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MODULO 2 - direito civil

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DIREITO CIVIL – MÓDULO 2
CRITÉRIOS HERMENÊUTICOS
Hermenêutica é a ciência que sistematiza critérios de interpretação do direito aplicado aos casos concretos. Por meio dos métodos de interpretação (literal, comparativa, teleológica, gramatical, sistemática, sociológica), fundamentados em critérios racionais, os operadores da ciência do Direito deverão encontrar a maneira mais adequada e pertinente de tornar concretas as proposições legais e constitucionais previstas no plano normativo.
Desenvolveremos na sequência um estudo específico sobre os temas mencionados, de modo a detalhar pontualmente seus reflexos no campo do Direito Civil brasileiro.
Dignidade humana
A dignidade humana possui previsão expressa no Art. 1º, inciso III, da Constituição, sendo categorizada como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil. Trata-se de macroprincípio constitucional de onde irradiam todos os critérios utilizados para a interpretação e aplicabilidade dos direitos fundamentais no Estado Democrático de Direito. A proteção integral da pessoa humana se reflete diretamente no âmbito do Direito Civil, a partir do fenômeno da despatrimonialização das relações privadas e da atenção especial dada às questões existenciais.O papel do Direito Civil, compreendido sob a ótica constitucionalizante e democrática é proteger de modo amplo, plural e igualitário a pessoa humana, vedando qualquer tipo de tratamento desigual, discriminatório, ultrajante, degradante ou indigno que venha a coincidir com a coisificação de um indivíduo.
Algumas propostas decorrentes do princípio da dignidade humana são: respeito às diferenças e ao pluralismo (ideias, concepções e visões de mundo); superação da vertente patrimonialista, que privilegia a propriedade em detrimento da pessoa humana; liberdade de escolha materializada no exercício da autonomia privada; igualdade de tratamento jurídico no exercício dos direitos civis; interpretação ampla, sistemática e inclusiva dos direitos fundamentais. Nesse contexto:
“A dignidade da pessoa humana é um valor supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem, desde o direito à vida”
Na realidade, “a dignidade humana é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida” (MORAES, 2004, p. 52), considerando que “traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar” (MORAES, 2004, p. 52). De maneira excepcional, são admitidas “limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos” (MORAES, 2004, p. 52).
Pensar a dignidade humana como referencial constitucional para o entendimento das relações privadas é, inicialmente, pôr a pessoa humana no centro gravitacional de toda proteção jurídica que rege as relações interpessoais. Deve-se admitir que toda relação jurídica firmada entre particulares não poderá ter como guia o desprestígio do indivíduo. Tais premissas evidenciam a imprescindibilidade de tratamentos igualitários, não discriminatórios, plurais e inclusivos nas formas jurídicas de constituição de relações entre particulares. Ademais, a dignidade humana deve ser pensada e efetivada tanto na perspectiva individual quanto na coletiva. O direito democrático proposto pelas sociedades contemporâneas não admite a constituição de relações ou a ratificação de condutas que coincidam com a coisificação de sujeitos, independentemente da perspectiva e proposta buscada.
A efetividade do macroprincípio da dignidade humana, no âmbito do Direito Civil, é visualizada nos seguintes exemplos:
· As relações contratuais não podem ser vistas como espaços de legitimação da desigualdade jurídica e estrutural entre os contratantes, devendo a ciência do Direito intervir no sentido de propor tratamento jurídico diferenciado às pessoas consideradas hipossuficientes ou vulneráveis, como é o caso dos consumidores.
· O nome, categorizado como um direito da personalidade hábil a individualizar os sujeitos nos espaços coletivos, não pode causar constrangimentos ou situações vexatórias, pois admitir isso é legitimar a ofensa à dignidade humana.
· Estabelecimentos comerciais não poderão adotar critérios raciais para impedir que pessoas negras frequentem o espaço destinado ao divertimento, pois tal prática, além de estimular a discriminação, atenta diretamente contra o princípio da dignidade humana.
· Uma empresa não poderá produzir campanha publicitária com o fim de enaltecer a mulher branca em detrimento da negra, pois tal prática vai contra os parâmetros constitucionais propostos pelo Estado Democrático de Direito.
· Instituições privadas de ensino não poderão impedir a matrícula de pessoas trans que ainda não retificaram seu registro civil de nascimento, pois tal prática reforça estruturas sociais que reproduzem o preconceito e a discriminação sexual.
Esses exemplos demonstram que, por mais que as pessoas sejam consideradas livres para construir suas relações jurídicas no âmbito privado, tal liberdade deverá ser regrada e dirigida pelo princípio da dignidade da pessoa humana. O Direito Constitucional brasileiro institui limites à liberdade contratual e ao exercício dos direitos civis. O eixo central que direcionará o respectivo regramento constitucional encontra-se no princípio da dignidade humana.
Autonomia privada
A autonomia privada é uma proposição teórica do direito contemporâneo que possui estreita relação com o direito fundamental à liberdade.
A autonomia privada não pode ser confundida com a autonomia da vontade, pois são conceitos que devem ser interpretados e diferenciados a partir do momento histórico em que foram propostos.É um poder conferido a cada sujeito de se autogovernar na “sua esfera jurídica, tendo como matriz a concepção de ser humano como agente moral, dotado de razão, capaz de decidir o que é bom ou ruim para si, e que deve ter liberdade para guiar-se de acordo com essas escolhas, desde que elas não perturbem os direitos de terceiros nem violem outros valores relevantes da comunidade” (SARMENTO, 2005, p. 182).
A autonomia da vontade se relaciona com a liberdade individual no contexto do Estado liberal, cujo foco central de proteção jurídica do Direito Civil era a propriedade privada, não a pessoa humana, haja vista o individualismo regente nesse período histórico. O direito de propriedade privada, na ótica da autonomia da vontade, sistematizava um modelo por meio do qual as pessoas eram livres para dar a destinação que quisessem à sua propriedade, não se vinculando às premissas sociais hoje tratadas pelo princípio da função social da propriedade. Do mesmo modo, as relações contratuais estabelecidas no contexto da autonomia da vontade priorizavam essencialmente os direitos individuais, pois os contratos tinham como foco a proteção jurídica dos direitos dos contratantes, uma vez que o compromisso jurídico não se estendia à proteção dos direitos sociais.
Em contrapartida, verifica-se que o instituto da autonomia privada é uma construção teórica que compreende as liberdades não apenas sob a ótica individual, já que a autodeterminação das pessoas deve ser exercida em compatibilidade com os direitos coletivos (sociais). Nesse contexto propositivo, surgiu a função social da propriedade privada e a função social dos contratos, com o exercício direito à propriedade privilegiando, também, o interesse coletivo mediante o cumprimento da função social da propriedade.
Exemplo
Os proprietários devem cumprir as normas de proteção ambiental e respeitar a legislação trabalhista como meio de coibir o trabalho escravo em propriedades rurais privadas.
No mesmo sentido, os contratos, ainda que sejam acordos de vontade entre particulares, não poderão ser voltados a um objeto que contrarie os direitos da coletividade. Esse é o caso, por exemplo, de contratos de exploração de minério que não priorizam a observância das normasambientais, já que o meio ambiente é um direito metaindividual.
Essa revisitação teórica do direito fundamental à liberdade e à autonomia da pessoa humana nas relações privadas somente foi possível a partir da releitura constitucional proposta pelo texto da Constituição brasileira de 1988, a qual, em seu Art. 5, inciso XXIII, é clara ao estabelecer que a propriedade privada deverá atender sua função social.
Direito à igualdade
O direito fundamental à igualdade é uma conquista histórica da modernidade que se desenhou a partir de premissas jurídico-legais.
Atenção
Em razão das desigualdades estruturais naturalizadas socialmente, foi necessária a intervenção da ciência do Direito como ferramenta hábil para coibir e amenizar as diferenças que caracterizam as relações interpessoais.
A desigualdade social pode ser verificada nos mais diversos aspectos, por razões econômicas, sociais, sexuais, intelectuais, políticas, ideológicas, de gênero, idade, raça, crenças ou origem. O pluralismo e a diversidade são características marcantes da sociedade contemporânea, tornando-se indispensável a criação de proposições normativo-legais no sentido de corrigir tais desigualdades. No âmbito das relações privadas, persistem tais desigualdades, o que justifica a interpretação das normas do Código Civil brasileiro a partir das premissas previstas no texto da Constituição Federal de 1988 (CF).
Tratar os iguais de modo igual, no âmbito de suas desigualdades, é uma proposição teórica que evidencia a importância da análise de cada caso concreto quando se pretende reconhecer a aplicabilidade do direito à igualdade. A igualdade material ou substancial somente se efetivará quando, diante de uma situação concreta, puder verificar qual é a melhor e mais justa interpretação construída para se alcançar a dignidade humana dos sujeitos envolvidos.
Essa lógica deverá guiar as premissas utilizadas na interpretação dos direitos que regem as relações privadas, de modo que toda relação jurídica instituída entre sujeitos não coloque um dos envolvidos em posição de desigualdade e vulnerabilidade.A letra fria do texto legal não garante por si só a igualdade entre as pessoas. Será a interpretação constitucionalizada, construída a partir da dignidade humana, que assegurará, em cada caso concreto, a efetiva igualdade esperada. Para isso, a proteção jurídica da vida humana, como um dos mais importantes bens jurídicos, deve se sobrepor, por exemplo, ao direito de propriedade.
Sistematizar premissas teóricas para reger os critérios humanísticos de interpretação dos direitos fundamentais é o primeiro passo para a igualdade esperada no âmbito das relações privadas. Nenhum direito existente é absoluto a ponto de ser aplicado genericamente de maneira idêntica a casos concretos distintos. Tais proposições se tornam relevantes para evidenciar o quanto é justo, sob o ponto de vista constitucional, propor parâmetros hermenêuticos (interpretativos) com referência central no princípio da supremacia da Constituição.
Negar a existência de um estreito diálogo interpretativo entre as normas constitucionais e as previstas no Código Civil brasileiro constitui um meio de robustecer a desigualdade naturalizada estruturalmente nas relações interpessoais. Partindo-se do princípio de que as pessoas convivem com desigualdades que marcam a vida em sociedade, só por meio de interpretações constitucionalizadas, que primam pela dignidade humana, será possível pensar um sistema que privilegie a igualdade material.
“A igualdade se configura como uma eficácia transcendente, de modo que toda situação de desigualdade persistente à entrada em vigor da norma constitucional deve ser considerada não recepcionada, se não demonstrar compatibilidade com os valores que a Constituição, como norma suprema, proclama”
A interpretação nos ditames propostos pelo texto da Constituição garante a integridade na aplicação do direito fundamental à igualdade no âmbito das relações jurídicas constituídas entre particulares. Qualquer interpretação contrária a essas premissas gerará injustiças, pois endossará as estruturas sociais que naturalizam as desigualdades estruturais. O grande desafio hermenêutico enfrentado quando se debate o direito à igualdade é saber até que ponto o tratamento desigual conferido a uma pessoa não ensejará novas desigualdades nas relações privadas. Isso exigirá do intérprete o cuidado especial de não se ater apenas aos aspectos teóricos apresentados, tendo em vista que o estudo pormenorizado das peculiaridades do caso concreto é algo essencial para se desenhar a interpretação mais justa e que mais adere às premissas constitucionais e democráticas vigentes. Para esclarecer de maneira prática a aplicabilidade do direito fundamental à igualdade no âmbito das relações jurídicas regidas pelo direito privado, confira os exemplos:
· A presunção de hipossuficiência econômica de crianças e adolescentes, que permite a concessão automática dos benefícios da gratuidade judiciária em processos judiciais, constitui um primeiro exemplo prático de tratamento diferenciado conferido à pessoa humana como medida hábil a assegurar a igualdade de acesso à justiça.
· A prioridade de atendimento médico conferido às crianças (Art. 4, parágrafo único da Lei 8069/90 – Estatuto da Criança e do Adolescente) constitui um modo de tratamento diferenciado para assegurar a igualdade material diante de casos concretos específicos.
· A prioridade de atendimento médico conferido a idosos (Art. 3, parágrafo único da Lei 10.741/2003 – Estatuto do Idoso) também constitui mais um exemplo que evidencia o interesse do legislador em assegurar a igualdade material nas relações jurídicas regidas pelo direito privado.
· A igualdade entre pai e mãe no exercício da guarda do filho menor é mais um exemplo previsto no Código Civil de aplicabilidade do direito fundamental à igualdade no plano infraconstitucional.
· A igualdade de direito entre os filhos, vedando-se qualquer designação discriminatória, é mais um clássico exemplo prático de efetividade do direito fundamental à não discriminação, conforme será exposto no item anterior.
Princípio da não discriminação
Tem previsão expressa no Art. 3, inciso IV, da CF, que estabelece como um dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras maneiras de discriminação.
Atenção
O princípio da não discriminação é o desdobramento lógico da interpretação extensiva, sistemática e constitucionalizada do direito fundamental à igualdade e do princípio da dignidade da pessoa humana.
Qualquer tratamento jurídico desigual ou discriminatório coloca o discriminado em posição jurídica de desigualdade perante os demais, além de reconhecer sua condição jurídica de indignidade. Desse modo, o não discriminar constitui-se em um meio de assegurar a igualdade material e as condições reais de exercício da cidadania por meios dignos de existência. Trata-se de direito aplicável por igual a todos os indivíduos, que não deverão suportar estar em posição de real desigualdade jurídica, tendo em vista tratar-se de fundamento regente da teoria dos direitos humanos. No momento em que a ciência do Direito legitima tratamentos discriminatórios, reforça a exclusão, marginalidade e segregação naturalizada nas estruturas sociais e vivenciada cotidianamente por muitas pessoas.A dignidade humana, assim como o direito fundamental à igualdade e o princípio da não discriminação, traduz juridicamente o ideal de valorização da pessoa humana no âmbito do texto constitucional vigente e serve de norte condutor de todo o ordenamento jurídico-legal em vigor, tanto no âmbito do direito público quanto do privado.
O princípio da dignidade, tendo em vista o fator limitante e regulamentador da autonomia privada, veda a coisificação do ser humano e torna inviável o fenômeno de sua degradação.
O princípio da não discriminação nada mais é do que uma vertente negativa do direito à igualdade, considerando que sua efetividadetorna viável o exercício dos direitos da personalidade, expressamente previstos no Código Civil vigente.
A proibição de discriminação no âmbito das relações contratuais constitui um meio legítimo de assegurar a igualdade entre os contratantes. Por mais que o Direito Civil assegure às pessoas a liberdade quanto ao objeto e à forma de contratação, a autonomia privada no âmbito contratual deve observar o dirigismo contratual, pois não é admissível, constitucionalmente, que contratos sejam espaços de tratamentos discriminatórios e desiguais.
Determinada pesquisa (COSTA; PINTO, 2020) analisou a licitude de uma prática corriqueira no mercado de entretenimento brasileiro, a distinção de preços de ingressos entre homens e mulheres em locais de eventos. Ao final dela, foi possível inferir a inadmissibilidade de tratamentos diferenciados e desprovidos de qualquer justificativa que objetivam tão somente discriminar a pessoa, de modo a reduzi-la e colocá-la em situação vexatória, desigual, degradante ou humilhante. Assim, não devem ser tolerados tratamentos diferenciados dissociados do exercício legítimo de direitos fundamentais, em especial, quando o critério de discriminação estiver baseado na raça, origem étnica, identidade de gênero ou orientação sexual, os quais, em regra, são presumidamente odiosos. O ordenamento jurídico deve rechaçar práticas diferenciadas que afetem a dignidade daquele que é discriminado.Ao analisar a eficácia do princípio da igualdade nas relações jurídicas envolvendo estabelecimentos abertos aos públicos, verificou-se que a recusa em se admitir o ingresso de indivíduos em razão de suas características pessoais tende a ser inadmitida, uma vez que, em regra, expõe quem não foi admitido a tratamento público vexatório e desigual, principalmente, se a recusa se basear em questões de natureza sexual, por exemplo.
Quando há oferta realizada ao público, o ofertante acaba por renunciar ao direito de selecionar os contratantes sob bases individuais, de modo que a recusa, nessas circunstâncias, evidencia uma conduta discriminatória, um ato de desprezo pela pessoa inadmitida.
· Ao atuar no mercado, o proprietário do estabelecimento manifesta e torna pública a oferta de seus bens e serviços, razão pela qual qualquer indivíduo que deseja contratá-lo nas condições previamente fixadas poderá fazê-lo.
· Os estabelecimentos abertos ao público, mesmo alicerçados na autonomia privada e no princípio da livre iniciativa, não poderão estabelecer critérios de contratação e admissão de pessoas diferenciadas.
· Portanto, a cobrança diferenciada de preços entre homens e mulheres constitui cláusula abusiva e lesiva na relação de consumo, institucionalizando a desigualdade entre os gêneros de maneira injustificada.
Nessa perspectiva teórica, tende a ser considerada ilícita e, portanto, inadmitida a cobrança de preços distintos para admissão de homens e mulheres em estabelecimentos abertos ao público. Essa desequiparação torna o gênero feminino inferior e tem por intuito fomentar a discriminação em seu sentido negativo (depreciativo), não constituindo, inclusive, prática amparada pela liberdade de contratação e pela livre iniciativa.
Eventual reconhecimento da licitude na diferenciação de preços de ingressos nesse caso desprivilegia o exercício isonômico dos direitos fundamentais em razão do gênero, ou seja, fomenta a desigualdade jurídica entre homens e mulheres, além de constituir, de maneira velada e simbólica, prática de violência de gênero. Tal cobrança de valores distintos é conduta apta a ensejar a legítima intervenção estatal com o propósito de evitar abuso de poder econômico, além de prevenir a institucionalização da desigualdade de gênero.
Quando o Estado intervém nessa seara, regulamentando a questão, deixa claro que a livre iniciativa e a autonomia privada dos fornecedores devem ser exercidas de modo compatível com a igualdade e dignidade humana dos fornecedores.
A cobrança diferenciada de preços, além de coisificar a mulher, coloca o homem em posição de desigualdade jurídico-contratual, pois o obriga a pagar valor maior para desfrutar da mesma prestação de serviços oferecida às pessoas do sexo feminino. Mesmo que os estabelecimentos abertos tornem públicos os critérios diferenciados de admissão de clientes, como o caso da cobrança diferenciada entre homens e mulheres, tal informação constitui cláusula contratual abusiva e lesiva aos consumidores, que são tratados juridicamente de modo desigual.
Atenção
A dignidade humana é princípio constitucional para despatrimonializar as relações jurídicas entre pessoas, garantir a igualdade jurídica de contratação, estabelecer regras ao exercício da livre iniciativa e sistematizar o exercício da autonomia privada a partir da boa-fé objetiva.
Assim, conclui-se pela ilegalidade da prática de cobrança de valores diferenciados entre homens e mulheres para ingresso em eventos, como medida hábil a garantir a construção de critérios interpretativos inclusivos, isonômicos e constitucionalmente dignos.
EXERCÍCIOS
1. O princípio da não discriminação é um desdobramento interpretativo do direito fundamental à igualdade nas relações jurídicas constituídas entre particulares. Com base nesse princípio e direito, assinale a alternativa correta:
a) É juridicamente admitido que estabelecimentos privados de eventos cobrem preços diferenciados em razão do sexo, como é o caso de ingressos mais baratos para mulheres.
b) Toda criança tem prioridade absoluta no que tange ao atendimento médico-hospitalar, fundamento esse essencial para efetivar o direito à igualdade.
c) Em razão do direito fundamental à igualdade, é juridicamente inadmissível qualquer tratamento diferenciado conferido às pessoas no âmbito das relações contratuais.
d) Excepcionalmente, será possível conferir tratamento jurídico diferenciado a filhos reconhecidos após a morte do pai.
2. O Estado Democrático de Direito e a teoria dos direitos fundamentais trouxeram reflexos diretos à interpretação e aplicabilidade dos direitos previstos no âmbito do Código Civil brasileiro vigente. Por isso, é correto afirmar que:
a) A igualdade é um direito fundamental que deve ser interpretado de maneira restritiva no âmbito da aplicabilidade dos direitos previstos no Código Civil brasileiro.
b) A liberdade de contratar deve ser interpretada de modo irrestrito, haja vista tratar-se de direito fundamental que reconhece a autonomia das pessoas em escolher irrestritamente o que pretende contratar.
c) O texto da Constituição brasileira de 1988 trouxe limitações positivas e negativas para regulamentar o exercício dos direitos civil.
d) O advento da dignidade humana enquanto princípio constitucional não assegura amplamente a despatrimonialização do Direito Civil.

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