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Luciana Santos ATM 2023/2 1 Reumatologia Gota Deposição de urato monossódico causando hiperuricemia com urato sérico ou plasmático >6,8mg/dL (400micromoles/L). Clínica: Crises recorrentes de artrite inflamatória (crise de gota), artropatia crônica, acúmulo de cristais de urato na forma de depósitos tofáceos, nefrolitíase de ácido úrico e nefropatia crônica devido as comorbidades. Hiperuricemia é pré-condição necessária, mas é diferente da síndrome clínica gota. Maioria dos hiperuricemicos não tem nenhum evento clínico pela deposição de cristais de urato. Epidemiologia: o Mais cedo em homens do que em mulheres; rara na infância. o Níveis de urato sérico na infância: 3-4mg/dl em meninos e meninas – pode haver defeitos hereditários nas enzimas do metabolismo de purinas ou doenças com taxas muito aumentadas de proliferação celular. o Homens: nível sérico de urato 5-6mg/dl na puberdade, com aumento devido a idade. As concentrações nas mulheres são 1-1,5mg/dl mais baixas. o Fatores de risco: aumento da longevidade e doenças cardiovasculares, metabólicas e renais associadas a idade na população; uso de medicamentos que alteram o equilíbrio do urato, aumento da ingestão de alimentos e aditivos alimentares (xarope de milho rico em frutose) que contribuem para DM e obesidade. História natural Hiperuricemia persistente: produção excessiva de urato E/OU comprometimento absoluto/relativo da excreção renal de ácido úrico; todos os pacientes com gota apresentam hiperuricemia em algum ponto da doença. Maioria dos hiperuricemicos nunca experimenta um evento clínico resultante da deposição dos cristais. Luciana Santos ATM 2023/2 2 Três estágios clínicos clássicos: Sinalizadores de gota Gota intercrítica Artrite gotosa crônica e gota tofácea Antes de tratamento eficaz na redução do urato, o intervalo desde a 1ª crise de gota até o início da artrite crônica ou tofos era de 12 anos. Tratamento para redução de urato com agentes uricosúricos ou Alopurinol levou a redução dramática na artrite gotosa crônica e na gota tofácea – quando a progressão ocorre é mais frequente em pacientes não aderentes, esquema de tratamento mal comunicado e nos quais o diagnóstico não foi feito. Prevalência residual de gota tofácea e poliarticular crônica em 50% foram relatadas em homens com consumo excessivo de álcool, uso de diuréticos, e manejo subótimo com baixa adesão da terapia para redução do urato. Luciana Santos ATM 2023/2 3 Receptores de transplante de órgãos tratados com inibidores de Calcineurina (diuréticos também) apresentam risco aumentado para gota tofácea. Exacerbações da gota Crise de gota é tipicamente monoarticular e intensamente inflamatória, em extremidades inferiores. Pode haver crises poliarticulares que são mais prováveis em pacientes com doença de longa duração. Hiperuricemia crônica pode desenvolver deposição de urato sólido com lesão articular associada – gota tofácea. O que desencadeia a crise? Fatores dietéticos e físicos, comorbidades, medicamentos. Algumas condições podem provocar distúrbios generalizados nas concentrações do urato fluido – trauma, cirurgia, fome, alimentos gordurosos e outros gatilhos dietéticos, desidratação, medicamentos (diuréticos tiazídicos e de alça, aspirina em baixas doses ou Alopurinol e agentes uricosúricos), vacinas. Álcool como cerveja, destilados e vinho está associado a risco maior de crises de gota. Gatilhos pró-inflamatórios imunizações 48h seguintes de vacina pode ocorrer. Início da terapia para redução do urato embora protetora a longo prazo pode precipitar o surto de gota particularmente nos primeiros meses. Profilaxia anti-inflamatória é administrada para prevenir essa complicação. Fatores geralmente estão em combinação: Temperatura corporal mais baixa (extremidades) + desidratação relativa + níveis relativamente baixos de cortisol no sangue na noite e primeiras horas da manhã – crises são mais fáceis de ocorrerem nestes horários. Surto de gota típico Dor intensa, vermelhidão, calor, inchaço, incapacidade – gravidade máxima em 12-24h. Resolução completa dentro de dias a semanas mesmo em não tratados. Descamação da pele na articulação afetada Início mais frequente a noite e de manhã cedo (entre meia-noite e 8h) – 2x mais prováveis do que de dia Envolvimento de extremidade inferior – 80% na base do dedão do pé (1ª articulação metatarsofalangiana – podagra) ou joelho Sinais de inflamação além dos limites da articulação – pode dar impressão de dactilite (dedo em salsicha) ou celulite ou artrite em várias articulações contíguas Outros locais: tornozelo, peito do pé, pulso, dedos, olecrano. Envolvimento incomum das articulações axiais: coluna e articulações sacroilíacas – região lombar. Gota poliarticular Manifestação inicial em menos de 20% dos pacientes – ocorre mais nas crises posteriores São particularmente comuns no final do curso da gota não tratada, quando múltiplas recorrências, intervalos curtos ou ausentes sem sintomas e depósitos tofáceos palpáveis São mais frequentes entre hospitalizados e pode ser acompanhada por febre/mimetizar sepse Gota intercrítica e crises de gota recorrentes Mesmo após crises graves e incapacitantes, os períodos intercríticos são totalmente assintomáticos – altamente sugestivo de diagnostico de gota porque em outras artrites há sintomas intercrises Intervalos entre crises são de duração variável – quem não trata – 2º ep em 2 anos Apesar da intermitência das erupções, pode haver deposição contínua do material tofáceo causando erosões ósseas que podem evoluir para artropatia gotosa crônica Gota tofácea Coleções de urato sólido acompanhada de alterações inflamatórias crônicas e frequentemente destrutivas no tecido conjuntivo circundante Tofos podem estar presentes em orelhas e tecidos moles, como estruturas articulares, tendões ou bursas Tofos geralmente NÃO são doloridos ou sensíveis Podem se formar em qualquer área que contenha tecido conjuntivo Complicações renais Nefrolitíase e nefropatia crônica de urato ACHADOS LABORATORIAIS Luciana Santos ATM 2023/2 4 Análise do líquido sinovial: presença de cristais de urato monossódico no líquido sinovial obtido de articulações ou bursas por exame direto; líquido é inflamatório, com leucócitos variando entre 10.000 a 100.000 com predominância de neutrófilos. Contagem de leucócitos elevadas. Durante um surto, os exames de sangue podem demonstrar alterações inespecíficas: Leucocitose neutrofílica ou elevação do VHS/PCR são comuns na crise; mas isso ocorre em outras artrites agudas Níveis séricos de urato: primeiros meses de terapia com medicamentos que baixam urato os surtos de gota podem ocorrer em concentrações baixas ou normais de urato no momento da crise; O tempo mais preciso para avaliação do urato sérico é 2 semanas ou mais após desaparecimento completo do surto. IMAGEM RX simples e imagem por RMN: cistos ósseos subcorticais aparentes podem sugerir tofos gotosos ou erosões – ocorrem em doença mais crônica. US: úteis na detecção precoce e monitoramento da terapia; TC: pode distinguir o deposito de urato do de cálcio; tamanho do tofo pode ser quantificado, mas a utilidade clínica é incerta DIAGNÓSTICO: CRISE Artrocentese – teste do líquido sinovial ou bursal com contagem de células e contagem diferencia de leucócitos, coloração e cultura Gram e exame de cristais em microscopia de luz polarizada. Cristais birrefringentes negativos em pacientes com crise de gota é de especificidade de 100%. Pseudogota: artrite aguda por cristal de pirofosfato de cálcio ou artrite séptica podem coexistir com a gota Critérios clínicos: pode ser feito o dx mesmo com ausência do líquido sinovial Sexo masculino (2p) Reação de artrite relatada anteriormente pelo paciente (2p) Início em um dia (0,5p) Vermelhidao nas articulações (1p) Envolvimento da 1ª articulaçãometatarsofalangeana (2,5p) Hipertensão ou pelo menos uma doença cardiovascular (1,5p) Nível de urato sérico > 5,88mg/dl (3,5p) Probabilidade baixa: menor ou igual a 4 pontos Probabilidade intermediária: maior que 4 e menor que 8 pontos Probabilidade alta: maior ou igual a 8 pontos Exames de imagem Podagra ou envolvimento de pequenas articulações das mãos RX simples com aparência erosiva característica (com borda sliente) pode ser favorável ao diagnóstico US quando aspiração do líquido não for viável Aspiração do fluido articular para microscopia com luz polarizada pode ser realizada tanto no período agudo como na intercrise TC: mais para artropatia crônica ou deformidades DIAGNÓSTICO: INTERCRISE OU GOTA TOFÁCEA Demonstração de cristais em aspirados de líquido sinovial ou tofos: mesmo no período intercrise assintomático os cristais são identificáveis. Exame histológico Diagnóstico clínico Se ausência de meios para identificar os cristais de urato o diagnóstico pode ser clínico – o score acima só foi validado para o período crítico, e não intercrise – aguarda validação Critérios de classificação para gota Pelo menos um episódio de inchaço, dor ou sensibilidade em uma articulação periférica ou Bursa com a presença de cristais de urato em articulação sintomática, Bursa ou tofo ou sem achados de líquido sinovial positivos em pacientes com número suficiente de achados clínicos e de imagem. DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL Artrite séptica aguda: febre, leucocitose e VHS elevada assim como na gota. Raramente coexiste com a gota. Contagem extremamente altas de leucócitos no líquido sinovial (>100.000células/ml) são mais favoráveis a artrite séptica. Trauma Luciana Santos ATM 2023/2 5 Doença de deposição de cristal de pirofosfato de cálcio artrite aguda de cristal de pirofosfato de cálcio = pseudogota Celulite: geralmente se estende para áreas não articulares com febre e calafrios. Artrocentese não deve ser realizada em área potencialmente envolvida pela celulite. Doença do cristal de fosfato de cálcio básico Diagnóstico diferencial de gota tofácea Artrite reumatoide: tofos podem ser confundidos com nódulos reumatoides; assimetria e assincronia ocorrem na GOTA. Dactilite Osteomielite TRATAMENTO DA CRISE Anti-inflamatórios: glicocorticoides sistêmicos e intra-articulares, anti-inflamatórios não esteroides, Colchicina, agentes biológicos inibidores da interleucina 1. Tratamento precoce: o mais rápido após perceber o início da crise; resolução mais rápida quanto mais rápido iniciar a terapia. Geralmente tratamento dura não mais que 5-7 dias se terapia iniciada de 12-36h após início dos sintomas; Profilaxia do surto: anti-inflamatórios em baixas dosagens para reduzir o urato. Terapia de redução de urato durante a crise: Alopurinol, Febuxostate, Probenecida, Lesinurad, Benzbromarona ou Pegloticase – se o paciente já faz uso destes medicamentos, deve manter durante a crise – sem interrupção temporária. Elas não têm benefício direto na crise. O tratamento da crise não difere em pacientes com tofos ou sem tofos; Medidas adjuvantes: gelo na articulação afetada, repouso na articulação. Escolha do agente: TERAPIAS ORAIS Glicocorticóides orais: injeção intra-articular ou contraindicações ao uso de AINEs. 30-40mg de Prednisolona em dose dividida 2x/dia AINEs: alternativa aos glicocorticoides – Naproxeno 500mg 2x/dia ou Indometacina 50mg 3x/dia. Apropriada em <60 anos sem doença renal, cardiovascular ou gastrointestinal ativa. Colchicina: é conveniente para pacientes que já utilizam para profilaxia de crises; Glicocorticóides parenterais Surto típico limitado a uma ou duas articulações podem ser usados glicocorticoides parenterais Pacientes com crises poliarticulares graves – combinação de glicocorticoides intra-articulares + agente oral (1 ou 2) TRATAMENTO DO INTERCRISE Drogas que reduzem o urato sérico aumentando a excreção renal de ácido úrico (agentes uricosúricos) ou diminuindo a síntese de urato (inibidores de Xantina-Oxidase) ou combinação de ambos, ou com urocilíticos – uricases. Mudanças na dieta + perda de peso + redução na ingesta de álcool + substituição de medicamentos que podem promover hiperuricemia. Pode ser usada profilaxia anti-inflamatória (AINEs) ou Colchicina para reduzir o risco de crises de gota durante o início da terapia de redução de urato. Indicacoes da terapia de redução de urato Crises de gota frequentes ou incapacitantes: duas ou mais crises anualmente são indicação Tofos e danos estruturais em articulações: sinais RX de gota grave (danos estruturais as articulações como erosão óssea gotosa), doença poliarticular e depósitos tofáceos em tecidos moles/ossos subcondrais – TERAPIAS DE REDUCAO DE URATO PODEM REDUZIR OS DEPÓSITOS TOFÁCICOS – Alopurinol, Probenecida ou Febuxostate. Gota + insuficiência renal Metas do urato sérico Urato sérico <6mg/dl em pacientes sem tofos Urato sérico <5mg/dl em pacientes com tofos – para acelerar a redução Monitoramento sérico do urato de rotina – valores da meta confirmados, fazer de 6/6 meses Quando iniciar a terapia? Luciana Santos ATM 2023/2 6 Duas semanas após aparecimento de um surto de gota para iniciar medicações que baixam o urato. Depois que estes medicamentos iniciados, não devem ser descontinuados em caso de crise de gota. Durante o período inicial da terapia de redução de urato (queda abrupta do urato pode precipitar uma crise , além de promover formação de cálculos urinários em uso de agentes uricosúricos) os pacientes devem receber profilaxia para diminuir as crises de gota – Colchicina ou um AINE (pode ser usado glicocorticoide, com menor frequência). Qual medicamento? Alopurinol – redução do urato (inibidor da xantina-oxidase): 100mg por dia Se não atingir o alvo em dose máxima de Alopurinol pode-se usar um uricosúrico como Alopurinol + Probenecida ou Lesinurad. Intolerantes ao Alopurinol: terapia única com Probenecida. Referência: UpToDate
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