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CA de Próstata

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Clínica Cirúrgica I Mayra Cleres de Souza, UFR
Principais cânceres urológicos
câncer de próstata
epidemiologia
No Brasil, o adenocarcinoma de próstata é o tipo mais comum de câncer em homens depois dos tumores de pele não melanoma. A estimativa nacional é de pouco mais 60 mil casos novos, uma taxa de incidência de 62,5 casos/100.000 homens-ano, representando cerca de 30% de todas as neoplasias malignas no sexo masculino. Trata-se da segunda causa de morte oncológica em homens, perdendo apenas para o Ca de pulmão. 
A dosagem do PSA (antígeno prostático específico) permite a detecção precoce durante a fase assintomática, o que pode ser evidenciado pelo fato de 60-75% dos tumores atualmente diagnosticados serem impalpáveis ao toque retal e restritos à glândula, sem invasão de estruturas adjacentes ou metástases à distância. 
fatores de risco
As causas do adenocarcinoma de próstata não são totalmente conhecidas, mas as evidências disponíveis sugerem que sua origem depende de múltiplas interações entre fatores genéticos e ambientais. 
fatores de risco não confirmados ou controvérsos
Alguns autores sugeriram que uma história de DST e/ou prostatite constituiria fator de risco para Ca de próstata. O tabagismo e o etilismo NÃO SÃO fatores de risco para a doença, mas o primeiro comprovadamente aumenta a morbimortalidade dos pacientes diagnosticados com Ca de próstata. 
etiopatogênese
O Ca de próstata é classificado em dois subgrupos:
· lesão histológica clinicamente oculta ou “latente”;
· doença clinicamente manifesta.
Existem dois grandes passos na etiopatogênese dessa neoplasia:
· iniciação (que cria a doença “latente”);
· progressão (que torna a doença “clinicamente manifesta”). 
São fatores de risco para Ca de próstata todos os eventos capazes de promover iniciação e/ou progressão do processo de transformação neoplásica da célula prostática.
alterações genéticas 
Das modificações na sequência do DNA que são importantes para o câncer de próstata, merece destaque a fusão dos genes TMPRSS2 e ERG (c22), encontrada em até 50% dos casos. O gene TMPRSS2 é “próstata-específico” e tem sua expressão regulada por hormônios androgênios, enquanto o gene ERG (que não responde aos androgênios) pertence a uma família de fatores de transcrição para oncogenes. 
Outras aberrações genéticas fundamentais são os polimorfismos no gene do receptor de androgênio (AR). Diversas mutações no AR foram consistentemente associadas à progressão do Ca de próstata, por exemplo, a ativação intrínseca do receptor (mesmo na ausência de androgênios circulantes o receptor se mantém no estado ativado). Esta última mutação parece estar implicada nas fases tardias do Ca de próstata metastático, quando a doença se torna “resistente à castração” (hormônio-independente). 
alterações epigenéticas 
Os genes podem ser estimulados ou “silenciados” em resposta a fenômenos bioquímicos como a hipo ou a hipermetilação do DNA, a acetilação das histonas (proteínas que “envelopam” o DNA) e a interferência no funcionamento do RNA, entre outros.
A alteração genética mais comum do Ca de próstata (100% dos casos), é a hipermetilação do gene GSTP1. Este gene codifica uma enzima que protege a célula do estresse oxidativo (glutation-S-transferase), e sua hipermetilação diminui os níveis de GSTP1 no citoplasma, o que aumenta a exposição do núcleo à ação de radicais livres e acelera o surgimento de mutações genéticas cumulativas.
patologia
O tipo histológico mais frequente de Ca de próstata é o adenocarcinoma acinar (~95% dos casos), uma lesão que em >70% das vezes aparece na zona periférica (posterior) da glândula, sendo potencialmente alcançável pelo toque retal. Em >80% dos casos a doença é multifocal. 
A camada externa de células basais está tipicamente ausente nas glândulas malignas. 
O grande achado patognomônico de Ca de próstata na biópsia é a presença de invasão perineural. 
Grau histológico: o escore de gleason
O sistema utilizado para avaliar o grau de diferenciação do adenocarcinoma prostático é o escore de Gleason. Ele classifica a citoarquitetura tecidual em 5 graus distintos, sendo o grau 1 o mais bem diferenciado (isto é, o mais “parecido” com o tecido normal, com formação de glândulas contidas dentro de nódulos), e o grau 5 o menos diferenciado (sem formações glandulares, apenas células “soltas” infiltrando o estroma ou formando cordões e ninhos).
É importante compreender que o Gleason se relaciona ao comportamento biológico do tumor e, por conseguinte, ao seu prognóstico. Como a doença tende a ser multifocal, em geral são encontrados pelo menos 2 graus distintos na mesma biópsia, e a pontuação final é dada pelo seu somatório.
outros tipos histológicos
formas de disseminação do adenocarcinoma próstatico
A disseminação LOCAL compromete estruturas periprostáticas como as vesículas seminais e a base da bexiga (onde pode causar obstrução urinária). A disseminação LINFÁTICA ocorre primeiro para os linfonodos obturadores e, depois, os para-aórticos. A disseminação HEMATOGÊNICA acomete preferencialmente o esqueleto axial, mas o envolvimento de ossos longos e outros órgãos e tecidos também é comum.
É importante ressaltar que as metástases ósseas em geral são osteoblásticas (isto é, têm aspecto “branco” ou radiopaco no RX simples), e o achado de lesões ósseas desse tipo é muito sugestivo de Ca de próstata em homens com >50 anos de idade.
estadiamento
manifestações clínicas
Devido ao screening, a maioria dos pacientes (>60%) recebe o diagnóstico numa fase completamente assintomática, com um tumor de pequeno volume restrito à zona periférica da glândula.
Sintomas de obstrução urinária (hesitação, jato intermitente e/ou fraco) acompanham a doença localmente avançada que invade a uretra ou o colo vesical, fazendo diagnóstico diferencial com HPB. Nesse contexto, apontam para um diagnóstico de Ca de próstata a coexistência de hematúria e, principalmente, hematoespermia. 
São indícios de disseminação linfática locorregional (linfonodos pélvicos) o surgimento de edema de membros inferiores e uma vaga sensação de “desconforto” pélvico ou perineal constante. 
As metástases esqueléticas costumam ser indolores no início, mas com o tempo queixas como dor óssea crônica (lombar, pelve, quadril) e/ou aguda (fratura patológica) vão se tornando mais frequentes.
screening
definição e controvérsias 
Rastreamento ou screening são termos que se referem às estratégias para a detecção de uma doença em suas fases incipientes no indivíduo assintomático.
Não há como determinar ao diagnostico, com os recursos atualmente disponíveis, que tumores evoluirão de forma sombria, assumindo um fenótipo agressivo, e que tumores permanecerão “silentes” por longos períodos. 
recomendações
diagnóstico
toque retal (tr)
Este exame só detecta as lesões mais periféricas, localizadas nas faces lateral e/ou posterior da glândula. Diz-se que o TR é “positivo” quando se nota a presença de nodularidade, induração ou assimetria lobar acentuada. 
antígeno prostático específico (PSA)
Após procedimentos como biópsia e RTU de próstata, deve-se aguardar de 8-10 semanas para dosar o PSA no sangue.
O PSA é uma enzima do tipo serina-protease pertencente à família das calicreínas. Sua principal função fisiológica é liquefazer o coágulo seminal.
Depois de uma prostatectomia radical espera-se que o PSA se torne indetectável dentro de, no máximo, seis semanas. Um PSA que “zera” e depois volta a subir provavelmente indica recidiva tumoral.
BIÓPSIA TRANSRETAL DA PRÓSTATA GUIADA POR uSG (BX-TRUS)
É o método de escolha para a confirmação histopatológica do diagnóstico de Ca de próstata. 
Este exame pode ser feito ambulatorialmente, sem necessidade de sedação. O paciente é preparado com clister retal e antibioticoterapia profilática (cipro ou gentamicina em associação a metronidazol ou clindamicina). Suas principais complicações (transitórias e brandas) são hematúria, hematoespermia, hematoquezia e picos febris. 
Recomenda-se uma coleta padronizadade, no mínimo, 12 fragmentos, englobando todos os setores da próstata (base, meio e ápice, medialmente e lateralmente, dos dois lados da glândula), além de coletas adicionais caso exista uma ou mais áreas suspeitas (imagens hipoecoicas) não incluídas na técnica padrão. 
tc de abdome e pelve 
Trata-se de um exame razoável para avaliação do comprometimento linfático da pelve (linfonodos obturadores) e do abdome (linfonodos para-aórticos). Tal exame deve sempre ser realizado em pacientes com maior risco de disseminação linfática, como aqueles que apresentam tumores T3/T4, Gleason alto (≥8) e PSA elevado (>10 ng/ml). 
rnm com sonda endorretal 
Este é o método de escolha para avaliar de forma não invasiva a extensão extraprostática e o envolvimento das vesículas seminais pelo tumor. 
cintilografia óssea (co)
É o método mais sensível para a detecção de metástases esqueléticas do Ca de próstata. A solicitação rotineira desse exame não é recomendada, pois se associa a uma elevada taxa de falso-positivo, gerando custos adicionais e ansiedade para o paciente. 
tratamento
Os fatores mais importantes para a definição da conduta terapêutica no Ca de próstata são:
· extensão da doença;
· condições clínicas do paciente.
A doença restrita à próstata é potencialmente curável com o tratamento agressivo, e os pacientes mais jovens e com menos comorbidades (maior expectativa de vida) são aqueles que efetivamente podem se beneficiar da cura, considerando o longo curso evolutivo da maioria dos Ca de próstata. 
Após o tratamento deve-se monitorar a ocorrência de efeitos colaterais e a possibilidade de recidiva do tumor. A recidiva tumoral é avaliada pelo comportamento da curva de PSA. 
conduta expectante
Ideal para pacientes que possuem curta expectativa de vida (<10 anos) por conta de uma idade mais avançada e/ou presença de comorbidades significativas, particularmente na vigência de fatores de bom prognóstico em relação ao tumor, como níveis não tão altos de PSA, Gleason de baixo grau (2 a 4) e lesão de pequeno volume. 
prostatectomia radiacal 
Definida pela remoção completa da próstata e das vesículas seminais. 
A linfadenectomia pélvica não é obrigatória em todos os casos, mas é fortemente recomendada para pacientes com maior chance de metástases linfonodais (tumor T3-4, PSA >10ng/ml, Gleason >7). 
Sempre que possível deve-se tentar preservar o feixe neurovascular posterolateral da próstata, por onde passam os nervos cavernosos responsáveis pela ereção peniana. Na tentativa de preservar a continência urinária, deve-se evitar a lesão inadvertida do esfíncter urinário externo. 
Não se recomenda a hormonioterapia neoadjuvante (pré-operatória), pois não há evidências de benefício na literatura. 
A radioterapia, no entanto, só deve ser iniciada após as primeiras seis semanas de pós-operatório, de preferência quando a continência urinária já tiver iniciado a sua recuperação.
radioterapia
Preferível para os pacientes de alto risco cirúrgico, pode ser feita por meio de duas modalidades distintas, de forma isolada ou combinada:
· radioterapia com feixes externos;
· braquiterapia (implante de sementes radioativas no interstício prostático pela via transperineal.
Os principais efeitos adversos da radioterapia são a proctopatia e a cistopatia induzida por radiação, ambos mais frequentes com a radioterapia externa. 
outras modalidades de controle local
Técnicas como crioablação, ablação por radiofrequência e ultrassom focal de alta intensidade. 
deprivação androgênica
Na vigência de metástases, a cura pela cirurgia/radioterapia não é mais possível. Para esses doentes a conduta prioritária consiste na eliminação dos hormônios androgênios. 
O tratamento “padrão-ouro” é a orquiectomia bilateral (castração cirúrgica), porém, esta abordagem não costuma ser aceita pela maioria dos pacientes. As principais alternativas à castração cirúrgica são:
· agentes que reduzem a produção de androgênios;
· agentes que bloqueiam o receptor de androgênio. 
agentes que reduzem a produção de androgênios (castração química)
Inibidores do eixo hiopotálamo-hipofisário-gonadal
Pela sua comodidade posológica (dose mensal subcutânea) e eficácia comprovada, as drogas de escolha dentro deste grupo são os agonistas do GnRH (goserelina, leuprolida). 
Antes do advento dos agonistas do GnRH a “orquiectomia química” era conseguida com o emprego de agentes estrogênicos (dietilestilbestrol, o “DES”). No entanto, tais fármacos caíram em desuso por conta de seu perfil de toxicidade extremamente desfavorável (ginecomastia, retenção hídrica, tromboembolismo venoso e arterial, AVC). 
bloqueadores do receptor de androgênio 
Bloqueadores não esteroidais do receptor de androgênio (flutamida, bicalutamida e nilutamida) reduzem a estimulação androgênica do tecido prostático sem reduzir os níveis séricos desses hormônios. 
quimioterapia 
tratamento das complicações
A principal causa de morbidade no Ca de próstata avançado é a presença de extensos depósitos metastáticos no esqueleto. Logo, a paliação da dor associada a esses depósitos costuma ser uma peça fundamental do esquema terapêutico. 
prognóstico
De modo geral, quanto mais avançada a doença, menor a chance de cura.

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