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Reposição de eletrólitos e antidiarréicos

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4º SEMESTRE 2021 – UNIFTC FARMACOLOGIA 
JULIANA OLIVEIRA 
REPOSIÇÃO DE ELETRÓLITOS 
E ANTIDIARREICOS 
DIARREIA 
➔ Definição: 
Dia [sem parar] e rheein [fluir ou escorrer]. 
A massa das fezes depende bastante da quantidade de água, 
assim, quando menor a reabsorção de água nesse intestino, 
mais líquido será eliminado, logo, a maioria dos casos de 
diarreia resulta de distúrbios do transporte intestinal de 
água e eletrólitos. 
Em geral, 200g/dia representam o limite superior normal de 
peso de água nas fezes para indivíduos saudáveis em países 
ocidentais. 
 
➔ Epidemiologia: 
o É a 2ª causa de morte em crianças abaixo de 5 anos, 
sendo prevenível e tratável. 
o 1,7 bilhões de casos de doenças diarreicas em crianças 
por ano. 
o 525.00 mortes anuais < 5 anos. 
o Diarreia é a causa líder de mal nutrição em crianças 
abaixo de 5 anos. 
o Estão entre as 10 doenças que mais matam no mundo, 
ocupando o 8º lugar. 
 
 ÁGUA X TRATO GASTROINTESTINAL: 
Pode-se ter a falsa impressão de que a maior parte da água 
que sai nas fezes advém da alimentação, mas isso é um 
engano, passam pelo nosso TGI aproximadamente 9L de 
água por dia, sendo que desses 9L, 2L vem da água ingerida, 
alimentos, etc, todo o restante é água secretada pelo TGI, 
só de saliva é secretado cerca de 1,5L/dia. Logo, a maior 
parte da água que transita no TGI, vem do próprio 
organismo. Com base nisso, pode-se sugerir algumas 
estratégias antidiarreicas, como p.ex. aumentar a absorção 
de água no TGI, mas além disso tem-se a redução de 
absorção de água do nosso organismo. 
Tem-se fármacos hidroscópicos, os quais são adsorventes, 
ou seja, não são absorvidos pelo corpo, são administrados 
por VO, passam pelo TGI, e ao chegar na região intestinal 
adsorvem a água da superfície e deixa o bolo fecal mais 
consistente, pois, está retendo a água em sua estrutura 
química, sendo um ex de fármaco que não estimula a 
absorção e não diminui a motilidade intestinal, mas é um 
fármaco que altera a consistência. 
A dejeção intestinal normal não deve provocar nem dor 
nem desconforto. 
Diz-se que uma diarreia aguda tem uma duração < 2 
semanas, já uma diarreia crônica tem uma duração > 4 
semanas. 
Normalmente, a diarreia é autolimitada, mas pode-se ter 
casos mais graves que podem levar o indivíduo à morte, 
devido a perda rápida de água e eletrólitos que ocasionam à 
desidratação, choque hipovolêmico e outros graves 
distúrbios eletrolíticos no paciente. 
➔ Diarreia aguda: 
Características: 
o Eliminação diária de 250g de fezes por 2 a 3x/dia. 
o Náuseas, vômitos, mal estar, cólicas e febre. 
o Nas infecciosas agudas ocorrem entre 6 e 48h após a 
ingestão do contaminante. 
Diarreia agudas altas: Costumam ser aquosas, volumosas, 
com náuseas, vômitos, pouca ou nenhuma febre ou 
prostração. Afeta o jejuno – íleo. 
Diarreias agudas baixas: Cólicas mais frequentes, presença 
de muco, pus e sangue, além de febre e sensibilidade à 
palpação. Afeta o cólon. 
➔ Diarreia crônica: 
O diagnóstico nesses casos depende muito das queixas do 
paciente, da história clínica, características da diarreia, 
exame físico e exames laboratoriais. 
Em geral as diarreias crônicas estão relacionadas com 
condições patológicas pré-existentes. 
 
Mecanismos fisiopatológicos da diarreia crônica: 
Deficiência secretora ou de absorção, doença exsudativa, 
motora ou associada com doenças metabólicas. 
 
➔ Etiologias: 
As principais são infecções intestinais bacterianas ou 
toxinas, viróticas ou parasitárias. 
 
A diarreia também pode se apresentar em razão do efeito 
indesejado de medicamentos, p.ex. a metformina, 
antibióticos e quimioterápicos. 
 
o Sintomas da desidratação: 
Oligúria; 
Sede; 
Boca seca; 
Hipotensão postural; 
Perfusão capilar diminuída; 
 
OBS: Em adultos a redução de turgor, elasticidade da pele e 
enoftalmia não é tão característica. 
 
➔ Mecanismos que levam a quadros diarreicos: 
o Vibrio cholerae: 
Tem um mecanismo de diarreia muito forte e o paciente de 
fato tem evacuações extremamente volumosas e perde 
muita água em uma velocidade muito rápida. 
Tem-se um agente que libera a toxina da cólera no TGI, 
nisso, tem-se um transportador que tem afinidade com a 
toxina da cólera e a coloca no citoplasma do enterócito, no 
 
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reticulo endoplasmático essa toxina é metabolizada e 
transformada em uma substância que é um produto do 
metabolismo da cólera que tem afinidade com o adenilato 
ciclase, fazendo com que ele trabalhe mais, com isso, há o 
aumento de AMPc no enterócito, esse ativa fosfoquinase A, 
a qual diminui a absorção de sódio e consequentemente de 
água, logo, uma menor absorção da água dos fluídos leva a 
uma maior secreção ou diarreia muito intensa. 
 
o Rotavírus: 
Diferentemente da cólera, tem uma função de destruição 
dos enterócitos, infectando-o e utilizando da maquinaria 
celular para se replicar, após isso, sai para infectar novos 
enterócitos e os enterócitos em questão morre, com a 
morte de enterócitos, há uma perda da capacidade 
absortiva. 
 
o Alimentos alérgenos: 
Um indivíduo alérgico pelas proteínas do amendoim, 
consumiu o amendoim, esse alérgeno foi absorvido, caiu na 
corrente sanguínea, e nos vasos periféricos próximos já se 
tem o desenvolvimento de uma resposta imune como a 
APC, linf Th2, IL-4, lL-13, recruta mastócitos, libera 
histamina, libera serotonina, as quais são substâncias que no 
TGI, próximo aos enterócitos vão provocar vasodilatação, 
aumento da permeabilidade vascular e contração da 
musculatura lisa, aumentando o peristaltismo, logo, a 
consequência disso é a diarreia. Além da liberação dos 
mediadores já citados, os mastócitos também estimulam os 
neurônios secreto motores que vão estimular a secreção 
dos líquidos intestinais, logo, o aumento do líquido é 
equivalente ao aumento de água no bolo fecal. A nível de 
secreção a acetilcolina estimula a secreção de líquido e a 
nível de contração ela estimula o peristaltismo. 
 
o Problemas de absorção intestinal: 
Correspondem a colite ulcerativa, doença de Chron, 
doença celíaca, as quais culminam na diminuição da 
eficiência da absorção pelas microvilosidades, ou seja, as 
áreas absortivas das microvilosidades com os nutrientes, 
eletrólitos ou água no intestino delgado diminui com essas 
doenças. Logo, com a diminuição da superfície de contato 
tem-se a diminuição da absorção de água, nutrientes, 
eletrólitos e consequentemente tem-se o aumento do 
volume de água nas fezes. 
 
➔ Tratamento: 
A maioria dos casos ocorrem sem toxemia ou prostração, 
sem sensibilidade abdominal e sem sangue nas fezes e 
normalmente requerem hidratação oral e, eventualmente, a 
administração de alguns antidiarreicos. 
 
Em adultos, o tratamento farmacológico é reservado para 
sintomas persistentes ou significativos. 
 
Qual o grande problema de tratar um quadro diarreico 
farmacologicamente sem saber a etiologia? 
O problema é que, por exemplo, se for um quadro 
bacteriano, ao usar antidiarreico, inviabiliza que a bactéria 
seja expelida, mantendo a bactéria por mais tempo no 
organismo. 
Se não for uma diarreia provocada por bactéria e for feita a 
administração de atb, aumenta-se a chance de outras 
bactérias desenvolverem resistência para tal. 
 
Assim, tratamentosinespecíficos podem mascarar o quadro 
clínico, atrasar a eliminação de microrganismos, toxinas e 
aumentar o risco de infecção sistêmica. 
 
Os antidiarreicos incluem fármacos antimotilidade, 
adsorventes e fármacos que modificam o transporte de 
água e eletrólitos. 
 
o Hidratação oral: 
Em grande parte dos casos, essa opção é suficiente para 
cessar o problema. A OMS distribui o sachê contendo sais 
para que se faça o líquido de hidratação oral de forma 
adequada. Esse sachê contém: 
- 3,5 g de cloreto de sódio. 
- 2,9g de citrato de sódio dihidratado. 
- 1,5g de cloreto de potássio. 
- 20g de glicose. 
 
Tem-se a mistura de sódio e glicose nessa solução, devido a 
descoberta de um transportador específico que é um co-
transportador de sódio e glicose. Ele só funciona se tiver 
esses sódio e glicose para serem transportados 
simultaneamente para os enterócitos, sem eles não há 
transporte, nem absorção. 
 
Em função disso, é recomendado que a ingesta de 
sobremesas ou doces sejam feitas em outro período que 
não seja no “pós almoço”, visto que devido a ingesta de sal 
na refeição do almoço, ingerir doce em sequência amplifica 
a absorção de glicose devido a ação do co-transportador de 
sódio e glicose, que nesse momento, estará sendo exposto 
a ambos. 
 
O soro caseiro é constituído por 1 litro de água, 1 
colher de chá de sal e 1 colher de sopa bem cheia de 
açúcar. Essa “receita” foi definida por Norbert Hirschhorn 
e foi considerado o avanço médico mais importante do 
século 20. 
 
Atualmente tem-se alternativas que são mais bem aceitas e 
conseguem restituir a hidratação. 
 
o Fármacos antimotilidade: 
Loperamida: Imosec é o nome comercial. 
É um opioide, pois atuam reduzindo a motilidade intestinal 
à nível da musculatura lisa, com atividade MOR (miopióides) 
e DOR (deltaopióides), ativo por via oral. 
40 a 50x mais potente que a morfina como antidiarreico. 
 
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Possui baixa penetração no SNC (praticamente não possui 
efeitos adversos). 
Atividade antissecretória contra toxina da cólera, ou seja, 
ela se liga no receptor que tem afinidade com a toxina da 
cólera, impedindo que afete os enterócitos. 
Atua nos receptores ligantes da toxina, impedindo aumento 
da atividade da adenililciclase. 
 
A nível dos receptores MOR, a loperamida reduz os 
movimentos peristálticos, libera acetilcolina e movimenta 
menos a musculatura lisa. 
A nível dos receptores DOR, quando a loperamida se 
liga a eles, tem-se a diminuição da secreção de líquidos no 
TGI e o aumento da absorção. 
 
Possuem poucos efeitos adversos, pois, os principais efeitos 
adversos dessa classe são a nível central, como não 
atravessam a barreira hematoencefálica, praticamente não 
se tem efeitos adversos, além disso, não possuem potencial 
significativo de abuso. 
 
Casos de superdosagem podem causar constipação, 
depressão do SNC em crianças, visto que sua barreira 
hematoencefálica não está completamente formada, e íleo 
paralítico. 
 
Atenção: Seu uso não é recomendado para < 2 anos. 
 
Em pacientes com doença inflamatória intestinal ativa 
envolvendo cólon, deve ser usada com cautela para 
prevenir megacólon tóxico. 
 
O difenoxilato, meperidina e codeína são outros 
fármacos antimotilidade que são amplamente utilizados no 
tratamento da diarreia. 
 
Clonidina: 
Uso principal como anti-hipertensivo, mas usado também 
como um antimotilidade. 
É uma agonista de receptor a2-adrenérgico. 
Interage com neurônios entéricos e com enterócitos. 
Estimula a absorção e inibe a secreção de líquidos. 
Diminui o trânsito intestinal. 
Uso interessante em diabéticos e diarreicos crônicos. 
 
Mecanismo de ação: 
O receptor alfa2 é acoplado à proteína G do tipo “i”, assim, 
no momento em que a clonidina se liga a esse receptor, 
dispara a subunidade alfa, inibindo o adenilato ciclase, logo, 
tem uma diminuição da formação do AMPc, da ativação de 
PKA e a diminuição da ativação de canais de cálcio de modo 
que há uma diminuição do influxo de cálcio no neurônio 
pré-sináptico na região entérica, o que diminui a liberação 
de noradrenalina. 
 
São fármacos úteis em pacientes com diarreia causada pela 
abstinência opioide. Tem-se alguns efeitos colaterais como 
hipotensão, fadiga, boca seca e sedação. 
OBS: Alguns pacientes apresentam disfunção erétil. 
 
o Fármacos antissecretores: 
Ocreotida: 
É análogo da somatostatina, ou seja, mimetiza suas ações 
em nosso organismo. A somatostatina reduz a produção de 
hormônios, é eficaz na inibição da diarreia, provocada por 
tumores secretores de hormônios no pâncreas e TGI 
(inibição da liberação da gastrina, colescistocinina, glucagon, 
insulina, secretiva, suco pancreático e serotonina). 
A ocreotida reduz a secreção dos fluídos intestinais, além 
disso, diminui a velocidade da motilidade gástrica, pois, 
contrai o músculo vascular liso → Fluxo portal e esplênico. 
 
Efeitos indesejados: Normalmente são dependentes da 
duração do tratamento. 
Podem ocasionar náuseas, formação de cálculos biliares, 
inchaço ou dor local na administração, hipo/hiperflicemia e 
eventos cardiovasculares endócrinos. 
 
Etiltelotristate: 
Pode ser chamado de telotristate. 
São usados em associação à somatostatina ou a ocreotida. 
É mais restrito à pacientes que têm tumores carcinoides. 
Faz a inibição da triptofano hidroxilase, a qual participa da 
cascata de produção da serotonina, a qual se relaciona 
diretamente com a secreção de líquidos e a motilidade GI. 
 
Serotonina → Secreção de líquidos e motilidade GI 
 
Efeitos indesejados: 
Constipação, náuseas, depressão, edema periférico, 
flatulência e redução do apetite. 
 
o Fármacos higroscópicos e formadores do bolo fecal: 
São fármacos que tem o mecanismo de ação fisicoquímico. 
 
Carboximetilcelulose e policarbofila cálcica: 
São polímeros. 
Possuem uma alta capacidade hidroscópica, logo, absorvem 
água e aumentam o volume fecal. 
Policarbofila absorve 60x sua massa em água. 
São úteis em diarreias agudas e em diarreais crônicas leves 
em pacientes com síndrome do intestino irritado. Também 
pode se ligar a algumas toxinas bacterianas. 
 
Ácido hialurônico e dextranômero: 
Atuam de forma diferente, também possuem uma alta 
interação com a água, no entanto, são administrados por via 
subcutânea da região da mucosa do canal anal, assim, essas 
moléculas não retém a água para o bolo fecal, mas sim para 
a levar até a região da submucosa para que seja 
reabsorvida. 
 
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É inviável em uso crônico visto que pode ocasionar dor na 
área da administração, sangramentos, inchaço dos grânulos. 
 
o Salicicato de bismuto: 
Diminui a secreção de líquidos no intestino, 
Se liga a toxinas bacterianas. 
Recupera o revestimento da mucosa gástrica. 
Possível efeito antibacteriano. 
É muito útil em diarreias do viajante. 
 
Efeitos colaterais: Língua e fezes escurecidas. 
 
o Probióticos: 
Atuam no tratamento das diarreias por tentar 
reestabelecer a microbiota comensal. 
Preparações contendo: Lactobacillus GG e Saccharomyces 
boulardii. 
Útil em quadros diarreicos com uso de antibiótico, porquê 
é um quadro em que se sabe que a microflora do paciente 
tá afetada, logo, ao restabelecer essa microflora a diarreiacessa. 
 
o Antibióticos: 
Sempre deve ser usado? Não, deve-se usar sempre no 
tratamento de diarréia se for uma infecção bacteriana. 
Quais consequências de usar sem necessidade? Resistência, 
erradicação da flora intestinal (microbiota) e aumento do 
custo. 
Quando deve ser usado? 
Usar em idosos > 65 anos, diarreia > 14 dias (testar 
infecção por protozoário), imunossupressão e quadro de 
sepse.

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