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UNIVATES - Centro Universitário Centro III Curso de Ciências Exatas - Licenciatura Matemática 6 por Claus Haetinger e-mail: chaet@univates.br URL http://ensino.univates.br/˜chaet Lajeado, 8 de Outubro de 2004 Sumário 1 Polinômios – Equações Polinomiais 1 1.1 Divisão pelo Método da Chave . . . . . . . . . . . . . . . . . 1 1.2 Definições . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 2 1.3 Divisibilidade & Equações . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 4 1.4 Ráızes de um Polinômio . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5 1.5 Dispositivo Prático de Briot-Ruffini . . . . . . . . . . . . . . . 5 1.5.1 Como Funciona este Dispositivo . . . . . . . . . . . . 6 1.5.2 Justificativa do Método . . . . . . . . . . . . . . . . . 7 1.5.3 Exerćıcios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7 1.6 Teorema de D’Alembert . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9 1.6.1 Exerćıcios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 9 1.6.2 Eliminação de Uma Raiz . . . . . . . . . . . . . . . . 9 1.6.3 Exerćıcios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 10 1.7 Pesquisa de Ráızes Inteiras . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 11 1.7.1 Exerćıcios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 12 1.8 Pesquisa de Ráızes Racionais . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13 1.8.1 Exerćıcios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13 1.9 Ráızes Reais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14 1.9.1 Exerćıcios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 15 2 Números Reais 17 2.1 Aproximação de Números Irracionais por Números Racionais 17 2.1.1 Aproximação por Inteiros . . . . . . . . . . . . . . . . 17 2.1.2 Aproximação por Números Racionais . . . . . . . . . . 18 2.1.3 Aproximações Melhores . . . . . . . . . . . . . . . . . 20 2.1.4 Aproximações a Menos de 1 n2 . . . . . . . . . . . . . . 21 2.1.5 Limitações das Aproximações . . . . . . . . . . . . . 23 2.2 Um Resumo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24 3 Ráızes Complexas de Polinômios 25 3.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25 3.2 Uma Generalização do Algoritmo de Briot-Ruffini . . . . . . . 26 3.3 Aplicações . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28 i UNIVATES – Centro Universitário Prof.Dr. Claus Haetinger ii 4 Polinômios em uma Variável sobre Subcorpos dos Complexos 31 4.1 Definições e Exemplos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31 4.2 O Algoritmo da Divisão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33 4.2.1 Polinômios Irredut́ıveis . . . . . . . . . . . . . . . . . . 35 4.2.2 Fatorização Única . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 35 4.3 Lema de Gausss e o Critério de Eisenstein . . . . . . . . . . . 36 4.4 Números Algébricos e Transcendentes . . . . . . . . . . . . . 38 4.4.1 Corpos Algebricamente Fechados . . . . . . . . . . . . 38 4.4.2 O Teorema Fundamental da Álgebra . . . . . . . . . . 39 Bibliografia 40 Caṕıtulo 1 Polinômios – Equações Polinomiais Este caṕıtulo é baseado no trabalho de Luiz Márcio Imenes ([20]). 1.1 Divisão pelo Método da Chave Explicaremos como se efetua a divisão de polinômios, pelo método da chave, através do exemplo a seguir. Exemplo 1.1.1 Façamos, passagem por passagem, a divisão do po- linômio A(x) = 3x3−13x2+37x−50 pelo polinômio B(x) = x2−2x+5, pelo método da chave. Solução 1. Dividimos, inicialmente, 3x3 por x2, encontrando 3x: 3x3 − 13x2 + 37x− 50 |x2 − 2x + 5 3x 2. Multiplicamos 3x por x2 − 2x + 5 e vemos “quanto falta para 3x3 − 13x2 + 37x− 50”, isto é, subtráımos 3x3 − 6x2 + 15x de 3x3 − 13x2 + 37x− 50: 3x3 − 13x2 + 37x− 50 |x2 − 2x + 5 −3x3 + 6x2 − 15x 3x − 7x2 + 22x− 50 3. Enquanto o grau do resto for maior ou igual ao grau de x2 − 2x + 5, continua-se a divisão. Dividimos, então, −7x2 por x2, encontrando −7: 3x3 − 13x2 + 37x− 50 |x2 − 2x + 5 −3x3 + 6x2 − 15x 3x− 7 − 7x2 + 22x− 50 1 UNIVATES – Centro Universitário Prof.Dr. Claus Haetinger 2 4. Multiplicamos −7 por x2− 2x + 5 e vemos “quanto falta para −7x2 + 22x− 50”: 3x3 − 13x2 + 37x− 50 |x2 − 2x + 5 −3x3 + 6x2 − 15x 3x− 7 − 7x2 + 22x− 50 7x2 − 14x + 35 8x− 15 5. Neste ponto terminamos a divisão, pois o grau de 8x− 15 é inferior ao de x2 − 2x + 5. Portanto, nesta divisão: O quociente é Q(x) = 3x− 7 e o resto é R(x) = 8x− 15 Exerćıcio 1.1.2 1. Efetua a divisão do polinômio A(x) = 4x3 +11x2 +36x+6 por B(x) = x2 + 2x + 7. 2. Divide o polinômio A(x) = 8x4 + 4x2 + x− 1 por B(x) = 2x2 + x− 1. 3. Determina o polinômio A(x), sabendo que na divisão de A(x) por B(x) = x2 − 8 obteve-se quociente Q(x) = 2x2 + 1 e resto R(x) = 3x + 10. 4. Divide o polinômio p(x) = 7x3+30x2−40x+15 por g(x) = x2+5x−6. 5. Efetua a divisão do polinômio −2x3+13x2−14x+2 por −2x2+3x+1. 1.2 Definições Quando efetuamos uma divisão de polinômios, o que estamos procu- rando? Os resultados obtidos devem satisfazer a que exigências? Definição 1.2.1 (DIVISÃO DE POLINÔMIOS) Dados dois po- linômios A e B, com B não sendo o polinômios nulo, dividir A por B é encontrar dois polinômios Q e R que satisfaçam às seguintes condições: (i). Q ·B + R = A (ii). O grau de R não pode ser igual nem maior que o grau de B. Nestas condições, chamaremos Q de quociente e R de resto da divisão. A definição 1.2.1 envolve inúmeros conceitos. Por exemplo, a condição (i), QB + R = A, envolve o conceito de igualdade de polinômios. Já a condição (ii) abrange o conceito de grau de um polinômio. Esta definição menciona ainda o polinômio nulo. Perguntamos-lhes, então: • O que são polinômios iguais? UNIVATES – Centro Universitário Prof.Dr. Claus Haetinger 3 • O que é grau de um polinômio? • O que é o polinômio nulo? • Aliás, o que é um polinômio? Exerćıcio 1.2.2 1. O que se pode afirmar sobre o grau da soma de dois polinômios de graus diferentes entre si? 2. Apresenta um exemplo de dois polinômios do 3o. grau que somados resultam num polinômio do 1o. grau. 3. Qual é o grau do polinômio p = 0x4 + ax3 + 2x2 + 1? 4. (a) Considerando dois polinômios, ambos de grau n, qual é o grau do produto desses polinômios? (b) Considerando dois polinômios, um de grau m e outro de grau n, qual é o grau do produto desses polinômios? 5. Determina os valores de a, b, c, d, e de modo que os polinômios p = ax4 + 5x2 + dx− b e g = 2x4 + (b− 3)x3 + (2c− 1)x2 + e sejam iguais. 6. Determina o polinômio p do 1o. grau tal que p(1) = 3 e p(3) = 13. 7. Dá um exemplo de dois polinômios diferentes p e g tais que p(2) = g(2) e p(5) = g(5). Exemplo 1.2.3 Determina os valores dos coeficientes m e n de modo que o resto da divisão do polinômio p = x3−5x2 +mx+n por a = x2 +x−2 seja igual a r = 16x− 13. Solução Façamos a divião de p = x3 − 5x2 + mx + n por a = x2 + x − 2, pelo método da chave: x3 − 5x2 + mx + n |x2 + x− 2 −x3 − x2 + 2x x− 6 − 6x2 + (m + 2)x + n 6x2 + 6x− 12 (m + 8)x + n− 12 Para que o resto seja igual a 16x− 13 deve-se ter m + 8 = 16 e n− 12 = −13, logo, m = 8 e n = −1. UNIVATES – Centro Universitário Prof.Dr. Claus Haetinger 4 1.3 Divisibilidade & Equações Efetuando a divisão do polinômio p = x3−6x2−x+30 por g = x2−x−6, teremos: x3 − 6x2 − x + 30 |x2 − x− 6 −x3 + x2 + 6x x− 5 − 5x2 + 5x + 30 +5x2 − 5x− 30 0 Devido ao fato de o resto ser o polinômio nulo, diremos que p é DI- VISÍVEL por g. Observe que, neste caso, temos: (x − 5)(x2 − x − 6) = x3 − 6x2 − x + 30 fato este de grande utilidade na resolução da equação do 3o. grau p(x) = 0. Resolvendo-a de posse desta informação, teremos: x3−6x2−x+30 = 0 ⇒ (x−5)(x2−x−6) = 0 ⇒ x−5 = 0 ou x2−x−6 = 0. A resolução da equação do 3o. grau recai, portanto, na resolução de duas equações de graus menores: uma do 1o. grau e outra do 2o. grau. Resolvendo- as, chegaremos ao conjunto-solução daquela equação do 3o. grau, que é: S = {5, 3,−2} (verifique!). Assim, de uma maneira geral, a divisibilidadede polinômios relaciona-se com a resolução de equações: p é diviśıvel por g ⇒ p |g 0 q ⇒ p = q · g. Considerando a equação p(x) = 0, tem-se então: p(x) = 0 ⇒ q(x) · g(x) = 0 ⇒ q(x) = 0 ou g(x) = 0. Dessa forma, a resolução de uma equação nos leva, freqüentemente, à resolução de duas equações de graus menores. Exemplo 1.3.1 Determina os valores de m e n de modo que o po- linômio p = x3 + 7x2 + mx + n seja diviśıvel por g = x2 + 5x + 7. Solução Façamos a divisão de p por g: x3 + 7x2 + mx + n |x2 + 5x + 7 −x3 − 5x2 − 7x x + 2 2x2 + (m− 7)x + n −2x2 − 10x− 14 (m− 17)x + n− 14 Para que o resto seja o polinômio nulo, todos os seus coeficientes devem ser nulos; logo m = 17 e n = 14. Exemplo 1.3.2 Resolve a equação do 3o. grau x3−6x2+7x+4, sabendo que p = x3 − 6x2 + 7x + 4 é diviśıvel por x2 − 2x− 1. UNIVATES – Centro Universitário Prof.Dr. Claus Haetinger 5 Solução Dividiremos p por x2 − 2x− 1: x3 − 6x2 + 7x + 4 |x2 − 2x− 1 −x3 + 2x2 + x x− 4 − 4x2 + 8x + 4 4x2 − 8x− 4 0 Na divisão anterior, vê-se que: (x− 4)(x2− 2x− 1) = x3− 6x2 + 7x + 4. Então: x3 − 6x2 + 7x + 4 = 0 ⇒ (x− 4)(x2 − 2x − 1) = 0 ⇒ x− 4 = 0 ou x2 − 2x− 1 = 0. A resolução da equação do 3o. grau recai, portanto, na resolução de duas equações de graus menores. Resolvendo-as, chegamos a S = {4, 1−√2, 1 +√ 2}. Exerćıcio 1.3.3 1. Obtém os valores de m e n para os quais o polinômio p = 6x3 + 29x2 + mx + n é diviśıvel por 2x2 + 11x− 6. 2. Resolve a equação 6x3 + 29x2 − 40x + 12 = 0. 3. Resolve a equação do 3o. grau (2x− 1)(x + 8)(3x− 5) = 0. 4. Resolve a equação x3 − 4x2 − 9x + 36 = 0. 5. Preenche as lacunas a seguir: supõe que seja dado o polinômio q e seja p = q · (x2 + 7x + 2) + 5x− 8. Na divisão de p por x2 + 7x + 2 o quociente é e o resto é . 6. Preenche as lacunas: Seja p = (x+7)(x−2)(x+6). Na divisão de p por x + 7 o quociente é e o resto é ; na divisão de p por x − 2 o quociente é e o resto é ; e na divisão de p por x + 6, o quociente é e o resto é . 1.4 Ráızes de um Polinômio Dizemos que o número real α é RAIZ ou ZERO de um polinômio p, se p(α) = 0. Por exemplo, o número 2 é uma das ráızes de p = x3 − 8x2 + 7x + 10, pois p(2) = 23 − 8 · 22 + 7 · 2 + 10 = 0. 1.5 Dispositivo Prático de Briot-Ruffini Através do algoritmo de Briot-Ruffini as divisões por polinômios do tipo x− a podem ser efetuadas de maneira muito simples e rápida. Inicialmente veremos as regras de funcionamento, para depois justificá-las. UNIVATES – Centro Universitário Prof.Dr. Claus Haetinger 6 1.5.1 Como Funciona este Dispositivo Consideremos, por exemplo, a divisão de p = 3x3+4x2+7x+1 por x−2. Para efetuá-la através do método de Briot-Ruffini, devemos dispor os coeficientes do polinômio p na ordem DECRESCENTE do grau precedidos da raiz de x− 2, que é o número 2: raiz de x− 2 coeficientes do pol. p 2 3 4 7︸ ︷︷ ︸ 1 ↑ ↑ coef. do quociente resto Primeiro, “abaixa-se” o 1o. coeficiente de p, que, neste caso, é o no. 3. 2| 3 4 7 1 3 A seguir deve-se multiplicar o número 3 por 2 e somar este produto com o coeficiente seguinte de p, que é 4. O resultado obtido, 3× 2 + 4 = 10, será o segundo coeficiente do quociente. ⊕ −→ ↑ ↓ 2| 3 4 7 1 ↑ 3 ↓ ↑ ↓ 10 ← ⊗ Agora repetiremos para o coeficiente 10 todas as operações antes feitas com o no. 3. Assim, multiplica-se 10 por 2 e soma-se este produto com o coef. seguinte de p, que é 7. O resultado obtido, 10× 2 + 7 = 27, será o 3o. coeficiente do quociente. ⊕ −→ → ↑ ↓ 2| 3 4 7 1 ↑ 3 10 ↓ ↑ ↓ ↓ 27 ← ←− ⊗ Finalmente, repete-se o processo anterior para o no. 27, multiplicando-o por 2 e somando este produto com o coeficiente seguinte de p, que é 1. O resultado obtido será o resto da divisão. 2| 3 4 7 1 3 10 27︸ ︷︷ ︸ 55︸︷︷︸ coef. do quoc. resto O quociente da divisão será, então, q = 3x2 + 10x + 27 e o resto será r = 55. Exemplo 1.5.1 Efetua a divisão do polinômio p = 2x3 − 7x2 + 2x + 1 por g = x− 4. UNIVATES – Centro Universitário Prof.Dr. Claus Haetinger 7 Solução 4 2 -7 2 1 2 1 6 25 , donde q = 2x2 + x + 6 e r = 25. 1.5.2 Justificativa do Método Vamos retomar a divisão de p = 3x3+4x2+7x+1 por x−2, mas efetuando-a pelo método da chave. 3x3 + 4x2 + 7x + 1 |x− 2 −3x3 + 6x2 3x2 + 10x + 27 10x2 + 7x −10x2 + 20x 27x + 1 −27x + 54 55 Obtivemos o quociente q = 3x2 + 10x + 27 e o resto r = 55, e agora faremos um cuidadoso retrospecto para investigar a procedência de seus coeficientes 3, 10, 27. Não é dif́ıcil perceber que o 1o. coeficiente do quociente é igual ao 1o. coeficiente de p, pois provém da divisão de 3x3 por x. Repara que, caso p se iniciasse com 5x3, o quociente começaria com 5x2. É por isso que, no dispositivo de Briot-Ruffini, “abaixa-se”o 1o. coeficiente de p. A seguir 3x2 é multiplicado por x− 2. O produto de 3x2 por x “desapa- rece” na passagem seguinte, enquanto o produto de 3x2 por −2 é subtráıdo de 4x2. Obtém-se então 10x2, que originará o 2o. coeficiente do quociente, que é 10. É por isso que, na divisão por Briot-Ruffini, deve-se multiplicar 3 por 2 (já levando em conta a mudança de sinal devida à subtração ) e somar este produto com o 2o. coeficiente de p. Observa que o ocorrido com 3x2 se repetirá, de forma inteiramente análoga, com 10x. Por isso mesmo, em Briot-Ruffini, deve-se multiplicar 10 por 2 e somar este produto com o coeficiente seguinte de p, que neste caso é 7. E, olhando para a divisão efetuada pelo método da chave, vemos que o processo se repete com o número 27. Por isso, multiplicando 27 por 2 e somando este produto com o coeficiente seguinte de p, obtém-se o resto 55. Com isso, acreditamos ter justificado as regras utilizadas no dispositivo de Briot-Ruffini na divisão espećıfica que foi efetuada. Não é dif́ıcil perce- ber, no entanto, que esta mesma justificativa permanece válida em qualquer divisão por polinômios do tipo x− a. 1.5.3 Exerćıcios Exerćıcio 1.5.2 Divide p = 3x4 − 4x3 + x2 − 6x + 3 por x− 2. Exemplo 1.5.3 Resolve a equação x3− 6x2 +11x− 6 = 0, sabendo que p = x3 − 6x2 + 11x− 6 é diviśıvel por x− 2. UNIVATES – Centro Universitário Prof.Dr. Claus Haetinger 8 Solução Façamos a divisão de p por x− 2: 2 1 -6 11 -6 1 -4 3 0 O “esqueleto” acima nos mostra que: x3 − 6x2 + 11x− 6 = (x2 − 4x + 3)(x− 2). Então uma das ráızes da equação dada é 2 e as demais são as ráızes do quociente da divisão, ou seja, são 1 e 3. Logo, S = {2, 1, 3}. Exerćıcio 1.5.4 Resolve a equação x3 − 2x2 − 19x + 20 = 0, sabendo que p = x3 − 2x2 − 19x + 20 é diviśıvel por x− 1. Exemplo 1.5.5 Efetua a divisão de p = x4 − 5x2 + 14x + 17 por x + 3. Solução Repara que o coeficiente de x3, em p, é 0. Além disso, observa que na divisão, pelo dispositivo de Briot-Ruffini, de p por x + 3, deve-se colocar o número −3 antecedendo os coeficientes de p. -3 1 0 -5 14 17 1 -3 4 2 11 q = x3 − 3x2 + 4x + 2 e r = 11. Exerćıcio 1.5.6 Efetua a divisão de p = 3x4 − 2x3 − 16x2 + 20x + 55 por x + 2. Exerćıcio 1.5.7 Determina os valores reais de x para os quais tem- se x3 + 2x2 + 8x + 7 = 0, sabendo que p = x3 + 2x2 + 8x + 7 é diviśıvel por x + 1. Exerćıcio 1.5.8 Efetua a divisão de p = 5x3−2x2+x−1 por g = x2+1. (Confere tua resposta!) Exemplo 1.5.9 Determina o valor de m de modo que o polinômio p = x3 + 2x2 + mx + 4 seja diviśıvel por x− 2. Solução Façamos a divisão de p por x− 2: 2 1 2 m 4 1 4 m+8 2m+20 Devemos ter resto nulo; logo, 2m + 20 = 0 e m = −10. Exerćıcio 1.5.10 Sabendo que na divisão de p = 2x3 + 5x2 + mx + 9 por g = x + 3 o resto é 6, determina o quociente da divisão. UNIVATES – Centro Universitário Prof.Dr. Claus Haetinger 9 1.6 Teorema de D’Alembert Através do teorema de D’Alembert pode-se determinar o resto da divisão de p por um polinômio do tipo x − a, sem que se tenha que efetuar esta divisão. Teorema 1.6.1 O resto da divisão do polinômio p(x) por x− a é p(a). prova: Na divisão mencionada o resto será r = k (constante), pois x−a tem grau1. Sendo q(x) o quociente da divisão, tem-se: q(x) · (x− a) + k = p(x). Como estes polinômios são iguais, atribuindo a ambos um mesmo valor para x, obtêm-se valores numéricos iguais. Para “isolar” k, que é o resto, atribuiremos a ambos o valor x = a, resultando então que: q(a) · (a− a) + k = p(a) ⇒ q(a) · 0 + k = p(a) ⇒ k = p(a). Assim este teorema nos mostra, por exemplo, que o resto da divisão de p = 2x3 − 4x2 + 8x− 1 por x − 3 é: p(3) = 2 · 33 − 4 · 32 + 8 · 3 − 1 = 41 (confirma este resultado efetuando a divisão pelo método da chave ou por Briot-Ruffini). 1.6.1 Exerćıcios Exemplo 1.6.2 Determina o resto da divisão de p = x4 − 3x2 + 5x + 1 por x− 2. Solução Pelo teorema de D’Alembert (1.6.1), o resto da divisão é: p(2) = 15. Exerćıcio 1.6.3 Qual é o resto da divisão de p = 2x3 − 10x2 + 8x − 3 por x− 5? Exerćıcio 1.6.4 Qual é o resto da divisão de A = x21 + 1 por x− 1? Exerćıcio 1.6.5 Determina o resto da divisão de A = x3 − x2 − 2x + 3 por x + 2. Exerćıcio 1.6.6 Determina o resto da divisão de p = xn − 1, n ∈ N∗, por x + 1. 1.6.2 Eliminação de Uma Raiz Conhecida uma raiz α de um polinômio p de grau n, n ≥ 2, esta raiz α pode ser eliminada de p, isto é, pode-se obter outro polinômio q, de grau n− 1, cujas ráızes são as demais ráızes de p. Esquematicamente, temos: UNIVATES – Centro Universitário Prof.Dr. Claus Haetinger 10 α é raiz de p ⇒ p(α) = 0 ⇒ (veja teorema de D’Alembert) ⇒ ⇒ p é diviśıvel por x− α ⇒ p = q · (x− α) ⇒ ⇒ as ráızes de p são, além de α, as ráızes de q. α é raiz de p ⇒ p é diviśıvel por x− α ⇒ ⇒ as demais ráızes de p são as ráızes do quociente da divisão de p por x− α. 1.6.3 Exerćıcios Exemplo 1.6.7 Resolve a equação x3 − 7x2 + 36 = 0, observando que −2 é uma das ráızes. Solução Seja p(x) = x3 − 7x2 + 36; sabe-se que p(−2) = 0, logo p(x) é diviśıvel por x + 2. Efetuemos esta divisão: -2 1 -7 0 36 1 -9 18 0 Então x3 − 7x2 + 36 = (x2 − 9x + 18)(x + 2) e, portanto, decorre que: x3−7x2+36 = 0 ⇒ (x2−9x+18)(x+2) = 0 ⇒ S = {−2, 3, 6} (verifica!) Exemplo 1.6.8 Resolve a equação x3−16x2+65x−50 = 0, observando que 1 é uma de suas ráızes. Solução Repetindo o racioćınio feito no exemplo anterior (1.6.7), temos: 1 1 -16 65 -50 1 -15 50 0 De x2 − 15x + 50 = 0 vem x = 5 ou x = 10. Então S = {1, 5, 10}. Exerćıcio 1.6.9 Resolve a equação x3−6x2−7x+60 = 0, sabendo que uma de suas ráızes é 4. Exerćıcio 1.6.10 Preenche as lacunas: se 7 é raiz de um polinômio p, então p pode ser decomposto num produto de dois fatores, um dos quais é . O outro fator, que “possui” as demais ráızes de p, é o . Exerćıcio 1.6.11 Resolve a equação x3 − x2 − 14x + 24 = 0, sabendo que uma de suas ráızes é −4. Exemplo 1.6.12 Resolve a equação x4 − 8x3 − 25x2 + 44x + 60 = 0, sabendo que −1 e 2 são ráızes da mesma. UNIVATES – Centro Universitário Prof.Dr. Claus Haetinger 11 Solução Vamos dividir x4−8x3−25x2 +44x+60 por x+1 e, depois, o quociente desta divisão por x− 2. -1 1 -8 -25 44 60 2 1 -9 -16 60 0 1 -7 -30 0 O “esqueleto” acima nos mostra que: x4 − 8x3 − 25x2 + 44x + 60 = (x + 1)(x3 − 9x2 − 16x + 60) e que: x3 − 9x2 − 16x + 60 = (x− 2)(x2 − 7x− 30) Juntando as duas fatorações, decorre que: x4 − 8x3 − 25x2 + 44x + 60 = (x + 1)(x− 2)(x2 − 7x− 30) Neste ponto já pode-se ver que S = {−1, 2,−3, 10}. 1.7 Pesquisa de Ráızes Inteiras Numa equação polinomial de coeficientes inteiros, pode-se obter suas eventuais ráızes inteiras. Comecemos por observar que, no exemplo anterior (1.6.12), as ráızes inteiras −1, 2, −3 e 10 são divisores do termo indepen- dente 60. Não custa fazer uma pausa para lembrar que, dados dois números inteiros a e b, diz-se que a é divisor de b (ou que a divide b) quando existe um número inteiro c tal que c ·a = b (neste caso, denotamos a | b). Assim, por exemplo, 2 é divisor de 60, pois 30× 2 = 60. Ou seja, 2 divide 60. Ou ainda 2 | 60. Prosseguindo, provaremos que as eventuais ráızes inteiras da equação x3 − 10x2 + 26x− 12 = 0 são (obrigatoriamente) divisores do termo inde- pendente −12. prova: Se r é uma raiz inteira de x3 − 10x2 + 26x− 12 = 0, tem-se: r3 − 10r2 + 26r − 12 = 0 ⇒ r3 − 10r2 + 26r = 12 ⇒ r(r2 − 10r + 26︸ ︷︷ ︸ no. inteiro ) = 12 Mas estamos supondo que r é um número inteiro, logo r2−10r+26 também é. Então a expressão acima nos mostra que r multiplicado por um número inteiro resulta em 12. Portanto, r é um divisor de 12 (ou, o que dá no mesmo, de −12). Terminada a prova e considerando que os divisores de 12 (ou de −12) são ±1, ±2, ±3, ±4, ±6 e ±12, aproveitaremos para pesquisar as ráızes inteiras de x3 − 10x2 + 26x− 12 = 0. Verificando esses valores na equação, uma a um, depois de algum trabalho, percebemos que 6 é raiz. Então 6 1 -10 26 -12 1 -4 2 0 UNIVATES – Centro Universitário Prof.Dr. Claus Haetinger 12 De x2 − 4x + 2 = 0 vem x = 2±√2. Logo, S = {6, 2−√2, 2 +√2}. Finalmente generalizaremos os resultados que temos obtido através do seguinte teorema: Teorema 1.7.1 Se r ∈ Z é uma raiz da equação polinomial com coefi- cientes inteiros: anxn + an−1xn−1 + · · · + a2x2 + a1x + a0 = 0, então r é divisor de a0. prova: Se r é raiz da equação, então: anr n + an−1rn−1 + . . . + a2r2 + a1r + a0 = 0 ⇒ ⇒ anrn + an−1rn−1 + . . . + a2r2 + a1r = −a0 ⇒ ⇒ r( anrn−1 + an−1rn−2 + . . . + a2r + a1︸ ︷︷ ︸ este valor resulta num número inteiro k. ) = −a0 Como estamos supondo que r e todos os coeficientes da equação são inteiros, a expressão anterior, que se encontra entre parênteses, também resultará num número inteiro, que indicaremos por k. Então k · r = −a0; logo, r é divisor de a0. 1.7.1 Exerćıcios Exemplo 1.7.2 Quais são as ráızes inteiras de 2x3−17x2 +19x+14 = 0? Resolução Pelo teorema anterior (1.7.1) sabemos que as eventuais ráızes inteiras são os divisores de 14: ±1, ±2, ±7, ±14. Fazendo uma verificação, vê-se que 2 é raiz, logo: 2 2 -17 19 14 2 -13 -7 0 De 2x2 − 13x− 7 = 0 vem x = 7 ou x = −12 . Portanto, as ráızes inteiras da equação dada são 2 e 7. Exemplo 1.7.3 Quais são as ráızes inteiras de 24x3−26x2+9x−1 = 0? Resolução Nesta equação, as posśıveis ráızes inteiras são os divisores de 1, que são apenas dois: ±1. Como nenhum desses dois valores é raiz da equação (confere!), conclui-se que tal equação não possui nenhuma raiz inteira. Exerćıcio 1.7.4 Resolve a equação x3 − 12x2 + 10x + 11 = 0. Sugestão: pesquisa suas posśıveis ráızes inteiras. Exerćıcio 1.7.5 Determina as ráızes reais de 2x4+3x3−10x2−5x−6 = 0. UNIVATES – Centro Universitário Prof.Dr. Claus Haetinger 13 1.8 Pesquisa de Ráızes Racionais De maneira análoga à feita com as ráızes inteiras, vamos demonstrar o seguinte Teorema 1.8.1 Se o número racional ab , com a e b primos entre si, é uma raiz da equação polinomial com coeficientes inteiros: anxn+an−1xn−1+ . . . + a1x + a0 = 0, então a é divisor de a0 e, além disso, b é divisor de an. prova: Seja p(x) = anxn + an−1xn−1 + . . . + a2x2 + a1x + a0, an 6= 0, ai ∈ Z, ∀i. Seja α = ab ∈ Q com m.d.c.{a, b} = 1 tal que p(α) = 0. A mostrar: a | a0 e b | an De fato, p(α) = 0 ⇒ an · anbn + an−1 · a n−1 bn−1 + . . . + a2 · a 2 b2 + a1 · ab + a0 = 0 ⇒ an · anbn + . . . + a1 · ab = −a0. Tirando o m.m.c. dos denominadores, temos: an · an + an−1 · an−1 · b + . . . + a2 · a2 · bn−2 + a1 · a · bn−1 = −a0 · bn. Todas as parcelas do lado esquerdo da igualdade acima possuem a: a an · an−1 + an−1 · an−2 · b + . . . + a2 · a · bn−2 + a1 · bn−1︸ ︷︷ ︸ ∈Z = −a0 · bn. † Isto implica que, por um lado, a | a0 ·bn ⇒ a | a0 ou a | bn ⇒ a | a0 ou a | b. Como esta última possibilidade não ocorre haja vista que m.d.c.{a, b} = 1, segue que a | a0. Por outro lado, também de †, vem que b | a ·(an · an−1 + an−1 · an−2 · b + . . . + a2 · a · bn−2 + a1 · bn−1 ) . Então b | a (o que não ocorre visto que m.d.c.{a, b} = 1) ou b | (an · an−1 + an−1 · an−2 · b + . . . + a2 · a · bn−2 + a1 · bn−1 ) . Portanto b | an ·an−1 + an−1 · an−2 · b + . . . + a2 · a · bn−2 + a1 · bn−1︸ ︷︷ ︸ mas b divide cada uma destas parcelas . Segue que b | b( )− a bicharada todac. No entanto, b( )−a bicharada todac = an ·an−1. Assim, b | an ·an−1 ⇒ b | an ou b | an−1 ⇒ ⇒ b | an ou b | a (esta última não ocorre pois m.d.c.{a, b} = 1) ∴ b | an. 1.8.1 Exerćıcios Exemplo 1.8.2 Determina as ráızes racionais de 3x3 + x2 + x− 2 = 0. Resolução Pelo teorema anterior (1.8.1) sabemos que se pq é uma raiz racional da equação, então: p divide − 2 : ±1, ±2 UNIVATES – Centro Universitário Prof.Dr. Claus Haetinger 14 q divide 3 : ±1, ±3 logo, para pq temos as possibilidades: ±1, ±13 , ±2 e ±23 . Fazendo uma verificação, vê-se que 23 é raiz, logo: 2 3 3 1 1 -2 3 3 3 0 Como 3x2 + 3x + 3 = 0 não tem ráızes reais, conclui-se que a única raiz racional da equação é 23 . Exemplo 1.8.3 Vimos que a equação 24x3 − 26x2 + 9x − 1 = 0 não possui nenhuma raiz inteira (exemplo 1.7.3). Agora solicitaremos as suas ráızes racionais. Resolução Se pq é raiz racional, então p | (−1) e q | 24 (isto é, p divide −1 e q divide 24). Portanto, as eventuais ráızes racionais são: ±1, ±12 , ±13 , ±14 , ±16 , ±18 , ± 112 e ± 124 . No entanto, na equação dada, quando substitúımos x por um número ne- gativo todas as parcelas envolvidas tornam-se negativas e, por conseguinte, a equação não possui ráızes negativas. Restam, então, oito daquelas pos- sibilidades (ou, mais precisamente, sete, pois já se sabe que não há ráızes inteiras). Verificando os valores restantes, vê-se que 12 é raiz, logo: 1 2 24 -26 9 -1 24 -14 2 0 De 24x2−14x+2 = 0 vem x = 13 ou x = 14 . Portanto, as ráızes racionais da equação são 12 , 1 3 e 1 4 . Exerćıcio 1.8.4 Determina as ráızes reais de 5x3 + 9x2 + 13x− 3 = 0. Exerćıcio 1.8.5 Quais são as ráızes racionais de 7x3−3x2 +x−2 = 0? 1.9 Ráızes Reais O teorema seguinte é geralmente demonstrado no curso de Análise Real, e até em alguns cursos de Cálculo. Aqui, no entanto, não incluiremos a sua prova formal, procurando justificá-lo de modo bastante intuitivo, através de sua conotação gráfica. O aluno interessado poderá pesquisar este e o teorema de Rolle em livros de Análise Matemática. Teorema 1.9.1 (Bolzano-Weierstrass) Seja p um polinômio com coeficientes reais e sejam a, b ∈ R com a < b. Se p(a) ·p(b) < 0, então existe pelo menos uma raiz real de p no intervalo (a, b). UNIVATES – Centro Universitário Prof.Dr. Claus Haetinger 15 A explicação intuitiva é a seguinte: se p(a) · p(b) < 0, então p(a) e p(b) têm sinais contrários. Suponhamos, s.p.g., que p(a) > 0 e p(b) < 0. Então, olhando para o gráfico de y = p(x), vê-se que quando x = a o gráfico situa-se acima do eixo ~OX. Já para x = b ele está abaixo do mesmo. O gráfico da função polinomial, sendo uma curva cont́ınua que liga esses dois pontos, terá obrigatoriamente que cortar o eixo dos ~OX ao menos uma vez no intervalo (a, b). Ao cortá-lo tem-se então um ponto de abscissa x0 tal que p(x0) = 0; logo x0 é uma raiz de p(x) = 0. Portanto, existe pelo menos uma raiz real de p no intervalo (a, b). 1.9.1 Exerćıcios Exemplo 1.9.2 Mostra que a equação x3−3x2−x−1 = 0 admite uma raiz irracional compreendida entre os números 0 e 4. A seguir determina um intervalo de amplitude 0, 5 que contenha aquela raiz. Resolução Sendo p = x3 − 3x2 − x − 1, temos p(0) = −1 e p(4) = 11. Então p(0) · p(4) < 0 e, pelo teorema 1.9.1 (Bolzano), a equação admite ao menos uma raiz real no intervalo (0, 4). Esta raiz não é racional, pois as posśıveis ráızes racionais são ±1 e nenhum desses dois valores é raiz da equação . Portanto, aquela equação admite uma raiz irracional compreendida entre os números 0 e 4. Para estreitar o intervalo que contém aquela raiz, tomemos um valor pertencente a (0, 4) – o número 2, por exemplo – e obtenhamos p(2). Neste caso, p(2) = −7, logo p(2) · p(4) < 0 e, assim, a raiz fica compreendida entre 2 e 4. Escolhendo em (2, 4) o número 3, temos p(3) = −4, logo p(3) · p(4) < 0 e, assim, a raiz fica compreendida entre 3 e 4. Continuando nesse processo vemos que p(3, 5) = 1, 625, logo p(3) · p(3, 5) < 0 e, finalmente, chegamos a um intervalo de amplitude 0, 5 que contém aquela raiz: (3;3,5). Observação 1.9.3 O processo anterior pode ser continuado, apertando- se cada vez mais o cerco em torno da raiz, até a obtenção do valor aproxi- mado da raiz com a precisão que se desejar. Por exemplo, no exerćıcio anterior (1.9.2) tem-se p(3, 3825) < 0 e p(3, 383) > 0; logo, o valor da raiz, calculado com erro inferior a 0, 0001 (um milésimo), é, 3, 383. Exerćıcio 1.9.4 Mostra que a equação x5 + 20x2− 100 = 0 possui uma raiz real positiva e inferior a 10. A seguir, determina dois números inteiros e consecutivos entre os quais se encontra aquela raiz. Exerćıcio 1.9.5 Pesquisa as ráızes racionais de x4+x3−2x2−3x−3 = 0 e mostra que essa equação possui uma raiz irracional compreendida entre 1 e 2. Exerćıcio 1.9.6 Pesquisa as ráızes racionais de 2x3− 3x2− 2x+1 = 0 e mostra que esta equação possui uma raiz irracional compreendida entre −1 e 0, e uma terceira situada entre 1 e 2. UNIVATES – Centro Universitário Prof.Dr. Claus Haetinger 16 Exerćıcio 1.9.7 Considera um polinômio p com coeficientes reais. Ocorrendo que p(0)·p(2) > 0, pode-se afirmar que este polinômio não admite ráızes reais entre 0 e 2? CHA ETINGER Caṕıtulo 2 Números Reais Este caṕıtulo é baseado no livro de Ivan Niven, “Números: Ra- cionais e Irracionais” ([15]). Detalhes e maior aprofundamento podem ser obtidos em “Aproximação de um Número Real por Números Racionais”, de Yves Lequain ([17]). 2.1 Aproximação de Números Irracionais por Números Racionais Trataremos do grau de precisão com que um número irracional é apro- ximado por números racionais. Veremos que é posśıvel obter números ra- cionais tão próximos, digamos, de √ 2 quanto se queira: existem números racionais ab que diferem de √ 2 por menos de 10−10, ou 10−20, ou por me- nos de números tão pequenos quanto se imagine. E isto vale para qualquer número irracional, não só para o √ 2. No entanto, para encontrar um número racional ab que difira de um irracional por menos de 10 −20, precisamos pro- curar ab com b muito grande: se admitirmos que b seja da ordem de 10 20, poderemos encontrar ab nestas condições. ¿ O que acontece se restringirmos os valores de b, não permitindo que ultrapassem 1015 ou 1010? O problema fica mais dif́ıcil e trabalhoso. Mas, examinando questões como estas, estaremos nos preocupando com o que pode ser afirmado a respeito de todos os números irracionais e não apenas de alguns casos particulares com √ 2 e √ 3. 2.1.1 Aproximação por Inteiros Se arredondarmos qualquer número real, substituindo-o pelo inteiro mais próximo, o erro cometido será no máximo igual a 12 . Exemplo 2.1.1 Se substituirmos 6, 3 por 6; ou então 9, 7 por 10; ou ainda 7, 5 por 7 ou 8, o erro não será, em cada caso, maior do que 12 . X Se substituirmos um número irracional pelo inteiro mais próximo, o erro será menor do que 12 e começamos a teoria das aproximações com este caso simples. 17 UNIVATES – Centro Universitário Prof.Dr. Claus Haetinger 18 Teorema 2.1.2 Para qualquer número irracional α, existe um único m ∈ Z, tal que −12 < α−m < 12 . prova: Escolhemos m como sendo o inteiro mais próximo de α. Por exemplo, se α = √ 3 = 1, 73 . . ., escolheremos m = 2 ou, se α = 2 √ 2 = 3, 46 . . ., escolheremos m = 3. Assim, m poderá ser o inteiro imediatamente maior do que α, ou imediatamente menor do que α, aquele que estiver mais próximo (é óbvio que um deles estará mais próximo de α do que o outro pois, caso contrário, α estaria bem no meio, entre dois inteiros consecutivos, digamos n e n + 1. Mas, então α seria igual a n + 12 ∈ Q??!!). Dito de outra forma, qualquer segmento AB, de comprimento unitário, marcado na reta real, conterá exatamenteum inteiro, a não ser que A e B sejam pontos inteiros. Chamemos, agora, de A o ponto correspondente ao número α − 12 e B, o ponto correspondente a α + 12 . Como α ± 12 não são inteiros (nem sequer são racionais), sabemos que A e B não podem ser inteiros. Chamando de m o único inteiro no segmento AB, vemos que m está estritamente entre α− 12 e α+ 12 . Assim, α− 12 < m < α+ 12 . Subtraindo α, obtemos −12 < m− α < 12 . Estando o número m − α entre −12 e 12 , o mesmo acontecerá com o número que se obtém trocando seu sinal e, portanto, α−m estará entre −12 e 12 . Provamos a existência. Vejamos a unicidade: o inteiro m é único, pois se existisse outro inteiro n, satisfazendo −12 < α−n < 12 , então n também satisfaria −12 < n−α < 12 . Somando α a estas desigualdades, vemos que n satisfaria α− 12 < n < α+ 12 . Mas, o segmento AB contém apenas um inteiro, de modo que n = m. 2.1.2 Aproximação por Números Racionais Um modo de se obter valores aproximados de um número irracional, como √ 2, é usar a forma decimal √ 2 = 1, 41421 . . .. Os números 1; 1, 4; 1, 41; 1, 414; 1, 4142; 1, 41421; . . . formam uma seqüência de aproximações, cada vez mais precisas, de √ 2. Os números da seqüência são todos racionais. Temos, assim, uma seqüência infinita de aproximações racionais de √ 2: 1 1 , 14 10 , 141 100 , 1414 1000 , 14142 10000 , 141421 100000 , . . . . (2.1) À medida que avançamos na seqüência, estes números se aproximam cada UNIVATES – Centro Universitário Prof.Dr. Claus Haetinger 19 vez mais de √ 2. Ademais, podemos escrever as desigualdades 1 1 < √ 2 < 21 , 14 10 < √ 2 < 1510 , 141 100 < √ 2 < 142100 , 1414 1000 < √ 2 < 14151000 , 14142 10000 < √ 2 < 1414310000 , 141421 100000 < √ 2 < 141422100000 , ... Estas desigualdades mostram que uma infinidade de termos de (2.1) estão tão próximos de √ 2 quanto se deseje. Exemplo 2.1.3 Suponhamos que desejamos nos certificar de que exis- tem infinitos números racionais diferindo de √ 2 por menos de 0, 0001. Po- demos obter estes números, escolhendo todos os termos da seqüência (2.1), salvo os quatro primeiros. X Observação 2.1.4 Os números racionais (2.1) apresentam uma parti- cularidade: seus denominadores são potências de 10. É posśıvel que existam, entre os números racionais, melhores aproximações de √ 2, sem qualquer restrição a seus denominadores. Exemplo 2.1.5 Examinemos o número irracional π para ilustrar nossa discussão. Como π tem valor 3, 14159 . . ., a seqüência para π, análoga a (2.1), é 3 1 , 31 10 , 314 100 , 3141 1000 , 31415 10000 , 314159 100000 , . . . . (2.2) No entanto, sabemos que 227 está mais próximo de π do que 31 10 . De fato, 22 7 está mais próximo de π do que 314100 , mas não mais próximo do que os termos subseqüentes da seqüência (2.2). X Para não mais dependermos dos denominadores 10, 102, 103, etc., mos- traremos que todo número irracional pode ser aproximado por um número racional de denominador arbitrário. Teorema 2.1.6 Sejam λ um número irracional n ∈ N? quaisquer. Então existe um número racional de denominador n, digamos mn , tal que − 12n < λ− mn < 12n . Motivaremos a prova deste teorema com um exemplo. UNIVATES – Centro Universitário Prof.Dr. Claus Haetinger 20 Exemplo 2.1.7 Suponhamos que λ seja √ 2 e n = 23. Considere- mos o irracional 23 √ 2 que na notação decimal de √ 2: 1, 41421 . . . vale 23 √ 2 = 32, 52 . . .. Portanto, o inteiro mais próximo de 23 √ 2 é 33 e este é o “m” do teorema 2.1.2 que, para α = 23 √ 2, afirma −12 < 23 √ 2− 33 < 12 . Mas, 33 é também o “m” do teorema 2.1.6, pois podemos dividir estas de- sigualdes por 23 e obter − 146 < √ 2− 3323 < 146 . X prova: Sabemos que ∀λ irracional e ∀n ∈ N?, o número nλ é irracional (ver teorema 4.1, caṕıtulo 4 de [15]). Definiremos, então, m como sendo o inteiro mais próximo de nλ. Assim, pelo teorema 2.1.2, −12 < nλ−m < 12 . Estas desigualdades podem ser divididas por n, dando − 12n < λ− mn < 12n . Exerćıcio 2.1.8 Encontra os números racionais mn como no teorema 2.1.6, para os casos em que λ = √ 2 e n = 1, 2, . . . , 10. Solução: Um cálculo simples mostra que os inteiros mais próximos de √ 2, 2 √ 2, 3 √ 2, 4 √ 2, 5 √ 2, 6 √ 2, 7 √ 2, 8 √ 2, 9 √ 2, 10 √ 2 são, respectivamente, 1, 3, 4, 6, 7, 8, 10, 11, 13 e 14. Portanto, os racionais pedidos são 11 , 3 2 , 4 3 , 6 4 , 7 5 , 8 6 , 10 7 , 11 8 , 13 9 , 14 10 , e o erro em cada aproximação é menor que 1 2n , onde n é o inteiro no denominador. X O exemplo 2.1.8 mostra que as frações mn do teorema 2.1.6 não são, necessariamente, irredut́ıveis. 2.1.3 Aproximações Melhores ¿Será que as proximações do teorema 2.1.6 podem ser feitas com erros menores que 13n , 1 4n , ou menores ainda? A resposta é sim. No próximo teorema veremos que λ pode ser aproximado por mn , a menos de 1 kn , ∀k > 0. No entanto, enquanto no teorema 2.1.6 a aproximação a menos de 12n podia ser conseguida ∀n > 0, a com erro menor do que 1kn , com um dado k > 0, não podera, no teorema 2.1.9, ser obtida para todos os inteiros n. ¿Será que podemos aproximar qualquer número irracional λ por mn , a menos de 1 n2 , ou 1 n3 , ou com erro menor ainda? A menos de 1 n2 , sim; a menos de 1 n3 , não. Mas, estes serão tópicos para momentos posteriores, fugindo dos nossos propósitos no momento. Mais uma vez, detalhes podem ser obtidos em [15] e [17]. Teorema 2.1.9 Quaisquer que sejam o número irracional λ e o in- teiro positivo k, existe um mn ∈ Q, cujo denominador não excede k, tal que − 1nk < λ− mn < 1nk . Ao invés de provarmos o teorema ∀λ, k, comprová-lo-emos num caso particular, onde λ = √ 3 e k = 8 (a prova do teorema é bastante longa, porém segue os mesmos passos que utilizaremos no caso particular abaixo). Inicialmente, enumeremos os múltiplos de λ desde 1 ·λ até k ·λ. Façamos uma lista dos múltiplos de √ 3, escrevendo cada múltiplo como soma de dois UNIVATES – Centro Universitário Prof.Dr. Claus Haetinger 21 números positivos, um inteiro e um menor que 1: √ 3 = 1 + 0, 732 . . . ⇒ √3− 1 = 0, 732 . . . 2 √ 3 = 3 + 0, 464 . . . ⇒ 2√3− 3 = 0, 464 . . . 3 √ 3 = 5 + 0, 196 . . . ⇒ 3√3− 5 = 0, 196 . . . 4 √ 3 = 6 + 0, 928 . . . ⇒ 4√3− 6 = 0, 928 . . . 5 √ 3 = 8 + 0, 660 . . . ⇒ 5√3− 8 = 0, 660 . . . 6 √ 3 = 10 + 0, 392 . . . ⇒ 6√3− 10 = 0, 392 . . . 7 √ 3 = 12 + 0, 124 . . . ⇒ 7√3− 12 = 0, 124 . . . 8 √ 3 = 13 + 0, 856 . . . ⇒ 8√3− 13 = 0, 856 . . . . As expressões à direita foram obtidas das da esquerda, subtraindo a parte inteira. A seguir, separemos o intervalo [0, 1] em oito partes iguais I1, I2, . . ., I8. Assim, I1 = (0, 18), I2 = ( 1 8 , 2 8), I3 = ( 2 8 , 3 8), . . .. 1 Classificaremos, agora, as oito partes decimais dos múltiplos de √ 3 nas categorias I1, I2, . . ., I8, do modo seguinte: 0, 732 . . . ∈ I6 (porque 0, 732 . . . está entre 58 e 68); 0, 464 . . . ∈ I4; 0, 196 . . . ∈ I2; 0, 928 . . . ∈ I8; 0, 660 . . . ∈ I6; 0, 392 . . . ∈ I4; 0, 124 . . . ∈ I1; 0, 856 . . . ∈ I7. Usaremos o número que está em I1 na lista acima: 0, 124 . . . ∈ I1, i.e., 7 √ 3−12 ∈ I1. Mas, os números em I1 estão entre 0 e 18 , de modo que 0 < 7 √ 3− 12 < 18 . Como o número 7 √ 3− 12 está entre 0 e 18 , ele certamente estará entre −18 e 18 . Portanto, −18 < 7 √ 3 − 12 < 18 . Dividindo esta desigualdade por 7, obtemos − 17·8 < √ 3− 127 < 17·8 . Este é um resultado na forma do enunciado do teorema 2.1.9, com k = 8, n = 7 e m = 12. X Baseamos nosso argumento no fato de 7 √ 3 − 12 estar em I1. O que teŕıamos feito se não existisse nenhum outro número no intervalo I1? A resposta é que então em um dos intervalos I2, I3, . . ., I8 existiriam dois ou mais números. No exemplo acima, não somente existe um número em I1, como também existem dois números em I4 e dois em I6. Consideremos o par em I6: 0, 732 . . . ∈ I6, i.e., √ 3− 1 ∈ I6; e 0, 660 . . . ∈ I6, i.e., 5 √ 3− 8 ∈ I6. Sempre que dois númerosestiverem em I6 (ou em qualquer um destes intervalos), eles estarão a menos de 18 um do outro, de modo que a sua diferença estará entre −18 e 18 . Em particular, para os dois números em I6, temos: −18 < (5 √ 3−8)−(√3−1) < 18 , donde −18 < 4 √ 3−7 < 18 . Dividindo por 4, obtemos − 14·8 < √ 3− 74 < 14·8 , e este é um outro resultado na forma do enunciado do teorema 2.1.9, para λ = √ 3 e k = 8, desta vez com n = 4 e m = 7. X 2.1.4 Aproximações a Menos de 1 n2 Vamos agora obter aproximações com erros menores do que 1 n2 . Teorema 2.1.10 Para todo número irracional λ, existem infinitos ra- cionais mn , em forma irredut́ıvel, tais que − 1n2 < λ− mn < 1n2 . 1Como desejamos obter desigualdades estritas, é conveniente interpretar “entre” como “estritamente entre”; assim, os intervalos Ij contêm todos os pontos u tais que (j−1) 8 < u < j 8 UNIVATES – Centro Universitário Prof.Dr. Claus Haetinger 22 prova: Observemos, inicialmente, que qualquer mn ∈ Q satisfazendo a desigualdade do teorema 2.1.9, automaticamente satisfará a do teorema 2.1.10. A razão é que como n não excede k, de k ≥ n podemos deduzir uqe 1 k ≤ 1n e 1kn ≤ 1n2 . Portanto, qualquer número que esteja entre − 1kn e 1kn deverá estar entre − 1 n2 e 1 n2 . A seguir mostraremos que se um mn ∈ Q, não em forma irredut́ıvel, satisfizer as desigualdades do teorema, então o mesmo número racional, em forma irredut́ıvel, satisfará as desigualdades apropriadas. Denotemos por MN a forma irredut́ıvel de mn . Podemos supor, sem perda de generalidade, que n,N > 0, deixando qualquer sinal negativo ser absorvido pelo numerador. Temos, então: mn = M N , 0 < N < n, porque simplificar uma fração até torná-la irredut́ıvel não altera o valor da fração, mas reduz o tamanho do denominador. Então 1n < 1 N e 1 n2 < 1 N2 e, portanto, se λ satisfizer − 1 n2 < λ− mn , 1n2 , automaticamente satisfará − 1N2 < λ− MN < 1N2 . Para completar a prova do teorema 2.1.10, precisamos mostrar que existe uma infinidade de racionais, em forma irredut́ıvel, satisfazendo as desigual- dades. Suponhamos, por absurdo, que exista apenas uma quantidade finita des- tas frações, digamos m1n1 , m2 n2 , m3n3 , . . ., mi ni . Consideremos, então, os i números λ− m1n1 , λ− m2 n2 , λ− m3n3 , . . ., λ− mi ni . Sabemos que todos eles são irracionais e, portanto, nenhum deles é zero. alguns podem ser positivos, outros negativos; vamos esccolher um inteiro k, tão grande que 1k esteja entre 0 e todos os números positivos e− 1k esteja entre 0 e todos os números negativos. Isto pode ser feito porque, quanto maior escolhermos k, mais próximos de 0 estarão os números 1k e − 1k . Escolhamos, então, k tão grande que as seguintes desigualdades sejam todas falsas: − 1k < λ− m1n1 < 1k , − 1k < λ− m2n2 < 1k , ... − 1k < λ− mini < 1k . (2.3) Para este valor de k, vamos aplicar o teorema 2.1.9 e obter um número racional mn , tal que − 1kn < λ− mn < 1kn . Isto nos diz que λ − mn está entre − 1kn e 1kn e, portanto, λ − mn terá que estar entre − 1k e 1k ; em śımbolos: − 1k < λ − mn < 1k . mas, como todas as desigualdades de (2.3) são falsas, conclúımos que mn é diferente de cada um dos i números m1n1 , m2 n2 , . . ., mini . Portanto, obtivemos mais um números racional satisfazendo asdesigualdades do teorema 2.1.10. Exerćıcio 2.1.11 Determina quatro aproximações racionais (irre- dut́ıveis) de π, suficientemente próximas de π para satisfazer as desigualdes do teorema 2.1.10. Solução: Sendo π = 3, 14159 . . ., então − 1 12 < π− 31 < 112 e − 112 < π− 41 < 112 . Para achar duas outras aproximações, podemos usar o método do teorema 2.1.6 UNIVATES – Centro Universitário Prof.Dr. Claus Haetinger 23 para obter os números racionais mais próximos de π, com denominadores 2, 3, etc: 62 , 9 3 , 13 4 , 16 5 , 19 6 , 22 7 , . . .. Rejeitamos 62 e 9 3 por não serem frações irredut́ıveis e testamos as demais para ver se satisfazem as desigualdades do teorema 2.1.10; por exemplo, − 136 < π − 196 < 136 (Verdade!). Somos, assim, levados a rejeitar 134 e 16 5 mas aceitar 19 6 e 22 7 . Portanto, um conjunto de respostas ao problema seria 31 , 4 1 , 19 6 e 22 7 . O número 227 é uma aproximação muito boa de π. Não existe número racional com denominador entre 1 e 56 que esteja mais próximo de π. O número 17957 está um pouco mais próximo de π que 22 7 , mas não satisfaz as desigualdades do teorema 2.1.10. O número racional 355113 satisfaz as desi- gualdades do teorema 2.1.10 e está bem mais próximo de π do que 227 . De fato, suas seis primeiras casas decimais coincidem com as de π. X Pode-se demonstrar a seguinte versão mais forte do teorema 2.1.10: Teorema 2.1.12 Para todo número irracional λ, existem infinitos números mn ∈ Q, tais que − 1n(n+1) < λ− mn < 1n(n+1) . Com ajuda deste teorema, no exemplo acima, o número 41 (que é uma aproximação relativamente grosseira de π) pode ser eliminado. 2.1.5 Limitações das Aproximações Mostramos no teorema 2.1.6 que, ∀λ irracional, existem infinitos mn ∈ Q tais que − 12n < λ − mn < 12n . Depois, no teorema 2.1.10, provamos que existem infinitos mn tais que − 1n2 < λ− mn < 1n2 . Será que é posśıvel demonstrar que existem infinitos mn tais que − 12n2 < λ− mn < 12n2 ? A resposta é sim, mas não o demonstraremos aqui. De fato, existe um teorema famoso afirmando que, ∀λ irracional, existem infinitos m n tais que − 1√5n2 < λ − m n < 1√ 5n2 e, ainda mais, que √ 5 é a constante que fornece a melhor aproximação posśıvel deste tipo. Isto significa que, se substituirmos √ 5 por qualquer constante maior, a afirmação torna-se falsa. Para dar uma idéia de como é posśıvel demonstrar que existe um limite para o tamanho da constante, vamos provar o seguinte resultado: Proposição 2.1.13 Não existem infinitos números racionais mn tais que − 1 5n2 < √ 2− m n < 1 5n2 . (2.4) prova: Provaremos, de fato, que (2.4) é imposśıvel ∀n ∈ N tal que n > 10. A prova é indireta. Vamos supor que (2.4) seja válida para alguns m,n ∈ Z, com n > 10. A desigualdade − 1 5n2 < √ 2 − mn implica, para n > 10, que m n < √ 2 + 1 5n2 < √ 2 + 1 500 < 2. (2.5) Por outro lado, a desigualdade √ 2− mn < 15n2 implica, para n > 10, que m n > √ 2− 1 5n2 > √ 2− 1 500 > 1. (2.6) UNIVATES – Centro Universitário Prof.Dr. Claus Haetinger 24 Se somarmos mn aos membros das desigualdades (2.4), obtemos m n − 1 5n2 < √ 2 < m n + 1 5n2 . (2.7) Se provarmos ser cada uma destas três partes positiva, podemos elevá- las ao quadrado e manter as desigualdades. Por (2.6) vemos que mn − 15n2 > 1 − 1 5n2 > 1 − 1500 > 0. Portanto, todas as partes de (2.7) são positivas e, elevando-as ao quadrado, obtemos( m n − 15n2 )2 < 2 < ( m n + 1 5n2 )2, m2 n2 − 2m 5n3 + 1 25n4 < 2 < m 2 n2 + 2m 5n3 + 125n64 . Multiplicando por n2, obtemos m2 − 2m 5n + 1 25n2 < 2n2 < m2 + 2m 5n + 1 25n2 . (2.8) Agora, por (2.5), vemos que m2 + 2 5 (m n ) + 1 25n2 < m2 + 2 5 (2)+ 1 25n2 < m2 + 4 5 + 1 2500 < m2 +1. (2.9) Por outro lado, por (2.5) podemos escrever m2 − 2 5 (m n ) + 1 25n2 > m2 − 2 5 (m n ) > m2 − 4 5 > m2 − 1. (2.10) Aplicando (2.9) e (2.10) a (2.8), obtemos m2 − 1 < m2 − 2 5 (m n ) + 1 25n2 < 2n2 < m2 + 2m 5n + 1 25n2 < m2 + 1, ou seja, m2 − 1 < 2n2 < m2 + 1. Mas, 2n2 ∈ N e se estiver entre os inteiros m2− 1 e m2 +1, terá que ser igual a m2. Conclúımos, então, que 2n2 = m2. donde 2 = m 2 n2 , ou seja, √ 2 = mn ∈ Q??!! 2.2 Um Resumo Vimos vários resultados sobre o grau de precisão com que um número irracional λ pode ser aproximado por infinitos mn ∈ Q. O teorema mais forte afirmou que λ pode ser aproximado a menos de 1 n2 . Provamos um resultado negativo, a saber, que não existem infinitos racionais mn a 1 5n2 de√ 2. Um resultado negativo análogo é válido para qualquer número algébrico. É verdade, embora não o demonstramos aqui, que não existem infinitos números racionais mn a menos de 1 n3de qualquer número algébrico λ. O mesmo não pode ser afirmado a respeito de números transcendentes em geral; é verdade para alguns, mas não para todos os transcendentes. No caṕıtulo 7 do livro de Ivan Niven [15], é exibido um número que pode ser aproximado por infinitos mn , não apenas a menos de 1 n3 , mas a menos de 1 n4 , 1 n100 e, na verdade, a menos de 1 nj para qualquer j que o aluno escolher, não importando quão grande. Este número não é algébrico mostrando, assim, que existem números transcendentes. Porém, isto já é uma outra história. Outro enfoque algébrico dos números reais pode ser visto no livro de Abramo Hefez ([13]). CHA ETINGER Caṕıtulo 3 Ráızes Complexas de Polinômios 3.1 Introdução Todos nós sabemos quão importante é a determinação das ráızes de um polinômio, além de constituir isso um problema que empolgou os matemáticos desde sempre. Com a pesquisa sobre o assunto obtiveram-se vários resultados como: • a fórmula para o polinômio de 2o. grau (Báskara); • a fórmula para o polinômio de 3o. grau (Cardano, Scipio del Ferro, Tartaglia); • a solução trigonométrica para o polinômio de 4o. grau (Ferrari); • a impossibilidade de solução em termos dos coeficientes para po- linômios de grau igual ou superior ao 5o. (Abel, Galois); • o teorema fundamental da álgebra (Gauss); • a condição necessária para uma raiz ser racional; • a condição necessária e suficiente para um número real ser um limitante superior, ou um limitante inferior do conjunto das ráızes reais; • o teorema do zero (Weierstrass); • processos numéricos aproximados; • a regra dos sinais (Descartes); • o lema de Gauss; • o critério de Eisenstein. Nosso objetivo é comentar alguns dos resultados acima, apresentando um método que mostra-se útil no cálculo de ráızes complexas de um polinômio a uma variável com coeficientes reais ou mesmo complexos. 25 UNIVATES – Centro Universitário Prof.Dr. Claus Haetinger 26 3.2 Uma Generalização do Algoritmo de Briot- Ruffini O algoritmo de Briot-Ruffini para a divisão de um polinômio f(x) de grau n por um polinômio g(x) = x− a de grau 1 é de fácil aplicação e serve para verificarmos se um determinado elemento a é ou não raiz da equação polinomial f(x) = 0. Apesar de fazer uma grande restrição ao grau do divisor g(x), é um algoritmo amplamente divulgado e utilizado no ensino médio. Muitas vezes, sabemos de antemão algumas das ráızes da equação f(x) = 0 e, para fatorá-la, temos duas opções comumente utilizadas: o método da divisão euclidiana (método da chave), ou então repetições suces- sivas do algoritmo da Ruffini. A primeira opção é, via de regra, enfadonha e extremamente trabalhosa. A segunda, por sua vez, apresenta uma série de cálculos intermediários que são desnecessários, tendo em vista que procura- mos apenas o último quociente das divisões. Pois bem, aqui mostraremos que esse algoritmo pode ser generalizado. É posśıvel obter um algoritmo semelhante, tembém de fácil aplicação, no qual o divisor g(x) pode ter qualquer grau. Esse algoritmo pode ser utili- zado também como uma alternativa à divisão euclidiana tradicional de dois polinômios quaisquer, estudada na 7a. série do ensino fundamental e revista no ensino médio sem modificações. Todos os polinômios mencionados doravante têm coeficientes reais; no entanto, eles poderiam ser polinômios de coeficientes complexos que tudo continuaria funcionando do mesmo modo. Vamos dividir, por g(x) = x−2, o polinômio f(x) = x4−2x3−5x2+2x−1. Neste caso, g(x) é da forma x− a, com a = 2. Temos o conhecido diagrama de Briot-Ruffini: 1 -2 -5 3 -1 2 – 2 0 -10 -14 1 0 -5 −7| -15 Neste diagrama, na primeira linha temos os coeficientes de f(x) na ordem decrescente dos graus (sem omitir os eventuais zeros) e na segunda linha à esquerda temos o valor de a. Cada elemento da 3a. linha é obtido somando-se os dois elementos da 1a. e 2a. linhas que se situam acima dele, com exceção do 1o. elemento, que é uma simples repetição do 1o. elemento da linha. Os elementos da 2a. linha são obtidos multiplicando-se a pelo elemento da 3a. linha situado na coluna anterior. É mais comum o diagrama anterior aparecer nos livros do ensino médio com a omissão da 2a. linha. Esta está sendo escrita para facilitar a com- paração com os exemplos a seguir. Os elementos da 3a. linha fornecem o quociente q(x) = x3 − 5x − 7 e o resto r(x) = −15 da divisão de f(x) por g(x). Vamos agora construir um diagrama semelhante para efetuarmos a divisão de f(x) = 2x7 + 5x6 − 13x5 + 10x4 + 12x3 + 2x2 − 16x + 2 por g(x) = x3 + 3x2 − 5x + 1: UNIVATES – Centro Universitário Prof.Dr. Claus Haetinger 27 2 5 -13 10 12 2 -16 2 -3 – -6 3 0 -9 -12 – – 5 – – 10 -5 0 15 20 – -1 – – – -2 1 0 -3 -4 2 -1 0 3 4| 5 1 -2 No diagrama acima, cada elemento da última linha é obtido somando-se os elementos acima dele, da coluna a qual pertence. De modo semelhante ao algoritmo de Briot-Ruffini, na última linha temos os coeficientes do quo- ciente e do resto da divisão: q(x) = 2x4 − x3 + 3x + 4 e r(x) = 5x2 + x− 2. Basta separar à direita tantos elementos quanto for o grau de g(x); uma vez determinados os coeficientes de r(x), os coeficientes do quociente q(x) são os que sobram à esquerda dos coeficientes de r(x). O algoritmo, aplicado ao nosso exemplo, é constitúıdo da seguinte forma: 1. Escrevemos na 1a. linha os coeficientes de f(x), seguindo a ordem de- crescente dos graus. Coeficientes nulos devem ser considerados; 2. Escrevemos os coeficientes de g(x), exceto o dominante, na 1a. coluna, com sinais contrários; iniciamos na 2a. linha, observando a ordem de- crescente das potências de x, incluindo os eventuais coeficientes nulos; 3. Repetimos o elemento da 1a. linha e 1a. coluna na última linha, 1a. coluna. Deixamos vagos os espaços correspondentes aos elementos situados abaixo da diagonal que se inicia no elemento da 1a. linha e 1a. coluna; 4. Os elementos da última linha são escritos da esquerda para a direita. Para cada elemento λ escrito na última linha, calculamos os produtos de λ pelos elementos da 1a. coluna (−3, 5,−1) e distribúımos esses produtos no diagrama segundo uma diagonal iniciada na 2a. linha e coluna imediatamente à direita de λ, “descendo” para a 4a. linha e 3 colunas à direita de λ; 5. Assim que for escrita a diagonal mencionada no item anterior, soma- mos os elementos escritos na coluna logo à direita de λ, escrevendo a soma n última linha da mesma coluna; 6. Repetimos (4) e (5) seguidamente, até escrevermos o elemento da última linha e última coluna do diagrama. Devem ser deixados vagos os espaços correspondentes aos elementos da 2a. e 3a. linhas situados acima da diagonal iniciada na última coluna da penúltima linha. A grande vantagem deste algoritmo é que não perdemos tempo escre- vendo potências de x, nem efetuando produtos e divisões do tipo xp · xq = xp+q e xp/xq = xp−q, que ocorrem diversas vezes no método tradicional; em relação aos coeficientes, não há diferença significativa entre a quantidade de operações aritméticas efetuadas nos dois métodos. Nota ainda que o algoritmo de Ruffini é um caso particular deste. Demonstração do algoritmo: podemos proceder de forma inteira- mente análoga à prova do algoritmo de Hörner-Briot-Ruffini. Portanto, fa- remos apenas um sketch da prova. UNIVATES – Centro Universitário Prof.Dr. Claus Haetinger 28 Sejam f(x) = anxn + an−1xn−1 + . . . + a0 e g(x) = xm − bm−1xm−1 − bm−2xm−2 − . . .− b0 dois polinômios tais que n ≥ m. Pelo algoritmo da di- visão de Euclides, existem polinômios q(x) = qn−mxn−m +qn−m−1xn−m−1 + . . . + q0 e r(x) = rm−1xm−1 + . . . + r0 tais que f(x) = g(x)q(x) + r(x). Desenvolvendo as operações com polinômios indicadas na igualdade anterior e comparando os coeficientes dos polinômios do 1o. e do 2o. membros, obtemos n + 1 igualdades envolvendo ai, bi, qi ou ri, i ∈ {0, 1, . . . , n}. Isolando-se,nos primeiros membros das igualdades, os ter- mos qn−m, qn−m−1, . . . , q0, rm−1, . . . , r0 e ordenando-se de modo conveniente os elementos dos segundos membros da igualdade, obtemos o diagrama desejado. Observação 3.2.1 Se o coeficiente dominante, k, do divisor g(x) não for igual a 1, então procedemos da mesma forma como na aplicação usual do algoritmo de Ruffini: fazemos a divisão de f(x) por um polinômio auxiliar h(x) = 1kg(x), que tem o coeficiente dominante igual a 1. O resto r(x) da divisão de f(x) por g(x) será o mesmo resto da divisão de f(x) por h(x) e o quociente q(x) da divisão de f(x) por g(x) será igual a 1k vezes o quociente s(x) da divisão f(x) por h(x). Exemplo 3.2.2 Dividir f(x) = 6x6− 10x5− x4− 7x3 + 35x2− 29x− 4 por g(x) = 3x4 + x3 − 4x + 7. Como o coeficiente dominante de g(x) é 3, consideramos o polinômio auxiliar h(x) = g(x)3 , ou seja, h(x) = x 4 + 13x 3 − 43x + 73 . A partir dos coeficientes de f(x) e h(x) constrúımos o seguinte diagrama: 6 -10 -1 -7 35 -29 -4 −1/3 – -2 4 -1 – – – 0 – – 0 0 0 – – 4/3 – – – 8 -16 4 – −7/3 – – – – -14 28 -7 6 -12 3| 0 5 3 -11 Observando a última linha deste diagrama, temos que o quociente da divisão de f(x) por h(x) é 6x2 − 12x + 3. Logo, o quociente da divisão de f(x) por g(x) é q(x) = 6x 2−12x+3 3 = 2x2− 4x+1. O resto da divisão de f(x) por g(x) é r(x) = 5x2 +3x− 11. X 3.3 Aplicações Em muitos problemas, em particular na busca de ráızes de equações poli- nomiais, divisões de polinômios surgem ao longo da resolução. Os exemplos seguintes ilustram isso e são aplicações do algoritmo de Ruffini generalizado. Observação 3.3.1 Se f(x) for um polinômio de coeficientes reais, po- demos calcular facilmente f(a + bı), o valor numérico de f em z = a + bı, onde a, b ∈ R, b 6= 0 e ı é a unidade imaginária. UNIVATES – Centro Universitário Prof.Dr. Claus Haetinger 29 Para tal, basta dividir f(x) por g(x) = (x−z)(x− z̄) = x2−2ax+a2+b2, obtendo assim um quociente q(x) e um resto r(x) = r1x + r0, ambos de coeficientes reais. A partir disso, obtemos f(x) = g(x)q(x) + r(x), o que implica f(a + bı) = q(a + bı) · g(a + bı) + r(a + bı). Como g(a + bı) = 0, temos que f(a + bı) = r(a + bı). Exemplo 3.3.2 Sendo f(x) = x5 + 5x4 − 2x3 + x2 − 3, vamos calcular f(1 + 2ı). Pela observação 3.3.1, calculemos r(x), o resto da divisão de f(x) por g(x) = [x− (1 + 2ı)] · [x− (1− 2ı)] = x2 − 2x + 5: 1 5 -2 1 0 -3 2 – 2 14 14 -40 – -5 – – -5 -35 -35 100 1 7 7 −20| -75 97 Do diagrama acima, temos que r(x) = −75x + 97. Por conseguinte, f(1 + 2ı) = r(1 + 2ı) = −75(1 + 2ı) + 97 = 22− 150ı. X Observa que obtivemos o resultado sem precisarmos efetuar trabalhosas potências de números complexos. Observação 3.3.3 Muitas equações polinomiais envolvem alguma di- visão de polinômios na sua resolução. No próximo exemplo apresentaremos um critério simples que pode ser usado na resolução de algumas equações polinomiais. Seja f(x) = anxn + . . .+a1x+a0 um polinômio de coeficientes inteiros. Se z = a + bı, a, b ∈ Z, b 6= 0 for uma raiz de f(x), então z̄ = a − bı também será uma raiz e, conseqüentemente, f(x) será diviśıvel por g(x) = (x− z)(x− z̄) = x2 − 2ax + a2 + b2. Fazendo x = 0, x = 1 e x = −1, obtemos que os inteiros f(0), f(1) e f(−1) devem ser diviśıveis por g(0), g(1) e g(−1), respectivamente. Assim, as posśıveis ráızes da forma a + bı, b 6= 0, de uma equação polinomial de coeficientes inteiros f(x) = 0 são as que satisfazem as seguintes condições: 1. a2 + b2 deve ser divisor de f(0) = termo independente de f(x); 2. 1− 2a + a2 + b2 deve ser um divisor de f(1) = soma dos coeficientes de f(x); 3. 1 + 2a + a2 + b2 deve ser divisor de f(−1). Usando o item (1) obtemos todas as posśıveis ráızes da forma a + bı, a, b ∈ Z, b 6= 0. Nota que temos somente uma quantidade finita de posśıveis ráızes dessa forma. Os itens (2) e (3) nos permitem eliminar várias falsas ráızes encontradas em (1). Devem restar assim poucas posśıveis ráızes de f(x) para serem realmente testadas. Para efetuarmos o teste, ou seja, para calcularmos f(a+bı), procedemos como no exemplo 3.3.2. UNIVATES – Centro Universitário Prof.Dr. Claus Haetinger 30 Exemplo 3.3.4 Vamos resolver a equação f(x) = x4 − 7x3 + 23x2 + 40x− 32 = 0 Vamos procurar as ráızes da forma a + bı, a, b ∈ Z, com b > 0. Se encontrarmos uma raiz desta forma, então a− bı também será raiz. Para que a condição (1) acima esteja satisfeita, as opções para a + bı, b > 0 são, pois: a2 + b2 ∈ {1, 2, 4, 8, 16, 32}, donde • x1 = 0 + 1ı; • x2 = 1 + 1ı; • x3 = −1 + 1ı; • x4 = 0 + 2ı; • x5 = 0 + 4ı; • x6 = 2 + 2ı; • x7 = −2 + 2ı; • x8 = 4 + 4ı; • x9 = −4 + 4ı. Entre essas opções, satisfazem os itens (2): 1− 2a + a2 + b2 divide 25 e (3): 1 + 2a + a2 + b2 divide −41, somente x3 e x8. Para calcularmos f(x3) e f(x8), dividimos f(x) por (x− x3)(x− x3) = x2 + 2x + 2 e por (x− x8)(x− x8) = x2 − 8x + 32: 1 -7 23 40 -32 -2 – -2 18 -78 – -2 – – -2 18 -78 1 -9 39 -20 -110 Como r(x) 6= 0, a divisão não é exata e, por conseguinte, x3 não é raiz de f(x). 1 -7 23 40 -32 8 – 8 8 -8 – -32 – – -32 -32 32 1 1 −1 0 0 Como a divisão é exata, x8 = 4 + 4ı e x8 = 4 − 4ı são ráızes de f(x). Além disso, observando a última linha do diagrama anterior, temos que as outras 2 são ráızes de x2 + x− 1 = 0. X Esse critério será de dif́ıcil aplicação quando o termo independente da equação polinomial possuir muitos divisores. No entanto, ele pode ser trans- formado num eficiente e simples programa de computador para a deter- minação desse tipo de raiz. Para o aluno interessado, fica como desafio a resolução da equação poli- nomial x6 − 4x5 + 13x4 − 16x3 − 4x2 + 100 = 0. CHA ETINGER Caṕıtulo 4 Polinômios em uma Variável sobre Subcorpos dos Complexos Este caṕıtulo é referente ao livro de Adilson Gonçalves ([12]). Va- mos introduzir os polinômios em uma “variável”(ou “indeterminada”). Es- peramos, entre outros objetivos, atingir também uma maior compreensão algébrica de Z. 4.1 Definições e Exemplos Seja K um corpo qualquer. Chamamos de polinômio sobre K na indeterminada x a expressão formal p(x) = a0 + a1x + . . . + amxm + . . . onde ai ∈ K, ∀i ∈ N e ∃n ∈ N tal que aj = 0, ∀j ≥ n. Dizemos que dois polinômios p(x) = ∞∑ i=0 aix i e q(x) = ∞∑ i=0 bix i sobre K são iguais se, e somente se, ai = bi em K, ∀i ∈ N. Se p(x) = 0 + 0x + . . . + 0xm + . . . indicaremos p(x) por 0 e o cha- mamos de o polinômio identicamente nulo sobre K. Assim, um po- linômio p(x) = ∞∑ i=0 aix i sobre K é identicamente nulo se, e somente se, ai = 0 ∈ K, ∀i ∈ N. Se a ∈ K indicaremos por a o polinômio p(x) = a0+a1x+. . .+amxm+. . . onde a0 = a, e ai = 0, ∀i ≥ 1. Chamamos ao polinômio p(x) = a, a ∈ K de polinômio constante a. Se p(x) = a0 + a1x + . . . + anxn + . . . é tal an 6= 0 e aj = 0, ∀j > n dizemos que n é o grau do polinômio p(x) e, nesse caso, indicamos p(x) = a0 + a1x + . . . + anxn, e o grau de p(x) por ∂p(x) = n. Denotemos por K[x] o conjunto de todos os polinômios, sobre K, na indeterminada x. 31 UNIVATES – Centro Universitário Prof.Dr. Claus Haetinger 32 Observa que não está definido o grau do polinômio 0, e ∂ pode ser inter- pretada como uma função do conjunto de todos os polinômios não nulos no conjunto N. Assim, ∂ : K[x] \ {0} −→ N p(x) Ã ∂p(x) = grau de p(x) . Agora vamos definir operações soma e produto no conjunto K[x]. Sejam p(x) = a0 + a1x + . . . + amxm + . . ., q(x) = b0 + b1x + . . . + brxr + . . . ∈ K[x]. Definimos p(x) + q(x) = c1 + . . . + ckxk + . . . onde ci = (ai + bi) ∈ K, e p(x) · q(x) = c0 + . . . + ckxk + . . . onde c0 = a0b0, c1 = a0b1 + a1b0, c2 = a0b2 + a1b1 + a2b0, . . ., ck = k∑ i=0 aibk−i, k ∈ N. Observa que a definição de produto provém da regra xm · xn = xm+n e da propriedade distributiva. Convencionam-se também as regras x0 = 1 e x1 = x. É de fácil verificação que (K[x], +, ·) é um domı́nio de integridade, onde o polinômio 0 é o elemento neutrode K[x] e o polinômio 1 é a unidade em K[x]. Observa que se identificarmos os elementos a ∈ K com os polinômios constantes p(x) = a podemos pensar em K[x] contendo o corpo K. Segue das definições que a função grau ∂ possui as seguintes proprieda- des: 1. ∂(f(x) + g(x)) ≤ max{∂f(x), ∂g(x)}, ∀f(x), g(x) ∈ K[x] não nulos tais que f(x) + g(x) 6= 0; 2. ∂(f(x) · g(x)) = ∂f(x) + ∂g(x), ∀f(x), g(x) ∈ K[x] não nulos. Suponhamos que um polinômio p(x) 6= 0 possua um inverso multipli- cativo em K[x]. Assim existe q(x) 6= 0 em K[x] tal que p(x) · q(x) = 1. Pela propriedade (2) acima, segue que p(x) = a 6= 0 é um polinômio cons- tante. Portanto, os únicos polinômios invert́ıveis em K[x] são os polinômios constantes não nulos. Convém observar que a notação formal de polinômios aqui introduzida é bastante conveniente, porém encobre o significado preciso do que seja uma indeterminada “x”. De fato, os polinômios p(x) = ∞∑ i=0 aix i nada mais são do que uplas (a0, a1, . . . , an, . . .) onde ai 6= 0 somente para um número finito de ı́ndices e com a canônica definição de igualdade entre uplas. A operação de soma de polinômios corresponde a natural operação de soma de uplas através das suas coordenadas enquanto a operação de produto de polinômios corresponde a seguinte regra de multiplicação: (a0, a1, . . . , an, . . .) · (b0, b1, . . . , bn, . . .) = (c0, c1, . . . , ck, . . .), onde ck = a0bk + a1bk−1 + . . . + ak−1b1 + akb), ∀k ∈ N. Agora, identificando: 1 ↔ (1, 0, 0, . . . , 0, . . .), x ↔ (0, 1, 0, . . . , 0, . . .) e a0+a1x+. . .+anxn ↔ (a0, a1, . . . , an, 0, . . .) temos uma realização concreta, através de uplas, das noções de indeterminada “x” e de polinômios nessa indeterminada. UNIVATES – Centro Universitário Prof.Dr. Claus Haetinger 33 Isso nos possibilita melhor entender a diferença entre funções polinomiais (em uma variável) sobre um corpo K e polinômios em uma indeterminada sobre um corpo K. Por função polinomial (em uma variável) sobre um corpo K entendemos a função f : K −→ K onde existem a0, . . . , an ∈ K tais que f(u) = a0 + a1u + . . . + anun, ∀i ∈ K. Uma função polinomial f sobre um corpo K é dita identicamente nula se f(u) = 0, ∀u ∈ K. Por exemplo, se K = Zp, p primo, sabemos (Teorema de Fermat) que up = u, ∀u ∈ K. Ou seja, a função polinomial f : Zp −→ Zp definida por f(y) = yp − y é a função identicamente nula sobre Zp. Mas é claro pela nossa definição de polinômios na indeterminada x que p(x) = xp − x não é o polinômio 0 sobre Zp. Em termos de uplas esse polinômio seria (0,−1, 0, . . . , 0, 1, 0, . . .) onde 1 figura na (p+1)-ésima coordenada. Assim, dois polinômios distintos podem induzir a mesma função polinomial sobre um corpo K (em corpos infinitos isto não ocorre). Se D é um domı́nio de integridade, então de modo análogo à construção de K[x] onde K é um corpo, podemos construir o domı́nio de integridade D[x] de todos os polinômios na indeterminada“x” com coeficientes em D. Por exemplo, Z[x] é o conjunto de todos os polinômios p(x) = a0+. . .+anxn, onde ai ∈ Z. Outro exemplo importante é o domı́nio K[x, y] dos polinômios em duas indeterminadas “x” e “y” com coeficientes em um corpo K. De fato, para isso é bastante construir o domı́nio D[y] em uma indeterminada “y” onde D = K[x] é o domı́nio dos polinômios em uma indeterminada “x”, com coeficientes em K. Observa que, pelas nossas considerações anteriores, x · y = y · x em D[y] = K[x, y]. Ainda de modo análogo podemos esten- der nossa construção para os domı́nios K[x1, . . . , xn] dos polinômios em n indeterminadas x1, . . . , xn, com coeficientes em um corpo K. Convém observar que certos teoremas que são válidos para K[x], K corpo (como por exemplo o algoritmo da divisão de Euclides) não são válidos em geral para os domı́nios D[x] onde D é um domı́nio de integridade (ver em Álgebra-IV: K[x, y] e Z[x] não são domı́nios de ideais principais). Apesar disso alguns resultados importantes se mantém quando passamos de um domı́nio D para o domı́nio D[x], como por exemplo, se D é um domı́nio fatorial então D[x] também o é. Em particular, Z[x] admite fatorização única como produto de certos polinômios que são análogos dos números primos em Z. 4.2 O Algoritmo da Divisão Sejam K um corpo e K[x] o domı́nio dos polinômios sobre K na inde- terminada x. Teorema 4.2.1 (Algoritmo da Divisão) Sejam f(x), g(x) ∈ K[x] e g(x) 6= 0. Então existem únicos q(x), r(x) ∈ K[x] tais que: f(x) = q(x) · g(x) + r(x) onde ou r(x) = 0 ou ∂r(x) < ∂g(x). prova: Sejam f(x) = a0+a1x+ . . .+anxn e g(x) = b0+b1x+ . . .+bmxm (∂g(x) = m). UNIVATES – Centro Universitário Prof.Dr. Claus Haetinger 34 Existência: se f(x) = 0, toma q(x) = r(x) = 0. Suponhamos f(x) 6= 0. Assim, ∂f(x) = n. Se n < m, tome q(x) = 0 e r(x) = f(x). Podemos assumir n ≥ m. Seja f1(x) tal que f(x) = anb−1m xn−m · g(x) + f1(x). É fácil observarmos que ∂f1 < ∂f . A prova do teorema segue por indução sobre ∂f = n. Se n = 0, n ≥ m ⇒ m = 0 e, portanto, f(x) = a0 6= 0, g(x) = b0 6= 0 e teremos f(x) = a0b−10 g(x), donde basta tomar q(x) = a0b −1 0 e r(x) = 0. Pela igualdade f1(x) = f(x) − anb−1m xn−mg(x) e ∂f1(x) < ∂f(x) = n temos, pela hipótese de indução: ∃q1(x), r1(x) tais que f1(x) = q1(x)g(x) + r1(x) onde r1(x) = 0 ou ∂r1(x) < ∂g(x). Segue imediatamente que: f(x) = (q1(x) + anb−1m xn−m) · g(x) + r1(x). Portanto, tomando q(x) = q1(x) + anb −1 m x n−m e r(x) = r1(x), provamos a existência dos polinômios q(x) e r(x) tais que f(x) = q(x)g(x) + r(x) com r(x) = 0 ou ∂r(x) < ∂g(x). Unicidade: sejam q1(x), q2(x), r1(x), r2(x) ∈ K[x] tais que: f(x) = q1(x)g(x) + r1(x) = q2(x)g(x) + r2(x) onde ri(x) = 0 ou ∂ri(x) < ∂g(x), i = 1, 2. Segue que: (q1(x) − q2(x)) · g(x) = r2(x) − r1(x). Mas, se q1(x) 6= q2(x), o grau do polinômio do lado esquerdo da igualdade acima é ≥ ∂g(x) enquanto que ∂(r2(x) − r1(x)) < ∂g(x)??!! contradição. Logo q1(x) = q2(x). Segue que r1(x) = f(x)− q1(x)g(x) = f(x)− q2(x)g(x) = r2(x). Este teorema 4.2.1 diz que K[x] é um domı́nio Euclidiano (ver [11]). Se f(x) = a0 + a1x + . . . + anxn ∈ K[x] é não nulo e α ∈ K é tal que f(α) = a0 + a1α + . . . + anαn = 0 ∈ K, dizemos que α é uma raiz de f(x) em K. Vamos agora provar uma proposição que limita o número dessas ráızes em um corpo. Observa que o polinômio x2 + 1 não possui ráızes em R. Proposição 4.2.2 Sejam K corpo e f(x) = a0+a1x+. . .+anxn ∈ K[x] não nulo de grau n. Então, o número de ráızes de f(x) em K é no máximo igual a ∂f(x) = n. prova: Se f(x) não possui ráızes em K a proposição está provada. Suponhamos que α ∈ K seja uma raiz de f(x). Como g(x) = x − α ∈ K[x], podemos usar o algoritmo da divisão. Assim, ∃q(x), r(x) ∈ K[x] tais que f(x) = q(x) · (x−α) + r(x) onde r(x) = 0 ou ∂r(x) < ∂g(x) = 1. Segue que r(x) = b0 é um polinômio constante, e temos f(x) = q(x)(x − α) + b0. Como f(α) = 0, vem que 0 = 0+ b0. Ou seja, r(x) = 0 e f(x) = q(x)(x−α) onde ∂q(x) = n − 1. Como K não tem divisores de zero, se β ∈ K é uma raiz qualquer de f , então f(β) = (β − α)q(β) = 0 ⇒ β = α ou β é raiz de q(x) ∈ K[x]. Assim as ráızes de f são α e as ráızes de q(x). Vamos usar indução sobre ∂f = n. Ora, se n = 0, f não possui ráızes em K e nada há a provar. Agora, por indução, ∂q(x) < ∂f(x) = n, q(x) possui no máximo ∂q(x) = n− 1 ráızes em K e, portanto, f(x) possui no máximo n ráızes em K. Esta proposição nos dá alguns corolários interessantes. Seja K um corpo. Se L ⊃ K é um corpo, dizemos que L é uma extensão de K. Observe que o polinômio x2 + 1 possui duas ráızes em C ⊃ R. UNIVATES – Centro Universitário Prof.Dr. Claus Haetinger 35 Corolário 4.2.3 Seja f(x) = a0 + a1x + . . . + anxn um polinômio não nulo de grau n em K[x]. Então, f(x) posui no máximo n ráızes em qualquer extensão L de K. prova: Basta observar que se f(x) ∈ K[x] e K ⊂ L, então f(x) ∈ L[x]. Agora usa o teorema anterior para o corpo L. Nota que o polinômiox3− 2 não possui ráızes em Q, possui apenas uma raiz em R e possui 3 ráızes em C. Assim, ao estendermos o corpo podemos conseguir mais ráızes de um dado polinômio, porém esse número de ráızes será sempre limitado pelo grau desse mesmo polinômio. Também o fato de trabalharmos com corpos é fundamental em relação ao corolário 4.2.3, pois o polinômio x2 + x possui 4 ráızes no anel Z6 = {0̄, 1̄, 2̄, 3̄, 4̄, 5̄}, com 4 > 2 = ∂(x2 + x). Corolário 4.2.4 Sejam f(x), g(x) ∈ K[x] onde K é um corpo com um número infinito de elementos. Então f(x) = g(x) ⇔ f(b) = g(b), ∀b ∈ K. prova: (⇒) Trivial da definição de igualdade de polinômios; (⇐) Seja h(x) = f(x) − g(x) ∈ K[x]. Assim, por hipótese, h(b) = 0, ∀b ∈ K e, como K é infinito, segue da proposição 4.2.2 que h(x) = 0. Ou seja, f(x) = g(x). 4.2.1 Polinômios Irredut́ıveis Sejam K um corpo e K[x] o domı́nio dos polinômios sobre K na indeter- minada x. Vamos introduzir os polinômios em K[x] que, dentro da analogia de K[x] com Z, fazem o mesmo papel dos números primos em Z. Esses polinômios serão chamados de polinômios irredut́ıveis sobre K. Seja f(x) ∈ K[x] tal que ∂f(x) ≥ 1. Dizemos que f(x) é um polinômio irredut́ıvel sobre K se toda vez que f(x) = g(x) · h(x), g(x), h(x) ∈ K[x], tivermos g(x) = a constante em K ou h(x) = b constante em K. Se f(x) for não irredut́ıvel sobre K, dizemos que f é redut́ıvel sobre K. Todo polinômio de grau 1 sobre um corpo M é irredut́ıvel sobre M . Também f(x) = x2 + 1 é irredut́ıvel sobre R, mas redut́ıvel sobre C. As- sim, um polinômio f(x) ∈ K[x] pode ser irredut́ıvel sobre K e redut́ıvel em alguma extensão L ⊃ K. 4.2.2 Fatorização Única Se u ∈ K \ {0} e se p1(x), . . . , pm(x) são polinômios irredut́ıveis sobre K, vamos usar a expressão f(x) = u · p1(x) · . . . · pm(x) de tal modo que incluiremos na mesma a possibilidade f(x) = u no caso de m = 0. Teorema 4.2.5 Seja K um corpo. Então todo polinômio f(x) ∈ K[x] \ {0} pode ser escrito na forma f(x) = u ·p1(x) · . . . ·pm(x), onde u ∈ K \{0} e p1(x), p2(x), . . . , pm(x) são polinômios irredut́ıveis sobre K (não necessaria- mente distintos). Mais ainda, essa expressão é única a menos da constante u e da ordem dos polinômios p1(x), . . . , pm(x). UNIVATES – Centro Universitário Prof.Dr. Claus Haetinger 36 prova: Seja f(x) ∈ K[x] \ {0}. Vamos provar por indução sobre ∂f(x) = n. Se n = 0, f(x) = u constante não nula. Assim, podemos assumir ∂f(x) = n ≥ 1. Suponhamos, pela hipótese de indução, que todo polinômio não nulo de grau menor que n pode ser escrito na expressão desejada, e vamos provar que f(x) também o pode. Por absurdo, vamos supor que f(x) não possa ser escrito como produto de irredut́ıveis. Então f(x) é redut́ıvel sobre K. Assim, ∃g(x), h(x) ∈ K[x], 1 ≤ ∂g(x) < n, 1 ≤ ∂h(x) < n, tais que f(x) = g(x) ·h(x). Agora, pela indução, g(x) = a·p1(x)·. . .·pr(x), a ∈ K\{0} e p1(x), . . . , pr(x) irredut́ıveis sobre K. Analogamente, h(x) = b·pr+1(x)·. . .·pm(x), b ∈ K\{0} e pr+1(x), . . . , pm(x) irredut́ıvies sobre K. Assim, f(x) = u · p1(x) · . . . · pm(x), com u = ab ∈ K \ {0} e p1(x), . . . , pm(x) irredut́ıveis sobre K. Isto prova a existência. Passemos a provar a unicidade da expressão. Suponhamos f(x) = u · p1(x) · . . . · pm(x) = u′ · p′1(x) · . . . · p′s(x) onde u, u′ ∈ K\{0} e p1(x), . . . , pm(x), p′1(x), . . . , p′s(x) são polinômios irredut́ıvies sobre K. Assim, temos p1(x) | p′1(x) · . . . ·p′s(x). Segue que ∃u′i ∈ K \{0} tal que p′i(x) = u ′ i · p1(x) (nesse caso dizemos que p′i(x) e p1(x) são associados em K[x]). O teorema segue agora por indução sobre m. Se m = 1 e p1(x) irredut́ıvel, temos que necessariamente s = 1 e p1(x) e p′i(x) são associados em K[x]. Podemos supor m > 1. De p′i(x) = u ′ i · p1(x) e sendo K[x] um domı́nio, temos que: u · p2(x) · . . . · pm(x) = u′ · u′i · p′1(x) · . . . · p′i−1(x) · p′i+1(x) · . . . · p′s(x). Pela hipótese de indução, m− 1 = s− 1 (i.e., m = s) e mais: cada p′j(x) está associado com algum pi(x) via uma constante, e isto termina a prova do teorema. 4.3 Lema de Gausss e o Critério de Eisenstein A verificação da irredutibilidade de um polinômio sobre um corpo é, em geral, um problema dif́ıcil. Veremos um teorema que nos dá condições suficientes para que um polinômio f(x) ∈ Q[x] seja irredut́ıvel sobre Q. Claramente, multiplicando f(x) pelo m.m.c. dos denominadores dos coefici- entes de f(x), podemos supor que f(x) ∈ Z[x]. Usaremos também a notação a - b significando “a não é um divisor de b”. Iniciamos com uma proposição (Lema de Gauss) que nos diz que irre- dutibilidade sobre Z de f(x) ∈ Z[x] é equivalente a irredutibilidade de f(x) sobre Q. Proposição 4.3.1 (Lema de Gauss): Seja f(x) ∈ Z[x] irredut́ıvel sobre Z. Então f(x) é irredut́ıvel sobre Q. prova: Suponhamos que f(x) seja irredut́ıvel sobre Z, mas f(x) = g(x) · h(x), onde g(x), h(x) ∈ Q[x] e 1 ≤ ∂g(x), ∂h(x) < ∂f(x). Claramente ∃m ∈ UNIVATES – Centro Universitário Prof.Dr. Claus Haetinger 37 N? tal que m · f(x) = g1(x) ·h1(x) onde g1(x), h1(x) ∈ Z[x] (o m é o m.m.c. de antes). Assim, temos: g1(x) = a0 + a1x + . . . + arxr, ai ∈ Z, h1(x) = b0 + b1x + . . . + bsxs, bi ∈ Z . Su- ponhamos agora que p | m, p primo (então p | mf(x) ⇒ p | g1(x)h1(x) ⇒ p | g1(x) ou p | h1(x)). Vamos provar que p | ai, ∀i ∈ {1, . . . , r} ou p | bj , ∀j ∈ {1, . . . , s}. Por absurdo: de fato, se ∃i ∈ {1, . . . , r} e ∃j ∈ {1, . . . , s} tais que p - ai e p - bj , consideremos i e j menores posśıveis com esta propriedade. Ora, como p | m, temos que p di- vide o coeficiente de xi+j do polinômio mf(x) = g1(x)h1(x), isto é, p | (b0 · ai+j + b1 · ai+j−1 + . . . + bj · ai + . . . + bi+j−1 · a1 + bi+j · a0). Pela nossa escolha de i e j temos que p divide cada parcela, exceto bj ·ai, do coeficiente de xi+j de g1(x) · h1(x). Como p divide toda a expressão, segue também que p | bj · ai (toda a expressão menos as parcelas diviśıveis). Mas, p primo. Então p | bj ou p | ai??!! contradição. Assim, se p primo, p | m ⇒ p | ai, ∀i ∈ {1, . . . , r} ou p | bj , ∀j ∈ {1, . . . , s}. Sem perda de generalidade, suponhamos que p | ai, ∀i ∈ {1, 2, . . . , r}. Assim, g1(x) = p · g2(x) onde g2(x) ∈ Z[x] e, se m = p ·m1, temos que p ·m1f(x) = p · g2(x) · h1(x) ⇒ m1f(x) = g2(x) · h1(x). Como o número de fatores primos de m é finito, prosseguindo no ar- gumento acima (ou por indução sobre o número de fatores primos de m), chegaremos a: f(x) = g?(x) · h?(x), onde g?(x), h?(x) ∈ Z[x] e g?(x) e h?(x) são múltiplos inteiros de g(x) e h(x), respectivamente, contradizendo a irre- dutibilidade de f(x) sobre Z. Teorema 4.3.2 (Critério de Eisenstein) Seja f(x) = a0 + a1x + . . . + anxn ∈ Z[x]. Suponhamos que exista um inteiro primo p tal que: 1. p - an; 2. p | a0, a1, . . . an−1; 3. p2 - a0. Então f(x) é irredut́ıvel sobre Q. prova: Pela proposição 4.3.1 (lema de Gauss) é suficiente provar que f(x) é irredut́ıvel sobre Z. Suponhamos por contradição que, f(x) = g(x) · h(x), g(x), h(x) ∈ Z[x] e 1 ≤ ∂g(x), ∂h(x) < ∂f(x) = n. Sejam g(x) = b0 + b1x + . . . + brxr ∈ Z[x], ∂g(x) = r, h(x) = c0 + c1x + . . . + csxs ∈ Z[x], ∂h(x) = s . Assim, n = r + s. Agora b0 · c0 = a0 e assim p | b0 ou p | c0 e, como p2 - a0, segue que p divide apenas um dos inteiros b0, c0. Sem perda de generalidade, supõe que p | b0 e p - c0. Temos an = br · cs coeficiente de xn = xr+s. Portanto p - br (pois p - an). Então p - br e p | b0. Seja bi o primeiro coeficiente de g(x) tal que p - bi. Ora, ai = b0 · ci + b1 · ci−1 + . . . + bi · c0 e, portanto, como p | b0, . . . , bi−1, p - bi e p - c0 ⇒ p - ai ⇒ i = n??!! absurdo, pois 1 ≤ i ≤ r < n. Vejamos alguns exemplos de polinômios irredut́ıveis sobre Q. UNIVATES – Centro Universitário Prof.Dr. Claus Haetinger 38 Exemplo 4.3.3 Seja f(x) = x3 + 2x + 10. O critério de Eisenstein se aplica para o primo p = 2, portanto f(x) é irredut́ıvel sobre Q. Exemplo 4.3.4 Seja p um número primo qualquer e seja f(x) = xn−p um polinômio de
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