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APG S8P2: ONDE DÓI??!!! Objetivos de estudo: • Estudar a fisiopatologia (etiologia, classificação e manifestações clínicas) do abdome agudo. • Conhecer as complicações do abdome agudo. • Entender as formas de diagnóstico do abdome agudo. ABDOME AGUDO É uma situação emergencial, com aparecimento abrupto de sintomas abdominais, em geral grave, sugerindo uma evolução potencialmente fatal, que leva o paciente a procurar a urgência e requer tratamento imediato, clínico ou cirúrgico. Para alguns autores, é uma dor abdominal intensa com duração menor ou igual a 5 dias. Nem toda dor abdominal é um quadro de abdome agudo!!! Falso abdome agudo: o paciente tem dor abdominal, mas a origem do problema é extra- abdominal (ex: uremia aguda ou cetoacidose diabética). Diante desse quadro, a essência da abordagem ao paciente é realizar o diagnóstico de forma precoce o mais rápido possível!!! Isso pode determinar o prognóstico e evitar sequelas irreversíveis. Etiologia: Causas mais comuns: apendicite aguda, colecistite, pancreatite e diverticulite. Peritonite aguda: pode ser resultante da ruptura de uma viscera oca ou complicação de doença inflamatória intestinal ou malignidade. Eventos vasculares: isquemia mesentérica e ruptura do aneurisma da aorta abdominal. Causas obstétricas e ginecológicas: ruptura da gravidez ectópica e torção ovariana. Condições urológicas: cólica ureteral e pielonefrite – dor abdominal aguda. Obstrução do intestino delgado: alguns autores incluem. Recém-nascidos: enterocolite necrosante, volvo de intestino médio. Abdome agudo pediátrico: causa mais comum é a apendicite. Classificação: 1. Inflamatório 2. Obstrutivo 3. Perfurativo 4. Vascular ou isquêmico 5. Hemorrágico Falso abdome agudo: síndromes coronarianas, porfiria, doenças reumatológicas, cetoacidose diabética, uremia aguda, herpes-zóster etc. Avaliação: Características peculiares que podem ser sugeridas no momento da anamnese e do EF. Dados relevantes: início dos sinais e sintomas, características semiológicas da dor, febre, náuseas, vômitos, distensão abdominal, ruídos hidroaéreos intestinais, hematêmese ou melena (vital importância!). Dor: principal sintoma no abdome agudo e a investigação das suas características pode orientar a etiologia do quadro. Pode ser classificada em 3 tipos: visceral, somática e referida. Dor visceral: geralmente mal localizada, ao longo da linha média, causada por distensão ou estiramento dos órgãos. Costuma ser a primeira manifestação das afecções intra-abdominais, principalmente no abdome agudo inflamatório. Dor somática: mediada por receptores ligados a nervos somáticos existentes no peritônio parietal e na raiz do mesentério. Responsável por sinais propedêuticos, como a contratura involuntária e o abdome “em tábua”. Dor referida: decorrente da convergência do corno posterior da medula, de nervos provenientes das vísceras e da pele - sensação dolorosa superficial nesses quadros. Febre: manifestação comum, geralmente discreta nas fases iniciais de afecções inflamatórias e infecciosas, progredindo nas fases mais avançadas. O exame físico é imprescindível para o diagnóstico. O paciente deve ser examinado em decúbito dorsal, com o abdome totalmente descoberto. Devemos observar a região do abdome, o aumento de volume, os movimentos e as alterações na epiderme. As cicatrizes abdominais e aderências podem sugerir a etiologia. 1. ABOME AGUDO INFLAMATÓRIO Envolve afecções intra-abdominais que geram quadro de peritonite secundária a processo infeccioso ou inflamatório. É caracterizado por dor lenta, insidiosa e progressiva no início (geralmente com intervalo longo entre o começo dos sintomas e a ida à emergência). Está relacionado com a reação do peritônio e as modificações do funcionamento no trânsito intestinal. O agente inflamatório ou infeccioso atinge o peritônio, causando irritação (que é diretamente proporcional ao estágio do processo etiológico) e instalação progressiva do íleo paralítico localizado ou generalizado, justificado pela Lei de Stokes: “Toda vez que a serosa que envolve a musculatura lisa sofre irritação, esta entra em paresia ou paralisia” A resposta do peritônio parietal (cerebroespinal) se exterioriza: a dor é mais bem localizada e há contratura da musculatura abdominal localizada ou generalizada, contínua, progressiva e piora com a movimentação. A dor abdominal secundária à irritação do peritônio visceral (autônoma) é mal localizada e se origina pela distensão e contração das vísceras. Essa dor pode ser desencadeada pelo inicio de uma doença recente (ex: apendicite aguda) ou pela agudização de uma doença crônica (ex: colecistite aguda por colelitíase ou diverticulite do sigmoide por doença diverticular dos colos). Além da dor abdominal, podemos observar: náuseas e vômitos, febre, alterações no hábito intestinal, sintomas urológicos. Apendicite aguda: principal causa de abdome agudo inflamatório. Obstrução da luz apendicular por fecálitos, tecidos linfoides hiperplásicos, cálculos ou parasitas – após a obstrução instalada, a pressão intraluminal aumenta, causando isquemia e processo inflamatório transluminal. Segue-se a proliferação bacteriana, que se instala em toda a parede apendicular, podendo ocorrer gangrena e perfuração em até 24h. Os sinais sugestivos de apendicite aguda são: • Sinal de Blumberg • Sinal de Rovsing • Sinal de Lapinsky Na ausculta, há redução dos ruídos hidroaéreos (mais evidente quanto mais avançada a fase em que se encontra a apendicite aguda. Colecistite aguda: resulta da obstrução do ducto cístico por cálculo impactado no infundíbulo, o que torna a vesícula inflamada e distendida. Na inspeção observamos posição antálgica ou discreta distensão. Palpação: sensibilidade no hipocôndrio direito, defesa voluntaria ou não e mesmo plastrão doloroso. Em 25% dos doentes a vesícula é palpável e dolorosa. Sinal de Murphy: comprime-se o hipocôndrio direito e solicita ao paciente que realize uma inspiração profunda. Na vigência de colecistite, a irritação peritoneal fará o paciente cessar a respiração. À percussão, o paciente apresenta dor ao nível do hipocôndrio direito, consequente à irritação do peritônio visceral, o mesmo ocorrendo com os ruídos hidroaéreos que se encontram diminuídos ou ate normais. Pancreatite aguda: processo inflamatório do pâncreas, geralmente de natureza química, provocado por enzimas produzidas por ele próprio e que tem como resultado a autodigestão da glândula. (ex: litíase biliar, etilismo agudo e hipertrigliceridemia). Dor, em faixa, no abdome superior e no dorso (50% dos pacientes). Sinais de toxemia: febre e alterações circulatórias (em quadros avançados). Manchas equimóticas periumbilicais (Sinal de Cullen) ou nos flancos (Sinal de Grey Turner) são secundárias à hemorragia peritoneal ou retroperitoneal. Trombose da veia esplênica é comum em pancreatite aguda grave. Dor e massa palpável consequentes do baço edemaciado. Diverticulite aguda: processo inflamatório do divertículo, resultado da ação erosiva de fecálito ou do aumento demasiado da pressão intraluminal, com consequente perfuração e peritonite. 2. ABDOME AGUDO OBSTRUTIVO Envolve afecções que dificuktam ou impossibilitam o trânsito gastrointestinal. É a segunda afecção abdominal aguda mais frequente. A obstrução do delgado é mais comum do que a do grosso. Pode ser classificado (tanto para auxiliar no diagnostico diferencial quanto na conduta terapêutica) em: Altas (acima da válvula ileocecal) e baixas; Funcionais (decorrentes de causas sistêmicas como fatores metabólicos ou infecciosos) e mecânicas (causas extrínsecas ao cólon); Simples e complicadas (sofrimento vascular). 3. ABDOME AGUDO PERFURATIVO Éuma das síndromes mais frequentes entre as urgências abdominais não-traumáticas. Resulta da peritonite secundária a uma perfuração de víscera oca com extravasamento de material na cavidade abdominal. A perfuração de vísceras ocas pode ocorrer devido a processos inflamatórios, neoplásicos e infecciosos do aparelho digestivo o (infecções por Salmonella tiphy, citomegalovírus, tuberculose intestinal etc.) ou a uso de medicamentos (antiinflamatórios). Pode ainda ser decorrente da ingestão de corpos estranhos, traumatismos e iatrogenias (procedimentos diagnósticos e terapêuticos). Ainda hoje, a mortalidade da perfuração visceral se encontra entre 8 e 10%. Em perfurações gástricas, a etiologia mais comum é a úlcera péptica perfurada, de modo que é comum o relato de uso de anti-inflamatórios não esteroides (AINEs) ou ácido acetilsalicílico. Quadro clínico: Independentemente da etiologia, o quadro clinico costuma ser semelhante. O paciente relata dor súbita e intensa, de início bem determinado. A difusão precoce da dor traduz a disseminação de gás e liquido gastrintestinal, que são bastante “irritantes” ao peritônio. A queixa de dor no ombro e no pescoço é do tipo irradiada, causada pela irritação do nervo frênico. Pode haver defesa localizada ou generalizada, a depender do tipo de perfuração; quando é bloqueada ou tamponada, pode existir dor localizada, sendo flácido o restante do abdome. Evoluções arrastadas cursam com sinais de septicemia. O quadro clínico é caracterizado por: • Intervalo curto entre o início da dor e a chegada ao serviço de emergência; • Dor súbita, de forte intensidade, com difusão rápida para todo o abdome; • Sinais de sepse, hipotensão ou choque estão freqüentemente presentes; • No exame do abdome, há sinais evidentes de peritonite, ausência de macicez hepática (sinal de Jobert – som timpânico à percussão devido à perda de macicez hepática do hipocôndrio direito pela interposição gasosa) e de ruídos hidroaéreos. A principal característica de abdome agudo perfurativo é o chamado abdome “em tábua”, com contratura generalizada. A intensidade dos sintomas e a gravidade do quadro clínico dependerão do local e do tempo de evolução da perfuração, do tipo de secreção extravasada e das condições do doente. Inicialmente, ocorre uma inflamação peritoneal de natureza química, principalmente nas perfurações altas do trato digestivo, seguida de invasão bacteriana secundária e progressivo processo infeccioso, com repercussões locais e sistêmicas. Em relação ao intestino grosso, a peritonite é séptica desde o início Sinal de Rigler: mais difícil de se observar, se refere à visualização, na radiografia de abdome, da parede gástrica ou intestinal pela presença de gás na cavidade abdominal (pneumoperitônio). A presença de gás dentro e fora da alça gera uma espécie de contraste que “desenha” a parede da alça. Sinal de Chilaiditi: interposição do cólon ou intestino delgado entre o fígado e o diafragma, podendo confundir-se com o pneumoperitônio. NÃO CONFUNDIR O SINAL DE RIGLER COM A TRÍADE DE RIGLER, QUE CAUSA OBSTRUÇÃO DE ALÇAS DELGADAS, PNEUMOBILIA E CÁLCULO BILIAR ECTÓPICO, SUGERINDO ÍLEO BILIAR. Grandes pneumoperitônios estão relacionados a perfurações colônicas. Uma série de parâmetros devem ser levados em consideração no diagnóstico e na avaliação do doente portador de abdome agudo perfurativo: • Peritonite química ou bacteriana; • Nível da perfuração; • Tempo de evolução da perfuração; • Manifestações sistêmicas ou abdominais exclusivas; • Perfuração bloqueada ou em peritônio livre; • Etiologia da perfuração. Todos os casos de abdome agudo perfurativo são cirúrgicos, variando a conduta de acordo com a origem da perfuração, as condições clínicas do paciente e o grau de contaminação da cavidade. 4. ABDOME AGUDO VASCULAR OU ISQUÊMICO É uma das formas mais graves entre as urgências abdominais, com índices de mortalidade de 46 a 100%. A variabilidade dos vasos envolvidos, a extensão do órgão acometido e os diferentes níveis de comprometimento do tecido resultam em uma infinidade de apresentações clínicas. A insuficiência vascular intestinal pode ser dividida em aguda (infarto intestinal) ou crônica (angina abdominal). (Irrigação sanguínea do intestino) Arcada de Riolano: arco anastomótico que comunica as artérias mesentéricas superior e inferior no nível do ângulo esplênico, área de maior suscetibilidade à isquemia nas ressecções colônicas. A aterosclerose, principal causa de isquemia crônica do intestino, tem como característica uma instalação lenta. Isso proporciona tempo para que haja acomodação da circulação colateral. De forma geral, a principal artéria responsável pela perfusão intestinal pode ser considerada a AMS; quando ocluída ou estenótica é a que mais freqüentemente causa sintomas de angina abdominal. Geralmente, a obstrução da AMI e/ou do tronco celíaco (TC) costuma ser mais bem tolerada. Cirurgias abdominais prévias, principalmente com ressecções intestinais, podem piorar o quadro de uma perfusão intestinal devido à perda de colaterais secundária às ligaduras dos ramos arteriais. Fisiopatologia: Quando ocorre a privação de oxigênio e nutrientes para o tecido manter o metabolismo e a integridade celular, há um aumento acentuado na atividade motora intestinal como resposta fisiológica a esse fluxo reduzido, resultando em aumento na demanda de oxigênio. À medida que a integridade capilar é comprometida, o intestino hemorragia e edemacia devido ao aumento da pressão hidrostática intraluminal, passando a comprometer mais ainda o fluxo sanguíneo. Produtos metabólicos tóxicos podem agravar essa lesão isquêmica. À medida que a barreira de proteção da luz intestinal se perde, as condições para translocação bacteriana e sepse aumentam. Podem ocorrer depressão cardíaca, choque séptico e insuficiência renal aguda como consequência dos mediadores vasoativos e das endotoxinas bacterianas liberadas na cavidade peritoneal, podendo levar o paciente a óbito antes da necrose completa da parede intestinal. Classicamente, diz-se que após seis horas de dor (isquemia) o tecido intestinal torna-se inviável, não se recuperando após a revascularização, visão esta que não é compartilhada por todos os autores. Vômitos, alteração nas características das fezes e distensão abdominal são sintomas freqüentes. A ausculta abdominal pode ser aumentada, nos casos de isquemia segmentar em que a porção acometida funciona como uma obstrução, ou diminuída, quando a extensão comprometida for muito extensa, não sendo assim de muito valor prático. O toque retal eventualmente traz como dado adicional sugestivo de necrose a presença de fezes com aspecto de “geléia de amoras”, conseqüência da necrose de regiões da mucosa intestinal. Quadro clínico: Depende do grau de oclusão arterial. Inicialmente, apresenta sintomas inespecíficos, com predomínio de dor abdominal tipo em aperto de forte intensidade e de difícil localização, sendo geralmente referida como surda ou em cólica. Caracteristicamente, há uma dissociação entre a queixa do paciente e o exame físico. O paciente relata dor de forte intensidade, enquanto o exame físico não mostra sinais de peritonite; isso acontece quando já há necrose intestinal instalada e significa prognóstico ruim. (SUSPEITAR DE ABDOME AGUDO VASCULAR!!) O paciente também pode apresentar angina abdominal, comum na isquemia crônica, que consiste em episódios de dor abdominal após as alimentações, levando o paciente a ter receio de comer e, consequentemente, perder peso. Essas dores abdominais melhoram espontaneamente, mas aumentam de frequência e intensidade. Presença de fezes mucossanguinolentas ao toque retal (em geleia de framboesa) – sugestivo deisquemia intestinal. Pacientes vasculopatas ou com histórico de arritmias cardíacas também apresentam risco maior para esse tipo de condição. 5. ABDOME AGUDO HEMORRÁGICO Casos de dor abdominal associados ao quadro clinico de choque hemorrágico por sangramentos intracavitários. As principais causas são gravidez ectópica rota e rotura de aneurisma da aorta abdominal. Suspeita-se de rotura de aneurisma da aorta abdominal quando o paciente apresenta frêmitos ou massas pulsáteis abdominais ou que já se saibam portadores de aneurismas. As causas da hemorragia intra-abdominal são numerosas e incluem doenças as mais variadas, como o traumatismo abdominal, a ruptura de aneurisma da aorta ou de alguma artéria visceral, as neoplasias malignas de vísceras sólidas, os processos inflamatórios erosivos (pancreatite e pseudocisto, por exemplo) e, nas mulheres, além dessas mencionadas, as afecções ginecológicas e obstétricas Quadro clínico: Dor abdominal súbita, mas de localização difusa. Taquicardia é o sinal mais precoce de alteração hemodinâmica, seguida de queda da pressão arterial, palidez, sudorese fria e agitação. Os sinais de Cullen e Grey Turner indicam hemorragia retroperitoneal. Sinal de Kehr: dor aguda no ombro devido à presença de sangue ou outros irritantes na cavidade peritoneal homolateral quando o paciente se encontra deitado e com as pernas elevadas. Sinal de Kehr no ombro esquerdo é sinal clássico de ruptura de baço. Toda mulher com hipótese diagnóstica de abdome agudo hemorrágico e em idade fértil admitida na emergência deve ser submetida a dosagem de beta-HCG e teste qualitativo. Esses exames podem confirmar a suspeita de gravidez ectópica.
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