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Cinemática do Trauma Introdução O trauma é uma doença provocada por uma lesão ou ferida súbita que promove uma alteração fisiológica ou estrutural. Ele constitui a principal causa de morte nas faixas etárias mais jovens e o estudo dos mecanismos cinéticos que o envolvem, permite prever as lesões mais prováveis apresentadas pelo doente e, com isso, orientar a avaliação da cena e suas intervenções.Quando o socorrista garante sua segurança e dos presentes e presta o socorro às vítimas, ele realiza a extração do máximo de informações sobre as circunstâncias do acidente. Fases da Cinemática do Trauma A avaliação dos mecanismos do trauma compreende uma frase pré-evento, a fase do evento ou colisão e uma fase pós-colisão, sendo importante colher as informações durante essas três fases. Fase pré-evento: é o momento em que se investiga todo evento que precedeu o trauma. Os principais pontos investigados são: o uso de drogas (lícitas ou ilícitas), pois podem interferir no estado de consciência do doente; medicações, que podem agir no débito cardíaco e predispor a situações de choque (betabloqueadores); comorbidades apresentadas e presença de óbito na cena (que pode indicar trauma de grande energia). Fase do evento: é quando se questionam sobre a ocasião do trauma. É importante investigar sobre a direção, força e efeito da força do trauma sobre o doente. Além de questões como uso de sistemas de proteção e se o objeto com que colidiu estava em movimento ou estacionário. Vale destacar também o teorema da energia cinética em que a velocidade possui expoente 2 e, por isso, um pequeno aumento da velocidade veicular pode impactar drasticamente nas lesões ao doente. Fase pós-evento: etapa que se inicia ao fim do evento traumático, sendo o período em que se utilizam das informações colhidas para fornecer o entendimento da cinemática do trauma e como a troca energética pode ter fornecido alterações anátomo-fisiológicas no paciente. Fisiopatologia Transferência de energia: a transferência de energia para o paciente é maior quanto menor e mais rápida for a parada. Por exemplo, em uma queda sobre a neve, há amortecimento de parte do impacto, pois a superfície elástica permite a dissipação prolongada da energia, como ocorre na colisão com airbag. Porém, caso o paciente caia sobre o chão ou seja ejetado em direção ao asfalto, a colisão promove troca de energia imediata e consequentemente tende a gerar maior dano. Densidade: a densidade diz respeito à razão de massa pelo volume, sendo que quanto mais denso for o objeto, mais ele pode transferir energia. Área de contato: a área de contato com o objeto determina o tipo de trauma, uma vez que uma menor área de contato concentra a transferência de energia a um único ponto, gerando então um trauma penetrante. Cavitação: consiste na cavidade criada no momento em que se transfere a energia, podendo ser temporária ou permanente. A cavitação temporária é aquela causada pelo afastamento temporário dos tecidos, que logo voltam à conformação anatômica e não é percebida ao exame dada a elasticidade tecidual, como ocorre numa fratura de costelas ou num acidente automobilístico. Por outro lado, a cavitação permanente ocorre quando há menor elasticidade, formando uma cavitação temporária inicial mas que se mantém, como na perfuração muscular por um projétil de arma de fogo. Cisalhamento: apesar de não provocar cavitação permanente como no trauma penetrante, o trauma contuso pode gerar lesões por forças de cisalhamento. O principal exemplo é na rotura ou transecção de aorta no trauma automobilístico, em que a aceleração e desaceleração do coração promove uma torção na aorta, que é fixada à parede posterior, resultando na ruptura dessa artéria, o que resulta em morte antes mesmo de o atendimento em mais de 80% dos pacientes. Outro exemplo ocorre nos pedículos de órgãos abdominais como o baço, podendo resultar na ruptura. Acidentes Automobilísticos Acidentes com automóveis são marcados por três fases de lesão, uma primeira que inclui a colisão do veículo com o objeto, a segunda que é a colisão do ocupante com o veículo e a terceira que é a colisão dos órgãos contra a parede e contra outros pontos de fixação. Colisão frontal: esse tipo de lesão é subdividido em impacto frontal com deslocamento para cima e impacto frontal com deslocamento para baixo. ⇒ Impacto com deslocamento para cima: no primeiro momento, o movimento carrega o corpo da vítima para cima e para frente, resultando em um choque do crânio contra o painel (sinal do ‘’olho de boi’’), podendo promover lesões cranioencefálicas e cervicais. No segundo momento, o tórax e o abdome colidem com o Gabriel Torres→ Uncisal→ Med52→ Cinemática do Trauma volante e, em um terceiro momento, o deslocamento dos órgãos pode promover esmagamento e cisalhamento, resultando em lesões diversas. Pode ocorrer rotura de aorta pelo cisalhamento, importante causa de morte na cena de trauma. Além disso, há o esmagamento pulmonar, em que o fechamento da glote e o choque da parede torácica promovem aumento da pressão intratorácica, resultam no pneumotórax hipertensivo (efeito ‘’paper bag’’, por assemelhar ao estouro de um saco de papel com a pressão). Por fim, a laceração de vísceras abdominais como baço, fígado e rins pelo cisalhamento, gerando lesões no hilo do órgão. ⇒ Impacto com deslocamento para baixo: nesse tipo de impacto, o corpo é deslocado para baixo de modo que a cabeça pode colidir com o volante, assim como o tórax e o abdome (podendo gerar lesões), com destaque para o membro inferior que bate no painel. Nesse tipo de lesão, há grande lesão do segmento inferior, sendo o principal ponto de impacto da energia o fêmur, podendo resultar em fraturas ou luxações que podem comprometer as artérias femoral ou poplítea. Também são comuns fraturas ou luxações dos outros ossos do membro inferior, além de entorses e rupturas de ligamentos. Colisão posterior: no impacto traseiro, há um veículo bala (mais rápido) e o veículo alvo (lento ou inerte), nessa colisão, há tendência de flexão cervical no veículo bala e hiperextensão no veículo alvo. Esse segundo é especialmente importante pois predispõe a um efeito chicote, em que a hiperextensão seguida por hiperflexão promove o mecanismo de chicote ou whiplash, que gera cisalhamento nas estruturas vertebro-medulares e encefálicas, especialmente se o encosto é inadequado. Colisão lateral: é mais grave, uma vez que há uma proteção menor na lateral dos veículos, o que implica em uma aceleração e desaceleração na parede lateral do veículo. Esse tipo de lesão pode afetar o segmento superior ao promover a compressão da clavícula sobre o úmero com uma possível fratura; compressão da caixa torácica com fraturas de costelas com lesões hepáticas, esplênicas, pulmonares. laceração de aorta e diafragma; lesões pélvicas como a fratura de fêmur e do acetábulo; além de lesões vertebrais que podem resultar em fraturas, luxações ou lesões medulares. Obs.: nas colisões angulares, há um misto do observado em lesões frontais e laterais, sendo mais grave para o doente que está mais próximo da região de impacto. Capotamento: também é uma lesão mais grave pois o paciente pode colidir qualquer parte do corpo contra os painéis do veículo. Em crianças o mais comum é a lesão do abdome e do crânio, enquanto adultos comumente lesionam mais os membros inferiores e crânio. Colisão com ejeção: a ejeção é um fenômeno traumático muito mais severo, pois pode haver colisão de qualquer parte do corpo sobre uma superfície rígida como o asfalto. Nesse sentido, as lesões são anárquicas, pois o padrão de lesões é individual e depende da forma de queda apresentada pelo paciente após a ejeção. Dispositivos de Segurança Veiculares Cinto de segurança: o cinto de segurança, quando posto corretamente, é importante na redução da morbidade e mortalidade dos traumas automobilísticos como as ejeções, além de absorver parte do impacto de tórax e abdome. Por outro lado, quando ele é posicionado acima da pelve, pode gerar lesões por compressão do baço,fígado, pâncreas e duodeno, lesões por aumento da pressão abdominal e hiperflexão da coluna lombar. Airbags: são importantes nas colisões frontais, pois absorvem parte da energia do impacto, nas não no caso de traumas sucessivos, pois, uma vez inflado, não irá proteger contra novos impactos. Quando o airbag infla, ele também pode gerar algumas lesões no tórax, braço e face, principalmente de usuários de óculos. Essas lesões podem ser graves em crianças e adultos menores de 1,40 e, por isso, não devem utilizar o banco dianteiro. Atropelamentos Nesse tipo de trauma, a lesão ocorre em três fases: Impacto com o pára-choque: nesse primeiro trauma, as lesões variam com o tamanho da vítima, sendo comum lesões nas pernas e pelve em adultos e tóraco-abdominais nas crianças. Gabriel Torres→ Uncisal→ Med52→ Cinemática do Trauma Impacto com o capô: nesse momento, o pedestre é jogado por cima do capô e pára-brisas, havendo lesões do tronco, da cabeça e dos membros superiores. Impacto com o solo: ocorre quando o pedestre cai ao solo, sendo o mais comum a lesão da cabeça e cervical. Acidentes com Motocicleta Nas motocicletas, merece destaque o fato que o centro de gravidade se encontra acima e atrás do eixo dianteiro, propiciando a ocorrência de esmagamento ou ejeção. Colisão frontal: pode haver colisão direta com o guidão que resulta em lesões cranioencefálicas, torácicas ou abdominais, mas há destaque para o trauma em membros em especial os inferiores. Caso os pés fiquem presos nos pinos, transfere-se energia ao fêmur e pode haver fratura femoral bilateral, enquanto se a coxa colide diretamente com o guidão, há transferência da energia para a pelve e pode ocorrer fratura em livro aberto. Colisão lateral: pode haver trauma da cabeça, abdome e principalmente dos membros que podem ser esmagados entre os dois veículos que colidem. Derrapamento: ocorre quando o paciente desloca pelo asfalto, podendo haver escoriações e fraturas. Ejeção: pode promover lesões múltiplas e anárquicas que podem culminar com a morte. Obs.: os equipamentos de proteção como o capacete reduzem em até 300% a chance de traumas encefálicos graves e letais. Além disso, botas e jaqueta oferecem proteção adicional durante a derrapagem. Quedas No caso das quedas, é importante a avaliação de três fatores principais: Altura da queda: o trauma de 6 metros no adulto ou de 3 metros na criança (2 a 3x seu tamanho), é considerado grave, pois há maior energia quando toca o solo. Superfície do solo: estruturas menos compressíveis tendem a gerar lesões mais graves pois a absorção do impacto é súbita. Estrutura do primeiro impacto: a estrutura que primeiro tange a superfície é aquela que recebe a maior energia e por isso, é importante determiná-la. A queda sobre os pés favorece fraturas de calcâneo (de Don Juan), tornozelo e da coluna por hiperflexão. A queda sobre as mãos favorece a fratura bilateral do rádio, denominada de fratura de Colles. Por fim, a queda sobre a cabeça facilita lesões de crânio e da coluna cervical, com um mecanismo semelhante àquele de chicote. Trauma Penetrante Projétil: trauma penetrante por projétil de arma de fogo ou PAF, possui relação direta entre a área frontal e a cavidade criada, concentrando toda energia na ponta. Assim, projéteis tendem a produzir maiores cavitações quanto maior sua área frontal, sendo influenciados por outros fatores como distância do atirador, velocidade do projétil e tipo de arma. Também se considera o efeito tumble ou de tombo do projétil, em que seu centro de gravidade basal permite rotação e maior lesão do tecido, o que pode se somar à fragmentação ativa ou passiva do projétil. Por fim, os projéteis geram um orifício de entrada oval com uma área negra de abrasão e podem possuir área de saída sem abrasão e de aspecto estrelado. Arma Branca: são traumas penetrantes de baixa energia cinética e que geralmente produzem cavitação menor em relação aos traumas de PAF. Além disso, mulheres possuem tendência a promover lesões de cima para baixo enquanto homens as produzem de baixo para cima, podendo lesionar estruturas distintas. Obs.: o que diferencia os traumas contusos dos penetrantes é o mecanismo de lesão, pois um ocorre por cisalhamento, enquanto que no trauma penetrante, a formação da extensa cavitação pode lesionar órgãos. Explosões Nas explosões, pode haver traumas através de quatro mecanismos: Ondas de impacto: é a lesão primária provocada pela pressão que lesiona órgãos ricos em gás, causando rotura de tímpano, contusão, e pneumotórax. Também se acometem olhos e intestinos nas explosões subaquáticas. Fragmentos: é a ejeção de fragmentos do explosivo e do ambiente como pedras e estilhaços sobre o paciente, podendo gerar um trauma contuso ou penetrante. Ejeção: é quando o paciente é ejetado pelo explosivo realizando uma aceleração seguida de desaceleração, com um trauma contuso. Produtos tóxicos: é um mecanismo de lesão indireta das explosões em que gases, o calor ou elementos radioativos podem promover queimadura, asfixia, lesão por inalação e outros efeitos secundários. Gabriel Torres→ Uncisal→ Med52→ Cinemática do Trauma
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