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1º PERÍODO INTRODUÇÃO AO ENSINO DE HISTÓRIA Autores Professor Alysson Luiz Freitas de Jesus Doutorando em História Social pela Universidade de São Paulo - USP e mestre em História Social e Cultural pela Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG. Atualmente é professor do Departamento de História da Universidade Estadual de Montes Claros - Unimontes. Professora Filomena Luciene Cordeiro Mestre em História pela Universidade Severino Sombra – USS. Atualmente é professora do Departamento de História da Universidade Estadual de Montes Claros - Unimontes. SUMÁRIO Apresentação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 199 Unidade I: 1.2 1.3 . . . . . . . . . . . . 205 1.7 Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 215 Unidade II: 2.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 216 2.2 . . . . . . . . . . . . . . . . . 216 2.3 . . . . . . . . 221 2.4 . . . . . . . . . . . 223 Unidade III: O . . . . . . . . . . . 229 3.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 229 3.2 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 229 3.3 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 231 3.4 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 233 Unidade IV: 4.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 237 4.2 . . . . . . . . . . . . . . . . . 237 4.3 4.4 C . . . . . . . . . . . . . . . . . . 244 Unidade V: . . . . . . 247 5.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 247 5.2 . . . . . . . . 247 A história e o historiador: da antiguidade aos dias atuais. . 202 1.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 202 Reflexões sobre a História, do mundo antigo ao mundo contemporâneo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 202 A história como ciência a partir do século XIX 1.4 A História: do século XX ao século XXI . . . . . . . . . . . . . . . . . 206 1.5 A História hoje: ensino . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 207 1.6 A “História nova”: pesquisa e função social . . . . . . . . . . . . . . 212 2.5 A produção do conhecimento histórico e o ensino de história. . 225 2.6 Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 228 3.5 Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 236 4.5 Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 246 5.3 . . . . . . . . 249 5.4 Referências . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 257 Resumo. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 259 História: relações entre passado e presente e a produção do conhecimento histórico. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 216 A história do ensino de história no brasil Passado e presente: imagens construindo a história Ensino de história: do positivismo ao marxismo historiador e as metodologias de ensino O que é história? Para que serve a história? Como produzir história? Análise crítica das competências do ensino de história. . . 237 O ensino e a aprendizagem de história A história e a historiografia no brasil . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 240 oncepção de história e historiografia História e ensino: novos fatos e novas abordagens Dimensões, abordagens e domínios historiográficos Ensino de história: novos fatos e novas abordagens Referências básicas e complementares . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 261 Atividades de Aprendizagem - AA. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 263 A disciplina Introdução ao Ensino de História é um dos conteúdos de fundamental importância para o profissional que atuará como pesquisador e professor de história. A disciplina História tem as suas particularidades e, por isso mesmo, tem suas próprias ferramentas e instrumentos de análise. Você, enquanto historiador, tem a responsabilidade de compreender qual o papel que exerce na sociedade e, principalmente, como exercer esse papel. Com isso, essa disciplina objetiva permitir ao aluno refletir sobre questões teóricas e práticas do ofício do historiador. Portanto, se o “ser historiador” é um ofício, devemos, então compreender de que forma exercê-lo e, principalmente, qual a importância que o ensino da História tem para a sociedade em geral. Como o título da própria disciplina diz, trata-se de uma “introdução”, o que nos coloca diante de um desafio inicial, que deve ser percorrido durante todo o seu curso. Assim, quando estiver estudando “História Antiga”, “História do Brasil Império” ou “História Contemporânea”, você deve ter em mente que o ensino de História é o eixo que norteia toda a teoria e toda a prática da sua formação acadêmica. Os objetivos dessa disciplina são muito claros: ?estabelecer uma relação entre a evolução da história e a função do historiador em distintos momentos históricos; ?compreender as relações entre passado e presente na produção do conhecimento histórico e no ofício do historiador; ?propiciar uma melhor compreensão sobre os métodos do historiador em sala de aula; e ?analisar as novas fontes e abordagens da história nas últimas décadas e a função do historiador nos dias atuais. Tendo isso em mente, esse material foi produzido e dividido em cinco grandes unidades. APRESENTAÇÃO 199 Figura 01: Clio, a musa dos historiadores, inspirou vários homens a pensar na importância da História para a sociedade. Fonte: http://www.bp3.blogger.com/.../s320/clio_car.gif 200 Introdução ao Ensino de História UAB/Unimontes Na primeira unidade, intitulada “Da História e o Historiador: da antiguidade aos dias atuais”, vamos percorrer o caminho que a disciplina História atravessou nos últimos séculos, refletindo sobre o papel que a mesma exercia em diferentes sociedades. Nem sempre nos damos conta de que a história foi de fundamental importância para a constituição de inúmeras sociedades, antigas, modernas e contemporâneas. Na Unidade 2, intitulada “História: relações entre passado e presente e a produção do conhecimento histórico”, você perceberá o quanto a história está presente no seu cotidiano e em que medida o estudo do passado é fundamental para compreender o mundo em que vivemos. Se o tempo é a principal preocupação do historiador, é no conhecimento do passado e no questionamento do presente que a história tem o seu sentido. A Unidade 3, “O historiador e as metodologias de ensino” aborda a importância da História na sociedade, bem como as formas de se estruturar a produção do pensamento historiográfico por meio das suas metodologias de ensino. Na Unidade 4, “Análise crítica das competências do ensino de História”, avaliamos mais detidamente a questão do ensino de História, a partir das suas possibilidades nas relações de ensino e aprendizagem. Por fim, a última unidade, “História e Ensino: novos fatos e novas abordagens”, evidencia como se pode pensar os diversos domínios historiográficos, e os instrumentos que o historiador tem em suas mãos para exercer sua atividade docente. Entender como é possível “ensinar História” é, também, compreender como explicar o nosso próprio mundo, o que confere ao historiador um papel dinâmico e central na sua sociedade. Afinal, se nem todos sabem para que serve a história, o historiador tem a obrigação de sabê-lo, para construir uma sociedade mais justa e igualitária. Você também tem esse papel. Então, mãos à obra. Você perceberá, portanto, que essa disciplina será fundamental para todo o seu curso. Nas demais disciplinas temáticas é imprescindível que você saiba a função e as metodologias para o ensinoda História. O texto está estruturado a partir do desenvolvimento das unidades e subunidades. Você deverá perceber que as questões para discussão e reflexão (são muito importantes) que acompanham o texto, bem como as sugestões para transitar do ambiente de aprendizagem aos sites, para acessar bibliotecas virtuais na web, etc. As sugestões e dicas estão localizadas junto ao texto, aparecendo com os respectivos ícones. A leitura dos textos complementares indicados também é importante, pois mostram os possíveis desenvolvimentos e ampliações para o estudo e a discussão. São recursos que podem ser explorados de maneira eficaz por você, pois buscam promover atividades de observação e de investigação que permitem desenvolver habilidades próprias da análise sociológica e exercitar a leitura e a interpretação de fenômenos sociais e culturais. 201 História Caderno Didático - 1º Período Ao planejar esta disciplina consideramos que essas questões e sugestões seriam fundamentais, de forma a familiarizar o acadêmico, gradativamente, com a visão e procedimentos próprios da disciplina. Agora é com você! Explore tudo, abra espaços para a interação com os colegas, para o questionamento, para a leitura crítica do texto, bem como para as atividades e leituras complementares. Bom estudo! Os Autores 1UNIDADE 1 202 A HISTÓRIA E O HISTORIADOR: DA ANTIGUIDADE AOS DIAS ATUAIS 1.1 INTRODUÇÃO A própria expressão “legitimidade da história”, empregada por Marc Bloch, desde as primeiras linhas, mostra que para ele o problema epistemológico da história não é apenas um problema intelectual e científico, mas também um problema cívico e mesmo moral. O historiador tem responsabilidades e deve “prestar contas”. Jacques Le Goff, In: Marc Bloch, Apologia da História ou o Ofício de Historiador, p. 17. Você terá notado que a reflexão acima constitui um importante desafio. A sociedade não forma historiadores apenas para atuar no nível intelectual, mas, sobretudo, em um nível moral e cívico. “Prestar contas” à sociedade é fazer com que aquilo que estudamos possa atingir às pessoas mais “comuns”, em especial se notarmos a dimensão da responsabilidade do historiador. Essa é uma das questões mais urgentes da nossa prática e que norteará toda a nossa reflexão. Você tem consciência dessa responsabilidade? Pois é para isso que refletiremos sobre o ensino da história. Esta unidade está dividida nos seguintes tópicos: 1.1 Reflexões sobre a História, do mundo antigo ao mundo contemporâneo; 1.2 A História como ciência a partir do século XIX; 1.3 A História: do século XX ao século XXI; 1.4 A História hoje: ensino; e 1.5 A “História nova”: pesquisa e função social. 1.2 REFLEXÕES SOBRE A HISTÓRIA, DO MUNDO ANTIGO AO MUNDO CONTEMPORÂNEO Desde a Grécia antiga, a História passou a fazer parte do cotidiano das pessoas. É claro que não existiam historiadores oficiais. Entretanto, o passado era a ferramenta primordial na construção do modo de vida grego e, posteriormente, romano. PARA REFLETIR O mundo em que vivemos hoje tem total relação com o passado dos gregos e dos romanos, por exemplo. O legado da Grécia para o mundo ocidental é por todos nós conhecido. As suas cidades-estado, a função da mulher na sociedade, a estrutura tirânica e democrática de poder, enfim, são exemplos da relação entre o passado grego e o presente ocidental. No tempo de Péricles, o comparecimento às assembléias era aberto a “todo” cidadão. As assembléias reuniam centenas de atenienses do sexo masculino, com idade superior a dezoito anos. Todos os que compareciam tinham o direito de fazer uso da palavra. As assembléias eram espaço para debates públicos que possibilitam o exercício da democracia. Elas foram um importante elemento da construção da História das sociedades ocidentais, inspirando seus regimes democráticos no exemplo grego. Você acredita que a democracia é o d i r e i t o d e t o d o s participarem da vida pública e política? Os gregos nos ensinaram que não, pois mulheres, escravos e estrangeiros não eram considerados cidadãos gregos, E h o j e ? C o m o s e e s t r u t u r a a democracia? Talvez inspirados nos gregos a maioria dos estados ocidentais vivem sob uma “democracia representativa” onde, por meio de eleições, o povo se faz representado. A história da Grécia, portanto, nos permite pensar a nossa própria história. Os gregos foram os primeiros a tratar a história como objeto de Figuras 02 e 03: Em sociedades antigas, como Grécia e Roma, a História foi adquirindo espaço e credibilidade nas relações sociais e políticas. Fonte: http://www.naturlink.pt/canais/Artigo.asp?iArtigo=2055&iLingua=1 http://historiaeatualidade.blogspot.com/2008/05/tal-revoluo-francesa.html DICAS Pesquise o que é democracia para o povo grego e o que significa democracia para as sociedades atuais Figura 04: Modelo de Assembléia democrática Fonte: http://www.eb23-monte-caparica.rcts.pt/webquests/republica/ images/constituint1911_s_inaug1.jpg 203 História Caderno Didático - 1º Período pesquisa sistemática, separando as lendas dos fatos. Heródoto de Halicarnasso (484-425 a.C.), conhecido como o “pai da história”, relatou as guerras Greco-pérsicas. Ele também se preocupou em conhecer os povos cujas histórias contava, visitando o Egito, a Península Itálica e a Ásia Menor. Outro historiador, Tucídides (460-400 a.C.), pode ser considerado o criador da história objetiva, escrevendo a famosa obra “História da Guerra do Peloponeso”. Durante séculos, portanto, a história foi se constituindo como importante instrumento da compreensão e constituição das sociedades ocidentais. Perceba que são nessas sociedades que você se encontra, o que nos leva a crer que essa história construiu parte do mundo em que você vive. No mundo medieval, a história esteve, por longos dez séculos, sob controle do monopólio da Igreja Católica. Por meio de uma cultura teocêntrica, quase todas as explicações sociais, políticas e culturais eram dadas pela igreja. Deus era a fonte de explicação de todo o cotidiano e a Ele eram atribuídos todos os fenômenos racionais, físicos e sociais. Com o advento do mundo moderno, a razão e o homem se constituíram em princípios fundamentais para a explicação do mundo pós século XV. Se não era Deus o principal responsável por um fenômeno como a chuva, cabia ao homem procurar suas próprias razões, em reflexões mais ligadas ao cotidiano das pessoas do que ao mundo espiritual. O antropocentrismo passou a ser a chave de compreensão do mundo racional e moderno. No mundo em que você vive, você pauta as suas decisões impulsionado por questões de cunho espiritual ou racional? Por mais que a primeira opção ainda faça parte do seu dia-a-dia – em especial por vivermos em um país essencialmente católico – não podemos negar que a razão é elemento indispensável na compreensão do nosso mundo, o que confere ao historiador a necessidade da objetividade e do racionalismo no pensamento histórico. C A B F EGGLOSSÁRIO Teocentrismo:a concepção segundo a qual Deus é o centro do universo, tudo foi criado por Ele, por Ele é dirigido, e não há outra razão além do desejo divino sobre a vontade humana. Contrapõe-se ao antropocentrismo, biocentrismo, humanismo. Figura 05: A Igreja Católica estabeleceu durante séculos o monopólio do conhecimento e da cultura, submetendo a História ao “olhar” do clero. Fonte: http://www.souturista.com.br/vaticano.htm Antropocentrismo: Diz-se de teoria que tem o homem como referencial único, ou que interpreta o Universo em termos de valores, feitos e experiências humanas. 204 Introdução ao Ensino de História UAB/Unimontes C A B F EGGLOSSÁRIO 1.3 A HISTÓRIA COMO CIÊNCIA A PARTIR DO SÉCULO XIX No século XIX, a história vai ganhar maturidade. É consenso entre os historiadores que, nesse período, a históriaadquire parte do seu referencial teórico-conceitual. O século XIX se estruturou a partir das idéias liberais pós-Revolução Francesa, e os princípios de liberalismo e nacionalismo vão ser fundamentais para a formação e maturidade da história enquanto ciência. É nesse contexto, portanto, que a História recebe parte da sua cientificidade, estruturando a importância da mesma na sociedade e o papel do historiador enquanto agente transformador. O método histórico tornou-se guia e modelo das outras ciências humanas. Os historiadores adquirem prestígio intelectual e social, pois tinham finalmente estruturado seu conhecimento sobre bases empíricas positivas. Aqui se deu o nascimento de uma nova consciência histórica: a que enfatiza as “diferenças humanas no tempo”. (...) Como conhecimento das diferenças humanas, a história científica dará ênfase ao evento: irrepetível, singular, individual, com seu valor intrínseco, único. José Carlos Reis, In: A história entre a filosofia e a ciência. p. 8. Nos últimos 150 anos, a história, portanto, se transformou em uma disciplina, a partir de uma concepção racional e iluminista sobre o mundo. Esse mundo é conseqüência do ambiente que se formou pós Revolução Francesa, e das idéias liberais típicas desse contexto. Você sabia que nem todos os homens ligados às ciências humanas e sociais consideram a história uma ciência? Existe um debate intenso sobre a cientificidade da história. Historiadores franceses, ingleses, alemães e mesmo brasileiros vêm, nas últimas décadas, debatendo sobre No final do século XVIII, a França revolucionou o mundo derrubando definitivamente o antigo regime. O iluminismo permitiu novas concepções sobre o mundo e sobre o homem, a partir dos ideais de “liberdade, igualdade e fraternidade”. Figuras 06 e 07: Momentos da Revolução Francesa . Fonte: http://www.enciclopedia.com.pt/readarticle.php?article_id=740 http://www.historiadomundo.com.br/francesa/revolucao-francesa/ ATIVIDADES Pesquise por que a França é considerada o centro irradiador do pensamento cultural e liberal do mundo contemporâneo. 205 História Caderno Didático - 1º Período essa questão. Marc Bloch, um dos maiores historiadores das últimas décadas, nos diz: A história é uma ciência, mas uma ciência que tem como uma de suas características o fato de ser poética, pois não pode ser reduzida a abstrações, a leis e a estruturas. O positivismo, nesse sentido, permitiu à história adquirir parte da sua conotação científica, estruturando as suas primeiras bases metodológicas. A transição entre o século XIX e o século XX foi ainda mais produtiva. O homem é filho do seu tempo, o que determina o olhar do historiador sobre o mundo. A história é busca, portanto escolha. Seu objeto não é o passado: “a própria noção, segundo a qual o passado enquanto tal possa ser objeto de ciência é absurda”. Seu objeto é “o homem”, ou melhor, “os homens”, e mais precisamente “homens no tempo”. Marc Bloch, In: Apologia da história ou o ofício de historiador. p. 24. 1.4 A HISTÓRIA: DO SÉCULO XX AO SÉCULO XXI No século passado a história foi escrita e reescrita a partir de várias concepções. Os historiadores se viram diante de inúmeras abordagens históricas, o que permitiu um discurso cada vez mais aprimorado de sua ciência. A França teve um papel fundamental nesse processo, pois a partir da famosa Escola dos Annales possibilitou uma revolução na historiografia. Marc Bloch, autor já familiar no nosso curso, foi um dos principais nomes dessa corrente historiográfica. Marc Bloch, Lucien Febvre e Fernande Braudel são referências obrigatórias para o estudo da história no século XX. Entre as principais idéias desses historiadores estão: Esses historiadores fizeram uma releitura da história enquanto As primeiras décadas do século XX foram marcadas por guerras, e o homem passou a entender o seu mundo a partir de uma nova concepção de tempo, própria do século XX. ?a substituição da tradicional narrativa de acontecimentos por uma história-problema; ?análise da história de todas as atividades humanas e não apenas história política; e ?a colaboração e aproximação com outras disciplinas, tais como a geografia, a sociologia, a psicologia, a economia, e tantas outras. Na transição entre o século XIX e XX eclodiu a primeira guerra mundial. Você sabia que a história também passaria por intensas transformações? Figura 08: Campo de batalha da Primeira Guerra Mundial Fonte: http://forum.portaltibia.com.br/index.php Sugestões de leituras: Reis, José Carlos. História e Teoria, FGV 2006. Fontana, Josep. História: análise do passado e projeto social, Edusque, 1998. 206 Introdução ao Ensino de História UAB/Unimontes PARA REFLETIR DICAS ciência, inclusive com forte crítica à escola positivista do século XIX. O que esses historiadores estão propondo, na verdade, é uma história “nova”, que repense o papel do homem na sociedade na primeira metade do século XX. Pouca a pouco os annales converteram-se no centro de uma escola histórica. Foi entre 1930 e 1940 que Febvre escreveu a maioria de seus ataques aos especialistas canhestros e empiricistas, além de seus manifestos e programas em defesa de “um novo tipo de história” associado aos annales – postulando por pesquisa interdisciplinar, por uma história voltada para problemas, por uma história da sensibilidade, etc. Peter Burke, A Escola dos Annales (1929-1989), p. 38. Com a queda do muro de Berlim e o fim da União Soviética, o mundo se viu diante de novos desafios. Tais mudanças também atingiram o historiador. Será que ser historiador hoje requer as m e s m a s e s t r a t é g i a s e metodologias que existiam no século XIX? O que você acha que significa “ser historiador” e “ensinar história” no mundo de hoje? 1.5 A HISTÓRIA HOJE: ENSINO Nas últimas décadas, a história passou por intensas transformações. Novas fontes, novas metodologias e novas abordagens passaram a fazer parte do referencial teórico do historiador. A história passou por uma “revolução”. É evidente, portanto, que o historiador das últimas décadas se vê diante de novos desafios e, por isso mesmo, o ensino de história também deve ser repensado. Mas, quais são essas novidades? Um exemplo são as A partir da historiografia francesa, outros grandes centros intelectuais foram se destacando, tendo como exemplo a Inglaterra. No Brasil, o avanço da historiografia também se fez sentir, permitindo um aprimoramento no ensino e na pesquisa da história. Contudo, foi nas últimas décadas que a história teve os seus avanços mais siginificativos. Com a queda do Muro de Berlim e tantos outros eventos no final do século XX, a História enquanto ciência passou por inúmeras transformações, sendo necessário “revolucionar” o ensino de História. Pesquise na internet um pouco da biografia dos três grandes nomes da escola dos annales: Marc Bloch, Lucien Febvre e Fernande Braudel. Figura 09: Queda do Muro de Berlim Fonte: http://nacionalismo-de-futuro.blogspot.com/ 2004/04/o-declnio-da-europa-e-ideologia_16.html 207 História Caderno Didático - 1º Período ATIVIDADES novas fontes da história. Você sabia que um filme, uma música, ou mesmo um jogo de videogame são hoje objetos de estudo da história? Você sabia que a mídia tem hoje uma importante função no trabalho do historiador? Tudo isso reflete que os tempos de hoje são outros e, evidentemente, as leituras precisam se adaptar a essa nova realidade. Essas novas fontes podem oferecer uma enorme contribuição no ensino da história. Recursos audiovisuais, como os filmes por exemplo, são importantes ferramentas hoje no processo de ensino. A História é um recurso muito utilizado pelos diretores. Tais filmes fornecem importantes impressões sobre sociedades do passado e do presente. Figuras 10 e 11: Cartazes de obras cinematográficas Fonte:http://minefpp.blogspot.com/2007/03/cinema-corrompido.html http://filmes_portugueses.blogs.sapo.pt/30159.html Duas Tribos - Renato Russo Vou passar / Quero ver Volta aqui / Vem você Como foi / Nem sentiu Se era falso / Ou fevereiro Temos paz / temos tempo Chegou a hora / E agora é aqui. Cortaram meus braços / Cortaram minhas mãos Cortaram minhas pernas / Num dia de verão Num dia de verão / Num dia de verão Podia ser meu pai / Podia ser meu irmão Não se esqueça / Temos sorte E agora é aqui / Quando querem transformar Dignidade em doença / Quando querem transformar Inteligência em traição / Quando querem transformar Estupidez em recompensa / Quando querem transformar 208 Introdução ao Ensino de História UAB/Unimontes Esperança em maldição: / É o bem contra o mal E você de que lado está? / Estou do la...do do bem E você de que lado está? / Estou do la...do do bem. Com a luz e com os anjos / Mataram um menino Tinha arma de verdade / Tinha arma nenhuma Tinha arma de brinquedo / Eu tenho autorama Eu tenho Hanna-Barbera / Eu tenho pêra, uva e maçã Eu tenho Guanabara / E modelos revell O Brasil é o país do futuro / O Brasil é o país do futuro O Brasil é o país do futuro / O Brasil é o país Em toda e qualquer situação / Eu quero tudo pra cima/Pra cima http://www.musica.com/letras.asp?letra=1080692 A responsabilidade do professor de história é estar atento à esses novos desafios, bem como às dificuldades de utilizá-los. Para tal, não devemos nos esquecer que isso requer metodologias. Essas metodologias são fundamentais para a construção do conhecimento histórico. A música colocada acima é um exemplo que deve ser instrumento do historiador. A música retrata o momento da Ditadura Militar, a violência do regime por meio da tortura e a ideologia dos militares que acreditavam estar transformando o Brasil no “país do futuro”. A letra da música é altamente reveladora, mas não é suficiente para explicá-la. O historiador deve estar atento à outros indícios que não são claramente revelados, como o ritmo e sonoridade da música, bem como o momento e o contexto em que ela foi escrita. Além de se pesquisar a história da banda ou dos compositores que a escreveram. Isso tudo revela que sem metodologias e sem uma boa qualificação profissional fica impossível trabalhar tais fontes. Figuras 12 e 13: Capas de obras musicais brasileiras Fonte: http://jukebox-br.blogspot.com/2007_11_01_archive.html http://www.geocities.com/zelak_2000/engenheiros/disco/capa_filmes.jpg 209 História Caderno Didático - 1º Período Várias bandas de Rock e inúmeros compositores das décadas de 1980-1990 escreveram músicas que até hoje são símbolos de resistência, ou mesmo canções que representam grandes eventos históricos. Na sala de aula, essas mídias e essas novas fontes são hoje referências obrigatórias do historiador. Além disso, o uso dessas fontes no cotidiano da sala de aula permite aproximar os alunos de suas próprias realidades, aproximando-os da própria história. Quantos professores já não ouviram a velha pergunta de um aluno: “Afinal, para que serve a história?” Marc Bloch, um dos fundadores da Escola dos Annales, colocou esta questão em seu magistral “Apologia da História ou o Ofício de Historiador”. Em sua obra, o autor reafirma a importância da história para a sociedade. Para ele, tal questão nos coloca diante da necessidade de legitimar a história. Você conseguiria responder essa pergunta? Para Marc Bloch: A história não apenas é uma ciência em marcha. É também uma ciência na infância: como todas aquelas que têm por objeto o espírito humano, esse temporão no campo do conhecimento racional. Ou, para dizer melhor, velha sob a forma embrionária da narrativa, de há muito apinhada de ficções, há mais tempo ainda coloca aos acontecimentos mais imediatamente apreensíveis, ela permanece, como empreendimento racional de análise jovem. Tem dificuldades para penetrar, enfim, no subterrâneo dos fatos de superfície, para rejeitar, depois das seduções da lenda ou da retórica, os venenos, atualmente mais perigosos, da rotina erudita e do empirismo, disfarçados em senso comum. Ela ainda não ultrapassou, quanto a alguns dos problemas essências de seu método, os primeiros passos. Marc Bloch, Apologia da História ou o Ofício de Historiador, p. 47. Vejamos um exemplo de como um texto, facilmente encontrado nos meios de comunicação, pode ser importante referência no trabalho do professor de história. No ano de 1954, um dos maiores presidentes da república brasileira suicidou-se com um tiro no peito. Getúlio Vargas, depois de vários anos como presidente do Brasil, resolvia “dar a sua vida para entrar na história”. A sua carta-testamento é um exemplo de como um bom profissional da história pode tornar atraente o evento que se passara naquele agosto de 1954. Reproduzimos a carta na íntegra, para que você tenha uma noção da importância do texto: Mais uma vez, as forças e os interesses contra o povo coordenaram-se e novamente se desencadeiam sobre mim. Não me acusam, insultam; não me combatem, caluniam, e não me dão o direito de defesa. Precisam sufocar a minha voz e impedir a minha ação, para que eu não continue a defender, como sempre defendi, o povo e principalmente os humildes. Sigo o destino que me é imposto. Depois de decênios de domínio e espoliação dos grupos econômicos e financeiros internacionais, fiz-me chefe de uma revolução e venci. Iniciei o trabalho de libertação e instaurei o regime de liberdade social. Tive de Pesquise instrumentos da mídia, como filmes e músicas, que podem ser importantes no ensino da história. 210 Introdução ao Ensino de História UAB/Unimontes ATIVIDADES renunciar. Voltei ao governo nos braços do povo. A campanha subterrânea dos grupos internacionais aliou-se à dos grupos nacionais revoltados contra o regime de garantia do trabalho. A lei de lucros extraordinários foi detida no Congresso. Contra a justiça da revisão do salário mínimo se desencadearam os ódios. Quis criar liberdade nacional na potencialização das nossas riquezas através da Petrobrás e, mal começa esta a funcionar, a onda de agitação se avoluma. A Eletrobrás foi obstaculada até o desespero. Não querem que o trabalhador seja livre. Não querem que o povo seja independente. Assumi o Governo dentro da espiral inflacionária que destruía os valores do trabalho. Os lucros das empresas estrangeiras alcançavam até 500% ao ano. Nas declarações de valores do que importávamos existiam fraudes constatadas de mais de 100 milhões de dólares por ano. Veio a crise do café, valorizou-se o nosso principal produto. Tentamos defender seu preço e a resposta foi uma violenta pressão sobre a nossa economia, a ponto de sermos obrigados a ceder. Tenho lutado mês a mês, dia a dia, hora a hora, resistindo a uma pressão constante, incessante, tudo suportando em silêncio, tudo esquecendo, renunciando a mim mesmo, para defender o povo, que agora se queda desamparado. Nada mais vos posso dar, a não ser meu sangue. Se as aves de rapina querem o sangue de alguém, querem continuar sugando o povo brasileiro, eu ofereço em holocausto a minha vida. Escolho este meio de estar sempre convosco. Quando vos humilharem, sentireis minha alma sofrendo ao vosso lado. Quando a fome bater à vossa porta, sentireis em vosso peito a energia para a luta por vós e vossos filhos. Quando vos vilipendiarem, sentireis no pensamento a força para a reação. Meu sacrifício vos manterá unidos e meu nome será a vossa bandeira de luta. Cada gota de meu sangue será uma chama imortal na vossa consciência e manterá a vibração sagrada para a resistência. Ao ódio respondo com o perdão. E aos que pensam que me derrotaram respondo com a minha vitória. Era escravo do povo e hoje me liberto para a vida eterna. Mas esse povo de quem fui escravo não mais será escravo de ninguém. Meu sacrifícioficará para sempre em sua alma e meu sangue será o preço do seu resgate. Lutei contra a espoliação do Brasil. Lutei contra a espoliação do povo. Tenho lutado de peito aberto. O ódio, as infâmias, a calúnia não abateram meu ânimo. Eu vos dei a minha vida. Agora vos ofereço a minha morte. Nada receio. Serenamente dou o primeiro passo no caminho da eternidade e saio da vida para entrar na História. (Rio de Janeiro, 23/08/54 - Getúlio Vargas). http://www.ebooksbrasil.org/eLibris/cartatestamento.html Como podemos observar, Vargas lança mão de inúmeras informações sobre o Brasil e o mundo em meados do século XX. Sua história pessoal é abordada no texto, associada às dificuldades que o país enfrentava, em especial devido à difícil relação com os Estados Unidos da América. Além disso, uma forte dose emocional é notável no seu testamento, tratando-se, portanto, de um texto com clara intenção: comover e chamar a atenção para o momento político que o país 211 História Caderno Didático - 1º Período atravessava na sua política interna e internacional. Quais as questões que você, enquanto historiador pode fazer a essa fon te? Como um a luno pode compreender o Brasil da época e o Brasil de hoje a partir dessa carta-testamento? Seria possível relacionar a postura de Getúlio à alguns políticos da atualidade? Essas questões só encontram respostas a partir de reflexões no cotidiano da sala de aula, exigindo do professor habilidade para lidar com as diferentes posições sobre o tema. Mesmo assim, uma questão é indiscutível: um historiador consciente do seu papel em sala de aula, ao trabalhar essa fonte, se verá diante de inúmeras possibilidades. 1.6 A “HISTÓRIA NOVA”: PESQUISA E FUNÇÃO SOCIAL Franceses e ingleses foram os principais responsáveis pelas inúmeras mudanças da ciência história nas últimas décadas. Com essas mudanças, o ensino de história se modernizou, fruto de pesquisas cada vez mais qualificadas. Se as pesquisas permitiram um avanço da produção histórica, por que o professor não deve levar a prática da pesquisa para o ensino? Hoje é imprescindível que a pesquisa faça parte do cotidiano da sala de aula. Ser espectador do processo de ensino-aprendizagem não é mais suficiente. A disciplina história exige que o aluno participe da construção das reflexões feitas na sala de aula para que, futuramente, participe também da construção de sua cidadania. Não apenas a carta- testamento de Getúlio Vargas, como toda a sua trajetória política, podem ser uma importante fonte para o professor de História no ensino da história republicana brasileira. Figura 14: Getúlio Vargas foi, talvez, o principal representante da história republicana brasileira, e legou importantes fontes para a História do Brasil. Fonte: www.br.geocities.com/.../fotos/Getul-a.gif Figura15: Velório do Presidente Getúlio Vargas Fonte: http://www1.folha.uol.com.br/folha/especial/2002/ eleicoes/historia-1951.shtml Existe diferença entre ser um bom professor de história e um bom pesquisador em história? 212 Introdução ao Ensino de História UAB/Unimontes PARA REFLETIR Como dissemos, as atuais formas de se fazer história permitem uma ampliação do papel do historiador e das fontes. A história nova ampliou o campo do documento histórico; ela substituiu uma história fundada essencialmente nos textos, no documento escrito, por uma história baseada numa multiplicidade de documentos (...). Uma estatística, uma curva de preços, uma fotografia, um filme, são, para a história nova, documentos de primeira ordem. Jacques Le Goff, A História Nova, p. 28. Levantar uma problematização em sala de aula requer do professor de história uma enorme habilidade em pesquisa, isto é, ser historiador. Mas, a pergunta que fizemos anteriormente permanece: “Afinal, para que serve a história?” Vamos, portanto, aumentar o nosso desafio com duas novas questões: “Afinal, para que serve o ensino de história?” e, “Afinal, como ensinar história?”. A resposta a essas perguntas parece ainda mais simples: história tem uma função social. Nos encontramos em um momento em que o capitalismo se acha numa crise estrutural. Suas promessas de progresso e felicidade para todos não apenas não se cumpriram, como também descobrimos que são irrealizáveis. O que devemos fazer é começar a construir, ao mesmo tempo, uma nova história e um novo projeto social, para que questões como democracia e bem-estar social possam se tornar realidade. O atraso social e político da América Central, a fome e as misérias da África, as tensões do Oriente Médio, enfim, o mundo só será compreendido e transformado quando descobrirmos a função social da história, bem como a função das demais ciências sociais. A fome e a miséria do mundo nunca serão realmente encaradas com responsabilidade se não descobrirmos que a história – como tantas outras ciências – deve cumprir uma função social, e resolver os problemas das sociedades que dela necessitam. Figura 16: A relação professor-aluno deve permitir a interação na construção do conhecimento. Fonte: http://www.imagem.ufrj.br/index.php?acao=detalhar_imagem&id_img Le Goff, Jacques, A História Nova, Martins Fontes, 1988. 213 História Caderno Didático - 1º Período DICAS Os homens do presente precisam encontrar um sentido para o fato de compreender o passado. Os grandes eventos da história não aconteceram de repente. Eles fizeram parte da vida da maioria dos cidadãos que viveram tais eventos. Nem sempre a história é reivindicada pela sociedade. Entretanto, é na sua própria história que cada sociedade legitima as suas ações. Em meio à tecnologia implacável do século XXI, o historiador e o professor de história não devem perder de vista sua função na sociedade: informar ao homem sobre o mundo em que ele vive, a fim de contribuir na construção de uma sociedade mais justa e igualitária. Figuras 17 e 18: Cenas do cotidiano em África e Ìndia Fonte: http://www.planetaeducacao.com.br/novo/artigo.asp?artigo=642 214 Introdução ao Ensino de História UAB/Unimontes REFERÊNCIAS BLOCH, Marc. Apologia da História ou o Ofício de Historiador. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2001. BURKE, Peter. A Escola dos Annales (1929-1989). São Paulo: UNESP, 1997. FONTANA, Josep. História: análise do passado e projeto social. Bauru, SP: EDUSC, 1998. LE GOFF, Jacques. A História Nova. São Paulo: Martins Fontes, 1988. REIS, José Carlos. A história entre a filosofia e a ciência. Belo Horizonte: Autêntica, 2004. REIS, José Carlos. História e Teoria: Historicismo, modernidade, temporalidade e verdade. Rio de Janeiro: FGV, 2006. Sites http://www.musica.com/letras http://www.ebooksbrasil.org/eLibris 215 História Caderno Didático - 1º Período 2UNIDADE 2HISTÓRIA: RELAÇÕES ENTRE PASSADO E PRESENTE E A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO HISTÓRICO 2.1 INTRODUÇÃO Você deve ter observado na Unidade 1 que o principal objetivo foi analisar a evolução pela qual a história passou nos últimos séculos. Desde a antiguidade, em especial pelo pensamento grego, passando pela Idade Média, onde o mundo teocêntrico dominou o cotidiano do homem, a história passou por intensa transformação. No século XIX, como vimos, a história absorveu princípios de ciência, e no século posterior passou a ser analisada sob diversas formas. Nos dias atuais, a história se transformou em uma ciência complexa, contribuindo na formação da nossa sociedade. Novas abordagens e novas metodologias permitem ao historiador aproximar a história e o ensino de História da realidade do seu público. Nossa proposta, portanto, foi avaliar como se deu essa evolução. Nessa segunda unidade vamos analisar como a história permite estabelecer um diálogo entre o tempo do passado e o tempo do presente. Na verdade, é impossível conceber a análise histórica e o próprio ensino de História sem entender o diálogo fundamental entre passadoe presente. Propomos, ainda, exemplificar como se dá a produção do conhecimento histórico, identificando os principais elementos que o professor de História deve levar em conta na produção das suas aulas e das suas pesquisas. Você já deve ter notado que ser professor de história é, também, ser um bom pesquisador... Não é mesmo? Antes, porém, faremos uma breve análise sobre as transformações que o ensino de História sofreu no Brasil no último século. Essa unidade está dividida nos seguintes tópicos: 2.1 A História do ensino de História no Brasil; 2.2 Passado e presente: imagens construindo a história; 2.3 Ensino de História: do Positivismo ao Marxismo; 2.4 A produção do conhecimento histórico e o ensino de História; 2.4.1 O tempo; 2.4.2 Os homens; e 2.4.3 A obsessão pelas origens. 2.2 A HISTÓRIA DO ENSINO DE HISTÓRIA NO BRASIL Estudar a história do ensino é tarefa das mais importantes para compreender o papel da educação e a tarefa do educador na sociedade. A História como disciplina escolar é fundamental no funcionamento das escolas primárias e secundárias. 216 A partir da década de 1970, vários trabalhos foram produzidos tendo como tema “a história do ensino de História”. Esses autores enfocaram aspectos de grande importância para a compreensão da consolidação da História como disciplina escolar e de seu ensino como questão política relevante. O “caso” francês tornou-se exemplar ao deixar claras as vinculações entre o fortalecimento do estado- nação, a construção e a consolidação de uma identidade nacional coletiva, a afirmação nacional perante outras nações, a legitimação de poderes constituídos e a história enquanto conhecimento social e culturalmente produzido e seu ensino nas escolas. As funções do ensino de história, as possibilidades de acentuação de funções morais e políticas para ele, as disputas pela memória nacional, sempre associadas à história da nação, foram alguns dos aspectos analisados por estudos dessa natureza. Thaís Nívia de Lima e Fonseca, História e Ensino de História, p. 26. A iconografia, isto é, o uso das imagens e ilustrações como fontes do ensino de História, ainda é pouco estudada e debatida pelos pesquisadores e professores de História. Uma imagem é, antes de tudo, uma representação sobre fatos e idéias do passado ou do presente. Por que os historiadores ainda não se preocuparam da maneira devida com relação a essas fontes? Mais à frente, teremos a oportunidade de pensar um pouco sobre essas iconografias. Voltemos ao ensino de História. A história do ensino de História é um campo complexo, contendo caminhos que se cruzam e que vão além das formalidades dos programas curriculares, e mesmo dos livros didáticos escolares. Suas múltiplas relações com as várias dimensões da sociedade, sua posição como instrumento científico, político, cultural, para diferentes grupos, indicam a Em países de primeiro mundo – como a França e a Inglaterra – a história é tratada com enorme responsabilidade pelo Estado e pela sociedade. São países que vinculam a construção do seu estado nacional ao seu passado histórico. Mas, existem poucos estudos que privilegiem as práticas escolares no ensino de História. Isso se dá talvez pela dificuldade do professor de História em entender o seu papel como pesquisador. Figuras 20 e 21: Cenas de educação em países da Europa Fonte: http://www.bonjourdefrance.com/images/photo_ado.jpg http://www.i3.photobucket.com/.../educacao/Image5.jpg 217 História Caderno Didático - 1º Período riqueza de possibilidades para seu estudo e o quanto ainda há para investigar. No Brasil, nos últimos dez anos, poucos autores se preocuparam em pesquisar sobre o e n s i n o d e H i s t ó r i a . Professores e pesquisado- res se debruçam, principal- mente, sobre temas ligados ao cotidiano da sala de aula e que merecem maior atenção dos professores e, p r i n c i p a l m e n t e , d o s pesquisadores interessa- dos. Thaís Nívia de Lima e Fonseca, História e Ensino de História, p. 29. No Brasil, o tema Ditadura Militar é recorrente nos trabalhos e pesquisas de História, pois é um tema muito ligado às experiências pessoais e ao cotidiano da socieda- de brasileira. À primeira vista, a história do ensino da disciplina no Brasil não parece interessar, de forma especial, os professores, e poucos são os historiadores da educação que a ela se dedicam. Ainda assim, verifica-se que muitos trabalhos que se propõem o estudo da história do ensino acabam, na verdade, por tratar das questões atinentes às práticas pedagógicas contemporâneas aos seus autores, sem se caracterizar, todavia, como uma história do tempo presente. Mas, sim, análises de metodologias de ensino, de programas curriculares ou de livros didáticos. Figura 22: Arquivos e bibliotecas são fundame- ntais na formação do professor de História. Fonte: http://anapaulass.wordpress.com/category/sem-categoria/ Pesquise na internet artigos e textos que reflitam sobre o ensino de História no Brasil. Ver sites sobre História e educação, e história da educação. Figura 23: Contestação à Ditadura Militar no Brasil Fonte: http://www.bonde.com.br/imgsistema/bondenews/2008/06/img.jpg 218 Introdução ao Ensino de História UAB/Unimontes DICAS O livro didático continua sendo o principal instrumento de ensino da maioria dos professores. Os próprios pesquisadores, quando decidem pesquisar sobre o ensino de História, ainda utilizam o livro didático como principal referência. Você sabe da importância do livro didático? Você sabia que o livro didático é um material fortemente regulamentado pelo Estado? Como é possível, portanto, ao professor de História ensinar de maneira livre e independente, sem a influência direta da intencionalidade do livro didático? Essas questões revelam mais um aspecto da complexidade de se pensar e de executar o papel de professor de História. Na Unidade 1, recorremos à carta-testamento de Getúlio Vargas para indicar a importância das fontes no ensino de História. Agora, recorreremos à fragmentos da mesma para refletir um pouco sobre a intencionalidade dos livros didáticos. Mais uma vez, as forças e os interesses contra o povo coordenaram-se e novamente se desencadeiam sobre mim. Não me acusam, insultam; não me combatem, caluniam, e não me dão o direito de defesa. Precisam sufocar a minha voz e impedir a minha ação, para que eu não continue a defender, como sempre defendi, o povo e principalmente os humildes. Sigo o destino que me é imposto. Depois de decênios de domínio e espoliação dos grupos econômicos e financeiros internacionais, fiz-me chefe de uma revolução e venci. Iniciei o trabalho de libertação e instaurei o regime de liberdade social. Tive de renunciar. Voltei ao governo nos braços do povo (...). Não Figuras 24 e 25: Os livros didáticos permanecem como principal fonte para os professores de História em sala de aula, e como principal referencia de estudo para os alunos. Fonte: http://www.livrariasaraiva.com.br/produto/produto.dll/detalhe?pro_id=341993&ID=C8DEF68F7D8081E0035200993 219 História Caderno Didático - 1º Período querem que o povo seja independente. Assumi o Governo dentro da espiral inflacionária que destruía os valores do trabalho (...) Nada mais vos posso dar, a não ser meu sangue. Se as aves de rapina querem o sangue de alguém, querem continuar sugando o povo brasileiro, eu ofereço em holocausto a minha vida. Escolho este meio de estar sempre convosco. Quando vos humilharem, sentireis minha alma sofrendo ao vosso lado (...). Meu sacrifício vos manterá unidos e meu nome será a vossa bandeira de luta. Cada gota de meu sangue será uma chama imortal na vossa consciência e manterá a vibração sagrada para a resistência. Ao ódio respondo com o perdão. E aos que pensam que me derrotaram respondo com a minha vitória. Era escravo do povo e hojeme liberto para a vida eterna. Mas esse povo de quem fui escravo não mais será escravo de ninguém. Meu sacrifício ficará para sempre em sua alma e meu sangue será o preço do seu resgate. Lutei contra a espoliação do Brasil. Lutei contra a espoliação do povo. Tenho lutado de peito aberto. O ódio, as infâmias, a calúnia não abateram meu ânimo. Eu vos dei a minha vida. Agora vos ofereço a minha morte. Nada receio. Serenamente dou o primeiro passo no caminho da eternidade e saio da vida para entrar na História. (Rio de Janeiro, 23/08/54 - Getúlio Vargas). http://www.ebooksbrasil.org/eLibris/cartatestamento.html Nem todos os professores sabem, mas os livros didáticos atendem não apenas a interesses escolares. Os livros são produzidos para serem comercializados e, nesse sentido, têm que atender a interesses de mercado. Além disso, o Estado tem um importante papel na reprodução e aceitação desses livros. Nada pode ser colocado em seus textos de forma a agredir os interesses da elite nacional. A carta de Getúlio é um exemplo. Quase todos os livros didáticos reproduzem a sua carta- testamento com clara intencionalidade. Revelar as habilidades do político brasileiro, a importância do homem na história e as relações sociais, políticas e econômicas com o mercado internacional são exemplos de algumas questões que são levantadas com o uso da sua carta. Trata-se de um texto intencional, e deve ser tratado como tal pelos historiadores. A maioria dos trabalhos sobre ensino de História privilegiam os programas curriculares e o livro didático, procurando analisá-los na perspectiva da utilização do ensino de História pelo Estado e pelas elites detentoras do poder. Assim, as principais fontes de pesquisa são os próprios programas curriculares e livros didáticos. Entretanto, ensinar História é um ofício bem mais interessante e complexo. Na Unidade 1, apontamos a importância da função social da História. Para compreendê-la melhor é importante que possamos refletir sobre a relação entre passado e presente na História. Então... Vamos lá! 220 Introdução ao Ensino de História UAB/Unimontes 2.3 PASSADO E PRESENTE: IMAGENS CONSTRUINDO A HISTÓRIA Você saberia estabelecer uma conexão entre as duas imagens ao lado? Aliás, você tem noção da importância que as duas têm para a história? Perceba que as duas imagens foram construídas em dois eventos de enorme grandiosidade nos últimos três séculos. A queda da Bastilha – evento símbolo da Revolução Francesa – é datada do final do século XVIII. O ataque ao World Trade Center, datado do ano de 2001, é uma das imagens mais marcantes do nosso século. Mesmo distantes mais de duzentos anos, você duvidaria que essas imagens cumprem a mesma função para as sociedades de suas épocas? Ou melhor, será que elas não têm a mesma função para o professor de História e para o pesquisador? Pensemos um pouco. A h i s t ó r i a d a Revolução Francesa inaugurou a época contemporânea, e ensinou para o mundo o signif icado das palavras “ l iberdade, igualdade e fraternidade”. A queda da Bastilha representa o fim de um antigo regime e o início de um m u n d o c o m i d e a i s d e cidadania e democracia. “Liberdade”... Uma palavra com um peso incalculável no nosso mundo. No segundo caso, a queda das torres gêmeas também revelaria o início de um novo mundo. O ataque às torres representou um enorme desafio ao poder capitalista norte-americano. Após o 11 de setembro de 2001, o mundo passou a conviver com uma nova realidade: a presença do terrorismo e os questionamentos sobre o intocável poder dos Estados Figura 26: A Queda da Bastilha: símbolo do processo revolucionário francês (final do século XVIII) Fonte: http://www.klickeducacao.com.br/.../Ba/2766/1045.jpg Figura 27: O Ataque ao World Trade Center: símbolo do terrorismo e da oposição ao Império dos EUA. Fonte: http://www.mirrors.org/historical/2001-09-11- World-Trade_Center/wtc/wtc_005.jpg 221 História Caderno Didático - 1º Período Unidos da América. Essas duas imagens demonstram claramente o quanto passado e presente se confundem na percepção de análise do historiador. A impressão que se passa é que a história estaria se repetindo, 200 anos depois da Revolução Francesa. Mas, será que é tão simples assim? Uma importante questão a levantar é o impacto que tais imagens provocaram em suas épocas. No caso da queda da Bastilha, por mais que tal evento tenha sido de enorme importância, com certeza a imagem não teve uma exploração tão intensa quanto o caso das torres gêmeas. O evento de 11 de setembro de 2001 foi filmado sob diversos ângulos e analisado sob inúmeras perspectivas. Isso revela o quanto a mídia e os recursos audiovisuais são imprescindíveis para o historiador do século XXI. A exposição da mídia torna o presente uma importante arma para a reflexão do historiador. A história encontra sua razão de ser nos homens vivos e, não só, no conhecimento do passado. Um dos aspectos mais importantes para se compreender “para que serve a História” é entender a importância que a mesma exerce no nosso dia-a-dia. Estudamos História para conhecer e transformar a vida. Nossas angústias e interrogações são a força motriz que nos impulsiona a conhecer o passado e, daí, tentar identificar e analisar criticamente as condições do nosso presente. O historiador Caio Boschi nos oferece uma importante reflexão sobre o passado e o presente na História: Figura 29: Nos dias atuais, toda a sociedade interage com os recursos audiovisuais e o historiador não deve ignorar essas fontes. Liberdade, igualdade e fraternidade: você acredita nesses princípios para o seu cotidiano? Terrorismo: modo de coagir, combater ou ameaçar pelo uso sistemático do terror. Fonte: http://www.valedoamanhecer.com/.../imagens/MaePaiTv.jpg 222 Introdução ao Ensino de História UAB/Unimontes PARA REFLETIR C A B F EGGLOSSÁRIO O passado e os mortos se constituem no objeto de nossos estudos, mas é das indagações e das perplexidades do presente que a História vai sendo (re)escrita e compreendida. É a partir do contexto em que nos situamos e do qual somos partícipes que construímos a nossa História. Cuidando em não resvalarmos para a prática do anacronismo, é no questionamento do passado que buscamos detectar e delinear nossas identidades. Essas, por seu turno, obviamente, só se delineiam por contrastação, por antinomia. Vale dizer, o estudo da História objetiva captar e exprimir, predominantemente, nossas diferenças e não nossas afinidades. Assim, o conhecimento do passado, não sendo em si mesmo a História, antes de iluminar o futuro, deve proporcionar aos homens viverem melhor o seu presente. Propiciar-nos referências para a constituição de uma almejada sociedade mais justa e solidária. Refletindo dessa maneira, tenho como horizonte primeiro as pessoas e o mundo que me cercam. Não faço abstração do que está longe de mim. Bem sei e reconheço que necessito aprender o todo. No entanto, como incita o poeta, é mister que eu conheça e (com)viva com o rio de minha aldeia para que alcance e dimensione a extensão e a profundidade do oceano. A evocação final, igualmente lição assimilada, busco-a em Josef Fontana, quando afirma: “Entender melhor o mundo em que vivemos e ajudar os outros a entendê-lo, a fim de contribuir para melhorá-lo, (é) o que nos faz falta. Porque, como disse Tom Payne há mais de duzentos anos, e essas são as palavras que cada um de nós deveria gravar na sua consciência: está em nossas mãos recomeçar o mundo outra vez.” Caio Boschi, História: Por que e para que?, Revista Nossa História, setembro de 2004, p. 98. 2.4 ENSINO DE HISTÓRIA: DO POSITIVISMO AO MARXISMO Duas grandes concepções teóricas dominaram o ensino de História nos últimos 120 anos: a Escola Positivista e a Escola Marxista. No final do séculoXIX, o Positivismo tornou-se a base para o pensamento das ciências humanas e sociais. A História adquiria, naquele contexto, um caráter de ciência. Segundo o Positivismo, a História deveria se concentrar nos eventos e nos documentos oficiais. Para o historiador José Carlos Reis, a Escola Positivista, ou Escola Metódica, se fundava em alguns princípios de método, entre os quais: ?o historiador não é juiz do passado; ?não há nenhuma interdependência entre o historiador e o seu objeto; ?a História se oferece através dos documentos; ?a tarefa do historiador consiste em reunir um número 223 História Caderno Didático - 1º Período significativo de fatos; ?os fatos devem ser organizados em uma sequên- cia cronológica, e todo reflexão teórica é nociva; e ?a História-ciência pode atingir a objetividade e conhecer a verdade histórica objetiva (REIS, 2004, p.17). Du ran te décadas foram os princípios positivistas que nortearam o ensino da História. O historiador deveria estar atento a todas as ques- tões mencionadas acima para que fosse possível compreender o papel da História enquanto ciência. A verdade e a realida- de eram objetivos primordiais na produção do conhecimento histórico. Historiadores como Marc Bloch estabeleceram uma forte crítica aos positivistas. Para Bloch, o historiador não deveria apenas coletar fatos e fontes, mas sim ser “o produto de uma construção ativa de sua parte para transformar a fonte em documento e, em seguida, constituir esses documentos, esses fatos históricos, em problema (BLOCH, 2001, p. 19). Mesmo assim, a História Positivista foi fundamental em sua época, possibilitando à História absorver parte da sua cientificida- de. Ainda no século XIX, mas principalmente durante grande parte do século XX, o Marxismo possibilitou uma nova leitura da História. A partir do que Marx chamou de materialismo histórico foi possível reinterpretar o ensino de História no mundo e no Brasil. Enquanto ciência da História, o Marxismo apresenta três hipóteses principais: Figura 30: O positivismo tornou-se filosofia e referência das ciências humanas e sociais. Fonte: http://www.i8.ebayimg.com/04/i/000/bf/f0/9d0b_1_sbl.JPG Pesquise a biografia de Karl Marx e a maneira como ele compreendia a História. Figura 31: Karl Marx Fonte: http://www.dawgsports.com 224 Introdução ao Ensino de História UAB/Unimontes ATIVIDADES ?“enfatiza o papel das “contradições”, priorizando o estudo dos “conflitos sociais”; ?o Marxismo foi uma das primeiras teorias “estruturais” da sociedade. Assim, abandonou a ênfase no evento e abriu o caminho da história “científica”. “A verdade” de uma sociedade está em sua estrutura econômico-social; e ?mesmo sem o saber, mas podendo vir a sabê-lo, os homens “fazem a história”. Os homens transformam o mundo e a si mesmos ( A ex-URSS (União da Repúblicas Socialistas Soviéticas), por meio da Revolução Russa de 1917, foi a primeira nação do mundo a aceitar os princípios do marxismo e do socialismo e tentar transformar sua história a partir das bases teóricas propostas por Marx. 2.5 A PRODUÇÃO DO CONHECIMENTO HISTÓRICO E O ENSINO DE HISTÓRIA REIS, 2004, p. 55-57). Com certeza você já estudou ou leu algo sobre a concepção marxista da História. A maioria dos livros didáticos usa as relações econômicas e sociais como ponto de partida para explicar os eventos históricos. Marx e o materialismo histórico são ainda a base nas discussões e debates do ensino de História. É importante frisar que, mesmo sem notar, os professores de História continuam se utilizando de Karl Marx nas relações de ensino-aprendizagem. Ensinar História e produzir um conhecimento histórico exigem peculiaridades para o historiador e para o professor da disciplina. A História tem suas especificidades, e que devem ser respeitadas. Assim, destacamos pelo menos três elementos fundamentais na produção do conhecimento histórico: o tempo, os homens e a obsessão pelas origens. Figura 32: Bandeira da ex-URSS Fonte: http://www.escudosonline.com/.../hinos_world_cups.htm Karl Marx foi o responsável pela principal mudança no campo das ciências sociais e humanas nos últimos 150 anos. O marxismo tornou- se referência no pensamento historiográfico de vários países, entre os quais o Brasil. 225 História Caderno Didático - 1º Período DICAS 2.5.1 O tempo A História é uma ciência que estuda os homens no tempo, já dizia (Bloch, 2001). O historia- dor não pensa apenas no “humano”, mas deve também entender o que é a duração. Contudo, o tempo também é perigoso para o historiador. Nem todas as sociedades e civilizações entendem o tempo da mesma forma. Antigamente, o tempo era mais lento, ma i s g radua l , po i s acompanhava o ritmo do mundo antigo. É o caso de Roma, por exemplo. Hoje, o tempo é mais dinâmico, mais veloz, pois acompanha o r i tmo alucinante de um mundo globalizado. Será que viver na Nova York do século XIX é a mesma coisa que viver na Roma do sécu lo X? Com certeza, não. E somente o tempo pode explicar essa diferença. É nesse sentido que o historiador deve usar o tempo como uma das suas principais ferramentas na pesquisa e no ensino de História. 2.5.2 Os homens Não existe sentido em estudar História senão for para compreender e mudar a vida dos homens. A História é uma ciência humana e, como tal, deve se preocupar com os problemas dos homens em seus tempos. Para Marc Bloch, “o bom historiador se parece com o ogro da lenda. Onde fareja carne humana, sabe que ali está a sua caça.” Nesse sentido, a História deve pensar antes de tudo nos homens, para compreendê-los e para apresentar soluções para as suas vidas. As Figura 33: O tempo em Roma indicava a forma como os romanos encaravam o mundo - lento, cotidiano simples. Fonte: http://www.soparaajudar.blogger.com.br/roma5.jpg Figura 34: O tempo na cidade de N. York (EUA), em pleno século XXI, demonstra um tempo dinâmico Fonte: http://static.hsw.com.br/gif/capitalism-1.jpg 226 Introdução ao Ensino de História UAB/Unimontes guerras, a fome e a miséria só serão compreendidas com o estudo dos homens no seu tempo. 2.5.3 A obsessão pelas origens Bloch (2001) nos deixa ainda uma última lição: o historiador deve ser obcecado pelas origens. Conforme nos propusemos nessa unidade, estabelecer uma ligação entre passado e presente é fundamental para entender História. Por mais que nossas indagações sejam fruto de nossas experiências do presente, é no passado que buscamos as respostas. Assim, se não compreendermos as origens dos fatos, dificilmente conseguiremos ensinar História com qualidade. Onde estariam as origens da corrupção o Brasil? Onde estariam as origens do ódio entre judeus e palestinos? Onde estariam as origens do poder dos Estados Unidos da América sobre o restante do mundo? Essas questões revelam que o historiador e o professor de História devem, incessantemente, buscar as origens dos fatos. Somente assim é possível produzir um conhecimento histórico que atinge diretamente o interesse dos alunos. Somente assim é possível responder à inquietante pergunta que ainda atormenta tantos e tantos profissionais da área de História: “Afinal, para que serve a História?” 227 História Caderno Didático - 1º Período BLOCH, Marc. Apologia da História ou o Ofício de Historiador. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2001. FONSECA, Thaís Nívia de Lima e. História e Ensino de História. Belo Horizonte: Autêntica, 2004. LE GOFF, Jacques. A História Nova. São Paulo: Martins Fontes, 1988. REIS, José Carlos. A História entre a Filosofia e a Ciência. Belo Horizonte: Autêntica, 2004. REVISTA Nossa História. Caio César Boschi, História: Por que e para que?, setembro de 2004. Sites http://www.ebooksbrasil.org/eLibris 228 Introdução ao Ensino de História UAB/Unimontes REFERÊNCIAS3.1 INTRODUÇÃO Esta unidade objetiva apresentar o significado de história e sua utilidade no âmbito intelectual e social, assim como discutir acerca da produção histórica. 3.2 O QUE É HISTÓRIA? Definir história parece, à primeira vista, extremamente fácil, pois logo se relaciona o termo ao cotidiano do homem. Hoje, a imprensa falada e escrita usa e abusa o tempo todo dos termos “história” e “fazer história”. Verifica-se essa afirmação por meio dos Jogos da XXIX Olímpiada, realizados em Pequim, China durante o mês de agosto de 2008. Os jornalistas salientavam o papel dos atletas enquanto sujeitos da história, marcando presença, sobretudo, através das vitórias conquistadas e das medalhas garantidas para o seu país. Enfim, utiliza-se o termo com frequência, por isso muitas vezes deixa controvérsias e ambiguidades. A palavra história vem do grego, correspondendo a “his” + “oren”, que significa apreender pelo olhar aquilo que se sucede dinamicamente, ou seja, testemunhar os acontecimentos, a realidade. Heródoto, ao pesquisar as Guerras Médicas e escrever sobre ela constrói o saber histórico representado por meio da escrita dos acontecimentos humanos. Nesse sentido, Bloch (2001), na tentativa de possibilitar a compreensão do termo história, coloca pai e filho frente a frente para 3UNIDADE 3 229 O HISTORIADOR E AS METODOLOGIAS DE ENSINO Figura 35: Futebol feminino nas Olímpiadas de 2008. Destaque da jogadora Marta Medeiros. Fonte: http://duard.com.br/. Acesso em: 29 agosto 2008. decifrá-lo e entendê-lo. Borges (1985) remete ao Dicionário Aurélio, simplificando a explicação acerca do que é história, que poderia ser: ão as estórias das fadas madrinhas, do Chapeuzinho Vermelho, Cinderela, Branca de Neve e tantas outras que levam a lições de moral. história apresenta várias versões, assim como é relativa, pois as fontes podem alterá-la. Dessa forma, qual a história verdadeira? Borges (1985) descarta as definições de história enquanto narração, conto, “lorota” e “complicação”, acolhendo as duas primeiras definições, que apresentam ambigüidades e deixam incertezas acerca do que é história, porém passíveis de serem explicadas. Com o objetivo de contornar essa dificuldade em definir história como acontecimentos do passado ou estudo desses acontecimentos, acrescenta três palavras- chaves que ajudam na compreensão do termo. As três palavras são: ACONTECIMENTO, PROCESSO e CONHECIMENTO. A palavra ACONTECIMENTO é explicada a partir do entendimento do homem como ser social, que vive em grupo e estabelece regras e normas para a convivência. O homem não é uma ilha, por isso se relaciona com o outro e o meio em que vive. Essas relações cotidianas resultam em acontecimentos que abrangem todas as dimensões possíveis para o homem nas suas vivências, ou seja, políticas, religiosas, econômicas, culturais, afetivas, etc. O acontecimento histórico é o objeto de análise do conhecimento histórico. O acontecimento histórico é aquilo que aconteceu com o homem, a natureza o universo e o estudo desses acontecimentos. A palavra PROCESSO remete à idéia de caminhada ou etapas que devem ser cumpridas, ou seja, nada acontece do dia para a noite, mas de forma gradativa tendo todas as dimensões vividas e construídas pelo homem contempladas. Dessa forma, rememorar a trajetória da humanidade desde o princípio até os dias de hoje é salutar, pois colabora na construção dessas etapas. ?o passado da humanidade: os acontecimentos realizados pelos homens em um tempo definido, ou seja, o PASSADO; ?o estudo desse passado: a construção do conhecimento por meio do estudo dos acontecimentos realizados pelos homens no passado; ?narração: é o relatar, contar ou narrar os acontecimentos realizados pelo homem no passado, porém sem análise ou leituras nas suas entre-linhas e passíveis de serem decifradas. ?conto: s ?Lorota: a ?Complicação: a história que faz parte do mundo da “decoreba”,ou seja, saber de cor nomes de pessoas, os acontecimentos e as datas. Por isso, a história é muito complicada e difícil. 230 Introdução ao Ensino de História UAB/Unimontes Exemplo: O homem de 700.000 a 10.000 a. C. era caçador e coletor e extraia da natureza o necessário para sua sobrevivência. De 10.000 a 7.000 a. C. o homem se torna, não do dia para a noite, mas enquanto PROCESSO, pastor e agricultor. A partir dessa data, as civiliza- ções de regadio ou hidráulicas surgem, pois o homem precisa da água para cultivar a terra e cuidar dos animais. Mas e as civilizações que não ficam às margens dos rios como o Egito, Mesopotâmia - atual Iraque - Índia e China? Essas civilizações procuram alternativas para sobreviver, como o comércio; dentre elas, cita-se Fenícia - atual Líbano - e Grécia. Verifica-se, posteriormente, o surgimento de um grande império: o império Romano. Em 476, é invadido pelos “Bárbaros” e inicia-se um novo período histórico, a Idade Média, que apresenta um modo de viver diferente da Idade Antiga. Em 1453, nasce outra fase, a Idade Moderna, quando o homem valoriza a ciência e a razão. Em 1789, a Idade Contemporânea marca, através da Revolução Francesa, um outro tempo. Enfim, tudo isso não ocorreu como um passe de mágica. Consistitiu na caminhada do homem desde a sua origem até os dias de hoje, ou seja, foi um PROCESSO. A p a l a v r a CONHECIMENTO remete à construção do saber, nesse caso específico, da área de história. São as informações, as experiên- cias do homem inserido na sua realidade e contexto político, econômico, religioso, afetivo, social e tantos outros, que serve de análise e estudo para o historiador. Para compreender melhor o homem e o que ele faz com a sua vida constrói-se o CONHECIMENTO HISTÓRICO, sendo o historiador, o produtor desse saber. Dessa forma, e de acordo com De Decca, A HISTÓRIA NÃO É O PASSADO MORTO, mas possibilidades de explicar o universo social do homem através do historiador, profissional da área de história; a cuja matéria-prima utilizada são as FONTES HISTÓRICAS, que constituem os vestígios do passado. 3.3 PARA QUE SERVE A HISTÓRIA? A história, de acordo com Reis (1996), é constituidora da cultura ocidental. A civilização ocidental é histórica: os gregos criaram o gênero histórico; os romanos utilizaram da história para conquistar outros povos e expandir seu território; e na Idade Média, os cristãos, profundamente Figura 36: Historiador Fonte: http://historiador.png&imgrefurl=http:/ Acesso em: 29 agosto 2008 Procurar conhecer os seus antepassados. Construir a sua genealogia. História é a ciência que estuda a mudança. História é vida, é movimento, é transformação. História estuda a vida humana através do tempo: estuda o que os homens fizeram, pensaram ou sentiram enquanto seres sociais. História é o processo de transformação onde todos os homens são agentes das constantes mudanças que ocorrem: processo histórico. 231 História Caderno Didático - 1º Período PARA REFLETIR ATIVIDADES históricos e historiadores, utilizaram da história para criarem raízes e se identificarem enquanto povo de Deus em busca da terra prometida. Enfim, a civilização ocidental, diferente das outras civilizações, cultivou a sua memória deixando marcas e registros contendo informações que diziam respeito a ela. Porém, qual a importância de registrar os acontecimentos do passado? Qual a diferença entre conhecer ou não o passado do homem? Para quê analisar esse passado? Porque compreender o que o homem fazia no tempo de “ontem”? Tudo isso parece sem sentido ou significado. José Carlos Reis diz que essas questões geram dúvidas sobre a validade da história. Bloch (2001) explica a validade da história quando se depara, conforme abordagem acima, com o filho questionando o pai acerca da utilidade da história. A questão é posta e aguarda resposta. Marc Bloch é tranqüilo em responder quese a história não tivesse uma utilidade significativa como outras ciências, ela serviria para divertir as pessoas, satisfazer um gosto ou uma curiosidade ou apenas para o prazer de conhecer o ser humano e a possibilidade dele se reconhecer nele. E se a história fosse considerada apenas uma poesia, ela revelaria e tocaria a sensibilidade do homem por meio da forma inteligente de abordá-lo. A sociedade moderna valida os conhecimentos pela sua utilidade. Mas a história serviria para quê? Se a história estuda e analisa o passado como não consegue evitar as epidemias, guerras, catástrofes, infelicidade e conflitos? Se o passado não se repete, para quê conhecê-lo? Marc Bloch afirma que conhecer o acontecimento do PASSADO é referência para o PRESENTE. O conhecimento histórico para Marc Bloch é um prazer, pois possibilita conhecer o outro, ou seja, saber o que o outro viveu e sentiu durante a sua trajetória e sua luta pela sobrevivência. A história coloca o HOMEM DO PRESENTE em contato com o HOMEM DO PASSADO e, por sua vez, se reconhece nele. Lucien Febvre diz que a história possibilita o diálogo dos vivos com os mortos. A aliança PASSADO – PRESENTE é significativa, porque o Figura 37: Movimento estudantil em Montes Claros, MG. Junho de 2008. Fonte: http://farm4.static.flickr.com/ Abaixo algumas disciplinas auxiliares da História. Arqueologia: estuda objetos, restos de animais e plantas, ossos humanos e outras antiguidades. Filologia: procura entender as línguas e os textos antigos. Cronologia: estabelece corretamente as datas históricas. Diplomática: serve para ler, interpretar e compreender documentos políticos do passado. Genealogia: procura entender a origem e desenvolvimento das famílias, desde os seus mais remotos antepassados até os dias de hoje. REIS, José Carlos. A história entre a filosofia e a ciência. São Paulo: Àtica, 1996. 232 Introdução ao Ensino de História UAB/Unimontes C A B F EGGLOSSÁRIO DICAS homem organiza o primeiro em função do segundo. Nesse sentido, a história dá a dimensão do homem na sociedade procurando ver as transformações que ocorreram ao longo do tempo. A história serve para dar consciência aos homens do seu poder de transformar a realidade. Porém, a história, tendo como objeto de estudo o homem, precisa do auxílio de outras ciências para compreendê-lo melhor, como a sociologia, antropologia, economia, arqueologia, filologia, diplomática, genealogia, cronologia, geografia, psicologia, demografia e outras. 3.3.1 Como compreender a história de um povo? Conforme abordagem anterior, os europeus ocidentais criaram o gênero histórico. Dessa forma, o modelo para apresentação da história da humanidade se apresenta a partir da evolução da sociedade européia. Porém, ressalta-se que cada povo constrói a sua história a seu modo, de acordo com sua realidade e contexto histórico. Por isso, cuidados são necessários no momento do estudo de um povo, pois cada sociedade deve se explicar por si mesma, conforma afirma ( BORGES, 1985). É interessante lembrar que a história é um processo histórico, dessa forma, não obedece um tempo linear e a diversidade cultural de um povo, assim como as escolhas que fazem revelarão os caminhos que percorreram ao longo da sua existência. 3.4 COMO PRODUZIR HISTÓRIA? O historiador é o profissional que estuda para conhecer as teorias e métodos com o objetivo de produzir o saber histórico. Porém, o historiador não dá conta de trabalhar todos os acontecimentos, documentos ou versões históricas de uma sociedade. Por isso, o historiador precisa fazer recortes definidos como o tempo, o espaço e o tema. Exemplo: O historiador para trabalhar o patrimônio cultural deve recortar visando dar conta de estudar e apresentar resultados para a sociedade que analisa. Então, estudando o patrimônio cultural pode fazer o seguinte recorte: ?tema: Políticas públicas de patrimônio documental; ?tempo: 1987 a 2006. Período em que se cria os arquivos públicos na cidade estudada; e ?espaço: Montes Claros, Minas Gerais. O historiador é por natureza curioso. Questionamentos invadem sua mente e o levam a pesquisar e querer conhecer o passado. As seguintes questões fazem parte para concretização da produção do conhecimento Filme denominado “Idade da Inocência” de François Trulfaut, produzido em 1976. Mostra como é possível documentar os dias de hoje. 233 História Caderno Didático - 1º Período PARA REFLETIR Figuras 38 e 39: Processo produzido pelo Fórum Gonçalves Chaves sob custódia da Unimontes. Ação de crédito – 1797. Transcrição da Ação de Crédito. Fonte: Fotografia de Filomena Cordeiro datada de 2002. histórico do historiador: ?O quê? ?Quando? ?Onde? ?Por quê? ?Para quê? ?Como? ?Para quem? ?Contra quem? ?A favor de quem? A partir dessas curiosidades, o historiador busca sua matéria- prima, ou seja, as fontes históricas que são os vestígios do passado. De acordo com Edgar De Decca, o historiador no momento da construção do conhecimento histórico deve estar atento às seguintes questões relativas às fontes, que constituem uma diversidade enorme, pois são os vestígios deixados pelo homem no decorrer da sua existência: a) O olhar sobre as fontes: ?deve ser cauteloso; ?ter apurado senso crítico; e ?estar atento às várias versões. b) As fontes são marcas do passado, ou seja, não são o passado. Por isso, apresentam o modo de viver do povo de uma determinada época e espaço geográfico, inserido em um contexto político, econômico, social, cultural, religioso, etc. 234 Introdução ao Ensino de História UAB/Unimontes c) O historiador executa uma pesquisa empírica. Para que esse trabalho historiográfico possa acontecer, o diálogo entre fontes, teoria e conceito deve ser observado e constante. d) O recorte temporal e espacial deve ser observado e explicado na pesquisa de forma clara e objetiva. e) O historiador, ao fazer seu estudo, não parte de acontecimentos cristalizados, prontos e acabados, mas de fontes que são indícios, registros, rastros ou vestígios do que aconteceu com a humanidade, aliando conceito e teoria. f) Na história, tudo é relativo, pois a verdade na história varia de acordo com as fontes trabalhadas. Nesse sentido, a história é diferente das ciências naturais, pois não pode levar os acontecimentos para um laboratório como ocorre com a biologia. Por outro lado, a história não é uma opinião qualquer, que não demanda estudo, pesquisa e análise de documentos, independente do seu caráter, fazendo uma aliança entre fonte-teoria-conceito. Dessa forma, o conhecimento do historiador é: ?provisório, pois nova fonte pode alterá-lo; ?descontínuo, pois não se pode estudar toda a história da humanidade; ?seletivo, porque o historiador escolhe o seu problema e objeto de estudo; e ?limitado, porque o conhecimento é um trabalho infinito. Nessa perspectiva, a história, então, não é: ?superposição da história dos outros povos, pois todos têm seu papel na sociedade em que vive e colabora para a sua construção. Cada sociedade se explica por si mesma; e ?descoberta de uma regra que, como uma equação matemática, chega a uma resposta exata e definitiva. Pensar a história nessa perspectiva é tomá-la como um processo criterioso do conhecimento e de produção de explicação do universo social do homem, o seu sujeito e protagonista. ?resultado de uma memorização dos acontecimentos da humanidade desde a sua origem até os dias de hoje. Não basta decorar os acontecimentos e datas históricas; 235 História Caderno Didático - 1º Período BRASIL. Ministério da Educação/Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros Curriculares Nacionais: História. Brasília: MEC/ESF, 1998. BRAUDEL, Ferand. O Mediterrâneo e o Mundo Mediterrâneo na Época de Felipe II. Lisboa: Martins Fontes, 1983. BURKE, Peter (Org.). A escrita da história: novas perpectivas. São Paulo:
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