Prévia do material em texto
1 Vanessa Telles- Medicina Diabetes Mellitus Definição: Diabetes Mellitus se refere a um distúrbio metabólico crônico relacionado com estado orgânico de hiperglicemia persistente e deficiência na produção e/ou ação da insulina. Essa doença endócrina está relacionada com complicação macrovasculares (doença coronariana, doença cérebro- vascular, doença arterial) e microvasculares (nefropatia, neuropatia e retinopatia). Logo, o DM está relacionado com aumento da morbimortalidade. Epidemiologia: Em 2017, estava presente em 8,8% da população mundial de 20-79 anos. No Brasil, há mais de 12 milhões de diabéticos. O número de portadores de DM tem subido muito, o que está relacionado com mudanças no estilo de vida, piora da alimentação, aumento dos fast-foods, aumento da idade da população, urbanização, sedentarismo e obesidade. O DM é a principal causa de cegueira, amputações e de nefropatias. Também é responsável por 70% das mortes por doenças cerebrovasculares. Trata-se de um problema de saúde pública. Cerca de 10% dos diabéticos possuem DM tipo 1 enquanto cerca de 90% possuem DM tipo 2. Fisiopatologia: Sabe-se que fatores genético, ambientais e imunológicos compõem a fisiopatologia do DM. Os danos orgânicos do DM são causados pelo estado de hiperglicemia persistente, o que é tóxico para o corpo. Essa hiperglicemia é causada, por sua vez, por deficiências na produção ou na ação periférica da insulina. A glicose é uma molécula hidrofílica que é captada pelas células por difusão facilitada, tendo como mediadores os transportadores GLUTs. O corpo obtém glicose através de absorção intestinal, glicogenólise hepática, gliconeogênese hepática e renal. Normalmente, a glicemia de jejum deve ser menor que 126 mg/dL. A insulina é produzida nas células beta das ilhotas pancreáticas, que correspondem a porção endócrina do pâncreas e onde também ocorre produção de glucagon pelas células alfa. Normalmente, a produção da insulina se inicia com a síntese do polipeptídio pró-insulina pelas células beta. Cada pró-insulina é clivada, gerando uma molécula de peptídeo C e uma molécula de insulina, os quais serão embalados em grânulos de armazenamento e ligados a membrana das células beta, sendo excretados por exocitose na circulação porta- hepática. O estímulo necessário para a exocitose desses grânulos é a presença de glicose, a qual é internalizada pelas células beta através do GLUT-2 da membrana, induzindo mecanismos que envolvem vias de sinalização, sinais mitocondriais e o fechamento de canais de potássio e abertura de canais de cálcio no citoplasma das células beta. Em indivíduos normais, a insulina possui uma liberação basal em pulsos de 11 a 15 minutos, além da liberação em boulos quando os níveis de glicose aumentam (refeições). A principal função da insulina é conduzir a glicose para o interior das células dos tecidos periféricos e reduzir a concentração de glicose na corrente sanguínea. Logo, a insulina estimula fenômenos anabólicos e inibe fenômenos catabólicos. A regulação da liberação de insulina no corpo é feita por: ✓ Agentes estimulantes da secreção = glicose e secretagogos como aminoácidos (leucina), estímulo vagal, medicamentos (sulfonilureias, repaglinida, nateglinida, agonistas do GLP-1 e inibidores do DPP-4). ✓ Agentes que inibem sua secreção (hormônios contrarregulatórios) = glucagon, cortisol, catecolaminas e GH. O glucagon é liberado em estados de hipoglicemia, principalmente, e seus efeitos incluem estimulo da gliconeogênese, glicogenólise e cetogênese. Nos indivíduos com diabetes, há uma falha das células beta em produzir/secretar insulina, o que pode ocorrer por destruição autoimune ou falência com a idade, ou por disfunção na ação da insulina associada a resistência insulínica dos tecidos periféricos. São indivíduos que apresentam defeitos metabólicos com hiperglicemia de jejum, hiperglicemia pós- prandial, ácidos graxos livres, hiperaminoacidemia e níveis de glucagon elevados. 2 Vanessa Telles- Medicina No caso do DM tipo 2, há uma explicação fisiopatológica consolidada chamada Octeto DeFronzo, que resume 8 fatores relacionados com a patogênese da doença, sendo eles (mnemônico Beta, Alfa, IRPANC): 1. BETA = Redução da insulina por disfunção da produção/secreção pelas células beta pancreáticas. 2. ALFA = Aumento do glucagon por estímulo das células alfa pancreáticas. 3. I = Redução das incretinas, que são substâncias reguladoras do metabolismo da glicose e produzidas por intestinos e pâncreas. Ex: GLP-1 intestinal (induz saciedade e + insulina). 4. R = Reabsorção renal de glicose, o que ocorre por atividade aumentada do SGLT-2. 5. P = Aumento da produção hepática de glicose estimulado por + glucagon e – insulina. 6. A = Lipólise aumentada, sendo que a presença de ácidos graxos livres e a atividade dos adipócitos induz a liberação de fatores inflamatórios e resistência insulínica. 7. N = Disfunção de neurotransmissores hipotalâmicos, gerando perca da saciedade e disparos para + produção hepática de glicose. 8. C = Redução da captação periférica de glicose Classificação: ✓ DM tipo 1: antes conhecido como diabetes insulinodependente, é uma forma de DM autoimune poligênica causada pela destruição das células beta e deficiência completa de insulina. Corresponde a cerca de 10% dos casos. As manifestações tendem a iniciar em indivíduos jovens com os “4 Ps” com grande necessidade de insulina e com cetoacidose como complicação mais comum. Possui 2 subtipos: • DM tipo 1 A: forma mais frequentes do DM tipo 1, sendo causada por fator genético + ambiental desencadeante (infecções virais, microbiota intestinal, componentes dietéticos). Marcado pela presença de autoanticorpos anti-ilhota, anti-insulina, anti-GAD65, anti-Znt 8, anti-IA2 e IA2B, mas os anticorpos não são usados para rotina. Manifestações típicas do DM, mas pode se iniciar abruptamente com cetoacidose diabética. Mais frequente em pacientes jovens e sua forma insidiosa em adultos é conhecido como LADA. São descritos 3 estágios: normoglicemia com anticorpos presentes e sem sintomas; pré-diabetes com anticorpos presentes e sem sintomas; diabetes com anticorpos e sintomas presentes. • DM tipo 1 B: forma idiopática menos frequente e não associada com autoanticorpos. ✓ DM tipo 2: forma de DM poligênica com forte fator genético e etiologia multifatorial (Octeto DeFronzo), caracterizado por deficiência relativa de insulina. Possui como fatores de risco como obesidade, hipertensão, história familiar, sedentarismo, tabagismo, +45 anos, diagnóstico prévio de resistência insulínica (pré-diabetes ou DMG), dislipidemias, etnia negra ou hispânica. Os indivíduos podem ser assintomáticos ou oligossintomáticos, apresentando complicações macro e microvasculares com a progressão da doença. O rastreamento do DM2 deve ocorrer em todos os pacientes que apresentarem fatores de risco ou sinais de complicações, com exames de glicemia a cada 2-3 anos. ✓ Diabetes gestacional: estado de intolerância a glicose diagnosticado durante a gravidez, sem que tenha preenchido critérios para DM previamente. ✓ Outros tipos: são tipos mais raros como o MODY (forma monogênica do DM associada a defeitos genéticos na função das células beta, possuindo vários subtipos), Diabetes Neonatal, etc. Manifestações: De modo geral, estados de hiperglicemia característicos do DM estão associados aos “4 Ps” do DM: poliúria (+ urina), polidipsia (+ sede), polifagia (+ fome), perda ponderal (ação dos hormônios contrarregulatórios da insulina). Também pode haver adinamia, infecções repetidas e complicações crônicas. Diagnóstico: As manifestações clínicas podem guiar, mas o diagnóstico só é confirmado pelo laboratório! ✓ Glicemia de Jejum: normal de 70-99mg/dL, pré- diabetes de 100-125 mg/dL, diabetes se 126 mg/dL ou mais. 3 Vanessa Telles- Medicina ✓ Teste Oral de Tolerância a Glicose (TOTG): normal se menor ou igual a 139, pré-diabetes de 140- 199, diabetes se 200 mg/dL. ✓ Hemoglobina Glicada (HbA1c): normal se menor ou igual a 5,6%, pré-diabetes se 5,7-6,4%, diabetes se 6,5% ou mais. ✓ Glicemia casual/ ao acaso: sugere diabetes se maior ou igual a 200 mg/dL. ✓ Dosagem sérica de peptídeo C: para saber quanto de células beta ainda estão ativas e se há produção de insulina no paciente. Valores > 0,7 são bons. Critérios diagnósticos para DM: 1 exame (GJ, TOTG, HbA1c) alterado + repetição confirmatória de GJ ou HbA1c OU 2 exames diferentes alterados na mesma ocasião OU Glicemia casual maior ou igual a 200 + presença de sintomas. Para o pré-diabetes, a presença de um exame alterado dentro dos valores estabelecidos já indica a condição de pré- diabetes. Tratamento: ✓ Perca de peso, melhora dos hábitos alimentares, prática de exercícios físicos regulares, controle de tabagismo e alcoolismo; ✓ Manejo de comorbidades como Síndrome Metabólica e complicações como neuropatia, retinopatia ou nefropatia; ✓ Controle da glicemia com hipoglicemiantes orais e/ou insulinoterapia (ver outro resumo).