016
deve constituir o “concreto pensado” (FREITAS, 1995). 
Para tanto, foi necessário que as manifestações da realidade 
investigada emergissem na ampliação da reflexão realizada a 
cada encontro com as alunas, através dos dados, elementos e 
conceitos trazidos por elas. 
Refletindo sobre os textos das alunas, seus relatórios 
e depoimentos, consideramos positivo o impacto causado 
em alunas do 4º ano de Pedagogia pelo contato com uma 
metodologia de investigação que não separa instâncias muitas 
vezes dicotomizadas em cursos de formação de professores: a 
teoria e a prática; o ideal e o real; a reflexão e a ação. Tais 
pares de conceitos são frequentemente utilizados nos nossos 
discursos educacionais, mas, efetivamente, os momentos 
que são concretamente vivenciados no interior dos cursos de 
formação não correspondem ao ideal proclamado. 
Nosso processo de formação continuada nos fez ver que 
as orientações são momentos muito ricos e construtivos do 
ponto de vista do desenvolvimento de um espírito científico, 
não só para nossas alunas da graduação, mas também para 
nós, que reconfiguramos nosso trabalho pedagógico docente, 
distanciando-o do ensino tradicional e transmissivo em direção 
ao desenvolvimento de uma autonomia intelectual.
Acreditamos que, no processo de formação do professor, 
o caráter de apropriação da história vivida se transforma na 
relação entre os homens e a apropriação/transformação da 
realidade. Trata-se de participar de um processo histórico, 
coletivo, social de objetivação singular da produção da 
humanidade. Para tanto, todas as dimensões – cognitivas, 
científicas, culturais, políticas – devem ser consideradas no 
processo de formação (OLIVEIRA, 2005).
Chauí (2003, p. 9) muito acrescenta à nossa reflexão ao 
expressar:
O que significa formação? [...] Podemos 
dizer que há formação quando há obra de 
86
Cláudia Chueire de Oliveira
Maura Maria M. Vasconcellos
Neusi Aparecida N. Berbel
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.67-98 ,
nov. 2015/ fev. 2016
pensamento4 e que há obra de pensamento 
quando o presente é apreendido como aquilo 
que exige de nós o trabalho da interrogação, 
da reflexão e da crítica, de tal maneira que 
nos tornamos capazes de elevar ao plano 
do conceito o que foi experimentado como 
questão, pergunta, problema, dificuldade.Qualificar melhor o professor, com aprofundamento 
dos conhecimentos para maior domínio no exercício da 
função, decorre do fato de que a docência universitária 
tem sua natureza científica no ensino ligado à pesquisa e à 
socialização dos conhecimentos. No caso específico do Curso 
de Pedagogia, Bianchetti e Meksenas (2004, p. 72) fornecem 
respaldo para a ideia quando afirmam:
O fazer pesquisa empírica em pedagogia 
apresenta-se como uma atividade reflexiva e 
intimamente relacionada com as interações 
sociais. Aqui não há espaço para pensarmos 
a dicotomia entre sujeito e objeto ou 
do sujeito-que-pesquisa com o sujeito-
pesquisado. Quando pensamos no ‘objeto’ 
de uma pesquisa empírica em pedagogia, 
não há como escapar da idéia da qual esse 
‘objeto’ corresponde a uma ou mais pessoas, 
inseridas em práticas sociais. Mesmo 
quando nos referimos a documentos, detrás 
deles encontramos práticas e interações 
sociais. Assim como nas ciências humanas 
o ‘objeto’ dos homens e mulheres são os 
próprios homens e mulheres, na pedagogia 
esse mesmo ‘objeto’ ainda converge para 
situações de educação: do “aprender-e-vir-a-
ensinar”.
4 “A obra de pensamento só é fecunda quando diz o que sem ela não poderia 
ser pensado nem dito, e sobretudo quando, por seu próprio excesso, nos dá a 
pensar e a dizer, criando em seu próprio interior a posteridade que irá superá-
la.” (CHAUÍ, 2003, p. 7).
87
Formação continuada do 
professor universitário: 
orientação de estágio 
com pesquisa
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 71-98,
nov. 2015/ fev. 2016
Para os autores, o ‘objeto’ de uma pesquisa em Pedagogia 
converte-se no outro com quem o pesquisador interage e 
participa da vida, que conduz o compromisso do pesquisador 
em estar com os outros na história. 
Como supervisoras, percebemos que a forma como a 
investigação foi desenvolvida, combinando diversas fontes e 
campos de coleta de informações e dando oportunidade às 
alunas de desenvolverem habilidades de pesquisa por meio de 
uma experiência diferenciada de estágio, permitiu reconhecer 
que as dificuldades que normalmente ocorrem no percurso, 
tanto de uma investigação quanto da realização de estágios, 
podem revelar exatamente o caminho de superação. 
Bianchetti e Meksenas (2004, p. 74) mais uma vez nos 
oferecem pontos para reflexão:
A que isso interessa à Pedagogia? [...] Romper 
dicotomias e assumir a contradição da práxis 
do fazer a pesquisa no ensino de Pedagogia 
significa, num primeiro e importante 
momento, pensar a relação sujeito e objeto 
como uma relação sujeito e sujeitos na 
construção do conhecimento, que permite 
rever o real. [...] Uma construção que não 
é apenas reflexiva, mas, sobretudo, de ação, 
intervenção e interação. A pesquisa educa 
porque a pesquisa é, antes de mais nada, 
uma qualidade das relações sociais.
Pode-se afirmar que ocorreram aprendizados de diversas 
ordens, em graus variados, tanto em relação ao conteúdo 
quanto em relação à forma de abordá-lo. O segundo tipo de 
aprendizado foi considerado por nós como mais importante, 
porque, por meio dele, alcançou-se o primeiro, de modo mais 
efetivo e com significado para os envolvidos no desenvolvimento 
da consciência profissional. Desta forma, a metodologia de 
pesquisa por nós adotada trouxe-nos discussões a respeito das 
mediações entre os particulares e os gerais, manifestados na 
vida cotidiana do nosso exercício docente. Aprendemos que 
88
Cláudia Chueire de Oliveira
Maura Maria M. Vasconcellos
Neusi Aparecida N. Berbel
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.67-98 ,
nov. 2015/ fev. 2016
há condições limitantes entre o plano idealizado e a ação 
propriamente dita. 
Com as palavras de Leitão (2004), temos outro ângulo 
para consideração da experiência pedagógica vivenciada:
Os processos de formação estão relacionados 
ao que saber, por que saber e aos modos 
de saber na relação entre as pessoas [...] 
esse entendimento traz em seu interior 
incertezas, inseguranças e necessidades de 
mudanças, e com elas perdem-se algumas 
certezas, descobrem-se outras, sobre as quais 
não temos garantias (p. 280).
O grande esforço empreendido, tanto da parte das 
supervisoras quanto da parte das estagiárias, nem sempre 
apresentou todos os resultados esperados. Se, pelo nosso olhar, 
há aspectos que deixaram a desejar para se poder considerar o 
trabalho das estagiárias como um trabalho nos moldes de uma 
iniciação científica, por outro lado, há que se considerar que 
as alunas foram bastante desafiadas, muitas vezes realizando 
esforços novos de busca e elaboração em relação a um tema 
de estudo, relacionando elementos teóricos e de campo. 
Acreditamos que nossa postura, no acompanhamento dos 
trabalhos, foi decisiva para que assim acontecesse, tal como 
exemplificado em um relatório:
O que me levou a enxergar os problemas em 
tudo aquilo que havia observado foram as 
reuniões, principalmente aquelas feitas com 
a supervisora. As reuniões têm sido muito 
produtivas. (R20, grifo das alunas).
Uma das questões centrais nesta discussão está na 
consideração do singular, que, cotidianamente, é produzido 
nas práticas educativas por aqueles que as fazem, professores/
supervisores/orientadores de estágio supervisionado e alunos 
de Pedagogia, em um movimento que envolve prática, teoria e 
prática. Nóvoa (1995, p. 33) afirma que é esta uma das grandes 
possibilidades que os professores têm de se apropriarem “[...] 
89
Formação continuada do 
professor universitário: 
orientação de estágio 
com pesquisa
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 71-98,
nov. 2015/ fev. 2016
dos saberes de que são portadores e os trabalhem do ponto 
de vista teórico e conceptual”. Significa dizer que a prática 
docente universitária é modificada com a produção teórico-
metodológica que a produz, em constante movimento 
dialético. 
Oliveira (2001) ilustra o movimento da produção 
docente-acadêmica ao defender que é necessário:
[...] pensar, por exemplo, a formação de 
professores a partir da idéia de tessitura 
do conhecimento [...] como um processo 
investigativo constante que se faz 
solidariamente com parceiros na própria 
caminhada. A troca de experiências e de 
saberes tece/destece/retece espaços/tempos 
da formação mútua, nos quais cada professor 
é chamado a desempenhar, simultaneamente, 
o papel de formador e de formando [...] 
Quando quem faz coletiviza esse fazer, por 
meio da linguagem do saber-fazer, ensina e 
aprende com seus pares (p. 71). 
Entre as lições extraídas do processo vivido, podemos 
destacar que ensinar valendo-se da pesquisa permitiu, a nós 
docentes, vivenciarmos uma diversidade de conhecimentos e 
práticas, reconhecermos algumas das muitas relações de poder 
que se estabelecem no interior das instituições de ensino e, 
assim, olharmos mais criticamente para a nossa realidade, locus 
do nosso exercício profissional. Carvalho (2005), em pesquisa 
sobre a formação e valorização do magistério, envolvendo 
vozes de profissionais da educação, traz uma ideia bastante 
pertinente a nós, a qual contribui para entendermos o que 
vivenciamos: 
Uma escola ou academia geométrica e 
arquitetonicamente definida é transformada 
em espaço pelos professores, alunos e outros 
agentes [...]. Os espaços exibem operações que 
permitem percursos, passagens, intercâmbios, 
trocas, compartilhamentos, e não apenas a 
determinação da ‘lei de um lugar próprio’, 
90
Cláudia Chueire de Oliveira
Maura Maria M. Vasconcellos
Neusi Aparecida N. Berbel
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.67-98 ,
nov. 2015/ fev. 2016
de autoria marcada e/ou do individualismo 
brilhante de um educador solitário, que 
cerca o conhecimento, mesmo em grupo, 
e segue o modelo da ordem dos lugares, 
coerente com o discurso científico moderno. 
[...] Dessa forma, a formaçãocontinuada, 
visualizada a partir da constituição da escola 
como comunidade compartilhada, pressupõe 
duas condições: o poder argumentativo das 
pessoas e grupos; a pretensão de construir 
processos de formação continuada voltados 
para a “utópica” de constituição de um novo 
coletivo escolar (p. 107).
Além disso, outra lição se deu na reconfiguração do nosso 
trabalho pedagógico: o desenvolvimento de uma autonomia 
intelectual das pedagogas em contínua formação. Há um 
depoimento, em um relatório de estágio, que ilustra a lição:
Esta metodologia em questão supera a 
questão tão comum nos cursos de graduação 
de realizar apenas mais um trabalho, já 
que a participação das alunas é ativa em 
todas as etapas, o que proporciona uma 
aprendizagem mais significativa vinculada à 
realidade e comprometida com sua formação 
(Relatório 22).
A possibilidade de ampliação das fronteiras do que somos 
e fazemos como docentes formadoras de outros professores 
se fez em intrincadas redes de relações que aconteceram nos 
múltiplos espaços/tempos complexos e desafiadores da prática 
pedagógica cotidiana, política e coletiva da academia. O 
esforço realizado na tentativa de superação das dificuldades 
e o estímulo ao desenvolvimento criativo de um trabalho 
de pesquisa, acompanhado por orientações e supervisões 
pertinentes em todas as etapas previstas do estágio com a M. 
P., constituíram-se, a nosso ver, numa experiência muito rica 
e construtiva do trabalho com a perspectiva de envolvimento 
do aluno no ensino com pesquisa.
91
Formação continuada do 
professor universitário: 
orientação de estágio 
com pesquisa
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 71-98,
nov. 2015/ fev. 2016
O exercício cotidiano de supervisionar/orientar e 
produzir conhecimento em equipe demonstrou que é preciso 
investir na dimensão do trabalho coletivo, compreendendo que 
o aluno, futuro colega, é interlocutor legítimo na construção 
e socialização dos conhecimentos pedagógicos. Além disso, 
a tomada de consciência sobre o que realizamos durante o 
processo foi um elemento fundamental para o despertar do 
olhar crítico em relação às inovações pedagógicas que permitem 
processos de formação continuada no exercício profissional. 
Acreditamos que nosso propósito de ampliar a 
construção do conhecimento teórico-prático sobre a 
Metodologia da Problematização em situação de ensino com 
pesquisa no âmbito da formação de professores foi plenamente 
atingido, uma vez que a experiência que realizamos foi inédita 
e inovadora e proporcionou a produção de um conhecimento 
novo, evidenciando a amplitude do potencial de uso da M. P. 
na formação de professores.
Consideramos ainda que, no exercício de supervisionar/
orientar alunas, conviver com elas e, especialmente, com as 
colegas professoras, a nossa prática docente universitária foi 
influenciada e provavelmente modificada pela diversidade e 
riqueza de conhecimentos e práticas encontradas, indo ao 
encontro de nossa intenção inicial de exercitar o trabalho de 
reflexão teórico-prático em equipe como condição de formação 
continuada na área da didática. Linhares (2000) nos auxilia a 
expressar a questão quando descreve uma situação pedagógica 
semelhante, que requer:
[...] falar de questões que trazem importantes 
conseqüências para todos nós, como educadores 
e aprendizes, que integramos estas configurações 
sociais, onde nenhum de nós está dispensado de 
atuar, não podendo crer-se ou supostamente 
comportar-se como um elo mecânico numa 
engrenagem que correria independente de 
sua atuação [ou] como se o aprender fosse 
uma conseqüência da deliberação de fazê-lo, 
decorrência de um processo de conscientização 
dos benefícios escolares. (p. 47).
92
Cláudia Chueire de Oliveira
Maura Maria M. Vasconcellos
Neusi Aparecida N. Berbel
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.67-98 ,
nov. 2015/ fev. 2016
A relação entre estagiárias e supervisoras saiu do universo 
circunscrito do par original professor-aluno para um coletivo 
de professoras e alunas. 
No conjunto dessas ideias, apresentamos o 
reconhecimento do nosso processo de formação do professor 
junto às possibilidades e limitações concretas do exercício 
profissional, ou seja, as clássicas perguntas da didática, “o 
que ensinamos, como ensinamos, para quem ensinamos” 
alimentaram diretamente nosso fazer didático-pedagógico de 
pesquisadoras em educação, em uma síntese de reconfiguração, 
de dimensões, de instâncias, de lugares e movimentos... Temos 
a nítida consciência de que “talvez seja possível mudar além 
de nós mesmos, o que não é pouca coisa, os espaços nos 
quais atuamos [...] entre a ação, participação, reflexão [...], 
restaurando conexões entre os diferentes saberes práticos e 
teóricos, valores, desejos, crenças, atitudes etc.” (LEITÃO, 
2004, p. 38). 
Gostaríamos, ainda, de lembrar Pistrak (2000), o qual 
considera que a caminhada da construção dos processos de 
formação docente requer a explicitação de que: 
[...] a educação do professor não é 
absolutamente fornecer-lhe um conjunto de 
indicações práticas, mas armá-lo de modo 
que ele próprio seja capaz de criar um bom 
método, baseando-se numa teoria sólida 
de pedagogia social; o objetivo é empurrá-
lo no caminho desta criação [...]. É claro 
que um professor isolado, abandonado a si 
mesmo, não encontrará sempre a solução 
ao problema que enfrenta, mas se trata de 
um trabalho coletivo, da análise coletiva do 
trabalho de uma escola, o esforço não deixará 
de ser um trabalho criador (p. 25-26). 
Bianchetti e Meksenas (2004) nos permitem ampliar a 
concepção do “trabalho criador” para o campo do pedagógico, 
considerando que as percepções da “multiplicidade das ciências 
aparecem como resultado de contradições históricas” ou seja, o 
93
Formação continuada do 
professor universitário: 
orientação de estágio 
com pesquisa
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 71-98,
nov. 2015/ fev. 2016
debate acerca do “[...] resultado desse processo didático leva a 
posturas menos ingênuas frente ao que se costuma definir por 
ciência e por pesquisa empírica no campo da educação” (p. 80). 
Convém, ainda, trazer o registro de Leite (2000) ao tratar 
do conhecimento da academia, entendido como uma forma 
de conhecer e, portanto, exercer o caráter de contaminação.
Contaminação: O movimento do 
conhecimento vivo, da prática, contamina; 
progride, avançando aos poucos, em 
doses homeopáticas, e pode interferir, 
desacomodar os saberes científicos, que 
podem até não ter respostas às situações 
criadas em sala de aula, dizem os alunos 
universitários. Envolve paciência histórica 
de repensar a própria prática; a repercussão 
é homeopática, diz o professor mediador. 
Interfere na comunidade, não só nos que 
estão trabalhando; ensina pais, filhos e 
vizinhos, dizem os papeleiros. Clareia as 
propostas, interfere na vida cotidiana, 
no todo da comunidade, na organização 
voltada para a pessoa humana, resgata a 
identidade das pessoas, joga para cima, dá 
força e elementos para lutar; é uma troca de 
experiências, dizem os educadores populares. 
A contaminação homeopática produz 
aprendizagem motivada por reflexão e 
sensibilização, ambas trazidas pelo trato com 
o conhecimento vivo, palpitante (LEITE, 
2000, p. 58)
Finalizando nosso relato, reafirmamos que a experiência 
com a M. P. no estágio supervisionado do Curso de Pedagogia 
é uma possibilidade de educação problematizadora, de 
superação da dicotomia teoria-prática, de evidência da relação 
de ensino/pesquisa e incentivadora da formação continuada 
de docentes universitários, considerando que, ao transformar 
um paradigma de ensino, de transmissão, para produção do 
conhecimento, transformamos, com melhor qualidade, os 
sujeitos do processo. 
94
Cláudia Chueire de Oliveira
Maura Maria M. VasconcellosNeusi Aparecida N. Berbel
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.67-98 ,
nov. 2015/ fev. 2016
REFERÊNCIAS
ALVES, Nilda; GARCIA, Regina Leite. A construção 
do conhecimento e o currículo dos cursos de formação de 
professores na vivência de um processo. In: ALVES, Nilda 
(Org.). Formação de professores: pensar e fazer. São Paulo: 
Cortez, 1993. p. 73-88.
BERBEL, Neusi Aparecida Navas; OLIVEIRA, Cláudia 
Chueire; VASCONCELLOS, Maura Maria Morita; GOMES, 
Icléia R. L. E; SOUZA, Waldecíria. Avaliação da aprendizagem 
no ensino superior. Um retrato em cinco dimensões. Londrina, 
PR: Editora da Universidade Estadual de Londrina, 2001. 
BIANCHETTI, Lucídio; MEKSENAS, Paulo. Por uma 
práxis de pesquisa: notas de experiências didáticas. Educação 
em Questão, v. 21, n. 7, p. 69-88, set./dez. 2004
BOGDAN, Roberto C.; BIKLEN, Sari K. Investigação 
qualitativa em educação. Uma introdução à teoria e aos 
métodos. Porto: Porto Editora, 1994.
CARVALHO, Janete Magalhães. O não-lugar dos 
professores nos entrelugares de formação continuada. Rev. 
Bras. Educ. [online]. n. 28, p. 96-107. 2005. Disponível em: 
<http://dx.doi.org/10.1590/S1413-24782005000100008>. 
Acesso em: 05 jul. 2010.
CHAUÍ, Marilena. A universidade pública sob nova 
perspectiva. REUNIÃO ANUAL DA ANPED, 26, 2003, 
Poços de Caldas. Conferência de abertura. Anais... Poços de 
Caldas: ANPED, 2003.
CHIZZOTTI, Antônio. Pesquisa em ciências humanas e 
sociais. São Paulo: Cortez, 1991.
CODO, Wanderley; VASQUES-MENEZES, Ione. 
Educar, educador. In: CODO, Wanderley (Coord.). Educação: 
carinho e trabalho. Petrópolis, RJ: Vozes, 1999. p. 37-47.
95
Formação continuada do 
professor universitário: 
orientação de estágio 
com pesquisa
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 71-98,
nov. 2015/ fev. 2016
CUNHA, Maria Isabel da. O lugar da formação do 
professor universitário: a condição profissional em questão. 
In: CUNHA, Maria Isabel da (Org.). Reflexões e práticas em 
pedagogia universitária. Campinas, SP: Papirus, 2007. p. 11-
26.
______. Ensino como lugar da mediação do professor 
universitário. In: MOROSINI, Marília Costa (Org.). Professor 
do ensino superior: identidade, docência e formação. Brasília, 
DF: Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais, 2000. p. 
79-92.
FRIGOTTO, Gaudêncio. Educação e a crise do 
capitalismo real. São Paulo: Cortez, 1995.
ISAIA, Silvia Maria de Aguiar. Professor universitário 
no contexto de suas trajetórias como pessoa e profissional. 
In: MOROSINI, Marília Costa (Org.). Professor do ensino 
superior: identidade, docência e formação. Brasília, DF: 
Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais, 2000. p. 35-60.
LEITÃO, Cleide Figueiredo. Buscando caminhos nos 
processos de formação/autoformação. Revista Brasileira de 
Educação, n. 27, p. 25-39, set./dez. 2004.
LEITE, Denise. Conhecimento social na sala de aula 
universitária e a autoformação docente. In: MOROSINI, 
Marília Costa (Org.). Professor do ensino superior: identidade, 
docência e formação. Brasília, DF: Instituto Nacional de 
Pesquisas Educacionais, 2000. p. 93-108.
LINHARES, Célia Frazão. Múltiplos sujeitos da 
educação: a produção de sujeitos e subjetividade de professores 
e estudantes. In: CANDAU, Vera Maria (Org.). Ensinar e 
aprender: sujeitos, saberes e pesquisa. Rio de Janeiro: DP&A, 
2000. p. 43-54.
96
Cláudia Chueire de Oliveira
Maura Maria M. Vasconcellos
Neusi Aparecida N. Berbel
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.67-98 ,
nov. 2015/ fev. 2016
LÜDKE, Menga; ANDRÉ, Marli E. D. A. Pesquisa em 
educação: abordagens qualitativas. São Paulo: EPU, 1986.
MARQUES, E. A. et al. Ensino e pesquisa na 
universidade: questão de lei ou de visão de mundo. Cadernos 
de Pesquisa, São Paulo, n. 69, p. 5-16, maio, 1989.
MORAES, Vera Regina P. O estágio na formação do 
professor e o papel dos colégios de aplicação. Educação e 
Realidade, Porto Alegre, v. 7, n. 1, p. 61-69, jan.-abr. 1982.
NORONHA, Olinda Maria. Políticas neoliberais, 
conhecimento e educação. Campinas, SP: Alínea, 2002.
NÓVOA, Antônio. Formação de professores e formação 
docente. In: NÓVOA, A. (Org.). Os professores e a sua formação. 
Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1995. p. 13-36.
OLIVEIRA, Cláudia Chueire; BERBEL, Neusi 
Aparecida Navas; VASCONCELLOS, Maura Maria Morita. 
A construção da boa prática avaliativa no ensino superior. 
Teoria e Prática da Educação, v. 9, p. 45-52, 2006.
OLIVEIRA, Cláudia Chueire de. A formação superior de 
professores através de mídias interativas. Tese (Doutorado em 
Educação) – Universidade Estadual de Campinas. Campinas, 
SP, 2005.
OLIVEIRA, Inês Barbosa de. Certeau e as artes de fazer: 
as noções de uso, tática e trajetória na pesquisa em educação. 
In: OLIVEIRA, I. B. de; ALVES, N. (Orgs.). Pesquisa do/
no cotidiano das escolas sobre redes de saberes. Rio de Janeiro: 
DP&A, 2001. p. 39-68.
PICONEZ, Stela C. B. (Coord.). A prática de ensino e o 
estágio supervisionado. Campinas, SP: Papirus, 2001.
PIMENTA, Selma Garrido. O estágio na formação de 
professores. Unidade teoria e prática? São Paulo: Cortez, 1995.
97
Formação continuada do 
professor universitário: 
orientação de estágio 
com pesquisa
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 71-98,
nov. 2015/ fev. 2016
PISTRAK, M. Fundamentos da escola do trabalho. São 
Paulo: Expressão Popular, 2000.
RICHARDSON, Roberto Jarry et al. Pesquisa social. 
Métodos e técnicas. São Paulo: Atlas, 1999.
SEVERINO, Antônio Joaquim. Metodologia do 
trabalho científico. São Paulo: Cortez, 2000.
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE LONDRINA. 
Projeto Pedagógico do Curso de Pedagogia. 2005. Disponível 
em: <http://www.uel.br/ceca/pedagogia/pages/arquivos/
PPP2005.pdf>. Acesso em: 13 ago. 2012.
Data de recebimento: agosto de 2014
Data de aceite: junho de 2015
99
Preencher potências 
e inventar educações 
possíveis: pela 
experimentação de uma 
formação-sem-órgãos
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 99-116,
nov. 2015/ fev. 2016
PREENCHER POTÊNCIAS 
E INVENTAR EDUCAÇÕES 
POSSÍVEIS: PELA 
EXPERIMENTAÇÃO DE UMA 
FORMAÇÃO-SEM-ÓRGÃOS
Cristian Poletti Mossi1
Marilda Oliveira de Oliveira2
Resumo
O artigo busca, a partir da frente filosófica instaurada por 
Deleuze e Guattari na obra Mil Platôs (1995a, 1995b, 1996, 
1997a, 1997b), pensar o campo educativo – o qual implica 
nas relações entre corpos, espaços, práticas, metodologias 
– como um fenômeno de estratificação de agenciamentos 
territoriais. Desse modo, a prática do Corpo-sem-Órgãos, 
enunciada por Artaud (Para acabar com o julgamento de 
Deus, 1947) e evidenciada também por Deleuze e Guattari 
em Mil Platôs, pode se tornar cara no sentido de gerar 
alguns movimentos de desterritorialização/desestratificação 
dos agenciamentos territoriais estratificados que formam 
o campo educativo. Isso implica pensar em pequenas 
educações, enquanto práticas marginais, que se alojam em 
uma grande Educação, já deveras instituída e legitimada, 
possibilitando aos corpos envolvidos em tais processos o 
“preenchimento de uma potência” (DELEUZE, 1988/1989, 
s/p) que lhes confere alegria produtiva e inventiva. Por fim, 
o artigo problematiza uma educação/formação sem órgãos 
que desinstitui as relações entre aprendizes, docentes e 
espaços educativos de formação de uma relação hierárquica, 
intentando tramar desvios sinuosos dos caminhos 
1 Cristian Poletti Mossi – Universidade Federal do Rio Grande do Sul 
(UFRGS).
 E-mail: cristianmossi@gmail.com
2 Marilda Oliveira de Oliveira – Universidade Federal de Santa Maria/RS 
(UFSM).
 E-mail: marildaoliveira27@gmail.com
100
Cristian Poletti Mossi
Marilda Oliveira de Oliveira
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.99-116 ,
nov. 2015/ fev. 2016
incessantemente pisados, invencionando outros percursos 
que se distanciam de receituáriose identidades fixas.
Palavras-chave: Corpo sem Órgãos; Educação; Formação.
Abstract
This article aims, through the philosophical front 
established by Deleuze and Guattari in the work Mille 
Plateaux (1995a, 1995b, 1996, 1997a, 1997b), at thinking 
the education field – which implies relations between 
bodies, spaces, practices, methodologies – as a phenomenon 
of stratification of territorial agencies. Thus, the Body 
without Organs practice, enunciated by Artaud (Pour en 
finir avec le jugement de dieu, 1947) and evidenced by 
Deleuze and Guattari in Mille Plateaux as well, can become 
highly valued in the sense of generating some moves of 
deterritorialization/destratification of stratified territorial 
agencies which constitute the education field. This implies 
thinking of ‘small educations’ as marginal practices located 
within a larger Education, which is already instituted and 
legitimated, allowing the bodies involved in such practices 
the “fulfillment of a potency” (DELEUZE, 1988/1989, 
s/p) that gives them productive and inventive joy. Finally, 
the paper aims at problematizing a education/formation 
without organs which deinstitutes the relations among 
apprentices, teachers and educative spaces of formation of a 
hierarquical relation, trying to design sinuous deviations in 
the tirelessly steped pathways and creating new routes that 
are distanced from prescriptions and fixed identities.
Keywords: Body without Organs; Education; Formation.
101
Preencher potências 
e inventar educações 
possíveis: pela 
experimentação de uma 
formação-sem-órgãos
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 99-116,
nov. 2015/ fev. 2016
PREENCHER POTÊNCIAS 
E INVENTAR EDUCAÇÕES 
POSSÍVEIS: PELA 
EXPERIMENTAÇÃO DE UMA 
FORMAÇÃO-SEM-ÓRGÃOS
MAQUINARIAS CURTO-CIRCUITADAS E UM CORPO-SEM-
ÓRGÃOS PARA A EDUCAÇÃO
O homem é enfermo porque é mal construído,
Temos que nos decidir a desnudá-lo para raspar 
esse animalúculo que o corrói mortalmente, 
deus
e juntamente com deus os seus órgãos
(...) não existe coisa mais inútil que um órgão.
Quando tiverem conseguido um corpo sem 
órgãos,
então o terão libertado dos seus automatismos
e devolvido sua verdadeira liberdade.
(ARTAUD, in: WILLER, 1983, pp. 161-162)
A terra, ainda desterritorializada, era um corpo-sem-
órgãos. Mais ou menos com essas palavras Deleuze e Guattari 
(1995a) iniciam o Platô três, pertencente ao primeiro volume 
de sua obra Mil Platôs3, fazendo clara referência à prática 
enunciada por Artaud em sua conferência radiofônica Para 
acabar com o julgamento de deus (1947/1983).
3 Deleuze e Guattari (1995a, 1995b, 1996, 1997a, 1997b).
102
Cristian Poletti Mossi
Marilda Oliveira de Oliveira
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.99-116 ,
nov. 2015/ fev. 2016
Esse corpo sem órgãos era atravessado por 
matérias instáveis não-formadas, fluxos em 
todos os sentidos, intensidades livres ou 
singularidades nômades, partículas loucas 
e transitórias (DELEUZE & GUATTARI, 
1995a, p. 53).
Ao mesmo tempo, ponderam os autores, outro 
fenômeno – o da estratificação – ocorria paralelamente, fixando 
singularidades e aprisionando intensidades. “Os estratos eram 
juízos de Deus” (DELEUZE & GUATTARI, 1995a, p. 54) 
que operavam por codificação e territorialização da terra.
Distantes de um intuito meramente literário, os autores 
nos apresentam com isso possibilidades para pensar uma 
geologia da moral, como eles mesmos denominam, ou seja, 
nos convidam a movimentar o pensamento na perspectiva 
de compreender de que forma o que era somente um fora 
absoluto – a terra desestratificada e desterritorializada – foi 
ganhando pontos de coagulação, enrijecimento e organismos 
hierarquizados mediante agenciamentos territoriais 
estratificados: deus e seus órgãos, nos diria Artaud.
Destarte, é de grande importância mencionar que tal 
ponto de vista tomado pelos autores não considera qualquer 
tipo de diferenciação entre formas naturais e formas culturais/
artificiais, tampouco há qualquer pretensão com vistas a 
competir frente a alguma disciplina de História Natural. O que 
nos parece mais viável é compreender esse viés filosófico como 
uma história (não legitimada, marginal, amplamente flexível) 
da própria História (já instaurada como verdade universal, 
absoluta, rígida, estável). Talvez, um modo contemporâneo de 
curvar o fluxo do pensamento no sentido que Aganbem (2009) 
propõe, ou seja, como uma relação singular com o tempo a 
qual, na mesma medida que a este adere, dele toma distâncias 
através de uma dissociação e de um anacronismo, sugerindo-
se, nesse sentido, participar das dinâmicas para nelas provocar 
brechas, torções e problematizações.
103
Preencher potências 
e inventar educações 
possíveis: pela 
experimentação de uma 
formação-sem-órgãos
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 99-116,
nov. 2015/ fev. 2016
Iniciando o terceiro volume dessa mesma coletânea 
de textos – Mil Platôs – o Platô seis (1996), logo em seu 
título, lança um questionamento no mínimo intrigante: 
como criar para si um corpo-sem-órgãos? Ou seja, como 
desterritorializar-se, desestratificar-se – visto que nós humanos 
e nossos corpos, nosso pensamento, até mesmo nossas ações, 
também participam desses fenômenos de territorialização/
estratificação anteriormente pontuados – sem que isso 
signifique necessariamente uma reversão, um retrocesso, uma 
busca por alguma essência perdida, mas uma abertura a outras 
intensidades no preâmbulo de uma produção inventiva de si 
mesmo?
Neste artigo, procura-se trazer para a discussão o campo 
educacional e os corpos de toda ordem que dele participam e 
o colocam em funcionamento, como parte desses fenômenos 
de territorialização e estratificação mencionados por Deleuze 
e Guattari. Intenta-se, portanto, problematizar: de que 
forma fazer da prática de um corpo-sem-órgãos um mecanismo 
(maquínico, não mecânico), a fim de precipitar alguns pontos 
já estratificados no modo como nos individuamos, especialmente 
na esfera da formação e da relação entre aprendizes, docentes e 
ambientes educativos? Para tanto, na sequência, discute-se 
o que significaria inventar educações possíveis (como um 
devir minoritário) às margens de uma grande Educação 
já deveras estratificada, no sentido de trazer para os corpos 
que a habitam e a colocam em funcionamento (aprendizes, 
docentes, ambientes educativos, entre outros) a alegria e 
o impulso inventor enquanto preenchimento de potências 
(Deleuze, 1988/1989, s/p).
Essas e outras questões fazem parte do que há algum 
espaço de tempo vem sendo problematizado na escrita da 
tese de doutoramento momentaneamente intitulada ‘um 
corpo-sem-órgãos para curto-circuitar maquinarias na educação’, 
produzida pelo autor desse artigo sob orientação de sua co-
autora. Na pesquisa supracitada, o campo educacional, longe 
de se restringir somente à escola – ambiente educativo por 
104
Cristian Poletti Mossi
Marilda Oliveira de Oliveira
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.99-116 ,
nov. 2015/ fev. 2016
excelência e uma de suas instituições fundamentais – ou 
ainda ao ofício do professor frente a seus aprendizes – papéis 
estes que contribuem para sua legitimação em nossa cultura 
ocidental – é entendido enquanto conjunto de agenciamentos 
territoriais estratificados (onde participam corpos, lugares, 
saberes, metodologias, discursos, entre outros) que oferecem 
microespaços para que nele sejam provocados movimentos 
de desterritorialização/desestratificação, devir e fuga4 frente à 
prática do corpo-sem-órgãos.
Tal prática, conjura possibilidades para pensar um 
corpo de intensidade zero, antes do organismo estratificado 
que, embora precise dele enquanto superfície por onde passam 
intensidades, não se confunde com o mesmo. Portanto, um 
corpo antes do corpo, não como essênciaou origem, mas 
como plano de imanência onde imantam-se possibilidades 
produtivas as quais procuram se distanciar do já instituído/
legitimado. No âmbito da formação de aprendizes/docentes 
e de sua relação em/com ambientes educacionais, como a 
escola e a universidade, por exemplo, isso implica pensar que 
certas normas, rotinas, métodos e metodologias, e até mesmo 
conformações de espaços, corpos, visualidades, entre outras 
práticas, podem ser repensadas e precipitadas no sentido de 
um fora onde o que há são somente potências com infinitas 
possibilidades de outras composições, readequações.
Nesse sentido, antes de propor as curto-circuitagens que 
se fazem presentes tanto no título provisório da tese descrita, 
como no atual subtítulo deste artigo – enquanto falência 
ou defasagem de sistemas – propõe-se pensá-las enquanto 
desencadeamento, disparo ou funcionamento inesperado 
4 Compreendendo devir não enquanto imitação ou fixidez de algum ser, 
mas enquanto vir a ser minoritário, individuação constante e fluente; 
Desterritorialização enquanto desestratificação de territórios aparentemente 
cristalizados (que sempre pressupõem, já em seguida, novas territorialidades, 
porém sem nunca retomar à territorialidade antiga) e linhas de fuga como 
criações, desvios, fendas e vazamentos dos estratos (DELEUZE & GUATTARI, 
1995a; 1995b; 1996; 1997a; 1997b).
105
Preencher potências 
e inventar educações 
possíveis: pela 
experimentação de uma 
formação-sem-órgãos
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 99-116,
nov. 2015/ fev. 2016
de maquinarias as quais, segundo Deleuze e Guattari 
(1997a), se definem por engendramentos que acoplam-se em 
agenciamentos territoriais estratificados, fazendo com que os 
mesmos fujam, escapem, delirem, traçando assim variações e 
infindáveis mutações.
Considera-se importante mencionar que na perspectiva 
aqui buscada, ou seja, ponderando o que propõem Deleuze e 
Guattari, não se torna viável visualizar o papel do professor 
de forma separada do aprendiz, tampouco tais papéis sem 
conexão com os ambientes educativos que participam, como, 
por exemplo, a universidade e a escola. O que aqui está em jogo 
é mais a relação que se estabelece na ponte entre esses papéis 
e esses espaços. Busca-se assim propor uma formação não 
enquanto identificação com uma função a ser desempenhada 
(produção identitária do ser aprendiz/docente), mas enquanto 
busca por uma individuação pessoal e intransferível em 
conexão com o que cada corpo em sua produção subjetiva – 
inclusive do docente como aprendiz – pode explanar de forma 
deliberada e inventiva. Isso significa que todo e qualquer 
espaço, entre eles as instituições de formação, mas também 
a cidade, a casa, os ambientes virtuais, os meios midiáticos, 
entre muitos outros, também contribuem de modo a produzir 
quem estamos sendo.
A partir do até então exposto, um dos questionamentos 
que podem surgir é: que possibilidades há mediante uma 
instância prática, visto que tais curto-circuitagens propostas 
são resultantes somente de injunções e articulações teóricas? 
Gallo (2010, p. 56), também amparado pelo pensamento 
deleuzeano, nos ajuda a elucidar tal demanda pontuando que
(...) à teoria não compete explicar a prática 
ou mesmo possibilitá-la, assim como não 
compete à prática alimentar a teoria ou 
manifestá-la na luta social. É impossível 
dissociá-las, sobretudo porque, se saímos do 
âmbito da representação, as totalizações já 
não fazem mais sentido e deixam inclusive 
de ser possíveis.
106
Cristian Poletti Mossi
Marilda Oliveira de Oliveira
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.99-116 ,
nov. 2015/ fev. 2016
Visto isso, ao invocar a prática do corpo-sem-órgãos no 
intuito de curto-circuitar maquinarias no campo educativo 
e de minimamente repensar algumas das relações que se 
estabelecem em seu âmbito mediante os corpos, papéis, 
práticas e ambientes que o fazem funcionar organicamente, 
também se está lançando possibilidades experimentativas 
no sentido prático, para além de mecanismos simplesmente 
teóricos. Ainda segundo Gallo (2010, p. 58),
se a teoria é uma ferramenta, ela faz sentido 
enquanto é usada e gera circuitos imediatos 
com as várias práticas, que por sua vez 
operam alterações nas ferramentas ou 
mesmo implicam na construção de novas 
ferramentas teóricas. 
Exercitar o pensamento e, portanto, colocar as teorias 
em funcionamento, já se trata de uma ação prática que, em seu 
próprio ato, modifica o que está sendo teorizado, intervindo 
em outras possibilidades produtivas da própria ação.
PARA A EDUCAÇÃO, EDUCAÇÕES POSSÍVEIS
Deleuze e Guattari (1995b) propõem que todo o 
agenciamento territorial pertencente aos estratos, é constituído 
por uma dupla articulação que implica por um lado em formas 
de conteúdo – misturas de corpos5 – as quais estão sempre em 
pressuposição recíproca, por outro lado, a formas de expressão 
– enquanto mistura de expressos incorporais de toda a ordem, 
uma interferindo sobre a outra, porém jamais uma sendo 
confundida com a outra. Essa dupla articulação, estaria sempre 
voltada para um fora que não reconhece tal distinção e que 
incita os estratos a se desestratificarem/desterritorializarem, 
Há estratos por todos os lados, assim como há territórios. Não 
há como fugir completamente dos estratos e suas articulações, 
5 Os autores dão, a partir de uma leitura bastante singular da filosofia estoica, 
a maior extensão para palavra corpo, entendendo-o como todo o conteúdo 
extenso, formado. Ou seja, não está ligada somente ao corpo humano, orgânico.
107
Preencher potências 
e inventar educações 
possíveis: pela 
experimentação de uma 
formação-sem-órgãos
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 99-116,
nov. 2015/ fev. 2016
contudo, todo estrato (bem como todo o território) possui 
vetores de desestratificação, direcionados para um plano de 
consistência onde só há linhas de fuga, matérias não formadas 
e intensidades desestratificadas.
Se nos reportarmos ao campo educativo e, mais 
especificamente, ao campo que agencia as relações formativas 
de indivíduos aprendizes/docentes em ambientes educacionais 
como parte desses agenciamentos territoriais estratificados, 
passaremos a pensá-los sempre constituídos por formas de 
conteúdo (agenciando corpos, pessoas, espaços, lugares, 
conjuntos arquitetônicos que produzem saberes e os colocam 
em prática) e por formas de expressão (teorias, conceitos 
e métodos os quais são cuidadosamente tecidos a fim de 
interferir diretamente sobre os corpos envolvidos em tais ações) 
as quais estão sempre prestes a se desestratificar. Portanto, 
partindo do que propõe Deleuze e Guattari, nenhuma dessas 
instâncias é completamente fixa, cristalizada, ou seja, elas se 
interpenetram e não podem ser completamente separadas. 
Quanto aos estratos que elas compõem, apresentam sempre 
a possibilidade de se desestratificar, de serem precipitados 
ou arrastados num movimento de dissolução, de se abrirem 
deixando que intensidades marginais os coloquem em outra 
direção de funcionamento, não para serem extintos, mas para 
se tornarem sempre outra coisa em um movimento de devir 
minoritário contínuo.
Ainda nesta seara, partindo de que curto-circuitar 
maquinarias no campo educativo está distante de provocar 
defasagens ou falências no mesmo, mas sim, impulsionar starts 
inesperados que façam com que seus agenciamentos territoriais 
minimamente se desestratifiquem/desterritorializem ao 
perseguirem devires e linhas de fuga, tal ação não está pautada 
em sugerir uma nova Educação, tampouco sua completa 
inexistência. Se trata sim de pensar educações possíveis – com 
letra minúscula, visto seu descompromisso com verdades e 
universalismos absolutos, bem como suas possibilidades de 
abertura e transitoriedade – que possam habitar uma grande 
108Cristian Poletti Mossi
Marilda Oliveira de Oliveira
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.99-116 ,
nov. 2015/ fev. 2016
Educação, esta sim, com letra maiúscula, já legitimada e 
marcada por diversos códigos, normativas e conceitos pré-
existentes.
Gallo (2010), a partir de Kafka: por uma literatura menor 
(DELEUZE, 1977) estabelece, frente às ferramentas teóricas 
que lhe são disponíveis nessa obra, o que seria uma educação 
maior e uma educação menor. Enquanto a educação maior é, 
para o autor, “do âmbito do instituído, dos protocolos que 
definem de antemão o que deve ser feito” (GALLO, 2010, p. 
60), a educação menor 
(...) trata-se de uma produção que se coloca – 
ou é colocada – às margens dos cânones e das 
instituições e, por esta mesma razão, é uma 
produção mais livre, que frequentemente 
subverte estes cânones e cria possibilidades 
até então insuspeitas.
Ou seja, distante de querer tornar o campo educacional 
melhor ou mais apurado em um sentido evolutivo, repensá-lo 
na crença de reformá-lo, destruí-lo para construí-lo novamente 
ou ainda transitar pelas suas bases com vistas a reafirmar 
certas práticas, busca-se criar no fora dessa Educação que já 
conhecemos, contudo, em conexão com ela e em direção a 
um plano de consistência que envolve seus estratos, educações 
possíveis que se fazem visíveis em pequenas práticas as quais se 
instauram a margem do que procede como rotina instituída. 
Nesse sentido, o menor não se opõe ao maior, tampouco é 
melhor ou pior que ele ou cria com o mesmo uma relação 
dialética (GALLO, 2010).
Trata-se, sim, de um reconhecimento de dois 
âmbitos distintos de pensamento e de produção 
e atuação, um estriado, isto é, com protocolos 
muito definidos; e um outro liso, isto é, sem 
protocolos definidos, aberto ao sabor do 
acontecimento (GALLO, 2010, p. 60).
Tal postura insurge no sentido de não reconhecer 
formas como sendo eternamente fixas e verdadeiras, mas 
109
Preencher potências 
e inventar educações 
possíveis: pela 
experimentação de uma 
formação-sem-órgãos
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 99-116,
nov. 2015/ fev. 2016
resultantes de complexas tramas. Veyne (2011), a partir de 
Foucault, pondera que aquilo que chamamos de conhecimento 
não é o espelho fiel da realidade, já que nem se quer existiria 
uma realidade em si. Tudo o que existe, existe enredado em 
uma rede discursiva a qual produz o que viemos então chamar 
de realidade. Esta é plural e multifacetada, não podendo ser 
suprimida de forma unidirecional e unidimensional. Desse 
modo, não há a educação ou a formação, mas uma educação 
ou uma possibilidade formativa, assim como não há o docente 
e o aprendiz, mas um docente e um aprendiz. Tais enlaces 
dependem de um espaço específico e de um acordo discursivo 
enquanto expressos incorporais que agem diretamente sobre 
os corpos envolvidos nesses fenômenos/campos de atuação, 
bem como nessas individualidades/singularidades.
CORPO-ALEGRIA: FUGA E LIBERDADE
Breve diálogo com uma criança:
Eu: - Quando você entra em férias de inverno?
A criança responde: - Hoje foi o último dia. 
As aulas voltam no final do mês.
Eu sigo o papo: - Coisa boa! Vai ter um bom 
tempo para descansar, brincar, dormir até 
tarde...
Ela retribui: - É... Hoje, quando saímos da 
escola gritamos: “LIBERDADE!” Eu, e todos 
os meus colegas...6
Deleuze e Guattari (1997a) afirmam que dois planos 
paralelos sustentariam, respectivamente, estratos e vetores de 
desestratificação. Um plano de organização ou desenvolvimento 
6 Este excerto é parte dos registros de pesquisa do primeiro autor deste artigo. 
Trata-se de um diálogo via site de relacionamento com uma criança de apenas 
nove anos, sobre sua rotina escolar.
110
Cristian Poletti Mossi
Marilda Oliveira de Oliveira
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.99-116 ,
nov. 2015/ fev. 2016
sustentaria órgãos, funções, sujeitos e relações entre estratos, já, 
um plano de consistência ou imanência, sustentaria somente 
movimentos e repousos entre partículas ainda não formadas, 
implicando em uma desestratificação de toda a Natureza7. 
Nesse sentido, o plano de consistência ou imanência seria, 
segundo os autores, o próprio corpo-sem-órgãos e não preexistiria 
aos movimentos de desterritorialização que o desenvolvem, às 
linhas de fuga que o traçam e o fazem subir à superfície, aos 
devires que o compõem. O plano de organização, por sua vez, 
não pararia de tentar barrar as linhas de fuga e interromper os 
devires e desterritorilizações do plano de consistência, assim 
como este último não pararia de levar partículas a fugirem 
e se desterritorializarem de seus estratos, traçando linhas de 
fuga e invencionando devires de toda a ordem (DELEUZE & 
GUATTARI, 1997a).
Intentando tensionar ainda mais as relações entre 
aprendizes, docentes e ambientes educativos, como epígrafe 
deste subtítulo, apresento parte de minhas anotações de 
pesquisa por entender que, o desejo de liberdade da criança 
mencionada e de seus colegas ao saírem da escola e entrarem em 
férias, parece elucidar o trabalho de um plano de consistência 
(as desterritorializações, os devires e as linhas de fuga buscadas 
e percorridas nesse ato) sobre um plano de organização 
e desenvolvimento (a escola, seu prédio arquitetônico 
padronizado, seus rituais e rotinas, seus horários, sua rigidez, 
suas proibições). Ou seja, parece trazer à tona a busca por um 
corpo-sem-órgãos coletivo das crianças, agora distantes do 
organismo escolar.
Não se trata aqui de denunciar um dos planos como se 
fosse algo benéfico e outro como algo macabro, não há juízos 
de valores em ambas as instâncias. Nenhum dos planos é fixo e 
pode ser tido como eterno, não há como construir morada em 
algum deles. Há somente a constatação de ambos os planos 
7 A opção pela letra maiúscula na palavra Natureza é da própria tradução da obra 
Mil Platôs (1997a).
111
Preencher potências 
e inventar educações 
possíveis: pela 
experimentação de uma 
formação-sem-órgãos
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 99-116,
nov. 2015/ fev. 2016
agindo paralelamente, um sobre o outro. Não se trata de uma 
briga entre o bem e o mal, mas do que escorre e é arrastado 
para fora desses e de qualquer valor absoluto, bem como dos 
devires e desterritorializações que tais crianças se submetem 
ao supostamente percorrerem uma possível linha de fuga, 
conquistando o que para elas significa alegria e liberdade.
A quem damos ouvidos e sobre que discursos 
sobrecodificamos as teorias que interpenetram-se às nossas 
práticas no campo educativo? Que vozes são trazidas para a 
discussão e que tantas outras são suprimidas? Gallo (2010), 
embasado em um diálogo entre Foucault e Deleuze – onde 
este último afirma que se as crianças fossem capazes de 
fazer entender seus protestos no período escolar isso geraria 
profundas modificações no campo educacional – pondera 
que não permitimos que as mesmas sejam ouvidas em nossas 
produções as quais pretendem embasar práticas docentes no 
cotidiano da educação e que quando o fazemos, partimos 
sempre de pressupostos, de pré-concepções, ou seja, ouvimos 
o que queremos ouvir.
As teorias educacionais são totalizações da 
teoria, imposições de poder. Por outro lado, 
mesmo as práticas educativas são totalizações 
e imposições de poder, na medida em que se 
fazem sempre pensando para crianças e não 
pensando com elas (GALLO, 2010, p. 60, 
grifo do autor).
Nesse viés, mais uma vez menciono que, embora 
se esteja falando de aprendizes ao relatar um breve diálogo 
com uma criança, não se deixa necessariamente de falar de 
formação de docentes, tampouco de ambientes educacionais. 
Não há binômios possíveis em tais relações estabelecidas. Há 
talvez uma ponte, uma superfície que liga corpos, instituições 
e práticas, as quais se sustentam de formaestrática sobre 
um plano de organização que tenta burlar linhas de fuga, 
territorializar partículas desterritorializadas e sanar qualquer 
tipo de devir que traça um plano de consistência ou imanência 
112
Cristian Poletti Mossi
Marilda Oliveira de Oliveira
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.99-116 ,
nov. 2015/ fev. 2016
desestratificado. Há talvez a possibilidade de repensarmos, 
com e a partir das crianças, algo do qual elas também fazem 
parte. Há talvez uma busca por um corpo-sem-órgãos teórico, 
o qual não sustenta prerrogativas deveras instauradas: de 
que uma produção teórica necessita insurgir verticalmente, 
do intelectual (adulto, experiente, titulado) para os que se 
sujeitam e colocam suas prescrições em prática.
Partindo, portanto, do que podem nos ajudar a pensar as 
crianças aqui mencionadas, a liberdade de que elas nos falam, 
está distante da concepção de liberdade ideológica proposta 
por qualquer tipo de corrente de pensamento ou paradigma 
filosófico. Não se trata de uma liberdade utópica que dependeria 
de complexas estratégias de conquista, mas de uma liberdade 
praticável enquanto efetuação e “preenchimento de uma 
potência”, como nos diz Deleuze pautado por Spinoza em seu 
Abecedário8. Nesse sentido, não há potências que sejam ruins,
o que é ruim não é... O ruim é o menor 
grau de potência. E este grau é o poder. O 
que é a maldade? É impedir alguém de fazer 
o que ele pode, é impedir que este alguém 
efetue a sua potência. Portanto, não há 
potência ruim, há poderes maus. (Deleuze, 
1988/1989, s/p).
Assim que uma potência é preenchida, a alegria e as 
potências de agir do corpo afloram e aumentam em vazão 
e intensidade, invencionando espaços, gestos, percursos, 
expressões e novas cartografias em composições com toda 
e qualquer imagem possível ao subverterem poderes e 
autoridades. Nesse sentido é que devir alguma coisa – devir-
criança, por exemplo – nunca será imitar uma criança, mas 
compor com sua imagem (DELEUZE & GUATTARI, 1997a) 
um corpo até então não visto. Não se trata de representar a 
criança, mas de inventar uma criança que estreita suas relações 
8 Série de entrevistas concedias à Claire Parnet, filmada nos anos 1988-1989. 
No Brasil, foi divulgado pela TV Escola, Ministério da Educação. Tradução e 
Legendas: Raccord [com modificações].
113
Preencher potências 
e inventar educações 
possíveis: pela 
experimentação de uma 
formação-sem-órgãos
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 99-116,
nov. 2015/ fev. 2016
com o mundo ao se sentir ‘livre’ da escola pelo período de 
férias, mas o mantém em potência para as incertezas e as 
surpresas que virão.
É claro que essa liberdade de que se fala nunca é absoluta, 
visto que as normativas e os poderes estão por todos os lugares 
em uma trama que cobre um plano de organização que se 
estende não só pelos ambientes escolares ou institucionais 
de qualquer tipo, mas pelas cidades, pelas famílias e até 
mesmo pelos espaços de entretenimento. Há nessa concepção 
de liberdade somente uma linha de fuga a ser percorrida 
enquanto vetor de desterritorialização, entendendo que, como 
afirma Deleuze (1988/1989), “não há território sem um vetor 
de saída do território e não há saída do território, ou seja, 
desterritorialização, sem, ao mesmo tempo, um esforço para 
se reterritorializar em outra parte”. Justamente por isso que, 
ao menos nessa escrita, ela não tem conexão com qualquer 
tipo de compromisso ideológico no sentido de um modelo a 
ser buscado e seguido. 
POR UMA EDUCAÇÃO/FORMAÇÃO-SEM-ÓRGÃOS
Deleuze e Guattari (1996) buscam em Artaud 
possibilidades para pensar a experimentação, a fabricação de 
um corpo-sem-órgãos. Dessa forma, evidenciam que a mesma 
não se trata de um mero conceito, mas sim de uma prática 
a qual envolve não unicamente o corpo físico, biológico, 
cotidiano, mas especialmente um corpo que serviria de plano 
de imanência/consistência para o desejo9. Desse modo, o 
corpo-sem-órgãos não declara guerra aos órgãos, ao corpo em 
si – visto que precisa dele para abrir-se às intensidades a que se 
propõe – mas sim ao organismo hierarquizado. Não é o corpo 
físico nem se confunde com ele, porém dele precisa para que 
nele as intensidades transitem.
9 Na perspectiva esquizoanalítica de Deleuze e Guattari, o desejo não é a falta 
e nem depende de fatores unicamente externos tal como na perspectiva 
psicanalítica (falta de algo, de alguém, de alguma coisa), mas sim produção de 
intensidades (ideia de fábrica, usina), imanência.
114
Cristian Poletti Mossi
Marilda Oliveira de Oliveira
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.99-116 ,
nov. 2015/ fev. 2016
Trata-se de criar um corpo sem órgãos ali 
onde as intensidades passem e façam com 
que não haja mais nem eu nem o outro, isto 
não em nome de uma generalidade mais 
alta, de uma maior extensão, mas em virtude 
de singularidades que não podem mais ser 
consideradas pessoais, intensidades que não 
se pode mais chamar de extensivas. O campo 
de imanência não é interior ao eu, mas 
também não vem de um eu exterior ou de 
um não-eu. Ele é antes como o Fora absoluto 
que não conhece mais os Eu, porque o 
interior e o exterior fazem igualmente parte 
da imanência na qual eles se fundiram 
(DELEUZE & GUATTARI, 1996, p. 18).
Pensar a educação/formação, ou se preferirmos, o 
próprio exercício da aprendizagem da docência, bem como 
sua relação com os aprendizes e ambientes educativos envoltos 
por uma prática que interage com a experimentação de um 
corpo-sem-órgãos, implica entende-los, primeiramente, não 
enquanto um receituário, ou como um modelo a ser seguido, 
mas sim enquanto singularizações que se desenvolvem e que 
são construídas através de devires, individuações os quais 
buscam antes a multiplicidade, ou seja, a “inexistência (...) de 
unidade que sirva de pivô no objeto ou que se divida no sujeito” 
(DELEUZE & GUATTARI, 1995a, p. 16). Não há, portanto, 
a universalização de qualquer procedimento ou método que 
seja, tampouco identidades, papéis e posturas fixas.
Nesses devires, há também inúmeras invenções de 
caminhos possíveis, caminhos que se constituem como 
desvios se levarmos em conta o que já está deveras instituído e 
legitimado organicamente. Há sempre aquilo que escapa, que 
foge à usualidade da tentativa de totalidade e que pode passar 
a ser produtivo na improdutividade, se assim o fizermos. 
Blanchot (2010, p. 60) contribui com tal imagem ponderando 
que “a questão a mais profunda, é esta experiência do desvio 
no modo de um questionamento anterior ou estranho, ou 
posterior a toda a questão”. Um fora talvez?
115
Preencher potências 
e inventar educações 
possíveis: pela 
experimentação de uma 
formação-sem-órgãos
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 99-116,
nov. 2015/ fev. 2016
Nesse sentido, o que pode haver são encontros de 
corpos que afetam-se em seus percursos, aumentando e/
ou diminuindo suas potências de agir (SPINOZA, 2010). 
Retomando Deleuze em seu Abecedário (1988-1989), não 
há maus encontros, apenas encontros improdutivos, que não 
geram outros percursos e possibilidades. Nesses encontros 
de que falamos, não há eu e o outro, eu e o espaço educativo, 
o docente e o aprendiz, porque não há sujeitos e identidades, 
mas singularidades que ao se individuarem acessam a 
um fora absoluto enquanto espaço aberto e profícuo para 
experimentações múltiplas, onde as categorias binárias dentro/ 
fora, acima/abaixo por exemplo, não são mais suficientes, 
tampouco cabíveis.
Há sempre a possibilidade de traçar uma cartografia 
sinuosa que atravessa subterraneamente os caminhos já 
incessantemente pisados. Falar de uma educação/formação 
que almeja tal iniciativa é falar, de certo modo, sobre subverter 
um campo que tradicionalmente se instaura sob a égide da 
disciplina, da organização, das normase das rotinas rígidas, 
do distanciamento entre docentes e aprendizes. Contudo, tal 
subversão procura aqui ser pensada dentro da mesma acepção 
que a liberdade enunciada pelas crianças anteriormente 
descritas: não se trata de uma subversão revolucionária, mas de 
uma subversão que se instala no que quer subverter, conhece 
de forma apurada seu funcionamento e resiste ao mesmo de 
modo produtivo, inventivo, muitas vezes fazendo uso de certas 
tradições para o que lhe convém.
REFERÊNCIAS
AGAMBEN, Giorgio. O que é o contemporâneo? E 
outros ensaios ? [tradução de Vinícius Nicastro Honesko]. 
Chapecó/SC: Argos, 2009.
ARTAUD, A. Para acabar com o julgamento de Deus 
(1947). In: WILLER, C. [tradução, seleção e notas]. Escritos 
de Antonin Artaud. Porto Alegre: L&PM, 1983.
BLANCHOT, Maurice. A conversa infinita [tradução 
de João Moura Jr.]. São Paulo: Escuta, 2010.
DELEUZE, Gilles. O Abecedário de Gilles Deleuze. 
Realização de Pierre-André Boutang, produzido pelas Éditions 
Montparnasse, Paris. No Brasil, foi divulgado pela TV Escola, 
Ministério da Educação. Tradução e Legendas: Raccord [com 
modificações]. A série de entrevistas, feita por Claire Parnet, 
foi filmada nos anos 1988-1989.
DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. Mil platôs: 
capitalismo e esquizofrenia, vol. 1 [tradução de Aurélio Guerra 
e Célia Pinto Costa]. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1995a.
_________________________________. Mil platôs: 
capitalismo e esquizofrenia, vol. 2 [tradução de Ana Lúcia de 
Oliveira e Lúcia Cláudia Leão]. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1995b.
_________________________________. Mil platôs: 
capitalismo e esquizofrenia, vol. 3 [tradução de Aurélio Guerra 
Neto ET alii]. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1996.
_________________________________. Mil platôs: 
capitalismo e esquizofrenia, vol. 4 [tradução de Suely Rolnik]. 
Rio de Janeiro: Ed. 34, 1997a.
_________________________________. Mil 
platôs: capitalismo e esquizofrenia, vol. 5 [tradução de Peter 
Pál Pelbart e Janice Caiafa]. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1997b.
GALLO, Silvio. Filosofia da diferença e educação: o 
revezamento entre teoria e prática. In: CLARETO, Sônia 
Maria; FERRARI, Anderson. Foucault, Deleuze e Educação. 
Juiz de Fora: Ed. UFJF, 2010.
SPINOZA, Benedictus de. Ética [tradução e notas de 
Tomaz Tadeu]. 3 ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2010.
VEYNE, Paul. Foucault: seu pensamento, sua pessoa. 
Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 2011.
Data de recebimento: agosto de 2014
Data de aceite: junho de 2015
117
Cansadas de esperar 
godot quebramos 
os espelhos
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 117-136,
nov. 2015/ fev. 2016
CANSADAS DE ESPERAR GODOT 
QUEBRAMOS OS ESPELHOS
Carmen Lúcia Vidal Pérez1
Luciana Pires Alves2
Resumo
As práticas pedagógicas disseminadas no cotidiano escolar 
respondem/correspondem a uma concepção de cognição 
que expulsa dos bancos escolares a imaginação, o rememorar, 
a herança cultural e os modos de fazer de todos aqueles 
que não se limitam a quantificar e ou pensar de forma a 
classificar, segregar, separar e ordenar o conhecimento. O 
modelo cognitivo escolar deixa de fora possibilidades de 
conhecer de diferentes grupos sociais que beberam em outra 
tradição, desprezando suas formas de aprender, colocando 
a margem outros conhecimentos e outros processos 
cognitivos. A busca por práticas pedagógicas mais justas dá 
visibilidade à injustiça cognitiva, que se faz sentir na escola 
quando os sistemas de significação, os saberes e as práticas 
culturais são sufocados ou historicamente desvalorizados 
em nome do progresso ou de uma única forma de ser e 
estar no mundo. Questionar o modelo de conhecimento 
fundado na representação é questionar o fracasso da escola. 
Na pesquisa nos dobramos sobre as questões relativas à 
formulação de novas possibilidades para a ação educativa da 
escola a partir da revisão-ampliação do conceito de cognição, 
articulando-o a uma perspectiva político-epistemológica 
fundada na concepção de injustiças cognitiva.
Palavras Chave: Representação; Cognição; Aprendizagens.
1 Carmen Lúcia Vidal Pérez – Universidade Federal Fluminense (UFF).
 E-mail: clvperez@gmail.com
2 Luciana Pires Alves – Secretaria Municipal de Educação de Duque de Caxias – RJ.
 E-mail: lualpires@gmail.com
118
Carmen Lúcia Vidal Pérez 
Luciana Pires Alves 
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.117-136 ,
nov. 2015/ fev. 2016
Abstract
The pedagogical practices disseminated daily in schools 
respond / correspond to a conception of cognition that 
expelled students banks imagination, remembering the 
cultural heritage and ways of doing all of those who are 
not limited to quantify and to think or rating , segregate, 
separate and organize knowledge. The cognitive model 
school leaves out opportunities to learn from different 
social groups who drank in another tradition, disregarding 
their ways of learning, putting the margin other knowledge 
and other cognitive processes. The search for pedagogical 
practices fairer gives visibility to cognitive injustice that is 
felt in school when systems of meaning, knowledge and 
cultural practices are historically undervalued or suffocated 
in the name of progress or a single way of being in world. 
Questioning the model of knowledge representation is 
founded on questioning the failure of the school. In the 
research we doubled on issues relating to the formulation of 
new possibilities for educational activities from reviewing 
school-extended concept of cognition, linking it to a 
political-epistemological perspective founded on the 
concept of cognitive injustices.
Keywords: Representation; Cognition; Learning.
119
Cansadas de esperar 
godot quebramos 
os espelhos
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 117-136,
nov. 2015/ fev. 2016
CANSADAS DE ESPERAR GODOT 
QUEBRAMOS OS ESPELHOS
“Nunca se sabe de antemão como alguém vai 
aprender (...)
Aprender é tão somente o intermediário entre 
não-saber e saber,
 a passagem viva de um a outro” 
(Gilles Deleuze).
A pratica pedagógica escolar é fruto de uma tradição. 
Uma tradição, que nos ensinou a pensar e a agir a partir de 
um universo discursivo considerado único e verdadeiro. Na 
escola o conhecimento é transmitido, difundido e socializado 
a partir de uma ordenação lógica que tem como fundamento 
uma concepção de totalidade em que o todo tem primazia 
sobre cada uma das partes, que só existem em função do todo 
e, de uma temporalidade abstrata que sustenta a ordenação e 
a progressão do conhecimento [curricular] estruturado numa 
seqüência gradual do simples ao complexo, criando pré-
requisitos para o ensino e para “aprendizagem”. 
O modelo escolar de conhecimento engendra [e é 
engendrado por] um processo cognitivo em que a atenção 
focal, a percepção [auditiva] e a memorização constituem a 
base da “aprendizagem”. Para aprender na escola a criança 
deve ser capaz de ouvir [atentamente uma explanação sobre 
determinado assunto], ler [reconhecer novos conhecimentos 
sobre o assunto no livro didático disponível] e escrever 
[reproduzir de modo preciso] o “aprendido”. Tal modelo 
toma a cognição em sua função intermediária: através dela 
o sujeito [cognoscente] entra em relação com o objeto [do 
conhecimento], o que resulta num conhecimento como 
representação do objeto. 
Na escola o conhecimento é concebido como 
aprendizagem de uma perícia: o conhecimento é tratado 
120
Carmen Lúcia Vidal Pérez 
Luciana Pires Alves 
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.117-136 ,
nov. 2015/ fev. 2016
como reconhecimento - conhecer é representar o conhecido. 
Na moderna sociedade contemporânea a escola cumpre 
a função de formar peritos. Fundada numa perspectiva 
políticoepistemológica que reduz a teoria do conhecimento a uma 
teoria do conhecido, a prática educativa escolar se estruturaa partir de uma ordenação lógica em que o conhecimento é 
tratado como representação do conhecido. Tal lógica sustenta 
as discussões sobre o currículo, a aprovação/reprovação e o 
destino acadêmico/profissional dos estudantes.
Vivemos no cotidiano da escola o teatro da representação 
– no sentido que lhe atribui Deleuze (2003) – que se nutre e 
se realiza no fluxo significado-significante fabricando padrões 
de comportamento ao mesmo tempo em que engendra formas 
e modos de pensar e agir
produzindo desejos e sentidos. Na escola [e na vida 
social] a representação opera na/para a reprodução do mesmo.
- “Nada a fazer". Diz Gogo (Estragão) em baixo de 
uma árvore no meio de uma estrada, em lugar nenhum, em 
qualquer lugar.
-“Não podemos fazer nada”. Dizem uma, duas, dez, cem 
professoras, diante dos impasses do cotidiano da sala de aula, 
uma sala de aula, duas salas de aulas, dez salas de aulas, cem 
salas de aulas, de uma escola, qualquer escola, todas as escolas...
Como Estragão (Gogo) e Vladimir (Didi), personagens 
de Beckett, muitas professoras também esperam por Godot: 
um acontecimento ou pessoa que venha a modificar a vida 
cotidiana da sala de aula, ou, um método que lhes oriente 
como agir e um material didático que lhes ajude a ensinar.... 
As professoras esperam, mas Godot não vem e não virá. Godot 
já chegou, está presente no cotidiano da escola sob a forma do 
tem que ser assim!
A lógica do tem que ser assim fundada na representação 
generaliza-se em hábito. Aí reside a força da representação 
- fazer do hábito uma segunda natureza – ou seja, a 
representação naturaliza as relações de poder [e as normas e 
121
Cansadas de esperar 
godot quebramos 
os espelhos
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 117-136,
nov. 2015/ fev. 2016
sanções], legitima conhecimentos e formas de produção do 
saber [produzindo epistemicídios e injustiças cognitivas], 
organiza pensamentos e sentidos [limitando experiências e 
reflexões], define comportamentos [controlando a criatividade 
e o desejo] e, constitui a subjetividade humana. 
A obediência a norma do tem que ser assim [crianças em 
fila seguindo para a sala de aula, carteiras enfileiradas umas atrás 
da outras, pedir permissão para falar, para se locomover, para ir 
ao banheiro, para beber água e aprender a escrever para depois 
ler; professoras atônitas diante das recomendações de: ensinar 
primeiro as vogais, depois sílabas simples e paulatinamente as 
“complexidades” da língua, trabalhar todo o livro didático, 
preparar as crianças para as avaliações externas, etc.] produz a 
angústia de uma expectativa que nunca se realiza. No cotidiano 
da escola a obediência gera angústia, frustração e cansaço. 
Muitas professoras vivem o cotidiano da escola como Estragão 
e Vladimir - que esperam em baixo de uma árvore numa estrada 
deserta em que ninguém vem ninguém vai e nada acontece – 
paralisadas e resignadas esperam desesperançadamente.
A organização do trabalho na escola se funda na 
estrutura sedentária da representação (Deleuze, 2003, p. 54). 
A hierarquia - mando e obediência, superior e inferior, forte 
e fraco – empobrece e restringe as experiências educativas e 
limita a ação escolar à reprodução do mesmo.
Enquanto esperam silenciosamente que nada aconteça 
Estragão e Vladimir são surpreendidos com a chegada de dois 
“estranhos”, embora muito familiares Pozzo e Lucky. Pozzo 
puxa uma corda que está amarrada ao pescoço de Lucky, que 
por sua vez carrega uma mala pesada que não larga um só 
instante, uma banqueta dobrável, uma cesta e um casaco. 
Pozzo carrega um chicote, com o qual controla as atitudes de 
Lucky e garante à obediência as suas vontades: alto, casaco! 
Para trás, cesta, banqueta.
Extração e Vladimir não se espantam com o desconforto 
da situação de Lucky, com seu esforço para executar as ordens 
recebidas ou com os castigos por não conseguir realizar a tarefa 
122
Carmen Lúcia Vidal Pérez 
Luciana Pires Alves 
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.117-136 ,
nov. 2015/ fev. 2016
a contento. “O que de fato os deixa abismados é a descoberta 
de que Lucky é capaz de pensar:” Pense!”diz Peso
E Samuel Beckett nos mostra o pensamento de Lucky:
Dada a existência tal como se depreende 
dos recentes trabalhos públicos de 
Poinçon e Wattmann de um Deus pessoal 
quaquaquaqua de barba branca quaqua 
fora do tempo e do espaço que do alto de 
sua divina apatia sua divina athambia sua 
divina afasia nos ama a todos com algumas 
poucas exceções não se sabe por que, mas o 
tempo dirá atormentados atirados ao fogo 
às flamas às labaredas que por menos que 
isto perdure ainda e quem duvida acabarão 
incendiando o firmamento, a saber, levarão 
o inferno às nuvens tão azuis às vezes e ainda 
hoje calmas tão calmas de uma calma que 
nem por ser intermitente é menos desejada, 
mas não nos precipitemos e considerando 
por outro lado os resultados da investigação 
interrompida não nos precipitemos à 
investigação interrompida, mas consagrada 
pela Academia de Antropopopometria [...] 
(BECKETT, 2005, p. 85)
Para nós é impossível ler/ver esta passagem da peça 
de Beckett sem nos reportarmos às condições de produção 
do pensamento/conhecimento na escola. Mais do que um 
pensamento “sem coerência”, o que Lucky nos mostra é uma 
aprendizagem, do pensar e do agir, objetificada: o ato de pensar 
e seu conteúdo resultam da pobreza de suas experiências e de 
sua existência objetificada. 
Mais do que um modelo de conhecimento, a 
racionalidade indolente – que engendra e é engendrada 
pela representação - produz [e reproduz] um sistema de 
signos e valores que, fundados na lógica da reduplicação do 
mesmo, difunde “verdades” que se configuram como saberes 
123
Cansadas de esperar 
godot quebramos 
os espelhos
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 117-136,
nov. 2015/ fev. 2016
universais3. A razão indolente fundamenta tanto a organização 
curricular do conhecimento, quanto os procedimentos 
didáticos e metodológicos subjacentes às práticas escolares. Os 
dispositivos pedagógicos engendrados na e pela razão indolente 
cumprem a função de marginalizar e ocultar a diversidade de 
saberes - que se organizam e se estruturam a partir de outras 
lógicas de pensamento e ação – que caracterizam outros 
modelos de racionalidade e divergem da lógica operante 
da escola e, por conseguinte, outros modos de aprender e 
produzir conhecimentos, que circulam [e são invisibilizados] 
no cotidiano da sala de aula.
Impactadas diante de tais constatações nos debruçamos 
sobre as implicações do teatro de representação na educação. 
Questionamos as possibilidades de fazerpensar uma prática 
educativa para além do condicionamento de ações (e 
pensamento), de memorização de conteúdos, de controle de 
subjetividades e de fixação de significações dominantes. Quais 
as reais possibilidades de pensarpraticar uma educação, que 
para além das estruturas sedentárias de representação, tome 
como fundamento a experiência e o movimento da vida 
cotidiana?
Em nossa busca praticoteorica nos deparamos com o 
conceito de memória longa (Deleuze e Guattari):
[...] a memória longa diz respeito às 
estruturas sedentárias da representação 
dominante e autorrefenciada que, como 
em um jogo de espelho, desdobra o mesmo 
significado e atribuição de valor para as 
coisas. É uma imagem que, no lugar de 
3 A ciência moderna promulga como saberes universais aqueles que sustentam 
as leis gerais, que regulam o mundo e seus habitantes. A Ciência como projeto 
da modernidade, confere um caráter universal a representações “verdadeiras”, 
daquilo que recorta como objeto de investigação, operando com demarcações 
que consistem em delimitar o que há de universal sob as particularidades e/
ou contingências. Os saberes universais emergem de um projeto de totalização 
(e totalitário) queexclui outras formas de racionalidade, lógica e relações 
cognitivas que não se adaptam ao modelo de hegemônico de representação de 
mundo. A esse respeito ver LATOUR, 1994. 
124
Carmen Lúcia Vidal Pérez 
Luciana Pires Alves 
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.117-136 ,
nov. 2015/ fev. 2016
obedecer à característica singular do objeto 
que deve ser refletido, ao contrário, forja nele 
uma mutação constante para ele obedecer ao 
padrão da imagem de antemão concebida. 
A memória longa (família, raça, sociedade 
ou civilização) decalca e traduz, mas o que 
ela traduz continua a agir nela, à distância, 
a contratempo, intempestivamente, não 
instantaneamente. (2004, p. 26).
Instigadas por tal formulação buscamos em nossas 
ações de investigação-formação desfazer esse jogo de espelhos 
subjacente as práticas cotidianas da/na escola. A escola, 
professores, crianças, jovens e suas famílias encontram-se 
num labirinto de espelhos que reproduzem a mesma imagem 
infinitamente criando a ilusão de que estamos diante de novas 
perspectivas ou de novas imagens. Imagens que refletem 
imagens e que se apresentam [e são percebidas como] novidade. 
Mas neste labirinto não existe o novo, somente o mesmo. O 
que fazer? Esperar a chegada de Godot? Não! Juntamente com 
as crianças e suas professoras partimos para a grande aventura 
de quebrar os espelhos!
QUEBRANDO ESPELHOS: CONHECER E APRENDER NA 
TRANSVERSALIDADE
Quebrar espelhos na educação é uma tarefa árdua, 
difícil e muitas vezes dolorosa. Por acreditarmos na potência 
da criação, assumimos as possibilidades de outra educação, 
,-ou melhor, dizendo, de muitas outras educações – em que as 
certezas são provisórias e as verdades, sempre parciais, expressam 
um ponto de vista, uma possibilidade, uma experimentação... 
(PÉREZ, 2003, p.4).
Afirmamos outros funcionamentos para a prática 
educativa: a aula é um acontecimento, que traduz outras/novas 
experiências de criação e de encontro de formas singulares de 
aprender, conhecer e viver. A aula como acontecimento é uma 
experiência de encontros entre o aprender e o ensinar, portanto, 
para além dos métodos e teorias totalizantes elegemos alguns 
125
Cansadas de esperar 
godot quebramos 
os espelhos
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 117-136,
nov. 2015/ fev. 2016
princípios que organizam nossas ações [de investigação-
formação] com as crianças e suas professoras: (i) pensamento 
é criação; (ii) conhecimento é autoria; a aprendizagem é um 
processo coletivo - aprender não é fazer como, mas fazer com; (iii) 
educar não é conduzir (como postula a perspectiva moderna 
da pedagogia), mas alimentar: a prática educativa potencializa 
(no sentido de nutrir) a criação e é a professora quem alimenta 
o fazer com, o fazer junto, a conquista da autonomia e a 
afirmação da autoria - o fazer por si mesmo.
Quebrar o espelho em que se reflete a racionalidade 
indolente da escola é uma ousadia. O que os estilhaços desse 
espelho quebrado nos revelam? Revelam como faz diferença 
afirmar para a criança porque não, ou ajudá-la a se perguntar 
por que não? O exercício da pergunta (por que não?) nos 
coloca outras possibilidades e experiências que nos fazem 
pensar, força a invenção e rompe com a naturalização do 
não saber ou da ignorância. Praticar a Pedagogia da Pergunta 
(FREIRE, 1991), é apostar na invenção como produção de 
conhecimentos suprimindo a intermediação da representação: 
a criança produz conhecimento pela ação inventiva [conhecer 
é criar], não representativa.
O senso comum científico, característico do 
conhecimento escolar, não possibilita que professoras e 
crianças pratiquem a “pedagogia da pergunta”. A ênfase 
no conhecimento como um processo de assimilação de 
informações, impede que se instale o processo de investigação 
da realidade e, a potencialização da curiosidade e da descoberta 
como formas de conhecer. O exercício da pergunta colocou 
as professoras e as crianças diante de outras possibilidades e 
experiências que forçam o pensamento, a invenção e rompem 
com a naturalização do não saber ou da ignorância.
Metodologicamente entendemos nossa pesquisa 
inter(in)venção como um acontecimento resultante do 
compartilhar e do movimento coletivo de crianças, professoras 
e professoras que fazem do cotidiano da sala de aula uma 
possibilidade de aventuras. Temos investido na configuração 
126
Carmen Lúcia Vidal Pérez 
Luciana Pires Alves 
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.117-136 ,
nov. 2015/ fev. 2016
de metodologia(s) e práticas produzidas em parceria com as 
crianças, que apostam na potência da autoria e na invenção 
de outras formas de aprenderensinar, a partir de um paradigma 
ético-estético que se distancia das lógicas, práticas e teorizações 
tecnocráticas4.
Os cacos do espelho quebrado também revelam que 
é possível romper com o signo da convergência do mesmo 
e do fechamento do sistema cognitivo5, pela afirmação do 
diálogo entre diferentes formas de ser, pensar e produzir 
conhecimentos. 
Em nossa empreitada de quebrar espelhos, ou, de 
romper os limites [e as limitações] da representação nos 
deixamos guiar pela curiosidade da criança: é a curiosidade 
que move a busca, dando energia para permanecer a procura, 
mas há uma diferença ou uma exigência, quem busca não se 
apodera da curiosidade entrega-se a ela, num movimento de 
ruptura com a visão do cotidiano como mesmice ou rotina - 
que oblitera nossa percepção da diferença, nos distanciando 
da aura da inventividade, como indica Benjamin ao comparar 
o rastro e a aura:
O rastro é a aparição de uma proximidade, 
por mais longínquo esteja aquilo que o 
deixou. A aura é a aparição de algo longínquo, 
por mais próximo esteja aquilo que a evoca. 
No rastro, apoderamo-nos da coisa; na aura, 
ela se apodera de nós (1994, p.40).
4 A pesquisa Injustiças Cognitivas: ressignificando os conceitos de cognição, 
aprendizagem e saberes no cotidiano escolar refere-se à investigação que 
desenvolvemos ao longo de 03 anos, com crianças de classes populares, alunas 
do Ciclo de Alfabetização da rede municipal de Educação de Duque de Caxias 
– cidade situada na Baixada Fluminense na periferia do Rio de Janeiro.
5 Segundo Kastrup, no quadro dos grandes sistemas, a cognição é entendida 
como idêntica a si mesma, fechada aos efeitos imprevisíveis do tempo, marcada 
pela repetição, por um funcionamento que se mantém sempre o mesmo. As 
condições da cognição são invariantes, correspondem a um sistema fechado 
onde o tempo não opera transformações significativas (2007, p.66).
127
Cansadas de esperar 
godot quebramos 
os espelhos
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 117-136,
nov. 2015/ fev. 2016
A passagem de Benjamin nos obriga a questionar as 
relações de perspectiva: o próximo e o distante, o possível e 
o impossível. A pesquisa com as crianças e suas professoras 
tem nos obrigado a fazer o movimento de ruptura com a 
racionalidade dominante, resgatando a possibilidade como 
categoria modal da existência.
Procurando estabelecer uma dinâmica diferente da 
lógica seriada acreditamos que a sala de aula pode funcionar 
como um coletivo de intercâmbio de experiências e, por isso 
mesmo, de criação de percursos com o conhecimento. Tal 
possibilidade se materializa no cotidiano da escola como um 
processo que chamamos de aula como acontecimento, pois a 
organização inventada exige que a escola funcione como 
espaço da pergunta, da curiosidade, da investigação... 
Estudar ótica ou eletricidade e magnetismo ou 
moléculas, no terceiro ano do ciclo de alfabetização do ensino 
fundamental é do ponto de vista do modelo lógico-cognitivo 
operante inaceitável, pois a razão indolente - que nos (de)
forma - postula a progressão do conhecimento em seus 
diferentes níveis de complexidade. Dessa forma somos levadas 
a acreditarque nesta fase de seu desenvolvimento, as crianças 
ainda não possuem ‘maturidade psíquica’ que as capacitem 
a apreender relações físicoespaciais complexas e formulações 
científicas mais “abstratas”.
Uma câmera de filmar e uma turma de 26 crianças, o 
que pode acontecer? As crianças da escola pública na Baixada 
Fluminense podem fazer um filme? Logo com essas crianças! 
Uma loucura! As crianças vão quebrar a câmera! O grupo é 
muito grande! É impossível fazer um filme.... (cf. Pérez &Alves 
apud Gouveia &Nunes, 2009, p.117) 
Apresentamos para as crianças a idéia: fazer um filme 
coletivamente. Um filme feito na altura dos olhos das crianças 
- o outro. A câmera e as filmagens despertaram diferentes 
sentimentos: assombro, dúvida, desejo de participar, 
proximidade, conflito e curiosidade. 
128
Carmen Lúcia Vidal Pérez 
Luciana Pires Alves 
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.117-136 ,
nov. 2015/ fev. 2016
Uma curiosidade que nos coloca diante do aparelho 
de filmar, diante da relação entre magia e técnica, crianças ao 
redor da câmera vendo umas as outras e se perguntando como? 
Como paramos aí dentro? Dominar o aparelho: liga/desliga, 
conecta e desconecta a bateria, aperta o botão – a aprendizagem 
acontece rápida e naturalmente. Ah! A curiosidade da criança! 
Aquela companheira tantas vezes esquecida e/ou relegada ao 
segundo plano na sala de aula. Mentes curiosas e inquietas 
fuçam daqui, perguntam dali e muito rapidamente põem 
tudo para funcionar. Dominar o instrumento é o desafio que 
a curiosidade suscita. Vencido o desafio vem o assombro: como 
as imagens entram na câmera? 
Entrelaçando a aula com a experiência de fazer o filme, 
à inteligência prática e a paixão de conhecer, as experiências 
vividas e os estudos realizados com as crianças, vivemos 
cotidianamente um processo de emergência, em que 
conceitos científicos e conceitos cotidianos se integram para 
alimentar a curiosidade e a busca do grupo. A aventura 
humana de fixar imagens [desde a câmera escura à imagem 
em movimento], nos possibilita a experiência com a técnica e 
com o instrumento – à câmera de filmar faz parte do estudo 
da fotografia, da ótica, do cinema e da memória.
A câmera como um instrumento, nos conduziu aos 
estudos de ótica. O instrumento não só de filmagem, mas em 
seu sentido histórico e cultural - em seu conceito de aparelho 
óptico. A curiosidade como princípio auto-organizador nos 
possibilitou ampliar a busca e, ao mesmo tempo em que 
encontrávamos algumas respostas às nossas questões íamos, 
paulatinamente, nos apropriando [e reconstruindo] a história 
do instrumento e de suas técnicas. (cf. Pérez &Alves apud 
Gouveia &Nunes, 2009, p.117) 
A câmera escura nos levou, em muitas tardes de sol, 
para o pátio em busca do melhor ponto de observação e da 
luz que inundasse as caixinhas, para que a imagem invertida 
se fizesse em nossas pequenas telas de papel fino. Diante da 
última tecnologia, lá estávamos nós mergulhados no passado 
129
Cansadas de esperar 
godot quebramos 
os espelhos
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 117-136,
nov. 2015/ fev. 2016
de um olhar, que não tem a rapidez e a nitidez do hoje, mas é 
borrado e esperado como peripécia. 
A câmera escura, o eletroscópio, a decomposição da luz, 
o campo visual, os jogos de espelho e ilusões de ótica, assim 
como as máquinas de ver, o olho biônico, a lupa, o óculos, as 
sombras..., vamos elaborando nosso currículo praticado e a 
aula vai acontecendo. 
A conjugação de linguagens desenho, escrita e 
oralidade, fotografia e cinema, nos permite ampliar nossa 
compreensão sobre os processos cognitivos das crianças. A 
informação veiculada pelo desenho é complementada pela 
130
Carmen Lúcia Vidal Pérez 
Luciana Pires Alves 
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.117-136 ,
nov. 2015/ fev. 2016
escrita e ampliada pelo relato oral. A pesquisa com as crianças 
tem confirmado as formulações de Michel de Certeau (1998), 
ao apontar que as lógicas operatórias são plurais, por que são 
plurais as experiências dos praticantes. 
Fotografias das crianças filmando as cenas cotidianas 
foram tiradas pelas próprias crianças e fazem parte do registro 
iconográfico das aulas. Também foram produzidos slides nas 
idas à Lan House (novidade – aprender a fazer Power point) 
e ainda estudamos o funcionamento o olho humano, os 
131
Cansadas de esperar 
godot quebramos 
os espelhos
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 117-136,
nov. 2015/ fev. 2016
mecanismos da visão e os conceitos de ótica, eletricidade e o 
sistema solar – para compreender “os diferentes tipos de luz”, 
tudo devidamente registrado no caderno de investigação. 
A pesquisa com as crianças tem sido para nós uma 
experiência estética, com elas temos aprendido que o exercício 
de olhar o olhar das crianças - que nos possibilita captar as 
singularidades no/do processo de conhecer de cada uma. O 
exercício do olhar estético no cotidiano da sala de aula implica 
mobilizar os diferentes sentidos e as redes de significados 
132
Carmen Lúcia Vidal Pérez 
Luciana Pires Alves 
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.117-136 ,
nov. 2015/ fev. 2016
que tecem as idéias, as imagens, as concepções presentes nos 
diferentes estilos cognitivos das crianças. Implica ainda em 
pensar-fazer uma escola em que 
O estudo se faz de desfazer-se: não há mais 
que o risco entre ler e escrever, o desconhecido 
que volta a começar, algo (se) passa, o gesto 
de apagar o que acaba de ser lido ou escrito 
para que a página continue em branco, ainda 
por ler, por escrever (Larrosa, 2003, p.113).
Na perspectiva de um estudo que se faz de desfazer-se a 
ênfase está na conexão entre os diferentes campos do saber – 
fazer um filme significou também, estudar física, geografia, 
astronomia, etc., além de mobilizar nossos saberes sobre 
leitura, escrita, matemática, etc. 
A sala de aula ao funcionar como uma comunidade 
investigativa aponta para “... uma transversalidade entre as 
várias áreas do saber, integrando-as, senão em sua totalidade, 
pelo menos de forma muito mais abrangente, possibilitando 
conexões inimagináveis através do paradigma arborescente” 
(GALLO, 1999, p.32). A transversalidade além de promover 
diferentes trânsitos pela multiplicidade dos saberes, possibilita 
policompreensões infinitas.
A sala de aula como uma comunidade investigativa 
procura articular e se funda, numa epistemologia conectiva, que 
ao promover outra abordagem do conhecimento lhe confere 
outro funcionamento que nos permite superar a fragmentação 
do conhecimento - que ignora a interação entre o todo e as partes 
e separa o pensamento científico e o pensamento humanista 
- rompendo com hierarquizações e disciplinarizações a partir 
de uma configuração políticoepistemológica, que ao articular 
conhecimento e experiência cotidiana nos possibilita pensar as 
questões humanas e enfrentar as incertezas de nossas próprias 
aprendizagens.
O paradigma rizomático orienta nossa investigação-ação 
com as crianças e suas professoras. O paradigma rizomático 
tem como imagem um tipo de caule radiciforme, formado por 
133
Cansadas de esperar 
godot quebramos 
os espelhos
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 117-136,
nov. 2015/ fev. 2016
pequenas raízes emaranhadas. O rizoma é um conjunto complexo 
que compreende linhas segmentadas que se entrelaçam. No 
rizoma qualquer ponto pode ser conectado a qualquer outro. 
O rizoma é conectivo, reversível, susceptível a modificações 
constantes, caracteriza-se pela circulação (de estados e elementos), 
pelo movimento, pela transformação permanente, é real e virtual 
ao mesmo tempo – traz sempre a possibilidade de não ser o 
que é, de ser o que não é e de tornar-se. As crianças constroem 
rizomaticamente seu conhecimento do mundo.No paradigma rizomático os saberes transitam pelos 
diversos campos do conhecimento e articulam inúmeras 
conexões e possibilidades de compreensão. Em nossas 
investigações tomamos o princípio da transversalidade como 
um imperativo metodológico fundamental para captar, as 
intensidades dos acontecimentos e das práticas cotidianas, 
colocando-as em conexão com os diferentes campos do saber.
A transversalidade caracteriza-se no paradigma 
rizomático do saber, como uma forma de trânsito entre 
os inúmeros devires de um rizoma, transita e integra 
conectivamente diferentes áreas do conhecimento. Do ponto 
de vista da prática educativa, a transversalidade representa 
uma ruptura político-epistemológica: os saberes já não são 
mais disciplinarizados ou compartimentalizados em rígidas 
fronteiras, estão conectados, mesclados, hibridizados, numa 
forma de conhecer em que as possibilidades de trânsito e de 
articulação são infinitas. 
Entendendo o cotidiano como território da 
multiplicidade, vislumbramos na noção de transversalidade 
uma ferramenta conceitual fundamental à construção de novas 
configurações no campo da pesquisa educacional e da prática 
educativa: o princípio da transversalidade reorienta o foco de 
análise para a apreensão da complexidade, da pulverização, da 
multiplicidade e da fragmentação das relações cotidianas.
A transversalidade nos coloca o desafio de pensar outros 
sistemas de referência, ao mesmo tempo em que nos lança num 
movimento que busca apreender/compreender a realidade e o 
134
Carmen Lúcia Vidal Pérez 
Luciana Pires Alves 
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.117-136 ,
nov. 2015/ fev. 2016
cotidiano em outros termos. Vamos exercitando nosso olhar 
investigativo e articulando conexões que, transversalmente 
produzem outras significações e novos caminhos para o 
conhecimento e para as aprendizagens na escola.
CONCLUSÃO: ALGUNS ESTILHAÇOS DOS ESPELHOS QUE 
QUEBRAMOS
Em nossas pesquisas com as crianças buscamos 
colocar no centro da investigação [e do debate acadêmico-
pedagógico], a lógica, como instrumento fundamental à 
leitura do mundo. A escola ensina a criança a pensar o mundo 
na perspectiva da lógica formal - o que do ponto de vista do 
processo de aprendizagem, tem resultado num conhecimento 
do mundo, ineficaz, impedindo a aquisição de novas posturas 
e a construção de respostas necessárias ao enfrentamento dos 
desafios que o cotidiano nos coloca. 
Trazer a lógica para o centro do debate é evidenciar 
a necessidade de superar [principalmente na educação] 
a racionalidade operante, substituindo-a por um novo 
aprendizado: um aprendizado capaz de promover uma 
leitura do mundo [e da palavra] fundamentada numa relação 
dialética-dialógica capaz de resgatar as "contra-racionalidades, 
ou melhor, "racionalidades paralelas (e não irracionalidades) 
que foram jogadas embaixo do tapete da história e recusadas nos 
estudos de nossas faculdades" (SANTOS 1998).
Pensar a produção de conhecimento na escola para 
além da representação é problematizar o modelo cognitivo 
operante [que confunde a matéria com a forma dos objetos], 
substituindo-o por relações cognitivas abertas ao novo, 
imprevisíveis, que produzam tanto a inquietação, quanto a 
instabilização da própria cognição. 
Quebrar os espelhos das representações implica 
romper com os limites da recognição [condições demarcadas 
e previamente definidas, invariantes e inultrapassáveis], 
substituindo-os pela produção de outras práticas cognitivas 
135
Cansadas de esperar 
godot quebramos 
os espelhos
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 117-136,
nov. 2015/ fev. 2016
[resíduos - tudo o que escapa aos limites e aponta para outros 
modos de funcionamento cognitivo], que afirmem outras 
formas de conhecer. 
As experiências vividas com as crianças em nossa 
investigação nos permitem tecer 
argumentos em favor do resgate das experiências 
compartilhadas no cotidiano da escola e dos saberes 
que emergem de tais experiências, como alternativas 
epistemológicas fundamentais à reinvenção da sala de aula e 
da escola. Apesar da profunda crise instaurada em todos os 
campos da realidade social, as instituições escolares ainda 
podem serem espaços privilegiados 
Para produção de subjetividades potencializadas, o que 
nos desafia a investir na (re) invenção da escola como lugar 
privilegiado para a recriação de saberes.
REFERÊNCIAS
BENJAMIN, Walter. Obras escolhidas I - magia e técnica, 
arte e política. São Paulo: Brasiliense, 1994
BECKETT, Samuel. Esperando Godoy. São Paulo: Cosac 
Naify Editora, 2010.
CASTELLO, L. A.; MÁRSICO, C. T. Oculto nas 
palavras: dicionário etimológico para ensinar e aprender. Belo 
Horizonte: Autêntica, 2007.
CERTEAU, Michel de. . A Invenção do Cotidiano 1. 
Artes de fazer. Petrópolis: Vozes, 3ª ed., 1994.
DELEUZE, G. Diferença e repetição. Rio de Janeiro, RJ: 
Graal, 2003.
DELEUZE, G. e GUATTARI, F. Mil platôs: capitalismo 
e esquizofrenia. São Paulo, SP: Editora 34, vol. 1, 2004.
FREIRE, Paulo, FAUNDEZ, Antonio. Por uma 
Pedagogia da Pergunta. São Paulo: Paz e Terra, 1991. 
FIGUEIREDO SILVA, G. M. Das imagens identitárias 
da pedagogia ao ofício de
136
Carmen Lúcia Vidal Pérez 
Luciana Pires Alves 
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.117-136 ,
nov. 2015/ fev. 2016
pedagogo na contemporaneidade: traçados nômades. 
Campinas: [s.n.], 2009.
GALLO, Silvio. Transversalidade e Educação: pensando 
uma educação não-disciplinar. In: ALVES, N. e GARCIA, 
Regina L. O Sentido da Escola. Rio de Janeiro. DP&A, 1999.
GALLO, Silvio e CARVALHO, Alexandre Filordi. Do 
sedentarismo ao nomadismo: intervenções para pensar e agir 
de outros modos na educação. In: ETD – Educ. Tem. Dig., 
Campinas, v.12, n.1, p.280-302, jul./dez. 2010. 
GOUVÊA, Guaracira, NUNES, Maria Fernanda 
Rezende. Crianças, Mídias e Diálogos. Rio de Janeiro, Editora 
Rovelle, 2009.
KASTRUP, Virgínia. A invenção de si e do mundo. 
Uma introdução do tempo no estudo da cognição. Belo 
Horizonte. Autêntica, 2007.
LATOUR, Bruno. Jamais fomos modernos. Rio de 
Janeiro: Editora 34, 2000.
PÉREZ,Carmen Lúcia Vidal. Professoras 
Alfabetizadoras:Histórias Plurais.Práticas Singulares. Rio de 
Janeiro: DP&A,2003.
__________________________. e ALVES, Luciana 
Pires. Injustiças Cognitivas: ressignificando os conceitos de 
cognição, aprendizagem e saberes no cotidiano da escola. Relatório 
de Pesquisa. Rio de Janeiro. FAPERJ, 2009.
SANTOS, Boaventura de Sousa. Conhecimento 
Prudente para uma Vida Decente. Um Discurso sobre as Ciências 
revisitado. São Paulo: Cortez, 2004.
SANTOS, Milton. SANTOS, Milton. A Natureza do 
Espaço: técnica e tempo, razão e emoção. São Paulo: Hucitec, 
1998.
Data de recebimento: maio de 2014
Data de aceite: junho de 2015
137
Compromisso e amor 
como elementos centrais 
das representações 
do ser professora de 
educação infantil
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 137-164,
nov. 2015/ fev. 2016
COMPROMISSO E AMOR 
COMO ELEMENTOS CENTRAIS 
DAS REPRESENTAÇÕES 
DO SER PROFESSORA DE 
EDUCAÇÃO INFANTIL
Idélia Manassés de Barros Silva1 
Laêda Bezerra Machado2
Resumo
Este artigo identifica a estrutura das representações sociais 
que professoras de Educação Infantil construíram da 
própria profissão, enfatizando o componente mais forte 
dessa estrutura: o núcleo central. O referencial orientador 
da pesquisa foi a abordagem estrutural das representações 
sociais. Representações funcionam como guias para as ações, 
constituem um sistema de pré-decodificação da realidade 
A pesquisa tomou como campo empírico o município de 
Jaboatão dos Guararapes-PE. Participaram do estudo 134 
professoras de creches e pré-escolas vinculadas a instituições 
públicas e privadas. O procedimento de coleta utilizado foi 
a associação livre de palavras. Para análisedas evocações 
utilizou-se software EVOC. Os resultados indicaram como 
elementos centrais dessa estrutura representacional os 
termos comprometimento, amor, dedicada, dinamismo, 
carinhosa, alegria e criatividade. Esses elementos constituem 
o núcleo estruturador dessa representação. Pode-se inferir 
que as professoras tem uma representação profissionalizada 
de si e procuram assumir a função com compromisso.
Palavras-chave: Professora; Educação Infantil; 
Representações Sociais.
1 Idélia Manassés de Barros Silva – Faculdade Guararapes (FG), Faculdade 
Metropolitana do Grande Recife (FMGR) e da Universidade Estadual do Vale 
do Acaraú (UVA).
 E-mail: idelia@uol.com.br
2 Laêda Bezerra Machado – Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).
 Email: laeda01@gmail.com
138
Idélia Manassés de Barros Silva 
Laêda Bezerra Machado
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.137-164 ,
nov. 2015/ fev. 2016
Abstract
This article identifies the structure of social representations 
that kindergarten teachers built the profession itself, 
emphasizing the strongest component of this structure: 
the central core. The framework guiding the research 
was the structural approach to social representations. 
Representations act as guides for action, constitute a system 
of pre-decoding of reality. The research took as the empirical 
field Jaboatão Guararapes. The study included 134 teachers 
from nurseries and pre-schools, in different stages of their 
careers, linked to public and private institutions. The 
collection procedure used was the free association of words. 
The results showed that the core elements that structure 
the terms representational commitment, love, dedicated, 
dynamic, caring, joy and creativity. These elements are 
the core structuring this representation. It can be inferred 
that the teachers have a representation professionalized 
themselves and seek to assume the function with 
commitment.
Keywords: Professor; Early ; Childhood Education; Social 
Representations.
139
Compromisso e amor 
como elementos centrais 
das representações 
do ser professora de 
educação infantil
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 137-164,
nov. 2015/ fev. 2016
COMPROMISSO E AMOR 
COMO ELEMENTOS CENTRAIS 
DAS REPRESENTAÇÕES 
DO SER PROFESSORA DE 
EDUCAÇÃO INFANTIL
INTRODUÇÃO
A expressão Educação Infantil no nosso país 
compreende o atendimento educacional às crianças de zero 
a cinco anos3, mas nem sempre foi assim. Como em muitos 
países subdesenvolvidos, o atendimento à infância no Brasil 
foi tardio, até bem pouco tempo não se garantia a educação 
de crianças pequenas. Como consequência, a preocupação 
com a formação de professores para a Educação Infantil é 
recente. A não exigência por qualificação e não garantia do 
direito das crianças pequenas à educação contribuíram para 
que a atividade em creches e pré-escolas fosse assumida como 
extensão do lar, voltada para a assistência.
Até os anos 1970 o atendimento a criança pequena no 
Brasil ocorreu de maneira tímida e precária. O crescimento 
do número de creches, no final desses anos, deveu-se em 
grande parte, aos movimentos reivindicatórios da sociedade 
civil, sobretudo, no contexto do movimento feminista. 
Esse atendimento vai assumir uma função assistencialista 
e, sobretudo, as creches se voltam para garantir cuidados 
referentes à alimentação, sono, saúde e higiene das crianças. 
A expansão vincula-se aos programas compensatórios que 
3 A Lei de Nº 11.274 de 20 de fevereiro de 2006 alterou a redação dos artigos 
29, 30, 32 e 87 da Lei Nº 9.394/96. Dispõe sobre a duração de 9 (nove anos) 
para o ensino fundamental reduzindo a Educação Infantil de 0 a 6 para de 0 a 
5 anos.
140
Idélia Manassés de Barros Silva 
Laêda Bezerra Machado
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.137-164 ,
nov. 2015/ fev. 2016
visavam o suprimento de déficits educacionais das crianças e 
garantir seu sucesso escolar futuro. (KRAMER, 1985).
Na década de oitenta, no contexto das lutas pela 
democratização do país, diferentes setores da sociedade, como 
organizações não governamentais, pesquisadores na área da 
infância e sociedade civil uniram forças para garantir o direito 
da criança a uma educação de qualidade desde o nascimento. 
A pressão desses movimentos fez com que a Constituição 
Federal de 1988 se constituísse como um marco decisivo na 
afirmação dos direitos da criança no Brasil. 
Nos últimos anos não se pode deixar de reconhecer 
certos avanços para com a Educação Infantil, além de passar a 
ser considerada a primeira etapa da Educação Básica, assume 
a função de favorecer seu desenvolvimento físico, motor, 
emocional, social, intelectual, e bem-estar infantil. A LDB (nº 
9394/96) e outras conquistas legais colocaram para o poder 
público e sociedade o desafio de garantir um atendimento 
voltado à educação e desenvolvimento das crianças pequenas, 
capaz de conciliar de modo indissociável as funções de educar 
e cuidar. (CERISARA, 2002; KRAMER, 2005).
Frente às mudanças legais, teóricas e práticas no campo 
da Educação Infantil e todas as injunções delas decorrentes, este 
artigo, resultado de uma pesquisa mais ampla desenvolvida no 
mestrado em educação, identifica a estrutura das representações 
sociais que as professoras de Educação Infantil construíram da 
própria profissão, enfatizando o componente mais forte dessa 
estrutura: seu núcleo central.
Para revisão da literatura sobre o tema ser professora da 
Educação Infantil, utilizamos as produções apresentadas no 
Grupo de Trabalho GT-07 - Educação da criança de 0-6 anos 
- da ANPED, no período de 1997-2007. Privilegiamos essa 
entidade científica pela relevância que ela assume no campo 
da produção científica em educação no país. A escolha dessa 
década deveu-se ao reconhecimento de que esse é o período 
de divulgação e consolidação da legislação que consagra o 
direito de crianças pequenas à educação. Além da produção 
141
Compromisso e amor 
como elementos centrais 
das representações 
do ser professora de 
educação infantil
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 137-164,
nov. 2015/ fev. 2016
da ANPED, lançamos mão de alguns periódicos, teses e 
dissertações do banco de dados do portal da Coordenação de 
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) que 
trataram sobre a docência na Educação Infantil. 
Os relatos de pesquisas apresentados nestes dois grandes 
espaços de divulgação do conhecimento indicaram que os 
estudos são de maneira geral pesquisas empíricas que ouviram 
professoras e auxiliares de Educação Infantil, estagiárias de 
creche, estudantes de pedagogia, famílias e funcionários de 
instituições que atendem crianças pequenas.
Nesses trabalhos, localizamos alguns estudos que 
utilizaram o aporte teórico das Representações Sociais, quais 
sejam: Portilho, Matos e Cruz (2011), Haddad e Cordeiro 
(2011), Lemos (2010), Haddad (2009), Campos (2008), Sales 
(2007) Monteiro (2007). As duas últimas, Haddad (2009) e 
Lemos (2010) utilizaram a abordagem estrutural proposta por 
Abric (1998). Os objetos de representação social estudados 
nesses trabalhos diziam respeito à representação que a professora 
tem de si; a representação que estudantes universitários têm da 
identidade docente; representações sobre a Educação Infantil, 
a infância, a criança, a docência e o papel do professor. O 
investimento feito em localizar e estudar a produção sobre a 
Educação Infantil nos fez reconhecer a relevância da pesquisa 
que realizamos, que pode vir a favorecer a ampliação do debate 
em torno das dimensões simbólicas que envolvem a docência 
na Educação Infantil. Assim, retomando o já colocado antes, 
partimos do pressuposto que as mudanças vivenciadas pela 
Educação Infantil podem ter afetado as representações sociais 
que as professoras construíram da própria profissão.A TEORIA DAS REPRESENTAÇÕES SOCIAIS
O referencial das representações sociais auxilia na 
compreensão do homem enquanto ser social, que vai se 
constituindo através de processos de interações sociais com 
outros sujeitos. Estudar representações sociais significa 
investigar como se formam e como funcionam os sistemas de 
142
Idélia Manassés de Barros Silva 
Laêda Bezerra Machado
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.137-164 ,
nov. 2015/ fev. 2016
referência dos quais lançamos mão para classificar pessoas e 
grupos, interpretar os acontecimentos da realidade cotidiana 
(ALVES-MAZZOTTI, 1994). As representações sociais são 
compartilhadas e produzidas nas interações dos sujeitos com 
os objetos e com outros sujeitos, constituem um conjunto 
organizado e estruturado de informações, crenças, opiniões e 
atitudes que orientam as práticas e condutas dos sujeitos. 
De acordo com Sá (1998) a Teoria das Representações 
Sociais vem se ampliando e desde a obra pioneira de Moscovici 
e na atualidade podemos nos reportar a, pelo menos, três de seus 
desdobramentos. O primeiro, mais próximo do pensamento 
original e que valoriza os métodos etnográficos, é liderado 
por Denise Jodelet. Willem Doise conduz, em Genebra, uma 
corrente que valoriza as condições de produção e circulação 
das representações sociais e por fim, em Aix-en-Provence, 
destacamos a abordagem estrutural, de Jean Claude Abric e 
seguidores, que dá ênfase a dimensão cognitivo-estrutural das 
representações sociais. Foi a abordagem estrutural ou Teoria 
do Núcleo Central que deu suporte pesquisa da qual resultou 
este artigo.
A Teoria do Núcleo Central, considerada uma das 
maiores contribuições para o refinamento conceitual e 
metodológico do estudo das representações sociais, foi 
proposta por Jean-Claude Abric, em 1976, através de sua 
tese de doutoramento. Constitui um corpo de proposições 
que oferece à teoria original um caráter mais heurístico para 
compreensão da prática social (LIMA, 2009).
A abordagem estrutural foi desenvolvida procurando 
compreender a relação existente entre as representações 
sociais e as práticas sociais dos indivíduos. A relação práticas 
e representações sociais é ao mesmo tempo sutil e complexa, 
transversaliza a teoria. Abric (1998) insiste que toda 
representação funciona como um sistema de interpretação da 
realidade que rege as relações dos indivíduos com o seu meio 
físico e social determinando, portanto, seus comportamentos 
e práticas. 
143
Compromisso e amor 
como elementos centrais 
das representações 
do ser professora de 
educação infantil
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 137-164,
nov. 2015/ fev. 2016
 Conforme o autor, a representação social se estrutura em 
torno de um núcleo central e um sistema periférico. O núcleo 
central está relacionado à memória coletiva e é determinado 
pelas condições históricas, sociológicas e ideológicas do 
grupo. Nele se situam os elementos mais permanentes da 
representação, sendo, portanto, estável e resistente a mudanças 
e relativamente independente do contexto social imediato. 
Esse núcleo desempenha três funções: uma função geradora – 
através da qual se cria ou se transforma uma representação; uma 
função organizadora - que determina a natureza das ligações 
entre os elementos constituintes de uma representação e uma 
função estabilizadora que assegura a permanência de seus 
elementos e protege o núcleo central fazendo com que ele se 
mantenha rígido, não se modifique facilmente. Os elementos 
estáveis ou mais permanentes de uma representação social são 
de natureza normativa e funcional. Os aspectos “normativos” 
estão relacionados ao sistema de valores e normas sociais do 
grupo de pertença do sujeito, enquanto que os “funcionais” 
estão associados à natureza descritiva, características do objeto 
representado (ABRIC, 2003). 
 Em torno do núcleo central encontra-se o sistema 
periférico da representação, que promove a interface entre a 
realidade concreta e o sistema central. Esse sistema diz respeito 
a parte operatória da representação e desempenha um papel 
essencial no funcionamento, dinâmica das representações. 
Conforme Abric (1998), ele é dotado de maior flexibilidade 
voltando-se as funções: a) de concretização, pois permite 
que a representação seja formulada em termos concretos e 
compreensíveis; b) regulação garante a adaptação às mudanças 
no contexto, integrando elementos novos ou modificando 
outros em função de situações concretas com as quais o 
grupo é confrontado; c) prescrição de comportamentos, pois 
possibilita o funcionamento instantâneo da representação 
como grade de leitura de uma dada situação, orientando as 
tomadas de posição; d) modulação personalizada preserva as 
representações individualizadas relacionadas às experiências 
144
Idélia Manassés de Barros Silva 
Laêda Bezerra Machado
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.137-164 ,
nov. 2015/ fev. 2016
individuais e por fim, função de proteção uma vez que absorve 
e reinterpreta as informações novas ou eventos suscetíveis que 
colocam os elementos centrais em questão. 
O sistema periférico relativiza a contradição entre, rigidez, 
estabilidade e consensualidade permitindo a flexibilidade, 
sensibilidade às transformações e as diferenciações individuais 
que caracterizam as representações sociais. As representações 
sociais funcionam com guias para a ação, elas orientam os 
comportamentos e relações sociais. Constituem um sistema 
de pré-decodificação da realidade porque determinam um 
conjunto de antecipações e expectativas dos sujeitos para com 
a realidade. Essas representações dão o sentido de pertença do 
indivíduo ao grupo. Elas definem as identidades e salvaguardam 
as especificidades dos sujeitos e grupos. (ABRIC,1998).
meTodoloGIa 
Para investigar as representações sociais do ser professora 
de Educação Infantil, fizemos a opção por usar uma abordagem 
de natureza qualitativa. A opção por esta abordagem deveu-
se ao seu caráter descritivo e possibilidade de reconhecer 
que as pessoas agem em função de suas crenças e valores que 
determinam comportamentos. 
A pesquisa que deu origem a este artigo foi desenvolvida 
junto a professoras que atuavam em instituições municipais 
e privadas de Educação Infantil do município do Jaboatão 
dos Guararapes-PE. A escolha deste campo empírico ateve-
se ao fato desse município ter integrado à Educação Infantil 
ao seu sistema de educação logo após a promulgação da LDB 
(em 1997) o que, pelo menos em termos formais, sugere uma 
compreensão do caráter educacional e não assistencial dessa 
educação. 
procedImeNTo de coleTa de dados
Como procedimentos de coleta de dados, utilizamos a 
técnica de associação livre de palavras. Conforme Oliveira et 
al (2005), a técnica de associação livre de palavras consiste em 
145
Compromisso e amor 
como elementos centrais 
das representações 
do ser professora de 
educação infantil
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 137-164,
nov. 2015/ fev. 2016
solicitar aos sujeitos que falem ou registrem em instrumento 
próprio, de modo livre e rápido, palavras ou expressões que 
lhes vêm imediatamente à lembrança a partir de um estímulo 
indutor. O estímulo pode ser uma palavra impressa, um 
objeto, figura etc. Trata-se de um tipo de investigação aberta 
que permite colocar em evidência os universos semânticos 
relacionados a um determinado conteúdo representacional. 
Para esta pesquisa utilizamos estímulo indutor: ser professora 
de Educação Infantil ... 
 Para realizar a associação livre de palavras utilizamos 
um protocolo que continha na primeira parte a própria tarefa 
de Associação e na segunda constavam questões de natureza 
sócio econômica e profissionais. As professoras foram 
orientadas da seguinte forma: a) escrever as cinco primeiras 
palavrasque lhe viessem à lembrança quando pensavam na 
expressão ser professora de Educação Infantil; b) hierarquizar ou 
ordenar as palavras de 1 a 5, da mais para a menos importante 
e c) justificar, por escrito, no protocolo, a razão da escolha da 
palavra colocada em primeiro lugar. Após responderem a 
associação livre, as participantes responderam às questões de 
natureza sócio econômica e profissionais do protocolo. 
 caracTerIzação do Grupo parTIcIpaNTe
Participaram da pesquisa 134 professoras de Educação 
Infantil, com diferentes tempos de atuação profissional que 
atuavam em creches e pré-escolas das redes pública e privada 
do município. Elas apresentaram diferentes níveis de formação 
acadêmica e estavam em diversas faixas de idade. 
Das 134 participantes, 106 eram professoras de 
instituições públicas (79%) e 28 professoras (21%) atuavam 
em instituições privadas. Do total de professoras participantes 
vinculadas à rede pública, 34 atuavam em creches (32%) e 
72 professoras (68%) atuavam em pré-escolas. A maioria 
das participantes da rede privada, em número de 16, atuava 
em pré-escola e uma minoria, 12 delas, atuava em creches, 
berçários e similares.
146
Idélia Manassés de Barros Silva 
Laêda Bezerra Machado
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.137-164 ,
nov. 2015/ fev. 2016
O conjunto geral das participantes concentrava-se na 
faixa de idade entre 20 a 40 anos. No que se refere à formação 
superior, 61% das professoras participantes eram graduadas 
em Pedagogia, 20% estavam cursando esta mesma graduação 
e 13% informaram ter feito outro curso de licenciatura. Um 
grupo de 6% cursou o normal médio. 
aNalIse dos dados
Para tratamento dos dados da Associação Livre de 
Palavras, utilizamos o software Ensemble de programmes 
permettant I’analyse des evocations (EVOC), versão 2003, criado 
por Pierre Vergés e seus colaboradores. O software EVOC é um 
recurso que auxilia na organização dos dados. É utilizado para 
análise de vocábulos, possibilitando a realização de cálculos 
estatísticos das médias simples e ponderadas culminando 
com a construção de um quadro de quatro casas. No referido 
quadro, as palavras evocadas são distribuídas e organizadas, 
permitindo captar a estrutura geral da representação, seu 
possível núcleo central e seu sistema periférico.
O EVOC, processado na plataforma Windows, é 
composto por dezesseis programas que executam diferentes 
funções, aos quais as palavras são submetidas e tratadas. Para 
processamento do material, utilizamos cinco dos programas 
que compõem o software, são eles: Lexique, Trievoc, Nettoie, 
Rangmont e Rangfraq. Após todo esse processamento do 
software, chegamos a um quadro de quatro casas, ou seja, de 
quatro quadrantes, conforme Vergés (2002).
De acordo com Oliveira et al. (2005) as palavras 
localizadas no quadrante superior esquerdo (primeiro 
quadrante) são, possivelmente os elementos do núcleo central 
das representações socias do objeto de investigação. Aquelas 
situadas no quadrante superior direito (segundo quadrante) 
são consideradas da primeira periferia, ou seja, os elementos 
que mais se aproximam do núcleo central. Trata-se de termos 
que durante a associação livre foram citados em últimas 
posições, mas obtiveram frequência alta. Os elementos desse 
147
Compromisso e amor 
como elementos centrais 
das representações 
do ser professora de 
educação infantil
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 137-164,
nov. 2015/ fev. 2016
quadrante indicam a possibilidade de já terem pertencido 
ou virem pertencer ao núcleo central das representações. No 
quadrante inferior esquerdo situam-se os elementos da zona 
de contraste, dizem respeito a termos pouco evocados (com 
baixa frequência), porém ordenados em primeiro lugar pelas 
professoras. No quadrante inferior direito (quarto quadrante) 
encontram-se os elementos da segunda periferia, ou periferia 
distante. São os elementos mais afastados do núcleo central. 
aNálIse e dIscussão dos resulTados: o Núcleo ceNTral das 
represeNTações socIaIs do ser proFessora de educação 
INFaNTIl
Com a associação livre de palavras chegamos a um total 
de seiscentos e setenta (670) palavras evocadas que, quando 
submetidas e processadas no EVOC, resultou em um conjunto 
de vinte e seis (26) palavras diagramadas em quatro regiões 
do Quadro 1. Estas palavras, conforme mecanismo utilizado 
pelo software, foram selecionadas com base nos critérios: 
número de evocações igual ou superior a cinco e ordem média 
de importância (OMI). As palavras do quadrante superior 
esquerdo, identificadas como provável núcleo central das 
representações do ser professora de Educação Infantil foram: 
alegria, amor, carinhosa, comprometimento, criatividade, 
dinamismo e dedicada. Reconhecemos a dinâmica da 
representação social (núcleo central e sistema periférico), mas 
nos limites deste artigo discutiremos os elementos referentes 
ao possível núcleo central dessas representações. 
148
Idélia Manassés de Barros Silva 
Laêda Bezerra Machado
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.137-164 ,
nov. 2015/ fev. 2016
QUADRO 1 - Quadro de quatro casas gerado pelo EVOC (Frequência Mínima: 5 
/ MF: 10 / OMI: (2,5)4
F >= 5 / OMI< 2,5 F >= 5 /OMI>= 2,5
f OMI f OMI
Alegria 17 2,471
Amor 18 1,667
1ª periferia2
Carinhosa 18 2,333
Comprometimento 14 1,643
Criatividade 33 2,485
Dedicada 39 2,282
Dinamismo 17 2,294
F < 5 /OMI< 2,5 F < 5 / OMI>= 2,5
Zona de contraste 2ª periferia
As palavras que integram o quadrante superior esquerdo 
do quadro 1, alegria, amor, carinhosa, comprometimento, 
criatividade, dinamismo e dedicada foram as mais 
frequentemente evocadas e hierarquizadas como as mais 
importantes pelas participantes da pesquisa. 
A palavra comprometimento, embora com a menor 
frequência de evocação do quadrante, foi a que obteve a menor 
OMI (1,643). Sabemos que quanto mais baixa for a OMI do 
quadrante mais importante a palavra foi considerada pelos que 
a evocaram. O lugar ocupado pelo termo comprometimento 
no quadrante superior esquerdo do quadro e as justificativas 
apresentadas pelas professoras, permitem inferir que o 
compromisso constitui para essas docentes o requisito 
principal para o ser professora de Educação Infantil. Convém 
lembrar que o comprometimento foi sempre associado de 
maneira articulada ao preparo e conhecimento do profissional 
para lidar com crianças. Justificaram as professoras: 
É necessário, por parte do educador, um 
preparo pessoal e um comprometimento 
4 Em função do recorte feito para este artigo omitimos as palavras contidas nos 
demais quadrantes do quadro de quatro casas.
149
Compromisso e amor 
como elementos centrais 
das representações 
do ser professora de 
educação infantil
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 137-164,
nov. 2015/ fev. 2016
com o papel desempenhado em sala de aula. 
(Profa.81 CR PUB)5
É preciso ter compromisso... respeitar nossos 
alunos desempenhando um trabalho de 
qualidade, mas principalmente com amor. 
(Profa.42 P-E PUB)
 O que pudemos constatar foi uma vinculação do 
ser professora de Educação Infantil ao comprometimento e 
preparação para trabalhar com as crianças. Das justificativas 
acima podemos depreender que há um indício de 
profissionalização na representação social do ser professora 
de Educação Infantil. As professoras articulam compromisso, 
amor e respeito como elementos que possibilitam qualidade da 
Educação Infantil. Podemos afirmar que, aspectos relacionados 
à formação e a profissionalização para o atendimento da 
primeira infância vem sendo defendidos no cenário educacional 
brasileiro. Pesquisas sobre a profissão docente, saberes docentes, 
histórias de professores tem se ampliado desde a década de 80, 
mas ainda são poucos os estudos voltados para a professora 
e trabalhodocente em creches e pré-escolas (Rocha, 1999; 
Cerisara, 2002). Nesse sentido, inferimos que as discussões 
mais recentes sobre a profissionalização, mesmo de maneira 
discreta, estão sendo incorporadas às representações sociais do 
ser professora. Isto é, as professoras reconhecem a importância 
do preparo para lidar com crianças pequenas. Apelam por 
formação profissional, o que nos leva a entender que aquela 
idéia quase cristalizada de que qualquer um pode ser professor 
de crianças pequenas não faz parte das representações sociais 
das participantes. Ilustramos com a justificativa abaixo:
5 As participantes da pesquisa foram codificadas da seguinte maneira: abreviatura 
da palavra professora (Profa.) seguida do número de ordem do protocolo 
que cada uma respondeu; letras CR ou P-E indicando, respectivamente, se 
atuavam em creche ou pré-escola seguida da abreviatura PUB ou PRIV que 
significavam, respectivamente o vínculo a instituição pública ou privada. 
Por exemplo, a codificação Profa.23 CR PUB. significa que se trata de uma 
professora de creche pública que respondeu ao protocolo de nº 23. 
150
Idélia Manassés de Barros Silva 
Laêda Bezerra Machado
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.137-164 ,
nov. 2015/ fev. 2016
Acredito que a professora de educação 
infantil deve ser profissional em primeiro 
lugar pois, ela está formando crianças... 
(Profa. 69 P-E PUB)
Constatamos que as professoras, com justificativas mais 
próximas de uma dimensão profissionalizada da Educação 
Infantil são aquelas profissionais que mais recentemente 
concluíram ou estão em processo de formação no curso de 
Pedagogia e aquelas com menos de dez anos de atuação na 
docência.
A palavra amor foi a palavra com a segunda menor OMI 
do quadrante referente ao núcleo central, isto significa que, 
depois de comprometimento, foi a palavra mais indicada em 
primeiro lugar quando as professoras fizeram a hierarquização 
de suas evocações. Ao evocarem o amor as docentes 
destacaram o amor à criança e à profissão, como requisitos 
para o ser professora de Educação Infantil. Ficou evidente 
nas justificativas que o amor é assumido pelas docentes como 
condição para o exercício da função. Ao justificarem o amor 
como palavra mais importante, as professoras afirmaram: 
Se você não tiver amor por criança mude de 
profissão. (Prof.47 P-E PUB)6
 Para ser professor de Educação Infantil 
temos que ter muito AMOR pela profissão, 
em trabalhar com crianças. (Profa.15 CR 
PRIV)
Ser professora de educação infantil não é para 
qualquer um. Temos que ter amor pela nossa 
profissão, nossa sala de aula e principalmente 
nossos alunos. (Profa.30 CR PRIV) 
Ensinar requer ter amor por sua profissão, 
pois é uma vocação e só desperta a paixão 
de ensinar (aprender) quem tem paixão 
de ensinar. Segundo Paulo Freire não se 
6 Transcrevemos para este artigo as justificativas das professoras do modo como 
elas escreveram no protocolo. 
151
Compromisso e amor 
como elementos centrais 
das representações 
do ser professora de 
educação infantil
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 137-164,
nov. 2015/ fev. 2016
pode falar de educação sem falar de amor. 
(Profa.13 P-E PRIV)
Trabalhar com a Educação Infantil requer 
amor pelas crianças... (Prof.55 P-E PUB)
As docentes destacaram em suas justificativas para a 
escolha da palavra amor, que assumir a função de professora 
de Educação Infantil não é tarefa para qualquer pessoa. Mas, 
para aqueles que amam a profissão, os alunos e a sala de aula. 
Como ilustramos acima, uma das participantes recorreu 
a Paulo Freire para reforçar a importância do amor no 
exercício docente. Conforme o autor, o ato de ensinar exige 
do profissional “amorosidade, criatividade e competência 
científica. É impossível ensinar sem a capacidade forjada, 
inventada e bem cuidada de amar”. (FREIRE, 2002, p.10) 
Convém lembrar que ao tratar da amorosidade como um dos 
saberes necessários à docência, Freire (2002) não perde de 
vista as dimensões afetiva, epistemológica e política do fazer 
pedagógico. Não se trata de um amor romântico, permissivo, 
mas um amor engajado que corrige e ajuda o outro a crescer 
como gente, como sujeito. 
Embora identifiquemos na literatura e história da 
Educação Infantil vinculação ao feminino, essa associação 
direta ao amor, ao materno na Educação Infantil não foi 
evidenciada diretamente nas justificativas das professoras. 
Elas deram mais ênfase ao amor à criança e à profissão, 
como requisitos para o desenvolvimento do trabalho. Nas 
associações e justificativas das professoras para o termo amor, 
as referências à profissão e às crianças aparecem como razões 
principais para se tornarem e permanecerem professoras. É o 
que podemos perceber nas suas justificativas para escolha desta 
palavra como mais importante:
Eu há 25 anos atrás escolhi ser professora por 
amor, nunca pensei em outra profissão. Sou 
apaixonada pela Educação Infantil. Mas tem 
que saber sobre elas.. se preparar, não é pra 
qualquer um... (Profa.53 P-E PUB)
152
Idélia Manassés de Barros Silva 
Laêda Bezerra Machado
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.137-164 ,
nov. 2015/ fev. 2016
Para trabalhar com os pequenos, nós 
professoras temos que ter muito amor pelo 
que fazemos, pois não é fácil, tem que ter 
preparo, mas tudo que você faz com amor, 
você faz bem feito. (Profa.40 P-E PUB) 
O amor é a base de tudo e motiva a realização 
de um bom trabalho. Mas, tem que ser 
profissional para trabalhar com elas. (Prof.28 
P-E PUB)
Ao triangularmos as justificativas dadas para a palavra 
amor pelas participantes, tomando por base às variáveis 
faixa etária e tempo na profissão, constatamos que são as 
professoras de mais idade (acima de 50 anos) e com mais 
tempo de profissão àquelas que mais associam o ser professora 
de Educação Infantil ao amor. 
 Na literatura, vários estudos que abordam a docência 
na Educação Infantil dão destaque ao amor como elemento 
comum quando ouvem professoras a respeito da profissão. 
Estudo desenvolvido por Alves (2006) junto a professoras de 
Educação Infantil indicou o amor à profissão como um dos 
significados do ser professora de crianças pequenas. 
No caso desta pesquisa, embora as justificativas para 
a associação livre destaquem um amor das professoras ao 
que faziam e às crianças com as quais trabalhavam, o amor à 
profissão assumiu um enfoque diferente do estudo anterior. 
Os elementos indicaram um sentido de amor à profissão 
aliado a importância e necessidade de preparo profissional. 
Evidenciaram a formação e qualificação específica com 
requisitos para atuar na Educação Infantil. 
Ainda em relação ao termo amor, percebemos 
que, algumas poucas vezes, nas justificativas o termo foi 
articulado à vocação. Isto ocorreu quando as professoras se 
referiram ao amor à profissão. Para elas só amor é capaz de 
superar as adversidades da docência principalmente a falta de 
reconhecimento e os baixos salários: 
153
Compromisso e amor 
como elementos centrais 
das representações 
do ser professora de 
educação infantil
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 137-164,
nov. 2015/ fev. 2016
Conseguir lecionar é uma tarefa difícil diante 
das questões: financeira e reconhecimento. 
Só com amor e vocação para superar essas 
questões e fazer um bom trabalho. (Profa.03 
P-E PRIV)
Ensinar requer ter amor por sua profissão, 
pois é uma vocação e só desperta a paixão 
de ensinar (aprender) quem tem paixão de 
ensinar (Profa.13 P-E PRIV)
Vocação no contexto das justificativas apresentadas pelas 
professoras acima aparece como algo construído socialmente 
diferente de dom ou predisposição natural para o desempenho 
de determinada ocupação. 
Alves (2006) a estudar a profissão docente, a vocação 
foi relacionada a uma carreira adequada para mulher,sua 
docilidade e bondade naturais. Em pesquisa sobre os 
significados da docência em Educação Infantil, Alves (2006) 
revelou que, para as professoras a vocação é sinalizada como 
uma predisposição para servir e ajudar o outro, a profissão 
foi associada ao sacerdócio. De modo parecido, Arce (2001), 
em pesquisa junto a alunos de pedagogia sobre as habilidades 
necessárias ao trabalho na Educação Infantil, constatou forte 
referência a imagem da profissional de Educação Infantil 
associada a mulher sem formação ou qualificação para o 
exercício de seu trabalho. No estudo do qual resultou este 
artigo não localizamos essa associação do ser professora de 
Educação Infantil ao ser mulher, sem qualificação ou formação. 
De maneira geral todas as participantes de nosso estudo, 
principalmente em outra fase da pesquisa quando tiveram 
oportunidade de falar mais sobre a profissão, reconheceram o 
valor e necessidade do preparo profissional para lidar com as 
crianças de zero a cinco anos. 
Ressaltamos que é frequente aparecer nos trabalhos que 
abordam o magistério ou a docência em diferentes níveis a 
referência ao amor. Santos (2010), por exemplo, investigando 
as representações sociais do ser professor, construídas por 
professoras dos anos iniciais do Ensino Fundamental, 
154
Idélia Manassés de Barros Silva 
Laêda Bezerra Machado
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.137-164 ,
nov. 2015/ fev. 2016
constatou que essas professoras associam o ser professor 
à vocação, gostar de criança, amor e maternagem. Sales 
(2012), ao estudar as representações sociais de docência no 
ensino superior, identificou o amor como elemento dessas 
representações. No seu estudo o amor, ao qual se referiram 
os estudantes, relacionou-se ao gosto pela docência. Também, 
Monteiro (2007), ao investigar como professores de Educação 
Infantil representam seu próprio trabalho, identificou o amor 
como parte dessa representação. Em seus achados percebeu 
o esforço dos professores de pré-escola para se diferenciarem 
dos professores da creche. Constatou entre os professores da 
pré-escola um possível núcleo central das representações de 
docência focado nos termos amor e paciência, enquanto que 
os professores de creche representaram sua própria atividade 
centrada no cuidar de criança. No que se refere ao núcleo 
central, não localizamos nesta investigação diferenças entre 
professoras de creche e pré-escola. Em ambos os grupos o amor 
à criança e ao trabalho que desenvolvem ganhou destaque nas 
representações do ser professora para o grupo.
Para Abric (1998) a representação é um sistema de pré-
codificação da realidade porque ela determina um conjunto 
de antecipações e expectativas, desta forma, representar é 
significar, dar sentido as condutas de um grupo e compreender 
a realidade em que estão inseridos. Assim, inferimos que as 
representações do ser professora e Educação Infantil centradas 
no amor à profissão determinam o modo de interação e relação 
das professoras com as crianças pequenas. O que conseguimos 
depreender das evocações a justificativas ao termo amor nesta 
pesquisa, embora colocado como atributo para docência na 
Educação Infantil e articulado à vocação e ao gostar de criança, 
não ganhou conotação romântica, dócil e peculiaridade do 
feminino. As professoras deram maior destaque ao amor 
como elemento de superação das adversidades financeiras, 
desvalorização, baixos salários. Para elas com amor é possível, 
ir adiante realizando um bom trabalho.
155
Compromisso e amor 
como elementos centrais 
das representações 
do ser professora de 
educação infantil
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 137-164,
nov. 2015/ fev. 2016
Dedicação foi a terceira palavra mais forte do núcleo 
central. Foi o termo mais evocado pelas professoras quando 
pensaram no ser professora de Educação Infantil. As docentes 
relacionaram dedicação ao compromisso, estudo, empenho, 
zelo com a construção do conhecimento das crianças e busca 
de formação para atuar na docência. 
A dedicação nos leva a estar estudando sempre, 
conhecendo nossos alunos, trabalhando com 
amor e acima de tudo nos conscientizando 
a cada dia da responsabilidade que temos 
quanto a construção do conhecimento dos 
nossos aluno. (Profa. 87 P-E PRIV)
Temos que nos dedicar o bastante para 
transmitir bons conhecimentos aos alunos. 
(Profa. 112 CR PUB) 
Diferentemente do que constatamos, Alves-Mazzotti 
(2007) identificou a dedicação, como elemento central da 
representação social do ser professores dos anos iniciais do 
ensino fundamental associada à vocação, missão, dom como 
algo intrínseco à docência. Em estudo posterior enfatizando os 
processos de objetivação e ancoragem da representação do ser 
professor, com o mesmo grupo de professores, Alves-Mazzotti 
(2008) localiza a dedicação como o principal atributo da 
docência. Segundo ela, devido às dificuldades enfrentadas 
no cotidiano escolar, desqualificação da profissão, carência 
dos alunos, a dedicação é naturalizada, objetivada por esses 
profissionais. 
O que pudemos depreender do que foi justificado 
pelas professoras que participaram desta pesquisa é que com 
dedicação é possível superar os obstáculos enfrentados no dia 
a dia da docência desenvolvendo um bom trabalho nas creches 
e pré-escolas. 
Dinamismo foi outro termo que ganhou destaque nas 
representações sociais do ser professora de Educação Infantil. 
A palavra dinamismo foi associado à iniciativa, empenho, 
envolvimento com o fazer pedagógico de modo a atender aos 
156
Idélia Manassés de Barros Silva 
Laêda Bezerra Machado
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.137-164 ,
nov. 2015/ fev. 2016
interesses e necessidades dos grupos de crianças matriculados 
em creches e pré-escolas. Justificaram as professoras: 
A professora de educação infantil tem que 
ser dinâmica. Com dedicação e dinamismo 
irá desenvolver um bom trabalho com os 
pequenos. (Profa.131 CR PUB)
Todo professor que trabalha com a educação 
infantil deve ser dinâmico para que possa 
desempenhar bem o seu trabalho com seus 
alunos. (Profa.50 P-E PUB)
[...] .a educação infantil exige uma dinâmica 
mais envolvente que atrai as crianças... 
(Profa.81 CR PUB) 
Sobre o termo criatividade, quarto termo mais 
justificado como importante e o segundo mais evocado pelas 
professoras, foi uma palavra relacionada ao prazer, ao novo, ao 
interessante na prática com crianças pequenas. As participantes 
se referiram a capacidade desse profissional para inovar e 
estimular as aprendizagens e desenvolvimento infantis. Sobre 
a criatividade as professoras justificaram: 
Criatividade - quando a professora é criativa 
suas aulas se tornam mais prazerosas. 
(Profa.19 P-E PUB) 
Criatividade - pois temos que buscar a cada 
dia algo novo, interessante que chama a 
atenção. (Profa.21 P-E PUB). 
Ter criatividade, conforme justificaram nos trechos 
abaixo, consiste em estimular a criação e a curiosidade 
das crianças. Ser criativa é considerado um indicativo de 
qualidade do trabalho da professora de Educação Infantil. Elas 
justificaram:
A criatividade é uma qualidade inerente a 
professora de educação infantil, pois ao tratar 
com essa faixa etária é necessário a busca por 
aprimoramento para estimular a curiosidade 
157
Compromisso e amor 
como elementos centrais 
das representações 
do ser professora de 
educação infantil
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 137-164,
nov. 2015/ fev. 2016
da criança de modo que venha a desenvolver 
suas habilidades. (Profa.34 P-E PUB)
O trabalho na educação infantil exige 
da professora o exercício da criatividade 
para elaborar atividades que atendam da 
melhor forma a criança na construção do 
conhecimento. (Profa.62 P-E PUB)
Pelas justificativas apresentadas podemos admitir 
que a criatividade foi consideradapelas professoras como a 
capacidade de estimular de diferentes formas o desenvolvimento 
e aprendizagem na Educação Infantil favorecendo a construção 
do conhecimento. Esse termo associou-se a outras palavras 
presentes no quadrante do núcleo central como alegria e 
dinamismo. 
A palavra carinhosa também integra o núcleo central. 
Ao evocarem e justificarem a palavra carinhosa como requisito 
para ser professora de Educação Infantil, as professoras 
deixaram entrever que assumem esse comportamento, porque 
as crianças, ao deixarem ao lar, precisam desse aconchego na 
instituição, ou devido as carências de afeto vivenciadas na 
própria família. Assim elas afirmaram oferecer esse suporte às 
crianças. Justificaram: 
Temos um papel muito importante na vida 
de nossas crianças em sala de aula e fora 
dela também, pois nossas crianças estão 
precisando de muito carinho e compreensão 
porque a realidade familiar às vezes deixa a 
desejar. (Profa. 82 CR PUB) 
[... ] a criança ao chegar ao sair do seio 
familiar, busca na escola... aconchego, cabe 
ao profissional dar ao aluno este apoio... 
(Profa. 07 P-E PRIV)
O termo carinhosa e as justificativas que lhe foram 
conferidas revelaram uma certa preocupação das professoras em 
substituírem famílias ausentes. Em relação ao que justificaram 
sobre este termo, embora possamos inferir uma vinculação 
158
Idélia Manassés de Barros Silva 
Laêda Bezerra Machado
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.137-164 ,
nov. 2015/ fev. 2016
à Educação Infantil compensatória de carências afetivas, 
necessitaríamos de maiores investigações para confirmá-la. 
Contudo, não podemos deixar de admitir que vários estudos, 
no âmbito do ensino fundamental, reclamam a ausência 
da família ou desestruturação familiar como obstáculo ao 
desenvolvimento e aprendizagem. Falsarella (2008, p.36) 
destaca a necessidade de uma redefinição do conceito de 
família como algo mais abrangente. Segundo a autora:
[...] o lar ainda oferece abrigo proteção 
e calor humano em um mundo de dura 
sobrevivência econômica e emocional, mas 
novos modelos de família são possíveis. [...] 
o que define a nova família são as funções 
desempenhadas por seus membros em suas 
interrelações com características de lealdade, 
afeição e pertinência sendo que nenhuma 
configuração familiar pode ser considerada 
melhor ou pior do que outra.
Entendemos que, embora a família assuma diferentes 
modelos de organização, ela ainda é a fonte de proteção social 
de seus membros, espaço de relações do diálogo, amor, carinho, 
respeito, disciplina e limites. Desse modo, as professoras 
às vezes por perceberem as crianças pequenas chegam ao 
ambiente escolar sem os devidos cuidados ou orientações que 
competem à família, demonstram sensibilidade e acabam 
por assumir responsabilidades que não lhes são próprias. Foi 
nesse contexto em que, sobretudo as professoras vinculadas a 
instituições públicas que atendem crianças de zero a três anos, 
destacaram “o ser carinhosa com as crianças”, como requisito 
da professora de Educação Infantil.
Também presente no quadrante referente ao núcleo 
central situa-se a palavra alegria que apresentou frequência e 
OMI relevantes. Para as participantes da pesquisa, a alegria foi 
também considerada um atributo para a docência na Educação 
Infantil. Como é possível depreender das justificativas, dadas 
para a escolha dessa palavra, ela foi relacionada ao bom 
159
Compromisso e amor 
como elementos centrais 
das representações 
do ser professora de 
educação infantil
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 137-164,
nov. 2015/ fev. 2016
humor e descontração no exercício das práticas docentes. As 
professoras justificaram: 
Alegria porque o bom humor deve prevalecer 
com as nossas crianças. (Profa.74 P-E PUB)
Porque é com alegria (bom humor) que faço 
meu trabalho. Mostrar alegria no que faz 
para os alunos é uma forma de incentivá-los. 
(Profa.94 P-E PUB)
Depreendemos que a alegria a que as professoras se 
referem diz respeito ao bom humor, descontração, animação 
para estimular o desenvolvimento e aprendizagem infantis. 
Elas parecem resistir a um modelo de professor sisudo, mal 
humorado, que certamente não estaria disposto a interagir com 
as crianças facilitando seu desenvolvimento e aprendizagem. 
As justificativas, também, não nos autorizam afirmar que as 
professoras que ouvimos nesta pesquisa estejam defendendo 
que a alegria deve fazer parte da natureza da docente.
 O núcleo central, de acordo com Abric (1998), é 
determinado pela natureza do objeto representado, relações 
estabelecidas o sistema de valores e normas sociais do grupo. 
Conforme aqui exposto, o núcleo central estruturador 
das representações sociais do ser professora de Educação 
Infantil é marcado por elementos de ordem subjetiva (como 
o amor, alegria e carinho) e de natureza objetiva como 
(comprometimento, dedicada, dinamismo e criatividade). 
Um misto desses elementos. Apesar dessa mescla de elementos 
de ordem subjetiva e objetiva o ser professora de Educação 
Infantil não foi vinculado à guarda ou proteção e assistência às 
crianças nas instituições. Mesmo o termo amor, na maioria 
das justificativas foi relacionado à dedicação, apego ao trabalho, 
considerado como desvalorizado. O amor foi justificado como 
um sentimento que mobiliza e impulsiona o desenvolvimento 
do trabalho e superação das dificuldades impostas à profissão.
A presença de termos de ordem mais objetiva no 
quadrante superior esquerdo do quadro nos leva a inferir 
160
Idélia Manassés de Barros Silva 
Laêda Bezerra Machado
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.137-164 ,
nov. 2015/ fev. 2016
que o proclamado pela LDB nº 9394/96, para a Educação 
Infantil, sobretudo, as exigências para com a formação dos 
profissionais, pode depois de mais de uma década, estar tendo 
ressonância, afetando as representações sociais das docentes 
dessa etapa da educação básica.
Identificamos, portanto, um núcleo central das 
representações sociais do ser professora de Educação Infantil 
que incorpora elementos normativos, originados do sistema de 
valores, ligados a história e a ideologia do grupo e elementos 
considerados funcionais, relacionados às novas condutas frente 
ao objeto representado, de ordem profissional vinculados à 
defesa da cidadania da criança e necessidade de formação do 
professor. 
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Em suma podemos afirmar que caminhamos na direção 
de um núcleo central das representações do ser professora 
de Educação Infantil vinculado a profissionalização. As 
professoras, mesmo quando destacaram o amor o termo não foi 
evocado na perspectiva romântica, da abnegação da vocação, 
ou sacerdócio. Foram muito pontuais as justificativas nesse 
sentido. Isto quer dizer que algo normativo muito presente 
e arraigado em relação docência na Educação Infantil parece 
estar dando lugar ao que vem despontando ou se modificando 
no contexto das práticas, ou seja, da formação a que tem acesso 
e os ditames da política educacional.
O termo dedicação, por exemplo, aludiu muito mais 
ao compromisso ou comprometimento, termo mais escolhido 
pelas professoras como o mais importante no conjunto geral 
de todas as evocações. A dedicação e o compromisso ganharam 
contornos semelhantes como elementos funcionais do núcleo 
central de busca pela formação e profissionalização. 
As evocações das professoras explicitaram a dinâmica 
e o movimento da representação, ou seja, evidenciaram 
que elas estão no cotidiano tendo acesso a informações, 
161
Compromisso e amor 
como elementos centrais 
das representações 
do ser professora de 
educação infantil
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 137-164,
nov. 2015/ fev. 2016
comunicações diversas e não são passivas. Mas, ao contrário, 
como apropriadamente pontua Moscovici(1978) são “sábias 
amadoras” reagem ativamente ao que está sendo posto e 
exigido em relação ao segmento em que atuam. Respondem 
ao novo, às políticas, a formação, as próprias práticas que 
desenvolvem, o trabalho com os pares, literatura a que tem 
acesso, entre outros. 
REFERÊNCIAS
ABRIC, Jean-Claude. A abordagem estrutural das 
representações sociais. In: MOREIRA, Antonia Silva 
Paredes; OLIVEIRA, Denize Cristina de (Orgs.). Estudos 
interdisciplinares de Representação Social. Goiânia: AB, p. 
27-38, 1998.
_________. Abordagem estrutural das representações 
sociais: desenvolvimentos recentes. In: CAMPOS, P. H. F; 
LOUREIRO, M. C. da S. (Orgs). Representações sociais e 
práticas educativas. Goiânia Ed. UCG, p. 37-57, 2003.
ALVES-MAZZOTI, Alda Judith. Representações 
sociais: aspectos teóricos e aplicações à educação. Em aberto, 
Brasília MEC-INEP, ano 1, n0 61, p.60-77, jan/mar. 1994.
____________.Repensando algumas questões sobre o 
trabalho infanto-juvenil. Revista Brasileira de Educação. N0 
19 Rio de Janeiro Abril 2002.
____________. Representações da identidade docente: 
uma contribuição para a formulação de políticas. Ensaio: 
aval. pol. públ. Educ., Rio de Janeiro, v. 15, n. 57, p. 579-
594, out./dez. 2007
ALVES, Nancy Nonato de Lima. “Amor à profissão, 
dedicação e o resto se aprende” - significados da docência 
em Educação Infantil na ambigüidade entre a vocação e a 
profissionalização. In: REUNIÃO ANUAL DA ANPED, 
29, 2006, Caxambu – MG, Anais eletrônicos... Caxambu – 
MG: ANPED, 2006. Disponível em http://www.anped.org.
br acessado em 07 de outubro de 2011.
162
Idélia Manassés de Barros Silva 
Laêda Bezerra Machado
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.137-164 ,
nov. 2015/ fev. 2016
ARCE, Alessandra. Compre o kit neoliberal para 
a educação infantil e ganhe dez passos para se tornar em 
professor reflexivo. Educação & Sociedade, Campinas, v.22, 
n.74 p. 251-283, abr. 2001.
CAMPOS, Jamerson Ramos. “Era um sonho desde 
criança”: a representação social da docência para os professores 
do Município de Queimadas – PB. 2008. 174f. Dissertação 
(Mestrado em Educação) – Universidade Federal do Rio 
Grande do Norte, Natal, 2008.
CERISARA, Ana Beatriz. Professoras de educação 
infantil: entre o feminino e o profissional. São Paulo: Cortez, 
2002. 
FALSSARELLA, Ana Maria. E a família, como vai? 
Rev. Presença Pedagógica. vol.14 n.84, nov/dez 2008.
FREIRE, Paulo. Professora, sim; tia, não: cartas a 
quem ousa ensinar. São Paulo: Olho D’água, 2002.
HADDAD, Lenira. Professor de educação infantil? 
Em busca do núcleo central da representação social a partir 
da análise das evocações livres. Nuances: estudos sobre 
educação. Presidente Prudente, SP, ano XV, vol. 16, n.17, 
p.85-104, jan/dez. 2009.
HADDAD, Lenira; CORDEIRO, Maria Helena. 
Representações sociais de ingressantes de pedagogia sobre 
creche e pré-escola: um estudo em quatro estados brasileiros. 
Revista Diálogo Educacional. Curitiba, vol.11, n. 32, p. 15-
35, jan/abr. 2011.
KRAMER, S. O papel social da pré-escola. Cad. 
Pesquisa. São Paulo. (58): 77-81. 1985.
KRAMER, Sônia. Histórias de formação: as entrevistas, 
seu contexto e procedimentos. In: KRAMER, S (Org.). 
Profissionais de educação infantil: gestão e formação. São 
Paulo: Ática, 2005. 
LEMOS, Maria Elizabeth Siqueira. Representações 
Sociais de Educadores de Creche a respeito do cuidado e em 
163
Compromisso e amor 
como elementos centrais 
das representações 
do ser professora de 
educação infantil
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 137-164,
nov. 2015/ fev. 2016
saúde de crianças com até cinco anos. Tese (Doutorado em 
ciências da Saúde) Universidade Federal de Minas Gerais, 2010. 
LIMA, Andreza Maria de. O “bom aluno” nas 
representações sociais de professoras da rede municipal 
de ensino do Recife. Dissertação. (Mestrado em Educação). 
Centro de Educação. Universidade Federal de Pernambuco. 
Recife, 382p., 2009.
MONTEIRO, Ana Paula dos Santos. Representações 
Sociais do professor de educação infantil sobre o seu 
próprio trabalho. Dissertação (Mestrado em Educação e 
Cultura Contemporânea) – Universidade Estácio de Sá, Rio 
de Janeiro, 2007.
MOSCOVICI, Serge. A Representação Social da 
Psicanálise. Rio de Janeiro, Zahar, 291p., 1978.
_______________Representações Sociais: 
investigações em psicologia social. Trad. Pedrinho A. 
Guareschi. 7ª Ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2004.
OLIVEIRA, Denize Cristina de; MARQUES, Sérgio 
Correia; GOMES, Antônio Marcos T.; TEIXEIRA, Maria 
C. T. V. Analise das evocações livres: uma técnica de análise 
estrutural das representações sociais. In: Perspectivas 
teórico-metodológicas em representações sociais. João 
Pessoa. UFPB/ Editora Universitária, 2005.
P0RTILHO, Evelise; MATTOS, Hilda; CRUZ, 
Julina. O desafio de pesquisar a educação infantil: limites 
e possibilidades. Revista Diálogo Educacional. Curitiba, 
vol. 11, n.32 jan/abr 2011
ROCHA, Eloísa A. Candal. A pesquisa em educação 
infantil no Brasil: trajetória recente e perspectivas de 
consolidação de uma pedagogia da educação infantil. 
Florianópolis, UFSC, Centro de Educação, Núcleo de 
Publicações.1999.
SÁ, Celso Pereira de. Núcleo Central das 
Representações Sociais. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002.
164
Idélia Manassés de Barros Silva 
Laêda Bezerra Machado
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.137-164 ,
nov. 2015/ fev. 2016
__________. A construção do objeto de pesquisa em 
representações sociais. Rio de Janeiro. Ed. UERJ, 1998.
SALES, Mônica Patrícia da Silva. Docência no 
ensino superior nas representações sociais de estudantes. 
Dissertação. (Mestrado em Educação). Centro de Educação. 
UFPE, Recife, 2012.
SANTOS, Patrícia Irene dos. Profissão docente: 
um estudo das representações sociais do ser professor. 
Dissertação (Mestrado em Educação). Centro de Educação. 
UFPE,Recife, 2010.
VERGÈS, Pierre. Conjunto de programas que 
permitem a análise de evocações. EVOC, Manual, versão 5 
de abril 2002. Aix en Prov ence: [S. n.}, 22p., 2002. 
Data de recebimento: fevereiro de 2014
Data de aceite: março de 2015
165
A criação do grupo 
escolar silveira brum 
e seus primeiros anos 
de funcionamento: 
relações entre a república 
e as festas escolares 
(1912-1930).
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 165-186,
nov. 2015/ fev. 2016
A CRIAÇÃO DO GRUPO 
ESCOLAR SILVEIRA BRUM E 
SEUS PRIMEIROS ANOS DE 
FUNCIONAMENTO: RELAÇÕES 
ENTRE A REPÚBLICA E AS FESTAS 
ESCOLARES (1912-1930).
Denilson Santos de Azevedo1
Talitha Estevam Moreira Cabral2 
Resumo
Este artigo versa sobre aspectos referentes ao processo de 
criação e os primeiros anos de funcionamento do primeiro 
Grupo Escolar público fundado no município de Muriaé 
(Minas Gerais), denominado Grupo Escolar Silveira 
Brum (GESB). A investigação aqui problematizada, 
especificamente, aborda questões relativas à criação e 
consolidação do educandário, dando ênfase aos assuntos 
referentes às festividades escolares ocorridas no 
estabelecimento de ensino suprarreferenciado. O recorte 
temporal se justifica em virtude da data de fundação 
dessa instituição (1912) e o fim da Primeira República 
no Brasil (1930). Para a consecução do trabalho foram 
consultados documentos como relatórios do Grupo, ofícios 
e correspondências enviados à Secretaria do Interior, atas 
de eventos e outras fontes oriundas de visitas ao Arquivo 
Público Mineiro (APM), com sede em Belo Horizonte/
MG, e ao acervo existente na atual Escola Estadual Doutor 
Silveira Brum, em Muriaé/MG. Esta análise permitiu 
identificar que as comemorações no Grupo atendiam aos 
interesses dos republicanos, que pretendiam se instituir no 
1 Denilson Santos de Azevedo – Universidade Federal de Viçosa (UFV).
 E-mail: dazevedo@ufv.br
2 Talitha Estevam Moreira Cabral – Universidade Federal deViçosa (UFV).
 E-mail: talitha.cabral@ufv.br
166
Denilson S. de Azevedo
Talitha Estevam M. Cabral 
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.165-186 ,
nov. 2015/ fev. 2016
poder e difundir os ideais de civismo e amor à pátria no 
Brasil, no início do século XX.
Palavras-chave: História da educação; Grupos escolares; 
Festas escolares
Abstract
This paper discusses aspects related to the process of creation 
and the first years of operation of the first Public School 
Group founded in the city of Muriaé (Minas Gerais), 
called Grupo Escolar Silveira· Brum (GESB). Research 
problematized here specifically addresses issues related to 
the creation and consolidation of the breed, with emphasis 
on issues related to school festivities took place at the school 
cited. The time frame is justified because the date of the 
founding of this institution (1912) and the end of the First 
Republic in Brazil (1930). To the achievement of labor were 
consulted documents as Group reports, offices and letters 
sent to the Secretary of the Interior, minutes of meetings 
and other sources by visits to the Arquivo Público Mineiro 
(APM), based in Belo Horizonte/MG, and the existing 
acquis in current Escola Estadual Doutor Silveira Brum in 
Muriaé/MG. This analysis revealed that the celebrations in 
Group met the interests of Republicans, who wanted to be 
instituted in power and spread the ideals of good citizenship 
and love of country in Brazil, in the early twentieth century.
Keywords: History of education; School groups; School 
parties.
167
A criação do grupo 
escolar silveira brum 
e seus primeiros anos 
de funcionamento: 
relações entre a república 
e as festas escolares 
(1912-1930).
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 165-186,
nov. 2015/ fev. 2016
A CRIAÇÃO DO GRUPO 
ESCOLAR SILVEIRA BRUM E 
SEUS PRIMEIROS ANOS DE 
FUNCIONAMENTO: RELAÇÕES 
ENTRE A REPÚBLICA E AS FESTAS 
ESCOLARES (1912-1930).
O presente artigo apresenta alguns resultados da 
investigação sobre o processo de criação e os primeiros anos 
de funcionamento do primeiro grupo escolar público fundado 
no município de Muriaé (Minas Gerais), o Grupo Escolar 
Silveira Brum (GESB), criado em 1912. Com o intuito de 
analisar a cultura escolar produzida neste estabelecimento de 
ensino até a década de 1930, foram consultados documentos e 
outras fontes que tratam da trajetória do referido educandário, 
enfatizando a questão das festas escolares, que supostamente 
representavam, naquele momento, uma tentativa de 
valorização dos preceitos republicanos. 
A análise feita nesse trabalho permitiu identificar 
características da organização e do funcionamento da escola, 
bem como da cultura escolar instituída nos primeiros anos 
de sua criação e as práticas pedagógicas ali incorporadas e 
difundidas, especialmente por meio das festividades que 
ocorriam no ambiente escolar.
A CRIAÇÃO E CONSOLIDAÇÃO DOS GRUPOS ESCOLARES 
NO BRASIL E SUA INFLUÊNCIA PARA O ENSINO PRIMÁRIO 
MINEIRO NO INÍCIO DO SÉCULO XX
Muito já foi escrito sobre a formação dos grupos 
escolares no Brasil. Dentre os estudos que realizamos, o debate 
a respeito da criação e difusão desses educandários vêm sendo 
objeto de estudo por diversos pesquisadores em História da 
Educação nos últimos anos, tais como Carvalho (1989); Faria 
168
Denilson S. de Azevedo
Talitha Estevam M. Cabral 
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.165-186 ,
nov. 2015/ fev. 2016
Filho (2000); Pinheiro (2002); Reis (2006). O acúmulo das 
investigações sobre essa temática tem propiciado a elaboração 
de balanços críticos e um volume considerável de publicações. 
Essas reflexões servem de referência e ponto de partida para a 
pesquisa que nos dispusemos a apresentar nesse texto.
Conforme a literatura sobre o assunto nos apresenta, no 
final do século XIX e início do século XX, um novo modelo 
de escola passou a vigorar no Brasil. A partir de 1889, com a 
instalação da república, o modelo educacional que vigorava até 
aquele momento, baseado no preceito das escolas domésticas3, 
passa a ser visto como ultrapassado e incapaz de atender aos 
ideais propagados pelos defensores do novo regime, como 
democracia, ordem, progresso e amor à pátria. 
Os republicanos pretendiam, a partir desse momento, 
disseminar seus valores, preparando a criança para viver em 
uma sociedade capitalista. Segundo Corsetti (2002, p.2):
a política educacional dos republicanos 
buscou preparar o homem adequado ao 
processo de consolidação do capitalismo, 
para que os aspectos relacionados com 
a disciplina, o respeito à hierarquia e à 
autoridade, o controle rigoroso das atividades 
e o uso produtivo do tempo, bem como os 
demais valores decorrentes de uma prática 
com base nesses elementos, constituíram-se 
em “ingredientes” permanentes do cotidiano 
escolar.
Para atender aos intuitos propostos pelo novo modelo 
educacional, ocorre um movimento de renovação da escola 
primária por meio do surgimento dos grupos escolares. Essa 
transformação teve um profundo significado social, político e 
cultural visto que não representava apenas a “democratização” 
do acesso à leitura e à escrita, mas a implantação de uma 
3 Nesse modelo educacional, as aulas aconteciam em ambientes cedidos e 
preparados pelos responsáveis, sem vínculo com o Estado. O pagamento do 
professor era de responsabilidade do contratante individual ou de um grupo de 
contratantes. (FARIA FILHO, 2000).
169
A criação do grupo 
escolar silveira brum 
e seus primeiros anos 
de funcionamento: 
relações entre a república 
e as festas escolares 
(1912-1930).
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 165-186,
nov. 2015/ fev. 2016
instituição educativa responsável em difundir novos valores, 
hábitos e deveres. 
O modelo “grupo escolar” representava um novo ideal 
de racionalização e uniformização do trabalho escolar, no 
que diz respeito a conteúdo, condutas, práticas pedagógicas, 
horário e cultura escolar; era uma tentativa de homogeneizar o 
currículo e fiscalizar o trabalho realizado nesses espaços.
Especificamente no estado de Minas Gerais, esses 
estabelecimentos de ensino foram criados no governo de João 
Pinheiro, através da Lei nº 439, de 1906. Na imprensa mineira, 
notas referentes à nova organização do ensino demonstravam 
a importância conferida à educação nesse novo modelo 
educacional. A questão da arquitetura dos prédios é bastante 
valorizada, a fim de demonstrar a centralidade conferida à 
educação nesse período.
Tão importante quanto a estrutura dos edifícios que 
sediavam os grupos escolares, eram as práticas difundidas 
nesse ambiente. Num discurso veiculado na Imprensa Oficial 
de Minas Gerais, um dos secretários do Interior escreve que:
A fusão de diversas escolas num só instituto, 
subordinado a uma única direção traz, como 
conseqüência, melhor orientação e mais suave 
difusão do ensino, devido à especialização de 
funções resultantes da divisão do trabalho de 
cada docente. A aplicação da Lei econômica 
da divisão do trabalho nos grupos escolares 
apresenta os mais robustos resultados. 
(MINAS GERAIS, 1913).
Essas transformações incluíram também o currículo 
das escolas. Saviani (2006) nos lembra que nos programas 
escolares foram reorganizadas várias disciplinas. Com a nova 
exigência curricular, modifica-se também a forma de ensinar. 
A nova metodologia adotada para esse modelo educacional 
foi denominada como método intuitivo ou lição das coisas, o 
qual implicava na adoção de um projeto concreto, racional e 
ativo de escolarização.
170
Denilson S. de Azevedo
Talitha Estevam M. Cabral 
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.165-186 ,
nov. 2015/ fev. 2016
Com tantas exigências, transformações e regulações, 
este modelo de escola se tornou referência naquele momento 
histórico, seja pela metodologiaentão adotada ou pelo modo 
de organização da prática pedagógica, com a racionalização 
do trabalho e a divisão de tarefas, seja pela estrutura tida 
como adequada para as atividades escolares, obedecendo às 
prescrições sanitaristas e higiênicas.
Feitas essas breves considerações acerca da criação dos 
grupos escolares no Brasil, percebe-se, portanto, que as práticas 
difundidas com a criação desses educandários em Minas Gerais, 
tendo como pano de fundo no caso desta pesquisa o GESB, 
foram fundamentais para a consolidação de uma nova maneira 
de se fazer a escola primária. E é nesse sentido que abordaremos 
a seguir aspectos referentes ao cotidiano do grupo escolar 
muriaeense, enfatizando as comemorações ocorridas no interior 
dessa instituição de ensino nos anos de 1912 a 1930.
GRUPO ESCOLAR SILVEIRA BRUM: AS RELAÇÕES ENTRE A 
REPÚBLICA E AS FESTIVIDADES ESCOLARES 
O modelo educacional da cidade de Muriaé praticamente 
não se difere das demais propostas recomendadas a partir 
da criação dos grupos escolares. Tanto no que diz respeito à 
organização do trabalho, bem como na sistematização das 
práticas pedagógicas difundidas no espaço escolar, inclusive 
no que diz respeito à realização das festividades escolares. 
Para compreender melhor essa situação, analisaremos alguns 
aspectos dos primeiros anos de funcionamento do GESB 
que nos forneceram pistas para compreender como estavam 
ocorrendo as situações de comemorações nesse Grupo.
Criado pelo decreto 3.305, de 5 de setembro de 1911, o 
GESB foi inaugurado em 07 de agosto de 1912 sob a direção 
do professor José Gonçalves Couto, que depois de nomeado 
por ato do Sr. Governador do Estado, Júlio Bueno Brandão, 
em 12 de janeiro de 1912, permaneceu no cargo até 13 de 
abril de 1936, quando se aposentou.
171
A criação do grupo 
escolar silveira brum 
e seus primeiros anos 
de funcionamento: 
relações entre a república 
e as festas escolares 
(1912-1930).
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 165-186,
nov. 2015/ fev. 2016
A respeito da estrutura do Grupo Escolar Silveira Brum, 
a Revista de Historiografia Muriaeense (1979) aponta que o 
edifício sobressaía-se como um dos melhores prédios da cidade. 
Criado exclusivamente para o fim da instrução, o prédio foi 
edificado dentro do conjunto arquitetônico da Praça Coronel 
Pacheco de Medeiros, um dos principais pontos de referência 
da cidade no início do século XX. 
Abaixo podemos ver uma foto do Grupo durante os 
primeiros anos de funcionamento:
Figura 1: Prédio do Grupo Escolar Silveira Brum (1916) – Fonte: Arquivo Municipal
Na continuidade da análise dos documentos encontrados, 
como os diversos relatórios escolares, bem como em relatórios 
de visitas de inspeção, percebemos que o primeiro diretor, José 
Gonçalves Couto, cumpria as tarefas a ele designadas. Nos ofícios 
enviados à Secretaria do Interior percebemos a distinta atenção 
dada às questões relacionadas com as práticas pedagógicas, de 
modo a garantir que a disciplina e a ordem fossem cumpridas nas 
salas de aula. 
Também encontramos, em um relatório datado de 28 de 
dezembro de 1912, a descrição do método pedagógico desenvolvido 
no GESB. Neste trecho foi possível identificar como as lições de 
coisas proposta pelo método intuitivo estava sendo trabalhada. 
A equipe de visitantes particulares escreveu que o educandário se 
configurava como um exemplo de modelo escolar:
172
Denilson S. de Azevedo
Talitha Estevam M. Cabral 
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.165-186 ,
nov. 2015/ fev. 2016
É que nelle se conjugam e admiravelmente 
se casam os melhores mhetodos pedagógicos 
com a mais séria disciplina e ordem. As 
licções ministram-se por processos brandos 
e altamente profícuos fiados na intuição e 
analyse dos factos múltiplos que constituem 
a essência da escola moderna. A noção das 
coisas caminha da mais simples para a menos 
complexa, ensinando a mente infantil para 
dellas se apreender suavemente para a vida 
independente e autônoma do individuo 
na sociedade [...] nunca imaginamos que 
em quatro escassos mezes de aulas tanto se 
conseguisse de resultados esplendidos nesta 
casa [...] (RELATÓRIO DE VISITA DE 
PARTICULARES, 1912, s/p).
Não obstante, a respeito de algumas informações contidas 
nos documentos pesquisados, cabe salientar que esses materiais 
são aliados importantes na construção da realidade cotidiana 
do Grupo. No entanto, é conveniente que tenhamos cautela 
na análise desses escritos localizados pelo fato de que, algumas 
informações localizadas, podem ser tendenciosas no sentido 
de exaltar em demasia determinados aspectos positivos e tapar 
as lacunas e problemas existentes no estabelecimento, pois 
nem sempre foi possível identificar, com a leitura do material 
localizado, quem eram essas pessoas que documentavam 
as informações. É necessário, então, que se acrescentem os 
demais elementos obtidos dos variados materiais estudados, 
elaborando um paralelo e um comparativo do que poderá ou 
não ser o mais próximo da realidade, haja vista que, em se 
tratando de história, torna-se uma tarefa complexa resgatar 
completamente uma realidade, sem que fiquem dúvidas e/ou 
outras considerações a serem analisadas a posteriori.
Apesar dessa dificuldade da área, podemos nos apropriar 
de algumas informações pesquisadas para tentar explicar uma 
dada situação. Nesse sentido, no que tange aos professores que 
atuaram no ensino primário do GESB, podemos inferir através 
dos documentos investigados que, em sua maioria, possuíam 
173
A criação do grupo 
escolar silveira brum 
e seus primeiros anos 
de funcionamento: 
relações entre a república 
e as festas escolares 
(1912-1930).
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 165-186,
nov. 2015/ fev. 2016
formação de normalistas, obtidas nas Escolas Normais do 
Estado e do próprio município. 
Foi possível perceber que o acesso e a ascensão na carreira 
profissional do magistério dependia tanto da competência 
profissional quanto da influência política e pessoal do docente 
pois na cidade de Muriaé os contratos não se davam apenas por 
indicações políticas, mas também eram resultado dos concursos 
realizados pelo Grupo. Como se supõe do documento localizado 
no Arquivo Público Mineiro, que apresenta um concurso de 
“Uma vaga adjuncto - Grupo Escolar de S. Paulo do Muriahé 
Interior, 6ª secção, 27-XI-1917”.
Após a contratação e antes de iniciar o trabalho docente 
no Grupo, os professores deveriam apresentar sua origem 
familiar e atestar sua boa conduta moral e sanidade física. Nos 
documentos consultados, esses três tipos de declarações eram 
pré-requisito para o exercício de seu cargo: atestado de bons 
antecedentes criminais, de boa saúde e de filiação. O corpo de 
profissionais compunha-se, inicialmente, de oito professores 
da cidade, muitos lecionando gratuitamente.
Sobre a rotina escolar da instituição, ainda no primeiro 
relatório escrito pelo diretor José Gonçalves Couto à Secretaria 
do Interior, são apontadas características desse cotidiano, 
determinadas através de uma programação regrada e pré-
estabelecida:
De 12 de agosto a 22 de janeiro de 1913, 
diariamente às 10,50 foi encerrado o ponto 
de entrada dos professores [...].
Das 10,50 as 11 assistiam, em posição militar 
corretíssima, ao hasteamento da bandeira 
[...] Um alumno, previamente designado por 
mim, saudava com enthusiasmo a bandeira, 
terminando sempre a sua saudação com 
um vibrante Viva ao pavilhão Nacional, 
no que era compreendido pelos colegas. Às 
11 em ponto, já em classe, feita a revista, 
começavam as professoras os seus trabalhos 
escolares.
174
Denilson S. de Azevedo
Talitha Estevam M. Cabral 
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.165-186 ,
nov. 2015/ fev. 2016
No dia 22 de janeiro de 1913, de acordo 
com o artigo 291 parágrafo único doregulamento vigente, passaram as aulas a 
funcionar das 7 às 11 da manhã, seguindo-se 
a mesma ordem referida.
Os exercícios physicos são feitos no pateo do 
edifício [...].
Nos 10 minutos de recreio, durante o qual são 
os alumnos fiscalizados por dois professores 
que se revezam durante a semana, os rapazes 
passam para um pateo [...] separado por 
uma tella de arame. (RELATÓRIO DO 
MOVIMENTO ESCOLAR, 1913, s/p).
Nesse excerto é interessante perceber a exaltação que era 
feita ao elemento patriótico, representado – nesse caso – pela 
bandeira nacional. Diariamente, os alunos eram convidados a 
reverenciá-la, o que nos permite supor que, essa ação, era uma 
maneira de reforçar o caráter nacionalista e republicano do 
novo modelo educacional. 
Essa exaltação dos ideais de “Ordem e Progresso” trazidos 
pela República são identificados em diversos outros momentos 
no GESB. Outro documento que indica a disseminação dos 
ideais republicanos é um relatório de visita de particulares, em 
que um dos visitantes escreve:
Depois de percorrermos todos os salões de 
estudo, onde apreciei graciosos e complicados 
trabalhos manuaes, e outras cousas, soou, 
eloquentemente, a sineta que nos annunciava 
o recreio infantil. Instantes depois passava, 
em formatura elegante, a alegre criançada. 
A nota destaque do momento foi a 
continência á bandeira nacional. O que 
mais me admirou foi o respeito com que [...] 
saudaram o auriverde pendão. [...] todos os 
apparelhos exigidos pela pedagogia hodierna 
alli se encontram, no mais perfeito estado 
de asseio e conservação, prestando os seus 
relevantes serviços á causa da vida pratica 
[...] a mnemotechnia é observada com todo 
175
A criação do grupo 
escolar silveira brum 
e seus primeiros anos 
de funcionamento: 
relações entre a república 
e as festas escolares 
(1912-1930).
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 165-186,
nov. 2015/ fev. 2016
o rigor [...] (RELATÓRIO DE VISITA DE 
PARTICULARES, 1913, s/p).
Outro momento específico de exaltação dos preceitos 
republicanos diz respeito às festividades escolares. Nos 
relatórios anuais localizados podemos perceber que as datas 
da Independência do Brasil e da Proclamação da República 
sempre eram muito comemoradas.
De acordo com Roger Chartier (1987) a realização 
de festas cívicas foi impulsionada por meio da Revolução 
Francesa. Essas comemorações revolucionárias carregavam 
em si um interesse pedagógico de complementar a educação 
escolar formal, além de garantir a formação integral do sujeito, 
baseada na educabilidade natural do homem.
As festas escolares do Grupo Escolar Silveira Brum 
aconteciam com frequência desde a sua fundação. Eram 
momentos que estavam intimamente relacionados às datas 
cívicas e aos princípios patrióticos, e que pretendiam refletir 
o movimento comum a outros grupos escolares mineiros que 
aproveitavam destas solenidades para disseminar os ideais 
republicanos. 
No educandário suprarreferenciado até o espaço foi 
pensado para a realização dos eventos escolares, conforme se 
infere de documento localizado no arquivo da atual Escola 
Estadual Doutor Silveira Brum:
Os seus salões, em número de doze: oito 
para as aulas, um para o gabinete do 
director, um para o museu escolar, outro – 
o nobre – destinado à reunião dos alumnos 
nos dias de festas escolares, e, (...) o vestíbulo 
(...) são vastíssimos e mui bem arejados. 
(...) (RELATÓRIO DO MOVIMENTO 
ESCOLAR, 1913, s/p, grifo nosso).
Sobre as festividades, de acordo com o relatório do 
diretor, o dia da inauguração do prédio escolar foi marcado 
de muitas comemorações, com a presença de pessoas ilustres:
176
Denilson S. de Azevedo
Talitha Estevam M. Cabral 
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.165-186 ,
nov. 2015/ fev. 2016
A este acto, que se reveste de toda a 
solenidade, compareceram quasi todas as 
auctoridades locaes, a câmara municipal 
incorporada e muitas famílias. O governo 
foi representado pelo Exmo. Sr. Dr. Antonio 
da Silveira Brum. 
[...] Ao acto da installação compareceram, 
dos 568 matriculados, 420 alumnos. No dia 
7 deste, ao meio dia, houve a solennidade da 
benção do prédio pelo Revmo. Sr. Pe. João Pio, 
que pronunciou bella allocução. A este acto, 
compareceram muitas pessoas gradas. [...]
Usando da palavra, o Sr. Silveira Brum 
agradeceu [...] as manifestações de apreço 
que lhe foram dirigidas [...] e me fez a entrega 
do prédio. Recebendo-o, agradeci a preciosa 
dádiva, promettendo enviar todos os meus 
esforços para que o Grupo, que é um dos 
primeiros do Estado, quanto ao prédio, o 
seja também, quanto a parte intellectual 
e moral [...]. Os alumnos cantaram o 
“Hymno a Tiradentes” [...] O Sr. Inspector 
escolar, depois de varias considerações sobre 
a instrução, tratou de fundar a Caixa Escolar, 
que recebeu o nome de V. Excia [...]
Ás seis da tarde, encerrou-se a sessão, 
retirando-se em seguida todos os alumnos 
e convidados .[...] (RELATÓRIO DO 
DIRETOR, 1912, s/p)
Em outro relatório enviado à Secretaria do Interior 
no ano de 1914, o diretor, Gonçalves Couto, relata que 
“algumas datas nacionaes, foram festivamente comemoradas” 
e apresenta que:
O ensino primário era ministrado em quatro anos, com 
um programa enciclopédico com matérias que proporcionavam 
uma educação integral - a educação física, intelectual e moral. 
Previa a utilização do método intuitivo [...] Exigia-se uma 
rígida disciplina dos alunos (assiduidade, asseio, ordem, 
obediência, etc.). O tempo escolar passou a ser controlado 
através do calendário. Havia também práticas “ritualizadas” 
177
A criação do grupo 
escolar silveira brum 
e seus primeiros anos 
de funcionamento: 
relações entre a república 
e as festas escolares 
(1912-1930).
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 165-186,
nov. 2015/ fev. 2016
e “simbólicas”, como os exames finais, as exposições escolares, 
as datas cívicas e as festas de encerramento do ano letivo. 
(RELATÓRIO DO DIRETOR, 1912, s/p, grifo nosso).
Nesse trecho, é possível perceber que as festividades no 
Grupo representavam mais uma forma encontrada pelo diretor 
da escola para desenvolver, através de práticas “ritualizadas” e 
“simbólicas”, os ideais republicanos.
Num outro documento consultado, Gonçalves Couto 
informa que os dias 7 de setembro e 19 de novembro foram 
festejados no GESB, datas referentes à Independência do 
Brasil (7 de setembro) e Proclamação da República (15 de 
novembro), respectivamente. No relatório sobre a festa de 7 
de setembro, em 1913 (segundo ano de funcionamento do 
Grupo), o diretor evidencia o patriotismo por meio de uma 
comemoração à independência do Brasil que 
(...) Recebendo o mastro, que foi colocado 
à frente do Grupo Escolar, e a bandeira, que 
também foi confeccionada na Alemanha, 
agradeci em nome do governo a preciosíssima 
offerta. Em seguida, ao som do hymno 
nacional tocado pela corporação musical – 
7 de setembro -, e entoado, vibrantemente, 
por todos os alumnos do grupo, elevou-se 
lentamente, garbosamente ao grande mastro 
a bandeira nacional que foi saudada por 
uma salva de 21 tiros. (RELATÓRIO DO 
MOVIMENTO DO GRUPO ESCOLAR 
DE MURIAÉ, 1913, s/p). 
Em 1915, temos que:
o dia 7 de agosto – aniversário do grupo – 7 
de setembro e 19 de novembro foram mais 
solenemente festejados. No dia 19 deste 
mez houve a solennidade da entrega de 
certificados de approvaçação dos alumnos 
que concluíram o curso. (RELATÓRIO DO 
DIRETOR, 1915, s/p).
178
Denilson S. de Azevedo
Talitha Estevam M. Cabral 
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.165-186 ,
nov. 2015/ fev. 2016
Nesse relato, temos que a data da proclamação da 
República também foi festejada (quatro dias depois) para findar 
o ano letivo das crianças aprovadas. Já no relatório de 1919, o 
diretor cita outras datas que também eramcomemoradas no 
estabelecimento de ensino:
Como nos annos anteriores, 
commemorando-se nesta casa de ensino, 
durante o anno a que se refere este relatório, 
as grandes datas normaes. Os dias 21 de 
abril, 7 de agosto – anniversario do grupo, - 
e 7 de setembro foram festejados com maior 
solennidades [...]. (RELATÓRIO DO 
DIRETOR, 1919, s/p).
Outra festa que ocorrera no educandário muriaeense era 
a chamada “Festa da Árvore”, que costumava acontecer em 
outras localidades mineiras, com influência internacional de 
modelos de festas que existiam em países norte-americanos 
e europeus. No exterior, essa iniciativa acontecia através do 
plantio de árvores e palestras sobre a importância da natureza, 
a fim de mobilizar os cidadãos para o cuidado ambiental de 
seus países. Aqui no Brasil, segundo Rodrigues (2010, p.101),
a Festa da Árvore consistia numa sessão 
solene em que era explicado o significado 
da festa, com palavras repassadas de muito 
carinho e amor às árvores (como se se 
operasse a transformação de um objecto 
profano, a árvore, em sagrado, sendo o 
sagrado o retorno da intimidade entre o 
homem e o mundo, entre o sujeito e o 
objecto). Recitavam-se versos e cantavam-
se canções patrióticas durante a marcha que 
decorria desde a escola até ao local onde 
eram plantadas as árvores, que eram tidas 
como elos de ligação entre o tempo passado 
e o tempo vindouro.
179
A criação do grupo 
escolar silveira brum 
e seus primeiros anos 
de funcionamento: 
relações entre a república 
e as festas escolares 
(1912-1930).
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 165-186,
nov. 2015/ fev. 2016
E é com esse pensamento que, em 1917, o diretor 
aponta as comemorações do dia da Independência fazendo 
referência à festa da Árvore:
Em comemoração da data da independência 
da nossa Patria, foram celebradas a festa 
das arvores, como determina V. Excia em 
portaria de 24 de agosto p. findo, e a das 
aves, como em completivo da 1ª;
Foi executado o seguinte programma:
Ás 12h – Dissertação dos professores, cada 
um em sua classe, sobre o 7 de setembro;
Ás 12 1/2h – Allocução do director sobre as 
arvores e a celebração da festa das mesmas;
Ás 2h – Plantio de arvores no pateo do 
estabelecimento por professores e alumnos 
[...]
Durante a plantação – Hymnos “A 
Independência” e “A Bandeira”.
Ás 2 1/2h – Liberdade aos pássaros trazidos 
pelos alumnos para este fim;
Ás 3h – Distribuição de prêmios aos alumnos 
que, em procedimento, aproveitamento e 
assiduidade mais se distinguirem em agosto 
p. findo. (RELATÓRIO DO DIRETOR, 
1917, s/p).
Detalhes como estes citados nos excertos supracitados, 
percebidos durante as comemorações realizadas no Grupo, 
como o hasteamento da bandeira nacional, hinos patrióticos 
cantados em continência e aclamações aos poderes públicos, 
nos revela aspectos civilizatórios que foram, ao longo do 
tempo, incutidos nos alunos, fazendo com que sentimentos 
como o de amor a Pátria estivessem sempre relacionado à 
formação do indivíduo.
Quanto a isso é possível entender que as festas cívicas e o 
hasteamento da bandeira nacional eram pensados pelos grupos 
escolares como um espetáculo formativo de sensibilidade 
180
Denilson S. de Azevedo
Talitha Estevam M. Cabral 
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.165-186 ,
nov. 2015/ fev. 2016
patriótica e de respeito ao regime republicano. Deve-se a isso, 
possivelmente, a intensa preocupação em festejar as datas 
marcantes na organização da República. 
Isso porque, mediante toda a nova organização do ensino, 
enquanto local de disseminação dos preceitos republicanos, 
criava-se também a idéia de uma memória nacional, que era 
buscada por meio das festividades escolares. Nas palavras de 
Rodrigues (2010, p.95):
As festas contribuem para a constituição de 
um modo de construir e difundir referências 
e símbolos nacionais, integrando a memória 
coletiva nacional. Em momentos de tensão e 
ruptura históricas, as festas são organizadas 
para criar consensos e unir o povo a um 
ideal, conquistando a adesão do mesmo para 
novas propostas políticas e consolidando 
uma nova ordem social.
A respeito dessas comemorações, Vieira e Marcusso 
(2009, p.2) nos informam que:
Previstas no regulamento da Instrução 
Pública de Minas Gerais, e também de outros 
estados, eram momentos de evidência local 
para os Grupos Escolares, com a divulgação 
das ações republicanas e dos símbolos 
da República (bandeira, escudo e hino). 
Aconteciam com certa frequência, e por 
reunirem a comunidade escolar tornavam-se 
uma oportunidade de exaltação da escola e 
das autoridades presentes.
Bencostta (2005) nos aponta que existia uma 
preocupação em inculcar consciências patrióticas nos discentes 
através dessas festas. Assim, calendários normatizadores foram 
instituídos para que se comemorassem datas cívicas. De acordo 
com Faria Filho (2000, p. 86):
o hasteamento da bandeira, as festa cívicas e 
mesmo a inauguração dos grupos escolares 
eram momentos organizados e pensados 
181
A criação do grupo 
escolar silveira brum 
e seus primeiros anos 
de funcionamento: 
relações entre a república 
e as festas escolares 
(1912-1930).
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 165-186,
nov. 2015/ fev. 2016
como espetáculos formativos, não apenas 
de comportamento, mas de sensibilidade e 
sentimentos em face da cidade, do regime 
republicano, da cultura das classe pobres, 
dentre outros.
Ainda mediante as informações trazidas pelos relatos 
apresentados anteriormente, percebemos a magnitude 
concedida às datas cívicas do calendário. Essa era uma maneira 
de dar visibilidade às novas práticas pedagógicas implementadas 
nos novos modelos escolares. Indo ao encontro das idéias de 
Faria Filho, Lopes (2011, p.2) aponta que:
em que pese as multiplicidades de usos, 
intencionalidades e sentidos existentes nas 
festas, estas eram utilizadas pelas escolas 
reunidas e grupos escolares, especialmente, 
para tornar mais visível sua ação pedagógica 
no contexto escolar, demarcando sua posição 
de importante inovação no aparato escolar 
existente. Reunião e movimentação de um 
número significativo de alunos, as festas 
escolares demarcavam mobilidade e status 
das escolas na cidade. Assim, os grupos 
escolares, no período analisado, situados 
no topo da hierarquia do sistema de ensino 
primário, participavam crescentemente das 
festividades públicas. Seus alunos passavam, 
cada vez mais, a figurar nas solenidades 
públicas discursando em nome delas.
Na continuidade das análises dos documentos 
pesquisados, foi possível inferir que as festividades de fim do 
ano no GESB, na maioria das vezes, se distinguiam das demais 
comemorações do ano. Existia uma fiscalização que visava 
avaliar os resultados das tarefas realizadas no estabelecimento, 
e se estas estavam de acordo com as disposições legais. Não 
obstante, assim como as outras festas, esta devia ser registrada 
e divulgada na cidade a fim de fortalecer os ideais republicanos 
de desenvolvimento, ordem, progresso e amor à pátria. 
182
Denilson S. de Azevedo
Talitha Estevam M. Cabral 
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.165-186 ,
nov. 2015/ fev. 2016
CONSIDERAÇÕES FINAIS
 A construção desse trabalho apoiou-se nos estudos dos 
teóricos da História da Educação Brasileira, particularmente 
os trabalhos sobre a criação dos grupos escolares no Brasil e em 
Minas Gerais. O cotejamento dos dados nesse artigo priorizou 
o estudo sobre as festividades escolares no início do século 
passado. 
Os resultados obtidos demonstram que a criação do 
Grupo Escolar Silveira Brum na cidade de Muriaé foi o marco 
inicial de um modelo de escolarização que surge em todo o país, 
incluindo o estado de Minas Gerais. No referido município, 
o educandário criado pretendia atender às exigênciasda 
república, com a divisão do trabalho, de modo a controlar os 
espaços e tempos escolares. 
A nova metodologia de ensino utilizada contava com 
a figura do diretor como responsável pela organização do 
trabalho, com a presença de um professor como regente do 
ensino elementar a um grupo de alunos divididos por séries 
no ensino primário. 
Essas modificações nas práticas escolares contribuíram 
para concretizar uma aprendizagem progressiva, com a 
gradativa implantação de um trabalho pedagógico cada vez 
mais embasado nos princípios republicanos e patrióticos. À 
guisa de exemplificação podemos compreender as festividades 
escolares como modos de disseminar os preceitos republicanos 
na sociedade brasileira naquela época.
Nesse viés, a pesquisa mostrou no GESB havia o esforço 
de tentar alcançar o ideal de nação civilizada e de identidade 
nacional proposto com a proclamação da República. É 
possível inferir que as comemorações no Grupo representava 
o progresso da nação, e contribuía para a construção de um 
imaginário político voltado para os interesses republicanos 
capitalistas.
Desse modo, o estudo realizado nos leva a crer que 
a orientação dos currículos escolares hoje são reflexo da 
183
A criação do grupo 
escolar silveira brum 
e seus primeiros anos 
de funcionamento: 
relações entre a república 
e as festas escolares 
(1912-1930).
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 165-186,
nov. 2015/ fev. 2016
sociedade em que vivemos, assim como no início do século 
passado o programa educacional estava voltado para os 
interesses republicanos, que se externaram por meio das 
festividades escolares. E, nesse sentido, a história da educação 
auxilia na compreensão de questões atuais, não com o intuito 
de solucionar os problemas que surgem, mas, com a intenção 
de lançar luz a aspectos já vivenciados em outros momentos 
históricos, capazes de orientar possibilidades e caminhos.
REFERÊNCIAS
Documentos pesquisados em Arquivos:
GRUPO ESCOLAR SILVEIRA BRUM. Atas de 
Instalação, posse, exames, etc. (Arquivo Escola Estadual 
Doutor Silveira Brum), 1912-1924
GRUPO ESCOLAR SILVEIRA BRUM. Ofícios 
enviados e recebidos da Secretaria de Educação do Estado. 
(Arquivo Escola Estadual Doutor Silveira Brum), 1912 a 1930.
GRUPO ESCOLAR SILVEIRA BRUM. Termos de 
Visitas Oficiais; Termos de Visitas Particulares. (Arquivo Público 
Mineiro e Escola Estadual Doutor Silveira Brum), 1912-1927.
GRUPO ESCOLAR SILVEIRA BRUM. Cadernos 
de avaliação e certificados de aprovação dos alunos. (Arquivo 
Escola Estadual Doutor Silveira Brum), 1913-1916.
GRUPO ESCOLAR SILVEIRA BRUM. Relatório 
do Diretor. (Arquivo Escola Estadual Doutor Silveira Brum), 
1913-1919.
GRUPO ESCOLAR SILVEIRA BRUM. Atas de 
Instalação e Exames; Relatórios do diretor; Termos de 
Assentamento e Posse; Visitas Oficiais e Particulares; diplomas; 
requerimentos; nomeações; decretos; licenças; procurações; 
frequência dos professores e/ou alunos. (Arquivo Público 
Mineiro), 1912-1930.
Revista de Historiografia Muriaeense. Ano II, nº 2 – 
Muriaé/MG. Maio, 1979.
MINAS GERAIS. Secretaria do Interior e Justiça. 
Relatório da Imprensa Oficial. (APM), 1913.
Livros, artigos e periódicos:
BENCOSTTA, M. L. A. Grupos escolares no Brasil: 
um novo modelo de escola primária. In: BASTOS, M.H.C. 
& STEPHANOU, M. (Orgs). Histórias e Memórias da 
Educação no Brasil. Petrópolis: Vozes, p. 68–76, 2005.
CARVALHO, M. M. C.de. A escola e a República. 
São Paulo: Brasiliense, 1989. 
CHARTIER, R. Lectures et lecteurs dans la France 
d’Ancien Régime. Paris: Éditions du Seuil, 1987.
CORSETTI, B. A escola pública no Rio Grande do 
Sul e o projeto político republicano (1889/1930): a escola 
pública, a formação de professores e o controle disciplinar. 
In: Congresso Brasileiro de História da Educação: História 
e Memória da Educação Brasileira, 2, 2002, Natal. Anais. 
Natal: Núcleo de Arte e Cultura da UFRN, p. 1-12, 2002.
FARIA FILHO, L. M. de. Dos Pardieiros aos Palácios 
– Cultura escolar e urbana em Belo Horizonte na Primeira 
República. Passo Fundo: UPF, 2000. 
LOPES, A. C. A escola em festa: Festividades escolares na I 
República no Piauí. Disponível em: http:<//www.faced.ufu.br/
colubhe06/anais/arquivos/396AntonioPaduaCarvalhoLopes.
pdf> Acesso em: 15 nov. 2012.
PINHEIRO, A.C.F.. Da era das cadeiras isoladas a 
era dos grupos escolares na Paraíba. Campinas, SP: Autores 
Associados; São Paulo: Universidade São Francisco, 2002.
REIS, R.M. dos. A história dos Grupos Escolares em 
Mato Grosso. In: Congresso Brasileiro de História da 
Educação – A Educação e seus sujeitos na História, 4, 
Goiânia. Anais. CD-ROM, 2006. 
RODRIGUES, M.M.P.F. Festas escolares: as festas da 
árvore no Barreiro. História da Educação, Pelotas, v. 14, n. 
31, p. 95-119, maio/ago 2010.
185
A criação do grupo 
escolar silveira brum 
e seus primeiros anos 
de funcionamento: 
relações entre a república 
e as festas escolares 
(1912-1930).
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 165-186,
nov. 2015/ fev. 2016
SAVIANI, D. O legado educacional do “longo século 
XX” brasileiro. In: SAVIANI, D.; ALMEIDA, J. S.; SOUZA, 
R. F. de; VALDEMARIN, V. T. O legado educacional do 
século XX no Brasil. Campinas: Autores Associados, 2006.
VIEIRA, L.C. & MARCUSSO, M.F. As comemorações 
escolares e suas frestas: as relações entre a república e as festas 
do Grupo Escolar de Mariana (1909-1930). In: Congresso 
Iberoamericano de História da Educação Latino-americana, 
9, 2009, Rio de Janeiro. Anais, p. 1-7, 2009.
Data de recebimento: agosto de 2014
Data de aceite: junho de 2015
187
Higienismo, imprensa 
e educação na 
parahyba do norte: 
o papel da mulher 
e a pedagogização 
dos hábitos
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 187-214,
nov. 2015/ fev. 2016
HIGIENISMO, IMPRENSA E 
EDUCAÇÃO NA PARAHYBA DO 
NORTE: O PAPEL DA MULHER E A 
PEDAGOGIZAÇÃO DOS HÁBITOS
Charliton José dos Santos Machado1 
Larissa Meira de Vasconcelos2 
Resumo
Este artigo analisa os discursos pedagógicos voltados à 
conformação de hábitos e valores comportamentais presentes 
nos jornais da Parahyba do Norte, na Primeira República. 
Parte-se da premissa de que o fenômeno educacional não 
se limita à escola, mas se encontra difundido na sociedade. 
Logo, consideram-se como dotados de viés educativo, 
impressos que não se direcionam estritamente ao público 
escolar. Empreende-se, pois, uma reflexão histórica sobre a 
construção da mulher como pedagoga da nação. Para tal 
intento, dialoga-se com a Nova História, a qual propõe 
repensar os conceitos de leitura e de assimilação dos 
discursos construídos. Trata-se de problematizar as formas 
de ler e os modos de arquitetar uma Parahyba saudável e 
educada. 
Palavras-chave: Gênero; Higienismo; Educação.
1 Charliton José dos Santos Machado – Universidade Federal da Paraíba (UFPB).
 Email: charlitonlara@yahoo.com.br
2 Larissa Meira de Vasconcelos – Universidade Federal da Paraíba (UFPB).
 E-mail: meiravasconcelos@gmail.com
 
188
 Charliton José dos S. Machado 
Larissa Meira de Vasconcelos
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.187-214 ,
nov. 2015/ fev. 2016
HYGIENISM, PRESS AND EDUCATION OF 
NORTH PARAHYBA: THE WOMAN'S PAPER AND 
PEDAGOGIZATION OF THE HABITS
Abstract
This article analyzes the pedagogical speeches focused 
on the resignation of habits and behavioral values 
present in the newspaper of North Parahyba, during the 
First Republic. It originates from the premise that the 
educational phenomenon is not limited to the school, but 
it is widespread in the society. Therefore, it is considered as 
endowed of educational bias, prints that are not targeted 
strictly to the academic audience. So, is undertaken a 
historical reflection about the making of the woman as 
educator of the nation. For this purpose,it dialogues with 
the New History, which proposes to rethink the concepts 
of reading and assimilation of the constructed discourses. 
It's about questioning the ways of reading and the ways of 
architecting a healthy and educated Parahyba. 
Keywords: Gender; Hygienism; Education.
189
Higienismo, imprensa 
e educação na 
parahyba do norte: 
o papel da mulher 
e a pedagogização 
dos hábitos
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 187-214,
nov. 2015/ fev. 2016
HIGIENISMO, IMPRENSA E 
EDUCAÇÃO NA PARAHYBA DO 
NORTE: O PAPEL DA MULHER E A 
PEDAGOGIZAÇÃO DOS HÁBITOS
1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Durante a Primeira República, a Parahyba, ao 
incorporar as aspirações de um projeto de nação civilizada 
em voga, voltou-se aos ideais de modernidade, dos quais 
a abolição da escravidão, a intensificação do movimento 
imigratório, o advento de um novo sistema político e o influxo 
da expansão urbana traduziram os desejos de progresso. Neste 
contexto, emerge um discurso publicizado na imprensa 
voltado à regeneração dos hábitos e à propagação da higiene, 
consolidando um saber pautado nas reformas morais e físicas 
propostas por profissionais médicos. Entrevia-se em um 
contingente populacional desnutrido e doente um entrave 
no interior das aspirações de uma sociedade vigorosa e que 
deveria voltar-se aos desafios do progresso. Portanto, fazia-
se necessário, a partir dos preceitos sanitaristas3, normatizar 
os corpos, os hábitos cotidianos, as formas de morar, de se 
alimentar, de se vestir (MATOS, 2010). De acordo com Del 
Fiorentino (1979, p.85), nesse momento inicial da experiência 
republicana, dedica-se especial atenção à campanha higienista, 
considerada de suma importância para o desenvolvimento do 
país, uma vez que as doenças e os costumes anti-higiênicos 
3 Ainda que existam estudos defendendo a tese de que o “movimento higienista” 
ou “sanitarista”, no Brasil, extrapola a periodização tradicional que lhe imputa 
o término entre os anos de 1930 e 1940, prosseguindo com suas tradições 
e ideais heterogêneos até o fim do século XX, e muito possivelmente, até 
hoje, no início do século XXI (GÓIS JÚNIOR, 2007), trabalhamos com a 
periodização tradicional encontrada em todas as referências bibliográficas 
citadas no decorrer do artigo.
190
 Charliton José dos S. Machado 
Larissa Meira de Vasconcelos
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.187-214 ,
nov. 2015/ fev. 2016
eram considerados os principais responsáveis pela degeneração 
nacional. (DEL FIORENTINO, 1979).
Segundo Silva (2006), não se deve circunscrever 
a atuação dos médicos sanitaristas apenas em termos de 
“miasmas e drenagens”, pois a “sujeira moral” era igualmente 
responsável pela desorganização da sociedade e de seus 
habitantes, impedindo o progresso da civilização. “Em 
raciocínios como estes, privadas, esgotos, prostitutas, pobres, 
doentes, loucos e negros são associados numa mesma operação 
simbólica” (SILVA, 2006, p.101).
Diante de tal perspectiva, a educação aparece como uma 
ferramenta basilar, pois é por meio dela que os indivíduos 
aprendem a obedecer, incorporando novos padrões de higiene 
e comportamentos, contribuindo para uma sociedade mais 
dócil e saudável. De acordo com Silva (2005, p. 51),
[...] a ascensão de idéias cientificistas 
indicavam e estavam na base de um certo 
“entusiasmo educacional” que caracterizou 
o primeiro período republicano brasileiro. 
Neste momento, os ideais republicanos eram 
apresentados como uma nova perspectiva de 
organização da sociedade, organização essa, 
sustentada por um arcabouço liberal, que 
tornaria possível a entrada do Brasil nos 
cânones dos países modernos e civilizados, à 
imagem e semelhança das principais cidades 
europeias. 
A educação foi, portanto, estrategicamente vinculada 
à medicina, à psicologia e à psiquiatria, transformando-se 
em um elixir para a ignorância. Por meio dela, era possível 
promover a regeneração física e moral do povo (DEL 
FIORENTINO, 1979). Todavia, ainda que a escola tenha 
se configurado em um espaço privilegiado de “adestramento” 
e “disciplinarização do comportamento infantil” (SILVA, 
2011), não desempenhou esse papel sozinha. Por meio de 
pesquisa em jornais paraibanos, é possível caracterizar o espaço 
doméstico como aliado decisivo do pensamento higienista, 
191
Higienismo, imprensa 
e educação na 
parahyba do norte: 
o papel da mulher 
e a pedagogização 
dos hábitos
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 187-214,
nov. 2015/ fev. 2016
atrelando a mulher ao papel de pedagoga, por excelência, 
aquela que trabalharia em prol da edificação da cidade limpa 
e saneada; concepção esta, sustentada na ideia de que a “boa 
mãe” produziria bons cidadãos e que a limpeza e higiene do 
lar produziriam disciplina, boa moral e ausência de vícios. 
Para Del Fiorentino (1979, p. 53): “As tarefas educacionais 
não poderiam ser levadas a bom termo sem a participação da 
mulher, pois a ela competiam duas funções básicas: propagar a 
espécie e ser a primeira educadora dos filhos”. 
2. PERCURSOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS
Antes de nos debruçarmos sobre os impressos paraibanos, 
é necessário tecer algumas considerações teórico-metodológicas 
adotadas como referências de análise no presente artigo. Nesse 
intuito, dialogamos com as ideias de Michel Foucault (1979) 
quando reflete sobre o poder ou sobre as relações de poder. 
Para esse autor, uma das principais precauções é considerar 
o poder não como um todo homogêneo ou privilégio de um 
grupo sobre o outro. Pelo contrário, 
O poder deve ser analisado como algo 
que circula, ou melhor, como algo que só 
funciona em cadeia. Nunca está aqui ou 
ali, nunca está nas mãos de alguns, nunca 
é apropriado como uma riqueza ou um 
bem. O poder funciona e se exerce em rede. 
Os indivíduos não só circulam, mas estão 
sempre em posição de exercer este poder e 
de sofrer a sua ação; nunca são alvo inerte 
ou consentido do poder, são sempre centros 
de transmissão (FOUCAULT, 1979, p.183).
Da mesma forma, Foucault não acredita em um núcleo 
central, do qual o poder parte até se prolongar às extremidades. 
Os mecanismos de dominação são polimorfos e infinitesimais, 
possuem uma história, um caminho, técnicas e estratégias 
próprias que podem ser colonizados, utilizados, subjugados, 
“transformados por mecanismos cada vez mais gerais e por 
192
 Charliton José dos S. Machado 
Larissa Meira de Vasconcelos
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.187-214 ,
nov. 2015/ fev. 2016
formas de dominação global. [Ou seja], não é a dominação 
global que se pluraliza e repercute até embaixo.” (FOUCAULT, 
1979, p. 184, grifo nosso). Portanto, a análise deve ser 
“ascendente”, partindo-se do princípio de que o exercício de 
poder tem uma existência própria no nível mais elementar e 
cotidiano da sociedade. 
Ao enfatizar essas precauções, não vislumbramos 
um poder médico-higienista que incide sobre as mulheres 
verticalmente. Trata-se de uma multiplicidade de interesses 
envolvidos. Segundo Bernardes; Almeida; Santos (s.d), “a 
visão historiográfica moderna, para a qual a mulher é vista 
como ativa e rebelde, contrapõe-se à visão historiográfica 
tradicional de submissão e obediência”, reduzindo o debate 
a uma bipolarização de imagens ou enfoques teóricos 
cartesianos. Ambas as correntes historiográficas trazem 
subsídios importantes para reflexão. No entanto, esta forma 
dicotômica de enxergar a História contribui, sobremaneira, 
para uma visão generalizante de uma versão particular de 
mulher. Faz-se necessário, pois, investigar em uma terceira 
via (BERNARDES; ALMEIDA; SANTOS, s.d.), o que 
significa considerar os conflitos, tensões e acordos destas 
particularidades, consentindo insurgir femininos múltiplos, 
cada vez mais complexos e plurais. Não se trata de considerar a 
construção da “maternidadecientífica4” (FREIRE, 2006) como 
imposição de um grupo (médico) sobre outro (mulheres), mas 
o fruto de uma atuação dinâmica entre vários interesses. É 
certo que o discurso médico-higienista ratificava a primazia 
da maternidade como destino, uma missão da mulher e a 
declaração mais alta de sua feminilidade. O instinto maternal 
era considerado intrínseco à natureza feminina e sua ausência 
configurava-se como um desvio da normalidade. Nesse 
sentido, analisando a medicalização na história brasileira, 
Priore (1997, p. 84) afirma que:
4 “Entende-se por maternidade científica o exercício materno fundamentado 
em bases científicas, objeto de práticas educativas próprias e sob supervisão 
médica”. (FREIRE, 2006, p. 17) 
193
Higienismo, imprensa 
e educação na 
parahyba do norte: 
o papel da mulher 
e a pedagogização 
dos hábitos
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 187-214,
nov. 2015/ fev. 2016
A mulher “bem constituída”, no entender dos 
doutores, era exclusivamente a que se prestava 
à perpetuação da espécie, ungida por uma 
vocação biológica que fazia da madre uma 
forma na qual era organizada a hereditariedade. 
No entanto, a denominada Primeira Onda5 do 
feminismo enxergou no apoio às proposições científicas da 
época um caminho oportuno para alterar o seu papel na 
sociedade. Ou seja, 
A maternidade científica significou para 
as mulheres um reforço à sua condição de 
mãe, transformando a maternidade em 
profissão feminina, objeto de formação 
técnica específica. Como a prática da 
maternidade nesses novos moldes exigia 
inserção no universo científico, esse 
aspecto a aproximava do mundo masculino 
racional, deslocando-a da esfera estritamente 
doméstica e lhe conferindo novo status. 
Deslocamento que mantinha certa tensão 
interna, pois atualizava, em substância, 
a função maternal, e, ao mesmo tempo, 
abria brechas para novos comportamentos 
femininos (FREIRE, 2006, p. 50).
É neste sentido que Soihet (2000) afirma que o 
movimento feminista valeu-se da tática, a fim de subverter, 
para seus próprios fins, uma representação imposta. Certeau 
5 Como consequência de uma proposição metodológica, a história das lutas 
feministas costuma ser periodizada em três etapas principais: a primeira fase, 
datada do século XVIII ao início do século XX, consiste na luta pela participação 
política, na qual o direito ao sufrágio universal se destacou como principal 
tema. A “Segunda Onda”, pós‐segunda guerra mundial, criticava a suposta 
harmonia espontânea dentro das relações familiares. Com o slogan “O pessoal 
é político”, questionava‐se a dicotomia entre público e privado. Entendia‐se 
que a equidade na esfera pública estava condicionada à equidade na esfera 
doméstica. A “Terceira Onda”, contextualizada em meados da década de 1980, 
e intitulada Pós‐Feminismo, subverte o sentido de “Identidade Feminina”, 
desconstruindo‐a, a fim de revelar as contingências e descontinuidades no 
processo de sua construção histórica.
194
 Charliton José dos S. Machado 
Larissa Meira de Vasconcelos
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.187-214 ,
nov. 2015/ fev. 2016
(1994, p. 100) sugere que as táticas são ações calculadas 
por aquele que “não tem por lugar senão o do outro e por 
isso deve jogar com o terreno que lhe é imposto, tal como 
o organiza a lei de uma força estranha”. Embora existam 
críticas à atuação do movimento sufragista, associando-o a um 
“feminismo bem-comportado, católico, elegante, ‘feminino’” 
(MACEDO, 2003, p.100), reduzindo, dessa forma, a luta 
e direitos conquistados a uma concessão, quando assim 
interessou à classe dominante (ALVES, 1980), subscrevemos a 
posição de Costa (2006) quando afirma que os atos políticos 
do sufragismo não podem ser considerados domesticados, 
ainda que bem comportados.
Faz-se premente enfatizarmos uma última precaução 
metodológica encontrada em Foucault (1979) e oportuna ao 
presente artigo. Frequentemente, o poder é percebido como 
negativo, aquele que impede, nega, coíbe. Nessa perspectiva, as 
intervenções higienistas sobre os cidadãos se dariam, portanto, 
apenas de forma repressiva, coercitiva. Esta linha de raciocínio 
encontra respaldo no exercício da incipiente medicina social, 
assegurado “por um conjunto de regulamentos e de instituições 
múltiplas que recebem, no século XVIII, o nome genérico 
de ‘polícia’” (FOUCAULT, 1979, p. 197). Dessa forma, o 
surgimento da polícia, enquanto instituição de controle e 
repressão, não esteve associada apenas às questões criminais, 
mas também aos domínios de salubridade e gestão da higiene 
urbana. Configurava-se, pois, como um agente portador de 
um projeto civilizador. A institucionalização da violência era 
uma ferramenta legítima utilizada pelos agentes sanitários, 
cuja ação sustentava-se nos aparelhos policiais disponibilizados 
pelo Estado. Santos (2005, p. 66) assegura que
[...] no Brasil, a vocação da polícia em 
resolver problemas que não necessariamente 
diziam respeito à esfera da segurança pública 
encontra seus ecos na criação da primeira 
Guarda Real de Polícia, em 1809 no Rio 
de Janeiro. [...] não é de se estranhar que 
a polícia tivesse ligações tão estreitas com a 
195
Higienismo, imprensa 
e educação na 
parahyba do norte: 
o papel da mulher 
e a pedagogização 
dos hábitos
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 187-214,
nov. 2015/ fev. 2016
efetiva implementação de medidas sanitárias, 
sobretudo considerando que muitas vezes 
a população se mostrava refratária ao 
autoritarismo que envolvia projetos como a 
higienização do espaço público e a vacinação 
obrigatória. Portanto, enxergava-se na 
polícia a própria materialização do braço 
executor das políticas de Estado6.
Deve-se, entretanto, atentar para o aspecto positivo do 
poder, extraindo do termo qualquer juízo de valor moral para 
considerá-lo como uma “tecnologia” empregada com intuito 
de obter determinado objetivo (FOUCAULT, 1979). Ora, o 
poder também produz sujeitos, fabrica corpos dóceis, induz 
comportamentos. O indivíduo é, pois, produtor e produto de 
um saber-poder, visto que “para exercer-se nestes mecanismos 
sutis, o poder é obrigado a formar, organizar e por em circulação 
um saber, ou melhor, aparelhos de saber” (FOUCAULT, 
1979, p. 186). Por conseguinte, além da “polícia higiênica”, 
o século XVIII viu emergir um saber médico que prescrevia 
a uma população formulações gerais de como se comportar, 
alimentar-se, vestir-se, relacionar-se sexualmente.
3. RECORTES DE UMA PARAHYBA ASSEADA
Silva (2006) descreve com maestria o conflito entre e 
o novo e o velho no estado da Parahyba do Norte. Ao final 
da primeira década do século XX, o estado ainda resistia em 
assimilar as ideias de urbanidade e progresso. A higienização 
das cidades, estratégia do Estado Moderno, “esbarrava, 
frequentemente, nos hábitos e condutas que repetiam a tradição 
familiar e levariam os indivíduos a não se subordinarem 
aos objetivos do governo” (SILVA, 2006, p. 86). Campina 
Grande, por exemplo, um forte pólo econômico do estado, 
experimentava intensos indicadores de insalubridade: dejetos 
6 Como exemplo de atuação intransigente do poder público para fazer valer as 
medidas sanitaristas, citamos a Revolta da Vacina (1904). Ver: SEVCENKO, 
Nicolau. A revolta da vacina. Companhia das Letras: São Paulo, 2010. 
196
 Charliton José dos S. Machado 
Larissa Meira de Vasconcelos
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.187-214 ,
nov. 2015/ fev. 2016
espalhados pelas ruas e porcos que andavam livremente pela 
cidade intensificavam os maus odores (SOARES JÚNIOR, 
2011). Em 1907, no entanto, era inaugurada a estrada de 
ferro do município, permitindo a entrada de novos padrões de 
comportamento, da modernidade e, sobretudo, de um visitante 
indesejado: a peste bubônica7. Na capital da Parahyba, nos 
primeiros anosdo século XX, segundo Farias (2010, p.116): 
[...] as residências ainda não recebiam 
a conduta de postura urbana e eram 
construídas ao gosto e vontade do 
proprietário. A cidade enchia-se de becos 
e vielas onde se acumulavam monturos de 
lixos, animais mortos e detritos, o esgoto 
corria a céu aberto, no leito da rua crescia 
o capim e os sulcos provocados pelas águas 
pluviais.
Todavia, à medida que o Estado se desenvolvia, 
aumentava a demanda por uma política sanitária, sobretudo, 
após o registro de casos de varíola e gripe espanhola8, além dos 
alarmantes casos da peste bubônica. Diante desse contexto, 
cogitou-se implantar a educação higienista urgentemente. 
Neste cenário de transformações urbanas, é possível destacar 
os jornais como interessantes manuais pedagógicos para a 
população (SOARES JÚNIOR, 2011). Ressaltamos que, 
para analisar as fontes, dialogamos com a Nova História 
7 “A peste bubônica, chamada simplesmente de peste, é uma doença 
pulmonar ou septicêmica, infectocontagiosa, provocada por Bacillus 
pestis, que é transmitido ao homem pela pulga do rato. A pandemia 
mais conhecida da doença ocorreu no fim da Idade Média, ficando 
conhecida como Peste Negra, quando dizimou grande parte da 
população europeia. Os infectados com a doença apresentam febre 
alta, delírio, dores pelo corpo e finalmente, os bubões”. Ver: LE GOFF, 
Jaques. As doenças tem história. Tradução de Laurinda Bom. Lisboa: 
Terramar, 1985.
8 Entre 1912 e 1924, uma série de epidemias amedrontaram a população 
paraibana: a peste bubônica em 1912; a varíola em 1913, 1917, 1921 e 1924; 
e a gripe espanhola em 1918. Ver: Soares Junior, 2011.
197
Higienismo, imprensa 
e educação na 
parahyba do norte: 
o papel da mulher 
e a pedagogização 
dos hábitos
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 187-214,
nov. 2015/ fev. 2016
Cultural, a qual propõe repensar os conceitos de leitura e de 
assimilação dos discursos construídos (OLIVEIRA, 2012). 
Trata-se, pois, de problematizar as formas de ler e os modos 
de arquitetar uma Parahyba saudável e educada. Os periódicos 
já foram considerados fontes suspeitas, sem credibilidade, 
por possuírem caráter passional e tendencioso. No entanto, 
conforme assegura Vieira (2007, p. 16),
[...] a tendenciosidade do veículo, 
evidentemente, não justifica a recusa dessa 
como fonte de pesquisa, uma vez que não 
partilhamos da crença de que existem 
documentos fidedignos, capazes de expressar 
objetivamente a realidade. Consideramos 
como ponto de partida que os documentos, 
as fontes, os vestígios do passado expressam 
pontos de vista daqueles que o produziram 
e/ou preservaram.
Os jornais apresentam-se, portanto, como um rico e 
fascinante universo simbólico (LUCA, 2006), por meio dos 
quais é possível desvendar determinadas facetas socioculturais, 
fornecendo, desta forma, elementos para a construção 
da história da educação. Tendo em vista que o fenômeno 
educacional não se limita à escola, mas se encontra difundido 
na sociedade, consideramos como dotados de um viés 
educativo impressos que não se direcionam estritamente ao 
público escolar ou que abordem matérias relativas ao campo da 
educação especificamente. De uma forma geral, os periódicos, 
tal como os estabelecimentos educacionais, contribuem para 
a modelação de sujeitos. Assim sendo, além dos dispositivos 
situados na transmissão de conhecimentos formais, destacamos 
o jornal como ferramenta à conformação de hábitos e valores 
comportamentais. Não obstante os periódicos serem destinados 
a um grupo minoritário de paraibanos – indivíduos letrados 
que tiveram acesso à instrução em escolas ou no interior das 
casas, como acontecia com muitas mulheres – isso não significa 
que o conteúdo dos jornais ficava circunscrito a pouquíssimas 
pessoas. Segundo Conceição, (2001, p. 16), 
198
 Charliton José dos S. Machado 
Larissa Meira de Vasconcelos
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.187-214 ,
nov. 2015/ fev. 2016
Por se caracterizarem como periódicos de 
produção diária, ao serem descartados para 
outros usos, como para embrulhar objetos, 
passavam pelas mãos de diversas pessoas, 
despertando interesse e sendo lidos de 
diversas maneiras: pelas imagens, pelos 
comentários de um leitor ou pela leitura 
em voz alta de um conhecido ou membro 
da família alfabetizado. Assim, os textos 
podiam ser aprendidos, compreendidos e 
manipulados de acordo com as situações de 
leitura, as aptidões e expectativas dos leitores.
Por conseguinte, as páginas dos jornais são entendidas 
como documentos que dão suporte e sentido às práticas sociais 
e que, por sua vez, contribuem no combate à difusão das 
doenças e de seus agentes e parasitas, como insetos, baratas, 
ratos e pulgas. Atentemos para as figuras abaixo:
1) Informe Publicitário do Inseticida Flit. Fonte: A UNIÃO, Parahyba do 
Norte, p. 7, n. 103, ano XXVII, mai. 1919.
199
Higienismo, imprensa 
e educação na 
parahyba do norte: 
o papel da mulher 
e a pedagogização 
dos hábitos
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 187-214,
nov. 2015/ fev. 2016
2) Informe Publicitário do inseticida Flit. A UNIÃO, Parahyba do Norte, p. 7, n. 
104, ano XXVII, mai. 1919.
Trata-se de dois informes publicitários de um mesmo 
produto, o inseticida Flit, acompanhados do pequeno texto 
transcrito abaixo:
Sabe-se hoje que os insetos são os maiores 
transmissores de moléstias. Elles se criam 
no monturo e dahi invadem os lares, 
transportando os germens de doenças muitas 
vezes mortaes. Mate-os antes que elles o 
matem. Pulverize Flit. Flit mata moscas, 
mosquitos, pulgas, formigas, traças, ratos, 
percevejos, baratas e seus ovos. É fatal aos 
insetos, mas inoffensivo ao gênero humano. 
De uso fácil. Não mancha. Não confunda o 
Flit com outros inseticidas 9.
A partir desses dois recortes, é possível perceber que 
a divulgação das informações visava prevenir o contágio da 
doença. Os informes publicitários além de objetivarem a venda 
de mercadorias, educavam e informavam, pois, através do seu 
caráter repetitivo, permitiam maior facilidade de memorizar 
a mensagem (MATOS, 2010). Por se tratar de enfermidades 
contagiosas, os primeiros cuidados eram destinados ao corpo 
que deveria ser protegido e resguardado de todo contato com 
9 Optamos por manter a escrita original dos textos.
200
 Charliton José dos S. Machado 
Larissa Meira de Vasconcelos
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.187-214 ,
nov. 2015/ fev. 2016
lugares e objetos suspeitos de infecção. Por meio do asseio 
doméstico, combater-se-ia diretamente a propagação da 
moléstia e de seus agentes como os insetos, parasitas, pulgas 
e os ratos. Mas, conforme assevera Soares Júnior (2012), a 
emergência de um saber médico-higienista normalizante não 
era acompanhada pela quantidade de médicos disponíveis. 
Embora, as etapas profiláticas devessem ser vigiadas por 
profissionais, 
[...] a quantidade de médicos que existia 
na capital paraibana ainda era insuficiente 
para a população da época. Durante a 
década de 1920, João Pessoa dispunha de 
aproximadamente trinta profissionais que 
se dividiam nas funções de dirigir, clinicar e 
operar nos hospitais, controlar o saneamento 
e higiene do porto e da cidade, medicar nas 
casas e curar os corpos (SOARES JÚNIOR, 
2012, p. 10).
Como ainda era reduzido o numero de médicos 
sanitaristas, e os que existiam estavam centralizados na 
capital, deixando as repartições de higiene das outras cidades 
em estado de abandono10, compreende-se a importância 
atribuída à mulher como pedagoga do lar, aquela que recebeu 
a função política de educar os filhos e conservar a família sobre 
parâmetros higienistas (OLIVEIRA, 2002). A “salvação do 
povo” era mais do que um dever do Estado, era um dever da 
mulher. Durante a primeira república, as tarefas domésticas 
cotidianasde cozinhar, lavar, limpar e passar eram atribuídas 
apenas às mulheres. Portanto, no discurso médico-sanitarista, 
a nova mulher, colonizada pela higiene, estava apta a assumir 
o destino da família, a unidade mais elementar da pátria, e 
transformar os filhos em heróicos cidadãos. Neste período, 
intensificou-se, no Brasil, uma literatura sobre a puericultura 
10 Segundo Soares Júnior (2011), a atuação do Serviço Público de Higiene do 
Estado da Paraíba era ineficiente, fazendo-se presente apenas por meio de 
discursos, nas edições dos jornais, lançando informes com medidas possíveis 
de evitar a proliferação da doença.
201
Higienismo, imprensa 
e educação na 
parahyba do norte: 
o papel da mulher 
e a pedagogização 
dos hábitos
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 187-214,
nov. 2015/ fev. 2016
e, conforme os excertos relacionados abaixo, a saúde das 
crianças é cada vez mais alvo de controle: 
Para as mães: febre de sêde
Ha muito vem se observando que a febre 
na infância é muito freqüente mormente 
no lactente, cuja causa é sempre a pouca 
resistência orgânica contra as infecções, 
por mais banaes que sejam. O que as mães 
devem evitar de um modo assas enérgico, 
é no que diz respeito a febre de sede. 
Quando o lactente se apresentar febril, cuja 
causa seja desconhecida, procure semrpe 
saber se o mesmo tem ingerido liquido 
sufficiente para hydratar os tecidos. As 
dessordens provocadas pela sede são: perda 
de peso, agitação, febre, pallidez, pyuria por 
deshydratação, albuminuria, convulsões etc. 
O liquido mais aconselhável para o lactente 
é o sôro de Ringer, não só pelo seu sabor 
agradável, quando adoçado com sacharina, 
como pela sua atuação therapeutica. Seu 
fabrico é muito fácil, podendo mesmo ser 
confeccionado na própria casa de família 
sem nenhum incoveniente. Esse líquido, 
assim preparado, poderá ser mesmo dado 
em mamadeiras e servir muito bem para 
uma dieta hydrica no caso de perturbações 
gastro-intestinais. Na falta do sôro de 
Ringer, poderá substitui-lo o soro de leite, 
que gosa da mesma acção alimentar e acção 
terapêutica mais ou menos idêntica. Em 
caso de emergência, é a mucilagem de arroz 
indicada do mesmo modo, comtanto que 
saiba prepara-la de fórma a não prejudicar o 
estado de nutrição do paciente. 
Dr. João Soares 
3) A UNIÃO, Parahyba do Norte, p. 3, n. 
205, ano XXXVIII, ago. 1931
202
 Charliton José dos S. Machado 
Larissa Meira de Vasconcelos
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.187-214 ,
nov. 2015/ fev. 2016
Para as mães: alimentação artificial
Nem toda mãe de família conhece o perigo 
a que expõe o seu filhinho, quando de tenra 
edade alimenta-o de leite de vacca ou outro 
qualquer que não seja o leite materno. Na maior 
parte, o perigo não está no alimento e sim na 
quantidade e modo de emprega-lo. Quando 
não for possível amamentar ao recemnascido, 
que pelo menos faça uma alimentação mista. 
Dr. João Soares 
4) A UNIÃO, Parahyba do Norte, p. 3, n. 
143, ano XXXVIII, jul. 1931
Para as mães: Acabemos com os apertos de 
mãos
É fóra de dúvida que tem toda razão os 
sanitaristas condemnando o clássico “beijo”, 
como cerimonioso “aperto de mão”. E não 
somente estas, como muitas outras práticas 
encontradas francamente em os nossos 
costume, e quase todas factoras do mal. É 
preciso fazer-se bem conhecido o valor do 
contagio directo, ou seja, de individuo a 
individuo, da transmissão de innúmeras 
doenças, para não se contestar o perigo a 
que estamos expostos com as pragmáticas da 
nossa tão apregoada civilização. Tão perigoso 
é “beijo” como o “aperto de mão”, como 
portadores de infecções! A higiene ahi está 
para cabalmente demonstrá-lo. E quantas 
moléstias são contrahídas sem disto nos 
apercebermos, com um simples beijo – mais 
perigoso do que o beijo de Judas – e com 
um attencioso e cortez aperto de mão?! Não 
nos esqueçamos que a “saúde é a primeira 
condição de felicidade.” A Higiene evita o 
mal. Para evitar o perigo é preciso conhece-
lo. Conhecer o mal é saber-lhe as causas e os 
effeitos, ou por experiência própria, ou por 
observação do alheio. 
Dr. Flávio Marojá
203
Higienismo, imprensa 
e educação na 
parahyba do norte: 
o papel da mulher 
e a pedagogização 
dos hábitos
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 187-214,
nov. 2015/ fev. 2016
5)A UNIÃO, Parahyba do Norte, p. 3, n. 
298, ano XXXVIII, out. 1931
Estes diferentes trechos citados acima são excertos de 
uma coluna semanal intitulada “Para as Mães” que, por sua 
vez, era assinada por médicos e possuía lugar privilegiado nas 
páginas do Jornal A União, órgão impresso oficial do Estado da 
Paraíba. Conforme atesta Freire (2006, p. 13), diferentemente 
da pediatria, que tem por objetivo intervir apenas sobre o corpo 
doente da criança, a puericultura é um ramo da medicina que 
“propõe transformar, crenças, valores, costumes e atitudes”. 
Trata-se, portanto, de uma transformação de ordem cultural. 
Nesse ambiente, saturado pelo higienismo, costumes ou 
hábitos até então considerados inofensivos são redefinidos 
em novas bases científicas. Os atos de civilidade e carinho - 
“apertar as mãos” ou “beijar” - são reconfigurados como vilões, 
portadores de moléstias. Cabia às mães, pois, serem vigilantes 
e sempre diligentes no dever de educar seus filhos. 
No entanto, foi no campo da alimentação infantil que 
se tornou mais concreta a parceria entre mulheres e médicos 
(FREIRE, 2006). Estes, ancorados na legitimidade do saber 
médico, possuíam espaço privilegiado nos jornais para 
divulgar as propostas de alimentação racional. Conforme 
ressalta Freire (2006), a aspiração de um projeto civilizador 
para a incipiente República rejeitava os costumes identificados 
com o passado vergonhoso e obsoleto. O repúdio às tradições 
refletiu na negação de uma personagem muito comum em 
um passado escravagista recente: as amas-de-leite. A imagem 
da mulher construída na “República ideal” é aquela que, 
além de gerar filhos saudáveis, acompanha atenciosamente 
o desenvolvimento destes, amamentando-os com o fim 
de contribuir decisivamente para a evolução física, moral e 
intelectual dos futuros cidadãos. Ora, as amas-de-leite, escravas 
recém-libertas, quando não continuavam trabalhando na casa 
senhorial, abrigavam-se em cortiços, convertendo-se em focos 
de contágio físico e moral. Segundo Freire (2006, p. 48),
204
 Charliton José dos S. Machado 
Larissa Meira de Vasconcelos
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.187-214 ,
nov. 2015/ fev. 2016
Tal conexão entre o contágio e os cortiços – 
os pobres e os criados – levaria à necessidade 
de reformulação dos critérios de ordem e 
controle, alçados a uma dimensão pública, 
exigindo intervenção governamental. Assim, 
uma das respostas da Higiene ao “fantasma” 
da doença seria a condenação às amas-pretas, 
na tentativa de recondução das mulheres à 
prática da amamentação. Esses esforços 
se concretizariam através da redefinição 
da maternidade em bases científicas, 
conferindo-lhe valorização inédita – o que 
ia ao encontro de interesses de mulheres das 
classes média e alta urbanas e dos anseios 
republicanos de superação dos traços 
remanescentes da cultura colonial11.
É preciso ressaltar que neste contexto, ao perceber o 
potencial das novas demandas, os informes publicitários, 
presentes nos jornais paraibanos, intensificaram o discurso 
médico-científico. Com o intuito de vender produtos, apelavam 
para o papel da mãe zelosa, ciente de suas responsabilidades na 
proteção de seus filhos, assentando, dessa forma, o mercado 
de produtos variados destinados à nutrição infantil, oferecidos 
como uma opção saudável para a mulher que, por algum 
motivo, não conseguisse amamentar.
11 “A maternidade científica – na sua dimensão relacionada ao aleitamento materno 
– possivelmente permaneceumais como um discurso do que como prática 
efetiva na sociedade brasileira urbana dos primeiros anos da República, quando 
as amas-pretas desfrutavam de posição privilegiada no ambiente familiar, dando 
lugar posteriormente às “amas secas”, embriões das babás até ainda hoje presentes 
nas famílias das classes mais elevadas” (FREIRE, 2006, p. 49).
205
Higienismo, imprensa 
e educação na 
parahyba do norte: 
o papel da mulher 
e a pedagogização 
dos hábitos
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p. 187-214,
nov. 2015/ fev. 2016
6) Informe Publicitário de Emulsão Scott. Fonte: A UNIÃO, Parahyba do 
Norte, p. 6, n. 186, ano XXXVII, jul. 1930.
O conteúdo dos textos veiculados no jornal A União, 
citados acima, bem como a discussão empreendida por Freire 
(2006) remetem-nos a análise feita por Viviani (2007) sobre 
“O livro das mamães”12, dos autores Almeida Jr. e Mário 
Mursa, obra que alcançou grande êxito editorial ente as 
décadas de 1920 e 1930, no Brasil. Segundo Viviani, essa 
foi uma das primeiras produções em terras brasileiras que 
se dedicavam, exclusivamente, a discutir puericultura. Entre 
outros aspectos analisados da obra, sobre os quais não nos 
cabe detalhar neste texto, ressaltamos a afirmação da referida 
pesquisadora quando destaca que o livro em foco apresenta 
uma relação de tarefas a serem desempenhadas pelas mães 
com o objetivo de promover o “bom desenvolvimento da 
criança na primeira infância” (VIVIANI, 2007, p.182). No 
12 A primeira edição, intitulada Noções de Puericultura – para as mães e para 
as escolas, é de 1927, publicada pelo Instituto D. Anna Rosa; a 2ª e a 3ª são, 
respectivamente, de 1933 e 1938, publicadas pela Editora Nacional, e como 
toda publicação dessa editora apresentava-se como subsidiária do “progresso do 
Estado e do País, promovendo a educação dos leitores e tornando disponível 
a eles a cultura dita universal, ou seja, aquela corrente nos países considerados 
desenvolvidos (VIVIANI, 2007, p.172)
206
 Charliton José dos S. Machado 
Larissa Meira de Vasconcelos
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.187-214 ,
nov. 2015/ fev. 2016
rol das funções maternas incluíam-se: “[...] alimentação, o 
asseio da criança e de seu ambiente, o acompanhamento de 
seu crescimento e desenvolvimento físico e psíquico, na saúde 
e na doença, e ainda a educação, e disciplina do lactente [...]”. 
Outros aspectos apontados pela autora como merecedores de 
atenção na análise da obra dirigida às mães, e que consideramos 
pertinentes aproximá-los de nosso estudo, referem-se a 
considerar as prescrições referentes aos deveres das mães que 
se coadunam com os atributos “naturalmente” desejados 
e os espaços sociais reservados às mulheres, considerando-
se também seu pertencimento a uma classe social detentora 
de condições sociais de acesso a livros e jornais, brancas, 
escolarizadas e com poder de compra, afinando-se com um dos 
perfis de feminilidade e maternidade em circulação nas décadas 
inicias do século XX.13 Arrematando esse diálogo com Viviani 
(2007), transcrevemos um trecho em que a autora destaca 
que as obras produzidas à época em questão eram oriundas de 
um grupo de “liberais reformadores, envolvidos em um bem 
sucedido projeto de formação da identidade cultural do país.” 
Por essa perspectiva, e concordando-se com o pensamento de 
Scott de que “gênero é um campo por meio do qual o poder 
é articulado”, Viviani (2007, p. 173) procurou “elucidar os 
caminhos pelos quais esse grupo atuou no campo das relações 
de gênero para construir e legitimar sua posição privilegiada”.
Todavia, não se trata de apresentar uma hegemonia 
do saber-médico incidindo verticalmente sobre mulheres 
inertes. Pelo contrário, de acordo com Freire (2006), os 
arranjos históricos não podem ser estudados apenas como 
uma imposição unilateral, mas compreendidos como 
fruto de uma atuação dinâmica entre múltiplos interesses 
sociais. Embora a maternidade científica reforçasse uma 
suposta essência feminina, ratificando o papel da mãe como 
“Rainha do Lar”, grupos feministas organizados, como por 
13 Viviani (2007, p. 173) refere-se especificamente à década de 1930; consideramos 
pertinente estender a outras décadas da primeira metade do século XX.
exemplo, a Associação Paraibana pelo Progresso Feminino14, 
enxergava na adesão aos preceitos científicos um caminho 
conveniente na tentativa de alcançar uma transformação no 
seu lugar na sociedade, sobretudo, um caminho pertinente 
para fortalecer uma das principais reivindicações da época: 
a educação igualitária, entendida como um passaporte 
para diminuir as desigualdades políticas entre os gêneros. 
Trata-se de uma tática ou astúcia “pela qual, ao reforçarem 
as diferenças de gênero, as mulheres buscavam, justamente, 
alcançar a equidade; extraíam de sua aparente fraqueza, a sua 
força” (FREIRE, 2006, p. 312). De fato, a partir dos anos 
de 193015, as mulheres conquistaram o direito ao voto. Este 
acontecimento, por sua vez, não traria apenas um novo papel 
a ser exercido pelas mulheres, de eleitora ou elegível, mas a 
possibilidade de uma nova existência, não mais vinculada, 
apenas, ao mundo privado. Conforme descreve Oliveira 
(2002), a emancipação feminina era considerada insalubre ao 
corpo saudável da Pátria. As imagens das mulheres que fugiam 
dos padrões considerados normais – mãe, esposa, dona-de-
casa – eram eminentemente atreladas ao caos, à negatividade, 
à destruição do mundo. Negar a maternidade era, sobretudo, 
negar a natureza. Portanto, é compreensível o tom moderado 
das feministas, no qual, malgrado reproduzissem o discurso da 
maternidade como uma unidade moral do lar, recuperavam a 
imagem da mulher enquanto um sujeito ativo. 
14 Presidida pela Dra. Lilia Guedes, a Associação Paraibana pelo Progresso 
Feminino (APPF), fundada em fevereiro de 1933, reuniu um elenco 
significativo de educadoras, médicas e advogadas (Olivina Carneiro da Cunha, 
Analice Caldas, Albertina Correia Lima, Alice Azevedo Monteiro, Francisca 
Ascensão Cunha, Juanita Machado) e refletiu o engajamento de parte das 
mulheres paraibanas elitizadas na luta pelos direitos políticos. Ver mais em: 
FRAGOSO, 2011. 
15 Por meio do decreto 21.076, de 1932, o sufrágio universal foi estabelecido, 
incorporando-se, posteriormente, à Constituição de 1934.
208
 Charliton José dos S. Machado 
Larissa Meira de Vasconcelos
Educ. Foco,
Juiz de Fora,
v. 20, n. 3, p.187-214 ,
nov. 2015/ fev. 2016
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste artigo, pudemos compreender de que modo o 
pensamento higienista, na Parahyba da Primeira República, 
conferiu à mulher o papel de pedagoga da pátria, aquela que 
trabalharia em prol da edificação da cidade limpa e saneada, 
um discurso médico sustentado por meio da ideia de que a 
limpeza e higiene domésticas produziriam disciplina, boa 
moral e ausência de vícios. Educar, neste contexto, não 
poderia ser caracterizado apenas como sinônimo de instrução, 
na medida em que também era zelar pelo íntimo do outro, era 
evitar e, quando necessário, corrigir desvios não apenas físicos, 
mas morais encontrados na criança; era imprimir disciplina 
no indivíduo, boas maneiras de se comportar, de sentir, de 
cuidar de si.
No momento histórico em que a construção de uma 
nacionalidade adquiria papel central, a emergência da 
puericultura e da consolidação da maternidade científica 
forneceu ânimo argumentativo tanto para os médicos quanto 
para o movimento feminista. Numa análise historiográfica 
que foge da oposição binária submissão/opressão e com 
intuito de não reduzir o debate a uma bipolarização de 
imagens ou enfoques teóricos cartesianos, acreditamos que 
tanto os profissionais dedicados à higiene infantil enxergavam 
na valorização da maternidade um caminho para obterem 
reconhecimento e prestígio, quanto, para as mulheres, tal 
perspectiva representava

Mais conteúdos dessa disciplina