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MÓDULO DOR ABDOMINAL – P4 | Luíza Moura e Vitória Neves APENDICITE AGUDA INTRODUÇÃO O apêndice cecal funciona como uma safe house para a flora comensal, facilitando a recolonização intestinal no caso de um clareamento da flora, como ocorre em diarreias aquosas importantes. Quando inflamado, causa a apendicite. ANATOMIA O apêndice cecal é uma extensão tubular localizada na convergência das três tênias cólicas no ceco, terminando em fundo cego. Situa-se próximo à válvula ileocecal e é considerado um divertículo verdadeiro do ceco. Sua posição no abdome pode variar muito, complicando e retardando o diagnóstico em um eventual processo inflamatório. O apêndice pode estar: Fossa ilíaca direita nos sentidos medial, lateral, anterior; Posterior ao ceco (retrocecal); e Também pode ocupar a região pélvica. Sua extensão média é de 9 a 10 cm de comprimento, seu diâmetro varia de 0,5 a 1 cm e é suprido arterial é feito pela artéria apendicular, ramo da artéria ileocólica. Apresenta abundante tecido linfoide nas camadas mucosa e submucosa da lâmina própria. Sua hiperplasia pode causar: Obstrução da luz do órgão, provocando inflamação aguda. Esse tecido linfoide sofre atrofia com o passar dos anos, acompanhando o declínio na incidência da apendicite com a idade. FISIOPATOLOGIA O apêndice do adulto é um longo divertículo, medindo aproximadamente 10 cm de comprimento, com origem na parede póstero- medial do ceco, cerca de 3 cm abaixo da válvula íleo-cecal. Apesar da base fixa, o restante do órgão é livre, podendo ocupar várias regiões da cavidade abdominal, como: Região pélvica; Fossa ilíaca esquerda; e Até mesmo o interior do canal inguinal. A!! Esta grande variação na topografia do apêndice tem muita influência na apresentação clínica. A apendicite resulta de um processo mecânico de obstrução da luz do apêndice. Esse processo é facilitado pela conformação do apêndice que possui um pequeno diâmetro com comprimento longo. MÓDULO DOR ABDOMINAL – P4 | Luíza Moura e Vitória Neves São inúmeros os agentes que podem obstruir a luz do apêndice, sendo os mais comuns: Fecálito; Hiperplasia linfoide; Corpo estranho; ou Tumor. A!! O apendicólito, fecálito calcificado, é menos frequente e está mais associado a perfuração e formação de abscesso. Outros agentes também podem obstruir: Parasitas, êmbolos sépticos, muco desidratado, torção, invaginação, doença de Crohn, processos infecciosos ileocecais ou peritoneais, como a tuberculose. A oclusão da luz do apêndice ocasiona um aumento da secreção de muco pela mucosa apendicular distal com aumento da pressão intraluminal, que pode alcançar até 65 mmHg. Prossegue com dificuldade de retorno venoso, estase, edema e diapedese. A distensão do apêndice (aumento de pressão) estimula fibras viscerais aferentes, entre T8 e T10, produzindo dor referida na região epigástrica ou periumbilical – mas pode ser dor difusa também. A dor referida não é intensa e geralmente pouco localizada, tendo duração de 4-6 horas. A!! Pode acompanhar essa fase: anorexia, náuseas e vômitos. Com a progressão do edema e o aumento da pressão intraluminal, excede a pressão de perfusão capilar, o que determina a isquemia da mucosa e surgimento de ulcerações levando à quebra da barreira mucosa e à invasão da parede do apêndice pela flora intestinal. Assim, causa proliferação bacteriana, com penetração mural do processo infeccioso. O processo infeccioso pode atingir a serosa e, depois, o peritônio parietal, ocasionando dor no quadrante inferior direito. Então a dor referida migra para a região do apêndice, geralmente na fossa ilíaca direita – associada à irritação peritoneal (Blumberg positivo). A!! A febre é baixa ou ausente; quando alta, sugere perfuração. A persistência da obstrução – e sem intervenção cirúrgica - leva à necrose do apêndice e à sua perfuração, com extensão da infecção para os tecidos periapendiculares. A!! O tempo decorrido desde o início da dor até a necrose e perfuração é de, aproximadamente, 48 e 70 horas, respectivamente. Pode haver bloqueio do processo por meio do grande omento e/ou de alças de delgado. Nesta fase, frequentemente há íleo paralítico regional, podendo evoluir em alguns casos para obstrução intestinal; A formação de abscesso pode ocorrer no local ou a distância. COMPLICAÇÕES DO DIAGNÓSTICO TARDIO O apendicólito pode migrar para outros sítios da cavidade abdominal, determinando a formação de coleções. Outras complicações possíveis são: Disseminação da infecção para a parede abdominal; Obstrução ureteral; Trombose venosa (sistema portal); e Abscessos hepáticos. Além disso, caso não ocorra a involução do processo inflamatório, pode resultar na: Formação de um “plastrão” pelo omento, alças intestinais, anexos e o cólon como mecanismo de defesa; ou MÓDULO DOR ABDOMINAL – P4 | Luíza Moura e Vitória Neves Evoluir com perfuração com contaminação da cavidade peritoneal, podendo progredir para uma peritonite generalizada. A!! A intervenção cirúrgica tardia aumenta o risco de complicações. ________________________________________ ATENÇÃO O uso indiscriminado de antibióticos pode alterar a evolução da doença, dificultando o diagnóstico precoce e aumentando a morbidade. Na maioria dos casos, a doença progride, necessitando de tratamento cirúrgico, mas, em alguns pacientes, pode ocorrer regressão espontânea, provavelmente decorrente da desobstrução luminal do órgão e da redução do processo inflamatório. Não são raros os casos de pacientes que relatam dor semelhante anterior com quadro de crise apendicular e resolução espontânea. DIAGNÓSTICO O diagnóstico de apendicite aguda é, geralmente, feito com base: História clínica; Exame físico; e Com o auxílio de alguns exames laboratoriais e/ou de imagem. A acurácia diagnóstica da avaliação clínica isolada da apendicite aguda é de 75 a 90%, mas depende da experiência do médico examinador. Pacientes com diagnóstico de apendicite aguda é considerado muito provável após a avaliação por médico experiente, podem ser encaminhados diretamente para a cirurgia. Porém, em alguns pacientes, o diagnóstico de apendicite aguda pode ser difícil e resultar em atraso cirúrgico, com aumento das taxas de perfuração. Os fatores associados ao aumento do risco de perfuração incluem: Sexo masculino; Aumento da idade; e Presença de 3 ou mais comorbidades. EXAMES LABORATORIAIS Os exames laboratoriais podem ajudar nos casos em que o quadro clínico não é clássico. Não existe nenhum exame laboratorial específico para o diagnóstico da apendicite. HEMOGRAMA O hemograma tem padrão infeccioso em até 80% dos casos, com: Leucocitose e desvio à esquerda. A!! Leucocitose >18.000/campo deve levar à suspeita de complicações, como perfuração ou formação de abscesso. Porém, pode ser normal nos quadros iniciais. Além disso, fornece informações sobre: Anemia e suas características, auxiliando o cirurgião para indicação de transfusão de sangue e cirurgia de urgência. EXAME DE URINA O exame de urina é importante no diagnóstico diferencial com a infecção urinária, porém, pode apresentar alterações em até 40% dos casos de apendicite aguda. A leucocitúria, particularmente sob forma de aglomerados de leucócitos, indica: ITU, porém, está presente em processos infecciosos de vísceras abdominais que têm relações anatômicas com o ureter – por exemplo, a apendicite aguda. MÓDULO DOR ABDOMINAL – P4 | Luíza Moura e Vitória Neves PCR A PCR está normalmente aumentada nos processos inflamatórios e infecciosos, mas também não é específica. Valor < 10mg/dlestá relacionado com a fase inicial da inflamação do apêndice; Valor > 50 mg/dl está relacionados com necrose e perfuração apendicular. BETA-HCG É útil no diagnóstico diferencial das mulheres em idade fértil. ESCORES DIAGNÓSTICOS Muitos sistemas de pontuação com parâmetros clínicos e laboratoriais têm sido propostos para aumentar a acurácia do diagnóstico de apendicite aguda. O mais utilizado na prática é o escore de Alvarado, que já foi modificado desde sua descrição. ESCORE DE ALVARADO MODIFICADO Dor irradiada para fossa ilíaca direita (1 ponto); Anorexia (1 ponto); Náusea/vômito (1 ponto); Sensibilidade na fossa ilíaca direita (2 pontos); Descompressão brusca na fossa ilíaca direita (1 ponto); Febre (T > 37,5°C) (1 ponto); Leucocitose (2 pontos); Desvio a esquerda (1 ponto). AVALIAÇÃO - 0 a 3 pontos: baixo risco, o paciente pode ser liberado com orientações a retornar se houver persistência ou piora dos sintomas. - 4 a 6 pontos: internação e reavaliação. O tratamento cirúrgico é recomendado na persistência dos sintomas por >12 horas. - 7 a 9 pontos: tratamento cirúrgico – apendicectomia. Estudos apontam uma sensibilidade de 95% e uma acurácia de 83% para o diagnóstico de apendicite aguda em pacientes com escore de Alvarado ≥ 7. Naqueles com escore entre 4 e 6, exames de imagem são recomendados – USG ou TC. Porém, o escore tem maior acurácia nos homens em comparação às mulheres. Dessa forma, pacientes do sexo feminino, não gestantes, devem ter preferência pela laparoscopia diagnóstica com apendicectomia, conforme os achados, dada a maior incerteza diagnóstica utilizando-se o escore de Alvarado. EXAMES DE IMAGEM Após esta primeira avaliação, se não foi possível a confirmação diagnóstica, deve fazer: Raio-x de abdome em decúbito dorsal e ortostático; em seguida USG de abdômen; e TC: APENAS SE TIVER DÚVIDA DIAGNÓSTICA. A!! É importante que o cirurgião forneça ao radiologista todas as informações da anamnese, do exame físico e as hipóteses diagnósticas provável. MÓDULO DOR ABDOMINAL – P4 | Luíza Moura e Vitória Neves RX DE ABDOME O raio-x do abdome (decúbito dorsal horizontal, ortostática e cúpulas) pode mostrar: Distensão do ceco; Formação de níveis líquidos em posição ortostática na fossa ilíaca direita; Apagamento da linha do psoas; e Até pneumoperitônio nos casos avançados. A imagem radiopaca de fecalito na topografia do apêndice reforça o diagnóstico. Isso porque o acúmulo de fezes no ceco, ocorre em 97% dos casos de apendicite aguda; Se presente, tem valor preditivo positivo de 79% e valor preditivo negativo de 98%. Outros sinais indiretos podem ser observados, como: Alça sentinela; Presença de nível hidroaéreo; e Apagamento do músculo psoas na fossa ilíaca direita. Legenda: Rx de abdome, em incidência anteroposterior e ortostatismo. a, b, c: pacientes com apendicite aguda. Observar imagem do ceco, que está distendido pelo acúmulo fecal (seta). A!! Porém, esses achados podem ser encontrados em outras causas de abdome agudo inflamatório e não há evidências na literatura sobre o papel do rx no diagnóstico da apendicite aguda. USG ABDOME TOTAL A USG é um exame de imagem que tem sido usada em pacientes com suspeita de apendicite aguda e os resultados têm sido satisfatórios. Ela é facilmente disponível, relativamente simples e rápida de ser realizada, bem tolerada, não emite radiação ou outros efeitos colaterais. Entretanto, nos casos com suspeita de apresentar apendicite aguda, este exame depende da/do: Resolução e frequência do transdutor ultrassonográfico; Critério diagnóstico adotado; e Experiência do examinador. Tem sido observado que a sensibilidade, especificidade, valor preditivo positivo e negativo e a acurácia da USG para o diagnóstico da apendicite podem ser superiores à avaliação clínica realizada pelo cirurgião. Este tipo de estudo pode reduzir o número de laparotomias brancas em até 20%. Na USG, a detecção do apendicolito se manifesta com a comprovação da: Presença de imagem hiperecogênica, com sombra acústica posterior, localizada na luz do apêndice, observada em 35,0% dos casos. Deve observar no diagnóstico diferencial a possibilidade da: Presença de gases, que também podem provocar imagens de aspecto semelhante. A!! Nesses casos, a mobilização do paciente pode confirmar a presença do apendicolito. MÓDULO DOR ABDOMINAL – P4 | Luíza Moura e Vitória Neves A USG pode não ser diagnóstico devido à: Obesidade; Grande quantidade de gás intestinal; Rigidez abdominal após perfuração; ou Dor abdominal intensa que impede a compressão adequada da região do apêndice; Paciente não cooperativo; Examinador inexperiente; e Posição atípica do apêndice. O resultado não conclusivo é um problema na USG abdominal, porém deve ser categorizado como negativo com respeito à apendicite. O apêndice agudamente inflamado é demonstrado como: Forma cilíndrica; Aperistáltica; Não compressível; e Como estrutura hipoecóica com fundo cego. O índice de visualização do órgão inflamado depende da intensidade do processo, que, em geral, acompanha o tempo de evolução da doença. Um diâmetro do apêndice >6mm é um critério de anormalidade. A!! A presença de grande quantidade de gás em alças intestinais dilatadas e dor com rigidez reflexa impede a compressão adequada e pode explicar a baixa sensibilidade quando há perfuração da víscera. Vale lembrar que a USG abdominal é, portanto, um instrumento da maior importância no diagnóstico de quadros sindromáticos da fossa ilíaca direita, mas não deve substituir uma boa anamnese e exame físico minucioso para estabelecer o diagnóstico. Legenda: USG demonstrando “imagem em alvo” com parede espessada observado na apendicite aguda. Legenda: presença de apendicolito na luz do apêndice, sinal indireto de apendicite aguda. TC É um exame mais preciso que a USG, devendo ser utilizado apenas em dúvida diagnóstica. O exame deve ser feito abrangendo todo o abdome, do apêndice xifoide até a sínfise púbica, e não somente a fossa ilíaca direita, porque a: Localização do apêndice é bastante variável; e Complicações a distância podem coexistir. Além disso, há a possibilidade da análise de outros possíveis diagnósticos diferenciais. Não usa, de rotina, o meio de contraste endovenoso, mas seu uso pode ser bastante útil, principalmente nas/nos: Complicações: apendicites perfuradas; Pacientes jovens e magros: gordura intraperitoneal escassa; Achados inespecíficos; e Diferenciação com processo maligno. ACHADOS TOMOGRÁFICOS APÊNDICE ESPESSO A distensão do apêndice é o primeiro sinal tomográfico, porém, sua identificação depende do/da: MÓDULO DOR ABDOMINAL – P4 | Luíza Moura e Vitória Neves Grau de distensão apendicular; Quantidade de gordura ao seu redor; e Qualidade técnica do exame (espessura de corte). O apêndice normal é visualizado em 67% a 100% dos adultos assintomáticos submetidos à TC com cortes finos. Legenda: apêndice normal. Enema opaco (A) e TC (B – seta). O apêndice é considerado espesso quando > ou = a 8 mm de diâmetro transverso. Legenda: apendicite aguda. Notar o grau de espessamento do apêndice, assim como o borramento da gordura adjacente. Habitualmente, o conteúdo no seu interior é líquido. Legenda: acentuada distensão líquida do apêndice na fossa ilíaca direita, com espessamento parietal e borramento da gordura adjacente, caracterizando apendicite. Sua distensão raramente ultrapassa 15 mm a 20 mm, pois geralmente a perfuração ocorre primeiro. Valores maiores sugerem a possibilidadede mucocele ou de neoplasia. Nos pacientes com pouca gordura periapendicular, o uso de contraste retal pode facilitar sua identificação. ESPESSAMENTO DA PAREDE A espessura normal da parede do apêndice mede entre 1 mm e 2 mm. No processo inflamatório existe espessamento mural, e se utilizarmos o contraste endovenoso, observa a captação deste nas paredes do apêndice inflamado. Legenda: apendicite demonstrada por acentuado espessamento da parede do apêndice e realce pelo contraste. BORRAMENTO DA GORDURA ADJACENTE A gordura normal adjacente ao apêndice é homogênea. Na apendicite existe borramento dessa gordura, sendo um sinal muito frequente e importante, encontrado em 98% dos casos. Legenda: MESMA FIGURA ACIMA. Notar o borramento da gordura adjacente. MÓDULO DOR ABDOMINAL – P4 | Luíza Moura e Vitória Neves ESPESSAMENTO DO CECO É comum observar também algum grau de processo inflamatório nas alças vizinhas, especialmente do ceco. Legenda: apendicite aguda. Espessamento do ceco (seta), borramento da gordura periapendicular e espessamento do apêndice. SINAL DA PONTA DE SETA Caracterizado pelo desenho de uma ponta de seta na base de inserção do apêndice, em virtude do edema nesta topografia, em exames feitos com contraste retal. Legenda: apendicite aguda. Sinal da ponta de seta (seta). APENDICÓLITO O apendicólito não indica, necessariamente, que o órgão esteja inflamado, pois este achado é observado em adultos assintomáticos e sem distensão apendicular. Porém, com outros achados, ele passa a ser muito significativo. Após a perfuração do apêndice, o apendicólito pode migrar para outros sítios da cavidade abdominal, com consequente formação de abscesso a distância, inclusive no pós-operatório. Legenda: Apendicólitos. A: Apêndice normal com apendicólito em paciente assintomático (seta). B,C,D: Apendicite em fase inicial com apendicólito. Neste caso, apesar de o apêndice medir apenas 6 mm de espessura, outros dados positivos, como a distensão líquida do apêndice, a presença de apendicólito e a USG concordante, permitiram o diagnóstico pré- operatório. D: Foto da peça cirúrgica. E,F,G: Abscesso apendicular reconhecido pelo apendicólito no seu interior em criança de três anos em uso de antibióticos há duas semanas (setas duplas). MASSA INFLAMATÓRIA Caso o processo inflamatório seja intenso após a perfuração do apêndice, pode observar: Grandes massas inflamatórias na fossa ilíaca direita, de limites imprecisos, determinadas pelo bloqueio das alças adjacentes e do omento. Legenda: massa inflamatória na fossa ilíaca direita. Apendicite. Diagnóstico diferencial com doença de Crohn, tuberculose íleo-cecal e processo neoplásico. Em alguns casos, o apêndice pode ser totalmente destruído pela infecção, sendo impossível a sua identificação. MÓDULO DOR ABDOMINAL – P4 | Luíza Moura e Vitória Neves LÍQUIDO LIVRE Ocorrendo a perfuração do apêndice, o líquido em seu interior (pus) é derramado na cavidade abdominal, podendo produzir uma peritonite bacteriana. Legenda: apendicite com líquido livre intraperitoneal, sugestivo de peritonite, confirmado na cirurgia (setas). GÁS EXTRALUMINAL Pode ser encontrado no interior de uma coleção ou livre na cavidade (pneumoperitônio), sendo decorrente da perfuração do apêndice. Legenda: apendicite complicada com abscesso de parede caracterizada por gás extraluminal (setas), confirmada cirurgicamente. O apêndice foi totalmente destruído pela infecção, não sendo possível localizá-lo pela TC. A!! O pneumoperitônio é mais raro e, quando ocorre, é de pequena monta. RNM A ressonância nuclear magnética do abdome fica reservada aos casos em que o paciente não deva ser submetido à radiação, como: Gestação; e que Ainda haja dúvida diagnóstica mesmo após realização do USG. VÍDEOLAPAROSCOPIA A laparoscopia diagnóstica é um recurso que pode ser utilizado e encorajado em casos duvidosos, quando os principais exames de imagem não produziram achados conclusivos. A grande vantagem é a: Possibilidade de melhor exploração da cavidade abdominal sob visão direta e, ao mesmo tempo possibilitar o tratamento cirúrgico videoendoscópico. COMPLICAÇÕES DO DIAGNÓSTICO TARDIO A apendicite pode ser dividida em: Apendicite não complicada: processo inflamatório apendicular, sem gangrena, coleção ou necrose; Apendicite complicada: presença de perfuração, necrose do apêndice ou abscesso periapendicular. As complicações são decorrentes do diagnóstico tardio e perfuração do apêndice, disseminando o processo infeccioso para a cavidade peritoneal. As principais são: Abscesso; Trombose venosa; Obstrução intestinal; Sepse; Obstrução uretral. ABSCESSO Complicação comum. Ocorre na topografia do apêndice ou em outros sítios da cavidade abdominal, caracterizado por: Coleção líquida; Realce marginal pelo meio de contraste endovenoso, muitas vezes bloqueado por alças adjacentes. MÓDULO DOR ABDOMINAL – P4 | Luíza Moura e Vitória Neves Legenda: Apendicite aguda complicada com abscesso na fossa ilíaca direita. Dois casos diferentes, sendo que no segundo (B) observamos conteúdo gasoso (seta). TROMBOSE VENOSA Complicação grave decorrente de disseminação do processo infeccioso para o sistema portal. Pode observar também abscessos hepáticos. OBSTRUÇÃO INTESTINAL O bloqueio determinado pelas alças intestinais, a princípio, determina íleo regional, porém, com a evolução da doença, pode haver: Obstrução, determinada pelo processo inflamatório; e Isquemia. Legenda: A: Radiograma digital. B: Ultra-sonografia (seta). C–F: Achados clássicos de apendicite aguda, além de sinais de obstrução intestinal, estes caracterizados por dilatação de alças de delgado e espessamento mural do íleo terminal (seta). SEPSE Complicação muito grave, de diagnóstico clínico, decorrente de: Abscessos intracavitários; ou Peritonite difusa. ...com consequente disseminação sistêmica do processo infeccioso e alta mortalidade. OBSTRUÇÃO URETERAL O processo inflamatório pode determinar obstrução ureteral à direita. TRATAMENTO CIRÚRGICO O tratamento da apendicite aguda é cirúrgico e deve ser efetuado tão logo o diagnóstico estiver estabelecido. 1. Diagnósticos precoces e precisos possibilitam ao cirurgião realizar procedimentos de exérese do apêndice com incisões específicas no quadrante inferior direito ou por videolaparoscopia. 2. Diagnósticos em fase mais adiantada ou na possibilidade de outras afecções podem exigir do cirurgião incisões maiores, para exploração da cavidade abdominal, para tratar complicações, como peritonite e coleções purulentas. A!! Não existe diferença nas complicações no tratamento cirúrgico quando é feito antes de 12 horas dos sintomas ou até 24 horas depois. Porém a taxa de perfuração do apêndice chega a 36% quando o tratamento ocorre após as primeiras 36 horas de início dos sintomas. CUIDADO PRÉ-OPERATÓRIO Um preparo pré-operatório deve ser instituído, com: Avaliação clínica do paciente; Dieta zero; Hidratação intravenosa e reposição eletrolítica; Introdução de antibióticos no pré- operatório: preferencialmente pelo cirurgião que tomou a decisão operatória. MÓDULO DOR ABDOMINAL – P4 | Luíza Moura e Vitória Neves ANTIBIOTICOTERAPIA A antibioticoterapia é direcionada à flora bacteriana intestinal com abrangência para germes aeróbios e anaeróbios. É altamente recomendada e deve ser iniciada até 60 minutos antes da operação: Diminuindo a incidência de infecção de ferida operatória e abscesso intracavitário. Normalmente as associações de: Ciprofloxacina + metronidazol; OU Aminoglicosídeo + metronidazol; OU Clindamicina + ampicilina; OU até da Amoxicilina + clavulanato. A!! A duração do tratamento, no entanto, é discutida. 1. Nos casos não complicados, não há evidência de benefício em manter a administração dos antibióticos por mais de 24 horas. 2. Já nos casos de perfuração, necrose ou de abscessos localizados, o tratamento deve ser prolongado até, pelo menos, o paciente permanecer sem febre e com leucograma normal durante 24 horas seguidas. Muitos completam o esquema de tratamento até completar 7 ou 10 dias, dependendo da gravidade do caso. ________________________________________ O tratamento cirúrgico consiste basicamente na: Apendicectomia; Drenagem de abscesso; e Lavagem com soro fisiológico do campo operatório. APENDICECTOMIA “ABERTA” Embora a cirurgia laparoscópica seja a opção para tratamento da apendicite, frequentemente, não tem equipamento e pessoal para realizar a operação por esse método. Ela é muito recomendada nos: Casos não complicados: sobretudo operados nas primeiras 48 horas; ou Sem evidência de peritonite generalizada, incisões na fossa ilíaca direita, oblíqua (incisão de McBurney: centrada no ponto de McBurney), ou transversa (incisão de Davis). ...pois afastam, mais do que seccionam, as fibras musculares da parede abdominal e permitem acesso ao ceco e apêndice. Essas incisões são: Mais bem toleradas pelos pacientes; Têm melhor efeito estético; e Apresentam menor índice de hérnias incisionais no pós-operatório tardio. Elas podem, eventualmente, ser prolongadas, se necessário, seccionando as bainhas anterior e posterior do reto abdominal e afastando medialmente o músculo reto para ter bom campo operatório. Em casos complicados de abscessos bloqueados de evolução prolongada, quando não se dispõe de drenagem percutânea dirigida, essas incisões podem ser efetuadas sobre o plastrão inflamatório, e a operação inicial pode restringir- se à drenagem do abscesso. O fechamento da pele e do tecido celular subcutâneo deve ser protelado para o 5º-6º dia pós-operatório nos casos de contaminação grosseira por pus proveniente de abscessos periapendiculares. Esta conduta evita infecções da parede abdominal. Quando não tem uma equipe com experiência em videolaparoscopia, nos casos que há dúvida diagnóstica ou com suspeita de peritonite generalizada, recomenda incisão mediana – que poderá ser facilmente ampliada para exploração e lavagem ampla da cavidade peritoneal – e até a realização de outras operações. MÓDULO DOR ABDOMINAL – P4 | Luíza Moura e Vitória Neves Essa situação pode ocorrer na úlcera péptica perfurada, com: Extravasamento de sucos digestivos pela goteira parietocólica direita; e Bloqueio na fossa ilíaca direita. Se a perfuração ulcerosa é rapidamente bloqueada, pode: Não haver disseminação difusa; Não existir pneumoperitônio visível no RX simples. Então, pode deparar com um paciente mimetizando apendicite com dor de início no epigástrio – provocada pela úlcera em atividade – e, posteriormente, localizada no quadrante inferior direito, fruto da perfuração e da localização da secreção digestiva contida. A técnica operatória da apendicectomia consiste, basicamente, em: Localizar e liberar o apêndice; e, em seguida Ligar ou coagular o mesoapêndice com corrente bipolar; Iniciando pela ponta e, finalmente, ligar e seccionar o apêndice próximo à sua base no ceco. A!! Quando existe processo inflamatório intenso na parte distal do apêndice, especialmente na localização subserosa e retrocecal, pode fazer a apendicectomia de forma retrógrada, iniciando a sua liberação pela secção e ligadura da sua base. O coto apendicular é tratado com simples ligadura e cauterização da mucosa para: Prevenir mucocele, ou ligadura com fio absorvível; e Invaginação do coto na parede do ceco. É necessário identificar corretamente o ponto de implantação do apêndice no ceco para: Evitar deixar um coto apendicular muito longo Possibilitando a ocorrência de novo quadro de apendicite aguda; Com um agravante provocado pela dificuldade diagnóstica, pois presume que o paciente já fora submetido à apendicectomia prévia. Legenda: A. localização das possíveis incisões para uma apendicectomia aberta; B. abertura por planos; C, D e E. ligação da base e divisão do apêndice; F. colocação de sutura em bolsa ou ponto Z; G. Inversão do coto apendicular. APENDICECTOMIA LAPAROSCÓPICA As indicações da apendicectomia videolaparoscópica são as mesmas da operação efetuada a céu aberto. A abordagem laparoscópica tem a vantagem de permitir a inspeção ampla da cavidade peritoneal, permitindo também firmar outras hipóteses diagnósticas nos casos duvidosos. É excelente método, em especial, nas mulheres, quando há dúvida, por causa frequência de processos inflamatórios pélvicos de origem anexial. MÓDULO DOR ABDOMINAL – P4 | Luíza Moura e Vitória Neves Nos pacientes obesos, o método permite: Evitar grandes laparotomias, muitas vezes necessárias para se obter campo adequado, evitando todos os inconvenientes dessas incisões. Nos casos de peritonite generalizada, a videolaparoscopia efetuada por equipe experiente pode: Realizar remoção do apêndice; e Permitir aspiração de lojas supuradas e lavagem dos espaços peritoneais. Tem índices de complicações semelhantes ao método aberto, mas com redução significativa das infecções da parede abdominal. É claro, nos casos complicados, o índice de conversão para cirurgia aberta é maior (de 20% a 30% 30). Mas, até nessas situações, a videolaparoscopia permite ao cirurgião posicionar com precisão a incisão na parede do abdome, podendo planejar acesso mais econômico. A!! As contraindicações da videolaparoscopia estão cada vez menores com a experiência adquirida. Pacientes recomendados para laparotomia: Intolerância ao pneumoperitônio; Coagulopatias refratárias; e Pacientes com peritonite generalizada com instabilidade hemodinâmica; Pacientes com apendicite com gravidez avançada; Pacientes com múltiplas operações prévias e forte bloqueio aderencial. Habitualmente a operação é realizada com a introdução de três trocartes. A cavidade peritoneal é bem visualizada e, após a identificação do apêndice: Seu meso é coagulado por corrente bipolar ou ligado com endogrampeador. O coto apendicular é ligado próximo à sua base com dupla ligadura ou com ajuda de endogrampeador. Não se procede à invaginação do coto, que tem sua mucosa fulgurada. O apêndice é removido em bolsa pelo trocarte de maior calibre, e a cavidade é cuidadosamente limpa por meio de aspiração e lavagens repetidas. De um modo geral, tanto em cirurgia a céu aberto, como por videolaparoscopia, costuma remover o apêndice nos casos de erro diagnóstico, estando o mesmo sem inflamação. É mais comum nas mulheres, onde as patologias anexiais levam com maior frequência a falsos diagnósticos de apendicite aguda. Em certas situações, nas fases precoces, o apêndice pode parecer normal no ato operatório, mas apresentar aspecto histopatológico de apendicite inicial. Legenda: A. Superior esquerda, localização das portas locais para apendicectomia laparoscópica; B. dissecção MÓDULO DOR ABDOMINAL – P4 | Luíza Moura e Vitória Neves do mesoapêndice, que circunda o apêndice; C. Colocação de um Endoloop absorvível que circunda a base do apêndice; D. Divisão do apêndice por Endoloops; E. Colocação do apêndice em uma bolsa de amostra antes da remoção do apêndice pela porta umbilical.
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