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1 1. INTRODUÇÃO A doença de Alzheimer, também conhecida como demência senil do tipo Alzheimer, é uma doença neurodegenerativa que afeta estruturas cerebrais do sistema límbico. Apesar de ainda não haver cura definitiva para a doença, há tratamentos químicos e não-químicos que, aliados à um diagnóstico precoce, podem retardar seu agravamento e trazer uma melhora na qualidade de vida do indivíduo acometido. Com o aumento da expectativa de vida surgiram doenças que estão relacionadas com o processo de envelhecimento, e a doença de Alzheimer é a forma mais conhecida de demência (termo genérico para o declínio na habilidade mental, severo o suficiente para interferir nas atividades diárias). A doença acomete principalmente pessoas idosas – a partir dos 65 anos – embora já tenha sido detectada em pessoas mais jovens. A doença, ou Mal de Alzheimer, foi assim batizada pelo neurocientista alemão Alois Alzheimer. É um tipo de demência que afeta as funções do sistema nervoso prejudicando as capacidades cognitivas bem como as habilidades de organização e planejamento. Ao progredir, a doença passa a afetar uma área maior do cérebro, causando atrofia cerebral grave. Os familiares precisam ter cuidados redobrados com o idoso, que pode se perder nas ruas e ele também passa a necessitar de ajuda para comer, tomar banho, além de outras tarefas cotidianas. Este trabalho pretende explanar sobre as descobertas científicas realizadas até esse momento na busca de compreensão sobre essa enfermidade, seu diagnóstico e etiologia, bem como as formas de tratamento até então conhecidas. É muito importante também nos atermos à parte neuropsicológica no caso da doença de Alzheimer. No decorrer deste trabalho serão elucidados os aspectos neuropsicológicos e aspectos psicossociais. 2 2. ASPECTOS MÉDICOS: doença de Alzheimer 2.1 Conceito Conforme relatado pela Associação Brasileira de Alzheimer - ABRAz (2014d), em 1906, o médico Alois Alzheimer fez registros sobre essa doença, a partir de estudos e observações do caso da sua paciente Auguste Deter, uma mulher saudável que, aos 51 anos, desenvolveu um quadro de perda progressiva de memória, desorientação, distúrbio de linguagem (com dificuldade para compreender e se expressar), tornando-se incapaz de cuidar de si mesma. Após o falecimento de Auguste, aos 55 anos, o Dr. Alzheimer examinou seu cérebro e descreveu as alterações que hoje são conhecidas como características fisiológicas da doença. De acordo com a Associação Brasileira de Alzheimer - ABRAz (2014c), há uma piora progressiva dos sintomas, que se dá em três fases: leve, moderada e grave. Na fase leve ou inicial, podem ocorrer alterações como perda de memória recente, dificuldade para encontrar palavras, desorientação no tempo e no espaço, dificuldade para tomar decisões, perda de iniciativa e de motivação, sinais de depressão, agressividade, diminuição do interesse por atividades e passatempos. Os sintomas nesta fase não se diferenciam muito do processo normal de envelhecimento humano. Já na fase moderada, as dificuldades mais evidentes são esquecimento de fatos e pessoas mais importantes, incapacidade de viver sozinho ou de cuidar da casa, necessidade de ajuda com a higiene pessoal, maior dificuldade para falar e ser entendido, apresenta alterações de comportamento (agressividade, irritabilidade, inquietação, desconfiança, ciúmes) e alucinações (ver pessoas, ouvir vozes de pessoas que não estão presentes). Na fase grave, observa-se prejuízo gravíssimo da memória, dificuldade para alimentar-se e na deglutição, dificuldade de entender o que se passa a sua volta e de orientar-se dentro de casa. Pode apresentar incontinência urinária e fecal, além de dificuldade de locomoção, sendo necessário auxílio para caminhar. Posteriormente, o paciente pode necessitar de cadeira de rodas ou ficar acamado. 2.2 Etiologia 3 Um fator de risco para a doença é a idade e, segundo Rubin et al. (2013, p.1223), células não replicativas, como as cerebrais e as cardíacas, sofrem atrofia celular. O tamanho de todos os órgãos parenquimatosos do corpo humano diminui com o envelhecimento, assim como o cérebro e o coração. Essa diminuição se agrava com a doença de Alzheimer. Conforme Kumar, Abbas e Aster (2013) explicam o processo de evolução fisiológica da doença, o maior problema do Alzheimer é a acumulação de proteínas anormais chamadas de placas senis de beta-amiloide(Aβ) que afetam os neurônios corticais cerebrais, causando os danos neuronais. O peptídeo Aβ aparece quando a proteína precursora de amilóíde (PPA) é crivada ou atravessada pelas enzimas β-secretase e γ-secretase. A PPA também pode ser clivada pela α-secretase e γ-secretase que liberam um peptídeo não patogênico. Rubin et al. (2013, p.1215) conta que o peptídeo Aβ é derivado da PPA ou AβPP por uma série de etapas proteolíticas, que são as clivagens catalisadas pela enzima β- secretase que corta a extremidade aminoterminal e a enzima γ-secretase que corta a extremidade carboxiterminal da proteína Aβ. O gene para AβPP localizado no cromossomo 21 é um fator de risco, o que explica porque pacientes com Sindrome de Down (trissomia do 21) apresentam a doença de Alzheimer até os 35 anos de idade. De acordo com Kumar, Abbas e Aster (2013), existem outros fatores de risco que aumentam a frequência de criação do peptídeo Aβ que são as mutações na PPA, as mutações nos componentes da γ-secretase (mutação no cromossomo 14, presenilina 1 e a mutação no cromossomo 1, presenilina 2) e também uma mutação na variante da apolipoproteína E (ApoE4) do cromossomo 19. Algumas pequenas placas senis, além de alterar a neurotransmissão e ser tóxico para os neurônios, também levam a hiperfosforilação da proteína tau responsável pela ligação ao microtubulo neuronal, fazendo com que a proteína tau seja redistribuida na célula, agregando-se em emaranhados e causando interrupção do transporte axonal. Assim, o neurônio é 4 afetado externamente pelas placas senis e internamente pelos emaranhados neurofibrilares de filamentos da proteína tau. Figura 1 - Processo de formação das placas senis e emaranhados neurofibrilares Fonte: Robbins: Patologia Básica (2013) Também, de acordo com Kumar, Abbas e Aster (2013), alterações patológicas como placas senis, emaranhados e perda neuronal associada e a reação glial são primeiramente constatadas no cortex entorrinal, depois na formação hipocampal e no isocórtex e finalmente no neocórtex. Rubin et al. (2013) fala sobre uma pesquisa sobre o comportamento de camundongos transgênicos com genes mutantes para PPA humano, e que eles desenvolvem lesões no cérebro semelhantes as lesões da doença de Alzheimer em seres humanos, mas que os camundongos não apresentam manifestações críticas como os emaranhados e as evidências de neurodegeneração. 5 Figura 2: Comparação entre um neurônio normal e um neurônio com Doença de Alzheimer. Fonte: Fisiologia Médica de Ganong (2014) 2.3 Prevalência A doença de Alzheimer é o tipo de demência senil mais comum, e, segundo Ganong et al. (2014), essa doença é responsável por 50 a 60% dos casos. Sobre a prevalência da doença, Kumar, Abbas e Aster discorrem sobre o assunto da seguinte forma: A idade é um fator de risco importante para a doença de Alzheimer; a incidência é em torno de 3% nas pessoas de 65-74 anos de idade, 19% nas pessoas de 75-84 anos de idade e 47% nas pessoas com mais de 84 anos de idade. A maioria dos casos de doença de Alzheimer é esporádica, mas pelo menos 5-10% são familiares. Os casos esporádicos raramente se apresentam antes dos 50 anos de idade, mas o inicio precoce é observadocom algumas formas herdadas (Kumar; Abbas; Aster, 2013, p.837). 6 Resultados estatísticos publicados pela Associação Brasileira de Alzheimer - ABRAz (2014c) indica a existência de cerca de 35,6 milhões de pessoas com a Doença de Alzheimer no mundo. No Brasil, há cerca de 1,2 milhão de casos, a maior parte deles ainda sem diagnóstico. Estudos recentes divulgados pelo IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (2017) demonstram o aumento da expectativa de vida da população brasileira e o consequente aumento do número de acometidos. 2.4 Diagnóstico Essa é a área que mais concentra estudos sobre a doença hoje em dia. Apesar de ter sido detectado há mais de 100 anos, o Mal de Alzheimer ainda não tem um diagnóstico preciso, sendo atualmente feito basicamente através de avaliação clínica das funções cognitivas e estudo do histórico do paciente. Exames laboratoriais, tais como Tomografia, exame de sangue ou Ressonância Magnética, são feitos no intuito de descartar outras enfermidades. Segundo a Associação Brasileira de Alzheimer - ABRAz (2014b), há uma novidade em termos de pesquisa científica que é a análise de biomarcadores de beta-amiloide e da proteína TAU, mas essa ainda não é indicada para a prática clínica. Há também pesquisas na área da genética que pretendem identificar os genes relacionados ao maior risco de desenvolvimento da doença. 2.5 Tratamento 2.5.1. Tratamento farmacológico Acredita-se que parte dos sintomas decorra de alterações em uma substância presente no cérebro chamada de acetilcolina, que se encontra reduzida em pacientes com a doença. Um modo possível de tratar a doença é utilizar medicações que inibam a degradação dessa substância. 7 O tratamento proposto por Ganong et al. (2014) discorre sobre o uso de inibidores da acetilcolinesterase (p.ex.rivastigmina, donepezil ou galantamina) nos estágios iniciais da doença que aumenta a disponibilidade de acetilcolina na fenda sináptica. Ela retarda o agravamento dos sintomas por até 1 ano e tem mostrado na melhoria da disfunção cognitiva global, mas não na aprendizagem e na deficiência de memória. São receitados antidepressivos como a paroxetina e imipramina para tratar a depressão dos pacientes e um medicamento antagonista do receptor NMDA que evita o dano neuronal por glutamato chamado memantina também é usado no tratamento da doença de Alzheimer moderada ou severa. Existem pesquisas sobre uma vacina e um medicamento, o flurbiprofeno R, que bloqueia a produção da proteína beta- amilóide. 2.5.2. Tratamento não farmacológico Evidências indicam que estimulações cognitivas, sociais e físicas podem beneficiar a manutenção dessas habilidades, Pacientes mais ativos tendem a sentir-se mais seguros com relação às tarefas do dia-a-dia. As intervenções são oferecidas em três áreas: estimulação cognitiva – que consiste no contato social do indivíduo com amigos e parentes; estimulação física – atividades físicas ou fisioterapia, e organização do ambiente – que consiste na organização do ambiente de maneira a recordar as coisas da maneira que sempre foram, mesmo antes da doença, em seu espaço físico, trazendo assim a sensação de ordem e rotina. Segundo a Associação Brasileira de Alzheimer - ABRAz (2014a), não há restrição de um ou mais alimentos que se aplique a todos os pacientes de Alzheimer, mas recomenda-se evitar alimentos ricos em caloria. É também recomendável que a família ou o cuidador controle o horário de refeições, porque, devido ao esquecimento, o paciente esquece que já comeu e o ganho de peso pode gerar riscos para a saúde, 8 com problemas metabólicos e físico, e a ingestão exagerada pode causar problemas digestivos e mal-estar. 3. ASPECTOS NEUROPSICOLÓGICOS 3.1. Neuropsicologia Conforme Gil (2007), a neuropsicologia tem por objeto o estudo dos distúrbios cognitivos e emocionais, bem como o estudo dos distúrbios de personalidade provocados por lesões do cérebro, que é o órgão do pensamento e, portanto, a sede da consciência. Ao receber e interpretar as informações sensoriais, ao comunicar-se com os outros e ao agir no mundo pela linguagem e pela motricidade, forjando sua continuidade e, pela memoria, forjando uma identidade coerente, o cérebro exprime as lesões sofridas em desordens comportamentais. Essa é a razão pela qual a neuropsicologia também é chamada de comportamental. 3.2. Avaliação neuropsicológica: doença de Alzheimer A avaliação neuropsicológica, junto as demais já citadas anteriormente, compõe o diagnóstico da Doença de Alzheimer. Essa avaliação é composta por uma gama de testes psicométricos que visam verificar as funções cognitivas (Hamdan, 2008). Entre os testes que são usados no diagnóstico do Alzheimer, por neurologistas e neuropsicologos, estão: 3.2.1. Mini Exame do Estado Mental (MEEM) 9 Sendo o teste mais utilizado no mundo para o rastreio de demências, o Mini Exame do Estado Mental, desenvolvido por Folstein, e busca avaliar as funções cognitivas. Para isso utiliza-se de perguntas, divididas em cinco sessões (orientação, memória imediata e tardia, cálculo/ memória de trabalho, habilidade visuo-espacial e linguagem), tendo um escore máximo de 30 pontos. (Lourenço, Veras, Ribeiro; 2008). 3.2.2. Teste do desenho do Relógio (TDR) Sendo o segundo teste mais utilizado no mundo para o rastreio de demências, o Teste do desenho do relógio foi desenvolvido no século XX, visando a investigação da presença de comportamento cognitivo de algumas habilidades corticais, tais como funções visuconstrutivas, visuoespaciais, representação simbólica e grafomotora, linguagem auditiva, memória semântica e funções executivas. Assim sendo, diversas habilidades corticais, subcorticais, anteriores, posteriores, direita e esquerda dos hemisférios cerebrais, devem operar simultaneamente para realizar o desenho do relógio. O teste, realizado de maneira rápida e objetiva, consiste na solicitação ao paciente que desenhe um relógio numa folha de papel e em seguida desenhe os ponteiros indicando um determinado horário. 3.2.3. Teste da Torre de Londres (TDL) O teste que visa avaliar o comprometimento cognitivo leve, por meio das habilidades de planejamento, foi desenvolvido em 1982 por Shallice, e revisto posteriormente por outros autores, tais como Krikorian, Bartok e Gay (1994) e Portella et.at. (2003). Sua aplicação consiste no rearranjo de três esferas de forma a alcançar uma configuração específica, com o número mínimo de movimentos necessários para reproduzir o modelo. Para alcançar a solução correta, é preciso visualizar 10 mentalmente a sucessão de passos adequados para que se alcance a solução correta de forma eficiente, sendo que tal processo demanda a atividade dos circuitos pré- frontais. 3.2.4. Escala Funcional de Pfeffer A escala de Pfeffer, composta por 10 itens, evidencia a funcionalidade por meio do grau de independência para realização das atividades instrumentais de vida diária. O escore mínimo é 0 e o máximo é 30. Quanto mais pontos, maior é a dependência do paciente, sendo considerada a presença de prejuízo funcional a partir de um escore de 3. 3.3. Alterações neuropsicológicas 3.3.1. Caracterização do início e curso do problema Um aspecto especialmente relevante é a cronologia do aparecimento dos sintomas: desde o primeiro sintoma percebido, mesmo que retrospectivamente, até os sintomas atuais (MILLER, BOEVE, 2009 apud FROTA, 2016). O modo de início — se os primeiros sintomas foram amnésticos, comportamentais, disexecutivos ou de outra ordem — é também peça importante; assim como a taxa de progressão, se os sintomas são graduais e insidiosos ou rapidamente progressivos. (EMRE, 2009 e MILLER,BOEVE, 2009 apud FROTA, 2016). 3.3.1.1. Declínio e distorções da memória: 11 O hipocampo e outras estruturas do lobo temporal medial são as regiões do cérebro mais precoce e gravemente atingidas na DA. Como o hipocampo é a estrutura cerebral mais diretamente responsável pela memória episódica (memória de longo prazo para eventos), o comprometimento desta é, geralmente, um dos mais precoces sinais da doença. (BUDSON et al 2016 e MILLER, BOEVE, 2009 apud FROTA, 2016). 3.3.1.2. Anomia e outros distúrbios de linguagem Há várias áreas do cérebro envolvidas na tarefa de nomeação, a maioria delas é afetada pela DA, como a porção inferolateral dos lobos temporais (envolvidos na representação das palavras e seus significados) (DAMASIO et al, 1996 apud FROTA, 2016) e os lobos frontais (envolvidos na seleção ou na escolha da palavra específica que está sendo procurada), (BALOTA et al, 1999 apud FROTA, 2016). Em alguns casos, os distúrbios de linguagem são, inicialmente, os únicos sintomas e, quando mantidos os principais sintomas por pelo menos dois anos, pode-se tratar de um quadro de afasia progressiva primária (APP)11. 3.3.1.3. Desorientação Espacial Outra região do cérebro afetada precocemente na DA é o lobo parietal. Ele está envolvido na orientação espacial, empregada em tarefas como andar ou dirigir12. Isso explica em parte por que pacientes com a doença com frequência pegam caminhos errados e ficam perdidos ou confusos. Essas dificuldades acontecem mesmo em trajetos conhecidos, e os pacientes têm grande dificuldade para planejar novas rotas. Familiares começam a perceber que há algo de errado quando o paciente fica perdido em lugares públicos, não consegue achar o caminho para um lugar novo ou quando fica perdido em um restaurante, procurando a mesa onde estava sentado, após ir ao banheiro. Mais tarde, o paciente fica perdido mesmo em locais conhecidos5. Pacientes com demência frontotemporal (DFT), por sua vez, têm suas habilidades 12 espaciais mais preservadas, proporcionando um forte contraste com as deficiências espaciais típicas da DA e de outras formas de demência com comprometimento encefálico mais posterior. (BUDSON 2016, MILLER, BOEVE 2009 e TEIXEIRA, CARAMELLI, 2011 apud FROTA, 2016) 3.3.1.4. Disfunção Executiva Os lobos frontais, especificamente o córtex pré-frontal, são envolvidos em vários aspectos do funcionamento cerebral, incluindo solução de problemas, abstração, raciocínio e julgamento. Essas habilidades cognitivas são, em conjunto, chamadas de funções executivas (BUDSON 2016, MILLER, BOEVE 2009, TEIXEIRA, CARAMELLI, 2011 e BALOTA, 1999 apud FROTA, 2016). Os lobos frontais são também críticos para a atenção, a concentração e a memória operacional — a habilidade de manter e manipular temporariamente informações. 3.3.1.5 Mudanças no comportamento Além de raciocínio, julgamento e atenção, os lobos frontais, assim como a amígdala, estão envolvidos no controle do comportamento, bem como de personalidade e afeto (BUDSON, 2016, e TEIXEIRA, CARAMELLI, 2011 apud FROTA, 2016). Na DA e na DFT, particularmente sua variante comportamental, as alterações de comportamento são muito comuns. Mais de 80% dos indivíduos diagnosticados com DA apresentam mudanças no comportamento e afeto em algum estágio da doença (BUDSON, 2016 apud FROTA, 2016). Muitas vezes essas mudanças aparecem de forma precoce e evoluem progressivamente. Apesar de se manifestarem de diferentes formas, a apatia é a alteração comportamental mais comum no início da doença, seguida pela irritabilidade (BUDSON 2016, MILLER, BOEVE 2009 e TEIXEIRA, CARAMELLI, 2011 apud FROTA, 2016). Com a progressão, muitos pacientes mostram uma exacerbação das características de suas personalidades prévias. Uma pessoa que sempre foi 13 competitiva pode se tornar agressiva, enquanto uma pessoa que sempre foi tímida pode parar de conversar totalmente. (BUDSON, 2016 e TEIXEIRA, CARAMELLI, 2011 apud FROTA, 2016). 3.3.1.6. Humor Transtornos do humor, principalmente depressão e ansiedade são extremamente comuns nos primeiros estágios da DA15. Esses sintomas são compreensíveis quando o paciente percebe que está com perda de memória ou tem medo de estar doente. A relação entre DA e depressão é complexa e controversa (PANZA et al, 2010 apud FROTA 2016). Durante muito tempo, a depressão foi pensada como causa comum de problemas de memória. Apesar de ser verdade que indivíduos com depressão frequentemente se queixam de problemas de memória, eles muitas vezes apresentam uma desordem primária da memória, como na DA5. Durante a anamnese, deve-se sempre procurar por sintomas de transtorno do humor, principalmente depressivos, que podem ser a causa ou estar colaborando para as queixas de memórias. Deve-se lembrar de que no idoso os sintomas podem não ser tão típicos, podendo se manifestar até mesmo com queixas álgicas. É muito importante também diferenciar sintomas depressivos de apatia. Muitas vezes os familiares relatam que o paciente está triste e desmotivado, quando na realidade ele está apático. 3.3.1.7. Perda de Discernimento (insight) Pacientes desenvolvendo amnésia no contexto de uma doença neurodegenerativa podem subestimar suas dificuldades devido à anosognosia, enquanto pacientes com 14 queixa puramente subjetiva de problemas de memória tendem a sobrevalorizá-los (LARNER, 2005 apud FROTA, 2016). Costumava-se dizer que se o paciente se queixa de problemas de memória é porque ele não tem problemas de memória; o paciente que nega problemas de memória, apesar da queixa de familiares, é o que tem DA ou outras demências (BUDSON, 2016 apud FROTA, 2016). Essa regra traz a questão do insight e apesar de a regra valer para algumas situações, é importante observar que pacientes num estágio muito inicial de demência — e aqueles em estágio pré-demencial, como o comprometimento cognitivo leve, frequentemente sabem que estão com problemas de memória. 3.3.1.8. Sono e comportamentos noturnos A qualidade do sono está diretamente ligada a um bom desempenho cognitivo e, portanto, distúrbios do sono podem contribuir para ou causar problemas de memória. Deve-se questionar sobre o tempo de sono, roncos, apneia e outros comportamentos noturnos. Movimentação excessiva durante o sono, sonhos vívidos e sonilóquios são indicativos de transtorno comportamental do sono REM (do inglês rapid eye movement), que está associado a doenças degenerativas, principalmente sinucleinopatias, como a doença de Parkinson e demência com corpos de Lewy, (BUDSON 2016, MILLER, BOEVE 2009 apud FROTA, 2016). 3.4. Reabilitação neuropsicológica A heterogeneidade dos déficits cognitivos da demência de Alzheimer possibilita uma reeducação dos déficits mnésicos, fundamentada numa avaliação neuropsicológica 15 detalhada, que permitirá adaptar uma estratégia centrada nos seguintes pontos: tentar facilitar a aprendizagem ou a rememoração; fazer com que o doente adquira novos conhecimentos buscando as capacidades preservadas, especialmente de memória implícita e de memória procedural; organizar o ambiente e fazer uso de lembretes, (VAN DER LINDER e JUILLERAT, 1998 apud GIL, 2007). 4. ASPECTOS PSICOSSOCIAIS 4.1. Implicação da doença de Alzheimer no contexto social O mal de Alzheimer, no contexto social, acomete principalmente os comportamentos socialmente esperados, isto é, a pessoa portadora da doença perde o ‘filtro’ de seus comportamentos, agindo não de acordo com o esperado e aceito socialmente, mas sim de acordo com seu querer e vontade. Assim, muitas vezes os indivíduos que possuem o mal de Alzheimer acabam por manifestar sua opinião, sincera, de forma natural, sem medir as palavras, o que muitasvezes resulta em uma interpretação errônea daqueles que as escutam, que passam a ver o indivíduo portador da doença como alguém desagradável ou teimoso. Ressalta-se aqui novamente que o idoso acometido pelo Alzheimer vive em um mundo particular, onde não se existem filtros do que é aceitável socialmente ou não. Outra questão envolvendo este mundo particular do paciente portador de Alzheimer são os papeis afetivos. É comum que esses pacientes percam sua capacidade de conectar, por exemplo, os nomes aos netos; o Alzheimer acomete principalmente a memória recente do paciente, como já mencionado anteriormente, o que faz com que este manifeste claramente dificuldade com determinadas coisas, como os papeis sociais por exemplo. Isto não quer dizer que ele não sinta nada, mas, o acesso as lembranças vividas com aquela pessoa acabam se restringindo. Gritos e repetidas explicações a cerca disso, a fim de fazer com que a pessoa se ‘recorde’ de quem é 16 quem, são apenas fatores que complicarão ainda mais relacionamento com o paciente de Alzheimer. A doença de Alzheimer, comumente acomete pessoas já em idade avançada, assim sendo, os cuidados devem ser redobrados, necessitando não só de um conhecimento acerca da doença, mas também do processo natural de envelhecimento, visando a promoção de uma boa qualidade de vida para aquele indivíduo. Neste sentido, se faz necessário a presença de um cuidador, seja ele um familiar ou um funcionário contratado para isso. Muitas vezes os pacientes de Alzheimer eram vistos como independentes, fortes, exemplos, e passam a apresentar determinadas limitações por conta da doença. Os vínculos afetivos que o paciente de Alzheimer mantinha antes da manifestação da doença, como com sua família, muitas vezes são fatores que dificultam o entendimento e aceitação da família da atual condição do paciente. Neste contexto, de acordo com Zulmira Elisa Vono (2009), a melhor postura a ser adotada por aqueles que rodeiam o enfermo é se adequar ao mundo particular daquele paciente. Traz a luz ainda o relato de um caso, onde a paciente passou a chamar sua filha — que neste caso desempenhava o papel de cuidadora — de mãe. Ao aceitar tal situação, os laços entre mãe e filha se fortaleceram, o que facilitou o trato com determinadas questões relacionadas a doença. Diga-se de passagem, as pessoas não gostam de serem tratadas como indivíduos ‘incapazes’, pois não são, tal como o paciente de Alzheimer também não. Ele possui algumas limitações que devem ser respeitadas e tratadas da melhor maneira possível, nunca tirando do paciente sua independência, deve-se ressaltar que o papel do cuidador na vida do paciente é auxilia-lo, cuidar deste, e não o privar de ter suas próprias experiências. Assim, afim de manter a independência do paciente, deve-se procurar agregar sua participação nas tarefas que se referem a ele, sugere Vono (2009), como por exemplo, a organização de gavetas, de roupas, da aparência, etc. 4.2. Intervenção psicossocial 17 O conceito de intervenção psicossocial se dá quando os problemas sociais e ambientais enfrentados por um indivíduo são abordados e tratados então há a possibilidade de prevenir ou minimizar as consequências da doença. Muitos programas e protocolos foram desenvolvidos para promover o envelhecimento saudável do cérebro, tais como terapias de estimulação cerebral, tudo para abordar a prevenção da doença de Alzheimer e outras demências. De acordo com Salzman C, Jeste DV (2008) essas intervenções não-farmacológicas são uma adição bem-vinda e uma abordagem atraente da perspectiva risco-benefício, especialmente pelo comportamento e sintomas afetivos na doença de Alzheimer. Os tratamentos de medicação sempre foram reativos ao comportamento inadequado que precisa ser controlado rapidamente para diminuir o dano ao paciente e ao cuidador. Já as abordagens psicossociais podem ser consideradas proativas. O objetivo da intervenção psicossocial é aumentar o senso de domínio e controle do paciente, aumentando assim o senso de si mesmo. Existem vários tipos de intervenção psicossocial. A terapia comportamental por exemplo, combinada com um programa que pode incluir exercícios, programas de atividades, musicoterapia e manipulação do ambiente físico em geral, aumentando assim o bem-estar e promovendo a independência em certas tarefas. Outra intervenção importante abordada é a ambiental: a modificação do ambiente e iluminação em lares de idosos combinados com pistas visuais, verbais e táteis adequadas para compensar os déficits sensoriais podem ajudar a melhorar as atividades da vida diária – como se vestir, alimentar-se e tomar banho, promovem a independência e a melhora do humor e comportamento. Ensinar o cuidador sobre as intervenções psicossociais diminui o peso e o estresse sobre o ele e melhora o seu bem-estar emocional. Uma série de intervenções psicossociais flexíveis devem ser desenvolvidas de acordo com as necessidades do paciente e do cuidador, é importante que as intervenções sejam individualizadas, pois cada caso tem suas particularidades. 18 6. BIBLIOGRAFIA Associação Brasileira de Alzheimer - ABRAz. Alimentação. 2014a. Disponível em:<http://abraz.org.br/orientacao-a-cuidadores/cuidados-com-o-doente-de- alzheimer/alimentacao>. Acesso em: 01/10/2017. Associação Brasileira de Alzheimer - ABRAz. 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