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UNIVERSIDADE PAULISTA 
HEVILLE SABRINA FONTENELE 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A confissão como requisito do Acordo de Não Persecução Penal sob a égide 
da Lei nº 13.964 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
SÃO PAULO 
2020 
 
HEVILLE SABRINA FONTENELE 
 
 
 
 
 
A confissão como requisito do Acordo de Não Persecução Penal sob a égide 
da Lei nº 13.964 
 
 
 
Trabalho de Conclusão de Curso 
para obtenção do título de 
graduação em Direito apresentado à 
Universidade Paulista – UNIP, na 
área de concentração em Direito 
Processual Penal. 
 
Orientador: Prof. Me. Vitor Luís 
Artioli Kundrat 
 
 
 
 
SÃO PAULO 
2020 
3 
 
HEVILLE SABRINA FONTENELE 
 
 
A confissão como requisito do Acordo de Não Persecução Penal sob a égide 
da Lei nº 13.964 
 
Trabalho de Conclusão de Curso 
para obtenção do título de 
graduação em Direito apresentado à 
Universidade Paulista – UNIP, na 
área de concentração em Direito 
Processual Penal. 
 
Aprovado em: 
 
BANCA EXAMINADORA 
_______________________/__/___ 
Prof. 
Universidade Paulista – UNIP 
_______________________/__/___ 
Prof. 
Universidade Paulista – UNIP 
_______________________/__/___ 
Prof. 
Universidade Paulista UNIP
 
 
RESUMO 
O surgimento do Acordo de Não Persecução Penal (ANPP) no Brasil teve forte 
influência do modelo de Justiça Negociada dos Estados Unidos, onde há ampla 
liberdade de negociação entre as partes, inclusive podendo retirar processos ou 
deixar de aplicar penas, vigorando o princípio da oportunidade na ação penal. O 
instituto surgiu através de uma Resolução do Conselho Nacional do Ministério 
Público e posteriormente foi positivado no ordenamento jurídico através do Pacote 
Anticrime. Analisando-se os requisitos para celebrar o acordo emerge um 
questionamento quanto a necessidade de confissão do acusado. De mera 
formalidade a real necessidade, passa-se ao conflito entre um dever de confessar e 
a garantia da presunção de inocência. Tem-se que é preciso fazer um confronto 
entre a confissão e os demais elementos probatórios disponíveis. Ela não deve ser 
utilizada como base para propositura de eventual ação penal, nem como 
entendimento de que o investigado é culpado. Há que se efetivar uma garantia de 
não autoincriminação aos acusados. Além disso, nota-se ainda uma cultura de 
aceleração dos processos em busca de maior eficiência e celeridade. Entretanto, tal 
movimento não pode suprimir garantias individuais. No tocante ao papel do juiz no 
acordo, é importante ressaltar que ele age como um limitador do poder negocial das 
partes, com o intuito de preservar garantias constitucionais. Visto isso, torna-se 
imprescindível um controle jurisdicional efetivo sobre o acordo, de modo a apreciar 
os requisitos legais, a livre manifestação de vontade do imputado e o suporte fático 
probatório mínimo para que seja acolhido o acordo. Isso é essencial para garantir os 
direitos individuais de um réu em potencial, que poderá ter sua liberdade privada a 
depender do caso. 
 
Palavras-chave: Acordo de Não Persecução Penal. Confissão. Garantias 
fundamentais. 
 
 
5 
 
 
ABSTRACT 
The emergence of the Non-Criminal Persecution Agreement (ANPP) in Brazil had a 
strong influence on the United States Negotiated Justice model, where there is ample 
freedom of negotiation between the parties, including being able to withdraw lawsuits 
or stop applying penalties, with the principle of opportunity in criminal action. The 
institute emerged through a Resolution of the National Council of the Public 
Prosecutor's Office and was subsequently confirmed in the legal system through the 
Anticrime Package. Analyzing the requirements to conclude the agreement, a 
question arises as to the need for the accused's confession. From mere formality to 
the real need, there is a conflict between the duty to confess and the guarantee of 
the presumption of innocence. It is necessary to make a confrontation between the 
confession and the other available evidence. It should not be used as a basis for 
filing a possible criminal action, nor as an understanding that the investigated person 
is guilty. There must be a guarantee of non-self-incrimination against the accused. In 
addition, there is also a culture of accelerating processes in search of greater 
efficiency and speed. However, such a move cannot remove individual guarantees. 
Regarding the role of the judge in the agreement, it is important to note that he acts 
as a limiter of the parties' negotiating power, in order to preserve constitutional 
guarantees. In view of this, effective jurisdictional control over the agreement is 
essential in order to assess the legal requirements, the free will of the accused and 
the minimum factual factual support for the agreement to be accepted. This is 
essential to guarantee the individual rights of a potential defendant, who may have 
his or her private freedom depending on the case. 
 
 
Keywords: Non-Persecution Agreement. Confession. Fundamental guarantees. 
 
 
 
6 
 
 
SUMÁRIO 
Introdução...................................................................................................................7 
Capítulo I.....................................................................................................................9 
1. Justiça negociada no Brasil..................................................................................9 
1.1 Origens da experiência dos Estados Unidos e um breve histórico................9 
1.2 Os requisitos e termos do Acordo de Não Persecução Penal.......................13 
Capítulo II..................................................................................................................17 
2. A confissão como condição de aceitação do Acordo......................................17 
2.1 A confissão como requisito formal..................................................................17 
2.2 Presunção de culpa ou presunção de inocência?..........................................19 
2.3 A confissão como fundamento para propositura da ação penal..................21 
Capítulo III.................................................................................................................24 
3. O papel judicial no Acordo de Não Persecução Penal.....................................24 
3.1 O juiz como fiscal da legalidade do Acordo....................................................24 
3.2 A possibilidade de reformulação do Acordo...................................................28 
3.3 O descumprimento e a recusa à homologação como autorizadores ao 
oferecimento da denúncia.......................................................................................31 
Conclusão.................................................................................................................41 
Referências Bibliográficas......................................................................................44 
 
 
 
 
 
 
7 
 
 
1 INTRODUÇÃO 
No presente trabalho será abordado o Acordo de Não Persecução Penal 
(ANPP), novo instrumento do Processo Penal brasileiro positivado no ordenamento 
jurídico nacional através da Lei de nº 13.964 de 2019, também chamada de “Pacote 
Anticrime”. 
A atual redação do art. 28-A do Código de Processo Penal (CPP) disciplina o 
Acordo e seus requisitos para celebração, através de proposta do Ministério Público 
(MP). O mencionado artigo prevê que se não for caso de arquivamento, se 
necessário e suficiente para reprovar e prevenir o crime e se ele tiver pena mínima 
inferior a 4 anos, o acordo poderá ser proposto, “tendo o investigado confessado 
formal e circunstancialmente a prática de infração penal sem violência ou grave 
ameaça” (BRASIL, 2019). 
No CPP estão previstas diversas condições a serem cumpridas pelo acusado 
de modo cumulado e alternativo, que são: 
I - reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, exceto na impossibilidade defazê-lo; 
II - renunciar voluntariamente a bens e direitos indicados pelo Ministério 
Público como instrumentos, produto ou proveito do crime; 
III - prestar serviço à comunidade ou a entidades públicas por período 
correspondente à pena mínima cominada ao delito diminuída de um a dois 
terços, em local a ser indicado pelo juízo da execução, na forma do art. 46 
do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal); 
IV - pagar prestação pecuniária, a ser estipulada nos termos do art. 45 do 
Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), a entidade 
pública ou de interesse social, a ser indicada pelo juízo da execução, que 
tenha, preferencialmente, como função proteger bens jurídicos iguais ou 
semelhantes aos aparentemente lesados pelo delito; ou 
V - cumprir, por prazo determinado, outra condição indicada pelo Ministério 
Público, desde que proporcional e compatível com a infração penal 
imputada. (BRASIL, 2019). 
Entretanto, um grande questionamento que emerge da redação legal é quanto 
a necessidade de confissão do acusado para celebração do acordo e qual a 
natureza e efeitos desse ato no processo. Realmente seria preciso confessar o 
crime a fim de garantir a aceitação de uma medida negocial? Essa confissão 
8 
 
ofenderia a presunção de inocência ou seria na verdade uma presunção de culpa do 
acusado como condição para a negociação? 
Além disso, a disciplina legal do instituto prevê também a possibilidade de 
retomada da ação penal. A denúncia pode ser oferecida nos casos de recusa judicial 
à homologação do Acordo ou de descumprimento pelo acusado das condições 
estabelecidas. 
Cabe salientar e investigar a importância do papel desempenhado pelo juiz 
nessas situações, visto que a ele caberá a homologação ou não do acordo. O 
magistrado irá aferir a eventual inadequação, insuficiência ou abusividade das 
condições propostas pelo MP, bem como se de fato não há vícios na voluntariedade 
em aderir ao acordo, se realmente há livre disposição da vontade (BRASIL, 2019). 
Considerando o exposto, tem-se que o Judiciário funciona como um verdadeiro fiscal 
da legalidade do ANPP. 
Visto que a depender da postura judicial tem-se a possibilidade de retomada 
da ação penal, emerge mais uma indagação: será permitido se basear no fato de 
que o acusado teve que confessar a prática do crime para celebrar o acordo como 
meio de prova para justificar e fundamentar a ação penal? Tal confissão tem 
natureza material, a fim de demonstrar a justa causa para movimentação do aparato 
estatal na persecução penal? 
Diante das considerações e questionamentos expostos, que norteiam essa 
pesquisa, o presente trabalho irá se desenvolver em torno desse eixo temático. Será 
feita relação entre a confissão, os requisitos para celebração do acordo, a atuação 
do juiz e a possibilidade de retomada da ação penal com o oferecimento da 
denúncia. 
Para tal, a monografia será dividida em três capítulos. O primeiro irá tratar do 
histórico da Justiça negociada na esfera penal, abordando as raízes na experiência 
dos Estados Unidos, onde essa prática é bastante difundida, e um histórico do 
instituto no Brasil, passando por outros instrumentos já anteriormente previstos de 
transação e suspensão processual, bem como o trajeto de criação do ANPP desde a 
sua primeira Resolução instituidora. 
9 
 
Em seu segundo capítulo, a monografia irá abordar mais especificamente o 
tema da confissão, com vistas a tentar responder aos questionamentos norteadores 
dessa pesquisa já explicitados. Serão discutidos pontos como a confissão como uma 
condição de aceitabilidade do acordo, o status de mera formalidade ou de 
necessidade real para sua celebração e sua natureza e efeitos jurídicos. 
Com relação ao tratamento que o acusado receberá será tratada a 
manutenção de sua presunção de inocência ou presunção de sua culpabilidade para 
fins do acordo, com o intuito de assim definir melhor posição acerca da autorização 
para uso dessa confissão como fundamento de retomada da ação penal. 
No terceiro capítulo será discutido o papel judicial no Acordo de Não 
Persecução Penal, enquanto fiscal de sua legalidade e examinador da abusividade e 
adequação das condições impostas, bem como da voluntariedade ao aderir ao 
ANPP. Também se tratará sobre os casos em que for reportado ao juiz acerca do 
descumprimento das condições estabelecidas ou quando ele se recusar à 
homologação, situações que autorizam o oferecimento da denúncia. 
Por fim, serão feitas as considerações finais sobre o tema após o 
aprofundamento da pesquisa, leituras e reflexões, com as respectivas referências 
bibliográficas. 
1 JUSTIÇA NEGOCIADA NO BRASIL 
1.1 Origens na experiência dos Estados Unidos e um breve histórico 
Pode-se considerar vigente no Brasil um modelo essencialmente repressivo, 
visto que confere especial relevância à pretensão punitiva do Estado e ao justo e 
necessário castigo do criminoso. Entretanto tal sistema penal está em crise; é 
possível citar dois motivos para tal, dentre eles: 
inflação legislativa em matéria penal, com excessiva criminalização e 
consequente hipertrofia de todo o sistema, levando ao 
enfraquecimento da eficácia intimidatória da sanção; e 
congestionamento processual, com a deletéria consequência de 
morosidade na tramitação dos processos e, como decorrência, 
diminuição do efeito de prevenção geral do sistema penal (CAMPOS, 
2012). 
10 
 
Na esfera criminal, a ideia de resolução consensual do conflito ainda se 
encontra em tímida expansão. Isto porque sempre prevaleceram a cultura do litígio e 
a ideia de adversariedade entre Ministério Público e defesa. Devido à falha do 
modelo ressocializador dos criminosos, faz-se necessária a implementação de 
medidas alternativas para possibilitar o descongestionamento da máquina estatal. 
Nos Estados Unidos da América, que faz parte do sistema jurídico da 
chamada Common Law, as práticas e procedimentos criminais foram desenvolvidos 
de forma consuetudinária, apresentando significativas variações de acordo com a 
esfera de jurisdição. 
Lá existe a plea bargaining, famoso instituto que consiste em um processo de 
negociação através do qual o réu aceita confessar sua culpa em troca de alguma 
benefício por parte da promotoria, que pode ser redução no número ou na gravidade 
das acusações feitas contra ele ou redução da pena aplicada na sentença ou na 
recomendação de sentença feita pela acusação (CHEMERINSKY, LEVENSON, 
2008, p. 648). 
Nos EUA cerca de 90% dos casos criminais não chega a ser levado a 
julgamento (CAMPOS, 2012). Parece claro que essa prática encontra seu 
fundamento sobretudo em razões relacionadas ao eficientismo/utilitarismo do 
sistema punitivo estatal, com relativa abdicação de direitos e garantias do acusado. 
Observa-se “uma supervalorização das ideias de eficiência na proteção 
jurídico-penal”, com o escopo de “evitar trabalho e conseguir um benefício também 
do tipo econômico”, com certa “comercialização” no âmbito da Justiça Penal 
(CAMPOS, 2012). Os agentes envolvidos no processo criminal concentram todas as 
suas forças em uma solução preliminar, para encerrar de imediato um caso e 
começar outro, aumentando quantitativamente sua produtividade, numa perspectiva 
utilitária, como que para transparecer um fortalecimento político-institucional. 
Em primeiro lugar observa-se que a garantia da presunção de inocência, um 
dos fundamentos de um processo penal democrático, dissipa-se e inverte-se em um 
campo jurídico-penal pautado pela barganha. Percebe-se que tal garantia acaba 
distorcida com a consagração de uma presunção de culpa ou até de um “dever de 
confissão”. Como bem observa Milton Heumann (1981, p.138): 
11 
 
Gradualmente os juízes começam a encontrar dificuldade para 
presumir que a maioria dos acusados é inocente. Certamente, há 
casos em que o julgador tem dúvidas sobre a culpabilidade fática do 
réu, mas com o tempo eletende a acreditar que a maioria dos 
imputados é realmente culpada do crime, ou de alguma ofensa 
aproximada. 
De certa forma, na tradição norte-americana, acabou se consolidando um 
império da economia processual, pautado por uma urgência que privilegia uma alta 
flexibilidade negocial com o objetivo de ser mais funcional e não permitir a 
morosidade da Justiça. 
 Entretanto, há um problema com esse modelo: vê-se o ressurgimento da 
confissão como uma espécie de “rainha das provas” e fundamento único capaz de 
sustentar uma condenação. Devido à alta disseminação dessa prática negocial no 
fim das contas muitas vezes não importa se o acusado realmente é culpado, se ele 
realmente cometeu um crime. Só a pressão e o medo de sofrer um processo criminal 
e a possibilidade de ser punido já fazem com que ele muitas vezes confesse mesmo 
sem ter feito nada, com vistas a se livrar de um processo e obter os benefícios 
propostos pela promotoria. 
Com a ilegítima hipervalorização da confissão incriminadora, regressa-se, a 
um modelo autoritário das provas no processo penal. Há a consagração da 
confissão como “rainha das provas”, característico do sistema processual da 
Inquisição, em que há confusão entre as funções de investigação, acusação e 
julgamento (GIACOMOLLI,2015). 
Dentro do plea barganing há duas possibilidades negociais nos EUA: a guilty 
plea, em que o que ocorre é o reconhecimento da culpa em troca de uma benesse 
penal, e o no nolo contendere, em que não há esse reconhecimento de culpa. Nesta, 
o indivíduo apenas deixa de contestar a acusação. (VIANA, 2019). 
Visto isso, tem-se que a partir do estudo e análise das alternativas 
consensuais estadunidenses, nota-se a sua diferença em relação ao modelo 
brasileiro. Lá há ampla liberdade para transigir, considerando que vigora o princípio 
da oportunidade na ação penal, e não o da obrigatoriedade como no Brasil; Este se 
mais se aproxima dos fundamentos do processo penal europeu, em que há: 
12 
 
a regulação por lei dos seus institutos, com o estabelecimento de 
seus pressupostos e requisitos; limitação ao poder de atuação do 
Ministério Público, que atua vinculado ao princípio da obrigatoriedade 
da ação penal e às regras de aplicação estrita do princípio da 
legalidade; e outorga de papel mais relevante ao juiz criminal 
(FERNANDES, 2005). 
Apesar das distinções, há sim uma inspiração estrangeira em institutos que 
foram surgindo no Brasil ao longo dos anos. A implementação da Justiça Penal 
Negociada teve como marco histórico a edição da Lei n. 9.099/1995 (BRASIL, 1995), 
que trouxe ao ordenamento brasileiro um novo modelo fundado no consenso. 
Embora o Brasil seja tradicionalmente norteado pelo sistema do civil law, a Lei 
n. 9.099/1995 foi responsável pela implementação de duas grandes medidas 
despenalizadoras, a transação penal e a suspensão condicional do processo, que 
foram bastante influenciadas pelo modelo norte americano. A transação penal 
consiste na proposta, feita pelo MP de aplicação imediata (antes da instauração 
formal do processo) de pena restritiva de direitos ou de multa (BRASIL, 1995). É um 
meio de substituição do oferecimento da denúncia criminal, evitando que sequer 
seja iniciada a ação penal tradicional. 
Já na suspensão do processo, por um período de dois a quatro anos, desde 
que o acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro 
crime, e obedecendo à condições fixadas em lei, o processo será suspenso 
(BRASIL, 1995). 
No contexto brasileiro, muito se critica acerca da atuação simultânea do MP 
como fiscal da ordem jurídica e parte acusadora. Parte da doutrina entende que não 
é possível que o MP seja imparcial ou isento devido à sua função. Aury Lopes Jr. 
(2020), por exemplo, entendem que o Ministério Público é “uma parte artificialmente 
construída para ser o contraditor natural do sujeito passivo (afastada assim a 
contradição semântica de 'parte-imparcial', além de sua ilogicidade)”, objetivando 
afirmar que a ideia de imparcialidade do MP é uma falsa construção dogmática. 
Apesar disso, o certo é que através desses institutos, que são propostos pelo 
Ministério Público, houve um rompimento com a ideia de justiça penal do conflito e 
do litígio e, de certa forma, foi instituída uma ritualística processual negocial. A Lei n. 
9.099/1995 foi um marco histórico na implementação das medidas despenalizadoras 
13 
 
e abriu espaço para a disseminação de uma cultura do consenso entre os 
jurisdicionados. 
Entretanto, não se pode perder de vista que, após análise dessa inspiração 
de modelos de outros países, não poderia ser realizada essa importação sem antes 
promover uma reflexão crítica: (a) as soluções transacionais são isentas de 
crítica nos países de origem? (b) não o sendo, como enfrentar possíveis 
vulnerabilidades? (c) o modelo de justiça consensual que experimentamos nos 
Juizados Especiais Criminais formou uma cultura jurídica menos dependente da 
tutela do Estado? (d) os acordos estão sendo negociados em uma plataforma 
horizontal e paritária? 
Abriu-se maior espaço para a discussão acerca da viabilidade dos 
procedimentos alternativos de resolução das lides penais, garantir maior efetividade 
à tutela jurisdicional prestada na seara criminal. Entretanto, apesar da existência dos 
institutos citados, havia ainda as infrações que não se enquadravam nos requisitos 
legais para obtenção dos benefícios da lei processual penal. Essa circunstância com 
o passar do tempo tornou-se um impasse para uma atuação célere e efetiva do 
aparato estatal e influenciou, de certo modo, a criação do acordo de não persecução 
penal. 
1.2 O Acordo de Não Persecução Penal: surgimento, requisitos e termos 
É possível verificar que há uma sintonia entre o Acordo e compromissos 
internacionais que funcionam como vetores axiológicos da construção normativa dos 
países. Em particular cabe ressaltar a Resolução de nº 45/110 da Assembleia Geral 
das Nações Unidas, em que, em 14 de dezembro de 1990, editou as chamadas 
Regras de Tóquio. 
Nelas ficou acertada a necessidade de implementação de medidas 
alternativas a serem tomadas antes do início processo, conforme disposto: 
Sempre que adequado e compatível com o sistema jurídico, a polícia, 
o Ministério Público ou outros serviços encarregados da justiça 
criminal podem retirar os procedimentos contra o infrator se 
considerarem que não é necessário recorrer a um processo judicial 
com vistas à proteção da sociedade, à prevenção do crime ou à 
promoção do respeito pela lei ou pelos direitos das vítimas para a 
decisão sobre a adequação da retirada ou determinação dos 
14 
 
procedimentos deve-se desenvolver um conjunto de critérios 
estabelecidos dentro de cada sistema legal. Para infrações menores, 
o promotor pode impor medidas não privativas de liberdade, se 
apropriado. (COSTA RICA, 1969) 
Após essa trajetória da justiça criminal negocial no Brasil, o Conselho 
Nacional do Ministério Público (CNMP) em 2017 editou a Resolução de nº 181. Ela 
possuía o objetivo de aprimorar as investigações presididas pelo Ministério Público, 
tornando-as mais céleres, eficientes, desburocratizadas e regidas pelo princípio 
acusatório e pela observância aos direitos fundamentais dos investigados. 
 Entre as diversas alterações promovidas no âmbito do Procedimento de 
Investigação Criminal (PIC), o CNMP criou um instituto até então desconhecido pelo 
sistema brasileiro de justiça criminal: o Acordo de Não Persecução Penal. Seu 
surgimento teve como fundamentos a carga excessiva de processos acumulados 
nas varas criminais e um interesse em evitar o desperdício, com a priorização dos 
recursos financeiros e humanos para processo e julgamento dos casos mais graves 
(BRASIL, 2017). 
Tal resolução foi posteriormente, em 2018, alterada por outra de nº 183. Nela 
há definição da situação autorizadora para proposição do acordo, que é quandonão 
for o caso de arquivamento e a pena mínima cominada for inferior a 4 anos, sendo 
que o crime não pode ter sido cometido com violência ou grave ameaça à pessoa e 
o investigado deve ter confessado formal e circunstanciadamente a prática do delito. 
 A partir disso, é possível constatar que trata-se de providência que busca 
assegurar a celebração de uma negociação com a pessoa cujas provas colhidas na 
fase pré-processual já indiquem ter sido ela a autora da infração penal. Visto isso, 
ficam ajustadas as seguintes condições a serem cumpridas pelo acusado, de forma 
cumulativa ou alternativa, como forma de “punição”: 
I – reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, salvo impossibilidade 
de fazê-lo; II – renunciar voluntariamente a bens e direitos, indicados 
pelo Ministério Público como instrumentos, produto ou proveito do 
crime; III – prestar serviço à comunidade ou a entidades públicas por 
período correspondente à pena mínima cominada ao delito, 
diminuída de um a dois terços, em local a ser indicado pelo Ministério 
Público; IV – pagar prestação pecuniária, a ser estipulada nos termos 
do art. 45 do Código Penal, a entidade pública ou de interesse social 
a ser indicada pelo Ministério Público, devendo a prestação ser 
destinada preferencialmente àquelas entidades que tenham como 
15 
 
função proteger bens jurídicos iguais ou semelhantes aos 
aparentemente lesados pelo delito; V – cumprir outra condição 
estipulada pelo Ministério Público, desde que proporcional e 
compatível com a infração penal aparentemente praticada (BRASIL, 
2018). 
Nota-se a partir dos requisitos fixados que eles são típicos de prestações 
alternativas à privação de liberdade, semelhantes as que são estabelecidas nos 
casos de suspensão do processo ou transação penal no âmbito dos Juizados, 
conforme já explanado. O investigado tem o dever de comprovar mensalmente o seu 
cumprimento independentemente de notificação ou aviso prévio, além de, quando 
for preciso apresentar de modo documentado eventual justificativa para o não 
cumprimento do negociado. 
Há ainda um rol que elenca vedações ao Acordo, dentre as quais estão 
quando: 
I – for cabível a transação penal, nos termos da lei; II – o dano 
causado for superior a vinte salários mínimos ou a parâmetro 
econômico diverso definido pelo respectivo órgão de revisão, nos 
termos da regulamentação local; III – o investigado incorra em 
alguma das hipóteses previstas no art. 76, § 2º, da Lei nº 9.099/95; 
IV – o aguardo para o cumprimento do acordo possa acarretar a 
prescrição da pretensão punitiva estatal; V – o delito for hediondo ou 
equiparado e nos casos de incidência da Lei nº 11.340, de 7 de 
agosto de 2006; VI – a celebração do acordo não atender ao que 
seja necessário e suficiente para a reprovação e prevenção do crime 
(BRASIL, 2018). 
A partir dessa previsão observa-se que a Resolução se preocupou em 
privilegiar os instrumentos já consagrados na Lei dos Juizados Especiais, bem como 
dar preferência aos crimes menos graves e de menor expressão financeira. 
Posteriormente a essa verificação do enquadramento do caso aos requisitos 
para celebração, o Acordo é submetido à apreciação judicial. O juiz pode adotar 
diferentes posturas frente a ele; dentre elas, a mais esperada é que ele considere 
cabível o instrumento e as condições propostas como adequadas e suficientes, com 
remessa dos autos ao MP para sua implementação. 
Entretanto, caso esse juízo ocorra em sentido contrário os autos serão 
remetidos ao Procurador-geral ou ao órgão interno superior, que poderá oferecer a 
denúncia ou designar alguém para fazê-lo. Há ainda as possibilidades de 
16 
 
complementação das investigações, reformulação da proposta ou manutenção do 
acordo. 
 Além dessas situações, há também o caso de descumprimento de quaisquer 
das condições estipuladas no acordo ou não observância dos deveres 
estabelecidos. Nessa circunstância, o MP pode imediatamente oferecer denúncia ou 
essa conduta do acusado poderá ser utilizada pela Promotoria como justificativa 
para o eventual não oferecimento de suspensão condicional do processo. 
Entretanto, com toda essa extensa e inovadora disciplina do instituto muito se 
questionou acerca do meio utilizado para introduzir o Acordo no ordenamento 
jurídico brasileiro. Foi aí que foram ajuizadas duas Ações Diretas de 
Inconstitucionalidade (ADI), de nº 5.790 e nº 5.793. 
A ADI de nº 5.790 foi ajuizada pela Associação dos Magistrados Brasileiros 
(AMB), alegando que a norma questionada (a Resolução de 2017) invade a 
competência legislativa, inovando em matéria penal e processual penal, além de 
violar direitos e garantias individuais. De acordo com a associação, a norma também 
apresenta vício de inconstitucionalidade material, uma vez que, a pretexto de fazer 
acordo, o CNMP usurpou a competência do Poder Judiciário para julgar e impor 
sanção aos jurisdicionados. 
Já a ADI de nº 5.793 foi ajuizada pelo Conselho Federal da Ordem dos 
Advogados do Brasil (OAB), questionando dispositivos da Resolução que dispõem 
sobre a instauração e tramitação do procedimento investigatório criminal a cargo do 
Ministério Público. Para a Ordem, a Resolução contestada extrapolou seu poder 
regulamentar inovando no ordenamento jurídico. Haveria ofensa aos princípios da 
reserva legal e da segurança jurídica, considerando a competência privativa da 
União para legislar sobre matéria penal e processual penal. 
Esses questionamentos judiciais acabaram por impulsionar a “regularização” 
desse instituto, que ocorreu com a entrada em vigor da Lei de nº 13.964/2019, 
popularmente conhecida como Pacote Anticrime. Através dela ocorreram diversas 
alterações nos sistemas penal e processual penal, dentre as quais a disciplina agora 
legal no CPP do Acordo de Não Persecução Penal em seu artigo 28-A. 
17 
 
O fato é que a nova redação do Código nada mais fez do que praticamente 
repetir a disciplina já instituída na Resolução de nº 183 do CNMP. Há pouquíssimas 
alterações nos requisitos, como a escolha do juízo da execução penal sobre o local 
de prestação do serviço comunitário e valor da prestação pecuniária e a 
determinação de cumprir outra condição indicada pelo MP por prazo determinado 
(BRASIL, 2019). 
A partir de então, no dia 05 de junho do corrente ano, o relator da ação 
proposta pela AMB, ministro Ricardo Lewandowski, determinou a manifestação da 
parte autora sobre a entrada em vigor da Lei de nº 13.964/2019. Os autos ainda 
estão pendentes de julgamento no Supremo Tribunal Federal (STF). Na ação 
proposta pela OAB, cujo relator também é o ministro Lewandowski, igualmente foi 
determinada à parte autora a mesma manifestação. No dia 21/07/2020 os autos 
foram conclusos ao relator e ainda estão pendentes de julgamento. 
 
2 A confissão como condição de aceitação do Acordo 
2.1 A confissão como requisito formal 
No âmbito da Lei dos Juizados Especiais, o reconhecimento da culpa é 
prescindível para fins de celebração da transação. Entretanto, tal não foi a opção 
legislativa no tocante ao Acordo de Não Persecução, visto que nele é previsto como 
um de seus requisitos para celebração que o acusado tenha confessado formal e 
circunstanciadamente a prática do delito. 
Segundo Nucci (p.762, 2020): 
confessar, no âmbito do processo penal, é admitir contra si, por 
quem seja suspeito ou acusado de um crime, tendo pleno 
discernimento, voluntária, expressa e pessoalmente, diante da 
autoridade competente, em ato solene e público, reduzido a termo, a 
prática de algum fato criminoso. 
 
A confissão é considerada um ato antinatural, visto que não é da natureza 
humana reconhecer suas falhas, principalmente no contexto de uma investigação 
criminal, em que as consequências para quem o fizer podem ser muito graves. Visto 
isso, é muito importante que ela seja avaliada com prudência e equilíbrio. 
18 
 
A melhor e mais eficaz forma de se apreciar o valor da confissão é buscarconhecer os fundamentos que levaram o acusado a fazê-la, os motivos que 
sustentam sua admissão de culpa. Para tal, deve-se ter em mente que ela não pode 
simplesmente ser considerada como a “rainha das provas”, com um caráter absoluto 
(NUCCI, 2020). 
Isso se deve ao fato de que em muitos casos ela pode ser inconsistente, 
viciada ou até mesmo falsa. Ela pode ocorrer em razão de coação, falsa percepção 
da realidade, distúrbios psicológicos, entre outros motivos. Por isso ela goza de 
retratabilidade, garantia para o acusado, visto que a admissão de culpa envolve 
direitos fundamentais e o direito à liberdade, tão caro aos indivíduos pode ser 
comprometido. 
Em razão disso, é indispensável ao juiz que proceda ao confronto da 
confissão com as outras provas existentes nos autos, não aceitando que ela 
isoladamente signifique a condenação do réu. É preciso haver compatibilidade e 
concordância dela com o quadro probatório já colhido através dos procedimentos 
investigativos. 
Esta confissão deve ser feita também circunstancialmente, ou seja, devem 
estar detalhados todos os fatos, de maneira pormenorizada e sem margem para 
quaisquer dúvidas, atentando-se sempre para que tenha sido feita sem coação de 
nenhuma natureza, conforme exige o art. 8º., 3, da Convenção Americana sobre 
Direitos Humanos (COSTA RICA, 1969). 
Se o investigado praticou, supostamente, duas ou mais infrações penais, 
tendo confessado apenas uma delas, o acordo somente poderá ser feito em relação 
ao fato admitido, devendo ser oferecida denúncia (caso haja justa causa) no que diz 
respeito ao outro fato. Se o acusado confessar a autoria porém indicar um fato que 
lhe favoreça (como excludentes de ilicitude ou de culpabilidade), não deve haver 
obstáculo legal para a formalização do acordo. 
Há quem defenda que a previsão da confissão para celebração do acordo 
teria na verdade uma feição protetiva ao investigado, pois busca assegurar a 
colheita de elementos de convicção (SOUZA, 2019). De acordo com tal 
entendimento, esse requisito serviria para evitar a precoce celebração de acordos 
desprovidos de provas que indicassem a participação do confitente na infração 
penal. 
19 
 
De certo modo é compreensível tal posição, porém defende-se que essa 
confissão seja efetivamente apenas uma formalidade, sem a necessidade de ser 
plena e detalhada (NUCCI, 2020). É preciso garantir ao acusado uma imunidade 
contra a sua autoacusação. 
Nesse sentido tem-se o enunciado de nº 3 da 1ª Jornada de Direito e 
Processo penal do Conselho da Justiça Federal (CJF), a qual prevê que “A 
inexistência de confissão do investigado antes da formação da opinio delicti do 
Ministério Público não pode ser interpretada como desinteresse em entabular 
eventual acordo de não persecução penal” (BRASIL, 2020). 
O Acordo é justamente para não haver persecução penal; obrigar o 
investigador a confessar para depois fixar penas alternativas, existindo inclusive a 
possibilidade de descumprimento das condições não é adequado. Corre o risco de o 
pactuado ser desfeito e a denúncia ser proposta, só que posteriormente a uma 
confissão já feita pelo acusado, o que pode prejudicá-lo. 
 
2.2 Presunção de culpa ou presunção de inocência? 
Segundo Claus Roxin (p.100, 2003), “é possível um arquivamento com 
imposição de condições, caso exista consentimento entre o acusado e a 
Promotoria”. Essa possibilidade revela uma perspectiva voltada às consequências, 
de modo a se concretizar uma espécie de funcionalismo jurídico. 
Essa orientação acaba por produzir estratégias que busquem aumentar os 
níveis de eficácia das políticas criminais, de forma estrategicamente conduzida à 
harmonia social. Nesse contexto, o Acordo de Não Persecução Penal emancipa a 
atuação institucional do órgão de acusação de um modelo exclusivamente 
reativo/punitivo para um para um modelo mais propositivo e conciliador. Há um claro 
enfoque no princípio na perspectiva de evitar não só o cárcere mas também do 
próprio processo penal. 
No âmbito do ordenamento jurídico brasileiro a garantia da presunção de 
inocência ou da não culpabilidade está prevista de modo explícito e literal no art. 5, 
inciso LVII da Constituição Federal, como uma cláusula pétrea, que diz que: 
20 
 
“ninguém será considerado culpado até o trânsito de sentença penal condenatória” 
(BRASIL, 1988). 
Relacionados a esse estão os incisos LXI e LXVI, que preveem 
respectivamente que: “ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem 
escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente” e “ninguém será levado 
à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem 
fiança” (BRASIL, 1988). Há ainda uma reafirmação desse princípio na legislação 
infraconstitucional, no art. 283 do Código de Processo Penal, que prevê que: 
ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem 
escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em 
decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no 
curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão 
temporária ou prisão preventiva (BRASIL, 1941). 
 
De acordo com considerações doutrinárias, os direitos fundamentais em sua 
dimensão objetiva possuem “eficácia irradiante” para todo o ordenamento jurídico, e 
a sua dimensão subjetiva aquela impõe uma atuação negativa ou positiva ao Estado 
(FERNANDES, 2017). Nesse sentido, eles são vistos como direitos de defesa contra 
atuações ilícitas do Poder Público, instrumentos de proteção do cidadão, como é o 
caso da presunção de inocência. 
Nesse sentido é que se entende que, em virtude da garantia da presunção de 
inocência, a confissão obtida para a celebração do Acordo não pode ensejar 
assunção de culpa, e, por isso, não pode ocasionar julgamento antecipado do caso. 
Mais uma vez se reafirma que a confissão aqui tratada é retratável e, mesmo depois 
de iniciada eventualmente uma ação penal, não leva, por si só, à condenação, até 
porque foi colhida na fase inquisitiva. 
A política criminal deve ser feita com amparo na Constituição; não se pode 
interpretar dispositivos constitucionais taxativos da maneira que se entende mais 
adequada ou de acordo com a opinião pública. Não são diferentes as lições de 
Vladimir Aras (2018, p. 263): 
O Ministério Público brasileiro é, assim, um promotor da política 
criminal do Estado. Não é mero espectador, não é autômato da lei 
penal. Na condição de agente político do Estado, tem o dever de 
discernir a presença, ou não, do interesse público na persecução 
penal em juízo, ou se, diante da franquia do art. 129, inciso I, da 
21 
 
Constituição, combinado com o art. 28 do CPP, deixará de proceder 
à ação penal, para encaminhar a causa penal a soluções 
alternativas, não judicializando a pretensão punitiva. Entre essas 
soluções estão a opção pela Justiça Restaurativa ou pelos acordos 
penais. 
Há no meio jurídico uma grande confusão entre efetividade da jurisdição e a 
busca da celeridade, de modo que muitas vezes o devido processo legal é 
atropelado. Aumentar os mecanismos que asseguram uma justiça mais rápida e 
efetiva não deve suprimir garantias individuais. 
De acordo com Souza (p.184, 2019), a confissão produz como efeito prático 
no confitente: 
um novo mindset de efeito psíquico de arrependimento pela prática 
da infração penal, sentimento apto a produzir uma mudança de 
atitude e comportamento que parte da ideia de que, para corrigir um 
erro, é necessário que o responsável o admita, o que aumenta seu 
senso de responsabilidade e comprometimento com o ato, atributos 
que reforçam a confiança no cumprimento integral do Acordo de não 
persecução. 
A partir disso e da noção de que a confissão serve apenas para depuração 
dos elementos indiciários, ela não deve servir por si só para a formação da 
convicção do juiz. Ela não deve produzir qualquer efeito sobre a culpabilidade do 
investigado para que não ocorra violação ao princípioda presunção de estado de 
inocência de quem está sendo acusado. 
2.3 A confissão como fundamento para propositura da ação penal 
Questão relevante é se a confissão já realizada como condição para 
celebração do Acordo poderia ser utilizada como fundamento para uma eventual 
propositura da ação penal. O enunciado de nº 32 da 1ª Jornada de Direito e 
Processo Penal do Conselho da Justiça Federal dispõe que “a proposta de acordo 
de não persecução penal representa um poder-dever do Ministério Público, com 
exclusividade, desde que cumpridos os requisitos do art. 28-A do CPP” (BRASIL, 
2020). 
A partir desse quadro que impõe uma certa “obrigatoriedade” para propositura 
do acordo, tem-se a possibilidade de o juiz, no momento de sua análise, considerar 
incabível o acordo ou inadequadas ou insuficientes as condições. Isso autoriza a 
remessa dos autos ao procurador-geral ou outro órgão responsável pela sua 
22 
 
apreciação, que poderá oferecer denúncia ou designar outro membro para oferecê-
la. 
Há também o caso de serem descumpridas quaisquer das condições 
estipuladas no acordo de não persecução penal, situação em que o Ministério 
Público deverá comunicar ao juízo, para fins de rescisão do acordo com posterior 
oferecimento de denúncia. 
A possibilidade de uma certa intervenção ou controle por parte do juiz é muito 
relevante, considerando que o imputado na prática assina um “acordo de adesão” 
com o Ministério Público, já sabendo inclusive que não poderá firmar um novo ANPP 
nos próximos 5 anos. Isso é mais evidenciado se a defesa exercer um papel 
meramente formal no âmbito negocial, o que pode custar ao acusado acordos com 
condições desfavoráveis ou até mesmo ações penais “sem justa causa”. 
É possível perceber o exposto em razão da grande desigualdade entre as 
partes na esfera penal, em regra. Há uma falsa noção de que há paridade para que 
o acusado possa dispor de sua vontade livremente. Considerando essa 
desproporção, deve-se ter em prioridade a proteção dos direitos do réu, que na 
verdade são garantias de toda a coletividade. 
Se a defesa se mantém inerte, a acusação tem posição de vantagem nas 
tratativas do acordo. Por isso recomenda-se que 
para que o investigado tenha chances de participar efetivamente do 
direcionamento dos termos do ANPP, faz-se necessário que se 
apresente ao representante do Ministério Público elementos 
informativos defensivos. Quanto mais qualificados forem os 
argumentos da defesa, melhores serão as condições negociais 
(ROSA, 2020). 
Em virtude disso, cabe à advocacia criminal e à defensoria pública o desafio 
de potencializar suas habilidades negociais e agir estrategicamente na elaboração 
das cláusulas contratuais com o representante do Ministério Público, de modo a 
resguardar os interesses e direitos de seus clientes. O ANPP deve, antes de mais 
nada, viabilizar uma verdadeira bilateralidade na formação do consenso. Em 
respeito à paridade de armas, as partes devem ter lugar na mesa, com equidade de 
tratamento e de faculdades processuais. 
23 
 
Com o intuito de reforçar o lastro probatório a favor do reú, de modo a mitigar 
os efeitos que poderiam causar uma lógica que induz a confissão, é que foi 
disciplinada a investigação defensiva, por intermédio do Provimento n°188/2018 do 
Conselho Federal da OAB. A sua efetivação está em consonância com critérios 
políticos criminais de viés democrático e de resguardo da paridade de armas entre 
as partes do processo, desde que dentro de seus limites e em obediência ao 
princípio da legalidade. 
O fato é que se está diante de um poderoso instrumento de negociação 
processual penal que requer uma postura diferenciada por parte dos atores 
judiciários, antes forjados no confronto, que agora precisam abrir-se para uma 
estratégica, que demanda uma análise de custos e benefícios, da arte negocial. 
Assim sendo, quando se está diante de uma situação que pode resultar em 
ônus para o acusado, até em uma possível privação da liberdade a depender do 
caso, é preciso ter cautela sobre os limites de uso da confissão feita. Isso é tarefa 
para a defesa, como já mencionado, e agora também do juiz. 
Sendo informado pelo MP o descumprimento do acordo, deverá o juiz 
designar audiência oral e pública para exercício do contraditório, momento em que 
deverá ouvir o imputado sobre a veracidade e eventuais motivos que justifiquem o 
descumprimento na presença do seu defensor. Também deverá ser analisada a 
proporcionalidade do descumprimento em relação às consequências. 
Portanto, segundo Aury Lopes (2020): 
a revogação, portanto, além do contraditório, deverá ser objeto de 
decisão fundamentada do juiz, não sendo obrigatória, unilateral ou 
automática; deve ser mantida a coerência com o sistema adotado, 
que estabelece uma postura intervencionista do juiz, também no 
momento da rescisão. Assim, eventualmente, poderá o juiz entender 
que está justificado o descumprimento ou mesmo que ele não 
ocorreu, indeferindo o pedido de rescisão e determinando a 
continuidade do acordo. 
A partir dessa postura tem-se como evitar um ambiente estimulante à 
propositura da ação penal. Aqui há de se ressaltar a posição de Aury Lopes (2020), 
para o qual devem ser observados institutos do Direito Civil, como a boa-fé e o 
adimplemento substancial, para fins de manutenção do acordo ou extinção da 
punibilidade por cumprimento das condições. Isso se dá por uma necessidade, em 
24 
 
razão da hibridez do instituto da negociação no processo penal. O papel do juiz aqui 
é o de garantidor da máxima eficácia do sistema de direitos do réu, essa é sua 
verdadeira missão constitucional. 
Portanto, conclui-se que, se o acordo não implica no reconhecimento de 
culpa, não podendo ser usado em desfavor contra o investigado, e deve ser 
preservado ao máximo no cumprimento de seus termos e condições, por qual motivo 
se exigiria uma confissão circunstanciada? Para prejudicar, posteriormente, o 
“beneficiário” da medida, empregando sua confissão para responsabilização 
extrapenal? Para utilizar-se, em caso de descumprimento do ANPP, essa confissão 
como elemento de prova no mesmo processo? 
Em observância às garantias constitucionais envolvidas, a atuação da defesa 
criminal e o papel do juiz, tem-se que não é adequado utilizar essa confissão como 
fundamento para propositura de uma ação penal posteriormente. Esse na verdade já 
é um caminho a ser evitado, o que justificou o surgimento do instrumento em estudo. 
A confissão é feita fora dos autos, sendo ratificada perante o Juiz, numa 
audiência pública, oral, na presença do Defensor e do membro do MP. Em virtude 
disso, não tendo havido ainda uma acusação formal, tampouco instrução criminal, 
não pode essa confissão, em nenhuma hipótese, servir de base para uma ação 
penal e muito menos de uma sentença condenatória (ANDRADE, 2020). 
 
3. O papel judicial no Acordo de Não Persecução Penal 
3.1 O juiz como fiscal da legalidade do Acordo 
Inicialmente, observa-se que toda a negociação do Acordo de Não 
Persecução ocorre à margem da jurisdição. O controle jurisdicional sobre os acordos 
somente se dá em momento posterior, quando submetidos os termos do acordo 
para homologação. O que se percebe é um certo distanciamento da jurisdição, que 
demandaria em contrapartida uma regulamentação precisa dos limites de atuação 
dos negociadores, especialmente do Ministério Público, representante do Poder 
Estatal cuja atuação se encontra limitada pela legalidade. 
25 
 
Na fase judicial são analisadas formalmente a voluntariedade e a legalidade 
dos termos, bem como sua adequabilidade e suficiência, conforme redação legal do 
dispositivo do art. 28-A do CPP: 
§ 4º Para a homologação do acordo de não persecução penal, será 
realizada audiência na qual o juiz deverá verificar a sua 
voluntariedade, por meio da oitiva do investigado na presença do seu 
defensor, e sua legalidade. (Incluído pela Lei nº 13.964,de 2019) 
§ 5º Se o juiz considerar inadequadas, insuficientes ou abusivas as 
condições dispostas no acordo de não persecução penal, devolverá 
os autos ao Ministério Público para que seja reformulada a proposta 
de acordo, com concordância do investigado e seu defensor. 
(Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019) 
§ 6º Homologado judicialmente o acordo de não persecução penal, o 
juiz devolverá os autos ao Ministério Público para que inicie sua 
execução perante o juízo de execução penal. (Incluído pela Lei nº 
13.964, de 2019) (BRASIL, 2019). 
Além disso, também é previsto o controle, pelo juízo da execução, de 
algumas obrigações a que o acusado está submetido pelo acordo, como se vê no 
texto legal: 
III - prestar serviço à comunidade ou a entidades públicas por 
período correspondente à pena mínima cominada ao delito diminuída 
de um a dois terços, em local a ser indicado pelo juízo da execução, 
na forma do art. 46 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 
1940 (Código Penal); (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019) 
IV - pagar prestação pecuniária, a ser estipulada nos termos do art. 
45 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código 
Penal), a entidade pública ou de interesse social, a ser indicada pelo 
juízo da execução, que tenha, preferencialmente, como função 
proteger bens jurídicos iguais ou semelhantes aos aparentemente 
lesados pelo delito; ou (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019) 
(BRASIL, 2019). 
Entretanto, o que se percebe são regras abertas e limites excessivamente 
amplos, permitindo um amplo protagonismo do Ministério Público na elaboração dos 
acordos. Os requisitos não vinculam o órgão à proposição de um acordo, o que 
parece introduzir no ordenamento o princípio da oportunidade, em que o 
oferecimento ou não de acordos – e consequentemente o caminhar ou não dos 
processos – dependerá da força do acervo probatório formado pela acusação. 
Alerta-se então para o risco de que a ausência de uma vinculação normativa 
do Ministério Público às hipóteses de oferecimento do acordo, uma vez cumpridos 
26 
 
os requisitos legais, tornando-o um direito subjetivo do acusado, acabem por permitir 
um uso seletivo do instituto. Isso se percebe através de uma previsão discricionária 
ao Ministério Público, que prevê que o acusado deve “cumprir, por prazo 
determinado, outra condição indicada pelo Ministério Público, desde que 
proporcional e compatível com a infração penal imputada” (BRASIL, 2019). 
Outro problema relevante da ausência de determinação legal estrita sobre a 
aplicabilidade ou não do seu oferecimento está em uma possível instrumentalização 
como meio de pressão exercido sobre o investigado para influenciá-lo a aceitar o 
acordo, confessando um crime que não cometeu. Como já visto anteriormente em 
enunciado da Jornada, parece haver um “poder-dever” do Ministério Público de 
propor o Acordo. 
Há quem defenda inclusive que a própria autoridade policial, ao tomar 
conhecimento do caso e munido dos elementos colhidos na fase investigatória, já 
poderia até fazer uma análise de adequação do caso do investigado à possibilidade 
de acordo. Se fosse possível já poderia até mesmo ser remetido ao Ministério 
Público para posterior oferta da negociação. 
Entretanto, parece que há uma cultura jurídica atualmente de aceleração 
processual, que é um objetivo a ser alcançado a qualquer custo (JUNIOR, 2020).De 
fato, salta aos olhos que o objetivo mais claro de tais acordos é a aceleração da 
prestação jurisdicional, abreviando ou excluindo qualquer procedimento que estipule 
prazos ou que garanta oportunidades do investigado ou acusado de resistir à 
pretensão punitiva. 
Isso é fruto de uma visão mais econômica da atuação do Judiciário. No 
anseio por números, redução de processos e a busca por aumentar a “eficiência” 
dos juízes em seus processos surgem instrumentos como o ANPP. 
Inclusive, em atenção aos princípios da celeridade e economia processual, há 
uma corrente na doutrina que defende que seria possível aplicar o acordo até antes 
do trânsito em julgado da sentença (TÁVORA, 2020). Se o objetivo do acordo é 
justamente reduzir o número de processos criminais, não seria razoável impedir a 
sua aplicação a processos que ainda estão tramitando. 
27 
 
Sobre o tema, importante destacar decisões judiciais sobre o ANPP proferidas 
recentemente pelo Tribunal Regional Federal (TRF) da 4ª região, em sua 8ª turma. 
Há que se mencionar a posição do Desembargador João Pedro Gebran Neto em 
seu voto, em cuja decisão restou consignada a permissão para proposição do 
acordo após conclusão dos autos para sentença: 
Não é nova a busca pela efetivação do princípio do direito penal 
mínimo, reservando o processo penal tradicional para os casos 
graves. Assim como o fez o Código de Processo Civil em vigor, 
parece que está chegando o tempo em que o processo penal longo e 
infrutífero, para questões mais singelas, está também cedendo 
espaço à composição”. [...] apesar de a natureza processual ser a 
mais notada, não se desapega da norma o seu conteúdo material. A 
não persecução, por certo, é mais benéfica que uma possível 
condenação criminal, mesmo quando as penas são substituídas. 
Dessa maneira, deve ter sua aplicação ampliada sob o prisma do 
artigo 5º, XL, da Constituição Federal, e deve incidir igualmente aos 
processos em curso, cabendo ao Estado propiciar ao réu a 
oportunidade de ter sua punibilidade extinta pelo cumprimento dos 
termos convencionados. Não há inversão tumultuária na decisão do 
magistrado que, no curso do processo, intima o órgão ministerial 
para que se manifeste expressamente a respeito da possibilidade de 
oferecimento do acordo de não persecução penal. Nessa 
perspectiva, deve ser improvido o recurso para manter a decisão do 
juízo de primeiro grau que determinou a abertura de fase para 
verificar a possibilidade de acordo (Processo de n° 5009312-
62.2020.4.04.0000/TRF 4ª região). 
No mesmo sentido, em outro processo, a mesma turma decidiu suspender o 
processo e a prescrição da pretensão punitiva, ordenando que a ação fosse 
remetida ao juízo de origem para verificação de eventual possibilidade de 
oferecimento do ANPP. Ao analisar a possibilidade de acordo nesse processo, o 
magistrado apontou que: 
 “o acordo de não persecução penal consiste em norma penal que 
tem, também, natureza material ou híbrida mais benéfica, na medida 
em que ameniza as consequências do delito, sendo aplicável às 
ações penais em andamento. [...] É permitido ao tribunal examinar a 
existência dos requisitos objetivos para eventual permissivo à 
formalização de acordo de não persecução penal, determinando, se 
for o caso, a suspensão da ação penal e da prescrição e a baixa em 
diligência ao primeiro grau para verificação da possibilidade do 
benefício legal.[...] Presentes os requisitos objetivos para o ANPP, 
não vejo óbice à abertura de fase para verificação de proposta de 
acordo de não persecução penal mesmo após o processo iniciado, 
ainda que em grau de recurso. Tem-se como solução adequada a 
suspensão do feito com baixa em diligência ao primeiro grau para as 
providências cabíveis, com o exame do cabimento e eventual acordo 
entre as partes. (N° 5005673-56.2018.4.04.7000/TRF 4ª região) 
28 
 
Nesse mesmo sentido, é de suma importância a lição de Aury Lopes 
Junior (2020): “por outro lado, a lei processual penal mais benéfica poderá 
perfeitamente retroagir para beneficiar o réu, ao contrário pelo defendido pelo senso 
comum teórico”. Isso se dá porque é necessário distinguir as normas 
genuinamente processuais das normas processuais materiais ou mistas, que 
possuem natureza diversa, tanto processual quanto penal. 
O problema é que isso pode acabar se tornando um meio de certa forma de 
cerceamento da defesa, em razão dessa busca pela abreviação dos processos. É 
preciso não perder de vista que a produtividade não pode converter-se num critério 
de medida de eficáciada atividade jurisdicional (JUNIOR, 2020). 
É importante ressaltar a efetividade de um modelo garantista, preconizado 
pela Constituição brasileira. 
3.2 A possibilidade de reformulação do Acordo 
O art. 28-A da Lei nº 13.964/19, em seu § 2º enumera os casos em que a 
proposta não será admitida, em seus incisos I ao IV. 
§ 2º O disposto no caput deste artigo não se aplica nas seguintes 
hipóteses: I - se for cabível transação penal de competência dos 
Juizados Especiais Criminais, nos termos da lei; II - se o investigado 
for reincidente ou se houver elementos probatórios que indiquem 
conduta criminal habitual, reiterada ou profissional, exceto se 
insignificantes as infrações penais pretéritas; III - ter sido o agente 
beneficiado nos 5 (cinco) anos anteriores ao cometimento da 
infração, em acordo de não persecução penal, transação penal ou 
suspensão condicional do processo; e IV - nos crimes praticados no 
âmbito de violência doméstica ou familiar, ou praticados contra a 
mulher por razões da condição de sexo feminino, em favor do 
agressor (BRASIL, 2019). 
Além disso, tem-se que não se admite o acordo nos casos em que for cabível 
a transação penal e se o investigado incorrer em hipóteses que não permitem a 
transação penal, as quais estão estipuladas no artigo 76, § 2º da Lei nº 9.099/95, do 
mesmo modo, não celebrar-se-á o acordo. Assim, há uma ordem de preferência do 
oferecimento dos benefícios. Em primeiro lugar, se a infração penal permitir a 
transação penal, esta deve ser oferecida. Se não couber transação penal, mas 
forem cabíveis a suspensão condicional do processo e o ANPP, o ANPP deve ser 
prioritariamente oferecido. 
29 
 
Por fim, a suspensão condicional do processo só será oferecida se não 
couber o ANPP, ressaltando que o descumprimento do ANPP poderá ser utilizado 
como justificativa para não oferecimento do sursis processual. Compreende-se que, 
no País, já há um reconhecimento da justiça criminal em âmbito consensual: O 
ordenamento jurídico brasileiro já está familiarizado com institutos de Justiça penal 
consensual como a transação penal, para delitos de pequeno potencial ofensivo, e 
colaboração premiada, para crimes graves que podem envolver organizações 
criminosas. 
No entanto, faltava um instituto consensual para crimes de médio potencial 
ofensivo. Essa lacuna foi suprida com o acordo de não persecução penal (ANPP). 
Posto isto, ressalta-se que fundado em uma assunção de culpa, o acordo de não 
persecução penal tem como pré-requisito a confissão formal do cometimento do 
crime, de modo que, uma vez preenchidas as condições previstas pelo acordo, 
possibilita-se a aplicação de uma pena não privativa de liberdade. 
Desta forma, se preenchidos os requisitos que possibilitam o oferecimento da 
transação penal, tais como o cometimento de crime com pena de até 2 (dois) anos, 
primariedade e bons antecedentes, além das demais particularidades previstas na 
Lei nº 9.099/95, não há que se falar em proposta de acordo de não persecução 
penal, quando há cabimento de transação penal de competência dos Juizados 
Especiais Criminais. 
Como o parquet possui a titularidade da ação penal, somente ele pode se 
comprometer a não oferecer a denúncia. O acordo só pode ser firmado com a 
anuência do investigado e sua defesa técnica. Ou seja, não é possível que somente 
a defesa técnica ou somente o investigado subscreva o acordo isoladamente. Mas 
não impede que eventual vício possa ser, posteriormente, suprido com a ratificação 
de seus termos. 
Em eventual não oferecimento do acordo por parte do MP, mesmo quando 
presentes as condições e os requisitos de cabimento, o investigado poderá recorrer 
ao órgão de revisão do MP, conforme o § 14, do art. 28-A, da Lei nº 13.964/19. § 14. 
No caso de recusa, por parte do Ministério Público, em propor o acordo de não 
persecução penal, o investigado poderá requerer a remessa dos autos a órgão 
30 
 
superior, na forma do art. 28 deste Código. Destarte, preenchido as hipóteses de 
cabimento do acordo, torna-se um poder-dever do Ministério Público em oferecer o 
acordo e deve-se motivar em caso de eventual recursa. 
Com o oferecimento do acordo, este deve ser formalizado por escrito e 
firmado pelo membro do MP, pelo investigado e por seu defensor, nos termos do § 
3º. É imprescindível a figura do defensor para a celebração do acordo, sob pena de 
nulidade absoluta do ato. Desta forma, a participação do advogado na negociação 
não pode ser apenas protocolar ou passiva, mas defender os interesses do 
investigado, buscando o suficiente necessário para reprimir e prevenir o crime. 
 “A suspensão condicional do processo não é direito subjetivo do 
acusado, mas sim um poder-dever do Ministério Público, titular da 
ação penal, a quem cabe, com exclusividade, analisar a possibilidade 
de aplicação do referido instituto, desde que o faça de forma 
fundamentada” (AgRg no HC 504.074/SP, Rel. Ministro ANTONIO 
SALDANHA PALHEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 13/08/2019, 
DJe 23/08/2019; RHC 99.181/GO, Rel. Ministro JOEL ILAN 
PACIORNIK, QUINTA TURMA, julgado em 09/04/2019, DJe 
22/04/2019). 
 Caso as condições propostas pelo Parquet sejam inadequadas, insuficientes 
e/ou abusivas, deve-se contestar para que sejam reformuladas. No caso de 
impossibilidade do investigado em obter a defesa técnica, uma solução seria a 
fixação de honorários a advogados dativos para atuar tanto na fase de celebração, 
bem como na realização de audiência de homologação. 
Já na audiência de homologação, que será realizada pelo juiz, ele verificará a 
legalidade e a voluntariedade por parte do acusado em aceitar o acordo, por meio da 
oitiva do investigado na presença do seu defensor, conforme o § 4º. É preferível que 
o defensor que atuou na celebração do acordo seja o mesmo presente na audiência 
de homologação. Na audiência de homologação, o juiz deverá verificar, além da 
voluntariedade do investigado, a presença dos requisitos autorizadores, ausência de 
circunstâncias impeditivas, bem como a adequação, suficiência e não abusividade 
das cláusulas do acordo. 
Nesse contexto, é importante ressaltar que o juiz devolverá os autos ao MP 
para reformulação do acordo, com a concordância do investigado, quando 
31 
 
considerar inadequadas, insuficientes ou abusivas as condições dispostas no 
acordo, nos termos do § 5º. 
Apesar disso, o Ministério Público poderá recusar-se a reformular o acordo. 
De acordo com Lucas César Costa Ferreira (2020), a possibilidade de reformulação, 
porém, não obriga o órgão ministerial, que poderá recusar a reformulação, e, 
considerando a manifestação favorável do investigado e de seu defensor, remeter os 
autos ao órgão superior. Porém, de acordo com o § 7º, caso seja verificado a não 
voluntariedade do investigado, ou a ilegalidade do acordo, o juiz recusará a 
homologação da proposta do ANPP. 
Da decisão judicial de não homologação a proposta de acordo de não 
persecução penal caberá recurso em sentido estrito, nos termos do inciso XXV do 
art. 581, do CPP, alterado pela Lei nº 13.964/19. Cabe salientar que o art. 584 do 
CPP estabelece as hipóteses em que o recurso em sentido estrito terá efeito 
suspensivo. Assim, em caso de recusa da homologação do acordo, não suspenderá 
a persecução penal. 
Desta forma, de acordo com o § 8º, o juiz devolverá os autos ao MP para 
análise de necessidade de complementação das investigações, requisitando novas 
diligências complementares (art. 16, do CPP), ou o oferecimento da denúncia. Com 
a homologação judicial do acordo, o juiz intimará a vítima e devolverá os autos ao 
MP para que inicie sua execução perante o juízo da execução penal, conforme os §§ 
6º e 9º. 
Posteriormente, o membro do MP providenciará a remessa de cópia do ANPP 
e de sua homologação, acompanhadas de peças essenciais, ao membro que 
detenha atribuição em matéria de execução penal para o ajuizamento da 
correspondente execução do ANPP.Homologado o acordo, ocorrerá o trancamento 
da ação penal, na fase em que se encontrar, podendo até suspender as 
investigações em curso. 
3.3 O descumprimento e a recusa à homologação como autorizadores ao 
oferecimento da denúncia 
32 
 
Nota-se que a distinção entre a transação penal e o acordo consiste na 
confissão e na aceitação da culpa. Sabe-se, assim, que a aceitação da proposta de 
transação penal não importa em confissão pelo beneficiado e, por isso, não há 
prejuízos próprios resultantes de uma condenação. Esta transação não pode ser 
considerada para fins de reincidência nem como fundamento, pela suposta vítima, 
para, no juízo cível, propor ação de indenização. 
Em caso de rescisão do acordo, a persecução penal retomará da fase em que 
foi trancada, sem prejuízo aos atos praticados anteriormente. Uma vez celebrado o 
acordo entre o MP e o investigado, bem como a homologação pelo juiz, tem-se a 
submissão do investigado às condições previstas nos incisos do caput do art. 28-A, 
as quais podem ser ajustadas de forma cumulativa ou alternada. 
Desta forma, em caso de descumprimento destas condições, o § 10 deste 
mesmo artigo estipula o seguinte: “descumpridas quaisquer das condições 
estipuladas no acordo de não persecução penal, o Ministério Público deverá 
comunicar ao juízo, para fins de sua rescisão e posterior oferecimento de denúncia” 
(BRASIL, 2019). 
 Assim sendo, uma vez não observadas as condições e obrigações por parte 
do investigado, o Ministério Público deverá comunicar ao juiz da execução, que 
determinará a rescisão do acordo e intimar a vítima para informá-la do 
descumprimento por parte do acusado, conforme o § 9º. Desta decisão, a defesa 
poderá interpor agravo em execução, sem efeito suspensivo, nos termos do art. 197, 
da Lei nº 7.210/84. 
Posteriormente, o membro do MP solicitará a revogação da suspensão dos 
autos do inquérito policial e, em seguida, oferecer imediatamente a denúncia. Neste 
caso, não há que se falar em prescrição, pois a Lei nº 13.964/19 trouxe o inciso IV 
ao art. 116 do Código Penal, acrescentando às causas impeditivas da prescrição 
enquanto não se cumpre ou não rescinde o acordo de não persecução penal. 
A prescrição da pretensão punitiva se inicia por meio das condições trazidas 
pelos incisos do art. 111, do CP. Na maioria das vezes, a prescrição já estará em 
curso quando for firmado a celebração do acordo. 
33 
 
Porém, a mera celebração do ANPP não constitui causa suficiente para a 
suspensão do curso prescricional, mas sim a sua homologação judicial. Assim, a 
partir da homologação, o lapso prescricional da pretensão punitiva não correrá, 
permanecendo suspensa até o cumprimento ou rescisão do acordo. 
A suspensão condicional do processo tem por objetivo evitar a imposição de 
pena se tratando de crimes de médio potencial ofensivo. Este instituto está previsto 
no art. 89 da Lei nº 9.099/95, o qual prevê o seguinte: 
Art. 89. Nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou 
inferior a um ano, abrangidas ou não por esta Lei, o Ministério 
Público, ao oferecer a denúncia, poderá propor a suspensão do 
processo, por dois a quatro anos, desde que o acusado não esteja 
sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime, 
presentes os demais requisitos que autorizariam a suspensão 
condicional da pena (BRASIL, 1995). 
 Desta maneira, com a suspensão da tramitação do processo e o 
preenchimento das condições estabelecidas, vencido o período de prova 
previamente determinado, a punibilidade do agente é extinta. Assim preleciona o § 
11 do art.28-A, o qual diz que o descumprimento do acordo de não persecução 
penal pelo investigado também poderá ser utilizado pelo Ministério Público como 
justificativa para o eventual não oferecimento de suspensão condicional do 
processo. 
Por sua vez, se o investigado descumprir o acordo de não persecução penal 
celebrado com o Ministério Público, o membro desta instituição pode utilizar tal 
argumento como justificativa para eventual não oferecimento de suspensão 
condicional do processo, conforme o § 11º, art. 28-A, da Lei nº 13.964/19. 
Nesse contexto há que se mencionar o princípio da oportunidade, já abordado 
quando da explanação acerca do modelo dos EUA, que inspirou o instituto brasileiro. 
Ele constitui uma exceção ao princípio da obrigatoriedade da ação penal, o qual 
garante uma faculdade ao titular da ação penal (Ministério Público) quanto à 
propositura ou prosseguimento da ação em casos de escassa culpabilidade e pouca 
lesividade social. 
Por sua vez, o acordo de não persecução penal se trata de um ato de 
disposição da ação penal, que excepciona a regra da obrigatoriedade da ação, 
34 
 
cabendo ao Ministério Público, num juízo de conveniência e oportunidade, valer-se 
da discricionariedade quanto à disposição ou exercício da ação penal. A 
Constituição dispõe no art. 129, inciso I, que é função institucional do Ministério 
Público “promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei”. 
Assim sendo, a CRFB/88 reforça a ideia de que o parquet deve observância à 
lei, mesmo sendo o titular da ação penal e, por isso, para que ele desfrute do 
princípio da oportunidade regrada, pressupõe-se uma previsão legal específica 
quanto à sua aplicação. Com a criação da nova Lei nº 13.964/19, que prevê o 
instituto, a exceção ao princípio da obrigatoriedade foi legalmente normatizada. 
Assim, pode ser aplicado o princípio da oportunidade regrada ao acordo de não 
persecução penal, como exceção ao princípio da obrigatoriedade da ação penal. 
Com a confissão no acordo formalizado por escrito e firmado pelo membro do 
MP, pelo investigado e por seu defensor, será realizada uma audiência para que o 
juiz verifique a voluntariedade por parte do acusado em aceitar o acordo, além da 
sua legalidade, conforme já abordado. Por conseguinte, o devido processo legal tem 
relação com o princípio da inafastabilidade da jurisdição, posto que para ser 
celebrado, pressupõe-se a observância a diversos requisitos procedimentais, além 
da apreciação judicial prévia à implementação. 
A confissão do acusado vem gerando inúmeras discussões, e a principal 
crítica é que a confissão fere o princípio da presunção de inocência, de acordo com 
posição já mencionada. Além disto, questiona-se: após a confissão do investigado, 
no caso de descumprimento das condições estabelecidas em acordo, esta confissão 
pode ser utilizada como meio de prova para condená-lo? 
A resposta correta é não. A confissão não pode ser utilizada como prova 
contra o acusado com o posterior oferecimento da denúncia, isso porque ainda não 
há processo, em regra. Ademais, a situação assemelha-se à delação premiada 
desfeita, em que as provas auto-incriminatórias não podem ser utilizadas em 
desfavor do colaborador. 
Da mesma forma, Cunha (2020, p. 129) afirma que: 
apesar de pressupor sua confissão, não há reconhecimento expresso 
de culpa pelo investigado. Há, se tanto, uma admissão implícita de 
35 
 
culpa, de índole puramente moral, sem repercussão jurídica. A culpa, 
para ser efetivamente reconhecida, demanda o devido processo 
legal. 
 Posto isto, entende-se que assim como na delação premiada, o acordo é 
desfeito, não podendo utilizar a confissão como meio de prova. Também não se 
deve condenar o acusado com base na confissão, pois o acusado não reconhece a 
culpa, mas há apenas uma confissão com admissão implícita de culpa. 
Além disto, é necessário que se realize o devido processo legal, e considerá-
lo culpado após o trânsito em julgado de sentença penal condenatória, nos termos 
do inciso LVII, do art. 5º, da CRFB/88. A confissão formal é realizada perante 
autoridade pública (policial ou membro do MP, por exemplo), de forma escrita, 
expressamente prevista nas cláusulas do acordo. 
A confissão circunstanciada diz respeito aos detalhes e especificações das 
principais características da infraçãosobre qual se trata o acordo, seja o tempo, 
lugar, meio de execução, e etc. Tal confissão é necessária para traçar limites 
objetivos de eventual formação de coisa julgada. 
Caso o investigado tenha praticado mais de uma infração penal, tendo 
confessado apenas uma das infrações, o acordo poderá ser feito apenas em relação 
ao fato admitido, devendo, assim, oferecer a denúncia, se houver justa causa, com 
relação à infração não confessada. 
O fato é que, em razão dos direitos envolvidos e da possibilidade de restrição 
à liberdade, é preciso ter cautela e preconizar pela permanência de um modelo 
garantista. Em seu livro Direito e Razão, Ferrajoli (2014) aponta um significado triplo 
para a teoria garantista. Ele aponta uma tricotomia em que de um lado, o garantismo 
“designa um modelo normativo de direito”; de outro, demonstra-se que, na verdade, 
“a teoria que [o garantismo] é hábil a fundar, precisamente, é uma teoria da 
divergência entre normatividade e realidade, entre direito válido e direito efetivo, um 
e outro vigentes”. 
Isso se deve ao fato de que as garantias preservadas pela teoria se 
consubstanciam em “técnicas insertas no ordenamento que têm por finalidade 
reduzir a distância estrutural entre a normatividade e a efetividade, possibilitando, 
assim, uma máxima eficácia dos direitos fundamentais” (FERRAJOLI, 2014). Por fim, 
36 
 
o professor italiano esclarece que, na última perspectiva da tricotomia, há “uma 
filosofia política que requer do Direito e do Estado o ônus da justificação externa 
com base nos bens e nos interesses dos quais a tutela ou a garantia constituem a 
finalidade”. 
Portanto, tal perspectiva acerca da teoria garantista admite a consonância de 
finalidades perseguidas tanto pelo Estado quanto pelo Direito, que não se 
consubstancia em uma aplicação mono orientada em defesa de direitos 
fundamentais individuais, mas sim, que também vislumbra a proteção de direitos 
coletivos. Nas palavras de Ferrajoli (2014): 
Eles [os três significados de garantismo] delineiam, precisamente, os 
elementos de uma teoria geral do garantismo: o caráter vinculado do 
poder público no Estado de direito; a divergência entre validade e 
vigor produzida pelos desníveis das normas e um certo grau 
irredutível de ilegitimidade jurídica das atividades normativas de nível 
inferior; a distinção entre ponto de vista externo (ou ético-político) e 
ponto de vista interno (ou jurídico) e a conexa divergência entre 
justiça e validade; a autonomia e a prevalência do primeiro e em 
certo grau irredutível de ilegitimidade política com relação a ele das 
instituições vigentes. 
Não se defende uma desconsideração doss vetores fundamentais [sob a ótica 
dos direitos fundamentais de quem eventualmente está sendo investigado ou 
processado] num sistema de Direito democrático. Unicamente se proprugna pela 
compreensão de que as ordens constitucionais e comunitárias possuem previsões 
de preceitos fundamentais que merecem consideração e relevância no momento da 
análise dos comandos normativos. 
Visto isso, sabendo-se que o garantismo é um pilar fundante do processo 
penal, imposto tanto para o legislador quanto para o intérprete, surge um ônus para 
eles de equilibrá-lo com a eficiência. Sob o ponto de vista da proteção individual, 
assentam-se na balança o resguardo dos direitos e garantias daquele que é 
submetido ao crivo do poder de punir do Estado e o estabelecimento de um sistema 
cuja efetividade seja reconhecida e reverberada como sinônimo de segurança, ou 
ainda, como um sistema de prevenção geral positiva, cujos efeitos sejam relevantes 
para a sociedade. 
Nesse sentido é que se vislumbra a dificuldade de estabelecer um modelo 
que admita a existência do processo penal tradicional enquanto instrumento hábil a 
37 
 
determinar uma punição justa, que detenha o resguardo do devido processo legal, 
da ampla defesa, do ônus probante da acusação, e que ainda, tramite com o devido 
respeito ao Direito constitucional a um processo célere. 
Visto isso, aponta-se que o sacrifício de bens jurídicos tutelados pelo 
indivíduo – a exemplo do direito ao contraditório e ampla defesa – não pode ser 
minimizado, sob a justificativa de resguardar outros direitos como a celeridade. O 
impacto no desdobramento do processo e na consecução da finalidade jurisdicional 
não são tão gravosos quanto a ausência de garantias que previnem o excessivo 
poder de punir do Estado, no caso do ANPP, personificado através das ações 
penais propostas pelo Ministério Público. 
Todavia, o que se tem visto na disparada busca por eficiência no processo 
penal é o que Aury Lopes Jr. (2020) chama de “uma inegável crise da teoria das 
fontes”. Isso porque a produção normativa em matéria processual penal começa a 
sofrer os efeitos dessa necessidade desenfreada de um sistema acusatório 
instantâneo. Sendo assim, as soluções trazidas para esse âmbito do direito, às 
vezes, olvidam a hierarquia normativa e a principiologia constitucional. Há uma luta 
pela superação do preconceito em relação à eficácia da Constituição no processo 
penal. 
Mais do que isso, é necessário fazer-se um controle judicial da 
convencionalidade das leis penais e processuais penais, na medida em que a 
Convenção Americana de Direitos Humanos (CADH) goza de caráter supralegal, ou 
seja, está abaixo da Constituição, mas acima das leis ordinárias (como o CP e o 
CPP). Portanto, é uma dupla conformidade que devem guardar as leis ordinárias: 
com a Constituição e com a CADH. 
Ora, o acordo de não persecução penal é feito antes mesmo de qualquer 
conhecimento dos fatos pelo juiz. Sendo assim, o membro ministerial, de posse do 
procedimento investigatório e da confissão do acusado – elemento necessário para 
a celebração do acordo – tem a liberdade de atribuir a pena que considerar hábil a 
reparar os danos cometidos à sociedade. 
Então, o sujeito que apresenta os fatos e as provas é o mesmo que tem o 
poder de punir. Tal conclusão é incompatível com a garantia da imparcialidade 
38 
 
explicitada no artigo 8º, § 1º, da Convenção Americana sobre Direitos Humanos 
(CADH) e com o devido processo legal, conforme redação legal da CADH: 
 1. Toda pessoa tem direito a ser ouvida, com as devidas garantias e 
dentro de um prazo razoável, por um juiz ou tribunal competente, 
independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na 
apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou para 
que se determinem seus direitos ou obrigações de natureza civil, 
trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza (COSTA RICA, 
1969). 
 O que se entende é que o processo, essencialmente, é um instrumento que 
se pauta na limitação do excesso de poderio estatal em face do particular, evitando 
que a mácula da privação de liberdade se imponha aos indivíduos injustamente. E, 
tanto o é, que o processo penal se consubstancia num mecanismo cujo caráter 
intrínseco é o de garante, oferecendo ao indivíduo a ele submetido, um lastro de 
garantias constitucionais devidas. 
A aferição de um processo penal com fulcro na Constituição e que respeita a 
hierarquia normativa existente estabelece com clareza as regras do jogo político e 
de circulação do poder e assinala, indelevelmente, o pacto que é a representação da 
soberania popular, e, portanto, de cada um dos cidadãos. 
O desenvolvimento do sistema acusatório principalmente em decorrência da 
publicização do processo, fez surgir um processo em que há clara separação de 
funções entre acusação, defesa e julgador, a despeito de o juiz poder ser dotado de 
poderes instrutórios. Tal modelo dita as regras do jogo processual, objetivando 
assegurar a prevalência dos direitos fundamentais do investigado, e evitar espaços 
de discricionariedade do poder de punir estatal. 
Em contrapartida, o sistema inquisitório – no qual as tarefas de acusar e julgar 
recaem sobre o mesmo sujeito – tem como finalidade a obtenção de um resultado

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