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O câncer é definido como alterações que se passam no código genético da célula, tornando-a anômala do ponto de vista morfológico, bioquímico e funcional, impedindo a sua morte natural. A cirurgia é a modalidade mais antiga de tratamento do câncer e continua sendo uma das mais importantes terapêuticas dos tumores sólidos. Muitas vezes, ressecções primárias de muitos tumores são realizadas de maneira inadequada e sem tratamento neoadjuvante e não raras vezes, o tratamento adjuvante não é realizado por falta de conhecimento de sua importância, contribuindo para piorar as taxas de cura, sobrevida e qualidade de vida. O câncer é um problema de saúde pública mundial, tanto pelo número de casos novos diagnosticados como pelas novas formas de prevenção passíveis de serem efetivadas em decorrência da história natural da doença. Prevenção primária: tomar medidas que atuam em fatores de risco, como tabagismo, etilismo, sedentarismo, entre outros. Prevenção secundária: também conhecida como screening ou rastreamento, tem como objetivo fazer diagnóstico precoce da doença em uma população assintomática e trata-la e, com isso, aumentar as taxas de cura e diminuir a morbimortalidade. Prevenção terciária: consiste em fazer o diagnóstico da doença em pacientes já sintomáticos e não os tratar como sendo portadores de doença benigna, permitindo que os mesmos venham mais tarde com sua doença em fase mais avançada piorando as taxas de cura e sobrevida. O diagnóstico completo de uma neoplasia deve incluir aspectos etiológicos, histopatológicos e funcionais. As condições clínicas dos pacientes devem ser avaliadas com profundidade antes do tratamento, pois o planejamento terapêutico que não esteja fundamentado nos meios diagnósticos mais completos possíveis é sempre inadequado e seus resultados prejudicados. 90% dos tumores poderiam ser curados se fizéssemos diagnóstico precoce. Principais causas de diagnóstico tardio: falta de sintomas nas lesões precoces, falta de informações sobre a doença, dificuldade de acesso ao sistema de saúde e despreparo dos profissionais de saúde. Repercussões do diagnóstico tardio: menores taxas de cura e sobrevida, maior morbidade e aumento dos custos. A biópsia consiste em se obter material para estudo citológico ou histopatológico. A escolha da técnica da biópsia deve satisfazer as necessidades do patologista e os tecidos biopsiados devem ser representativos para o tumor em estudo. Para que o material removido pelas biópsias seja adequado devemos evitar áreas de hemorragia e necrose, fato que é mais comum na porção central do tumor; assim sendo, as biópsias devem ser feitas preferencialmente na periferia do mesmo. PAAF: fornece material para exame citológico e pode ser guiada tanto pela palpação ou por um exame de imagem. Apresenta a desvantagem de não fornecer material suficiente para se determinar o grau de malignidade, fator importante no planejamento terapêutico das neoplasias e se associar a mais resultados falsos-negativos. Por isso ela é pouco utilizada. Biópsia com agulha grossa ou a céu aberto: fornece material para estudo histopatológico, permitindo não só o diagnóstico bem como o grau de malignidade do tumor. A biópsia por agulha grossa é um método menos invasivo, sem anestesia e de menor custo. Usualmente ela é guiada por exames de imagem e empregada na obtenção de material de nódulos de mama, tumores de partes moles, próstata. A biópsia a céu aberto pode ser incisional ou excisional. A primeira consiste na remoção cirúrgica de um fragmento de tumor, enquanto que na segunda remove-se toda a lesão. A biópsia excisional é reservada para pequenas lesões e é muito importante lembrar que uma vez confirmado o diagnóstico de tumor maligno, o paciente deve ser submetido à cirurgia apropriada para o caso. Na biópsia incisional e excisional devemos lembrar que a cicatriz cirúrgica sempre deverá ser removida em mononobloco com a peça operatória. Deste modo, ela deve se posicionada adequadamente como, por exemplo, em sarcomas de extremidades, sempre deve ser feita no sentido longitudinal. Além da posição da cicatriz, devemos descolar o mínimo possível os tecidos, a hemostasia deve ser rigorosa para se evitar hematomas e sempre que possível distanciar a biópsia do feixe vasculho-nervoso. Existe uma modalidade de biópsia chamada linfonodo sentinela. O linfonodo sentinela é definido como o primeiro e principal Principios de Cirurgia Oncologica linfonodo a receber a drenagem linfática de um tumor e o seu comprometimento serve de parâmetro em relação aos outros demais. → 6-12 horas antes da cirurgia injeta-se o radiotraçador, em geral tecnécio 99, que miga pelos vasos linfáticos e para o linfonodo sentinela, que é detectado por uma gama pobre e sua posição marcada na pele do paciente. → Em seguida, com o uso de um gama, e também com o auxílio do corante, identifica-se o linfonodo, que é removido e enviado para exame anatomopatológico. → É padrão para pacientes com câncer de mama menores que 3cm, de axila e de melanoma sem linfonodos palpados e espessura > 0.76 da classificação de Breslow. O estadiamento consiste em mensurar a extensão da doença no órgão em que o tumor se originou, a extensão ou não do mesmo órgão e/ou estruturas adjacentes, aos linfonodos regionais e a ausência ou presença de metástases a distâncias. O estadiamento tem como objetivos principais: orientar o planejamento terapêutico, indicar o prognóstico, comparar os resultados obtidos em diferentes centros, usar uma linguagem comum e universal para se referir aos tumores e contribuir para a pesquisa continuado do câncer. O sistema de estadiamento mais utilizado e recomendado universalmente é o TNM. Ele avalia 3 componentes: extensão do tumor primário (T), disseminação para linfonodos regionais (N) e metástases a distância (M). O estadiamento TNM pode ser dividido em dois momentos: estadiamento clínico (cTNM) e o estadiamento patológico (pTNM). O primeiro utiliza dados clínicos e exames de imagem, enquanto o segundo se baseia na análise histopatológica do produto de uma ressecção cirúrgica. Pode-se dizer também que o estadiamento clínico orienta em relação a seleção do melhor tratamento primário e o estadiamento patológico orienta tratamento adjuvante e confere prognóstico. Y TNM: avaliar o paciente após tratamento pré-operatório. R TNM: pacientes já tratados que possuem recorrência da doença, precisam de um novo estadiamento. A TNM: estende-se até aos achados de uma autópsia. Roteiro para o diagnóstico e estadiamento de um câncer: 1. Anamnese 2. Exame físico geral e loco-regional 3. Exames complementares: imagem, endoscopia e marcadores tumorais 4. Biópsia 5. Exame anatomopatológico e biomolecular, quando indicado. O tratamento do câncer tem como objetivo fundamentais a cura, o aumento da sobrevida e melhorar a qualidade de vida. Os termos operabilidade e ressecabilidade frequentemente são empregados de maneira inapropriada. Operabilidade refere-se às condições clínicas do paciente, ao passo que ressecabilidade refere-se ao tumor propriamente dito. Assim, o correto é dizer que o paciente é operável ou inoperável, pelas suas condições clínicas, e o tumor é ressecável ou irressecável pela sua extensão a estruturas adjacentes que não permitem sua ressecção. As vias de disseminação das neoplasias malignas são: hematogênica, linfática, contiguidade ou extensão local, continuidade e implantes. Hematogênica e linfática: as células neoplásicas invadem um vaso sanguíneo ou linfático que chegam a um órgão originando as metástases locorregionais. Na disseminação por contiguidade o tumore deixa o órgão de origem e estende-se ao órgão adjacente. Na disseminação por continuidade, o tumor se estende do órgão de origem e se propaga ao que lheé contínuo como, por exemplo, um câncer de esôfago distal se propagando ao fundo gástrico. A disseminação por implantes ocorre pelo desprendimento de células da superfície do tumor, que se implantam no peritônio ou na pleura, ou então no leito operatório, pela ruptura do tumor, decorrentes de manobras cirúrgicas inapropriadas. As cirurgias para o tratamento das neoplasias malignas são classificadas conforme sua finalidade em: diagnóstica, estadiadora, curativa, paliativa, profilática e outras. Diagnóstica: possuem como objetivo fornecer material para estudo anatomopatológico, mesmo que o tratamento da neoplasia não seja cirúrgico. Estadiadora: são indicados como medidas complementares aos exames de imagem e permitem a obtenção de material para confirmação histológica de uma doença metastática. Podem contraindicar ressecções cirúrgicas maiores e indicar procedimentos cirúrgicos mais extensos. Curativa: obedece aos princípios descritos por Halsted, ou seja, resseca-se o tumor primário com uma boa quantidade de tecido normal em seu contorno e, em se tratando de carcinomas, em geral faz-se uma linfadenectomia regional. Paliativa: tem como objetivo paliar sintomas causados pelos efeitos diretos da neoplasia, como dor, sangramento ou obstrução intestinal. Algumas vezes estes podem ter caráter higiênico, como em grandes lesões ulceradas a pele e infectadas. Profilática ou preventiva: atuar em lesões precursoras ou outras condições predisponentes ao câncer, antes que as mesmas se transformem. Exemplo: retirada de nevo que pode virar um melanoma. IMPORTANTE Cerca de 90% das neoplasias malignas são hereditárias e a maioria delas ligadas a mutações germinativas em genes supressores de tumores, obedecendo ao padrão de doença autossômica dominante. Saber identificar os pacientes com estas síndromes é fundamental na prevenção da doença, no planejamento terapêutico e aconselhamento genético. As ressecções cirúrgicas para as neoplasias malignas ainda podem ser classificadas como marginal, radical ou inadequada e adequada. Marginal: ressecção de todo tumor, porém sem uma margem de segurança adequada de tecido normal em torno da lesão. Radical: consiste numa excisão ampla que abrange toda a lesão e tecido normal em toda sua extensão com margens de segurança associada à remoção da área de drenagem linfática locorregional, quando indicada. A ressecção dos tumores também pode ser classificada de acordo com o resultado das margens obtidas: → R0: margens microscópicas livres. → R1: margens macroscópicas livres, porém, margens microscópicas comprometidas. → R2: ressecção com doença macroscópica residual. CUIDADOS TRANSOPERATÓRIOS Após a abertura da cavidade peritoneal, campos secundários ou compressas devem ser fixadas no peritônio para evitar os implantes de células neoplásicas na ferida operatória da parede abdominal. No caso dos tumores envolvendo a serosa, a fixação de fazes ou compressas em torno dos mesmos impedem a descamação de células para dentro da cavidade durante as manobras de ressecção. Um minucioso inventário da cavidade deve ser feito, no sentido centrípeto, para evitar que células sejam levadas pelas luvas e se implantem em outros pontos. Durante a ressecção, as manobras devem ser delicadas para evitar ruptura do tumor com consequente implante de células na cavidade peritoneal e também facilitar a fuga das mesmas pelo sistema linfático e sanguíneo. A troca de luvas e irrigação abundante do leito operatório com solução salina após a retirada da peça ocorre de rotina. O futuro de um paciente portador de câncer depende de fatores relacionados ao tumor: estadiamento e aspectos moleculares, fatores relacionados ao hospedeiro (estado nutricional, comorbidade) fatore relacionados com a terapêutica.