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Disciplina: Didática Aula 3: Correntes pedagógicas liberais Apresentação Nesta aula, apresentaremos as tendências pedagógicas liberais que se dividem em tradicional, escola nova e tecnicismo, sendo importante compreender porque esses três modelos foram agrupados dentro da perspectiva liberal de ensino. Além disso, destacaremos para cada uma dessas tendências, a função da escola, como a ela se organiza, o papel do professor e do aluno, a relação aluno-professor, os pressupostos da aprendizagem, os objetivos educacionais, a metodologia e a avaliação escolar. Objetivos Diferenciar as tendências pedagógicas liberais de ensino; Identificar os pontos comuns entre as tendências liberais de ensino; Avaliar o sentido da didática nos diversos contextos sócio-históricos, se apropriando criticamente acerca dos modelos teóricos; Reconhecer porque as tendências liberais de ensino contribuem para a reprodução da sociedade; Reconhecer que a docência é um ato político e está articulada ao modelo de sociedade que se deseja contribuir para construir. Correntes pedagógicas liberais: tradicional, escola nova e tecnicismo Para início de conversa, é importante mencionar o porquê do termo liberal e, aí, nos reportamos a Dermeval Saviani que oferece a seguinte explicação: O termo liberal veio para justificar a nossa sociedade capitalista que é caracterizada pelo individualismo, pelo imediatismo, competitividade e o consumo. E é sob essas bases que as tendências pedagógicas em questão se alicerçam. Saviani, 2008. Sobre as tendências pedagógicas que poderão respaldar a nossa prática, vale dizer que elas não se excluem, se complementam e se nos perguntarem em que ou quem fundamentamos a nossa prática, talvez tenhamos dificuldades para responder, pois, ora podemos respaldar a prática em uma teoria, ora, em outra. Atenção Talvez possamos constatar o que está predominando nas ações dos profissionais da educação. Em outras palavras, queremos dizer que, ao observarmos uma aula de um determinado professor, podemos constatar como ele está trabalhando o conhecimento, assim como podemos verificar como esse professor se relaciona com seus alunos e os avalia; a propósito, como ele constrói suas questões de prova, por exemplo, e, a partir daí, ensaiar algumas considerações a respeito de sua prática docente. Para facilitarmos a aprendizagem sobre as tendências pedagógicas, optamos por sistematizá-las, apontando suas características, discutindo sobre os reflexos no espaço de sala de aula, lembrando, mais uma vez, que são apenas referências da prática e nunca solução definitiva sobre como ser professor. Sala de aula. (Fonte: Maroke / shutterstock) Você já imaginou se deparando com um “problema” no cotidiano escolar tal como a apatia dos alunos na sala de aula e, aí, procura no manual, na letra A de apatia, para saber como lidar com essa situação? Professora em sala de aula. (Fonte: ESB Professional / shutterstock) Pois é, as teorias oferecem um norte, iluminam a nossa prática, porém, não são redentoras, cabendo ao professor comparar dialeticamente a sua realidade, a sua prática às teorias estudadas e apresentar sua própria prática que não será uma prática qualquer, mas fundamentada porque estudada, consciente e refletida. Vamos, então, às tendências pedagógicas liberais que poderão respaldar as nossas ações? Modelo Tradicional Esse modelo tem como representantes principais Comenius (Pai da Didática Magna) e Herbart (Pai da Pedagogia Tradicional) e, conforme já deve ter sido mencionado em aulas anteriores, nesse caso, o professor é o centro do processo de aprendizagem; ele detém o poder do conhecimento. Antes de aprofundarmos nossos estudos nesse modelo de abordagem, vejamos o vídeoclipe da música Another Brick in the Wall (Parte II), do grupo Pink Floyd: Pink Floyd -The Wall (legendado). https://www.youtube.com/embed/2Fafmrv_kMA De acordo com o que acabamos de ver no vídeo da sessão anterior, no modelo tradicional, o aluno é considerado “sem luz”. O conhecimento é transmitido vertical e hierarquicamente do professor para o aluno que recebe, passivamente, uma massa de informações para arquivar em sua mente. Professora ensina; alunos anotam. (Fonte: Olga1818 / shutterstock) Para Libâneo (2013), na Pedagogia tradicional, prepondera a ação de agentes externos na formação do aluno. A transmissão do saber é constituída na tradição e nas grandes verdades acumuladas pela humanidade. O ensino é compreendido como um repasse de ideias do professor para a cabeça do aluno; os alunos devem compreender o que o professor transmite, mas apenas com a finalidade de reproduzir a matéria transmitida. Com isso, a aprendizagem se torna mecânica, automática, não mobilizando a atividade mental, a reflexão e o pensamento independente e criativo dos alunos. Comentário Talvez, aqui, possamos identificar um dos porquês dessa abordagem ser incluída nas pedagogias liberais de ensino, pois, como o aluno não pode questionar seu professor, ele não exercita a cidadania crítica; a ciência não é desvelada, desmistificada e o aluno, por sua vez, tem que aceitar o que está posto e se adaptar ao sistema, se desenvolvendo intelectual e moralmente. Diante disso, quando o conhecimento é determinado como verdade absoluta, não se abre espaço para a discussão, para o debate, para a participação dos alunos. Como então formar esse aluno participativo na sociedade? Vejamos a charge a seguir: Charge sobre educação tradicional. Fonte: © 2012 — Curso Múltiplos Saberes <https://cursomultiplossaberes.wordpress.com/2012/07/15/atividade- sobre-a-charge/charge-2-2/> . Diante da charge, podemos perceber que a escola tradicional está contribuindo, apenas, para reproduzir o sistema, a estrutura social vigente, pois esse aluno cidadão é condicionado a acreditar que os fatos são inexoráveis, imutáveis. Paulo Freire criticou a Pedagogia tradicional, denominou de educação bancária, enciclopedista, conteudista. Ao aluno não é possível despertá-lo sobre o sentido do aprendizado. Quando há questionamento sobre o porquê de aprender tal conteúdo, muitas vezes, o professor tradicional responde que é porque cairá na prova ou porque está no programa, mas, o porquê mesmo, o sentido da matéria, esse professor, talvez, nem saiba responder, pois, igualmente, foi educado pelo método reprodutor, assumindo a condição de mero repassador de informações. Normalmente, se prendem aos livros didáticos, repassando o conteúdo, o conhecimento como se fosse seu e com essa prática, não estimula a dúvida, a busca de novas respostas. O professor, nesse caso, sabe o que é certo e errado e impõe que os alunos copiem, memorizem e apresentem mais tarde, nas provas, as respostas determinadas por ele. Pedagogia tradicional. (Fonte: ESB Professional / shutterstock) Quem nunca sentou nas primeiras fileiras para não perder o que o professor fala, escrevendo em seu caderno o conteúdo? Quem nunca desejou gravar a aula do professor para reproduzi-la posteriormente? A propósito, seu professor permite que grave sua aula? Sim, Não? Qual o motivo? Que tal investigar? Na verdade, são muitos questionamentos, muitas respostas que podemos buscar e identificar se o professor respalda a prática predominantemente na Pedagogia tradicional. Quer ver? Como o professor trabalha o conhecimento? Ele escreve no quadro? Como é o quadro do professor? “Ele constrói o quadro ou traz o quadro pronto?” Ele permite que você faça perguntas? Como ele reage quando o aluno faz uma pergunta sobre um determinado assunto que, aparentemente, não está relacionado ao conteúdo pensado pelo professor para trabalhar na aula naquele dia? Ele dá atenção ao aluno ou responde que o assunto não está previsto em seu roteiro? Exemplo de prática respaldada na Pedagogia tradicional A professoraCarolina ensina a seus alunos do sexto ano sobre o continente europeu, os países e suas capitais. Professora Carolina apresenta conteúdo no quadro. (Fonte: DarkBird / Shutterstock) Cartão postal de Paris. (Fonte: LiliGraphie / Shutterstock) Mariana, aluna da professora Carolina, tinha recebido um cartão-postal enviado de Paris por sua madrinha. Como estava estudando sobre aquela e outras cidades da Europa, Mariana leva o cartão para mostrá-lo à professora e a seus colegas. Logo no início da aula, Mariana tenta mostrar o cartão, mas a professora não permite a interrupção. Mariana em sala de aula. (Fonte: Syda Productions / Shutterstock) A professora não permite interrupções. (Fonte: DarkBird / Shutterstock) A professora Carolina avisa: “Nosso assunto hoje não é sobre pontos turísticos, Mariana. Por favor, guarde e pegue seu material para copiar o conteúdo da aula.” Mariana fica muito constrangida, guarda seu cartão dentro de um livro, e não consegue prestar atenção à aula. Mariana fica frustrada. (Fonte: Syda Productions / Shutterstock) A aula foi planejada antecipadamente, sem aberturas. (Fonte: Aaron Amat / Shutterstock) A professora tinha um roteiro previamente planejado que dizia: “no dia X fale sobre as capitais dos países da Europa”. Carolina estava refém do planejamento, não admitindo novas possibilidades, tornando sua prática inflexível. Certamente, esse foi o modo que aprendeu -- reproduzir o modelo alheio. No livro didático usado pela turma, um dos capítulos era sobre a Europa, com o seguinte objetivo: “levar os alunos a identificar as capitais dos países da Europa”. Carolina seguiu o planejamento sem permitir interrupções. Professora segue o conteúdo do livro didático. (Fonte: Slobodan Djajic / Shutterstock) Leitura Veja, agora, o que conta Rachel de Queiroz: Memórias de menina <galeria/aula3/anexo/doc01.pdf> . Escola Nova: denominada de ativa, progressiva ou progressivista, renovada Esse modelo pedagógico tem como um dos representantes brasileiros Anísio Teixeira que foi aluno de J. Dewey e, por conta disso, Anísio teve uma formação respaldada na cultura americana, do aprender fazendo, do educar para a ação, do empreendedorismo, diríamos hoje. De fato, foi uma evolução em relação ao modelo tradicional, pois o aluno passaria a estudar, a aprender “colocando a mão na massa”, vendo no plano concreto o conceito abstrato, generalizado. Por esse motivo, também podemos dizer que J. Piaget representa esse modelo, uma vez que trata dos estágios cognitivos que vão desde o plano concreto – quando a criança precisa ter o objeto “ao vivo e a cores” em suas mãos – até que desenvolva a representação mental do mesmo. Crianças pesquisam localidades em um globo terrestre. (Fonte: wavebreakmedia / Shutterstock) Um modelo bastante interessante para se trabalhar disciplinas de ciências naturais, fazendo experimentos. (Fonte: wavebreakmedia / Shutterstock) Na Escola Nova o professor passará a estreitar os vínculos com o aluno, se relacionando de forma mais amigável, centralizando o ensino no educando, permitindo, ao mesmo, mais espontaneidade e comportamento ativo. O aluno pode participar de aulas práticas, em laboratórios, experimentação, soluções de problemas, aulas passeio, na horta, aulas lúdicas, aprender fazendo, ou seja, constatando, na prática, o conceito estudado teoricamente. Em outras palavras, se debruçando sobre o objeto de estudos, em uma relação indivíduo-organismo/meio. Vejamos a charge a seguir: Charge sobre processo de avaliação. Fonte: https://bit.ly/2FBXyZh <http://escolaabertaceteb.blogspot.com.br/2015/04/voce- conhece-o-real-significado-da.html> Você percebeu a ironia da charge ao afirmar que o processo de avaliação seria justo? Diante dessa necessidade de mudança no processo de avaliação, na Escola Nova, o professor, por sua vez, acompanha o ritmo cognitivo do aluno, volta-se para as potencialidades e as lacunas cognitivas. Observe que a ênfase ainda recai sobre o indivíduo e seu ritmo, mesmo que trabalhem em grupo e, quanto a isso, não houve alteração em relação ao modelo tradicional. No modelo escolanovista, a ênfase recaía, então, sobre o indivíduo, mesmo que o professor incentivasse o trabalho em grupo em sala de aula. Os alunos que conseguissem se enquadrar nesse sistema por apresentar domínio do conhecimento científico seriam aprovados. Os demais seriam alvo de reprovação. Exemplo de prática respaldada no modelo pedagógico escolanovista Ao estudar o conceito de fotossíntese, as partes de um vegetal, o professor Maurício orienta os alunos para que plantem um feijão no algodão. Quem de nós nunca plantou um feijãozinho no algodão para constatar o fenômeno da fotossíntese ou identificar as partes do vegetal? Projeto Fenômeno da fotossíntese. (Fonte: Levent Konuk / Shutterstock) Veiga (2007) se pronuncia, quanto a organização geral da Escola Nova, assinalando que é um laboratório de Pedagogia prática. Procura desempenhar o papel de explorador ou iniciador das escolas oficiais. A Escola Nova está situada no campo, porque este constitui o meio natural das crianças que oferece possibilidades para empreendimentos simples. A Escola Nova organiza trabalhos manuais, rurais, de jardinagem, trabalhos livres; que tenham uma finalidade educativa e sejam de utilidade individual ou coletiva, que assegurem o espírito inventivo. 01 Em matéria de educação intelectual, a Escola Nova procura abrir o espírito por uma cultura geral da capacidade de julgar, mais que por acumulação de conhecimentos memorizados. O processo de aprendizagem se dá por meio da aplicação do método científico, da observação, hipótese, comprovação, lei. 02 O ensino será baseado na experiência. A aquisição dos conhecimentos resulta de observações pessoais, visitas a fábricas, prática de trabalho manual. A teoria vem sempre depois da prática, nunca a precede. 03 A Escola Nova está baseada na atividade pessoal da criança. A Escola Nova deve ser um ambiente belo, como desejava Ellen Key . A ordem e a higiene são as primeiras condições, o ponto de partida. Esse é um modelo de ensino que mobiliza a motivação pessoal, desperta o interesse do aluno, pois ele não ficaria mais parado, sentado para aprender através da memorização; mas, por sua vez, é importante ressaltar, à luz de educadores progressistas, que essa prática da constatação de fenômenos não garante visão crítica de mundo, sobre o que se está estudando, não garante formação emancipada socialmente e transformadora. O aluno apenas constata, entretanto, não é instigado a relacionar o que aprende aos fatos, à realidade. Ele estuda as partes do vegetal, mas, não discute sobre a fome, a miséria, a desigualdade social e, por vezes, se não for despertado por alguém, professores ou outras pessoas de seu convívio, acreditará que os fatos são inexoráveis. Quer ver outro exemplo? Aulas de culinária, aprender a ser prendado para corresponder às necessidades da sociedade: o papel de filha, de mãe. A discussão sobre o papel da mulher na sociedade fica para os professores críticos e progressistas. Meninas aprendem a cozinhar em sala de aula. (Fonte: Arina P Habich / Shutterstock) Saiba mais A educação, nessa perspectiva escolanovista, pragmatista, da prática pela prática, imediatista, com um fim em si mesmo, não é desvelada, não funciona como instrumento de libertação da condição de opressão. Por mais que as intenções de Anísio Teixeira e companheiros tenham sido de democratizar a escola pública, oferecendo um ensino de qualidade aos pobres para que tivessem melhores condições de vida; há notícias de que seus projetos de educação foram engavetados enquanto assumia cargos públicos. 1 Era um idealista, mas a história não aconteceu, conforme Anísio sonhava: uma escola pública, de qualidade em que o aluno pudesse ter acessoà alimentação saudável, orientação para os estudos, acesso a recursos didáticos, professores capacitados. Contudo, não podemos afirmar que os professores de escolas públicas não estejam aptos a exercer a profissão. Bons e maus profissionais existem em qualquer domínio. É preciso lembrar que são professores concursados e as razões do comprometimento ou não deles com a formação das novas gerações são diversas, difícil de julgá-las. O objetivo das escolas pautadas nessa perspectiva “renovadora” ainda era fazer com que o aluno se desenvolvesse intelectualmente, apresentasse domínios cognitivo, afetivo e psicomotor e se ajustasse, se adaptasse socialmente. Importante reforçar que esse modelo pedagógico foi influenciado pela Psicologia que, por sua vez, recebeu influência das Ciências Naturais, o que ficou evidente, a partir dos nossos estudos sobre os pensadores de 1700 a 1900, na medida em que enfatizavam os aspectos biológicos. Nesse sentido, recebeu críticas de educadores contemporâneos, a partir da década de 1960, considerados progressistas, pois, a Escola Nova continuou a reproduzir a estrutura social vigente, a acentuar a desigualdade social. Sabe por quê? Porque o aluno, o indivíduo, era o único responsável por seu sucesso ou fracasso escolar e na vida, por não possuir dons naturais, aptidão, capacidade intelectual que lhe permitisse dominar os conteúdos e obter a aprovação no final do período letivo. Vale destacar, aqui, para reforçar a presença da Psicologia na Pedagogia, as influências de Francis Galton, primo de Darwin, bem como de Binet, ambos da área médica, no sistema educacional brasileiro. O aluno era o único responsável por seu sucesso ou fracasso. (Fonte: shapovalphoto / Shutterstock) Enquanto Galton, foi pioneiro na Psicometria — área da Psicologia que se vale da Estatística, da quantificação para identificar um modo de existência do sujeito, assim como o QI (Coeficiente Intelectual) e as aptidões (habilidades inatas) através de testes psicológicos; Binet foi criador da I Escala de Inteligência para Crianças. Seu objetivo era fazer uma previsão, a partir da aplicação de testes de raciocínio em uma amostra significativa de sujeitos, sobre o rendimento escolar. Uma faixa de normalidade seria traçada mediante a média apresentada pelos indivíduos testados. Aqueles que apresentassem resultados, abaixo da faixa de normalidade, a previsão era de que fracassaria na escola. Essa prática da testagem, no campo da Psicologia, veio a se refletir no sistema de ensino com a ampla disseminação de provas e testes, aproximadamente, após a década de 1940. Os alunos que não apresentassem resultados na média ou acima ficariam reprovados, sendo excluídos do sistema. Com esse discurso, não estamos afirmando que não se deve aplicar testes e provas, mas, que, talvez, possamos lançar mão de outros instrumentos e ter como expectativa que o aluno mobilize competências, saberes que ultrapassem a questão dominar conhecimentos. Alunos fazem prova escrita em sala de aula. (Fonte: AimPix / Shutterstock) Atenção Veja você quando participa dos fóruns. Eis, aí, um espaço para avaliação: se o aluno participa dos fóruns, se a participação é superficial, se o aluno mostra autonomia nas respostas, se ele faz cópia de sites, se escreve qualquer coisa no último dia do prazo. Avaliar é muito complexo, mas, estamos convidando você, professor em construção, para que pense na formação integral, ou seja, um aluno que apresente domínio cognitivo, afetivo e psicomotor, e, acima de tudo, atitude diante da vida, da sociedade, que seja um cidadão consciente e com desejo de contribuir para a construção de uma sociedade mais digna e feliz de se viver. Isso não significa que tenhamos que aprovar todos os alunos, que essa atitude é esperada do professor, mas, que, talvez, prestássemos atenção em outros saberes, igualmente, formativos, relevantes na formação do sujeito, que vão além do domínio cognitivo (domínio das ciências). O que adianta um aluno gabaritar uma prova de Biologia e não demonstrar consciência ecológica, nem o respeito pelos colegas? Vamos avaliar o conhecimento, mas, ir além, incentivando a formação de valores. Tecnicismo A Pedagogia Liberal Tecnicista surgiu nos Estados Unidos na segunda metade do século XX, chegando ao Brasil entre as décadas de 1960 e 1970. Nessa concepção de ensino, o homem é considerado produto do meio, sendo resultado das consequências das forças existentes em seu ambiente. O Tecnicismo acredita que a consciência do homem é formada pelas relações acidentais estabelecidas com o meio e devem ser controladas cientificamente através da Educação. Tendência inspirada na Teoria Behaviorista, comportamental de Skinner, essa abordagem acabou sendo imposta às escolas pelos organismos oficiais por ser compatível com a orientação econômica, política e ideológica do regime militar vigente. De acordo com a Pedagogia Liberal Tecnicista, a Educação deve atuar para o estabelecimento e a manutenção da ordem social vigente, se articulando diretamente com o sistema capitalista de produção. Diante disso, é possível compreender porque a Pedagogia Tecnicista emprega a ciência da mudança do comportamento, se apoiando então, na concepção comportamentalista (estímulo/resposta) que privilegia resultados rápidos e sem espaço para reflexões críticas. Aluno de escola técnica utiliza ferramentas em sala de aula. (Fonte: Golubovystock / Shutterstock) Atenção Segundo essa perspectiva educacional, o comportamento desejado é fixado pela recompensa. A instrução programada enfatiza a importância de uma definição precisa do que o aluno deverá aprender e a importância de estruturar cuidadosamente os materiais a serem utilizados (apostila) para o aluno aprender exatamente o que se quer que ele aprenda. A técnica da instrução programada foi responsável pela ênfase que o processo ensino-aprendizagem passou a dar aos seguintes elementos: Os princípios da técnica de instrução programada são os seguintes: Objetivos; A matéria é desdobrada em pequenas informações; Aprendizagem em ritmo próprio; Cada informação apresentada ao aluno exige uma resposta dele; Concentração da atenção do aluno em uma quantidade limitada de material (módulo); O acerto ou o erro da resposta do aluno é reconhecido por ele imediatamente; Respostas dos alunos a cada momento (feedback imediato); Cada informação deve estar perfeitamente ordenada, formando conjuntos ou programas com fins específicos. Oportunidade para saltar partes do programa que o aluno já sabe e para repetir partes do programa em que tem mais dificuldades. Com isso, ainda hoje, predomina nos cursos de formação docente, o uso de manuais didáticos de cunho tecnicista, de caráter meramente instrumental. A didática instrumental se caracteriza pela racionalização do ensino, o uso de meios e técnicas, a otimização do tempo. O professor é um administrador e executor do planejamento, o meio de previsão das ações a serem executadas e dos meios necessários para se atingir os objetivos. Boa parte dos livros didáticos, em uso nas escolas, são elaborados com base na tecnologia da instrução. O sistema de instrução se compõe das seguintes etapas: a) especificação de objetivos instrucionais operacionalizados; b) ensino ou organização das experiências de aprendizagem; c) avaliação dos alunos relativa ao que se propôs nos objetivos iniciais (LIBÂNEO, 2013). Comentário Orientados por uma concepção mecanicista de ensino, os professores brasileiros que cursaram o Magistério nas décadas de 1960 e 1970, aprenderam que os planejamentos e os planos de aula deveriam estar centrados nos objetivos operacionalizados, e a metodologia de ensino deveria utilizar estudos dirigidos, planejamentos bem estruturados e recursos tecnológicos e audiovisuais, que faziam transparecer a chegada da modernidade noambiente escolar. Na verdade, visavam a escamotear a intenção primeira da escola: servir ao modelo socioeconômico vigente. Esse modelo foi considerado um retrocesso educacional, uma vez que, na década de 1960, já se cogitava a respeito de uma educação libertadora com Paulo Freire. Veio no bojo do Regime Militar a partir do acordo MEC/USAID — Agência Internacional de Desenvolvimento — em que o currículo escolar deveria se enquadrar aos princípios americanizados, visando à preparação do aluno para o mercado de trabalho. Por outro lado, é preciso pensar nos objetivos, no que pretendemos alcançar. Se queremos respostas imediatas, talvez, a proposta adequada seja essa. Exemplo: quando desejamos nos preparar para concursos públicos. Exemplo de prática respaldada no modelo pedagógico tecnicista Cursos de idiomas, Kumon, Senai, Sesc, Senac, escolas técnicas, politécnicos, cursos de curta duração, modalidade do ensino à distância quando os alunos realizam exercícios de fixação e o feedback é imediato, ou seja, de forma rápida o aluno sabe que errou ou acertou. Nesses casos, em geral, o conteúdo é controlado pelo professor que assume o papel de instrutor, tutor. A relação é de causa e efeito; o ensino é controlado pelo meio, esperando que o aluno apresente a resposta desejada. São cursos por módulos em que os alunos só passam para o segundo módulo até que sejam aprovados no primeiro, sendo o conteúdo fragmentado, não articulado e há a presença do condicionamento, visando exclusivamente à aprovação, à obtenção do título. Aluna estuda sozinha em sala de aula. (Fonte: GaudiLab / Shutterstock) Professor utiliza projeção de telas em sala de aula. (Fonte: VladKol / Shutterstock) Sérgio, professor de Ensino Médio profissionalizante, visando a “dinamizar” e a “garantir” a aprendizagem dos alunos, resolveu trabalhar os conhecimentos referentes às doenças sexualmente transmissíveis, projetando no data show os tipos existentes e a forma de prevenção e tratamento, mas sem discutir suas implicações sociais. No planejamento do professor, constavam apenas os objetivos específicos, comportamentais que os alunos deveriam apresentar, dentre eles: Identificar as DSTs; Comparar as formas de prevenção; Diferenciar os tipos de tratamento. Em seguida, o professor fez um estudo dirigido, colocando o nome da doença e solicitando que os alunos apresentassem a forma de prevenção e tratamento, conforme sua instrução programada, uma técnica de ensino com base na teoria do reforço. Aqueles que acertaram tudo, ganharam o direito de manusear o computador da escola e aqueles que não acertaram, ficaram na sala de aula. Sistematizando informações sobre os modelos pedagógicos estudados Tradicional Escolanovista Tecnicista Papel da escola Preparação intelectual e moral dos alunos para assumir seu papel na sociedade. Porém, para assumir seu papel na sociedade como? Preparação intelectual e desenvolvimento mental dos alunos, atendendo-os em suas necessidades individuais, ajustando- os à sociedade. Escola proclamada para “todos”. Adaptação social. Modelar o comportamento humano através de técnicas específicas; manter a ordem social; preparar para o mercado de trabalho. Organização da escola Funções claramente definidas e hierarquizadas. Normas disciplinares rígidas. Funções se confundem (autoridade disfarçada); afrouxamento das normas disciplinares. Modelo empresarial aplicado à escola; divisão entre planejamento e execução. Currículo organizado baseado em modelos americanos. Professor É o transmissor dos conteúdos aos alunos. É o facilitador da aprendizagem, o auxiliador no desenvolvimento “livre” da criança. É o técnico, tutor que aplica um conjunto de meios que garantem a eficiência do ensino, controlando o resultado. Aluno Um ser passivo que deve assimilar os conteúdos transmitidos pelo professor. Aluno educado que deverá dominar o conteúdo cultural universal Um ser “ativo”, centro do processo ensino- aprendizagem. Um elemento para quem o material é preparado, devendo ser eficiente, produtivo, técnico. transmitido pela escola. Relação aluno-professor Predomina a autoridade do professor que exige atitude receptiva dos alunos e impede qualquer comunicação entre eles. Relação “democrática”, autoritarismo diluído na fisionomia de camaradagem. Relação objetiva onde o professor transmite informações e o aluno vai fixá-las, seguir o comando externo. Pressupostos de aprendizagem Aprendizagem receptiva e mecânica, sem considerar particularidades, o contexto. Aprendizagem baseada na motivação e no esforço pessoal e no estímulo do meio. Aprendizagem baseada na eficiência, no desempenho, na administração, controle do tempo; aprendizagem individualizada. O ensino é um processo de condicionamento. Objetivos educacionais Obedecer a sequência lógica dos conteúdos, baseados em documentos legais. Ênfase nos objetivos específicos. Desenvolver a capacidade mental do aluno e a atividade prática. Específicos, operacionalizados a partir de classificações (verbos precisos). Conteúdos escolares/programáticos Selecionados a partir da cultura universal acumulada. Organizados em disciplina, quantidade de conhecimentos repassados como verdade absoluta. Conteúdos fragmentados e isolados do contexto. Trabalhados a partir da experiência concreta do aluno. Conteúdo isolado. Informações, princípios, leis estabelecidas, ordenados e estruturados em uma sequência lógica e psicológica por especialistas (conteudista/mentor, tutor da disciplina). Método Exposição verbal da matéria, centrado no professor, Solução de problemas, desafios cognitivos, Instrução programada, módulos. Ênfase nos recursos audiovisuais, TICs, apostilas. leituras, cópias, ditados, exercícios de fixação; uso excessivo do quadro que é previamente determinado, pronto e não construído conforme o andamento da aula e a participação dos alunos. pesquisa, experimentos, experiência, jogos, trabalhos em grupo. Estudo do meio natural e social. Registro empírico. Fundamentado na teoria comportamental — recompensa e punição (estímulo-resposta) – S – R. Transmissão de informações precisas, objetivas, rápidas. Tele- educação, EAD. Avaliação Valorização dos aspectos cognitivos com ênfase na memorização da matéria, ênfase na quantidade de informações assimiladas, ênfase no produto final, na classificação. Valorização dos domínios cognitivo, afetivo e psicomotor. Visa a resultados, à produtividade, ao alcance dos objetivos específicos, à mudança de comportamento — eliminação de resposta/comportamento inadequado. Atividade Afim de reforçarmos o que estudamos até aqui, vamos fazer uma atividade? Observe e analise o fenômeno educativo representado pela gravura abaixo, à luz das teorias estudadas, apontando a pedagogia que está predominando na prática docente. Referências LIBÂNEO, J. C. Didática. São Paulo: Cortez, 2013. QUEIROZ, Cecília; MOITA, Filomena. Fundamentos sócio-filosóficos da educação: as tendências pedagógicas e seus pressupostos. Campina Grande: UEPB; Natal: UFRN, 2007. SAVIANI, Dermeval. História das ideias pedagógicas no Brasil. Campinas: Autores Associados, 2008. VEIGA, Cynthia Greive. História da educação. São Paulo: Ática, 2007. Próximos Passos • As tendências pedagógicas progressistas. Explore mais Leia o texto As tendências pedagógicas e seus pressupostos <http://www.ead.uepb.edu.br/ava/arquivos/cursos/geografia/fundamentos_socio_fi losoficos_da_educacao/Fasciculo_09.pdf> .
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