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O choque é uma anormalidade do sistema circulatório que resulta em perfusão inadequada de órgãos e oxigenação de tecidos. É uma emergência médica, potencialmente fatal. É importante que se realiza o diagnóstico do choque e de sua etiologia. No politraumatizado a causa mais comum é a hipovolemia decorrente de hemorragia. Contudo, pode ainda ocorrer por causas: cardiogênica, obstrutiva, neurogênica e séptico. Fisiologia Cardíaca Básica O débito cardíaco é definido por: DC = FC X VSF VSF - (a quantidade se sangue que deixa o coração após a contração) Pré-carga – volume de sangue venoso que retorna ao coração. Pós carga – resistência para o fluxo de sangue para a frente. O volume de sangue que retorna ao coração determina o comprimento da fibra muscular após o enchimento ventricular no final da diástole. Tipos de Choque Para determinação inicial da causa do choque, é necessário uma história apropriada e um exame físico detalhado. Pode ser realizado para CONFIRMAÇÃO os exames de: radiografia de tórax e pelve e FAST; mas esses exames NÃO atrasam a ressuscitação. Existem os seguintes choque: hipovolêmico, obstrutivo, distribuitivo (neurogênico e séptico) e cardiogênico. No trauma as causas são divididas principalmente em choque hemorrágico e não hemorrágico. OBS: TODO PACIENTE DE POLITRAUMA EM CHOQUE DEVE SER CONSIDERADO HIPOVOLÊMICO ATÉ QUE SE PROVE O CONTRÁRIO. Choque Hemorrágico Caracterizado por hipovolemia, decorrente da redução do volume intravascular (pré-carga reduzida), que posteriormente reduz o DC. Ocorre devido a hemorragia, que consiste na perda aguda de sangue corporal. Possuem risco de maior perda de sangue: obesos, idosos e fratura no fêmur. Choque Não Hemorrágico Inclui choque cardiogênico, tamponamento cardíaco (obstrutivo), neurogênico e séptico (distribuitivo). CHOQUE CARDIOGÊNICO: É caracterizado por falência da bomba com redução do DC. A disfunção miocárdica pode ser causada por contusão cardíaca (comum em trauma frontal), tamponamento cardíaco, embolia gasosa e IAM. Além do trauma, possui outras 3 causas: - Cardiomiopatia = IAM envolvendo mais de 40% do miocárdio do VE, IAM acompanhado por isquemia extensa e grave, IAM de VD, exacerbação de IC, depressão miocárdica por choque neurogênico ou séptico. - Arrítmica = taquiaaritmias atriais e ventriculares, bradiarritmias. - Mecânica = insuficiência valvar aórtica ou mitral grave, defeitos valvares agudos, ruptura de músculo papilar ou de cordoalhas tendíneas, dissecção de aorta ascendente, mixomas atriais. CHOQUE POR TAMPONAMENTO CARDÍACO (obstrutivo): O tamponamento cardíaco pode ocorrer por trauma torácico penetrante (mais comum) ou por contusão pulmonar. Ocorre por acúmulo de sangue no saco pericárdico, levando à compressão cardíaca, ao comprimento do retorno venoso e ao choque cardiogênico. A cavidade mais acometida é o VD (mais anterior). O socorrista deve suspeitar de TC principalmente se houver ferimentos penetrantes na Zona de Ziedler, que se encontra entre o 2º espaço intercostal (superior - a), 10º espaço (inferior - d), linha paraesternal direita (medial - b) e linha axilar anterior esquerda (lateral - c). Nessa zona ocorre 70% dos ferimentos penetrantes no tórax, e desses, 30% culminam em ferimentos cardíacos que podem causar tamponamento cardíaco. Achados clínicos = tríade de Beck (abafamento de bulhas cardíacas, turgência das veias jugulares e hipotensão); pulso paradoxal, AESP, taquicardia e insuficiência da resposta à fluidoterapia. Choque O pneumotórax pode mimetizar os achados clínicos do tamponamento cardíaco, mas permanece a turgência jugular e a hipotensão. Além do diagnóstico clínico¸ pode ser realizado a ecocardiografia (padrão-ouro), mas como não é possível na emergência, podemos utilizar o FAST que quando evidência fluido pericardial, sugere TC. Tratamento = pericardiocentese, em que há drenagem de um sangue não coagulado, uma vez que o pericárdio possui substâncias anticoagulantes. Realiza a punção com uma agulha que drena o sangue, após isso, retira a agulha, deixa o jelco conectado a uma torneira de 3 vias para eventuais retiradas de sangue. PNEUMOTÓRAX HIPERTENSIVO (Obstrutivo): É uma emergência cirúrgica que precisa de diagnóstico e tratamento imediatos. É causado pelo desenvolvimento de uma fístula que promove escapamento do ar do pulmão para o espaço pleural, causando aumento da pressão intrapleural e isso promove colapso pulmonar e desvio contralateral do mediastino. Consequentemente, ocorre comprometimento do retorno venoso e queda do débito cardíaco. CHOQUE NEUROGÊNICO (distribuitivo): Causado por lesões na medula espinhal torácica superior ou na cervical, mas não por lesões intracranianas. Essas lesões provocam perda do tônus simpático, causando hipotensão, por redução da RVP e alteração do tônus vagal. Pode ser acentuado por hipovolemia. Achados clínicos = hipotensão sem taquicardia ou vasoconstrição cutânea. Possui fracasso na ressuscitação com fluidos. CHOQUE SÉPTICO (distribuitivo): É incomum ocorrer imediatamente após a lesão. As causas mais comuns são: - Atraso no transporte ao hospital - Após trauma abdominal penetrante com contaminação da cavidade peritoneal por conteúdo intestinal Achados clínicos precoces = volume circular normal, modesta taquicardia, pele quente, PAS quase normal e ampla pressão de pulso Achados clínicos tardios = taquicardia, vasoconstrição cutânea, baixo débito urinário, redução da PAS e pulso periférico fino (DIFICIL DE DIFERENCIAR DO HIPOVOLEMICO). Fisiopatologia do Choque Hemorrágico Após a hemorragia, é desencadeado respostas circulatórias iniciais compensatórias, como vasoconstrição progressiva cutânea, muscular e visceral, para preservar o fluxo sanguíneo nos rins, coração e cérebro (órgãos nobres). A resposta a isso é a taquicardia (1º sinal na maioria das vezes), pelo aumento da FC, em uma tentativa de preservar o DC. Progressivamente há liberação de catecolaminas que aumentam a RVP e a PAD (para aumentar a perfusão pelos órgãos), reduzindo a pressão de pulso. O retorno venoso é inicialmente preservado pela compensação, mas de forma limitada. A hipovolemia causadora do choque só é abolida quando a etiologia da hemorragia for interrompida. Contudo, enquanto isso não ocorre, há perfusão e oxigenação inadequadas para as células, e com isso, elas alteram seu metabolismo para anaeróbio, resultando na formação de ácido lático e consequentemente há uma acidose metabólica. Assim, se o choque não for tratado, há a evolução para disfunção orgânica. Avaliação O reconhecimento do choque deve ocorrer na avaliação primária no ambiente intra-hospilatar (C do ABCDE). Deve observar: - Pulso - Frequência cardíaca e respiratória - Perfusão da pele - Pressão de pulso (diferença entre a PAS e a PAD) PRIMEIROS SINAIS: - Taquicardia (FC > 100bpm)* - Vasoconstrição cutânea - Pele fria * Idosos podem não apresentar taquicardia devido à sua limitação da resposta cardíaca à estimulação das catecolaminas ou pelo uso concomitante de medicamentos bloqueadores B- adrenérgicos. PRÓXIMOS SINAIS: - Redução da pressão de pulso SINAIS TARDIOS: - Queda da PA (hipotensão), que só ocorre após a perda de pelo menos 30% da volemia. - Ligeira redução do hematócrito ou da hemoglobina* * Logo, um hematócrito inicialmente normal não descarta perda significativa de sangue e choque. Classificação De acordo com os sinais clínicos, podemos classificar a perda sanguínea, auxiliando na toma de decisão sobre o tratamento. É classificado em 4 classes, sendo que a classe I e II é considerado estável e a classe III e IV é considerado instável. CLASSE I: os sintomas clínicos são mínimos; - Há pequena taquicardia - Não há alteração da PA, pressão de pulso e respiração - Não requer reposição de sangue, pois os mecanismoscompensatórios restauram o volume sanguíneo em 24h. CLASSE II: possui os seguintes sinais clínicos: - Taquicardia e taquipneia - Redução da pressão de pulso (aumento da PAD pelo aumento das catecolaminas) - Ansiedade e medo - Em alguns casos o débito urinário é ligeiramente afetado com um fluxo entre 20 a 30 ml/h A maioria é estabilizada com cristaloides. CLASSE III: apresentam os seguintes sinais clínicos: - Taquicardia e taquipneia significativa - Mudanças no estado mental - Queda da PA CLASSE IV: é imediatamente fatal. Os sintomas incluem: - Taquicardia acentuada - Hipotensão - Pulso muito dino - Anúria - Estado mental deprimido - Pele fria e pálida Nas classes I e II, em que o paciente está ESTÁVEL, é possível realizar uma TC para realizar diagnóstico da origem do sangramento. Nas classes III e IV (principal) podem iniciar transfusão sanguínea com sangue O-. Aqui é necessário um exame mais rápido de diagnóstico (FAST ou DLP). Tratamento CH O diagnóstico e o tratamento devem ocorrer quase que simultaneamente. O objetivo é parar o sangramento e repor a perda de volume, além de fornecer oxigenação e ventilação adequadas Parâmetros para monitoramento da resposta: - Lactato sérico - Gasometria arterial Nesse tratamento pode ser utilizado: soluções eletrólicas, sangue e derivados do sangue (plasma e plaquetas). O paciente deve ser monitorado para avaliar a resposta a terapia. Em alguns casos a intervenção deve ser cirúrgica. Situações que podem alterar a conduta mesmo com a classificação: - Idade do paciente - Fuidoterapia pré-hospitalar - Gravidade da lesão - Medicamentos usados em - Tempo entre a lesão e doenças crônicas o tratamento * Vasopressores são contraindicados como medicamentos de 1ª linha para tratamento do choque. Mesmo que o choque possa causar acidose metabólica pelo acúmulo de ácido lático, ele é tratado com a terapia de controle do sangramento e reposição de volume, NÃO devendo ser realizada a reposição de bicarbonato. O tratamento segue ABCDE. AB – VIAS AÉREAS E RESPIRAÇÃO Estabelece uma ventilação adequada e a oxigenação. Fornece O2 suplementar para manter SatO2 > 95%. C – CIRCULAÇÃO - Controle da hemorragia evidente, pode ser por compressão direta no local do sangramento, e em alguns casos necessita de torniquete - Obter acesso intravenoso - Avaliar perfusão tecidual - Em alguns casos pode ser necessário controle cirúrgico com angioembolização. D – EXAME NEUROLÓGICO Útil para avaliar o nível de consciência do paciente e consequentemente o a perfusão cerebral. Deve reavaliar após a restauração da perfusão e oxigenação. E – EXPOSIÇÃO Prevenir hipotermia, pois pode agravar a perda de sangue e contribuir com coagulopatia e agravamento da acidose. CATETER GÁSTRICO Realizado para prevenir a aspiração (mas pode ainda acontecer) e promover a redução da distensão gástrica, que por compressão pode causar hipotensão ou arritmia por estimulação vagal. Pode ser por via nasal ou oral. CATETER DE BEXIGA Permite que os médicos avaliem a hematúria, podendo identificar a perda de sangue de origem do sistema genitourinário. Além disso, serve como forma de monitorar o débito urinário e a perfusão renal. Contraindicação = hematoma perineal, hematoma no meato uretral ou no escroto, podendo fazer uma radiografia para confirmar essas lesões (se não houver, realiza o procedimento). ACESSO VENOSO Deve ser obtido imediatamente, de forma que seja 2 periféricos de grande calibre (18 em adultos) e curta, de preferência nos antebraços e nas veias antecubitais. Todo cristaloide (ringer lactato) deve ser administrado após seu aquecimento, principalmente em casos de hipotensão. Se o acesso periférico não for possível, parte para acesso venoso central e posteriormente o intraósseo. Após obter a via, deve ser coletado uma amostra de sangue para: - Estudos toxicológicos - Teste de gravidez (mulheres férteis) Além disso deve obter sangue para gasometria arterial. 1) Fluidoterapia A ressuscitação de fluidos se inicia com a administração em bolus de cristaloide aquecido (ringer lactato) de 1 L (e 20ml/kg em crianças < 40 kg). Essa quantidade INCLUI qualquer quantidade de fluido administrado em ambiente pré-hospitalar. Fluido hospitalar + Fluido pré-hospitalar = 1L ou 20ml/kg (< 40kg) Após essa terapia, realiza a reavaliação buscando identificar perfusão de órgão-alvo adequada e oxigenação de tecido. Se o paciente estiver hipotenso, consideramos uma hipotensão de 90x50 mmHg aceitável, pois caso haja elevação da pressão enquanto o sangramento persiste, haverá aumente desse (“ressuscitação controlada ou hipotensiva”). Pode considerar até mesmo o atraso da ressuscitação de fluidos em pacientes com feridas penetrantes. AVALIAÇÃO DA RESPOSTA PERFUSÃO ADEQUADA: retorno normal da PA, pressão e frequência de pulso melhores, melhora do débito urinário (melhor indicador – 0,5 ml/kg/h). Caso a reposição de volume com cristaloide NÃO causa resposta satisfatória, continua-se a busca pela origem do sangramento e não se ultrapassa mais de 1L. Assim, pode considerar reanimação precoce com hemoderivados em pacientes em classe III e IV. 2) Transfusão Sanguínea Pacientes que possuem resposta transitória ou que não respondem requerem de concentrado de hemácia + plasma + plaquetas. NÃO AQUECE A BOLSA DE SANGUE. Paciente com choque grau IV, com pulso > ou = 120 bpm, PAS < 90 mmHg, FAST + e trauma torácico penetrante, são indicativos para transfusão sanguínea maciça, ou seja, uma bolsa atrás da outra. Em pacientes que desenvolveram hemorórax é possível realizar autotransfusão a partir do sangue drenado por dispositivos estéril com anticoagulação (citrato de sódio), ainda sendo necessário a transfusão de plaquetas e de plasma. COAGULOPATIA Pode acontecer em 30% dos feridos graves, uma vez que a hemorragia consome os fatores de coagulação. Pode contribuir para essa coagulopatia: hipotermia reanimação maciça de fluidos. Os exames que podem ser realizados em pacientes com história de distúrbio da coagulação ou que tomam medicamentos que alteram ela: - Tempo de protrombina - Tempo de tromboplastina parcial - Contagem de plaquetas Em alguns casos é necessário o uso de ácido tranxâmico. REPOSIÇÃO DE CÁLCIO NÃO deve ser realizada, apenas em condições em que a medição de cálcio ionizado mostre ser necessário. 3) Condições Especiais IDOSOS: São incapazes de aumentar a FC ou a contração miocárdica quando estão em estresse pela perda de volume de sangue. Além disso, a aterosclerose deixa muitos órgãos vitais sensíveis à redução de fluxo sanguíneo. Assim, o idoso pode não apresentar taquicardia (por uso de B-bloqueadores) e estar em choque grave mesmo com PAS de 100 mHg. ATLETAS: possuem capacidade de compensar a perda de sangue, e por isso podem não manifestar as respostas usuais à hipovolemia, mesmo com a perda de sangue. GESTAÇÃO: como na fisiologia da gestação, é normal uma hipervolemia, é necessária uma perda maior de sangue para a apresentação de sinais e sintomas do choque. MEDICAMENTOS: alteram a repsosta ao choque, sendo eles: B-bloqeuadores, bloqueadores dos canais de cálcio, diuréticos e AINES. HIPOTERMIA: pacientes com hipotermia associada a CH não respondem ao esperado à administração de fluidos e de hemoderivados, uma vez que a coagulopatia pode se desenvolver ou piorar. Pacientes sobre efeito de álcool tem maior chances de hipotermia. MASCAPASSO: são incapazes de responder à perda de sangue como esperado, porque o DC está relacionado à FC.
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