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TENDÊNCIAS-ATUAIS-DA-EDUCAÇÃO (1)

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EDUCAÇÃO NO BRASIL: CONCEPÇÃO E 
DESAFIOS PARA O SÉCULO XXI 
 
Texto adaptado de Dermeval Saviani 
 
 
http://www.ifpb.edu.br/reitoria/noticias/dia-internacional-da-educacao-1/image 
 
O problema das concepções de educação pode ser abordado de 
diferentes maneiras. Um enfoque possível é a partir da filosofia identificando-se, 
em consequência, as principais concepções de educação expressas nas 
grandes tendências que se manifestaram ao longo da história. Nessa linha de 
análise poderíamos chegar às diversas concepções de filosofia da educação 
considerando também as correntes filosóficas a elas articuladas. Outra forma de 
abordagem seria levar em conta o aspecto propriamente pedagógico o que nos 
conduziria a identificar as principais correntes pedagógicas como o 
escolanovismo, o não-diretivismo, o construtivismo, o behaviorismo, etc. Uma 
outra maneira seria considerar a educação a partir da função social 
desempenhada nas diferentes sociedades ao longo do tempo. Nesse caso a 
educação seria concebida como um processo de inculturação ou aculturação 
das novas gerações nas tradições e nos costumes característicos de uma 
formação social determinada. Nesse âmbito emergiriam, como assinalou 
 
Durkheim, os papeis de homogeneização e diferenciação requeridos de seus 
membros por parte da sociedade. 
No entanto, para efeitos desta exposição no âmbito dessa Conferência 
Nacional de Educação, Cultura e Desporto, não vou seguir nenhum dos 
caminhos acima apontados. Vou procurar me ater aos objetivos desse evento 
que, inspirado em Anísio Teixeira e pretendendo ser dominantemente 
propositivo, nos convida a buscar alternativas concretas, em especial no âmbito 
da legislação, de modo a delinear com a clareza que se revelar possível, a 
concepção e as medidas dela decorrentes exigidas para se enfrentar os desafios 
que se põem para a educação brasileira neste limiar do século XXI. 
 
 
CONCEPÇÃO DE EDUCAÇÃO 
 
http://cursosedicas.com/wp-content/uploads/2014/06/banner_selecao_monitores_mais_educacao.jpg 
 
O entendimento dos problemas enfrentados pela educação brasileira 
atualmente implica a compreensão da forma assumida pela educação no 
contexto das sociedades modernas. Caracterizadas pelo predomínio da cidade 
e da indústria sobre o campo e a agricultura, essas sociedades se constituíram 
sob a forma do direito positivo regendo-se por constituições escritas e 
generalizando relações formalizadas através de contratos cujo teor se 
manifestava também por escrito e cuja adesão se dava através da assinatura 
 
que expressava a concordância , após sua leitura, com o conteúdo das cláusulas 
do contrato. Incorporava-se, assim, à vida social a expressão escrita. Em 
consequência, para participar ativamente desse tipo de sociedade nas diversas 
e múltiplas funções por ela desenvolvidas, se faz necessário o ingresso na 
cultura letrada. Ora, sendo essa forma de cultura um processo formalizado, 
sistemático, só pode ser atingida através de um processo educativo também 
sistemático. Portanto, a sociedade moderna não podia mais se satisfazer com 
uma educação difusa, assistemática e espontânea, passando a requerer uma 
educação organizada de forma sistemática e deliberada, isto é, institucionalizada 
o que veio a colocar a educação escolar como a forma principal e dominante de 
educação. 
No contexto descrito o acesso à escola passa a ser considerado como 
um direito de todo cidadão e, como tal, um dever do Estado. O cumprimento de 
esse dever assume, no final do século XIX, a forma da organização dos sistemas 
nacionais de ensino, entendidos como amplas redes de escolas articuladas 
verticais e horizontalmente tendo como função garantir a toda a população dos 
respectivos países o acesso à cultura letrada traduzido na erradicação do 
analfabetismo através da universalização da escola primária considerada, por 
isso mesmo, de frequência obrigatória. 
 
http://envolverde.com.br/portal/wp-content/uploads/2013/08/abc.jpg 
 
 
Os principais países, não apenas da Europa, mas também da América 
Latina, como se pode ver pelo exemplo de nossos vizinhos, a Argentina, o Chile 
e o Uruguai, tendo organizado os seus sistemas nacionais de ensino a partir do 
final do século XIX, lograram universalizar o ensino elementar e, com isso, 
erradicar o analfabetismo. O Brasil não fez isso. Após uma tentativa fracassada 
por ocasião da Constituinte de 1823 e, depois, com a lei das escolas de primeiras 
letras de 1827, relegou-se a educação básica durante todo o Império e ao longo 
da Primeira República às Províncias e, depois, aos Estados federados, 
desobrigando-se desse dever o Estado Nacional. Foi somente após a Revolução 
de 1930 que a educação no Brasil começou a ser tratada como uma questão 
nacional dando-se precedência, porém, ao ensino secundário e superior já que 
foi só em 1946 que viemos a ter uma lei nacional relativa ao ensino primário. E, 
ainda assim, o trato da questão educacional foi sempre, entre nós, atravessado 
por um dualismo desqualificador da instrução popular em confronto com aquela 
destinada às elites. 
Com efeito, as reformas Capanema da década de 1940 foram marcadas 
pela contraposição entre ensino secundário destinado às elites condutoras e 
ensino profissional voltado para o povo conduzido. Procurou-se corrigir essa 
distorção através das leis de equivalência entre os vários ramos do ensino médio 
na década de 1950, equivalência essa que foi incorporada à nossa primeira Lei 
de Diretrizes e Bases da Educação Nacional promulgada em 1961. E a Lei 5692 
de 11 de agosto de 1971, ao justificar a tentativa de universalização compulsória 
da profissionalização no ensino de segundo grau, trouxe à baila o slogan "ensino 
secundário para os nossos filhos e ensino profissional para os filhos dos outros" 
com o qual se procurava criticar o dualismo anterior sugerindo que as elites 
reservavam para si o ensino preparatório para ingresso no nível superior, 
relegando a população ao ensino profissional destinado ao exercício de funções 
subalternas. 
Deve-se notar, porém, que essa mesma lei 5.692 introduziu a distinção 
entre terminalidade ideal ou legal, que corresponde à escolaridade completa de 
primeiro e segundo graus com a duração de onze anos, e terminalidade real, a 
qual implicava a antecipação da formação profissional de modo a garantir que 
todos, mesmo aqueles que não chegassem ao segundo grau ou não 
 
completassem o primeiro grau, saíssem da escola com algum preparo 
profissional para ingressar no mercado de trabalho. Admitiu-se, pois, que nas 
regiões menos desenvolvidas, nas escolas mais carentes, portanto, para a 
população de um modo geral, a terminalidade real resultaria abaixo da legal, isto 
é, chegaria até os dez anos de escolaridade ou oito, sete, seis ou mesmo quatro 
anos correspondentes ao antigo curso primário devendo receber, mesmo nesses 
casos, algum preparo profissional para daí passar diretamente ao mercado de 
trabalho. Ora, através desse mecanismo a diferenciação e o tratamento desigual 
foram mantidos no próprio texto da lei, apenas convertendo o slogan anterior 
neste outro: "terminalidade legal para os nossos filhos e terminalidade real para 
os filhos dos outros". 
 
http://www.unifebe.edu.br/site//docs/imagens/pos_graduacao/especializacao_docencia_educacao_basica/educacao_ba
sica.jpg 
 
Observe-se, finalmente, que o referido dualismo se faz presente também 
na política educacional atual não apenas quando, na reforma do ensino médio, 
se separa o ensino técnico do ensino médio de caráter geral e quando se 
advogam no ensino superior os centros de excelência destinados a ministrar às 
elites um ensino de qualidade articulado com a pesquisa em contraste com as 
instituições que ofereceriam ensino sem pesquisa. Esse dualismo se manifesta 
também no ensino fundamental ao se propor para a rede pública um ensino 
aligeirado avaliado pelo mecanismo da promoçãoautomática e conduzido por 
professores formados em cursos de curta duração organizados nas escolas 
 
normais superiores com ênfase maior no aspecto prático-técnico em detrimento 
da formação de um professor culto, dotado de uma fundamentação teórica 
consistente que dê densidade à sua prática docente. Esta última alternativa 
ficará reservada às escolas destinadas às elites que certamente continuarão a 
recrutar os seus professores dentre aqueles formados nos cursos de licenciatura 
longa, preferentemente oriundos dos centros de excelência constituídos pelas 
universidades públicas que preservarão a exigência da indissociabilidade entre 
ensino e pesquisa. 
 
http://www.linkedportugal.com/wp-content/uploads/2013/05/avaliar-linkedin.jpg 
 
 
VISÃO CRÍTICA DA CONCEPÇÃO QUE 
ORIENTA A POLÍTICA EDUCACIONAL 
ATUALMENTE EM VIGOR 
 
A política educacional que vem sendo implementada no Brasil, sob a 
direção do Ministério da Educação, se caracteriza pela flexibilização, pela 
descentralização das responsabilidades de manutenção das escolas através de 
mecanismos que forcem os municípios a assumir os encargos do ensino 
 
fundamental associados a apelos à sociedade de modo geral, aí compreendidas 
as empresas, organizações não-governamentais, a comunidade próxima à 
escola, os pais e os próprios cidadãos individualmente considerados, no sentido 
de que cooperem, pela via do voluntarismo e da filantropia, na manutenção 
física, na administração e no próprio funcionamento pedagógico das escolas. 
Delineia-se, assim, um estímulo à diferenciação de iniciativas e diversificação de 
modelos de funcionamento e de gestão do ensino escolar. Em contrapartida, 
com base na montagem de um "sistema nacional de avaliação" respaldado pela 
LDB, centraliza-se no MEC o controle do rendimento escolar em todos os níveis, 
desde as creches até a pós-graduação. Há, pois, um estímulo à descentralização 
traduzida na flexibilização, diferenciação e diversificação do processo de ensino 
mas uma centralização do controle dos seus resultados. 
Ora, as características acima enunciadas permitem perceber que a 
política educacional que está sendo implementada acentua, pela via da 
diferenciação apontada, as desigualdades educacionais aprofundando o 
dualismo antes referido. 
 
http://veja.abril.com.br/assets/images/2012/2/66069/educacao-20120214-82-size-620.jpg 
 
Aliás, cabe observar que a orientação em pauta se inspira naquilo que 
poderíamos chamar de "modelo americano". Esse modelo, diferentemente 
daquele que predominou nos países europeus, considera como função principal 
do ensino fundamental, a socialização das crianças ao passo que o modelo 
europeu enfatizava a função de formação intelectual o que implica a garantia de 
uma base comum, mais ou menos homogênea a partir da qual todos os cidadãos 
 
podem participar, em condições de igualdade, da vida da sociedade a que 
pertencem. Visando, pois, criar esse patamar comum centrado no domínio dos 
elementos fundamentais da cultura letrada de base científica, os principais 
países organizaram os sistemas nacionais de ensino como instrumento para 
universalizar a escola básica (o ensino elementar) e, por esse caminho, erradicar 
o analfabetismo. 
Em contrapartida nos Estados Unidos, a precedência da função de 
socialização das crianças atribuída à escola básica levou a vincular as escolas 
às comunidades próximas, isto é, aos municípios, dispensando-se um sistema 
nacional e priviligiando-se, na avaliação da aprendizagem das crianças, sua 
capacidade de relacionamento e interação com as demais crianças ao passo 
que, no modelo europeu, a avaliação implicava um sistema de exames destinado 
a aferir o grau de apreensão dos conhecimentos elementares que caracterizam 
uma formação intelectual correspondente ao domínio da cultura moderna 
entendida como necessária a toda a população e, por isso, sendo objeto de um 
ensino comum a todos. 
Do ponto de vista do processo, o modelo americano levou a uma maior 
diferenciação de iniciativas assim como à maior diversificação das formas de 
gestão, enquanto o modelo europeu conduziu a uma maior centralização das 
iniciativas e a uma forma de gestão relativamente unificada cuja 
responsabilidade primordial se localizava no Estado nacional. 
Do ponto de vista dos resultados se verifica que o modelo europeu foi capaz de 
garantir razoável coesão, assegurando um patamar comum que permitiu 
homogeneizar o acesso à cultura letrada, o que significou um razoável grau de 
igualdade de condições de participação de todos na vida social. Já o modelo 
americano resultou bem mais desigual, apresentando diversas distorções que 
têm sido objeto de alerta das próprias autoridades políticas e educacionais do 
próprio país e que volta e meia são divulgadas através da imprensa. 
Com efeito, de vez em quando nos deparamos com notícias em jornais 
ou revistas dando conta de que nos Estados Unidos é comum ocorrer que um 
significativo número de jovens cheguem a concluir o ensino médio e até mesmo 
a ingressar na universidade sendo praticamente analfabetos (os denominados 
analfabetos funcionais). Ora, essa é uma situação inteiramente estranha aos 
 
países europeus. Em verdade, nunca encontramos notícias semelhantes a 
respeito da Inglaterra, Alemanha, Bélgica, Holanda, Suécia, Dinamarca, 
Noruega, França, Itália, Espanha, Portugal, em suma, dos países europeus de 
modo geral. Sem dúvida isso tem a ver com a diferença de modelos que presidiu 
a organização do ensino em um e em outro caso. 
 
http://cdn.mundodastribos.com/wp-admin/uploads/2010/03/Estagio-Supervisionado-Educacao-Infantil.jpg 
 
 
As observações feitas acima nos permitem aquilatar a gravidade da 
situação em que nos encontramos. Na verdade, considerando que nós sequer 
chegamos a universalizar a escola elementar, a adoção do modelo americano 
potencializa enormemente as consequências negativas detectadas nos Estados 
Unidos contribuindo para aprofundar ainda mais a extrema desigualdade que é 
a triste marca de nossa tradição histórica. Vê-se assim que, se na Europa a 
influência do modelo americano pode ser até benéfica pois poderá contribuir para 
flexibilizar a forma de um sistema já consolidado, no caso do Brasil, onde não se 
conseguiu ainda implantar um sistema de ensino abrangente em âmbito 
nacional, a referida influência resulta deletéria nos distanciando ainda mais da 
meta de garantir a todas as nossas crianças a desejada igualdade de acesso 
aos bens culturais. 
DESAFIOS PARA O SÉCULO XXI 
 
 
http://www.primecursos.com.br/arquivos/uploads/2013/10/gestao-da-educacao-infantil.jpg 
 
Curiosamente, a conclusão a que chegamos é que o grande desafio que 
ainda se põe para o Brasil em termos educacionais ao ingressar no século XXI, 
nos vem do século XIX. Trata-se da tarefa de organizar e instalar um sistema de 
ensino capaz de universalizar o ensino fundamental e, por esse caminho, 
erradicar o analfabetismo. A Constituição de 1988 estabeleceu, nas Disposições 
Transitórias, o prazo de dez anos para o cumprimento dessas duas metas. Os 
dez anos se passaram e agora, em decorrência da Emenda Constitucional de 
número 14 e da nova LDB, está se procurando fixar no Plano Nacional de 
Educação, mais dez anos para se atingir essas mesmas metas. Corremos, 
assim, o risco de, daqui a dez anos, estarmos concedendo mais uma década 
para realizar aquilo que os principais países fizeram a partir do final do século 
XIX e início do século XX. 
Nosso atraso já é, pois, secular o que vem implicando um grande déficit 
histórico. E é preocupante constatar que a política educacional em curso, embora 
disposta a atacar esse problema, não o está encaminhando da forma mais 
adequada. Com efeito, como já foi indicado, ao aderir ao "modelo americano" 
nós corremos o risco de universalizar o ensino fundamental sem conseguir, 
porém, erradicar o analfabetismo. E esse risco fica maisevidente ao se constatar 
que um dos principais vetores dessa política educacional é a redução de custos, 
sob o aspecto econômico, o que leva a apostar todas as fichas na "promoção 
automática" como via para possibilitar a todas as crianças a conclusão do ensino 
 
fundamental. Mas, convenhamos, a promoção automática não é solução para o 
problema da repetência. Isto porque, como se infere da própria denominação, a 
passagem é automática, isto é, os alunos são promovidos independentemente 
do que fizeram ou deixaram de fazer. Quer se tenha atingido os objetivos quer 
não, tenham ou não preenchido os requisitos, a aprovação irá ocorrer. Deixa de 
ser relevante o desempenho tanto dos alunos como dos professores. Coisa 
diversa é o empenho em se atingir a meta da "repetência zero", vale dizer, o 
objetivo de que todos sejam promovidos. Aqui se trata de criar as condições para 
que todos os alunos atinjam os objetivos definidos para os diversos componentes 
curriculares que integram o processo de ensino-aprendizagem. 
Acoplando-se simplesmente o mecanismo da "promoção automática" à 
situação atual das escolas ficando intactas as suas condições de funcionamento 
pode-se eliminar o problema da repetência resolvendo-se o problema do ponto 
de vista estatístico. Permaneceria, porém, o mesmo quadro de deficiências e 
precariedades que se associam, hoje, aos altos índices de repetência. O que 
precisa ser feito é equipar adequadamente as escolas e instituir uma carreira 
digna para o corpo docente como fizeram os países que, a partir do final do 
século XIX, implantaram os seus sistemas nacionais de ensino. Em condições 
adequadas o normal é que as crianças aprendam sendo, portanto, promovidas. 
Assim, resolve-se o problema da repetência porque as crianças, de fato, 
aprendem e não porque se decretou a promoção automática. Aliás, os sistemas 
de ensino europeus estavam apoiados em uma sistemática relativamente rígida 
de exames como mecanismo para aferir se os alunos seriam ou não promovidos 
e nem por isso tiveram que se deparar com a necessidade de exorcizar o 
fantasma da repetência. Ao contrário, o sistema se mostrou eficaz para garantir 
a aprendizagem, o que permitiu estabelecer o fluxo regular dos alunos que 
evoluíam, sem problemas, de uma série para outra até a conclusão, sem 
defasagem de idade, da escolaridade obrigatória. 
Para enfrentar esse desafio, que há um século nos afronta, é mister 
assumir de vez a educação como prioridade de fato e não apenas nos discursos 
como ocorre recorrentemente. Nesse esforço cabe, sem dúvida, promover 
alterações na legislação educacional. Poderíamos aperfeiçoar determinados 
dispositivos da Constituição assim como modificar a orientação que prevaleceu 
 
na LDB e legislação complementar. Entretanto, não me parece ser esta a 
questão fundamental mesmo porque uma efetiva mudança de rumos na 
regulação legal da educação estaria na dependência de uma nova correlação de 
forças políticas que conduzisse a uma outra relação de hegemonia. No que se 
refere, porém, aos desafios fundamentais que se põem para a educação me 
parece haver um razoável grau de consenso, o que faz com que a legislação em 
vigor não chegue a ser, na letra da lei, um efetivo obstáculo para as ações que 
se fazem necessárias. Nesse aspecto penso que a legislação que conta, de fato, 
nas atuais circunstâncias, é aquela relativa ao Plano Nacional de Educação. Sob 
esse aspecto o texto aprovado na Câmara dos Deputados não deixa de se 
constituir num avanço em relação à proposta do MEC. Entretanto, naquilo que é 
decisivo, isto é, a questão do aporte de recursos para a educação, a 
gradualidade adotada acaba por diluir e amortecer o impacto requerido para 
implementar as transformações que não podem mais ser postergadas. Por isso, 
ouso insistir na minha proposta de um plano de emergência cujas linhas básicas 
apresento a seguir (SAVIANI, S/D): 
 
http://www.duniverso.com.br/wp-content/uploads/2010/09/crianca-livros-educacao-a-distancia-ead.jpg?d31342 
 
Para fazer face ao atraso em que nos encontramos, proponho a imediata 
duplicação do percentual do PIB investido em educação, passando dos atuais 
4% para 8%. Isso, em verdade, apenas nos colocaria no nível das nações que 
mais investem em educação a exemplo dos Estados Unidos, Canadá, Noruega 
e Suécia que, segundo tabela apresentada pelo MEC em seu roteiro para a 
 
elaboração do Plano Nacional de Educação, se situam na faixa entre 7,5 e 8,5%. 
Observe-se, porém, que esses países não têm o déficit que temos. Portanto, se 
estamos empenhados em zerar o déficit, teríamos que investir muito mais. 
Penso, porém, que, a partir desse esforço, teríamos chances de começar a tratar 
com seriedade os problemas da educação, ganhando condições de resolvê-los 
efetivamente. A propósito, recordemo-nos da insistência de Anísio Teixeira para 
quem a educação requer significativos investimentos não sendo possível tratá-
la seriamente com pouco dinheiro. 
 
http://faculdadefamesp.com.br/novosite/wp-content/uploads/2012/10/pintura-educacao-infantil.jpg 
 
 A duplicação do percentual do PIB permitiria que cada instância 
passasse a ter o dobro dos recursos de que hoje dispõe para a educação. Assim, 
os municípios que, por força do FUNDEF, têm apenas 10% de seus recursos 
para investir em educação infantil, passariam a ter 20%. Com isso, já começa a 
se tornar viável a construção de uma ampla rede nacional de educação das 
crianças de 0 a 6 anos, mantida e gerida pelos municípios, com a orientação dos 
Conselhos Estaduais de Educação. 
Para o ensino fundamental, em lugar dos atuais 15% dos recursos de 
Estados e Municípios, passaríamos a ter o equivalente a 30%. Lançando mão 
do parágrafo único do artigo 11 da LDB, que permite aos municípios a opção de 
se integrar ao sistema estadual ou compor com ele um sistema único de 
educação básica, será possível construir, a partir dos Estados, um amplo sistema 
de ensino fundamental coordenado nacionalmente. 
 
No caso do ensino médio teríamos o equivalente a 20% dos recursos 
dos Estados, o que já permitiria que o objetivo de universalização do ensino 
médio, previsto pela Constituição Federal, deixasse o âmbito dos objetivos 
remotos para se tornar viável no médio prazo. Com efeito, cabe observar que, 
diferentemente do ensino fundamental que se compõe de nove séries, o ensino 
médio tem apenas três. 
 
http://noticias.universia.com.br/br/images/docentes/b/bu/bur/burocracia-contradicao-cenario-educacao-superior-brasil-
noticias.jpg 
 
Quanto à questão dos professores, considerando a determinação do 
FUNDEF de que 60% dos recursos se destinem ao corpo docente, a duplicação 
do percentual tornará exequível a meta de implementar a jornada de 40 horas 
em uma única escola, além de viabilizar a criação de uma espécie de PICD da 
Educação Básica, semelhante ao que se fez com o ensino superior, através da 
CAPES, viabilizando, assim, a qualificação dos professores através de bolsas de 
estudo para frequentar cursos específicos nas universidades públicas de melhor 
qualidade. 
Finalmente, em relação ao ensino superior, a duplicação dos recursos permitirá 
à União, com o montante atual, consolidar as universidades federais além de 
manter sua rede de escolas técnicas. Os recursos adicionais, da mesma 
magnitude dos atuais, poderiam ser divididos em duas fatias: metade se 
destinaria à educação básica para que a União possa cumprir a função de apoio 
técnico e financeiro, suprindo as deficiências locais; a outra metade constituiria 
 
um fundo por meio do qual seriam financiados projetos que engajariam 
fortemente as universidades na realização das metas definidas no Plano 
Nacional de Educação. 
Está claro que a implantação de uma proposta como essa não resolverá, 
por si só, todos os problemas da educação brasileira. Mas estou convencido que 
é somente a partir de uma iniciativa desse tipo que a soluçãose tornará possível. 
 
http://radiomirandelafm.com/wp-content/uploads/2014/04/LogoTodospelaEducacao.jpg 
 
Apresentei essa proposta primeiramente no II CONED e depois a 
registrei no livro Da nova LDB ao novo Plano Nacional de Educação, publicado 
em abril de 1998, retomando-a em outras oportunidades. A única objeção que 
se poderia levantar contra ela diz respeito à sua viabilidade à vista da propalada 
escassez de recursos com que conta o Poder Público para fazer face a 
necessidades de toda ordem e em todos os setores, de modo especial naqueles 
da área social. Entretanto, sua viabilidade pode ser constatada no exemplo dos 
demais países que implantaram os seus sistemas, inclusive aqueles que o 
fizeram tardiamente como são os casos do Japão e da Coréia. Além disso, como 
também já se indicou, a meta de 8% do PIB destinados à educação resulta 
perfeitamente viável porque foi praticada por diversos países. Mas temos 
também demonstração dessa viabilidade em nosso próprio país através de 
projetos de impacto que contaram com grandes investimentos públicos em 
decorrência da vontade política de torná-los realidade. Estão nesse caso a 
construção de Itaipu, as usinas nucleares de Angra dos Reis e, no atual contexto, 
o SIVAM, o gasoduto proveniente da Bolívia e o PROER. Daí ter eu sugerido em 
determinada ocasião que se criasse uma espécie de PROEN (Programa de 
 
Recuperação da Educação Nacional), através do qual seriam captados recursos 
de monta para viabilizar a implantação de nosso sistema de educação em âmbito 
nacional. 
 
http://escolas.madeira-edu.pt/Portals/71/Escola/OfertaEducativa/EducacaoBasica.jpg 
 
Penso, portanto, que, se não partirmos para um plano de emergência 
lúcido, corajoso, arrojado, que sinalize o empenho efetivo em reverter à situação 
de calamidade pública em que se encontra o ensino dos diferentes graus em 
nosso país, as proclamações em favor da educação não passarão de palavras 
ocas, acobertadoras da falta de vontade política para enfrentar o problema. E, 
nesse diapasão, avançaremos século XXI adentro, ampliando ainda mais o já 
insuportável déficit histórico que vem vitimando a população brasileira em 
matéria de educação. 
 
 
ARTIGO PARA REFLEXÃO 
GLOBALIZAÇÃO E EDUCAÇÃO: UMA 
 
INTRODUÇÃO 
 
Nicholas C. Burbules e Carlos Alberto Torres 
(Do Livro: “Globalização e Educação – Perspectivas críticas”- org. 
Nicholas C. Burbules e Carlos Alberto Torres / Porto Alegre:2004, Artmed 
Editora, pp. 11-25) 
 
 
http://novotempo.com/tv/files/banner_educacao.jpg 
 
 
DA EDUCAÇÃO NO ILUMINISMO À EDUCAÇÃO GLOBALIZADA: 
IDÉIAS PRELIMINARES 
 
Este livro reúne um grupo notável de autores internacionais para discutir a 
questão de como a globalização está afetando a política educacional em vários 
Estados ao redor do mundo. Os autores apresentam visões bastante diferentes 
sobre a "globalização". Para alguns deles, o termo refere-se ao surgimento de 
instituições supranacionais, cujas decisões moldam e limitam as opções de 
políticas para qualquer Estado específico; para outros, ele significa o impacto 
avassalador dos processos econômicos globais, incluindo processos de 
produção, consumo, comércio, fluxo de capital e interdependência monetária; 
ainda para outros, ele denota a ascensão do neoliberalismo como um discurso 
 
político hegemônico; para uns, ele significa principalmente o surgimento de 
novas formas culturais, de meios e tecnologias de comunicação globais, todos 
os quais moldam as relações de afiliação, identidade e interação dentro e através 
dos cenários culturais locais; e para outros, ainda, a "globalização" é, 
principalmente, um conjunto de mudanças percebidas, uma construção usada 
pelos legisladores para inspirar o apoio e suprimir a oposição a mudanças, 
porque "forças maiores" (a competição global, respostas a exigências do FMI e 
do Banco Mundial, obrigações para com alianças regionais, e assim por diante) 
não deixam "nenhuma escolha" ao Estado, além de agir segundo um conjunto 
de regras que não criou. É claro que cada um dos autores cita a complexa 
interação entre esses fatores diversos, atribuindo-lhes diferentes pesos e 
relações. 
Solicitamos que cada autor se concentrasse em um conceito que 
consideramos central para entender o impacto específico da globalização sobre 
as políticas e práticas educacionais, conceitos que têm sido repensados e 
redefinidos neste contexto global (real e percebido), que são: "neoliberalismo", 
"Estado", "reestruturação", "reforma", "administração", "feminismo", "identidade", 
"cidadania", "comunidade", "multiculturalismo", "novos movimentos sociais", 
"cultura popular" e o "local" (em oposição/relação ao "global"). De forma clara, 
eles refletem não apenas mudança de conceitos, mas também mudanças nas 
relações, nas práticas e nos arranjos institucionais. O foco deste livro é analisar 
como o repensar essas ideias básicas sugere mudanças fundamentais na 
maneira como as sociedades estão elaborando políticas e práticas educacionais. 
Apesar de ser uma obra centralmente teórica, estas discussões contêm 
implicações específicas e concretas para a forma como a educação está 
mudando, e deverá mudar, em resposta a circunstâncias novas. Este trabalho é 
crítico no sentido de que os autores recusam- se a aceitar como algo 
determinado as formas específicas que a globalização tem assumido, e 
questionam com ceticismo quem são os vencedores e os perdedores sob esse 
novo conjunto de regras. No momento em que a "globalização" (concebida de 
determinada forma) tornou-se um discurso ideológico que move a mudança, 
devido à urgência e necessidade de responder a uma nova ordem mundial, 
queremos apresentar uma admoestação aos entusiastas da globalização e 
 
sugerir que, mesmo que essas mudanças ocorram, elas podem mudar de 
maneiras diferentes, mais justas e equitativas. De acordo com a nossa opinião, 
os educadores, em particular, devem reconhecer a força dessas tendências e 
enxergar as suas implicações para moldar e limitar as escolhas disponíveis de 
políticas e práticas educacionais, enquanto também resistem à retórica da 
"inevitabilidade" que frequentemente motiva a prescrição de certas políticas. 
 
http://pedrosamagalhaes.com.br/wp-content/uploads/2012/06/vozes_banner_educacao.jpg 
 
Uma forma de reexaminar a aparente inevitabilidade da globalização é 
situar o debate contemporâneo numa perspectiva história. De fato, algo parece 
estar mudando no campo da educação, e essas mudanças têm ocorrido por um 
período bastante longo. Na perspectiva do Iluminismo, nada pode ser mais 
personalizado, mais íntimo e local, do que o processo educacional em que as 
crianças e os jovens amadurecem num espaço de aquisição e aprendizagem de 
sua cultura familiar, regional e nacional. Antes da instituição da educação 
pública, a educação da elite era conduzida por tutores que trabalhavam com 
seus pupilos de forma altamente personalizada. A educação da mente, das 
capacidades e dos talentos do indivíduo era um princípio básico. Em um contexto 
de classe diferente, para crianças de famílias rurais ou de operários, a educação 
ou a formação também era uma questão pessoal, gerida pelas famílias e 
comunidades locais. Encaixar-se em uma comunidade, seja ela uma cultura e 
forma de vida local ou nacional, pode ser visto como o imperativo educacional 
que relaciona esses contextos. 
Mais adiante, quando a escola foi moldada como instituição pública, 
permaneceu essa noção de responsabilidade local e familiar pela formação. A 
 
ideia de que as escolas agiam in loco parentis, reforçada por estruturas políticas 
que sustentavam o controle da comunidade sobre o processo escolar, situou o 
aprendiz em uma relação com necessidades imediatas e familiares de 
aprendizagem: necessidades de identidade, afiliação, cidadania e papéis de 
trabalho que respondiam a um contexto próximo. Mesmo em sistemas escolarespúblicos centralizados e nacionalizados, a mesma dinâmica pode ser 
encontrada. Invocada em um nível diferente: as políticas impõem conformidade 
e identificação com uma tradição nacional, uma comunidade maior e um contexto 
mais amplo de cidadania e responsabilidade social, mas, ainda assim. no qual 
as condições de afiliação baseiam-se na proximidade e homogeneidade relativa 
(embora, nesse caso, brechas entre o local e o nacional possam se abrir — e 
ainda o fazem). 
As implicações desse processo educacional, especificamente à medida 
que ele se torna uma preocupação pública, vão além do objetivo de desenvolver 
o self individual. Como a economia da educação nos diz, a educação do público 
tem custos e benefícios para a sociedade mais ampla e, assim, não é apenas 
uma despesa, mas um investimento. Dessa forma, as implicações políticas da 
educação superam as condições de um indivíduo a ser educado e constituem 
um conjunto estratégico de decisões que afetam a sociedade maior, de onde 
vem à importância da educação como política pública e o papel do Estado (ver 
Raymond Morrow e Carlos Torres, neste volume). 
Este processo dialético de formar o indivíduo como um self e um membro 
de uma comunidade mais ampla acarreta, como uma premissa da tradição 
ocidental, a necessidade de preservar os tesouros da civilização dentro do pro-
cesso de socialização dos membros de cada geração nova, tornando-se um 
imperativo ainda maior à medida que o Estado-nação se torna o lugar, cercado 
por fronteiras, onde o processo pedagógico é governado. Os sistemas 
organizados de educação operam sob a égide de um Estado-nação que controla, 
regula, coordena, comanda, financia e certifica o processo de ensino e 
aprendizagem. Não é de surpreender que um dos principais propósitos de um 
sistema educacional projetado dessa forma seja criar um cidadão leal e 
competente. 
 
 
https://encrypted-tbn0.gstatic.com/images?q=tbn:ANd9GcS4NmXF7_U91o2SIR7c0DScwe8cXfOKqo6bOaopu6-
NhPhuSTg5 
 
A questão que enfrentamos agora é: até que ponto o esforço educacional 
é afetado por processos de globalização que ameaçam a autonomia de sistemas 
educacionais nacionais e a soberania do Estado como regente soberano em 
sociedades democráticas? Ao mesmo tempo, de que maneira a globalização 
está mudando as condições fundamentais de um sistema educacional que tem 
por premissa integrar-se em uma comunidade caracterizada pela proximidade e 
a familiaridade? As origens, natureza e dinâmica do processo de globalização 
são, portanto, um foco de preocupação para os filósofos educacionais, 
sociólogos, aqueles que desenvolvem o currículo, professores, legisladores, 
políticos, pais e muitos outros envolvidos com o esforço educacional. Os 
processos de globalização, seja como forem definidos, parecem ter 
consequências sérias na transformação do ensino e da aprendizagem, pois 
estes têm sido compreendidos dentro do contexto de práticas educacionais e 
políticas públicas que possuem um caráter altamente nacional. 
Muitas outras questões reaparecem nessas reflexões. Como podemos 
definir a globalização? A globalização é "real" ou será ela simplesmente uma 
ideologia? Se a globalização for uma tendência inexorável, como isso afeta a 
economia política dos países e, assim, sua cultura e educação? De que maneira 
ações no sentido de uma reestruturação econômica estão afetando sistemas 
educacionais ao redor do mundo? Existe uma organização e agenda 
educacional internacional que possa criar outra hegemonia em currículo, 
 
instrução e práticas pedagógicas, de um modo geral, assim como em políticas 
que dizem respeito ao financiamento escolar, pesquisa e avaliação? Será que 
esses fatores e resultados são simétricos e homogêneos em suas implicações 
para todos os países e regiões? De que maneira a globalização está relacionada 
com o processo contínuo de luta política em diferentes sociedades? Essas são 
algumas das questões centrais que os autores que colaboraram com este livro 
buscaram responder. 
 
REESTRUTURAÇÃO ECONÔMICA E A TENDÊNCIA PARA A 
GLOBALIZAÇÃO 
 
De maneira a capturar a essência da ação 
social, devemos reconhecer a cumplicidade ontoló-
gica, conforme sugeriram Heidegger e Merleau- 
Ponty, entre o agente (que não é um sujeito ou uma 
consciência e nem o mero executante de um papel ou 
aquele que cumpre urna função) e o mundo social 
(que nunca é uma simples "coisa", mesmo que deva 
ser construído desta forma na fase objetivista da 
pesquisa). A realidade social existe, por assim dizer, 
duas vezes, em coisas e em mentes, fora e dentro dos 
agentes. 
 
Os padrões de reestruturação econômica global, que emergiram no final da 
década de 1970, desenvolveram-se juntamente com a implementação de 
políticas neoliberais em muitas nações. Naquela época, as administrações capi-
talistas estavam em apuros, no que diz respeito aos lucros, com os trabalhadores 
lutando para manter o salário alto e os concorrentes estrangeiros pressionando 
para reduzir os preços. À medida que a economia esfriava, as rendas estatais 
não conseguiam cumprir com os gastos sociais, e os contribuintes começavam 
a expressar um certo ressentimento para com aqueles que se beneficiavam mais 
da renda estatal (a burocracia estatal, beneficiários da previdência social, 
 
instituições que recebiam subsídios estatais, e assim por diante). Isso levou a 
um rompimento do consenso em torno da viabilidade e valor do Estado de bem-
estar social. O Estado afastou-se de seu papel corno árbitro entre o trabalho e o 
capital, aliando-se ao capital e forçando os trabalhadores adotar uma postura 
defensiva 
 
http://www.crianca.mppr.mp.br/arquivos/Image/noticias/educacao/educacao_paulo_freire.jpg 
 
A reestruturação econômica refletiu urna tendência mundial caracterizada, 
no mínimo, pelos seguintes elementos: 
 
1. A globalização da economia no contexto de urna nova divisão 
internacional do trabalho e a integração econômica de economias 
nacionais (corno os mercados comuns emergentes e os acordos 
comerciais); 
2. O surgimento de novas relações e acordos comerciais entre nações, e 
entre classes e setores sociais dentro de cada país, e o surgimento de 
novas áreas, especialmente em países desenvolvidos, onde a 
informação e os serviços têm-se tornado mais importantes que o setor 
industrial; 
3. A crescente internacionalização do comércio, refletida na crescente 
capacidade de conectar mercados de forma imediata e de transferir 
capital através de fronteiras nacionais (atualmente, 600 importantes 
 
empresas multinacionais controlam 25% da economia mundial e 80% do 
comércio mundial); 
4. A reestruturação do mercado de trabalho, com o salário fixo sendo substi-
tuído em muitos cenários por remuneração por trabalhos realizados, e o 
poder dos sindicatos enfraquecido pelo relaxamento ou pela falta de 
cumprimento da legislação trabalhista; 
5. A redução de conflitos entre capital e trabalho, principalmente devido a 
fatores como o aumento do número de trabalhadores excedentes 
(desempregados ou subempregados), a intensificação da competição; a 
redução da margem de lucro, menos contratos de trabalho com proteção 
da legislação trabalhista e a institucionalização de estratégias segundo 
o "conceito de equipe"; 
6. A mudança de um modelo de produção fordista rígido para um modelo 
baseado na flexibilidade maior no uso da força de trabalho, na prescrição 
do trabalho, nos processos de trabalho e mercados de trabalho, na 
redução de custos e na maior velocidade em transferência de produtos 
e informações de um local do globo para outro; 
7. A ascensão de novas forças de produção, com a indústria mudando de 
um modelo industrial mecânico para um modelo governado pelo 
microchip, pela robótica, e por máquinas automáticas e auto 
reguladoras, o que, por sua vez, levou ao surgimento de uma sociedade 
de informação high- tech baseada no computador; 
8. A crescenteimportância da produção intensiva de capital, que resulta na 
desespecialização e no desemprego de grandes setores da força de 
trabalho, situação esta que leva a um mercado de trabalho polarizado, 
composto de um pequeno setor altamente especializado e bem 
remunerado, por um lado, e um grande setor pouco especializado e mal 
remunerado, por outro; 
9. O aumento da proporção de empregados avulsos e do sexo feminino, 
muitos dos quais trabalham atualmente em seus lares; 
10. O aumento no tamanho e importância do setor de serviços, às custas 
dos setores primário e secundário; e 
 
11. O crescente abismo financeiro, tecnológico e cultural entre os países 
mais desenvolvidos e os menos desenvolvidos, sendo a única exceção 
os países "recém-industrializados". 
 
http://perlbal.hi-pi.com/blog-images/1414896/mn/136028398897.jpg 
 
A reestruturação econômica também refletiu uma profunda crise fiscal, e as 
reduções orçamentárias que afetam o setor público resultaram na redução do 
Estado de bem- estar social e na crescente privatização dos serviços sociais, de 
saúde, habitação e da educação. Verifica-se uma reestruturação da relação 
Estado/trabalhador, de modo que o salário social (gastos públicos distribuídos 
na forma de benefícios sociais) diminui às custas de salários individuais. Como 
resultado disso, a sociedade foi segmentada em dois setores: um protegido ou 
incluído pelo Estado, e outro desprotegido e excluído. A reestruturação 
econômica levou a um modelo de exclusão que deixa de fora setores amplos da 
população, particularmente as mulheres que vivem na pobreza em países 
desenvolvidos e em desenvolvimento. 
Esses elementos de reestruturação econômica têm ocorrido de forma 
concomitante com a tendência para a globalização. De modo contrário à previsão 
de Marx e Engels, a globalização da economia produziu uma unificação do 
capital em escala mundial, enquanto trabalhadores e outros grupos 
subordinados tornam- se mais fragmentados e divididos. De fato, a 
reestruturação neoliberal está operando através da dinâmica impessoal da 
 
competição capitalista em um mercado comum que é progressivamente 
desregulado, aumentando o impacto local das tendências globais. Os Estados 
torram-se cada vez mais internacionalizados, no sentido de que suas agências 
e políticas ajustam-se aos ritmos da nova ordem mundial. 
Conforme afirmamos, a reestruturação econômica levou a uma crescente 
proletarização e desespecialização do emprego. Embora a alta tecnologia seja 
apresentada como a solução para muitos problemas econômicos, ela não 
contribuiu para elevar o padrão de vida da maioria das pessoas. Mesmo que 
alguns empregos estejam sendo criados em indústrias de alta tecnologia, esses 
empregos encontram-se principalmente nas áreas burocráticas ou de 
montagem, que pagam salários abaixo da média e não exigem muitas 
habilidades, ou em empregos que envolvem serviços pessoais. Como não é de 
surpreender, a categoria mais importante de criação de empregos nos Estados 
Unidos na última década foi o campo dos serviços pessoais, incluindo categorias 
de empregos tão variadas quanto instrutores de ginástica e de saúde até 
serviços de segurança privada. 
Outra mudança evidente é que, com a implementação de políticas 
neoliberais, o Estado demitiu-se de sua responsabilidade de administrar os 
recursos públicos para promover a justiça social, a qual está sendo substituída 
por uma fé cega no mercado (por exemplo, nos apelos por mais privatizações de 
escolas, por "escolhas" e vales) e pela esperança de que o crescimento 
econômico gere um excedente para ajudar o pobre, ou que a caridade privada 
assuma aquilo que os programas estatais deixam de fora. Apesar dos apelos da 
direita para desmantelar ou reduzir o tamanho do Estado, observadores céticos 
da redução estatal afirmam que a principal questão não é o tamanho do Estado, 
ou os seus gastos, mas a forma de suas intervenções e investimentos, seja para 
promover o bem-estar e a igualdade, por um lado, seja para subsidiar o 
crescimento de empresas por meio de incentivos fiscais ou por meio da rubrica 
dos "gastos militares", por outro. O Estado neoliberal, particularmente nas 
sociedades mais desenvolvidas, e nos países em desenvolvimento que lutam 
para imitá-las, caracteriza-se por reduções drásticas em gastos sociais, pela 
destruição desenfreada do ambiente, por revisões regressivas do sistema fiscal, 
limites frouxos para crescimento empresarial, ataques amplos contra o trabalho 
 
organizado e mais gastos com "infraestrutura" militar. 
 
http://www.educacaoeciencia.net.br/site_on/images/fotos/Jovem2.png 
 
As empresas estão se tornando tão poderosas que muitas estão criando 
programas educacionais pós-secundários e vocacionais próprios. A Burger King 
abriu "academias" em 14 cidades norte-americanas, e a IBM e a Apple estão 
contemplando a ideia de abrir escolas devido ao lucro que estas produzem. A 
Whittle Communications (uma empresa cujos principais proprietários são a Time 
Warner e a British Associated Newspapers) não apenas fornece antenas 
parabólicas e aparelhos de televisão em troca de publicidade para mais de 10 
mil escolas (o projeto Channel One), como também está planejando abrir mil 
escolas com fins lucrativos para atender a 2 milhões de crianças dentro dos 
próximos dez anos» Além disso, as empresas norte-americanas gastam 
aproximadamente 40 bilhões de dólares a cada ano, aproximando-se dos gastos 
anuais totais de todas as faculdades e universidades de graduação e pós-
graduação, para treinar e educar seus funcionários atuais. Já em meados da 
década de 1980, a Bell and Howell tinha 30 mil estudantes em sua rede de ensino 
pós-secundário e a ITT possuía 25 instituições pós-secundárias." Diz-se que a 
AT&T sozinha realiza mais funções de educação e formação do que qualquer 
universidade no mundo. 
 
Esse processo de privatizar a educação está ocorrendo no contexto de 
novas relações e arranjos entre nações, caracterizado por uma nova divisão 
global do trabalho, uma integração econômica de economias nacionais 
(mercados comuns de livre-comércio e assim por diante), a crescente 
concentração do poder em organizações supranacionais (como o Banco 
Mundial, o FMI, a ONU, a União Europeia e o G-7), e aquilo que chamamos de 
"internacionalização" do Estado. 
A mobilidade do capital dá aos capitalistas, particularmente aos 
especuladores financeiros, uma grande vantagem sobre o Estado, por si só um 
produto da revolução industrial e não equipado, de muitas maneiras, para lidar 
com as demandas básicas do mundo pós- industrial. A especulação com moedas 
nacionais e a profecia autorrealizável da legitimidade do "crédito" internacional 
contribuíram para a formação de um terreno movediço para os países que 
tentam colocar em ordem sua economia. Os dias que precederam a preparação 
deste livro presenciaram crises sérias na Rússia, nas Filipinas, na Malásia e em 
outras economias emergentes da Ásia, que repentinamente perceberam que as 
regras do jogo econômico global estavam mudando enquanto tentavam jogar de 
acordo com elas. 
Conforme afirmou Korten, a influência empresarial sobre o Estado é 
exercida de forma indireta, por meio de liderança intelectual, incutindo nos 
legisladores um novo conjunto de valores e impondo limites sobre a variedade 
de opções do Estado, o que representa uma estratégia mais eficaz para mudar 
prioridades políticas do que a ameaça explícita de sanções punitivas. Esses 
novos valores, habilmente refletidos nas agendas neoconservadora e neoliberal 
(ver Michael W. Apple, neste volume), promovem menos intervenções estatais e 
maior confiança no mercado livre, e ainda mais atrativos para auto interesses 
individuais do que para direitos coletivos. David Held afirma que "a 
internacionalização da produção, das finanças e de outros recursos econômicos 
está inquestionavelmente erodindo a capacidade dequalquer Estado individual 
de controlar o seu futuro econômico. Empresas multinacionais podem ter uma 
base nacional clara, mas seu interesse está, acima de tudo, na lucratividade 
global. O país de origem interessa pouco para a estratégia empresarial". De 
maneira clara, a crescente integração da economia direciona-se rumo a um 
 
mundo sem fronteiras e proporciona evidências consideráveis da redução da 
capacidade dos governos nacionais controlarem as suas economias ou 
definirem seus objetivos econômicos nacionais. 
 
https://encrypted-tbn1.gstatic.com/images?q=tbn:ANd9GcSp46QT_gNO1u_ja2bd7-
ViQvxgO3YZCn_lENXeluNr5pKjEmsv 
 
Em resumo, existem mudanças nos níveis econômicos, político e cultural 
da sociedade, as quais tendem a promover e reforçar uma perspectiva mais 
global sobre as políticas sociais. No nível econômico, esses fatores incluem 
mudanças em relações comerciais (grupos como o GATT, ou o G-7, que 
promovem a redução de impostos de importação, tarifas e normas; e a formação 
de zonas de "livre-comércio", como o NAFTA ou a União Europeia); mudanças 
em processos bancários e de crédito (sistemas de crédito mundiais como o Visa, 
caixas eletrônicos, câmbio e fluxo de capital e mercados financeiros que são 
realmente globalizados); a presença de agências de financiamento 
internacionais (como o FMI e o Banco Mundial); mudanças nos fatores da 
produção que levaram à ascensão de novas indústrias "pós-fordistas" (a 
economia do conhecimento, o setor de serviços, as indústrias turísticas e 
culturais); a presença de corporações globais que não sejam ligadas (ou leais) a 
qualquer base ou fronteira nacional; a mobilidade da mão-de-obra e a mobilidade 
de companhias que colocaram os sindicatos na defensiva; novas tecnologias 
 
(para transmissão de dados, capital e publicidade); e novos padrões de consumo 
(às vezes chamado de "McDonaldização" do sabor — rápido, padronizado e 
orientado para a conveniência antes da qualidade), juntamente com novas 
estratégias de publicidade e marketing que promovem aquilo que George Ritzer 
chama de "meios de consumo" (shopping centers, canais de compras, compras 
on-line e crédito fácil). 
Em nível político, o Estado-nação sobrevive como uma instituição medial, 
longe daqueles que são impotentes, mas limitado por tentar equilibrar quatro 
imperativos: (1) respostas ao capital transnacional; (2) respostas a estruturas 
políticas globais (por exemplo, a Organização das Nações Unidas) e outras 
organizações não-governamentais; (3) respostas a pressões e demandas 
domésticas, de modo a manter a própria legitimidade política;'B e (4) respostas 
a suas necessidades e seus interesses internos. A maioria das iniciativas 
políticas, incluindo políticas educacionais, é formada na matriz dessas quatro 
pressões, centrada no Estado-nação, não mais concebido como um agente 
soberano, mas como um árbitro que busca equilibrar uma variedade de 
limitações e pressões internas e externas. Fatores econômicos, como a dívida 
externa, a crise fiscal do Estado, ou a criação de entidades regionais como a 
União Europeia, apresentam profundas implicações políticas e econômicas. 
Nesse contexto, as pressões sobre o Estado-nação estimularam uma questão 
de teoria política que perdura há muito tempo: será o Estado uma esfera 
pluralista para a disputa de grupos de interesses rivais, ou um terreno não-
neutro, refletindo um conjunto de limitações e preocupações que atribuem um 
peso especial às demandas de interesses sociais específicos? Fica claro para 
nós que tem ocorrido uma mudança pronunciada com relação a essa questão, 
indo além de visões puramente estatizantes da política, para incluir um foco em 
novos terrenos de contestação política, em novos atores políticos, como em 
movimentos sociais globais (aquilo e Falk chama de "globalização de baixo para 
cima"), e a constituição daquelas que são, com feito, sociedades civis 
transnacionais. 
 
 
http://www.unilab.edu.br/wp-content/uploads/2014/07/sala-alunos-estudando-concetracao-1.jpg 
 
Finalmente, em termos culturais, mudanças nos meios de comunicação 
globais (TV a cabo, satélites, CNN, Internet); cultura comercial (McDonald's, 
Nike, cores da Benneton); maior mobilidade, com setores de viagens turismo 
bastante ampliados; mudanças em tecnologias de comunicações; distribuição 
mundial de filmes, televisão e produtos musicais; maior presença e visibilidade 
de religiões globais que mudam rituais locais, transformando-os em rituais 
transnacionais; ou o mundo global dos esportes, tanto com relação a eventos 
competitivos (e espetáculos), como as Olimpíadas ou a Copa do Mundo, como 
também, de maneira significativa, com relação ao marketing esportivo (vestuário, 
tênis, equipamentos), patrocínio/publicidade, e apostas e loterias globais, todos 
mostram os desafios que confrontam as sociedades que buscam reconciliar seus 
valores locais e tradicionais com a crescente globalização de culturas que não 
as suas. 
Apesar dessas mudanças inegáveis, contudo, os efeitos da globalização às 
vezes também são exagerados. Qualquer bom observador ou viajante do mundo 
irá notar que o chamado “processo de globalização" não é tão global. Vastos 
segmentos do mundo permanecem quase intocados por muitas dessas 
dinâmicas da globalização. O que temos visto é uma segmentação (mundial) 
 
entre a cultura globalizada — por exemplo, a prevalência de um habitus urbano 
e cosmopolita — e o resto do mundo, que enxerga poucos dos benefícios (até 
onde eles existem) do acesso ao mercado global ou a culturas cosmopolitas. Da 
mesma forma, como observado anteriormente, a asserção de algo chamado 
"globalização" frequentemente é usada para reforçar a sua "inevitabilidade" e, 
dessa forma, para suprimir tentativas de resistir a ela, e, mesmo assim, muitas 
tentativas de contrabalançar os processos de globalização estão ocorrendo ao 
redor do mundo, como nos campos da ecologia e do gerenciamento de recursos. 
 
http://1.bp.blogspot.com/-
gq6hR6qxYdU/Ulp9fFLEfeI/AAAAAAAATUE/ZrTKOUV6Ls4/s1600/educa%25C3%25A7aoemfoco.png 
 
 
 
 
 
QUESTÕES CRÍTICAS 
 
http://www.amplitudenet.pt/images/editorials/educacao-escola-virtual.jpg 
 
 
O conhecimento em si não conquista a incerteza, mas produz incertezas 
com as quais ninguém jamais teve a experiência histórica de lidar. 
Embora a forma e direção gerais das mudanças recém-mencionadas não 
sejam mais objeto de disputa, permanecem ainda desacordos consideráveis 
com relação à natureza e à extensão dessa coisa chamada "globalização". 
Quanto mais aprendemos sobre ela, maiores as incertezas a respeito das suas 
consequências. Essas questões se tornam ainda mais desafiadoras, à medida 
que avançamos das mudanças amplas com as quais temos lidado para áreas 
específicas de política e prática, como a educação. Reunimos aqui diversas 
questões críticas que, conforme nos lembra Giddens, refletem as novas 
incertezas que as discussões sobre a globalização trouxeram à luz. 
 
Quais são as origens da globalização? Teoricamente, um dilema central 
é se devemos localizar as origens da globalização contemporânea em torno de 
1971-1973, com a crise do petróleo, que promoveu diversas mudanças 
tecnológicas e econômicas direcionadas para encontrar fontes substitutas para 
matérias-primas estratégicas e buscar novas formas de produção que 
consumissem menos energia e trabalho. De maneira alternativa, como fizeram 
alguns autores deste livro, podemos localizar as origens da globalização há mais 
de um século, com mudanças nas tecnologias de comunicação, nos padrões de 
migração e nos fluxos de capital (por exemplo, como aqueles afetados pelo 
processo de colonização do Terceiro Mundo). 
 
Uma questão importante para muitos observadores é se estamos 
enfrentando uma nova época histórica, a configuração de um novo sistema 
mundial, ou se essas mudanças são significativas, mas não sem precedentes,com paralelos, por exemplo, nas mudanças semelhantes que ocorreram no final 
da Idade Média. Nossa visão sobre esse tema, todavia, não é uma questão de 
escolher entre uma ou outra opção. Estamos em uma nova época histórica, uma 
nova ordem global, em que as velhas formas não estão mortas, mas as novas 
ainda não estão inteiramente formadas. David Held sugere em Democracy and 
global order, por exemplo, que estamos em uma nova "Idade Média global", um 
período que reflete que, apesar de ainda terem vitalidade, os Estados- nação 
não podem controlar suas fronteiras e, portanto, estão sujeitos a todo o tipo de 
pressões internas e externas. 
Além disso, mesmo que essa nova ordem global mostre o fim da soberania 
do Estado- nação, essa situação apresenta impactos diferenciais, de acordo com 
a sua posição na ordem mundial: Estados unificados em alianças regionais, 
como o NAFTA e a União Europeia; Estados emergentes ou intermediários, 
como o Brasil, a Coréia, a Índia e a China; Estados menos desenvolvidos, como 
a Argentina, a Hungria, o Chile e a África do Sul; Estados em desenvolvimento, 
incluindo muitos na América Latina, Ásia e África; e Estados subdesenvolvidos, 
em um estado de dependência extrema, como o Haiti, alguns Estados da Amé-
rica Central, Moçambique, Angola e Albânia. O impacto e o significado da 
"globalização" não apenas são duvidosos, como também podem operar de 
maneira diferente em várias partes do mundo e, em certos contextos, ter pouco 
impacto. Aqui, mais uma vez, a globalização, em si, não é um fenômeno 
unificado e global. 
Assim, apesar de a globalização poder refletir um conjunto de mudanças 
tecnológicas, econômicas e culturais bastante definidas, a forma de sua 
importância e suas tendências futuras não estão determinadas. Conforme 
observamos, a especificidade histórica desse processo não garante 
necessariamente um impacto simétrico e homogêneo ao redor do mundo. Essa 
narrativa da globalização é bastante diferente da narrativa neoliberal, um 
discurso que tira vantagem dos processos históricos de globalização para valori-
zar certas receitas econômicas sobre como operar a economia (através do livre-
 
comércio, des- regulamentação, e assim por diante) — e, por implicação, 
receitas sobre como transformar a educação, a política e a cultura. 
Além das narrativas dicotômicas sobre a globalização. Certas dualidades 
são recorrentes na literatura a respeito deste tema. Em uma distinção de 
influência ampla, existem duas forças principais em operação na ascensão da 
globalização: a globalização de cima para baixo, um processo que afeta 
principalmente as elites dentro e através de contextos nacionais, e a globalização 
de baixo para cima, um processo popular que fundamentalmente emerge das 
organizações de base da sociedade civil. Este contraste ressalta uma importante 
dinâmica política (e ajuda a formar uma conveniente e esperançosa imagem de 
luta e resistência em escala global), mas o seu uso disseminado obscurece as 
formas pelas quais essas duas tendências não são inteiramente independentes 
uma da outra. Por exemplo, os grupos "de cima" e "de baixo" tendem a se fundir 
em determinadas organizações não-governamentais; e os movimentos 
populares "de baixo" ainda podem ser percebidos, em certos contextos, como 
uma imposição "de cima". 
 
http://www.folhavitoria.com.br/economia/blogs/gestaoeresultados/files/2013/04/8ARQ-GAF2.jpg 
 
 
Ainda assim, outras dualidades prevalecem: entre o global e o local; entre 
dimensões econômicas e culturais da globalização; entre a globalização, vista 
como uma tendência para a homogeneização em torno de normas e culturas 
ocidentais (ou, de forma ainda mais limitada, norte-americanas) e vista como 
uma era de maior contato entre culturas diversas, levando a um crescimento em 
hibridez e novidade; e entre os efeitos materiais e retóricos da globalização — 
ou, como pode ser colocado, entre a globalização e a "globalização". Finalmente, 
há a questão de se a globalização é uma "coisa boa": será ela um benefício para 
a causa do crescimento, da igualdade e da justiça econômica, ou será 
prejudicial? Ela promove o compartilhar cultural, a tolerância e um espírito 
cosmopolita, ou produz apenas a ilusão dessa compreensão, uma apreciação 
consumista imperturbável, como em um parque temático da Disney, que suprime 
questões de conflito, diferença e assimetrias de poder? 
Para nós, nenhuma dessas questões captura as sutilezas ou dificuldades 
dos temas que estão em jogo. Todas elas apontam uma escolha fácil entre 
alternativas polares, tipos "bons" e "ruins" de globalização, em vez de uma 
situação conflituosa de tensões prolongadas e escolhas difíceis. Uma 
reconsideração ou, em muitos casos, um desafio direto a esse tipo de dicotomia 
simples irá aparecer seguidamente em todo o livro. Consideramos que isto é 
central para compreender a globalização em toda a sua complexidade e 
ambiguidade. 
Quais são as características cruciais da globalização? À luz de muitos 
desses debates, pode ser extremamente arriscado estabelecer uma descrição 
das características da globalização que afetam a educação de forma mais 
rigorosa, mas elas parecem envolver, pelo menos: 
• em termos econômicos, uma transição de formas fordistas a pós-fordistas 
de organização do local de trabalho; um aumento na publicidade nos padrões de 
consumo internacionalizados; uma redução de barreiras ao fluxo livre de 
mercadorias, trabalhadores e investimentos entre fronteiras nacionais; e, 
consequentemente, novas pressões sobre os papéis do trabalhador e do 
consumidor na sociedade; 
• em termos políticos, urna certa perda da soberania do Estado-nação ou, 
pelo menos, a erosão da autonomia nacional e, consequentemente, um 
 
enfraquecimento da noção de "cidadão" como um conceito unificado e unificante, 
um conceito que possa ser caracterizado por papéis, direitos, obrigações e status 
precisos (ver Capella, neste volume); 
• em termos culturais, uma tensão entre as maneiras como a globalização 
produz mais padronização e homogeneidade cultural, enquanto também produz 
mais fragmentação com a ascensão de movimentos locais. Benjamin Barber 
caracterizou essa dicotomia no título de seu livro, Jihad vs. McWorld; contudo, 
uma terceira alternativa teórica identifica uma situação mais conflituosa e 
dialética, com a homogeneidade e a heterogeneidade culturais aparecendo de 
maneira simultânea no cenário da cultura. (Às vezes, essa fusão, e tensão 
dialética, entre o global e o local é denominada "o global".) 
 
GLOBALIZAÇÃO E A RELAÇÃO ENTRE O ESTADO E A EDUCAÇÃO 
 
http://educacaointegral.org.br/wp-content/uploads/2013/09/educacao-ilustracao-desenho-material-escolar-%C2%A9-
cienpiesnf-Fotolia.jpg 
 
Em termos educacionais, existe uma compreensão crescente de que a 
versão neoliberal da globalização, particularmente da forma implementada (e 
 
ideologicamente defendida) por organizações bilaterais, multilaterais e 
internacionais, reflete-se em uma agenda educacional que privilegia, se não 
impõe de modo direto, certas políticas de avaliação, financiamento, padrões, 
formação de professores, currículo, instrução e testes. Diante dessas pressões, 
são necessários mais estudos sobre as respostas locais para defender a 
educação pública contra a introdução de mecanismos de mercado para regular 
as trocas educacionais e outras políticas que busquem reduzir o patrocínio e o 
financiamento estatal e impor modelos de administração e eficiência 
emprestados do setor empresarial como um arcabouço para a tomada de 
decisões envolvendo a educação. Essas respostas educacionais são 
conduzidas principalmente pelos sindicatos de professores, pelos novos 
movimentos sociais e por intelectuais críticos, expressadas com frequência em 
oposição a iniciativas em educação, tais como os vales, ou subsídios públicos 
para escolas privadas e paroquiais. 
Isso apresenta um problemapeculiar para análise. Devido ao fato de que 
as relações entre o Estado e a educação variam de forma tão dramática de 
acordo com a época histórica, as áreas geográficas, os tipos de governo e as 
formas de representação política, e entre as diferentes demandas de diferentes 
níveis educacionais (fundamental, secundário, educação superior, de adultos, 
continuada e educação não- formal), qualquer alteração drástica nas formas de 
governança (por exemplo, a instalação de uma ditadura militar que governe por 
vários anos antes de permitir a volta da democracia) pode ter múltiplos efeitos 
complexos e imprevisíveis sobre a educação. Essa situação exige uma análise 
histórica mais matizada a respeito da relação entre o Estado e a educação. Essa 
problemática é dificultada ainda mais pela tendência que discutimos 
anteriormente: a erosão da autonomia do Estado em tudo o que é importante, 
inclusive em questões que dizem respeito às políticas educacionais. 
Por exemplo, consideremos brevemente a situação na América Latina. 
Desde o momento em que as guerras civis terminaram, há mais de um século e 
meio (culminando no processo de organização nacional da década de 1880), os 
sistemas educacionais foram criados juntamente com o estabelecimento das 
fronteiras dos países. A constituição de Estados-nação incluiu a criação de fortes 
exércitos e a promulgação de constituições nacionais baseadas nos princípios 
 
da Carta Magna britânica, da Revolução Norte- Americana e da Revolução 
Francesa, e assim expressam uma fundamentação fortemente liberal. Dessa 
forma, pelo menos três formações estatais predominaram na experiência latino- 
americana durante o último século e meio. (As exceções a isso foram, é claro, 
períodos de intervenção militar, ditaduras militares e revoluções que costumam 
alterar a forma democrática liberal do Estado.) Essas três formas do Estado 
incluíram o Estado liberal, promovendo a educação liberal (digamos, da década 
de 1880 até a crise de 1929 em certos países, ou até a Segunda Guerra Mundial 
na maioria dos países); o Estado desenvolvimentista (da década de 1950 até a 
de 1980), em que houve um padrão consistente de modernização (embora, às 
vezes, modernização "forçada" por regimes autoritários), com um papel central 
desempenhado por reformas educacionais baseadas no modelo do capital 
humano; e a constituição de diferentes formas de estado neoliberal e políticas 
educacionais neoliberais. 
 
https://salaaberta.files.wordpress.com/2014/08/desafio-ashoka-claro.jpg 
 
Em síntese, a partir de uma perspectiva histórica, essa conexão complexa 
entre a educação e o Estado apresenta um problema para a análise da relação 
entre eles. Não existe uma forma única de associação entre essas instituições, 
e assim não existe um modo único em que elas serão afetadas pelas condições 
da globalização. Do ponto de vista econômico, as pressões das condições de 
austeridade impostas externamente (por exemplo, a condição para empréstimos 
do FMI) podem levar a reduções brutais nos gastos com educação; em outros 
contextos, o desejo por maior competitividade econômica e produtividade pode 
 
levar a maiores gastos com educação. Do ponto de vista político, alguns 
contextos nacionais irão organizar a educação em torno de uma concepção revi-
talizada de nacionalismo e lealdade do cidadão (talvez em reação às lealdades 
tribais ou outras formas de lealdade); em outros contextos, uma noção de 
cidadania cosmopolita pode prevalecer, encorajando viagens, estudos de 
línguas estrangeiras e tolerância multicultural. Do ponto de vista cultural, 
algumas nações irão aceitar, e até mesmo encorajar, uma confiança maior na 
mídia, na cultura popular, ou novas formas de comunicação e informática, como 
uma janela através da qual possam compreender o seu lugar no mundo global; 
em outros contextos, essas mesmas tendências darão lugar a um aumento em 
estreiteza mental, suspeição e resistência a influências externas. Um livro como 
este pode apenas dar início ao processo de explorar a diversidade desse tipo de 
respostas à globalização, por meio de contextos nacionais variados, e a 
diversidade de relações entre o Estado e a educação, que geram princípios, polí-
ticas e práticas educacionais à luz dessas novas condições. 
 
OS DILEMAS DA GLOBALIZAÇÃO 
 
http://undime.org.br/wp-content/uploads/2012/12/014.jpg 
 
Será que a globalização é meramente deletéria, ou existem características 
positivas associadas a suas práticas e sua dinâmica? Já tentamos desafiar essa 
 
estrutura simples de julgamento. Duas características que podem ser 
denominadas "positivas" são a globalização da democracia ou, no mínimo, uma 
forma peculiar de democracia liberal (mais uma democracia de método do que 
uma democracia de conteúdo); e a prevalência e expansão de uma crença em 
"direitos humanos" e no crescimento de organizações que os tentam monitorar 
e proteger. Para aqueles que têm suficiente sorte de viver em certos setores da 
sociedade, a globalização está associada a um padrão de vida mais elevado, 
não apenas pela disponibilidade de itens de consumo, mas também pelas 
ocasiões para viajar e para manter um contato enriquecedor com outras culturas 
do mundo. 
Os "males" mais óbvios da globalização são o desemprego estrutural, a 
erosão da mão-de-obra organizada como força política e econômica, a exclusão 
social e um aumento no abismo entre ricos e pobres dentro das nações e, 
especialmente, ao redor do mundo. Certas pessoas associam a globalização a 
um aumento na insegurança urbana, devido à progressiva violência urbana, com 
a presença crescente de movimentos de fora do território e de fora do Estado 
que impedem o desenvolvimento internacional e podem representar ameaças 
sérias contra a segurança, a paz, a estabilidade e o desenvolvimento (como o 
tráfico de drogas, máfias, comércio de armas de destruição em massa, ou 
organizações terroristas). 
Mas será que é possível separar os benefícios dos males? De fato, não 
serão os "benefícios" para uns, "males", do ponto de vista de outros? De certa 
forma, o modelo para esse tipo de julgamento não deve ser simplesmente uma 
questão de se a globalização está ou não "acontecendo mesmo", mas da 
globaliza- cão de que formas e nos termos de quem? Diversos países em 
desenvolvimento, como a China e a Malásia, têm-se tornado cada vez mais 
receosos com a globalização e têm buscado formas de restringir os seus efeitos 
sobre seu modo de vida nacional. Ainda assim, ao mesmo tempo, eles desejam 
alguns dos benefícios da participação em uma economia global e da troca de 
mercadorias e de informação. Uma importante questão atual é o nível em que 
as sociedades serão capazes de escolher as formas e o grau de participação em 
um mundo global; ou se, como outras barganhas faustianas, não existe uma 
alternativa intermediária. 
 
De maneira semelhante, abaixo e além do nível nacional, existem 
movimentos claramente regionais e tradicionais para os quais a globalização 
deve ser combatida vigorosamente. 0 surgimento de novos movimentos sociais 
e o papel de organizações não-governamentais locais e internacionais exercem 
uma influência que pode ser denominada contra-globalização. Em certos casos, 
esses grupos são igualmente "globais" em caráter (organizações internacionais 
de direitos humanos, como a Anistia Internacional; organizações ambientalistas, 
como o Greenpeace; ou organizações trabalhistas, como a OIT). Em outros 
casos, eles são antiglobalização, profundamente resistentes à interpenetração 
econômica, política e cultural de diferentes sociedades e culturas (por exemplo, 
grupos regionalistas e fundamentalistas de vários tipos). Enquanto a 
globalização acontece de maneira clara, sua forma e contorno são determinados 
por padrões de resistência, alguns com intenções mais progressistas do que 
outros. 
 
http://www.sescalagoas.com.br/educacao/sesc_jaragua6.jpgSerá possível, então, dar respostas gerais para a questão de como a 
globalização está afetando as políticas e práticas educacionais ao redor do 
mundo? Conforme indicado em nossa discussão anterior, acreditamos que não 
pode haver uma resposta única; as mudanças econômicas, políticas e culturais, 
nacionais e locais, são afetadas por tendências de globalização em uma 
variedade de padrões e respondem de forma ativa a essas tendências. De fato, 
como a educação é uma das arenas centrais onde essas adaptações e respostas 
 
ocorrem, ela será um dos tantos contextos institucionais possíveis. Assim, as 
respostas exigirão uma análise cuidadosa das tendências em educação, 
incluindo: 
 
• as atuais "palavras de efeito" populares (privatização, escolha e 
descentralização de sistemas educacionais) que dirigem a formação 
de políticas em educação e agendas de pesquisa baseadas em 
teorias de administração e organização racional (ver Michael Peters, 
James Marshall e Patrick Fitzsimons neste volume); 
• o papel de organizações nacionais e internacionais no campo da 
educação, incluindo sindicatos de professores, organizações de pais 
e movimentos sociais (ver Bob Lingard neste volume); 
• o conhecimento contemporâneo sobre as questões de raça, classe e 
gênero, e sobre o lugar do Estado na educação (o que levanta 
preocupações com o multiculturalismo e a questão da identidade na 
educação, teoria crítica de raça, feminismo, pós-colonialismo, co-
munidades diaspóricas e novos movimentos sociais). 
 
Questões quanto ao papel da pesquisa- ação participativa, da educação 
popular e da luta democrática multicultural surgem como centrais nesses 
debates. Dessas perspectivas críticas, podem surgir novos modelos educa-
cionais para confrontar os ventos da mudança, incluindo a educação no contexto 
de novas culturas populares e movimentos sociais não- tradicionais (e assim, o 
papel dos estudos culturais para compreendê-los); novos modelos de educação 
rural para áreas marginalizadas e a educação do pobre; novos modelos para a 
educação de imigrantes, para a educação de crianças de rua, para a educação 
de garotas e mulheres, em geral, mas particularmente no contexto de sociedades 
e culturas tradicionais que suprimem as aspirações educacionais das mulheres; 
novos modelos de parcerias para a educação (entre o Estado, as ONGs, o 
terceiro setor e, em certos casos, as organizações religiosas e privadas); novos 
modelos de alfabetização de adultos e educação não-formal; novos modelos de 
relações entre universidades e empresas; e novos modelos de financiamento 
 
educacional e organização escolar (por exemplo, escolas charter°). 
Certas iniciativas de reforma têm sido apoiadas ativamente pela UNESCO 
e por outras agências da ONU. Entre estas estão, por exemplo, reformas no 
sentido da alfabetização universal e do acesso universal à educação; qualidade 
educacional como um componente fundamental da igualdade; educação- para a 
vida toda; educação como um direito humano; educação para a paz, a tolerância 
e democracia; eco-pedagogia, ou como a educação pode contribuir para o 
desenvolvimento ecológico sustentável (e assim, para uma eco- economia); e o 
acesso educacional a novas tecnologias de informação e comunicação (ver 
Nicholas C. Burbules, neste volume). Assim. pode-se considerar que a influência 
da globalização sobre as políticas e práticas educacionais tem efeitos múltiplos 
e conflitantes. Nem todos esses efeitos podem ser classificados simplesmente 
como sendo ou não benéficos, e alguns deles estão sendo moldados por tensões 
e lutas ativas. Os ensaios apresentados neste livro iluminam tais dilemas em 
toda a sua complexidade. 
 
 
http://dj8xw3uz01vei.cloudfront.net/2013/04/educacao-ideal.jpg 
 
CONCLUSÃO: DILEMAS DE UM SISTEMA DE EDUCAÇÃO GLOBALIZADO 
 
Esperamos que os propósitos deste livro já estejam claros: em primeiro 
 
lugar, identificar, caracterizar e esclarecer alguns dos debates em torno do 
fenômeno da globalização; e, em segundo, tentar compreender alguns dos 
efeitos múltiplos e complexos da globalização sobre as políticas educacionais e 
a formação de políticas. A fim de sintetizar algumas das consequências da 
globalização para as políticas educacionais, seguiremos a organização anterior, 
dividida em três partes: identificar alguns dos impactos econômicos, políticos e 
culturais. 
No nível econômico, porque a globalização afeta o emprego, ela afeta um 
dos objetivos tradicionais básicos da educação: a preparação para o trabalho. 
As escolas deverão reconsiderar essa missão à luz de mercados de trabalho 
instáveis, em um ambiente de trabalho pós-fordista; novas habilidades e a flexibi-
lidade de adaptar-se a novas demandas do trabalho e, portanto, mudar de 
emprego durante o decorrer da vida; e lidar com uma mão-de- obra internacional 
cada vez mais competitiva. Ainda assim, as escolas não estão apenas 
preocupadas em preparar os estudantes como produtores; cada vez mais, as 
escolas ajudam a moldar as atitudes e práticas do consumidor, rajadas pelos 
patrocínios empresariais instituições educacionais e para produtos curriculares 
e extracurriculares que confrontam os estudantes em seu cotidiano na sala de 
aula. Essa crescente comercialização do ambiente escolar tem-se tornado 
notavelmente impudente e explícita em suas intenções (como no caso do projeto 
de Chris Whittle, o Channel One, discutido anteriormente, que admite 
abertamente oferecer televisores grátis às escolas para expor as crianças à dieta 
forçada de comerciais em suas salas de aula lados os dias). 
Os efeitos econômicos mais amplos da globalização tendem a forçar 
políticas educacionais nacionais em uma estrutura neoliberal que enfatiza 
impostos mais baixos; redução do setor estatal e "fazer mais com menos"; 
aproximação das abordagens de mercado às escolhas escolares 
(particularmente por meio de vales); administração racional de organizações 
escolares; avaliação de desempenho (testes); e desregulamentação para 
encorajar novos provedores (incluindo provedores on line) de serviços 
educacionais. 
No nível político, uma questão repetida tem sido a limitação sobre a 
formação de políticas nacionais/estatais imposta por demandas externas de 
 
instituições transnacionais. Ainda assim, ao mesmo tempo que a coordenação e 
a troca econômica são cada vez mais reguladas, e à medida que instituições 
mais fortes surgem para regular a atividade econômica global, com a 
globalização tem havido uma crescente internacionalização de conflitos, crimes, 
terrorismo e questões ambientais globais, mas com um desenvolvimento 
inadequado de instituições políticas para lidar com elas. Aqui, mais uma vez, as 
instituições educacionais podem ter um papel crucial a desempenhar ao 
abordarem esses problemas e a complexa rede de consequências humanas 
voluntárias e involuntárias que se seguiram ao crescimento de corporações 
globais, da mobilidade global, das comunicações globais e da expansão global. 
Em parte essa consciência pode ajudar a produzir uma concepção crítica de 
educação exigida pela "cidadania mundial". 
 
http://www.geraldojose.com.br/ckfinder/userfiles/images/Mais-Educa%C3%A7%C3%A3o.jpg 
 
Finalmente, mudanças globais em cultura afetam profundamente as 
políticas, práticas e instituições educacionais. Particularmente em sociedades 
industriais avançadas, por exemplo, a questão do "multiculturalismo" assume um 
significado especial em um contexto global. De que maneira o discurso do 
pluralismo liberal — que tem sido o modelo dominante para a educação 
multicultural em sociedades desenvolvidas que estão aprendendo a conviver 
com outras, dentro de um modelo de tolerância e respeito mútuos — estende-se 
a uma ordem global em que o leque de diferenças torna-se mais amplo, o senso 
de interdependência e interesse comum mais atenuado, os fundamentos da 
afiliação mais abstratos e indiretos (se existirem

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