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A queda da TV Excelsior: Os motivos que levaram a falência de uma das maiores redes de televisão do país e sua relação com o Regime Militar* . Ádria Kaline Pereira de Carvalho Daniel Augusto Vila Nova da Silva Gabriel Nonato de Almeida Silva Regiane Pereira da Silveira** Resumo: O presente artigo foi elaborado com o objetivo de analisar a censura sofrida pela TV Excelsior durante o Golpe Militar de 1964. Inaugurada oficialmente em setembro de 1950, a televisão brasileira nasceu em uma época em que o veículo de comunicação mais popular do País era o rádio. Dez anos depois nasce a TV Excelsior, emergindo entre a primeira fase do desenvolvimento da televisão nacional, caracterizada como A Fase Elitista (1950-1964) subsistindo até 1970. Em 1964 quando a TV Excelsior era líder em audiência, dava-se início em 1º de abril do mesmo ano a uma longa ditadura e ao começo do fim de uma das maiores redes de televisão brasileira. Os apontamentos finais indicam que os motivos que levaram a extinção da TV Excelsior foram a grande crise e falência, acarretadas pela pressão e perseguição da intervenção militar que forçou a TV tirar e censurar programas, os quais traziam renda para a emissora. A metodologia utilizada para a elaboração do artigo está vinculada a uma pesquisa de caráter qualitativo, por meio de uma pesquisa bibliográfica. Palavras-Chaves: Televisão brasileira. Golpe Militar 1964. Censura. Queda da TV Excelsior. Abstract: This article was elaborated with the objective of analyzing the censorship suffered by TV Excelsior during the Military Coup of 1964. Inaugurated officially in September of 1950, the Brazilian television was born in a time in which the most popular vehicle of communication of the Country was the radio. Ten years later Excelsior TV was born, emerging between the first phase of the development of the national television, characterized as The Elitist Phase (1950-1964) subsisting until 1970. In 1964 when the TV Excelsior was leader in hearing, 1º April of the same year to a long dictatorship and the beginning of the end of one of the largest Brazilian television networks. The final points indicate that the reasons that led to the extinction of TV Excelsior were the great crisis and bankruptcy, caused by the pressure and persecution of the military intervention that forced the TV to take and censor programs, which brought income to the transmitter. The methodology used for the elaboration of the article is linked to a qualitative research, through a bibliographical research. * Artigo apresentado para a Disciplina História do Jornalismo do Curso de Jornalismo da Faculdade de Informação e Comunicação (FIC) da Universidade Federal de Goiás (UFG), sob orientação da professora Rosana Maria Ribeiro Borges, como requisito parcial para obtenção de nota no primeiro semestre de 2017. ** Estudantes do Curso de Jornalismo da FIC/UFG. Key-words: Brazilian television. Military Coup 1964. Censorship. Fall of Excelsior TV. INTRODUÇÃO A televisão brasileira foi inaugurada oficialmente em 18 de setembro de 1950, na cidade de São Paulo. O propulsor dessa inovação foi o jornalista Assis Chateubriand que fundou o primeiro canal televisivo do país, a TV Tupi. Emergindo em uma época em que o principal meio de comunicação era o rádio a televisão brasileira teve de se sujeitar a influência do mesmo. O que fez com que inicialmente, seguisse a mesma estrutura de programação, bem como os seus artistas e técnicos (MATTOS, 1990). Após a Independência do Brasil, ainda no Período Colonial, a imprensa ganhou uma maior liberdade, porém, a censura reapareceu no Estado Novo (Era Vargas 1937-1946). Com o desenvolvimento dos meios de comunicação, o governo de Getúlio Vargas teve visível preocupação em censurar as ideias e programas divulgados nesse período. Desse modo, o Poder Executivo passou a regular o material publicado nos rádios, jornais, cinemas e revistas daquela época. Após a Era Vargas no final da década de 50 quando já existiam 10 emissoras de televisão em funcionamento, O Código Brasileiro de Telecomunicações foi promulgado pela lei N. 4.117/62, o que resultou segundo Sérgio Mattos em um grande avanço para o setor, pois “além de amenizar as sanções, dava maiores garantias às concessionárias”. Entretanto errava em continuar dando muitas atribuições ao Poder Executivo que continuava tendo jurisdição para frear os conteúdos que iam contra seus ideais. O que para Mattos posteriormente serviu de “inspiração militar” para os que já maquinavam tomar o poder do Estado. O Código Brasileiro de Telecomunicações, aprovado pelo Congresso Nacional, em 1962, era na verdade, um projeto de "inspiração militar, plenamente identificado com as teses de integração nacional, segurança e desenvolvimento pregado na ESG. (PRIOLLI 1985). O Regime ou Ditadura Militar supramencionado no parágrafo acima foi um período (1964-1985) da política brasileira em que o País foi comando por militares, graças a um golpe que derrubou o até então Presidente João Goulart, eleito democraticamente. Esse período ficou marcado pelos vários Atos Institucionais que colocavam em prática a censura, a perseguição política, a supressão de direitos constitucionais, a falta total de democracia e a repressão àqueles que eram contrários ao Regime Militar (REIS, 2005). Quatro anos antes de o país sofrer o maior golpe de Estado da história brasileira nascia precisamente no dia 09 de julho de 1960 a TV Excelsior São Paulo, mais tarde abrindo uma filial também no Rio de Janeiro. A história da Excelsior começou quando um grupo empresarial de quatro membros comprou a concessão do Canal 9, posteriormente a rede passou a pertencer apenas Mário Wallace Simonsen. A TV Excelsior foi a primeira a implantar uma grade de horário fixa, usando uma programação diária e uma programação semanal. Esse modelo foi adotado por outras emissoras e é até hoje utilizado. Ademais uma das propostas da TV era a valorização da cultura brasileira, dando espaço a exibições de filmes nacionais e de artistas locais. Além de pagar os melhores salários para os artistas. Em pouco tempo passou a ser líder em audiência e começou a preocupar os concorrentes econômicos e políticos, acarretando dez anos depois a queda e desaparecimento do nome “TV Excelsior”. Por este motivo o objetivo desse artigo é analisar a censura sofrida pela TV Excelsior durante o Golpe Militar de 1964, ademais desvendar os numerosos motivos que levaram esta que era uma das maiores emissoras televisas do Brasil, à decadência e desaparecimento. Analisando inclusive, a relação da TV Excelsior com o Regime Militar e como ela se portava diante da grande repressão e censura, por motivos do seu proprietário Mário Wallace Simonense ser totalmente democrata e defender a liberdade de expressão, ações estas que se opunha diante da ideologia dos militares. REGIME MILITAR - CONTEXTUALIZAÇÃO HITÓRICA A história do Brasil é marcada por um período em que os historiadores chamam de Ditatura Militar. Esse período é cronologicamente marcado entre os anos de 1964 até 1985, período em que se inicia uma nova fase da política brasileira, a Democracia perde força. O Regime Militar teve início no começo da década de 60, precisamente em 1964, fato que se desencadeou no dia 31 de março de 1964, com a deposição do então, Presidente da República João Goulart, golpe que foi dado e planejado pelos Militares que tinham por objetivo “livrar o país da corrupção e do comunismo e para restaurar a democracia”. (BORIS, p. 463, 1995). Mas, sabe-se que na verdade os objetivos dos Militares não foram esses. “O novo regime começou a mudar as instituições do país através de decretos chamados de Atos Institucionais (AI). Eles eram justificados como decorrência "do exercício do Poder Constituinte, inerente a todas as revoluções”.(BORIS, 1995). O primeiro Ato Institucional decretado pelos Militares foi o Nº 1 “Várias das medidas do AI-1 tinha por objetivo reforçar o Poder Executivo e reduzir o campo de ação do Congresso”. (BORIS, 1995). Segundo Boris (1995) o mesmo Ato permitia a cassação de mandatos de parlamentares, independentemente, da esfera governamental, seja ela municipal, estadual ou federal. Nesse decreto houve o estabelecimento de uma eleição indireta para a presidência da República, sendo eleito o General Humberto de Alencar Castelo Branco pelo Congresso Nacional mandato que durou até 1966. Os Atos Institucionais Nº2 e Nº3 foram decretados no governo de Castelo Branco em 1965. O Ato Institucional Nº 2 “estabeleceu em definitivo que a eleição para presidente e para vice-presidente da República seria realizada pela maioria absoluta do Congresso Nacional, em sessão pública e votação nominal. Evitava-se assim o voto secreto para prevenir surpresas (BORGES, 1995). Enquanto o AI-3 tinha por objetivo estabelecer eleições indiretas nos estados através das respectivas assembleias. O AI-4 é marcado pelo consentimento para a abertura do Congresso Nacional que fora fechado por Castelo Branco. Depois de Castelo Branco outro general a tomar o poder foi Artur da Costa e Silva (1967) e foi justamente nesse governo que teve o ápice dos Atos Institucionais, o AI-5 foi criado, com esse ato os militares puderam novamente fechar o Congresso Nacional, intervir nos Estados e Municípios, além de dar poderes ao presidente para cassar e perseguir políticos. (BORIS, 1995). Foi justamente nesse Ato Institucional que se teve o ápice do modelo de violência praticado pelo Regime Militar: perseguição, tortura, e censura aos meios de comunicação. Foi com quando a presidência foi assumida pelo General Emílio Garrastazu Médici (1969) que ocorreu o “Milagre Econômico” período em que a economia teve um crescimento. Depois de Médici o outro militar a presidência foi o general Ernesto Geisel (1973). No seu governo o pais começou a vivenciar uma abertura política. Em seguida quem assumiu a presidência foi o presidente general João Batista Figueiredo seu mandato foi marcado, apesar das dificuldades econômicas se teve, por uma ampliação da abertura política. O Regime Militar caracterizado pela violação de direitos tanto no aspecto político, como o social, com pratica de violência e torturas teve seu fim no ano de 1985 com a eleição de Tancredo de Almeida Neves. A CENSURA DURANTE O REGIME MILITAR A liberdade de imprensa, no Brasil, ganhou contornos após a Independência, no período imperial, entretanto, a censura reapareceu no Estado Novo; criando a legislação repressiva e centralizadora em relação aos meios de comunicação que, posteriormente ao período democrático, foi expandida e utilizada durante a Ditadura Civil-Militar. O controle comunicacional não foi homogêneo, porém, existiu um enorme incremento desde a instituição do Ato Institucional Número 5 (AI-5), decreto de 13 de dezembro de 1968 que expandiu os poderes do Poder Executivo, no Governo Costa e Silva ao fim do Governo Garrastazu Medici. Durante o Governo Geisel, buscou-se, teoricamente, o início da abertura democrática e com ela a diminuição da censura formal, mas com a manutenção das pressões econômicas através de verbas publicitárias e, consequentemente, o controle privado e estatal da programação. O Decreto-Lei 1077 de 1970 buscava instituir a censura prévia, porém foi incipiente comparado à Legislação repressiva existente. Assim, a redemocratização da liberdade de imprensa passou a ganhar forma efetiva apenas em meados do Governo Figueiredo, desta forma a possibilidade de processos comunicacionais democráticos. Da mesma forma que a intensidade, a forma de censura se deu em vários matizes. Na modalidade de censura prévia existia a necessidade da presença de uma equipe de censores no local de produção e exibição e acabou sendo, ao mesmo tempo, uma alternativa e uma imposição às empresas que recusavam a autocensura ou o envio dos materiais para análise em Brasília. Outra forma de ação eram os bilhetinhos: Ordens escritas e assinadas por autoridade competente ou sem assinatura, avisos, recados escritos, ameaças encaminhadas aos meios de comunicação. Também era comum militares ou agentes estatais ligarem às empresas. O controle econômico por meio de verbas publicitárias também era corrente, haja vista a diminuição de receitas devido o material proibido de circular e o custo decorrente de transportá- los a fim de análise de conteúdo. A autocensura foi um método no qual as empresas criavam e mantinham, com recursos próprios, equipes responsáveis pela censura internamente. Apesar de não ser comum nesses casos, nem aparente de modo geral, o aparelho repressivo do Estado foi usado constantemente a exemplo da invasão no O Estado de São Paulo e atentados à bomba contra o Opinião. Ary Dillon Soares classifica a censura em quatro tipos. O primeiro é proteção do Estado, o mais usado, que se subdivide em atividades repressivas: Prisões, destruição de aparelhos, torturas, morte, etc.. Atividades da oposição: No caso, a oposição política do Movimento Democrático Brasileiro (MDB). Problemas internos do regime: Desonerações, caos de corrupção, etc. 2) Problemas Sociais, 3) Problemas econômicos e 4) Outros, os casos que não se encaixam em nenhum desses tipos. As instituições autoritárias não se comportavam de forma sempre integrada. Setores como os serviços de inteligência contavam com uma grande autonomia em relação a outros aparelhos do Estado. A jurisdição de assuntos como a censura era, desta forma, frequentemente requisitada por diversos órgãos, principalmente entre o Centro de Informações do Exterior do Itamaraty (CIEX) e o Serviço Nacional de Inteligência (SNI). Porém o SNI era quem mantinha maior poder sobre as matérias que seriam censuradas, assim recebia do Ministério da Justiça os considerados suspeitos e perigosos ao regime e remetia de volta os escolhidos. O quarto poder - a mídia como indústria e veículo sociocultural - acaba, de certa forma, impondo sua agenda à sociedade, seja no trato dos fatos e ficções como na escolha do que ocupará a programação, assim, através dele pode-se entender posições e colocações ideológicas existentes em pessoas e grupos (Filho, 1999). No Brasil, no geral, não se buscou um modelo que prezasse pela isenção dos modelos lucrativistas e estatistas baseados no conceito de serviço público, isto é, que atendesse a necessidades da população ensejando a participação democrática e a promoção da cultura. Somente com a Constituição de 1988, o assunto passou a ser tratado com maior profundidade; desta forma, conforme o artigo 223 da carta política, deveria existir a complementaridade entre os sistemas privado, público, e estatal de rádio e teledifusão (Filho, 1999). O movimento antidemocrático, e com ele, a censura, ascendeu a fim de subjugar ações e movimentos julgados subversivos à ordem e ameaças à economia de mercado (Fausto, 1995). Para tanto, a censura emergiu com o papel de homogeneizar as manifestações culturais, comunicacionais, etc., a fim de, dessa forma, manter a coesão social com a supressão do contraditório e, consequentemente, eliminando possíveis ameaças ao regime autoritário. Nesse sentido, o processo de criar sentido, neste país, encontrou-se, na maior parte do tempo, restrito a interesses econômicos e políticos dos proprietários das empresas e agentes do estado ditatorial, e não ao crivo da população. O NASCIMENTO E O PIONEIRISMO DA TV EXCELSIOR No fim da tarde do dia 01 de outubro de 1970, ás 18h30, o programa Adélia e suas Trapalhadas é interrompido e o jornalista Ferreira Netto anuncia que, por ordem do governo, as transmissões do Canal 9 seriam encerradas. Chega ao fim a história de uma das maioresredes de Televisão do país. Poucos dias depois, no dia 15 daquele mesmo mês, a Televisão Excelsior S.A. declarava falência e teve seu fim confirmado. (AMORIM, 2004) A história da TV Excelsior começou no ano de 1959 quando grupo empresarial formado por Mario Wallace Simonsen, Ortiz Monteiro, José Luiz Moura e João de Scantimburgo comprou, pelo valor de 80 milhões de cruzeiros, a concessão do Canal 9, que pertencia à Organização Victor Costa (Posteriormente Simonsen comprou as partes de seus sócios e se tornou único dono do Canal). Junto com a compra veio também diversos equipamentos: transmissores, câmeras, torre, etc. Em um prédio na Rua da Consolação, esquina com Avenida Paulista, foi instalado de forma precária os primeiros equipamentos do canal e no dia 09 de julho de 1960 foi inaugurada a TV Excelsior no Teatro Paulo Eiró. Mesmo com as deficiências iniciais de estruturas físicas, o corpo artístico e a direção da TV Excelsior conseguiram revolucionar o mercado Televisivo Brasileiro de forma marcante. Uma das propostas da TV, fortalecida pelo seu diretor artístico Álvaro Moya, era a valorização da cultura brasileira, dando espaço a exibições de filmes nacionais e de artistas locais. Na Excelsior, imaginei então o Teatro Nove, só com textos nacionais. Gianfrancesco Gaurnieri, Roberto Freire, Jorge de Andrade, Chico de Assis, Walter Negrão e outros autores escreviam especialmente para o veículo dirigido por Flávio Rangel e Adhemar Guerra, com Natalia Timberg, Cleyde Yaconis, Rosamaria Murtinho e com atores fixos, e Stênio Garcia, Fúlvio Stefanini, Armando Bogus, Irina Grecco, Juca de Oliveira, Bentinho, Geraldo Del Rey, Elisio de Albuquerque, Riva Nimitz, Henrique Cesar e outros, convidados. (MOYA, 2004) Foi a primeira a implantar uma grade de horário fixa, usando uma programação vertical (diária) e uma programação horizontal (semanal). Esse modelo foi adotado por outras emissoras e é até hoje utilizada. A TV Excelsior também estabeleceu tempo máximo de intervalo comercial, que era de cinco minutos, ao contrário das suas concorrentes que chegavam a 20 minutos. A TV Excelsior trouxe para o Brasil o conceito de novela diária, que até então eram transmitidas aleatoriamente durante a semana sem horários e dias específicos. A primeira novela com esse formato foi 2-5499 Ocupado, estrelada por Gloria Menezes e Tarcísio Meira. Além disso, o canal foi o primeiro a pagar às suas artistas porcentagens pelo direito de imagem, quando algum programa era vendido. Além disso, a TV conquistou inimizade de suas concorrentes ao quebrar o que era chamado de "acordo de cavalheiros". Esse acordo se tratava de um esquema onde as emissoras se comprometiam a não contratar os funcionários umas das outras, o que forçava os artistas e profissionais a aceitarem salários pequenos, afinal, nenhuma outra emissora contrataria seus serviços. Indo contra esse acordo, o então diretor da TV Excelsior Edson Leite, ofereceu altos salários aos artistas de outras emissoras, especialmente aos mais famosos. Em depoimento a Edgard Ribeiro Amorim a atriz Marcia Real conta: ... Eu fui para o 9 naquela época da debandada. Todo mundo saiu e tinha que sair mesmo.... Eu estava magoada com a Tupi... Então eu saí do 4 e fui para o 9... Eu sai ganhando 25 contos e fui ganhar 250 no 9... Porque o 4, realmente, em termos de pagar, era duro. Tinha, inclusive, um dos diretores, Sr.Rui Aranha, que dizia que artista ele achava na fila do ônibus... Essa era a mentalidade deles... Alguns diretores da Tupi chegaram a dizer: Nós queremos ver o que o Edson Leite vai fazer com o rebotalho da televisão... Comigo foi uma turma – Glória Menezes, Tarcísio Meira, David Neto, Walter Stuart, Lolita Rodrigues e queiram ou não queiram, doa a quem doer, os atores ganham o que ganham hoje na televisão, por causa do Canal 9 (AMORIM, 2004) A TV Excelsior foi pioneira também na criação de um departamento de figurinos. Até então as emissoras usavam as roupas dos próprios atores e atrizes, quando era necessário um figurino de época, os atores por conta própria alugavam as roupas. Foi com inspiração em grandes redes de televisão estadunidenses, como a ABC e a NBC, que a Excelsior planejou implantar no Brasil a primeira rede televisiva, que iria possibilitar uma programação sincronizada em várias cidades do país. Isso se tornou possível com a aquisição do videoteipe em 1962. Foi então inaugurada a TV Excelsior Rio de Janeiro e também o sistema de distribuição de programas gravados para várias filiais. Uma dessas filiais foi a TV Anhanguera, pertencente ao Grupo Jaime Câmara, que hoje é afiliada da Rede Globo, localizada na cidade de Goiânia. O sistema de rede, além do envio de fitas, ainda incluiu um processo de produção industrial. A emissora do Rio de Janeiro (...) produzia os shows de auditório, enquanto a emissora de São Paulo por causa do Teatro Brasileiro de Comédia, e das companhias cinematográficas (...), se caracterizava pela criação em dramaturgia, principalmente após a contratação do elenco da TV Tupi. A Excelsior passou a produzir as telenovelas, construindo uma estrutura que incluía uma cidade cenógrafa e figurinos apropriados para cada novela. (OLIVEIRA, 2002) Foi assim que a TV Excelsior conquistou telespectadores e alcançou o sucesso. Liderou a audiência em São Paulo e Rio de Janeiro, duas das mais importantes cidades do país, e consagrou diversos programas como ícones da década de 60. Entre eles Brasil 60, apresentado por Bibi Ferreira (posteriormente chamado de Brasil 61, 62...), os humorísticos Times Square e Adoráveis Trapalhões e o telejornal Jornal de Vanguarda, esse que recebeu o prêmio na Europa como o melhor jornal da televisão pelos diretores da Eurovisão. Em 1963 a Excelsior vivia no seu apogeu, teve uma gama alta de contratações, com a aquisição de grandes nomes artísticos da época. O programa Moacyr Franco Show era um dos maiores sucessos, conquistou índices de audiência de 97% na cidade de Santos (SP) e 77% em São Paulo. Sua filial carioca foi inaugurada nesse ano com um grande show de 3 horas e conquistou igual sucesso na cidade do Rio de Janeiro. A emissora oferecia altos salários para seus contratos, o que ocasionou uma grande valorização profissional dos artistas e, em consequência, a inflação do mercado, que acabou causando sérias consequências mais tarde para a Excelsior. (AMORIM, 2004) O sucesso da TV Excelsior parecia imbatível, porém alguns anos mais tarde a rede se desmoronaria em meio a crises administrativas e perseguições políticas que se iniciaram com a instauração do Regime Militar. A QUEDA DA EMISSORA Existe muita discussão em torno dos motivos que levaram a TV Excelsior entrar em estado de falência. A perseguição política que Mário Wallace Simonsen sofreu por parte do Regime Militar, são uns dos motivos que levaram ao desmoronamento de seus negócios, levando a TV Excelsior junto. Simonsen tinha apoiado a posse de João Goulart (Jango). O empresário tinha uma forte influência da tradição inglesa que exalta o liberalismo democrático. Do ponto de vista político, Simonsen como um liberal democrata se colocava na defesa da liberdade de expressão. Formado na tradição inglesa, era um legalista, acreditava no poder da constitucionalidade, a ponto de não se deixar enredar pela propaganda anticomunista. (BUSETTO, 2009) Simonsen já havia saído do país e ido para França com a eminente ameaça de golpe militar. Com a concretização do temor de muitos, todos esperavam que a TV fosse sofrer intervenção e teria sua concessão caçada. Mas se passou o fatídico 31 de março, e não aconteceu a esperada cassação. Mário Simonsen se encontrava fora do país. Dias antes do golpe e pressentindo possíveis complicações políticas, partira para a Europa. As perspectivas sobre o destino da emissora não eram nada positivas.Especulava- se que o regime cassaria a concessão de funcionamento da Excelsior, ou que, no mínimo, a TV sofria alguma intervenção oficial. (BUSETTO, 2009) No primeiro dia do Regime a TV teve uma indigestão com os militares. Era 1º de Abril e um dia após o movimento golpista, João Goulart deixa a presidência. Por ordem da direção geral da emissora, não foram transmitidos os acontecimentos nem no Rio e nem em São Paulo. A única transmissão feita sobre o golpe foi de um garoto de 12 anos sendo alvejado na cabeça por um tiro de pistola, na Cinelândia, Rio de Janeiro. O autor do crime aparentava ser um militar. O garoto gritara "Jango, Jango". As cenas foram exibidas no Jornal de Vanguarda, que era o de maior audiência na época. Logo então no primeiro dia a TV Excelsior passa por uma investigação e tem a redação do jornal invadida por militares armados e censores. Sobre esse caso Busetto (2009) diz, "...um mês depois, jornalistas e profissionais da Excelsior paulista seriam presos sob alegação de terem promovido greve no dia 1º de abril com a finalidade de boicotarem a divulgação da 'Revolução de 31 de março." Passado esse período o Governo não fez mais intervenções diretas a TV. Todo o país estava sobre forte censura militar e, sem opção, os diretores da Excelsior recuaram. Mas ao contrário das outras emissoras, que editavam seus programas censurados, ou os trocava por outros, o Canal 9 exibia uma imagem de seus icônicos bonequinhos (um menino e uma menina) com as bocas e os ouvidos tampados, e palavra "CENSURADO" na legenda. Enquanto isso, Mário Wallace Simonsen morava na França, na esperança que o golpe não duraria muito tempo. Desde o início de 1964 ele vinha sendo investigado por uma CPI que o acusava de irregularidades na sua companhia Comal, que era a maior exportadora de café do período, e no dia 23 de abril teve sua licença para importação cassada. Começou então uma forte campanha contra os negócios da família Simonsen, liderado pelo deputado Hebert Levy e apoiado por grande parte da imprensa. Era notório o interesse por parte de empresários do café estadunidenses na queda da Comal. “Os americanos não gostavam de um empresário da parte pobre do mundo que colocava café nas prateleiras deles e que queria vender produtos estrangeiros para os brasileiros. Ele estava entrando num meio onde os americanos dominavam. Ele queria a parte dele” (NOVIS, 2004). A acusação era de que a Comal devia 500 mil sacas de café ao Instituto Brasileiro do Café (IBC), acusação fraudulenta que chegou a utilizar documentos falsos para se sustentar. Após o fim da Comal, a família Simonsen sofreu um novo ataque. Dessa vez o alvo foi a empresa Panair, na época a maior empresa de linhas áreas do Brasil. Em 1965 o Ministério da Aeronáutica, de forma bastante arbitraria, cassou as linhas da empresa aérea e cedeu grande parte delas para a empresa Varing e o resto para a Cruzeiro do Sul. A justificativa dada para a cassação era de que a empresa estava em frágil situação financeira e não poderia oferecer segurança para seus voos (NOVIS, 2004). Após esse ocorrido e da morte de sua esposa Baby Simonsen, Mario Wallace morre em Paris, aos 56 anos, de infarto. A Panair até hoje briga judicialmente para receber de volta seus bens confiscados. Com o desmoronamento das empresas da família Simonsen, a TV Excelsior perdeu seus principais investidores e a partir de então passou a sobreviver apenas do dinheiro de patrocínios publicitários. E foi então no final do ano de 1965 que Wallace Neto vendeu a concessão para os diretores da emissora de São Paulo, Edson Leite e Alberto Saad, e para Otávio Frias e Carlos Caldeira Filho, dono da Folha de São Paulo. Marca-se então a saída da família Simonsen da TV Excelsior. Começa um novo capítulo da emissora e outros eventos que levariam a queda do canal. A empresa sai da mira do Regime Militar por um período, mas entra num turbilhão de péssimas administrações e dívidas milionárias. Mesmo com o crescente número de dívidas, a Excelsior seguiu investindo alto equipamentos e instalações, o que foi tido como uma atitude irresponsável. No afã de tornar-se a emissora de melhor programação e audiência, a Excelsior não mediu gastos e produziu programas mais caros que o lucro que proporcionavam, como já foi salientado. Também contratou atores com salários mais elevados do que poderia pagar. As outras emissoras, para não perderem sua audiência e seus cartazes, entraram no mesmo tipo de esquema, até perceberem que nem o patrocinador, nem a venda de espaço comercial estavam cobrindo as despesas. (AMORIM, 2004) O período também foi marcado por muita briga entres os sócios. Os sócios não se entendiam. Saad e Leite, que eram do ramo, entravam em choque com Frias e Caldeira, os quais queiram imprimir uma administração racionalizada voltada para a obtenção imediata do maior lucro possível. Em 1968, Saad, primeiro, e Leite, depois, deixariam a sociedade. Frias e Caldeira seguem como sócios e contratam diretores que não eram do ramo da TV para gerir a Excelsior." (BUSETTO, 2009). O Canal entra então em uma forte crise financeira e em 1969 retorna para as mãos de Wallace Netto, que compra a concessão de volta. Wallace Neto assume o controle de uma emissora definhando em dívidas e com queda de audiência. A crise já afetava e muito as atividades, o canal perdeu diversos nomes artísticos para a então fundada Rede Globo, que usou da mesma técnica da TV Excelsior. Oferecia grandes salários e abocanhava os maiores nomes artísticos da época. Atrasos de pagamentos as distribuidoras de filmes e seriados e aos funcionários da emissora foram aumentando. Uma greve de funcionários atingiu a empresa, um fato curioso, pois em pleno Regime Militar, o Governo aprovou a realização da greve. A qualidade da programação caiu e a pontualidade do canal se perdeu. Diante de tantos problemas financeiros, Wallace Neto tentaria vender a emissora para ex-deputado Dorival Maci Neto. Porém a negociação foi proibida pelo governo. Naquela transação, o CBT fora exemplarmente aplicado, uma vez que o executivo federal vetara a venda da Excelsior, alegando como motivo da decisão o fato de MaMacieto ter os seus direitos políticos cassados, tanto por questões de ordem política como de corrupção. (BUSETTO, 2009). Wallace Neto chegou a ser preso, mas foi solto após esclarecimentos e foi "obrigado" a continuar com a TV Excelsior. E foi crescendo cada dia mais as dívidas com bancos, fornecedores e funcionários. Em meio à crise, artistas de outras emissoras, em um gesto de generosidade, realizaram campanhas para tentar ajudar o canal e arrecadar fundos para auxiliar os funcionários mais carentes da emissora. Então no dia 1º de Outubro de 1970, o presidente Emílio Médici, assina a ordem de cassação contra a TV Excelsior e o fato é anunciado ao vivo. Quinze dias depois é declarada a falência e chega ao fim a vida do Canal que reinventou o mercado televisivo brasileiro. A Rede Globo que surgiu em 1965, se consolida como líder em audiência usando os moldes da Excelsior. CONSIDERAÇÕES FINAIS Esta pesquisa se propôs como objetivo específico analisar como a TV Excelsior que nasceu pouco antes do Regime Militar, e viveu sua maior parte de existência sob o comando do País na mão dos militares, teve seu auge e seu fim em tão pouco tempo. Ademais analisar a relação dessa emissora e como ela se portava diante da censura e repressão dos militares. O tema possui uma importância muito grande não só no campo jornalístico, como também no desenvolvimento histórico da comunicação brasileira. Pois, desvenda viés escondidos por uma época em que mataram, censuraram, torturaram e exilaram pessoas, por uma época que calou a boca, que escondeu e ainda esconde muitas histórias. Se uma das maiores emissoras e sobrenomes daquela época tiveramseus nomes metralhados pelos militares, imagina quem era pequeno e não tinha tanto poder. Portanto, podemos concluir que as origens dos motivos que levaram o fim da TV Excelsior se escondem não só atrás da perseguição militar sofrida pelo dono da emissora, como também sérios problemas administrativos que consequentemente acarretaram uma montanha de dívidas. Porém é importante elencar que isso não tira a responsabilidade e a maior culpa sobre a perseguição política ao Mário Wallace Simonsen. A obra não esgota todas as explorações acerca do tema, pelo contrário, o intuito é acrescentar no conhecimento e no desenvolvimento para novas pesquisas. REFERÊNCIAS AMORIM, Edgard Ribeiro de. TV Excelsior - Aspectos Históricos. In: MOYA, Álvaro de. Gloria in Excelsior: Ascensão, Apogeu e Queda do Maior Sucesso da Televisão Brasileira. São Paulo: Imprensa Oficial, 2004. p. 149-294. BUSETTO, Áureo. Sem aviões da Panair e imagens da TV Excelsior no ar: um episódio sobre a relação regime militar e televisão.. In: KUSHNIR, Beatriz. (Org.). Maços na gaveta: reflexões sobre a mídia.. 1a.ed.Niteroi: EDUFF, 2009, v. , p. 53-63. FAUSTO, Boris. História do Brasil. Editora da Universidade de São Paulo. São Paulo. 1995. LEAL FILHO, Laurindo Lalo. TV, um poder sem controle. Comunicação & Educação, São Paulo, n. 16, p. 75-80, dec. 1999. ISSN 2316-9125. Disponível em: <http://www.revistas.usp.br/comueduc/article/view/36882>. Acesso em: 06 july 2017. MATTOS, Sérgio. Um Perfil da TV Brasileira: 40 anos de história: 1950-1990. Salvador: A Tarde S/A, 1990. 55 p. Disponível em: <http://www.andi.org.br/sites/default/files/legislacao/02.%20Um%20perfil%20da%20TV%20 brasileira.%2040%20anos%20de%20hist%C3%B3ria.pdf>. Acesso em: 03 jul. 2017. MOYA, Álvaro de. Gloria in Excelsior: Ascensão, Apogeu e Queda do Maior Sucesso da Televisão Brasileira. São Paulo: Imprensa Oficial, 2004. 415 p. NOVIS, Carlos Henrique. Simonsen: Um Império Que Foi Pelos Ares. In: MOYA, Álvaro de. Gloria in Excelsior: Ascensão, Apogeu e Queda do Maior Sucesso da Televisão Brasileira. São Paulo: Imprensa Oficial, 2004. p. 345-389. OLIVEIRA, Marcelo Pires. TV Excelsior: O Elo Perdido: A evolução do modo de produção televisivo, do período romântico para a era industrial, pela visão de seus dirigentes. 2002. 138 f. Dissertação (Mestrado) - Curso de Multimeios, Institute de Artes, Unicamp, Campinas, 2002. Disponível em: <http://repositorio.unicamp.br/jspui/handle/REPOSIP/284162>. Acesso em: 03 jul. 2017. 15 16
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