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Alergia ao Leite de Vaca Introdução • As reações adversas a alimentos consis- tem em qualquer reação desfavorável após a ingestão de um alimento ou aditivo ali- mentar; • Essas reações são divididas em: - Intolerância alimentar: caracterizada por respostas fisiológicas adversas, ou seja, não envolve resposta imune; - Hipersensibilidade alimentar: respos- tas imunológicas adversas e alergias; • Até 6% das crianças apresentam reações alérgicas a alimentos nos primeiros (princi- palmente em lactentes) 3 anos de vida. Des- tes 2,5% são alergia ao leite de vaca, 1,5% alergia a ovos e 1% ao amendoim; • A lactose é a junção da glicose com a ga- lactose, tratando-se de um carboidrato, ou seja, na intolerância à lactose não se tem uma resposta alérgica ou imunológica; • A alergia à proteína do leite ocorre com resposta alérgica/imunológica. → • A lactose é uma substância ingerida comu- mente desde os primeiros anos de vida, im- portante componente do leite. Ao passar pelo estômago e atingir o intestino, local em que se tem vilos, que, em seu ápice, apre- senta enzimas como lactase, galactase, sa- carases, que quebram as substâncias em partes menores; • A lactase é a enzima produzida na extre- midade dos vilos e atuante na lactose, que- brando-a (hidrólise) em galactose e glicose e facilitando sua absorção no intestino; • Dependendo da quantidade de lactose, os níveis de glicose podem aumentar no san- gue, demonstrando o funcionamento da en- zima e, caso não estivesse funcionando, a lactose não seria absorvida e seguiria para as outras porções do intestino; • A ausência ou menor produção de lactase pode ser ocasionada por alguma condição do intestino delgado que leva a destruição desses vilos, como a giardíase (parasitose que leva a perda de vilos durante a infecção), doença de Crohn (doença inflamatória in- testinal que leva a perda de vilos), doença celíaca (a ingestão de glúten causa uma in- flamação intestinal, que leva a perda desses vilos, da mesma forma que na doença de Crohn) sendo que, em todos esses casos, se tem uma intolerância à lactose secundária; • Causas: - Primárias: genética/prematuros. As cau- sas genéticas são consideradas extrema- mente raras, em que a criança nasce com a falta do gene que determina a produção dessa enzima; - Secundárias: inflamação/infecção; • Na primeira imagem, a criança apresenta a enzima no intestino delgado e, naturalmente, realiza a quebra da lactose em glicose e ga- lactose, realizando a absorção de ambos e impedindo a passagem para o intestino grosso. No indivíduo intolerante à lactose permanente, transitório) representado na se- gunda imagem, o intestino delgado não tem a produção da lactase, com isso, a quebra da lactose em partes menores não ocorre, ha- vendo a passagem desse carboidrato em sua Marianne Barone (15A) Neonatologia e Pediatria Geral – Prof. Valeria Casella Speltri forma integral para o intestino grosso, onde são encontradas bactérias que realizam fer- mentação, formando gases e ácidos; • O paciente pode apresentar gases, dores abdominais, distensão abdominal e diarreia (como a molécula é maior, pode aumentar a osmolaridade); • Pode ter uma mudança de flora bacteriana pelo aumento da disponibilidade de carboi- dratos nessa porção do intestino grosso; • Não tem reação imune, sem inflamação, sangramento, ulceração, sem alterações sis- têmicas; • O diagnóstico pode ser feito através da ad- ministração de níveis mais altos de lactose, permitindo que o paciente tenha os sintomas descritos. Desta forma, sabe-se que, se o pa- ciente tiver a lactase normal a glicemia irá subir, já se o paciente não tiver a enzima esse aumento não ocorre; • Uma outra forma é através da dosagem de H2 expirado, visto que, a fermentação au- menta os níveis de ácidos, podendo ser no- tada um aumento de H2 ao se dosar a parte respiratória, sendo este o padrão ouro. Alergia ao leite de vaca • A fisiopatologia da intolerância à lactose e da alergia ao leite de vaca são diferentes, de forma que, um indivíduo pode apresentar ambas as patologias ao mesmo tempo; • É a causa mais comum de alergia alimen- tar em criança; • É mais prevalente em lactentes (28 dias – 2 anos); • Rara em adultos, visto que, a pessoa tende a se tornar tolerante, havendo um bloqueio ao longo do crescimento, produzindo uma resposta a administração gradual a este composto, deixando de ter sintomas. → • O leite de vaca contém proteínas como a caseína (80%) e soro (20%); - Lactoalbumina; - Lactoglobulina: é uma das principais proteínas que pode ser transferida da mãe para o RN através da amamentação, cau- sando sintomas da alergia ao leite de vaca ainda que esse RN não faça a ingestão de fórmulas, devendo haver uma retirada de leite da dieta da mãe para reversão do qua- dro. Se o paciente é alérgico apenas a essa proteína, não apresentará sintomas se o leite for fervido ou os produtos que contém leite forem assados, por sofrer desnaturação; - Lactoferrina; - Albumina bovina; - Imunoglobulinas bovinas; • Todas são possivelmente alergênicas, por- tanto, pode ocorrer polisensibilização. Reação mediada por IgE: • Tem-se uma resposta aguda ao leite de vaca, com urticária ou anafilaxia, come- çando de minutos-1h após a ingestão; • É uma reação rápida, aguda e de fácil iden- tificação, principalmente após a ingestão do leite; • Os indivíduos são suscetíveis e, após con- tato com alérgeno, eles produzem anticor- pos IgE específicos, ocorrendo uma ligação com receptores das células inflamatórias; • O contato mais precoce com o alérgeno fa- cilita o desenvolvimento de alergia ao leite, devendo, desta forma, ter uma ingestão mais tardiamente (evitar a janela dos 4-6 meses de vida); • Após um 2º contato com o alérgeno, causa uma vasodilatação, contração de musculatura lisa e secreção de muco, com isso, causa uma hipersensibilidade imedi- ata; • Sintomas: - Pele: urticaria (pápulas eritematosas, pruriginosas que desaparecem à digitopres- são), angioedema e rubor; - Trato gastrointestinal: prurido oral, náusea, dor abdominal, vômitos e diarreia - Trato respiratório: obstrução nasal, ri- norreia, prurido, espirros, edema de laringe, dispneia e sibilos; - Sistema cardiovascular: arritmias, hipo- tensão e perda da consciência; • Anafilaxia: choque anafilático + queda da PA. Pode levar ao óbito. Reação não-IgE mediadas: • Ocorre por intermédio de linfócitos T pre- cursores de IL-3 e IL-4, por via celular prin- cipalmente. Pode ter a produção de IgG; • Sintomas após 2h da ingestão ou sintomas crônicos, sendo as reações mais tardias em relação ao contato do alérgeno; • Sintomas: - Síndrome de enterocolite: é induzida por proteína alimentar, ocasionando diar- reia e vômitos graves, de 2 a 4 horas após a ingestão, desidratação e letargia. Pode ser confundida com intolerância à lactose, po- rém, o diagnóstico diferencial é dado pela desidratação e letargia; - Proctite ou proteocolite: sangue nas fe- zes em crianças saudáveis, após algumas se- manas, em pequenas quantidades. A criança não tem sintomas além do sangue das fezes, ocorrendo pela liberação de interleucinas pelos linfócitos T, causando microlesões na mucosa intestinal e consequentes sangra- mentos pontuais, sem reação sistêmica. São mais comumente causados por leite de vaca e soja; - Refluxo gastroesofágico: sintomas asso- ciados (irritação, regurgitação, emagreci- mento, choro). Os linfócitos T produzem as IL que levam a uma alteração da motilidade do esôfago, não havendo melhora a admi- nistração de medicamentos para o refluxo comum, devendo haver retirada do leite da dieta; - Constipação; - Síndrome de Heiner: hemossiderose pulmonar por alergia alimentar(sendo muito raro), em que o paciente apresenta tosse com sangue (hemoptise), com ima- gem de raio-X semelhante a pneumonia (é comum administrar antibiótico, porém, como a causa não é bacteriana, não há me- lhora no quadro) ou tuberculose, sendo ou- tros sintomas anemia ferropriva, infiltrados alveolares múltiplos (hemorragia alveolar); ▷ A alergia ao leite produz células imu- nes ativas que podem, em alguns casos, le- varem a lesões de vasos dos pulmões, cau- sando saída de hemácias que caem nos al- véolos, sendo observado um acúmulo de ferro nestes (=hemossiderose). Tem-se uma confirmação com a realização de biópsia; ▷ A troca de leite deve ser feita, havendo melhora entre 6-8 semanas. Reações mistas IgE mediada e não IgE mediada: • Pode ocorrer por mecanismo humoral e/ou celular, com ou sem IgE, linfócitos ou IgG; • Apresenta sintomas agudos ou crônicos; • Sintomas: - Dermatite atópica: a alergia ao leite de vaca é a segunda maior causa de dermatite atópica em crianças pequenas induzida por alimentos em crianças pequenas (1ª causa principal é o ovo e a 2ª é o leite de vaca). A criança apresenta hiperemia, escoriações nas regiões de dobra, prurido; - Alterações eosinofílicas-alérgicas do TGI: ataca esôfago (tem infiltrado eosino- fílico no esôfago, com sintomas semelhan- tes ao refluxo, devendo ter uma análise da secreção para poder ter certeza e adminis- trar corticoides), estômago, intestino. Pode causar dor abdominal, distensão abdominal, diarreia e perda de peso. * OBS: lactente com suspeita de DRGE (doença do refluxo gastroesofágico): • A ingestão do leite em casos de predis- posição por reação não IgE mediada, os lin- fócitos T desencadeiam produção de subs- tâncias inflamatórias que podem alterar a motilidade do esôfago, causando refluxo. → • Geralmente aparecem nos primeiros me- ses de vida, frequentemente primeiros dias ou semanas após introdução de leite de vaca; • Os sintomas podem aparecer mesmo em alimento materno exclusivo, porque a mãe ingere o leite de vaca; • Curso natural: alergia não IgE mediada resolve mais rapidamente do que a IgE me- diada (tolerância). Mesmo que tenha san- gramento nas fezes e pareça ser uma forma mais grave, a forma não IgE mediada se resolve mais rapidamente que a mediada por IgE. → • História + testes laboratoriais; • Padrão ouro: dieta de exclusão seguida por provocação pelo alimento, com duração de cerca de 2-8 semanas. Caso volte os sin- tomas com a provocação, é possível fechar o diagnóstico; - Tomar cuidado para resposta bruta em quadros de anafilaxia; - Dar preferência fazer em ambiente hos- pitalar por poder ter reações adversas im- portantes; • Testes para anticorpos IgE dos alimen- tos suspeitos e testes cutâneos: IgE de leite de vaca específico > 15 KIU/L e em meno- res de 2 anos > 5KIU/L tem 95% de valor preditivo; • Testes diagnósticos para não IgE mediada são limitados → • Outras alergias: ovo (observar posterior- mente à introdução do leite); • Refluxo gastroesofágico • Urticaria idiopática • Angioedema hereditário: desencadeado por sistema complemento; • Intolerância à lactose (muito difícil de confundir); • Diarreia funcional. → • Lactentes devem tomar leite; • A maioria das crianças com alergia à pro- teína do leite de vaca tem alergia ao leite de outros animais; • Não lactentes: retirar o leite de vaca da dieta e seus derivados: NÃO LACTENTES! • Lactentes: substituir por leite com prote- ína alternativa e fonte de cálcio; • Pacientes com risco de anafilaxia: epine- frina de auto injeção • Não adianta dar leite sem lactose. Deve substituir por leite sem proteína de vaca ou essa proteína sofrer uma modificação que a torne menos antigênica. As proteínas exten- samente hidrolisadas, geralmente, são hipo- alergênicas e, em formas graves de alergia, deve administrar fórmula de aminoácidos (hipoalergênico pode ainda causar reação), enquanto as formas parcialmente hidrolisa- das são fornecidas para pacientes com his- tórico familiar de alergia; • Fórmulas lácteas modificadas: - Fórmulas com caseína extensivamente hidrolisada: não desencadeia reação na maioria das crianças; Ex: similac, enfamil, pregestimil - Fórmulas baseadas em aminoácidos: para que tem até reação mesmo com a hi- drolisada; Ex: elecare, neocate, pur amino • Leites com proteína vegetal: - Soja: pode ser fornecido a partir dos 6 meses, devido à forma transgênica e de de- senvolver a produção de hormônios femi- nino, além de poder causar uma deficiência de cálcio. Quando mais cedo introduzir esse tipo de leite, a criança tem mais chance de ter problemas andrógenos; - Arroz: extensamente hidrolisada, sem atividade estrogênica. Um deles é o No- vamilRice, que contêm uma quantidade de proteína adequada, através da adição de aminoácidos importantes, e também de lipí- deos, vitaminas etc.; - Outros: ainda não liberados, como amêndoas; • Alimentos que tem a proteína do leite de vaca: caseína, caseinato, manteiga, sabor artificial de manteiga, todas as formas de leite, pudim, creme e nata, coalhada, soro (todas as formas), iogurte, atum enlatado. Pontos importantes • É a causa mais comum de alergia alimen- tar em crianças pequenas • A maioria dica tolerante com a idade; • Manifestações clínicas na ALV por IgE: urticaria, angioedema e anafilaxia • Manifestações por IgE e não IgE: der- matite atópica/esofagite eosinofílica; • Manifestações por não IgE: vômitos, di- arreia e distensão • Diagnostico ALV IgE: história + dosa- gem sérica de IgE específica + teste cutâneo. O teste de provocação deve ser feito com cuidado. Conclusão • A intolerância à lactose (IL) é uma reação fisiológica alimentar diversa; • A IL apresenta principalmente sintomas no TGI; • Tratamento: exclusão da lactose/lactase VO; • A alergia à proteína do leite de vaca (AVL) desencadeia diferentes respostas imunes; • O diagnóstico de ALV é o teste de exclu- são/provocação; • O tratamento da ALV é a troca da proteína do leite ou LV modificado e evitar consumo da proteína.