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História e Cultura Brasileira Kleber Eduardo Men DIREÇÃO UNICESUMAR Reitor Wilson de Matos Silva, Vice-Reitor Wilson de Matos Silva Filho, Pró-Reitor de Administração Wilson de Matos Silva Filho, Pró- Reitor de EAD Willian Victor Kendrick de Matos Silva, Presidente da Mantenedora Cláudio Ferdinandi. NEAD - NÚCLEO DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA Diretoria Operacional de Ensino Kátia Coelho, Diretoria de Planejamento de Ensino Fabrício Lazilha, Direção de Operações Chrystiano Mincoff, Direção de Mercado Hilton Pereira, Direção de Polos Próprios James Prestes, Direção de Desenvolvimento Dayane Almeida, Direção de Relacionamento Alessandra Baron, Head de Produção de Conteúdos Rodolfo Encinas de Encarnação Pinelli, Gerência de Produção de Contéudo Gabriel Araújo, Supervisão do Núcleo de Produção de Materiais Nádila de Almeida Toledo, Supervisão de Projetos Especiais Daniel F. Hey, Coordenador de Contéudo Alexandre Gimenes da Cruz, Projeto Gráfico e Editoração Jaime de Marchi Junior e José Jhonny Coelho, Designer Educacional Camila Zaguini, Revisão Textual Jaquelina Kutsunugi, Simone Limonta, Viviane Notari e Yara M. Dias, Ilustração Nara Emi Tanaka, Fotos Shutterstock e Istockphoto. NEAD - Núcleo de Educação a Distância Av. Guedner, 1610, Bloco 4 - Jardim Aclimação - Cep 87050- 900 Maringá - Paraná | unicesumar.edu.br | 0800 600 6360 “Promover a educação de qualidade nas diferentes áreas do conhecimento, forman- do profissionais cidadãos que contribuam para o desenvolvimento de uma sociedade justa e solidária” Missão C397 CENTRO UNIVERSITÁRIO DE MARINGÁ. Núcleo de Edu- cação a Distância; MEN, Kleber Eduardo História e Cultura Brasileira. Kleber Eduardo Men Reimpressão Maringá-Pr.: UniCesumar, 2019. 104 p. “Graduação em Gastronomia - EaD”. 1. História. 2. Cultura Brasileira. 3. Comida 4. Civilização EaD. I. Título. ISBN 978-85-8084-959-2 CDD - 22ª Ed. 306 CIP - NBR 12899 - AACR/2 3 Viver e trabalhar em uma sociedade global é um grande desafio para todos os cidadãos. A busca por tecnologia, informação, conhecimento de qualida- de, novas habilidades para liderança e solução de problemas com eficiência tornou-se uma questão de sobrevivência no mundo do trabalho. Cada um de nós tem uma grande responsabilida- de: as escolhas que fizermos por nós e pelos nossos fará grande diferença no futuro. Com essa visão, o Centro Universitário Cesumar assume o compromisso de democratizar o conheci- mento por meio de alta tecnologia e contribuir para o futuro dos brasileiros. No cumprimento de sua missão – “promover a educação de qualidade nas diferentes áreas do conhe- cimento, formando profissionais cidadãos que con- tribuam para o desenvolvimento de uma sociedade justa e solidária” –, o Centro Universitário Cesumar busca a integração do ensino-pesquisa-extensão com as demandas institucionais e sociais; a realização de uma prática acadêmica que contribua para o desen- volvimento da consciência social e política e, por fim, a democratização do conhecimento acadêmico com a articulação e a integração com a sociedade. Diante disso, o Centro Universitário Cesumar almeja ser reconhecida como uma instituição uni- versitária de referência regional e nacional pela qua- lidade e compromisso do corpo docente; aquisição de competências institucionais para o desenvolvimento de linhas de pesquisa; consolidação da extensão uni- versitária; qualidade da oferta dos ensinos presencial e a distância; bem-estar e satisfação da comunidade interna; qualidade da gestão acadêmica e adminis- trativa; compromisso social de inclusão; processos de cooperação e parceria com o mundo do trabalho, como também pelo compromisso e relacionamento permanente com os egressos, incentivando a educa- ção continuada. pa la vr a do re it or Reitor Wilson de Matos Silva Prezado(a) Acadêmico(a), bem-vindo(a) à Comunidade do Conhecimento. Essa é a característica principal pela qual a UNICESUMAR tem sido conhecida pelos nossos alunos, professores e pela nossa sociedade. Porém, é importante destacar aqui que não estamos falando mais daquele conhecimento estático, repetitivo, local e elitizado, mas de um conhecimento dinâmico, renovável em minutos, atemporal, global, demo- cratizado, transformado pelas tecnologias digitais e virtuais. De fato, as tecnologias de informação e comuni- cação têm nos aproximado cada vez mais de pessoas, lugares, informações, da educação por meio da conec- tividade via internet, do acesso wireless em diferentes lugares e da mobilidade dos celulares. As redes sociais, os sites, blogs e os tablets acelera- ram a informação e a produção do conhecimento, que não reconhece mais fuso horário e atravessa oceanos em segundos. A apropriação dessa nova forma de conhecer transformou-se hoje em um dos principais fatores de agregação de valor, de superação das desigualdades, propagação de trabalho qualificado e de bem-estar. Logo, como agente social, convido você a saber cada vez mais, a conhecer, entender, selecionar e usar a tecnologia que temos e que está disponível. Da mesma forma que a imprensa de Gutenberg modificou toda uma cultura e forma de conhecer, as tecnologias atuais e suas novas ferramentas, equipa- mentos e aplicações estão mudando a nossa cultura e transformando a todos nós. Priorizar o conhecimento hoje, por meio da Educação a Distância (EAD), significa possibilitar o contato com ambientes cativantes, ricos em infor- mações e interatividade. É um processo desafiador, que ao mesmo tempo abrirá as portas para melhores oportunidades. Como já disse Sócrates, “a vida sem desafios não vale a pena ser vivida”. É isso que a EAD da Unicesumar se propõe a fazer. bo as -v in da s Pró-Reitor de EaD Willian V. K. de Matos Silva 5 bo as -v in da s Seja bem-vindo(a), caro(a) acadêmico(a)! Você está iniciando um processo de transformação, pois quando investimos em nossa formação, seja ela pessoal ou profissional, nos transformamos e, consequente- mente, transformamos também a sociedade na qual estamos inseridos. De que forma o fazemos? Criando oportunidades e/ou estabelecendo mudanças capazes de alcançar um nível de desenvolvimento compatível com os desafios que surgem no mundo contemporâneo. O Centro Universitário Cesumar mediante o Núcleo de Educação a Distância, o(a) acompanhará durante todo este processo, pois conforme Freire (1996): “Os homens se educam juntos, na transfor- mação do mundo”. Os materiais produzidos oferecem linguagem dialógica e encontram-se integrados à proposta pe- dagógica, contribuindo no processo educacional, complementando sua formação profissional, desen- volvendo competências e habilidades, e aplicando conceitos teóricos em situação de realidade, de ma- neira a inseri-lo no mercado de trabalho. Ou seja, estes materiais têm como principal objetivo “provocar uma aproximação entre você e o conteúdo”, desta forma possibilita o desenvolvimento da autonomia em busca dos conhecimentos necessários para a sua formação pessoal e profissional. Portanto, nossa distância nesse processo de crescimento e construção do conhecimento deve ser apenas geográfica. Utilize os diversos recursos pedagógicos que o Centro Universitário Cesumar lhe possibilita. Ou seja, acesse regularmente o AVA – Ambiente Virtual de Aprendizagem, interaja nos fóruns e enquetes, assista às aulas ao vivo e partici- pe das discussões. Além disso, lembre-se que existe uma equipe de professores e tutores que se encontra disponível para sanar suas dúvidas e auxiliá-lo(a) em seu processo de aprendizagem, possibilitando-lhe trilhar com tranquilidade e segurança sua trajetória acadêmica. Pró-Reitor de Ensino de EAD Janes Fidélis Tomelin Diretoria de Graduação e Pós Kátia Solange Coelho Diretoria de Design Educacional Débora do Nascimento Leite Diretoria de Permanência Leonardo Spaine H i s t ó r ia e C u l t u r a B r a s i l e i r a Ap re se nt aç ão d o Li vr o Olá aluno(a) do curso de gastronomia da EaD UNICESUMAR! É com muito prazer e satisfação que poderemos juntos discutir e refletir sobre a história da formação do Brasil, bem como a maneira que essas transformações históricas estão direta e indiretamente ligadas à nossa alimentação. Primeiramente, antes de introduzir o assunto, gostaria de me apresentar. Sou o professor Kleber Eduardo Men, graduado em Licenciatura em História pela Universidade Estadual de Maringá (2007), especialista em Docência no Ensino Superior pela UNICESUMAR (2011) e Mestre em História das Ideias e das Instituições (2013), também pela Universidade Estadual de Maringá. Tenho 7 anos de experiência na área do Ensino Superior, principalmente no que diz respeito à EaD, tendo em vista que desde a minha graduação tenho me dedicado aos trabalhos nessa modalidade de ensino. Sendo assim, quero ressaltar que este livro foi escrito com muito carinho para que esta disciplina seja absorvida por você, prezado(a) aluno(a), de forma plena, possibilitando ampliar seu cabedal de conhecimento para que, em breve, ao se tornar um profissional da área de gastronomia, independentemente da área em que for atuar, consiga levar a cultura brasileira por meio de nossa deliciosa e multicultural cozinha. É muito importante destacar a importância da história na formação das pessoas. Como disse o vencedor do Prêmio Nobel da Paz, Mikhail Gorbatchev, “um povo sem história é como uma árvore sem raiz. Seca e morre”. Por isso, que ressaltamos a im- portância de se compreender a história que há por trás dos elementos que compõem a nossa vida, como os costumes, as instituições e, principalmente, aquilo que diz respeito à nossa prática alimentar. Sendo assim, gostaria de convidá-lo(a) a participar desta viagem pela formação da cultura brasileira, refletindo sobre os principais elementos que nos tornaram uma nação tão diversificada, em que, em cada canto desse imenso país, observamos sotaques diferentes, vestimentas diferentes, costumes diferentes, hábitos alimentares diferentes, em suma, a cada viagem, a cada leitura, descobrimos um Brasil diferente. Professor Mestre Kleber Eduardo Men SUMÁRIO UNIDADE 1 História e Cultura Brasileira: entre Europeus, Africanos e Nativos 13 A Colonização do Brasil: Apontamentos Preliminares 21 O Colonizador Português e a sua Influência na Formação da Cultura e da Sociedade Brasileira 29 O Papel Fundamental de Índios e Negros na Composição da Sociedade e Cultura Brasileira UNIDADE 2 Comida e Civilização: A Importância do Ato de Comer na Formação da Identidade Cultural Brasileira 43 A Refeição Enquanto Formadora da Rotina dos Brasileiros 49 Uma Interpretação Sociológica da Alimentação 61 Economia, Sociedade e Cultura UNIDADE 3 Influências Culturais em nossa Alimentação 75 A importância do nativo na configuração Alimentar Brasileira 85 A influência Portuguesa na mesa Brasileira 93 A influência dos Negros Africanos na Composição Culinária Brasileira dica do chef habilidades Legendas de Ícones recapitulando saiba mais fatos e dados minicaso reflita Dica do Chef: dicas rápidas para complementar um conceito, detalhar procedimentos e proporcionar sugestões. Habilidades: elo entre as disciplinas do curso. Mão na massa: indicação de atividade prática. Fatos e Dados: complementação do conteúdo com informações relevantes ou acontecimentos. Minicaso: aplicação prática do conteúdo. Reflita: informações relevantes que proporcionam a reflexão de determinado conteúdo. Recapitulando: síntese de determinado conteúdo, abordando os principais conceitos. Saiba mais: Informações adicionais ao conteúdo. mão na massa História e Cultura Brasileira: entre Europeus, Africanos e Nativos KLEBER EDUARDO MEN A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade: • A colonização do Brasil: apontamentos preliminares • O colonizador português e a sua influência na formação da cultura e da sociedade brasileira • O papel fundamental de índios e negros na composição da sociedade e cultura brasileira • Estudar como foi o processo de colonização do Brasil. • Compreender o significado da colonização portuguesa no contexto do século XVI. • Entender a importância do contato europeu com o nativo e o africano. • Refletir sobre a sociedade e a cultura brasileira sob a ótica da miscigenação Plano de Estudo Objetivos de Aprendizagem Introdução São inúmeros os debates acerca dos fatores que envolveram a colonização do Brasil. Além, é claro, de toda influência que esse processo exerceu e ainda exerce sobre a formação de nossa cultura geral. Não raro também é atribuir boa parte de nossos vícios políticos e administrativos aos colonizadores europeus que, em nosso caso, foram os portugueses. A colonização do Continente Americano não foi algo homogêneo. Também não foi empre- endida apenas por uma nação. Estudar a colonização de nosso continente é uma tarefa bastante complexa e qualquer conclusão, por mais óbvia que seja, carece de discussões e contestações. Para tanto, precisamos olhar com bastante cuidado o nosso passado, buscando entender os fatores responsáveis por cada influência aqui assistida. Para entender a colonização do Brasil, é necessário, antes de qualquer coisa, observar as condições em que se encontravam os portugueses na época do descobrimento. Além disso, preci- samos compreender os mecanismos econômicos que guiavam as nações naquele contexto, como a procura pelas especiarias orientais, a consolidação do poder centralizado nas mãos dos reis, a ascensão da classe burguesa como grupo social economicamente independente, dentre outros. Entretanto, nossa discussão nesta unidade não será a de enfatizar os fatores econômicos que moveram nações como Portugal na Idade Moderna, pois nosso objetivo primeiro será apresentar os fatores necessários para compreendermos a formação de nossa sociedade, principalmente no que diz respeito à nossa cultura alimentar. Queremos entrar na intimidade da sociedade brasileira. Precisamos entender o que acontecia entre quatro paredes, para dar sentido à nossa vida doméstica que está ligada diretamente a nossa culinária. Dentro dessa perspectiva, vamos analisar autores que optaram por essa abor- dagem, enfatizando o que há de mais relevante para que cada um de nós compreenda como foi o processo de formação da sociedade brasileira. 11 H i s t ó r i a e C u l t u r a B r a s i l e i r a Desembarque de Cabral em Porto Seguro, autor: Oscar Pereira da Silva, 1904. Acervo do Museu Histórico Nacional, Rio de Janeiro. 13G A S T R O N O M I A • U N I C E S U M A R O esforço colonizador empreendido por Portugal fora algo de uma magnitude que merece louvor. Não estamos aqui propondo sermos juízes da história – no sentido de olharmos o passado com intuito de julgar os acontecimentos –, mas, com algumas refle- xões, poderemos perceber que, por parte de Portugal, seu projeto de colonização foi muito bem sucedido em terras tropicais. Nas palavras do escritor Sérgio Buarque de Holanda: Pioneiros na conquista do trópico para a civilização, tiveram os portugueses, nessa proeza, sua maior missão histórica. E sem embargo de tudo quanto se possa alegar contra sua obra, forçoso é conhecer que foram não somente os portadores efetivos como os portadores naturais dessa missão. Nenhum outro povo do Velho Mundo achou-se tão bem armado para se aventurar à exploração regular e intensa das terras próximas à linha equinocial (HOLANDA, 1995, p. 43). A Colonização do Brasil Apontamentos Preliminares H i s t ó r i a e C u l t u r a B r a s i l e i r a C onforme foi possível perceber, na visão desse autor, que foi um dos maiores estudiosos da história brasileira, colonizar, para os portu- gueses, foi mais do que uma exploração mer- cantilista, como observamos em inúmeros manuais de história.A missão empreendida pelos lusitanos transcendeu, naquele contexto, o que havia de mais sensato à mente dos mais prudentes. Conforme nos foi ensinado no ensino Fundamental e Médio, o Brasil foi coloniza- do por Portugal e este organizou a produção por aqui, visando fortalecer o Estado Nacional Português. Na verdade, a virada do século XV para o XVI foi um momento em que as nações europeias estavam se consolidando política e economicamente. Para tanto, encontrar uma região que fosse economicamente viável e que pudesse ser utilizada para exploração tornaria esse país muito forte. De acordo com o documento mais antigo que se tem sobre a descoberta do Brasil, a Carta de Pero Vaz de Caminha, quando os portugueses chegaram aqui tiveram contato com os nativos que habitavam essas terras. Esse fato, como vamos perceber em algumas breves passagens deste livro, não foi apenas homens vestidos em contato com homens nus, mas sim o contato de homens que professavam uma cultura, com outros de uma cultura totalmente diferente. Haja vista o tom de surpresa em que são nar- rados muitas das cenas entre nativos e portu- gueses nessa carta. Assim como temos o indígena como um componente extraordinário de nossa civilização, não podemos deixar de dar destaque a outro elemento de crucial importância, que foram os negros africanos, trazidos para cá para serem utilizados como escravos. Dentro desse contex- to, tendo em vista o propósito dessa disciplina, destacamos que o fator central será o de com- preender que índios e portugueses, juntamente com os escravos africanos, formaram a base principal de nossa civilização nos primeiros três séculos da história brasileira, além de toda in- fluência exercida até os dias de hoje. O africano foi introduzido no Brasil em de- corrência do modelo de colonização aqui estabe- lecido. Segundo a historiografia mais tradicional sobre a colonização do Brasil, da qual podemos destacar Caio Padro Júnior e Fernando Novaes, as bases da colonização da América Portuguesa se fundaram na escravidão, na monocultura e no latifúndio. Essa tríade compõe aquilo que ficou conhecido como Sistema Colonial. Dessa forma, o negro africano é aqui introduzido para se tornar a principal mão de obra da atividade canavieira. Junto deles, vieram também seus usos, costumes e práticas culturais. 15G A S T R O N O M I A • U N I C E S U M A R Na década de 1990, o Timor Leste, país situado no sudeste asiático, passou por uma crise política relativa à sua indepen- dência. Para que o processo ocorresse sem maiores problemas, a ONU (Organização das Nações Unidas) enviou tropas ao pequeno país. Dessa forma, solicitou ajuda ao Brasil, para que pudéssemos enviar soldados do exército em Missão de Paz ao local. Uma das razões pela qual a ONU solicitou a participação brasileira foi devido à semelhança desses dois países, já que ambos foram colonizados por portugueses e comungavam, em linhas gerais, dos mesmos usos e costumes. Em razão das dificuldades econômicas atravessadas pelo Brasil naquele contexto, um esforço hercúleo foi feito por parte do Governo Federal, através do Ministério da Defesa, para que o Brasil mandasse um contingente militar. E o resultado foi uma Missão de Paz composta por, aproximadamente, 100 soldados brasileiros. Isso mesmo! Em um país de dimensão continental como é o Brasil e com uma população de, aproximadamente, 150 milhões de habitantes na época, foi possível o envio de apenas esse pequeno contingente. Agora, gostaria de chamar a sua atenção à situação de Portugal na época em que estava se tornando uma potência marítima e colonial. Para início de conversa, comparar o tamanho do território de Portugal com o território do Brasil é desnecessário. A população de Portugal, no século XVI, era de, aproximadamente, 1 milhão de habitantes. Ou seja, um país pequenino, com uma população pequena, foi capaz de colonizar um território que viria a se tornar um dos cinco maiores países em território do mundo! Fonte: O autor SISTEMA COLONIAL O sistema colonial foi o conjunto de relações entre as metrópoles e suas respectivas colônias, em que essas últimas ser- viam como alicerce para a estruturação do capitalismo, que, naquele contexto, se consolidava como Modo de Produção. É importante perceber a forma como as metrópoles viam essa relação, tendo em vista que o conceito de capital naquele contexto era bem diferente do que temos hoje. Dessa forma, é importante que saibamos observar essas características para uma melhor compreensão do que houve no Brasil. Saiba mais em: <http://lhs.unb.br/biblioatlas/Antigo_Sistema_ Colonial>. Acesso em: 24 nov. 2014. H i s t ó r i a e C u l t u r a B r a s i l e i r a O poema abaixo foi escrito por um dos maiores pensadores português, Fernando Pessoa (1888-1935), que retratou com precisão e elegância todo o sofrimento que passaram os portugueses, para que o objetivo de descobrir uma nova rota para as Índias fosse descoberto. MAR PORTUGUÊS Ó mar salgado, quanto do teu sal São lágrimas de Portugal! Por te cruzarmos, quantas mães choraram, Quantos filhos em vão rezaram! Quantas noivas ficaram por casar Para que fosses nosso, ó mar! Valeu a pena? Tudo vale a pena Se a alma não é pequena. Quem quer passar além do Bojador Tem que passar além da dor. Deus ao mar o perigo e o abismo deu, Mas nele é que espelhou o céu. A tríade sobre a qual foi organizada a co- lonização do Brasil, segundo a historiogra- fia tradicional, assenta-se na escravidão, monocultura e no latifúndio. Esse grupo que caracterizou a colonização brasi- leira também pode ser denominado de plantation. A escravidão, em linhas gerais, pode ser definida como a mão de obra “barata” que consistia na exploração do negro tra- zido da África Subsaariana para o trabalho pesado. Um dos fatores para os portugue- ses terem optado por essa mão de obra foi o fato de que o comércio de escravos era uma grande fonte de renda, além de haver uma certa resistência a escravizar os indígenas do Brasil. A monocultura era a prática de culti- var apenas um produto, que possibilitava a especialização, além de haver menos gastos com investimentos em outros se- tores produtivos. O latifúndio é uma caraterística que está no cerne de nossa colonização, tendo em vista que desde a distribuição das Capitanias Hereditárias, uma enorme porção de terras era doada a apenas uma pessoa. Sendo assim, o latifúndio pode ser caracterizado como uma enorme proprie- dade agrícola. Saiba mais em: <http://lhs.unb.br/ biblioatlas/Antigo_Sistema_Colonial>. Acesso em: 08 dez. 2014 17G A S T R O N O M I A • U N I C E S U M A R Quando vamos falar em colonização e de todas as consequências decorrentes da miscigenação racial, analisar a obra de Gilberto Freyre (2006), Casa-Grande & Senzala, torna-se indispensável. Foi esse sociólogo pernambucano o primeiro a abordar a importância que a miscigenação teve na colonização do Brasil. Ao contrário do que pensavam outros estudiosos contemporâneos, na publicação da obra pela primeira vez, em 1933, Freyre atribuiu à miscigenação uma importân- cia primordial. Inúmeros eram os pensadores que, buscando “decifrar” os problemas histó- ricos do Brasil, creditavam um valor negativo à miscigenação. Debates historiográficos à parte, fato é que, para conhecermos melhor esse país continental que é o nosso, em sua diversidade plena, conhecer cada ponto da influência de todas as culturas é uma obrigação histórica. Conforme veremos nesta disciplina, a miscigenação cultural influenciou dire- tamente em nossa cultura alimentar. Em nossas aulas práticas, no decorrer do curso, falaremos mais sobre o assunto e prepara- remos pratos da cozinha brasileira de raiz, em que, além da prática culinária em si, não deixaremos de abordar a importância histórica dessas preparações. H i s tó r i a e C u l t u r a B r a s i l e i r a O OUTRO BRASIL QUE VEM AÍ (GILBERTO FREYRE) Eu ouço as vozes eu vejo as cores eu sinto os passos de outro Brasil que vem aí mais tropical mais fraternal mais brasileiro. O mapa desse Brasil em vez das cores dos Estados terá as cores das produções e dos trabalhos. Os homens desse Brasil em vez das cores das três raças terão as cores das profissões e das regiões. As mulheres do Brasil em vez de cores boreais terão as cores variamente tropicais. Todo brasileiro poderá dizer: é assim que eu quero o Brasil, todo brasileiro e não apenas o bacharel ou o doutor O preto, o pardo, o roxo e não apenas o branco e o semibranco. Na primeira metade do século XX, muitos historiadores olharam para o passado e tentaram buscar respostas para o tipo de sociedade que foi formada no Brasil. Dentre as principais obras e seus respectivos au- tores, estão: Gilberto Freyre, com a obra Casa-Grande e Senzala (1933), na qual o autor aborda questões étnicas e culturais. Sérgio Buarque de Holanda, com a obra Raízes do Brasil (1936), em que o autor trabalha o conceito de homem cordial, e Caio Prado Júnior, com sua obra Formação do Brasil Contemporâneo (1942), em que o autor aborda as questões econômicas sob o viés marxista. Essas três obras são de estudo obrigatório para qualquer um que queira entender o processo colonizador que formou nossa sociedade. Fonte: Autor. 19G A S T R O N O M I A • U N I C E S U M A R Muitos professores que conheço já realizaram traba- lhos maravilhosos com seus alunos, quando o tema é relacionado a diversidade cultural do Brasil. Aliás, conforme a orientação pedagógica da instituição, trabalhos interdisciplinares são a verdadeira essên- cia do aprendizado, tendo em vista que contribuem para que o estudante coloque na prática aquilo que aprendeu na teoria. Lembro-me quando cursava o 9º ano (antiga oitava série) e que um professor havia delegado à sala um trabalho em que cada grupo deveria ser responsá- vel por apresentar um Estado do Brasil e destacar suas características econômicas e culturais. Para um garoto de quatorze anos e em uma época que não se ouvia falar de internet, o jeito era recorrer ao que estava ao alcance imediato. Sendo assim, fiquei com o tema o Estado do Rio Grande do Sul. Desde criança fui acostumado a ouvir música gaúcha com meu avô materno – embora ele não fosse gaúcho. Como eu tocava violão e um colega de classe tocava sanfona, conseguimos umas bom- bachas e algumas meninas conseguiram vestidos de prenda. Resultado: tocamos, cantamos e apresenta- mos algumas danças típicas do Rio Grande do Sul, como a vanera, o bugio, a rancheira e o xote. Entretanto, podemos dizer que o Rio Grande do Sul se resume a isso? No que diz respeito à tradição culi- nária, será que todo gaúcho toma chimarrão e gosta de churrasco? Certamente que não. Isso também se aplica ao Brasil como um todo. E tudo isso diz respeito ao processo de colonização empreendido pelos europeus no século XVI. Fonte: Fato real vivido pelo professor Kleber Men Churrasco – um dos pratos mais apreciados pelos gaúchos. H i s t ó r i a e C u l t u r a B r a s i l e i r a Recens elaborata mappa geographica regni Brasiliae in America Meridionali maxime celebris, autor: Seutter, Matthaeus, 1730 21G A S T R O N O M I A • U N I C E S U M A R Se observarmos como se processou a colonização da América de Norte a Sul, observando as características das 13 Colônias Inglesas instaladas na América do Norte, a colonização espanhola e a colo- nização francesa, vamos perceber, obviamente, que as diferenças são inúmeras. Se ao invés de observarmos as características eco- nômicas, focarmos nos pontos que envolvem a cultura, a lista de diferenças será ainda maior. O Colonizador Português e a sua Influência na Formação da Cultura e da Sociedade Brasileira H i s t ó r i a e C u l t u r a B r a s i l e i r a C ada colônia que se desenvolveu na América foi, grosso modo, um espe- lho do que era a sua Metrópole euro- peia, no que diz respeito à estrutura social e política. Entretanto, no que se trata dos fatores econômicos, essa região representava uma amplitude bem maior, em razão da abun- dância de terras sob um clima mais favorável à produção agrícola. O que acabou por criar uma sociedade que, segundo Freyre (2006, p. 65), no que diz respeito à colonização da América tropical, formou-se: Uma sociedade agrária na estrutura, es- cravocrata na técnica de exploração eco- nômica, híbrida de índio – e mais tarde de negro – na composição. Sociedade que se desenvolveria defendida menos pela consciência de raça, quase nenhuma no português cosmopolita e plástico, do que pelo exclusivismo religioso desdobrado em sistema de profilaxia social e política. Antes que possamos seguir em frente com nossa análise, é preciso deixar alguns pontos elucida- dos com relação à citação acima. Quando o autor se refere a nossa sociedade ser escravocrata, significa que a base de nossa colonização era a relação entre senhores e escravos. Não que por aqui não houvesse trabalho livre, mas, se com- pararmos este com a escravidão, essa última, sem dúvida alguma, era predominante. Freyre (2006) também destacou que, em terras brasileiras, a miscigenação foi maior do que em qualquer outro país americano, tudo isso se deveu à natureza dos portugueses que, segundo o autor, não possuíam orgulho racial e, sendo assim, eram pessoas que facilmente se adaptavam a qualquer situação. Além disso, o que se viu em outras regiões da América foi uma profilaxia social, em que os europeus não se misturaram com os nativos de forma tão in- tensa, como ocorrida por aqui, por se acharem superiores. Em suma, o autor afirmou que, do ponto de vista do orgulho racial, de evitar se misturar com alguém de outra raça, os portugueses prati- camente ignoraram isso. Assim, já identificamos que a miscigenação, ao contrário do que se viu em outros países, ocorreu de forma muito mais livre, pois essa prática encontrou pouquíssimas barreiras. Nesse diapasão, destaca-se que um dos fato- res sobre a facilidade que essa relação inter-racial encontrou na América Portuguesa se dá pelo fato de que os portugueses, em seu passado, também foram formados a partir da mistura de raças, por serem um povo, em razão de sua situação geográfica, mais propenso a intera- girem com outras culturas. Segundo Holanda (1995, p. 31), A Espanha e Portugal são, assim como a Rússia e os países balcânicos (e em certo sentido também a Inglaterra), um dos territórios-ponte pelos quais a Europa se comunica com os outros mundos. Assim, eles constituem uma zona fronteiriça, de transição, menos carregada, em alguns 23G A S T R O N O M I A • U N I C E S U M A R casos, desse europeísmo que, não obs- tante, mantêm como um patrimônio necessário. Perceba que, pelo fato de Portugal ser um país situado na periferia da Europa, isso facilitou o contato com outros povos, per- mitindo que os portugueses deixassem o “orgulho étnico” de lado – ou melhor, nem o desenvolvessem completamente –, o que acabou proporcionando uma maior intera- ção cultural. Essa visão também é compar- tilhada por Freyre (2006, p. 66): A singular disposição do português para a colonização híbrida e escravocrata dos trópicos, explica-a em grande parte o seu passado étnico, ou antes, cultural, de povo indefinido entre a Europa e a África. Nem intransigentemente de uma nem de outra, mas das duas. A influên- cia africana fervendo sob a europeia e dando um acre requeime à vida sexual, à alimentação, à religião; o sangue mouro ou negro correndo por uma grande po- pulação brancarana quando não predo- minando em regiões ainda hoje de gente escura. Holanda (1995) e Freyre (2006) concordam com o fato de que os portugueses não possu- íam objeções quando o assuntoera interação racial, tendo em vista que suas características históricas comprovam tal propensão. Para esses autores, não havia uma raça portuguesa. O que havia era uma população que se originou por meio de uma interação racial. Embora o termo raça seja discutível nos dias de hoje, entender essas obras no contexto em que foram escritas passa, primeiramente, por entender esse con- ceito. Nesse sentido, o que fica evidente é que os portugueses possuíam uma disposição natural à interação racial. Outra questão importante é que ninguém deu mais valor à miscigenação racial como fundamento para se compreender a nossa co- lonização como Gilberto Freyre. Dessa forma, para melhor entender suas expressões, é pre- ciso estar ligado na vivacidade de sua obra, ou seja, nos sentimentos que ele consegue nos passar com sua leitura. Ao contrário dos historiadores que abordaram a colonização sob o viés econômico, os quais já foram refe- renciados anteriormente, Freyre tempera sua obra buscando passar da forma mais objetiva possível o verdadeiro sabor das relações raciais ocorridas no Brasil. Ou como ele mesmo ex- pressa, um sabor especial, picante, diferente (acre requeime), mostrando como o sangue negro, mouro, índio corre pelas veias de forma direta ou indireta mesmo nas populações de pele branca. A título de conclusão, é importante men- cionar que o português, embora seja o prin- cipal colonizador do Brasil, não foi o único europeu a tentar a sorte em solo brasileiro. Por aqui, aventuraram-se franceses no século XVI e holandeses no século XVII (estes com maior êxito). Além disso, no século XIX e H i s t ó r i a e C u l t u r a B r a s i l e i r a início do século XX, vieram pra cá italianos, espanhóis, japoneses, árabes, judeus, ucra- nianos, dentre outros, que contribuíram de forma significativa para diversificar ainda mais nossa cultura. Outro fator importante, prezado(a) alu- no(a), que devemos levar em consideração é com relação ao clima. Quando se fala em pro- dução agrícola, os fatores climatológicos são in- dispensáveis. Mesmo que, atualmente, a ciência tenha suprido algumas deficiências naturais, em linhas gerais, quando o assunto é culinário, cada região obedece, em regra, aquilo que a ela foi imposto pela geografia. Isso também se aplica ao fator colonizador, como afirma Freyre (2006, p. 76): O português no Brasil teve de mudar quase radicalmente o seu sistema de ali- mentação, cuja base se deslocou, com sensível déficit, do trigo para a man- dioca; e o seu sistema de lavoura, que as condições físicas e químicas de solo, tanto quanto as de temperatura ou de clima, não permitiram fosse o mesmo doce trabalho das terras portuguesas. A esse respeito o colonizador inglês dos Estados Unidos levou sobre o por- tuguês do Brasil decidida vantagem, ali encontrando condições de vida física e fontes de nutrição semelhantes às da mãe-pátria. 25G A S T R O N O M I A • U N I C E S U M A R Gostaria que você refletisse sobre a compara- ção feita por Freyre (2006) na citação acima. Quando ele comparou a adaptação dos portu- gueses com a adaptação dos colonos que vieram à América do Norte, nesse caso específico, os Ingleses que formaram os Estados Unidos, os lusitanos encontraram ambiente muito menos propício a aclimatação do que os anglo-saxões. Os ingleses saíram de uma região de clima frio e foram para uma região que, pelo menos, em boa parte do seu território, era tida sob o clima temperado. Embora os colonos ingleses tenham sofrido com inúmeros problemas, em termo de adap- tação, tiveram uma grande vantagem sobre o português. Um dos principais exemplos que podemos citar foi o trigo – que era uma das bases da alimentação dos portugueses – que, em função do clima tropical, não pode ser cultivado de imediato pelos portugueses, que tiveram de se adaptar ao consumo de farinha de mandioca, conforme veremos mais adiante. É certo que não podemos generalizar que portugueses sempre estiveram em desvantagem com relação aos ingleses da América do Norte, mas o fato é que, por eles terem saído de um clima temperado e vindo enfrentar o calor e o sol forte dos trópicos, acabou por provocar mudanças significativas na base alimentar dos lusitanos. Imagine você, tendo de se deslocar para outro país em que a cultura alimentar é totalmente diferente da sua? Foi em razão desta mudança de ambien- te que surgiram os famosos bolinhos de legumes, tempurá, e que hoje são co- nhecidos como pertencentes à culinária e à cultura japonesa. No século XVI, no auge da Reforma Protestante, jesuítas portugueses partiram rumo ao Japão em busca de convertê-los à fé católica. Dessa forma, como entre os dogmas do catolicis- mo estão algumas restrições alimentares em determinadas épocas do ano, esses missionários acabaram levando em sua bagagem mudas para cultivar legumes e, assim, durante o tempo da quaresma (tempurae quaresmae), eles poderiam se alimentar fazendo com que continuassem a abstenção de carne vermelha nesses dias que antecedem a páscoa. Comer fritura, para os japoneses, era algo desconhecido, tendo em vista que o óleo era quase que totalmente usado para iluminação. Assim, nasceu um dos principais petiscos que é tão apreciado tanto por brasileiros quanto pelos japoneses. Acesse o link abaixo para ver a matéria completa: <http://redeglobo.globo.com/tvgazetaes/ raizes/noticia/2013/12/prato-tipicamen- te-japones-foi-criado-por-jesuitas-portu- gueses.html> H i s t ó r i a e C u l t u r a B r a s i l e i r a A credito que você já deve ter conhecido alguém que viveu experiência semelhante. Mas seria possível imaginar como isso ocorreu há cinco séculos? As transformações não param por aí. Assim prossegue Freyre (2006, p. 76-77) em sua explicação: No Brasil verificaram-se necessariamen- te no povoador europeu desequilíbrios de morfologia tanto quanto de eficiência pela falta em que se encontrou de súbito dos mesmos recursos químicos de ali- mentação do seu país de origem. A falta desses recursos como a diferença nas condições meteorológicas e geológicas em que teve de processar-se o trabalho agrícola realizado pelo negro mas dirigi- do pelo europeu dá à obra de coloniza- ção dos portugueses um caráter de obra criadora, original, a que não pode aspirar nem a dos ingleses na América do Norte nem a dos espanhóis na Argentina. Conforme foi observado na citação acima, o autor considera a obra dos portugueses em terras americanas algo da magnitude de um grande inventor, de um grande artista. Conforme foi alertado anteriormente nesta unidade, o empreendimento dirigido pelos por- tugueses fora algo sobrenatural, considerando as características desse povo. Por isso, é impor- tante que destaquemos esses fatores essenciais que tornaram a obra colonizadora portuguesa algo muito superior ao que vimos ocorrer no res- tante da América. Em suma, levando em conta os elementos destacados por Freyre (2006), a colonização portuguesa teve um grande êxito. As transformações morfológicas que o autor destacou se referem à deficiência de determi- nadas vitaminas oriundas de alguns alimentos e que os portugueses foram obrigados a abdi- carem ou se adaptarem a outros. Isso obrigou que os organismos desses homens tivessem que trabalhar mais para compensar de alguma forma essa deficiência. Além disso, fatores geográficos e climáticos em que eles tiveram de desempe- nhar as atividades agrícolas os tornou criadores de um processo colonizador original, sem existir nada semelhante ao longo da história. FADO TROPICAL (CHICO BUARQUE) Com avencas na caatinga, Alecrins no canavial, Licores na moringa: Um vinho tropical. E a linda mulata Com rendas do alentejo De quem numa bravata Arrebata um beijo... Ai, esta terra ainda vai cumprir seu ideal: Ainda vai tornar-se um imenso Portugal!27G A S T R O N O M I A • U N I C E S U M A R Outro fator de grande valia que devemos destacar é referente à relação estabelecida entre portugueses, escravos e índios. A primeira imagem que nos vem à cabeça quando se toca nesse assunto é aquela figura medonha e abo- minável do mercador português que ganhou muito dinheiro com o comércio de vidas hu- manas. Certamente que os livros de história que você estudou no Ensino Fundamental e Médio cristalizaram a imagem do português como sendo o ser mais amedrontador e cruel dos humanos. Entretanto, sua relação como os escravos africanos foi muito melhor, muito mais cordial, se comparada aos demais operadores da escravidão ao longo do continente americano. O escravocrata terrível que só faltou transportar da África para a América, em navios imundos, que de longe se adivinhavam pela inhaca, a população inteira de negros, foi por outro lado o colonizador europeu que melhor con- fraternizou com as raças chamadas infe- riores. O menos cruel nas relações com os escravos. É verdade que, em grande parte, pela impossibilidade de constituir- se em aristocracia europeia nos trópi- cos: escasseava-lhe para tanto o capital, senão em homens, em mulheres brancas. Mas independente da falta ou escassez de mulher branca o português sempre pendeu para o contato voluptuoso com a mulher exótica. Para o cruzamento e miscigenação. Tendência que parece re- sultar da plasticidade social, maior no português que em qualquer outro colo- nizador (FREYRE, 2006, p. 265). De fato, afirmações como essas não podem ocorrer sem que haja questionamentos que a coloquem em xeque. Sabemos que a cicatriz histórica deixada pela escravidão é visível. Mas, enquanto no Brasil a miscigenação é vi- sível sem muito esforço, quando observamos outros países da América Latina, percebemos que o que ocorreu no Brasil foi algo sui generis. H i s t ó r i a e C u l t u r a B r a s i l e i r a 29G A S T R O N O M I A • U N I C E S U M A R Vamos dar continuidade aos nossos estudos falando da formação da sociedade brasileira. Como foi destacado no início desta uni- dade, os três elementos básicos dessa formação foram o índio, o português e o negro africano. Dessa forma, vamos apresentar a você como cada uma dessas etnias foram responsáveis por moldar nossas instituições, nossos usos, costumes e outras práticas. O Papel Fundamental de Índios e Negros na Composição da Sociedade e Cultura Brasileira H i s t ó r i a e C u l t u r a B r a s i l e i r a O s nativos americanos que habitavam a região onde hoje se situa o Brasil eram as civilizações mais atrasadas da América. Se compararmos os inú- meros grupos étnicos que aqui habitaram com os Maias, Incas e Astecas, perceberemos que a distância cultural e evolutiva era imensa. Nas palavras de Freyre (2006, p. 158): A colonização europeia vem surpreen- der nesta parte da América quase que bandos de crianças grandes; uma cultu- ra verde e incipiente; ainda na primeira dentição; sem os ossos nem o desenvol- vimento nem a resistência das grandes semicivilizações americanas. Em outras palavras, o que vimos por aqui foi uma luta entre uma civilização adulta e outra em estágio embrionário. O que justificaria tal afirmação? Enquanto as demais civilizações citadas (Maias, Astecas e Incas) construíram verdadeiros impérios, com sistemas de irri- gação, palácios, pirâmides, fortalezas, dentre outros, nossos ancestrais indígenas ainda viviam em uma situação semelhante ao Período Paleolítico. Todavia, para o processo colonizador por- tuguês, bem como à formação de nossa socie- dade, isso não representou qualquer tipo de objeção, tendo em vista a já citada propensão à miscigenação que o lusitano possuía. De todos os processos colonizadores vistos na América, o português foi o que ocorreu de forma mais harmoniosa, em relação aos demais países, quando o assunto é raça. Dentro de um ambiente de quase re- ciprocidade cultural que resultou no máximo de aproveitamento dos valores e experiências dos povos atrasados pelo adiantado; no máximo de contemporiza- ção da cultura adventícia com a nativa, da do conquistador com a do conquista- do. Organizou-se uma sociedade cristã na superestrutura, com a mulher indíge- na, recém-batizada, por esposa e mãe de família; e servindo-se em sua economia e vida doméstica de muitas das tradições, experiências e utensílios da gente autóc- tone (FREYRE, 2006, p. 160). Não diferente, o casamento entre índias e por- tugueses, em regra, foi uma das principais con- tribuições que podemos levar em conta no que diz respeito à formação de nossa identidade cultural. Principalmente quando falamos da influência direta na nossa forma de se compor- tar e também de se alimentar, conforme vamos destacar com maior ênfase na unidade III. Outro grupo étnico de indiscutível impor- tância são os africanos que foram trazidos para cá como escravos. Façamos um teste! Por onde quer que andemos, sem qualquer esforço, ob- servaremos a presença marcante do elemento africano em nossa sociedade. Não estamos nos referindo apenas à cor da pele. Essa influência está na aparência, mas também em nossas in- timidades domésticas e culturais. Na comida, como na utilização da pimenta malagueta, nas 31G A S T R O N O M I A • U N I C E S U M A R manifestações populares, como as Congadas, nas cores de nossas roupas, enfim, a lista é grande e, no que diz respeito à culinária, podere- mos observar com mais detalhes na unidade III deste livro. Em suma, o brasileiro, sem distinção alguma, é fruto dessa miscigenação. Todo brasileiro, mesmo o alvo, de cabelo louro, traz na alma, quando não na alma e no corpo – há muita gente de jenipa- po ou mancha mongólica pelo Brasil – a sombra, ou pelo menos a pinta, do indígena ou do negro. No litoral, do Maranhão ao Rio Grande do Sul, e em Minas Gerais, principalmente do negro. A influência direta, ou vaga e remota, do africano (FREYRE, 2006, p. 367). Ao contrário do que fizeram muitos historia- dores ao analisar a importância do elemento africano, Gilberto Freyre deu destaque à influ- ência deste nas relações da nossa intimidade. É a partir da observação dos escravos domésticos que o autor fundamenta sua tese. Em suma, Freyre se absteve de enfatizar o aspecto da do- minação violenta entre brancos e negros e focou na afetividade criada nas relações da vida pri- vada, em que as escravas desempenharam um papel de extrema importância. Os elementos que justificam essa importância são inúmeros na visão do escritor. Na ternura, na mímica excessiva, no catolicismo em que se deliciam nossos sentidos, na música, no andar, na fala, no canto de ninar menino pequeno, em tudo que é expressão sincera de vida, trazemos quase todos a marca da influ- ência negra. Da escrava ou sinhama que nos embalou. Que nos deu de mamar. Que nos deu de comer, ela própria amo- lengando na mão o bolão de comida (FREYRE, 2006, p. 367). H i s t ó r i a e C u l t u r a B r a s i l e i r a Eu gostaria que você, estudante do curso de gastronomia da UNICESUMAR, refletisse muito sobre a citação acima! Observe como a narrativa nos dá uma sensação de calor, de clima tropical. Imaginar as diversas cenas retratadas por Freyre não é algo impossível. A narrativa da importân- cia das escravas domésticas é um dos pontos fundamentais da obra de Freyre. Uma das fi- guras mais importantes são as populares Ama de Leite, que são aquelas mulheres que ama- mentam os filhos de outras. Vale lembrar que, naquele contexto, não havia qualquer condição para que houvesse programa de doação de leite, como conhecemos hoje, e a única saída para aquelas mães que não conseguiam amamentar de forma suficiente seus filhos era utilizando essas mulheres. Nesse sentido, entendemos a grande importância do escravo no ambiente doméstico de nossa sociedade. Era tambémessas escravas que alimenta- vam os filhos pequenos do Senhor de Engenho. Eram elas que desempenhavam a função de babás, que preparavam o alimento, que mistu- ravam no prato, que esfriavam para não queimar a boca da criança, enfim, são muitas as relações desenvolvidas por essas mulheres escravas que tanto foram e ainda são importantes para nossa cultura. Para o propósito deste livro, precisamos entender a influência do elemento africa- no à mesa do brasileiro. Para tanto, precisa- mos compreender que o escravo, como servo doméstico, consiste no principal fator dessa análise. Entretanto, não podemos também cair no senso comum de acharmos que o trabalho dos negros africanos necessitava de pouco do- mínio técnico ou intelectual e, dessa forma, seria inferior. A importância desse grupo étnico ultrapassa, e muito, essa percepção. O Brasil não se limitou a recolher da África a lama de gente preta que lhe fe- cundou os canaviais e os cafezais; que lhe amaciou a terra seca; que lhe comple- tou a riqueza das manchas de massapê. Vieram-lhe da África “donas de casa” para seus colonos sem mulher branca; técnico para as minas; artífices em ferro; negros entendidos na criação de gado e na indústria pastoril; comerciantes de panos e sabão; mestres, sacerdotes e ti- radores de reza maometanos (FREYRE, 2006, p. 391). A citação acima mostra que muitos negros que possuíam especialidades foram introduzidos no Brasil. E isso contribui, de forma significativa, na composição de nossa sociedade. O papel de- sempenhado pelos negros foi muito além do seu simples emprego nas atividades pesadas, como o plantio e a colheita. A relação entre senhores e os escravos do- mésticos no Brasil foi algo muito diferente do que se viu em outras regiões da América. Na verdade, era da Senzala que saíam aquelas pes- soas a quem seriam confiadas as tarefas mais importantes. Imagine: quando já fores um pro- fissional da área de gastronomia, respeitado e 33G A S T R O N O M I A • U N I C E S U M A R responsável (ou, quiçá, dono) de um grande restaurante, você contrataria uma pessoa que lhe despertasse qualquer tipo de desconfiança? Você seria capaz de colocar dentro da cozinha de seu restaurante uma pessoa que pudesse colocar em risco a vida de seus clientes e funcionários? Claro que não! Por isso que reiteramos que a relação entre senhores e escravos domésticos não poderia ser diferente. A casa-grande fazia subir da senzala para o serviço mais íntimo e delicado dos se- nhores uma série de indivíduos – amas de criar, mucamas, irmãos de criação dos meninos brancos. Indivíduos cujo lugar na família ficava sendo não o de escra- vos, mas o de pessoas de casa. Espécie de parentes pobres nas famílias europeias. À mesa patriarcal das casas-grandes sen- tavam-se como se fossem da família nu- merosos mulatinhos. Crias. Malungos. Moleques de estimação. Alguns saíam de carro com os senhores, acompanhando- -os aos passeios como se fossem filhos (FREYRE, 2006, p. 435). Em suma, o que queremos deixar evidente é que nas relações sociais, o negro foi muito além do que apenas um mero executor de tarefas. Ele foi, acima de tudo, um ser responsável por dar contornos à nossa cultura. Juntamente com os outros elementos étnicos, formaram a base de nossa civilização e isso vamos sentir de forma mais intensa quando estudarmos mais especi- ficamente toda essa relação com a culinária, na última unidade deste livro. H i s t ó r i a e C u l t u r a B r a s i l e i r a E nfim, chegamos ao final de nossa pri- meira unidade. Precisamos deixar claro a você, aluno(a) do curso de Gastronomia da EaD-UNICESUMAR, que nosso obje- tivo nesta unidade foi pavimentar o caminho que percorreremos na busca de compreender melhor a dinâmica da sociedade brasileira, a partir dos três principais elementos que marcaram nossa vida colonial: europeu, índio e africano. Primeiramente, gostaríamos de deixar claro que não existem verdades absolutas quando o assunto é Ciências Humanas, dessa forma, cada afirmação que fora feita nesta unidade é suscetível de contestação. Embora essa seja uma questão metodológica que foge do nosso propósito, precisamos esclarecer para evitar que conclusões errôneas sejam tiradas. No que diz respeito à composição social do Brasil, o que temos de ter em mente foi a carac- terística de uma sociedade miscigenada. Muito mais do que fora vista em outras regiões ame- ricanas que houve, em linhas gerais, o mesmo tipo de exploração. Um dos fatores que mais pesou em favor dessa característica foi a pró- pria propensão dos portugueses a se relacionar. Ou seja, como ficou evidente, o português não possuía um orgulho racial assim como possuíam outras nações que empreenderam conquistas em solo americano. Já da parte da população nativa, esta exer- ceu um fascínio muito grande no colonizador português. A atração sexual que a mulher indí- gena despertou, somada aos fatores climáticos que favorecem o florescimento da volúpia, tor- naram os portugueses obcecados pela beleza humana natural. Além disso, a relação resultou em casamentos e que, pouco a pouco, os vários elementos culturais foram se disseminando e caracterizando uma nova cultura. Já da parte dos africanos, a importância destes vai muito além do que o trabalho forçado nas lavouras de cana-de-açúcar, na exploração aurífera, ou nas plantações de café. A importân- cia desse grupo étnico está, acima de tudo, na composição da vida íntima da sociedade colonial brasileira. Os escravos domésticos foram os que contribuíram de forma significativa para que isso fosse possível. Sendo assim, a partir de agora, vamos ob- servar como cada um desses elementos está todos os dias diante nós, nas mesas de nossas casas, nos restaurantes, nas vestimentas, bem como espalhada por esse país de dimensões continentais. co ns id er aç õe s fi na is 35G A S T R O N O M I A • U N I C E S U M A R 1. Explique a razão pela qual o empreendimento colonizador português pode ser considerado, na visão de Freyre, uma obra de magnitude ímpar. 2. Descreva a importância que os escravos domésticos tiveram durante o Período Colonial. 3. Qual foi o fator que facilitou a interação étnica por parte dos portugueses? at iv id ad e de e st ud o H i s t ó r i a e C u l t u r a B r a s i l e i r a Sobre a população de Portugal, visite o site: <http://lusotopia.no.sapo.pt/indexPTPopulacao.html> Sobre o Brasil Holandês, acesse: <http://www.historiabrasileira.com/brasil-colonia/brasil-holandes/> Hoje, o debate acerca de terminologias como etnia, raça, cor etc. está muito em evidência. Entretanto, na década em que as principais obras citadas neste livro foram escritas, esses debates não estavam em pauta, dessa forma, esse assunto poderá ser melhor esclarecido no endereço: <http://www.scielo.br/pdf/dpjo/v15n3/15.pdf> Sobre o paleolítico, acesse: <http://www.suapesquisa.com/pesquisa/paleolitico.htm>. Sobre as Congadas da Lapa, no Estado do Paraná, acesse: <https://hemi.nyu.edu/unirio/studentwork/imperio/projects/betolanza/betolan- zawork.htm>. m at er ia l c om pl em en ta r 37G A S T R O N O M I A • U N I C E S U M A R m at er ia l c om pl em en ta r A FORMAÇÃO DO BRASIL CONTEMPORÂNEO Autor: Caio Prado Júnior Editora: Companhia das Letras Sinopse: Essa obra é um clássico sobre a formação do Brasil, feita pelo historiador paulista Caio Prado Júnior e lançada, originalmente, na década de 1940. O autor faz uma análise em que busca o sentido de nossa existência enquanto país. Sua obra faz uma abordagem da história sob a perspectiva do materialismo histórico de Marx. CASA GRANDE & SENZALA Autor: Gilberto Freyre Editora: Global Ano da Edição: 2006 Sinopse: Essa foi a principal obra de referência desta pri- meira unidade. O autor dá ênfase ao caráter miscigenado da sociedade brasileira,bem como à contribuição dos três elementos principais (europeu, índio, africano) na formação de nossa sociedade. H i s t ó r i a e C u l t u r a B r a s i l e i r a O Capitão, quando eles vieram, estava senta- do em uma cadeira, aos pés uma alcatifa por estrado; e bem vestido, com um colar de ouro, mui grande, ao pescoço. E Sancho de Tovar, e Simão de Miranda, e Nicolau Coelho, e Aires Corrêa, e nós outros que aqui na nau com ele íamos, sentados no chão, nessa alcatifa. Acenderam-se tochas. E eles entraram. Mas nem sinal de cortesia fizeram, nem de falar ao Capitão; nem a alguém. Todavia um deles fitou o colar do Capitão, e começou a fazer acenos com a mão em direção à terra, e depois para o colar, como se quisesse dizer-nos que havia ouro na terra. E também olhou para um castiçal de prata e assim mesmo acenava para a terra e novamente para o castiçal, como se lá também houvesse prata! Mostraram-lhes um papagaio pardo que o Capitão traz consigo; tomaram-no logo na mão e acenaram para a terra, como se os houvesse ali. Mostraram-lhes um carneiro; não fizeram caso dele. Mostraram-lhes uma galinha; quase tiveram medo dela, e não lhe queriam pôr a mão. Depois lhe pegaram, mas como espantados. Deram-lhes ali de comer: pão e peixe cozido, confeitos, fartéis, mel, figos passados. Não qui- seram comer daquilo quase nada; e se provavam alguma coisa, logo a lançavam fora. Trouxeram-lhes vinho em uma taça; mal lhe puseram a boca; não gostaram dele nada, nem quiseram mais. Trouxeram-lhes água em uma albarrada, provaram cada um o seu bochecho, mas não beberam; apenas lavaram as bocas e lançaram- na fora. Trecho da carta de Pero Vaz de Caminha, em que relata a reação dos indígenas frente a alguns itens que se tornariam usuais na comida brasileira. Disponível em: <http://educaterra.terra.com.br/voltai- re/500br/carta_caminha.htm>. Acesso em: 21 out. 2014. Comida e Civilização: A Importância do Ato de Comer na Formação da Identidade Cultural Brasileira KLEBER EDUARDO MEN A seguir, apresentam-se os tópicos que você estudará nesta unidade: • A refeição enquanto formadora da rotina dos brasileiros • Uma interpretação sociológica da alimentação • Economia, sociedade e cultura • Entender a relação entre a alimentação e o comportamento social brasileiro. • Estudar as bases sociológicas da cozinha brasileira. • Compreender como a gastronomia está intimamente ligada à formação de nossa identidade cultural. • Observar como economia, sociedade e cultura são fatores essen- ciais para compreender as relações humanas. Plano de Estudo Objetivos de Aprendizagem IntroduçãoIntrodução O objetivo principal desta nossa unidade será apresentar ao aluno da EaD UNICESUMAR os elementos sócio-antropológicos que permeiam a cultura alimentar do Brasil. Ou seja, vamos enfatizar os fatores sociais e a forma como eles estiveram ligados à própria essência biológica dos seres humanos, pois, como todos sabemos, o ato de comer é uma necessidade fisiológica, não apenas social. Como na primeira unidade, fizemos um estudo sobre os elementos étnicos responsáveis pela formação da sociedade brasileira, vamos fazer uma abordagem mais centrada nas relações humanas, tanto no que diz respeito à história, como à sociologia e à antropologia, bem como sobre a relação de todos esses elementos com o comportamento do brasileiro com relação a alimentação. Nesse sentido, vamos buscar destacar a importância da alimentação enquanto um elemento do comportamento social; como essa influência é vista sob a ótica da sociologia; e, além de tudo, compreender como a dinâmica da vida esteve ligada à formação de conceitos que influenciaram na estrutura física de nossa cozinha. Nesse sentido, precisamos entender que é necessário refletir em todas as nossas práticas culturais e buscar o sentido e o significado de cada uma delas na composição de nossas vidas, principalmente no que diz respeito à alimentação. 41 H i s t ó r i a e C u l t u r a B r a s i l e i r a 43G A S T R O N O M I A • U N I C E S U M A R Existem temas que são praticamente impossíveis de se tratar sem recorrer aos velhos clássicos. Quando um livro tem uma função informativa, no sentido de discutir alguns usos e costumes, e não o de sugerir uma visão inovadora, corre o risco de errar menos aquele que se propõe a fazer um estudo que aborde autores que possuem respeito e que são conhecidos por obras primas no tema que se propõem analisar. Nesse caso, para compreender como a refeição foi e ainda é importante na formação da rotina de nossas vidas, torna-se obrigatória uma análise da obra do escritor potiguar Luís da Câmara Cascudo. A Refeição Enquanto Formadora da Rotina dos Brasileiros H i s t ó r i a e C u l t u r a B r a s i l e i r a O horário alimentar dos seres humanos está ligado ao nosso instinto de caça- dor. Desde antes do advento do ser humano enquanto membro de uma sociedade, esse homem já adaptava sua vida às condições naturais. Dessa forma, antes de ser uma relação social, o horário alimentar surgiu das necessidades fisiológicas. As refeições nasceram condicionadas ao horário natural. Antes de deixar a casa, começando pela caverna paleolítica, o homem de Neanderthal comia. Na força do meio-dia, os animais descansam. Especialmente, nos climas quentes. Ao anoitecer, o regresso à cabana impõe o cibo noturno. Os caçadores comem du- rante a caçada, mas não podem mudar o horário lógico. Ao meio-dia, os animais desaparecem. O caçador da noite, espera ou procura, deve ir alimentado. Ao redor desses três momentos, decorre a ementa da nutrição humana no seu plano normal (CÂMARA CASCUDO, 2011, p. 659). Como foi possível perceber, antes do almoço, estar atrelado à sirene das fábricas, ao ritmo do relógio ponto, ele está ligado às condi- ções biológicas, naturais dos seres humanos. Comemos ao meio-dia, não porque convenções trabalhistas decidiram, mas porque esse era um horário improdutivo em eras longínquas, em que de nada adiantava o caçador-coletor correr atrás de sua presa, pois ele não obteria sucesso algum em encontrá-la, gastando ener- gia desnecessária. Entretanto, precisamos compreender que, atualmente, com o advento da revolução industrial que nos proporcionou uma verda- deira revolução no processo de conservação dos alimentos, ainda estamos, de alguma forma, atados ao nosso passado Neanderthal. Mas cada região, cada continente, organiza sua vida conforme o horário das refeições, adaptando a sua realidade e batizando-as segundo sua conveniência, como foi o caso do Brasil. Escritor e folclorista, Luís da Câmara Cascudo nasceu em Natal, Rio Grande do Norte, em 30 de dezembro 1898, e faleceu na mesma cidade, em 30 de julho de 1986. É um dos mais importantes pesquisadores das raízes étnicas do Brasil. Dentre suas principais obras, destacam-se “Dicionário do Folclore Brasileiro” (1954); “História da Alimentação no Brasil” (1967); “História dos nossos gestos” (1976). Ele foi, como muitos disseram, aquele que melhor ex- plicou a alma do brasileiro. Saiba mais em: <http://basilio.fundaj.gov.br/ pesquisaescolar/index.php?option=com_con- tent&view=article&id=304&Itemid=191>. Acesso em: 26 out. 2014. 45G A S T R O N O M I A • U N I C E S U M A R Os nomes é que podem ter outras significações, mas nunca finalidades diversas. Almoço é a primeira comida na Europa, ad morsus, a dente, comen- do às dentadas, rapidamente. Para nós é o café matinal, sempre acompanha- do, café de duas mãos, como dizem os caipiras de São Paulo. O que dizemos almoço diz o europeu jantar e para nós a ceia é idêntica na Europa, ter- minando o dia (CÂMARA CASCUDO, 2011, p. 659). É importante destacar que cada cultura dá nomes diferentes as suas práticas. O que se percebe na citação acima é que a expressão “almoço” pode ter sua origem explicada em diversas situações,como fora mostrado acima. Além disso, cada qual nomeia suas refeições conforme o costume local. Em suma, o autor prossegue: De Portugal tivemos essas denomina- ções. Almoço, jantar, ceia. Criamos uma, a primeira comida da manhã, que cha- mamos o café, e que é o pequeno almoço. Denominação das últimas décadas do século XVIII. O almoço para nós é um tanto antes ou depois do meio-dia e é o jantar europeu, tradicional (CÂMARA CASCUDO, 2011, p. 660). Para termos uma ideia de como as refeições estão atreladas às condições naturais, Câmara Cascudo (2011) enfatiza que até mesmo entre os indígenas havia refeições com os horários semelhantes aos europeus, entretanto, com nomes próprios de sua cultura linguística. Nas palavras do autor, parece ser o café da manhã uma obra brasileira. Café no sentido estrito. Seja isso verdade ou não, de fato, essa é considerada por muitos especialistas como sendo a principal refeição do dia. Para este autor, o café, acompanhado de qualquer coisa de que se pudesse mastigar, ou o “café de duas mãos”, como era denominado pelos caipiras de São Paulo, foi introduzido por volta de 1750 e necessitou de muito tempo até que fosse popularizado (CÂMARA CASCUDO, 2011). É difícil estipular corretamente a data do início dessa prática alimentar. Pelo que per- cebemos, o café da manhã se popularizou no Brasil por volta do século XIX. Embora a data estipulada por Câmara Cascudo seja 1750, além de carecer de maior precisão, o fato é que essa refeição, hoje, é presença marcante em nosso dia a dia. Sair de casa sem praticar o desjejum não é algo muito prudente do ponto de vista da saúde. A segunda refeição do dia, o almoço, já representou em nossa sociedade um mo- mento de união no ambiente doméstico. Era bem comum, nos tempos antigos, as famílias ser reunirem em torno da mesa nas prin- cipais refeições, como o almoço e o jantar. Atualmente, devido à correria e à intensifi- cação das atividades, esses momentos estão cada vez mais raros. Todavia, o almoço era visto sob vários ângulos, conforme o que era servido, quando se tratava da sua definição enquanto refeição: H i s t ó r i a e C u l t u r a B r a s i l e i r a ovos mexidos. Sendo assim, o importante é percebermos como nosso comportamento social está atre- lado às questões biológicas, como é o caso das refeições. No decorrer de nosso estudo, vamos apresentar outras situações curiosas. COMEMOS O PÃO QUE O MINEIRO AMASSOU Farinha, água e sal: essenciais para a manu- tenção do corpo, base da alimentação de grande parte da humanidade. Sinônimo de civilização, símbolo da vida. O pão surgiu em tempos imemoriais, mistura de grãos moídos e água, assada sobre pedras quen- tes. Alimento básico do Egito, com ele paga- va-se salário: um dia de trabalho valia três pães e dois cântaros de cerveja. Egípcios foram os primeiros a usar fornos e acres- centar fermento à massa para torná-la mais leve e macia. No Brasil, a arte da panificação firmou-se no início do século XX, com a che- gada dos imigrantes italianos. O Sociólogo Gilberto Freyre conta que, antes, em tempos coloniais, comia-se tapioca. Hoje, espalha- se pelo país a deliciosa invenção saída dos fornos mineiros, o pão de queijo. Fonte: Almanaque Brasil de Cultura Popular. Edição Especial de Professor. Positivo, 2004. <www.almanaquebrasil.com.br>. Almoço de carne fresca, quando havia matança no local, almoço de peixe, almoço de caça, almoço branco, quando de féculas. Nos dias de desmancha, de fa- rinhada, fazem beijus, grossos, pesados de amido, tapioca (beijus finos), bolos de mandioca, e constituem refeição, com manteiga, leite de coco, e menor quantidade de gado, farinha de crueira, entrando a carne em porção diminuta (CÂMARA CASCUDO, 2011, p. 665). Prezado(a) aluno(a), chamo a atenção para o seguinte fato: atualmente, o almoço deixou de ser algo relacionado à vida doméstica e se tornou um evento social, mais relacionado ao networking. Ou seja, as pessoas fizeram dessa refeição um momento para que sua rede de con- tatos pudesse ser aumentada. Negócios são fechados, decisões são toma- das, estratégias são traçadas, tudo isso regado por muita comida e bebida de boa qualida- de. Aliás, esse costume de comer bebendo é algo exclusivamente europeu. Os árabes e quase todos os orientais costumavam beber apenas após as refeições. Falar à mesa era algo também exclusivo dos europeus (CÂMARA CASCUDO, 2011). Enquanto o almoço parecia ser a refeição mais importante e diversificada, percebemos que o jantar já não era revestido de tanto gla- mour. Este, geralmente, nas cidades, era iniciado com sopas e, ao final, um caldo engrossado com farinha. Já a ceia era servida ao anoitecer e era uma mistura das sobras do jantar acrescida de 47G A S T R O N O M I A • U N I C E S U M A R Uma das combinações preferida dos brasileiros. Café da Manhã com pão de queijo. H i s t ó r i a e C u l t u r a B r a s i l e i r a 49G A S T R O N O M I A • U N I C E S U M A R A Sociologia é a ciência que tem por finalidade estudar, em linhas gerais, o comportamento do homem em sociedade, bem como este se relaciona com o meio onde vive, alterando o ambiente conforme suas necessidades. Podemos dizer, de forma simplificada, que a relação do homem em sociedade é o objetivo central das Ciências Humanas. Uma Interpretação Sociológica da Alimentação H i s t ó r i a e C u l t u r a B r a s i l e i r a A credito que você, estudante do curso de Gastronomia da UNICESUMAR, deve ter vivido situações parecidas com essas descritas anteriormente, principalmente se você já mora há muito tempo em uma mesma região. Se você der uma volta ao redor da quadra onde vive, perceberá que as transformações ocorridas por ali foram intensas, caso se lembre dos primeiros momentos vividos nessa região. Entender a alimentação sob a ótica da Sociologia implica entendê-la como fator de- terminante para o estabelecimento das relações sociais, principalmente no que diz respeito à formação da sociedade brasileira. Afinal, comer é mais do que um ato de suprir nossas necessi- dades fisiológicas. Comemos para fazer amigos, para celebrar, para conquistar a pessoa amada, para retribuir um favor, enfim, são inúmeros os eventos em que nós utilizamos a gastronomia para interagirmos. Desse modo, onde há ser humano, há curiosidade, assim, é importante buscarmos compreender toda a gênese socio- lógica da alimentação: A documentação clássica testifica que a Culinária era um interesse legítimo como indagação, exposição exegese. Não apenas dos que a praticavam como profissão mas dos espíritos argutos e curiosos da Antiguidade, pesquisando a geografia dos alimentos e o panorama das técnicas cozinheiras, não apenas am- pliando o conhecimento de uma ciência agradável, inseparada da vida humana, mas analisando a natural ligação entre a maneira de preparar o alimento e o nível da civilização circunjacente (CÂMARA CASCUDO, 2011, p. 342). A alimentação, ou seja, o ato de comer, fora entendida sob diversos ângulos ao longo de nossa história. Na Roma Antiga, os imensos banquetes eram luxuosos e ostentavam poder. Com vinhos e comida em abundância, os par- ticipantes comiam até vomitarem. Na Idade Média, com a influência da Igreja Católica, comer exageradamente se tornou pecado capital. O pecado da Gula. Jejuns, abstinências, evitação dos pra- zeres da mesa são recomendações cons- tantes. No século XIII, Dante Alighieri sacudiu o pobre Ciacco, pela danosa colpa dela gola, no terceiro círculo do inferno, sob a chuva eterna, maladetta, fredda e greve, culpado do repugnante excesso da gastrimargia, ou ventris ingluviae, como definia o Papa São Gregório Magno (CÂMARA CASCUDO, 2011, p. 343). Prezado(a) aluno(a), a figura do pecado da gula é algo que até hoje está presente no imaginá- rio popular. Haviauma crença popular, da qual ouvia meu avô falar de que a Igreja havia conde- nado a gula para aliviar o coração das pessoas que não podiam comer. Era uma questão de recompensa. Se comer demais é pecado, certa- mente, quem come menos tem maiores chances de ir para o céu. Mas isso é apenas sabedoria popular. 51G A S T R O N O M I A • U N I C E S U M A R Maurício era estudante do Ensino Fundamental de uma escola situada na cidade de Curitiba. Ele era um menino muito querido pelos colegas. Certo dia, um de seus colegas de classe, Jacob, o convidou para ir até sua casa e o que Maurício presenciou o deixou muito intrigado. Uma das coisas que mais estranhou Maurício foi o fato de na casa de Jacob, que era judeu, haver uma pia com duas cubas, armários de cores diferentes, ta- lhares e louças diferentes, bem como os diversos compartimentos para se guardar alimentos. Maurício indagou Jacob, per- guntando-lhe a razão para tudo isso, e o colega respondeu que era em razão do costume judaico de não misturar carne com os derivados de leite. Ou seja, o garoto não poderia comer strogonoff, nem comer um hambúrguer acompanha- do de um milk shake. Maurício, então, percebeu como o mundo era repleto de costumes e pes- soas que comungavam de culturas dife- rentes. Mas grande lição tirada por ele foi que cada um possui sua forma de se comportar e, se esta não é prejudicial a ninguém, devemos todos respeitar uns aos outros. Fonte: Caso fictício criado pelo autor do livro H i s t ó r i a e C u l t u r a B r a s i l e i r a terem capacidade plena de se defenderem, caso venha um outro animal e lhe ameace roubar seu alimento. Acreditamos, sem sombra de dúvidas, que em algum momento de sua vida há ma- ravilhosas lembranças da família reunida, no natal, páscoa, nos almoços de domingo, nos jantares comemorativos, enfim. Certamente que alguma lembrança relacionada às refei- ções deve fazer parte de sua história. Além de satisfazer, a refeição, em sentido lato, possui o dever de educar. O jantar, assim, é o responsável por modelar o ambiente familiar tradicional. A função educadora do jantar é tão in- substituível quanto o poder modelador do ambiente familiar, sadio e normal. Se entenderem moderador; também está certo. As aulas divergem do horário caseiro e aos domingos há programas intransferíveis, incoincidentes com o almoço materno (CÂMARA CASCUDO, 2011, p. 350). Dessa forma, precisamos compreender que comer é, antes de tudo, para nossa sociedade, um ato pelo qual se educa. Costumes e tradição são passados por gerações. Quem é que não tem um costume de fazer determinada refeição em certo dia da semana? Assim, de pai para filho, de avô para neto, nossa forma de interagir por meio das refeições vai se tornando nossa marca registrada. De fato, precisamos compreender que os alimentos estão longe de apenas nos fornecer os nutrientes básicos à nossa sobrevivência. Assim como o sexo não é visto mais apenas como uma forma de procriação, o ato de comer nos fornece mais do que energia, nos fornece prazer. Inútil pensar que o alimento contenha apenas os elementos indispensáveis à nutrição. Contém substâncias impon- deráveis e decisivas para o espírito, ale- gria, disposição criadora, bom humor. Como temos o argumento “científico” de comparar o homem aos modelos zoológicos, olhai como os animais se alimentam! Com lentidão e majestade, os tipos mais altos na escala. Pachorra, vagar delicado, prazer ruminativo, olhos vagos, focinho ao léo. Nenhum come velozmente senão os inferiores, desarmados para a luta competidora, ratos, lebres, antílopes. Leões, búfa- los, elefantes, gorilas, sabem comer! A urgência é inversamente proporcio- nal à consciência da força possuída (CÂMARA CASCUDO, 2011, p. 349). Gostaria que você refletisse nessa citação acima. Câmara Cascudo (2011) faz uma re- lação entre os homens e os animais e nos mostra que, quanto maior é o animal, maior é a sua ritualística alimentar. Conforme ficou evidente, os animais, assim como os seres humanos, comem para dar prazer. Os ani- mais que comem de forma lenta são aqueles que possuem mais “poder” entre os demais. Os inferiores comem rápido apenas por não 53G A S T R O N O M I A • U N I C E S U M A R As canções costumam retratar situações verídicas ou fanta- siosas. Não poderia ser diferente com a comida e sua função de interagir pessoas. Um exemplo disso é a canção de Chico Buarque de Holanda, Feijoada Completa, lançada em 1978. Mulher, você vai gostar: Tô levando uns amigos pra conversar. Eles vão com uma fome Que nem me contem; Eles vão com uma sede de anteontem. Salta a cerveja estupidamente Gelada pr’um batalhão E vamos botar água no feijão. Mulher, não vá se afobar; Não tem que pôr a mesa, nem dá lugar. Ponha os pratos no chão e o chão tá posto E prepare as linguiças pro tiragosto. Uca, açúcar, cumbuca de gelo, limão E vamos botar água no feijão. Mulher, você vai fritar Um montão de torresmo pra acompanhar: Arroz branco, farofa e a malagueta; A laranja-bahia ou da seleta. Joga o paio, carne seca, Toucinho no caldeirão E vamos botar água no feijão. Mulher, depois de salgar Faça um bom refogado, Que é pra engrossar. Aproveite a gordura da frigideira Pra melhor temperar a couve mineira. Diz que tá dura, pendura A fatura no nosso irmão E vamos botar água no feijão H i s t ó r i a e C u l t u r a B r a s i l e i r a Comida e Identidade Cultural Quando viajamos, a primeira imagem que nos vem a mente são os roteiros gastronômicos que determinado passeio nos proporciona. Por exemplo, para quem não vive em região litorânea, pensar em férias de verão, logo nos vem a mente uma imagem da praia, por- ções de camarão, cerveja gelada, caipirinha, espetinhos de carne, enfim, tudo isso, regado a muita conversa e diversão e não podendo faltar calor e sol. É claro que nem todos praticam essas atividades, longe disso, mas pela quantidade de pessoas que vemos nas praias durante o verão, já é o suficiente para compreendermos qual é o cardápio de uma parcela significativa dos brasileiros durante essa estação. Camarões empanados com batatas fritas, um dos pratos mais apreciados no litoral brasileiro. 55G A S T R O N O M I A • U N I C E S U M A R Assim também é a relação das pessoas que viajam para outro país. Se for até a Argentina, o famoso bife de chorizzo é prato indispensável para se iniciar na cultura culinária de nossos Hermanos, além de um bom vinho, é claro! Se, por acaso, for visitar a região da Patagônia, os pratos são diversos. O meu preferido foi o cor- deiro patagônico, temperado com ervas finas e acompanhado com batatas fritas. Assim, também, ao viajar pelo Brasil, cada região possui sua característica alimentar. Ao viajar pela Bahia, o azeite de dendê, o acarajé, bobó, tudo isso deve fazer parte do cardápio do viajante. No Rio Grande do Sul, o churras- co, como já mencionamos na unidade anterior, parece ser o mais tradicional prato, além da Bife de Chorizzo fortíssima influência italiana e alemã que esse estado possui. Entretanto, qualquer lugar que seja seu destino, vemos dominados pelos restaurantes de fast food. É quase impossível não encon- trar nas diversas regiões do mundo, exceto nos países em que o mercado é extremamen- te fechado, restaurantes como McDonald’s e Burguer King, além de inúmeras outras fran- quias do serviço de alimentação. Assim, cabe a seguinte indagação: uma cultura regional, diversificada, vai perdendo espaço cada vez mais para a massificação da sociedade con- temporânea? Não queremos aqui fazer jul- gamentos, mas um debate acerca do tema é bastante apropriado. H i s t ó r i a e C u l t u r a B r a s i l e i r a A cozinha de território, (...), somente hoje alcançou um estatuto cultural forte, passando por uma trajetória como a da globalização alimentar,
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