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1 Stephane D’arc – Módulo de Envelhecimento Depressão Etiologia As depressões apresentam etiologia multifatorial: • fatores genéticos, biológicos, epigenéticos e ambientais Acredita-se também que a maior parte dos fatores de risco para transtornos do humor acumule-se na população idosa. A depressão de início tardio que começa após os 60 a 65 anos de idade se relaciona a fatores estressores que podem desencadear e/ou manter o quadro depressivo. ✓ Lesões vasculares cerebrais são particularmente citadas como fatores de risco (e pior prognóstico) nessa população. Esse tipo de depressão muitas vezes é considerado como manifestações prodrômicas de quadros demenciais. A depressão também pode ser provocada por medicamentos usados para tratar doenças físicas, bem como pelo uso abusivo de álcool. Fisiopatologia Em relação à fisiopatologia, existem dados sugestivos de que as alterações do sistema de neurotransmissores podem ocorrer como consequência de mudanças no número, assim como na sensibilidade dos neurorreceptores pré e pós-sinápticos no sistema nervoso central, sem que haja, obrigatoriamente, uma alteração na quantidade do próprio neurotransmissor. ✓ As hipóteses baseadas na deficiência de neurotransmissores têm sido, pois, substituídas por hipóteses mais focadas nos neurorreceptores. As hipóteses atuais orbitam em torno dos neurorreceptores, os quais, em vez de estruturas rígidas, apresentam neuroplasticidade, adaptando-se e respondendo às alterações dos neurotransmissores. Critérios diagnósticos Os transtornos da saúde mental são classificados segundo duas codificações distintas, porém semelhantes: • o Código Internacional de Doenças, atualmente na sua décima revisão (OMS, 1993) • Manual de Diagnóstico e Estatístico de Doença Mental (DSM), atualmente na quinta edição, documento da Associação Americana de Psiquiatria (APA, 2013) No Brasil, na área de Geriatria, o referencial da APA é o mais utilizado. Para que seja efetivado um diagnóstico de episódio depressivo ou transtorno depressivo (quando já aconteceram dois ou mais episódios), é necessário que esteja presente um elenco de sintomas que compõem os critérios diagnósticos estabelecidos e revisados, de pelo menos uma dessas duas entidades, não havendo qualquer distinção de sintomas por faixa etária para fins de diagnóstico. Obs: São vários critérios que são avaliados e a tabela é enorme, então colocarei no final do resumo. Apresentação clínica Os sintomas que podem compor um episódio de depressão (vão olhar a tabela lá no final) muitas vezes, entre idosos, precisam de uma busca ativa para o correto diagnóstico. Ahhh, mas pq? Pois alguns dos sintomas podem ser próprio processo de envelhecimento ou das comorbidades presentes na vida daquele idoso. ▪ Todos os sintomas presentes na depressão em adultos jovens são encontrados em idosos. De modo geral a depressão em idosos apresenta menos humor depressivo e mais anedonia (incapacidade de sentir prazer em atividades normalmente agradáveis), mais sintomas somáticos do que “psicológicos”, maior frequência de associação com doença física e/ou cerebral e presença maior de déficit cognitivo e disfunção executiva. Em relação à depressão de início precoce, a depressão geriátrica (de início tardio) apresenta: ✓ menos correlação familiar ✓ maior prevalência de demência ✓ piora no desempenho dos testes neuropsicológicos 2 Stephane D’arc – Módulo de Envelhecimento ✓ dano auditivo neurossensorial Os subtipos de depressão mais frequentes em idosos são: Depressão vascular: o idoso apresenta redução do interesse, retardo psicomotor, prejuízo na percepção e pouca agitação ou sentimento de culpa, além de uma possível piora na incapacidade. Dentre os sintomas cognitivos mais presentes estão o déficit de fluência verbal e a anomia. → Deve ser suspeitada quando o primeiro episódio ocorre em idade mais avançada (mais de 85 anos) e não tem relação com história de depressão na família. Síndrome depressão - disfunção executiva: causada por uma proeminente disfunção frontoestriatal e caracterizada por retardo psicomotor, redução de interesse, dano nas atividades instrumentais da vida diária (AIVD), insight limitado e sinais vegetativos. Essa síndrome apresenta resposta pobre, lenta e instável aos antidepressivos e requer um cuidadoso plano de acompanhamento. Depressão psicótica: mais frequentes em idosos que nos adultos jovens, associa-se a alucinações e/ou delírios (*não é delirium*), com maior risco de comportamento de autolesão. Alucinações auditivas e, menos frequentemente visuais podem estar presentes. Depressão melancólica: caracterizada por incapacidade de reagir a estímulos positivos, piora do humor pela manhã, sentimento de culpa excessivo, despertar precoce, marcante retardo ou agitação psicomotora, perda de apetite ou peso. Obs: Pode haver dificuldade de diferenciar a depressão da demência, quando estiverem presentes sintomas como: • apatia, perda de peso, retardo psicomotor, redução da concentração, da memória a curto prazo, falta de iniciativa e de volição. A síndrome depressiva com demência reversível (antiga pseudodemência) é uma depressão associada a déficit cognitivo que melhora com o tratamento da depressão. Pode evoluir para demência em 3 anos, em 40% dos casos, podendo a depressão ser apenas uma manifestação precoce da demência. Em alguns casos, o diagnóstico diferencial é difícil, devendo ser observadas as características sintomáticas peculiares de cada doença para decisão diagnóstica. → Quando comparados com pacientes com depressão no curso da doença de Alzheimer, os pacientes com síndrome depressiva com demência reversível apresentam mais ansiedade, despertar precoce e perda da libido. OBS 2: Quando a afasia estiver presente, comportamentos como recusa de alimentação ou de tratamento médico podem ser interpretados como relacionados com ideação suicida. 3 Stephane D’arc – Módulo de Envelhecimento Diagnóstico É essencialmente clínico, com ênfase na história clínica atual e pregressa, incluindo a história psiquiátrica do próprio paciente e de seus familiares e ideação suicida; uso de medicamentos; funcionalidade; avaliação psicológica (eventos estressores), cognitiva e social, incluindo inserções laborativas, de lazer, suporte social/familiar, rede de relacionamentos e estrutura econômica. Uma vez estabelecido o quadro sindrômico, deve- se investigar a presença de doenças clínicas que possam estar colaborando para o quadro, com seus exames específicos. O eletrocardiograma deve ser realizado nos pacientes com indicação de uso de antidepressivo tricíclico. Quando houver déficit cognitivo associado ou suspeita de depressão vascular, está indicada a realização de ressonância magnética de encéfalo. Instrumentos de avaliação Existem várias escalas diagnósticas validadas para rastreio de depressão ou verificação de gravidade de seus sintomas. A aplicação de uma escala contribui para a investigação diagnóstica e reduz a possibilidade do subdiagnóstico por expor objetivamente a sintomatologia, mas nunca deve ser utilizada isoladamente como critério diagnóstico. → Existem várias escalas para avaliação sintomatológica, mas o livro só trouxe uma... então, só colocarei essa mesmo. Escala de depressão geriátrica É o instrumento mais popular para avaliação de sintomas depressivos em idosos. Seu entendimento é simples, com respostas dicotômicas do tipo sim/não e de rápida e fácil aplicação. → pode ser utilizado por qualquer profissional da atenção básica, entrevistadores leigos ou mesmo ser autoaplicável. Apresenta acurácia para os muito idosos (mais que 80 anos) e a vantagem denão incluir sintomas somáticos, reduzindo a interferência de sintomas confundidores em uma população em que a comorbidade é uma realidade. A desvantagem é a limitação do uso na presença de déficit cognitivo, especialmente após estágio moderado. A versão original do GDS possui 30 itens, porém existem versões mais curtas, sendo a principal composta por 15 itens selecionados. ▪ O escore do GDS 30 sugere depressão a partir de 11 pontos e do GDS 15, a partir de 05 pontos. ▪ indica depressão moderada de 11 a 20 e 8 a 9, e grave acima de 21 e 10 pontos para o GDS 30 e GDS 15, respectivamente. Perguntas: 1. Você está satisfeito com sua vida? 2. Abandonou muitos dos seus interesses e atividades? 3. Sente que a vida está vazia? 4. Sente-se frequentemente aborrecido? 5. Você tem muita fé no futuro? 6. Tem pensamentos negativos? 7. Na maioria do tempo está de bom humor? 8. Tem medo de que algo ruim vá lhe acontecer? 9. Sente-se feliz na maioria do tempo? 10. Sente-se frequentemente desamparado, adoentado? 11. Sente-se frequentemente intranquilo? 12. Prefere ficar em casa em vez de sair? 13. Preocupa-se muito com o futuro? 14. Acha que tem mais problema de memória que os outros? 15. Acha bom estar vivo? 16. Fica frequentemente triste? 17. Sente-se inútil 18. Preocupa-se muito com o passado? 19. Acha a vida muito interessante? 20. Para você é difícil começar novos projetos? 21. Sente-se cheio de energia? 22. Sente-se sem esperança? 23. Achaque os outros têm mais sorte que você? 24. Preocupa-se com coisas sem importância? 25. Sente frequentemente vontade de chorar? 26. É difícil para você concentrar-se? 27. Sente-se bem ao despertar? 28. Prefere evitar as reuniões sociais? 29. É fácil para você tomar decisões? Obs: caso queiram olhar as outras, estão aqui: sintomatológica - Center for Epidemiologic Studies Depression Scale (CES) e a Escala de Zung; escala de intensidade dos sintomas - como Escala de Beck (BDI) e a Escala de Hamilton. 4 Stephane D’arc – Módulo de Envelhecimento 30. O seu raciocínio é tão claro quanto antigamente? Comorbidades Essa parte aqui é só para falar que quando os sintomas depressivos estão presentes na vigência de uma doença, atribuem-se frequentemente os sintomas à doença clínica e não à depressão, comprometendo a adequada abordagem terapêutica. Essa situação é preocupante porque pode acabar mascarando a depressão. → Para os indivíduos de mais de 80 anos, este comportamento é ainda mais comum, associando-se a atribuição dos sintomas não apenas à comorbidade, mas também aos eventos da vida. Curso da Depressão O processo de desenvolvimento da depressão no idoso pode durar anos, sendo, portanto, mais crônico do que agudo. Para o entendimento do curso da depressão, é importante que alguns conceitos sejam conhecidos: ❖ Resposta: melhora de 50% dos sintomas inicialmente presentes ❖ Remissão: desaparecimento dos sintomas ❖ Recuperação: manutenção da remissão dos sintomas por pelo menos 6 a 12 meses ❖ Recaída: piora dos sintomas antes da sua remissão completa ou quando já houve remissão, porém ainda não a recuperação da doença. ❖ Recorrência: refere-se a um novo episódio de depressão, pois acontece após a recuperação da doença. Eventos vitais negativos que ocorrem no curso do tratamento podem desviar o curso da curva de melhora sintomatológica. Além disso, temos algumas situações em que os sintomas podem ter uma cronificação. Fatores de risco Os estudos de fatores de risco para sintomas depressivos ou transtornos depressivos são, em geral, de corte transversal e não longitudinais, estabelecendo uma coocorrência de eventos, sugerindo assim um aumento da possibilidade, mas não uma determinação de causa e efeito. ▪ Doença cerebrovascular: A arteriopatia cerebral autossômica dominante com infartos subcorticais e leucoencefalopatia (CADASIL) é uma entidade nosológica cujos sintomas de depressão fazem parte integralmente do seu quadro clínico, podendo compor a sintomatologia inicial ou aparecer durante o curso da doença. → Indivíduos com leucoencefalopatia na região pré-frontal medial orbital e na cápsula interna à esquerda desenvolvem depressão com maior frequência. A doença cerebrovascular, enfim, precipita, predispõe e perpetua a depressão no idoso (depressão vascular). ▪ Idade. A prevalência de transtornos depressivos é maior entre os mais jovens. Por 5 Stephane D’arc – Módulo de Envelhecimento outro lado, um maior número de idosos apresenta sintomas depressivos que não preenchem os critérios propostos. ▪ Gênero As mulheres apresentam mais sintomas depressivos que os homens por fatores como maior possibilidade de se queixar dos sintomas, liberdade para chorar, disposição para procurar tratamento, exposição aos estressores da vida e aos efeitos hormonais. ▪ Estado civil. A convivência com companheiro, independentemente do estado civil, é fator protetor para os transtornos do humor, e o fato de não ser casado está associado à presença de sintomas depressivos, para ambos os sexos. ▪ Doença psiquiátrica ▪ Outros eventos de saúde. ▪ Uso de medicamentos. ▪ Fatores socioeconômicos. ▪ Viuvez. ▪ Institucionalização. A presença de sintomas depressivos na admissão em instituição de longa permanência é fator preditor de depressão, assim como a falta de visitas ao idoso institucionalizado. ▪ Traumas psicológicos. Referência: Freitas, E.V.; Py, L.; Neri, A. L.; Cançado, F. A. X.C.; Gorzoni, M.L.; Doll, J. Tratado de Geriatria e Gerontologia.4ªed. Grupo Editorial Nacional (GEN), 2017 6 Stephane D’arc – Módulo de Envelhecimento e52967c02286e060783e173b916c81754d87ddfa7cf1dcd0217d933f8c1c0fa0.pdf
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