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DIRETORIA DA FEBRASGO 2016 / 2019 Alex Bortotto Garcia Vice-Presidente Região Centro-Oeste Flavio Lucio Pontes Ibiapina Vice-Presidente Região Nordeste Hilka Flávia Barra do E. Santo Vice-Presidente Região Norte Agnaldo Lopes da Silva Filho Vice-Presidente Região Sudeste Maria Celeste Osório Wender Vice-Presidente Região Sul César Eduardo Fernandes Presidente Corintio Mariani Neto Diretor Administrativo/Financeiro Marcos Felipe Silva de Sá Diretor Cientí� co Juvenal Barreto B. de Andrade Diretor de Defesa e Valorização Pro� ssional Imagem de capa e miolo: foxie/Shutterstock.com COMISSÃO NACIONAL ESPECIALIZADA EM DOENÇAS INFECTO-CONTAGIOSAS - 2016 / 2019 Presidente José Eleutério Junior Vice-Presidente Paulo César Giraldo Secretária Ana Katherine da Silveira Gonçalves Membros Cláudia Márcia de Azevedo Jacyntho Geraldo Duarte Iara Moreno Linhares Maria Luiza Bezerra Menezes Mario Cezar Pires Mauro Romero Leal Passos Newton Sérgio de Carvalho Plínio Trabasso Regis Kreitchmann Rosane Ribeiro Figueiredo Alves Rose Luce Gomes do Amaral Victor Hugo de Melo Doença in� amatória pélvica Newton Sergio de Carvalho1 Beatriz Freitas de Carvalho1 Renate Von Linsingen1 Marcos Takimura1 Descritores Doença in� amatória pélvica; Salpingite; Tratamento; Dor pélvica Como citar? Carvalho NS, Carvalho BF, Linsingen RV, Takimura M. Doença in� amatória pélvica. São Paulo: Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia (FEBRASGO); 2018. (Protocolo FEBRASGO - Ginecologia, no. 25/ Comissão Nacional Especializada em Doenças Infecto-Contagiosas). Introdução Doença in� amatória pélvica, ou DIP, é considerada um conjunto de processos in� amatórios da região pélvica devido à propagação de micro-organismos a partir do colo do útero e da vagina para o endométrio, as tubas, o peritônio e as estruturas adjacentes. Esta propagação ocorre de forma direta do colo para os órgãos superio- res, denominada de via canalicular. Manifesta-se, habitualmente, com um padrão clínico subagudo e oligossintomático, sendo que dor abdominal, em intensidade variável, é sintoma obrigatório. É mais comum em mulheres jovens que, com frequência, não incor- 1Universidade Federal do Paraná, Curitiba, PR, Brasil. *Este protocolo foi validado pelos membros da Comissão Nacional Especializada em Doenças Infecto- Contagiosas e referendado pela Diretoria Executiva como Documento O� cial da FEBRASGO. Protocolo FEBRASGO de Ginecologia nº 25, acesse: https://www.febrasgo.org.br/protocolos 4 Protocolos Febrasgo | Nº25 | 2018 poram o hábito do sexo seguro, tendo maior chance de contrair agentes causais das cervicites, sendo estes os mais importantes para desencadeamento da DIP. Um dos principais problemas é que em muitas vezes este processo passa despercebido, pois os sintomas clínicos como a dor se apresentam de forma discreta, não suscitando a suspei- ta diagnóstica. É uma das mais importantes complicações das infecções sexualmente transmissíveis (IST) e um sério proble- ma de saúde pública. Apresenta relevância devido às suas com- plicações, tanto do ponto de vista de emergência, no caso da pelveperitonite ou ruptura de abscesso tubo-ovariano, como em longo prazo, podendo provocar infertilidade, gravidez ectópica e dor pélvica crônica. Pelo fato de ser oligossintomática e não de notificação obrigatória, sua incidência no Brasil não é co- nhecida. Entretanto, considerando seu principal agente, que é a Chlamydia trachomatis, estima-se que essa infecta em torno de 10,7% das mulheres entre 15 e 25 anos, embora alguns estudos apontem taxas de 2% até 18%.(1-3) Para classi� car DIP no sistema CID-10, utilizam-se as situ- ações referidas no quadro 1, conhecidas como Doenças in� a- matórias dos órgãos pélvicos femininos. Os códigos N.74.3 e 4 são especí� cos para a DIP associada com Neisseria gonorrhoe- ae (gonococo) ou clamídia, embora muitas vezes não é isolado o agente etiológico.(4) Alguns códigos não mostrados são associa- dos apenas com infecção pós-aborto ou puerperal e outros com infecção crônica (Tuberculose genital) que não se enquadram no conceito de DIP. 5 Carvalho NS, Carvalho BF, Linsingen RV, Takimura M Protocolos Febrasgo | Nº25 | 2018 Quadro 1. N70-N77 - Doenças in� amatórias dos órgãos pélvicos femininos Exclui: aborto ou gravidez ectópica ou molar (O00-O07, O08.0), gravidez, parto ou puerpério (O23.-, O75.3, O85, O86.-) N70 Salpingite e ooforite, inclui: abscesso de ovário, trompa, tubo-ovariano, ou doença in� amatória tubo- ovariana ou piossalpinge ou salpingo-ooforite N70.0 Salpingite e ooforite agudas N70.1 Salpingite e ooforite crônicas (Hidrossalpinge) N70.9 Salpingite e ooforite não especi� cadas N71 Doença in� amatória do útero, exceto o colo (Inclui: abscesso uterino, endo(mio)metrite, miometrite, piometrite) (*) incluindo DIP ou Infecção pós-aborto/puerperal N71.0 Doença in� amatória aguda do útero N71.9 Doença in� amatória não especi� cada do útero N73.0 Parametrite e celulite pélvicas agudas (*) N73.1 Parametrite e celulite pélvicas crônicas (*) N73.2 Parametrite e celulite pélvicas não especi� cadas (*) N73.3 Pelviperitonite aguda feminina N73.5 Pelviperitonite não especi� cada feminina N73.6 Aderências pelviperitonais femininas N73.8 Outras doenças in� amatórias especi� cadas da pelve feminina N73.9 Doença in� amatória não especi� cada da pelve feminina N74.3 Infecção gonocócica pélvica feminina (A54.2= Pelviperitonite gonocócica e outras infecções geniturinárias gonocócicas) N74.4 Infecção pélvica feminina por clamídia (A56.1= Infecção por clamídias, pelviperitonial e de outros órgãos geniturinários) N74.8 In� amação pélvica feminina em outras doenças classi� cadas em outra parte (*) = associadas com infecção pós-aborto ou infecção puerperal que não se classi� ca como DIP Etiologia e fatores de risco Com relação aos fatores de risco, pode-se citar a adolescência e o comportamento sexual contribuindo para aumento da suscetibi- lidade à DIP. Um grande estudo denominado Pelvic In� ammatory Disease Evaluation and Clinical Health (PEACH), desenhado para avaliar a conduta em tratamento ambulatorial versus hospitalar, demonstrou que as populações jovens são de maior risco para de- senvolvimento de DIP e de complicações associadas, sendo estima- 6 Doença in� amatória pélvica Protocolos Febrasgo | Nº25 | 2018 do que 1 em cada 5 casos de DIP ocorre em menores de 19 anos. Outro estudo concluiu que jovens de 17 a 21 anos têm duas vezes mais chance de serem diagnosticadas com DIP.(5,6) O risco aumentado em adolescentes é devido a essa popula- ção submeter-se mais comumente a fatores comportamentais, como múltiplos parceiros e sexo desprotegido, mas também por fatores biológicos. Múltiplas parcerias sexuais e parceria se- xual atual portadora de uretrite por si só também são fatores importantes. O estudo PEACH, também, revelou maior chance de recorrên- cia em jovens. Adolescentes participantes do estudo desenvolve- ram recorrência em um tempo menor que mulheres adultas, bem como apresentaram risco cinco vezes maior de relatar dor pélvica crônica em 7 anos após serem diagnosticadas com DIP.(7) Outro fator de risco conhecido para DIP é história passada ou atual de IST. Pessoas com infecção por clamídia, micoplasmas e/ ou gonococo na cérvice uterina têm maior chance de desenvolver essa infecção no trato genital superior.(8) A infecção por Chlamydia trachomatis promove a possibilidade de desenvolver infecção do trato genital superior a partir de cervicite em até 30% dos casos. Pacientes com salpingite prévia têm uma chance aumentada em 23% de desenvolver um novo episódio infeccioso.(9) Também como fator importante, o uso de dispositivos intrau- terinos (DIU) pode representar um risco três a cinco vezes maior para o desenvolvimento de DIP, se a paciente for portadora de cer- vicite, mas desde que não apresente tal situação, foi demonstrado que tal risco não se justi� ca.(10) Com relação aos agentesetiológicos, a maioria dos casos é po- limicrobiano, fato importante na decisão do manejo terapêutico. 7 Carvalho NS, Carvalho BF, Linsingen RV, Takimura M Protocolos Febrasgo | Nº25 | 2018 Neisseria gonorrhoeae e Chlamydia trachomatis são inclusos como agentes primários; sendo que os patógenos endógenos in- cluem: Anaeróbios pélvicos, Bacilos gram-negativos, Mycoplasma hominis, Streptococcus agalactiae, Gardnerella vaginalis, Haemophilus in� uenzae, Ureaplasma urealyticum; Bacteróides spp, Escherichia coli. Citomegalovírus também já foi descrito como participante no desenvolvimento do processo. Fisiopatologia A � siopatologia da DIP pode ser analisada de forma segmentar desde a colonização do colo uterino pelos agentes primários até instalação da infecção nas tubas uterinas, podendo atingir ovários e peritônio pélvico. No início do processo, há agentes implicados nas cervicites (principalmente, a clamídia) instalados no colo uterino. A impor- tância de identi� car essa fase deve-se à possibilidade de tratamen- to e prevenção da DIP. Após esse estádio, mormente, na época menstrual ou pós-menstrual imediata, há ascensão desses agentes e passagem pelo endométrio devido à modi� cação do muco cer- vical, ocasionando uma endometrite que é habitualmente fugaz. Existe possibilidade de sangramento discreto além da menstrua- ção ou mesmo o prolongamento desta. Alguns justi� cam que o fato de o sangue menstrual ser alcalino e poder propiciar um meio de cultura poderia facilitar tal processo.(11) Na sequência, os micro-organismos que fazem parte do meio ambiente vaginal também ascendem (com auxílio dos agentes da cervicite), via canalicular, instalando-se na tuba uterina. Nesse lo- cal, com reação tecidual, inicia a formação de conteúdo purulento, que pode se desprender, passando através das fímbrias, e conta- 8 Doença in� amatória pélvica Protocolos Febrasgo | Nº25 | 2018 minar o peritônio pélvico e ocasionar pelviperitonite. Pelo fato do acúmulo ser maior no fundo de saco de Douglas, esse local apresen- ta-se com maior sensibilidade, desencadeando dispareunia e dor ao toque vaginal. Nesse tempo, alças intestinais e epiplon tendem a bloquear o processo purulento, formando o denominado “com- plexo tubo ovariano”. À medida que aumenta a viscosidade desse conteúdo pode ocorrer a fusão das � mbrias tubárias, provocan- do um aprisionamento de pus dentro das tubas, denominado de piossalpinge. Com esse conteúdo aprisionado, ocorre a diminuição dos níveis de oxigênio e o aumento gradativo na proliferação dos anaeróbios em detrimento dos aeróbios. Esse conteúdo purulento pode propagar-se para os ovários, então, constituindo o abscesso tubo-ovariano (ATO), que também poderá sofrer um bloqueio peri- toneal na forma de complexo tubo-ovariano. Essa estrutura pode- rá, posteriormente, autoesterilizar e formar uma massa multicís- tica com conteúdo citrino estéril, denominado de hidrossalpinge, sequela do processo infeccioso e in� amatório. Embora menos fre- quente, o conteúdo do ATO pode aumentar a tensão intra-abscesso e romper-se, sendo bloqueado com formação de complexo tubo-o- variano, ou ainda podendo ocasionar um quadro grave com grande derramamento de pus no peritônio, choque séptico e até levar a óbito. Felizmente, casos letais por DIP são infrequentes. No tocante à sintomatologia da dor, essa é desencadeada a par- tir da entrada dos agentes na cavidade uterina, tornando-se maior quando o conteúdo purulento contamina a cavidade pélvica. Quando há fusão das fímbrias, poderá ocorrer relativa diminuição da sensa- ção dolorosa e tornar-se máxima quando há ruptura do ATO. Tendo em mente esta � siopatologia, é possível classi� cá-la em estádios como se ilustra no quadro 2. 9 Carvalho NS, Carvalho BF, Linsingen RV, Takimura M Protocolos Febrasgo | Nº25 | 2018 Quadro 2. Estádios da DIP em função do tempo de evolução 0 - Cervicites (agentes presentes no colo uterino) 1a - Endometrite 1b - Salpingite sem peritonite 2 - Salpingite com peritonite 3 - Piossalpinge/Abscesso tubo-ovariano 4a - Abscesso tubo-ovariano roto 4b - Hidrossalpinge/Hidro Oforosalpinge Diagnóstico Anamnese Conquanto muitas das pacientes que apresentem ou tenham apre- sentado DIP sejam oligo ou assintomáticas, a dor pélvica, em vari- áveis maneiras de se apresentar, deveria ocorrer. Mesmo naquelas sintomáticas, a dor habitualmente não é severa, apresentando-se inicialmente como um desconforto e eventualmente progredindo, sendo, com maior frequência, bilateral. Associadas à dor podem existir disúria, sobretudo, na presença de uretrite associada, e dis- pareunia devido à in� amação dos ligamentos pélvicos ou até mes- mo por algum grau de peritonite que possa existir na dependência do tempo de evolução. Outra possibilidade é a presença de alterações do ciclo mens- trual na forma de aumento ou prolongamento da menstruação em razão da endometrite fugaz. Sangramento vaginal anormal de pouca quantidade após a menstruação (spotting) também pode ocorrer, e embora seja comum em usuárias de anticoncepcional de baixa dosagem, deve ser investigado. A febre e o corrimento vaginal ou mesmo alteração do muco cervical podem ou não estar presentes. O diagnóstico diferencial deverá ser feito com manifesta- ções uroginecológicas, gastrointestinais e musculoesqueléticas. 10 Doença in� amatória pélvica Protocolos Febrasgo | Nº25 | 2018 Portanto o ginecologista deve estar atento ao elevado nível de sus- peição na presença de um ou mais dos critérios mínimos diagnós- ticos, dessa forma, implantando terapêutica antibiótica precoce e diminuindo a chance de sequelas. Os principais diagnósticos dife- renciais devem incluir: gravidez ectópica, apendicite aguda, cisto ovariano roto ou torcido, infecção do trato urinário, litíase uriná- ria, endometriose, endometrioma roto, síndrome do intestino ir- ritável, entre outros. Entre os vários diagnósticos diferenciais cita- dos, chama atenção, sobretudo, para gravidez ectópica e apendicite aguda que, eventualmente, são difíceis de afastar. Alguns pontos são importantes para se questionar na anamnese: • Duração, curso e localização da dor. • Relação da dor com o ciclo menstrual com tendência de iniciar durante ou logo após a menstruação ou mesmo cursando com perda de sangue intermenstrual. • Inserção recente (<1 mês) de DIU ou curetagem ou parto, lem- brando que infecção após parto ou cesariana ou pós-aborta- mento, devido à sua diferente � siopatologia e morbimortali- dade, não é inclusa como sendo DIP. • História prévia de apendicectomia, cálculo urinário ou endometriose. • História prévia de episódio de DIP ou de gravidez ectópica, pois quem apresenta tais situação tem maior chance de repetir tanto a DIP quanto a gravidez ectópica. • Risco de IST: sobretudo, jovens abaixo de 21 anos tendo con- tato sexual com múltiplos parceiros (ou parceiro com contatos múltiplos), sem parceiro de� nido, parceiro recente há menos de 3 meses, parceiro com sintomas de uretrite ou de uma ITS. 11 Carvalho NS, Carvalho BF, Linsingen RV, Takimura M Protocolos Febrasgo | Nº25 | 2018 • Febre (alta ou baixa). • Disfunção miccional ou sintomas intestinais alterados. Exame físico No exame físico, o ginecologista deve atentar-se, principalmente, para os seguintes tópicos: • Veri� cação da temperatura corporal em várias aferições. • Palpação do abdome tentando evidenciar dor à pressão na re- gião pélvica, se é uni ou bilateral, bem como dor na descom- pressão súbita ou defesa muscular. • Exame especular: observação de presença de secreção purulen- ta proveniente do colo do útero ou mesmo presença de turva- ção do muco. Sangramento originado da friabilidade do colo in� amado ou do endométrio. • Toque vaginal: avaliação da presença de dor à mobilização do útero e/ou da região anexial uni ou bilateralmente, de funda- mental importância para o diagnóstico. Pode também ser ve- ri� cado “preenchimento” ou algum tipo de endurecimentode uma ou ambas as tubas, massa pélvica sensível ou sensibilida- de pélvica direta ou re� exa. Em todas as mulheres sexualmente ativas, principalmente jo- vens ou adolescentes, que se apresentem com dores ou descon- forto no baixo ventre, ainda que de intensidade discreta, deve ser afastado o diagnóstico de DIP. Exames complementares • Hemograma completo que possa sugerir presença de processo in� amatório (leucocitose e/ou bastonetose); • Exames de urina tipo I e urocultura, para afastar infecção do trato urinário; 12 Doença in� amatória pélvica Protocolos Febrasgo | Nº25 | 2018 • Provas bioquímicas in� amatórias (VHS e proteína C reativa). Embora inespecí� cas, auxiliam no raciocínio diagnóstico so- madas a outras alterações; • Exame bacterioscópico para rastreio de vaginose bacteriana; • Identificação do agente preferencialmente por provas de biologia molecular para diagnóstico de clamídia, gonococo e, se possível, micoplasma, bem como a cultura para gono- coco e, se possível, com antibiograma e determinação de resistência; • Teste de gravidez, se esta não pode ser excluída com certeza, principalmente para afastar gravidez ectópica. Ultrassonogra� a transvaginal (USTV): método de escolha para a avaliação inicial de dor pélvica, podendo mostrar imagem de:(12,13) • Espessamento da parede tubária > 5 mm (100% sensibilidade); • Septos incompletos intratubários; • Sinal da roda dentada (corte transversal) (95-99% especi� cidade); • Espessamento e líquido tubário; • ATO. A USTV tem habilidade limitada para o diagnóstico de DIP aguda, mas, em alguns casos de mulheres com sintomas de DIP, ela pode ser útil quando se identi� cam imagens típicas (grau de recomendação A).(14) Se a USTV for inconclusiva, con- siderar outros métodos de imagem. • Tomogra� a computadorizada da pelve pode evidenciar alte- rações nos planos fásciais do assoalho pélvico, espessamento dos ligamentos uterossacros, in� amação tubária ou ovariana, coleção líquida anormal. 13 Carvalho NS, Carvalho BF, Linsingen RV, Takimura M Protocolos Febrasgo | Nº25 | 2018 • Ressonância Magnética pode mostrar: ATO, piossalpinge, lí- quido intratubário, aparência de policistose ovariana com lí- quido livre na pelve. A RM tem maior acurácia quando comprada com a USTV para o diagnóstico de DIP (nível 1 de evidência) e pode, portanto, substituir a laparoscopia: • Laparoscopia pode ser usada para con� rmar o diagnóstico;(15) • Todas as mulheres que têm DIP aguda devem ser rastreadas para clamídia e gonococo e devem ser testadas para a infecção pelo HIV; • Outros exames bioquímicos na dependência de cada caso e de sua gravidade: provas de função hepática e renal, avaliação hi- droeletrolítica entre outros. Com relação ao diagnóstico da DIP, é eminentemente clínico, conforme quadro 3.(16) Quadro 3. Critérios diagnósticos de DIP Obrigatórios (maiores) · Dor em baixo ventre espontânea · Dor à palpação anexial · Dor à mobilização cervical Adicionais (menores) · Temperatura oral > 38,3º C · Secreção vaginal/cervical anormal · VHS ou PCR aumentados · Isolamento gonococo ou clamídia endocervical Para concluir o diagnóstico, deve-se ter a somatória dos três critérios mínimos ACRESCIDOS, ao menos, a um dos adicionais. Fonte: Workowski KA, Bolan GA; Centers for Disease Control and Prevention. Sexually transmitted diseases treatment guidelines, 2015. MMWR Recomm Rep. 2015;64(RR-03):1-137. Erratum in: MMWR Recomm Rep. 2015;64(33):924.(16) Existem também os critérios especí� cos que por si só de� nem a presença de DIP, sendo eles:(16) 14 Doença in� amatória pélvica Protocolos Febrasgo | Nº25 | 2018 • USG endovaginal ou ressonância magnética ou outro método de imagem sugerindo a presença de ATO ou Complexo Tubo- Ovariano (coleção diversa, podendo conter alças intestinais, epiplon e/ou conteúdo líquido em forma associada); • Biopsia endometrial demonstrando a presença de endometrite; • Laparoscopia demonstrando sinais sugestivos de infecção tu- bária ou tuboperitonial. Conduta O tratamento da DIP tem a � nalidade de resolver o quadro infec- cioso atual e prevenir as possíveis complicações futuras. Nesse sentido, deve ser iniciado o mais precoce possível, ainda que o diagnóstico seja apenas presumível. A seguir são referidas algumas orientações e sugestões de esquemas de antibioticoterapia. Orientações • Individualizar tratamento conforme disponibilidade, custo e aceitação do paciente; • Atentar para a presença de outras ITS associadas e rastrear ou- tras infecções. Testes sorológicos para HIV, sí� lis e hepatites sempre devem ser solicitados, bem como rastreamento de neo- plasias associadas como a infecção pelo HPV (rastreamento do câncer do colo uterino e seus estados precursores); • Compreender que a contaminação nem sempre ocorreu re- centemente, mas que o parceiro atual é aconselhado a ser examinado, mesmo que ele não tenha queixas. Independente de se conseguir este objetivo, o parceiro deverá ser orienta- do para o tratamento de agentes das cervicites (clamídia e gonococo); 15 Carvalho NS, Carvalho BF, Linsingen RV, Takimura M Protocolos Febrasgo | Nº25 | 2018 • Orientar medidas gerais como repouso e hidratação e que, nos casos de condução ambulatorial, a temperatura seja aferida e a curva térmica anotada para análise ao retorno; • Nos casos de associação com DIU, a remoção ou permanência do dispositivo deverá ser individualizada. Não há evidência de benefícios com retirada, mas, nesse caso, a paciente deverá ser internada e o dispositivo removido após mínimo de 6 horas do início da antibioticoterapia endovenosa.(10) Torna-se necessá- rio também aconselhamento na área de contracepção. • Nos casos de DIP leve ou moderada, o tratamento oral ou pa- renteral parece apresentar e� cácia semelhante.(16) A decisão de tratamento em âmbito ambulatorial ou hospitalar depende do julgamento médico, sendo que a presença das seguintes situa- ções sugere o tratamento com a paciente internada. Indicações de internamento: • emergências cirúrgicas (por exemplo, apendicite) não podem ser excluídas; • presença de ATO ou peritonite; • HIV+ ou imunossuprimidas; • uso de DIU; • antibioticoterapia oral não tolerada ou não efetiva; • estado tóxico e grave de início; • gravidez. Esquemas de antibioticoterapia Os esquemas de antibioticoterapia são considerados de forma em- pírica, devem ser de amplo espectro e instituídos precocemente. Devem focalizar em cobrir aeróbios e anaeróbios participantes da � ora vaginal que se encontrem envolvidos no processo infeccioso, 16 Doença in� amatória pélvica Protocolos Febrasgo | Nº25 | 2018 e, na mesma ocasião, ou posteriormente, atingir clamídia, gonoco- co e micoplasmas. • Tratamento em âmbito ambulatorial:(17-20) Primeira Escolha Alternativa *Ceftriaxona 250 mg IV DU + Azitromicina 1g VO DU + 500 mg/dia por 7 dias (1 g/semana por 2 semanas) OU Doxiciclina 100 mg VO 12/12h por 14 dias Com ou sem Metronidazol 250 mg, 2 comprimidos, VO, 12/12h, por 14 dias **lembrar da resistência do micoplasma a doxiciclina **Cipro� oxacino 500 mg VO DU + Azitromicina 1g VO DU + 500 mg/dia por 7 dias (OU 1 g/semana por 2 semanas) OU Doxiciclina 100 mg VO 12/12h por 14 dias Com ou sem Metronidazol 250 mg, 2 comprimidos, VO, 12/12h, por 14 dias ** na suspeita de gonococo, lembrar da possibilidade de resistência às quinolonas *Segundo alguns protocolos, o aumento da dose do ceftriaxona de 250 para 500 mg diminui a chance de resistência do gonococo.(21) • Tratamento em âmbito hospitalar: Esquema 1 Esquema 2 Esquema 3 Ceftriaxone 1 g EV 12/12h MAIS Metronidazol 500 mg EV 8/8h OU Clindamicina 900 mg EV 8/8h Cipro� oxacina 400 mg EV 12/12h MAIS Metronidazol 500 mg EV 8/8h OU Clindamicina 900 mg EV 8/8h Clindamicina 900 mg EV 8/8h MAIS Gentamicina 2 mg/kg EV ou IM + 1,5 mg/kg 8/8h Nos casos de ATO, idealmente, devem fazer parte do esquema de antibióticos o metronidazol ou a clindamicina, sempre,iniciados em âmbito hospitalar endovenoso, com tempo mínimo de interna- mento de 24 horas. À medida que a paciente melhora e não apre- senta quadro de temperatura elevada, o esquema pode ser trocado para VO, a clindamicina (450 mg VO 6/6h) ou o metronidazol (500 mg VO 12/12h) para completar pelo menos 14 dias de tratamento juntamente com doxiciclina ou azitromicina. Na presença de ATO, sugere-se a continuação do tratamento após a alta, com azitromi- cina 500 mg/dia (ou doxiciclinia 100 mg cada 12/12h), associados ao metronidazol 500 mg cada 12/12 horas prologado por mais 3 semanas. Em todos os casos, em associação, o parceiro deverá rece- ber 1 g de azitromicina em dose única. Nos casos de abscesso que se 17 Carvalho NS, Carvalho BF, Linsingen RV, Takimura M Protocolos Febrasgo | Nº25 | 2018 estenda até o fundo de saco vaginal ou mesmo abscesso em fundo de saco de Douglas que se encontre acoplado à cúpula vaginal, em algumas situações opta-se por sua drenagem pela via vaginal, com coleta de material para pesquisa de agentes. O procedimento de culdocentese (punção do fundo de saco de Douglas), também, pode ser realizado em determinadas ocasiões como auxiliar no diagnós- tico. Após drenagem, existe melhora do quadro geral da paciente e redução do tempo de internamento com melhora da morbidade. • Regime parenteral alternativo Ampicilina/Sulbactam 3 g EV 6/6h + Doxiciclina 100 mg VO ou EV 12/12h. O esquema ampicilina/sulbactam mais a doxiciclina foi inves- tigado em pelo menos um ensaio clínico e tem ampla cobertura do espectro, sendo e� caz contra clamídia e gonococo, também, em casos de ATO.(22) Seguimento As pacientes externas com DIP devem ser reavaliadas em até 72 horas e hospitalizadas se o seu estado não melhorar. • Nos casos de tratamento ambulatorial, acompanhar a paciente a cada 2 dias e instruí-la a retornar ao serviço caso haja piora dos sintomas. Nos casos de internamento, avaliar clinicamen- te, duas vezes ao dia. • Avaliar a resposta depois de instituída a antibioticoterapia após 48 a 72 horas, sobretudo, quanto às queixas de dor e tem- peratura. Lembrar que, eventualmente, para se obter resposta, pode-se estender a terapia mais um ou dois dias, devendo-se avaliar cada caso em particular. • A resposta ao tratamento deverá ser avaliada através de: 18 Doença in� amatória pélvica Protocolos Febrasgo | Nº25 | 2018 - Melhora do estado geral. - Melhora do quadro térmico (requisitar aferição da tempera- tura ao mínimo a cada 6 horas). - Melhora da dor evidenciada através da palpação e toque vaginal. - Melhora das provas in� amatórias (leucocitose, bastoneto- se, VHS e proteína C reativa), que devem ser realizadas a cada 2 dias. - Ecogra� a demonstrando manutenção ou ausência de au- mento das dimensões nos casos de ATO. Deverá ser realiza- da, no mínimo, a cada 2 dias. • Em casos de não evidência de melhora, avaliar a necessidade de intervenção cirúrgica, sobretudo, na possibilidade de exis- tência de foco de abscessos em outros locais abdominais (go- teiras parietocólicas, subfrênico, peri-hepático na Síndrome de Fritz Hugh Curtis, etc.), ou resistência ao esquema ou dose dos antibióticos inicialmente utilizados.(24) • Alta após a melhora clínico-laboratorial, que ocorre habitual- mente após 5 a 7 dias, com esquema de antibiótico para uso via oral em domicílio. • Para alta sempre deve ser considerada a ausência de tempera- tura elevada, quando existente, por, no mínimo, 2 dias. • Na alta, marcar seguimento no ambulatório de Infecções em Ginecologia e Obstetrícia, em que deverá ser discutido even- tuais consequências à fertilidade e possíveis risco de gravidez ectópica, bem como aconselhamento sobre prevenção de ITS e acompanhamento ambulatorial. • Nos casos de ATO, a indicação cirúrgica para drenagem e remo- ção de áreas desvitalizadas ocorre em cerca de 20% do total de 19 Carvalho NS, Carvalho BF, Linsingen RV, Takimura M Protocolos Febrasgo | Nº25 | 2018 casos. O maior diâmetro da imagem do abscesso avaliado atra- vés da USG inicial demonstrou poder ser considerado como fator prognóstico da indicação cirúrgica. Observou-se entre 80 casos de ATO que, quando esse diâmetro é maior que 10 cm, a chance da necessidade de drenagem cirúrgica é de 80%, enquanto que, quando menor que 5 cm, foi próximo a zero.(23) Nos casos de rotura do ATO, a indicação cirúrgica é obrigatória. • No seguimento, pôde-se observar complicações tardias, sen- do mais frequentes a gravidez ectópica e infertilidade, assim como DIP crônica com dor pélvica e maior chance de recorrên- cia. Tais complicações são mais frequentes quando o processo inicial ocorreu em idade precoce (adolescentes), naqueles que existia a clamídia causando cervicite, quando o diagnóstico e o tratamento foram retardados e quando houve formação preco- ce de ATO.(25) Prevenção Rastreio e tratamento dos agentes das cervicites de mulheres sexu- almente ativas reduz risco para DIP.(16) Referências 1. 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